Sinopse
O leitor tem em mãos um livro demolidor. As políticas econômica e social do governo Lula são analisadas à luz de inovações metodológicas e conceituais concebidas com grande rigor, sem exageros, sem chavões e sem adjetivação. Surge uma imagem desoladora. A eleição de Lula à Presidência da República foi a operação política conservadora mais bem-sucedida da nossa história, pois deu novo fôlego a um modelo que estava esgotado. Seus resultados comprometem o futuro do Brasil. Isso tem sido parcialmente mascarado pelos efeitos de uma conjuntura internacional excepcionalmente favorável, que não persistirá para sempre. Quando essa conjuntura mudar, todos os nossos problemas estruturais estarão agigantados. Nunca antes neste país houve tanta mistificação. Não é verdade que a vulnerabilidade externa tenha diminuído, quando comparada com o resto do mundo; na verdade, aumentou. Não é verdade que o crescimento das exportações sinalize uma inserção internacional mais virtuosa, pois estamos vivendo mais um episódio de adaptação passiva e regressiva ao sistema econômico internacional. A indústria de transformação perde dinamismo, com fortalecimento dos setores intensivos em recursos naturais e desarticulação de cadeias produtivas. Na pauta de exportações, têm peso crescente os bens de baixo valor agregado. Há perda de eficiência sistêmica. Nossas taxas de crescimento são inferiores à média internacional. Estamos ficando para trás. Quando se consideram, em conjunto, as seis variáveis macroeconômicas mais importantes, Lula obtém o quarto pior índice de desempenho presidencial da nossa história republicana. E sua política social, centrada no Programa Bolsa Família, é uma grosseira mistificação. Ao contrário do que se diz, não está em curso um processo de distribuição de renda, pois os rendimentos do trabalho, vistos como um todo, continuam a cair sistematicamente, como proporção da renda nacional. Com a adesão do Partido dos Trabalhadores ao sistema tradicional de poder, chegou ao fim o impulso transformador que surgiu nas lutas pela redemocratização do país. A política brasileira apequenou-se ainda mais. Sem disputa de projetos, o sistema político faliu. Foi despolitizado, reduzido a doses cavalares de marketing e a um conjunto de pequenos acordos, tudo a serviço da conquista e da preservação de posições de poder. Nunca foi tão grande, na sociedade, o sentimento difuso de desimportância em relação à política institucional. O governo que, na origem, prometia mudanças tornou-se o governo do cinismo e da passividade.
1. O leitor tem em mãos um livro demolidor.
As políticas econômica e social do governo
Lula são analisadas à luz de inovações
metodológicas e conceituais concebidas
com grande rigor, sem exageros, sem
chavões e sem adjetivação. Surge uma
imagem desoladora.
A eleição de Lula à Presidência da República
foi a operação política conservadora mais
bem-sucedida da nossa história, pois
deu novo fôlego a um modelo que estava
esgotado. Seus resultados comprometem o
futuro do Brasil. Isso tem sido parcialmente
mascarado pelos efeitos de uma conjuntura
internacional excepcionalmente favorável,
que não persistirá para sempre. Quando
essa conjuntura mudar, todos os nossos
problemas estruturais estarão agigantados.
Nunca antes neste país houve tanta
mistificação. Não é verdade que a
vulnerabilidade externa tenha diminuído,
quando comparada com o resto do mundo;
na verdade, aumentou. Não é verdade que
o crescimento das exportações sinalize
uma inserção internacional mais virtuosa,
pois estamos vivendo mais um episódio de
adaptação passiva e regressiva ao sistema
econômico internacional. A indústria
de transformação perde dinamismo,
com fortalecimento dos setores intensivos
em recursos naturais e desarticulação
de cadeias produtivas. Na pauta de
exportações, têm peso crescente
os bens de baixo valor agregado. Há perda
de eficiência sistêmica. Nossas taxas
de crescimento são inferiores à média
internacional. Estamos ficando para trás.
Quando se consideram, em conjunto,
as seis variáveis macroeconômicas mais
importantes, Lula obtém o quarto pior
índice de desempenho presidencial da
nossa história republicana. E sua política
social, centrada no Programa Bolsa Família,
é uma grosseira mistificação. Ao contrário
do que se diz, não está em curso um
processo de distribuição de renda, pois os
rendimentos do trabalho, vistos como um
todo, continuam a cair sistematicamente,
como proporção da renda nacional.
Com a adesão do Partido dos Trabalhadores
ao sistema tradicional de poder, chegou
ao fim o impulso transformador que surgiu
nas lutas pela redemocratização do país. A
política brasileira apequenou-se ainda mais.
Sem disputa de projetos, o sistema político
faliu. Foi despolitizado, reduzido a doses
cavalares de marketing e a um conjunto
de pequenos acordos, tudo a serviço da
conquista e da preservação de posições de
poder. Nunca foi tão grande, na sociedade,
o sentimento difuso de desimportância em
relação à política institucional.
O governo que, na origem, prometia
mudanças tornou-se o governo do cinismo
e da passividade.
Rigor científico e honestidade intelectual exigem, antes de tudo,
o compromisso com uma análise crítica desprovida de interesses.
O objetivo é compreender a realidade da melhor maneira possível
– condição necessária para transformá-la. O debate sobre
a realidade nacional está empobrecido. Os intelectuais orgânicos
do bloco dominante estão constrangidos, pois o governo Lula
está implementando as estratégias e as políticas desse bloco.
Os intelectuais de esquerda, na maioria, estão tímidos. (...)
Nosso esforço de inovação analítica está associado à introdução
de novos conceitos (como vulnerabilidade externa estrutural
e modelo liberal periférico), ao aperfeiçoamento de indicadores
(índice de vulnerabilidade externa comparada, índice de desempenho
presidencial) e à aplicação, ao Brasil, de conceitos já existentes
(transformismo, bloco dominante).
L U I Z F I L G U E I R A S E R E I N A L D O G O N Ç A L V E S
A E C O N O M I A P O L Í T I C A D O G O V E R N O L U L A
4. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 3
L U I Z F I L G U E I R A S I R E I N A L D O G O N Ç A L V E S
A E C O N O M I A
P O L Í T I C A D O
GOVERNO Lula
6. Sumário
a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 7
Sobre os autores 11
Lista de gráficos, quadros e tabelas 13
Introdução 17
C APÍTULO 1
Contexto internacional 33
1. Ciclo internacional favorável 35
1.1 Esfera produtivo-real 36
1.2 Esfera comercial 41
1.3 Esferamonetário-financeira 43
1.4 Esfera tecnológica 46
2. Vulnerabilidade externa 47
2.1 Vulnerabilidade externa comparada 48
2.2 Governo Lula versus Governo Cardoso 54
3. Oportunidade perdida 57
C APÍTULO 2
Inserção internacional e vulnerabilidade externa 61
1. Vulnerabilidade externa conjuntural e anomalias 64
2. Exportações e dependência externa 73
3. Especialização retrógrada 78
4. Retrocesso industrial 83
5. Vulnerabilidade externa estrutural 88
7. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 8
3. Política e dinâmica macroeconômica 95
1. Continuidade domodelo 97
2. Desempenhomacroeconômico 101
2.1 Contas externas e inflação 101
2.2 Finanças públicas 105
2.3 Renda, investimento e emprego 108
3. Modelo e ajustemacroeconômico 110
4. Liberalização e retrocesso 113
4. Desempenho em perspectiva histórica 117
1. Crescimento da renda 119
2. Hiato de crescimento 121
3. Acumulação de capital 125
4. Inflação 127
5. Fragilidade financeira 130
6. Vulnerabilidade externa 132
7. Desempenho geral 134
5. Pobreza e política social 141
1. Concepção hegemônica 143
2. Contra-reforma liberal 149
3. Universalização versus focalização 153
4. Ajuste fiscal e política social 157
5. Bolsa Família 162
6. Flexibilização e precarização do trabalho 170
8. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 9
6. Classes sociais, Estado e bloco de poder 175
1. Bloco de poder dominante 177
2. Transformismo e cooptação 182
3. Patrimonialismo e balcanização 188
7. Crescimento, acumulação e perspectivas 197
1. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) 198
2. Distribuição de riqueza e renda 2077
3. Perspectivas para os jovens 215
4. Cenáriosmacroeconômicos 220
5. Perspectivas 223
Anexos
I. Índice de Vulnerabilidade Externa Comparada 233
II. Índice de Desempenho Presidencial 235
III. Análise de Componentes Principais 243
IV. Conceitos e definições 249
Bibliografia 253
10. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 11
Sobre os autores
Luiz Filgueiras
Professor associado da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Fe-deral
da Bahia (UFBA) desde 1980,ministrando as disciplinas de Economia Bra-sileira,
Economia doTrabalho e História do Pensamento Econômico, entre ou-tras.
Foi diretor dessa Faculdade no período 2000-2004.
Doutor em Economia pelo Instituto de Economia da Unicamp (1994);mes-tre
em Economia pela UFBA (1983) e bacharel em Economia por essa mesma
instituição (1978).Em 2006, realizou pós-doutorado no Centro de Economia da
Universidade Paris XIII sob a direção do professor Pierre Salama.
Autor do livro História do Plano Real (Boitempo, 2000, 2003 e 2006) e de di-versos
capítulos de livros, dezenas de artigos publicados em revistas especializa-das
e jornais nas áreas de Economia Brasileira, Política Econômica e Economia
doTrabalho.
Membro do grupo de trabalho sobre Setores Dominantes na América Latina
do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso). Recebeu o Pri-meiro
Prêmio Baiano de Economia Rômulo de Almeida – Conselho Regional
de Economia, 5ª Região (1986) e o Prêmio Banco do Estado da Bahia (Baneb)
de Apoio aTeses, na categoria de professor pesquisador (1998).
Reinaldo Gonçalves
Professor titular de Economia Internacional do Instituto de Economia da Uni-versidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) desde 1993; diretor da Sociedade
Brasileira de Economia Política (1998-2002); diretor daAssociação Nacional dos
Cursos de Graduação em Economia (2000-2002); conselheiro titular,Conselho
Federal de Economia (2001-2003); vice-presidente do Conselho Regional de
Economia,RJ (1997-1999); e presidente do Instituto de Economistas do Rio de
Janeiro (1995-1996).
A economia política do governo Lula 11
11. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 12
Livre-docente em Economia Internacional (UFRJ, 1991); Ph.D. em Econo-mia
pela University of Reading (Inglaterra, 1986); mestre em Economia pela
EPGE-FGV (1976); mestre em Engenharia da Produção pela Coppe-UFRJ
(1974); e bacharel em Economia (UFRJ, 1973).
Foi professor visitante (Directeur d'Etudes), da École des Hautes Études en
Sciences Sociales,Maison des Sciences de l’Homme, Paris, 1996; professor visi-tante
da Universidade de Paris XIII, 1990; economista das Nações Unidas (Unc-tad,
Genebra, 1983-1987).
Autor de mais de três centenas de trabalhos publicados em 21 países: Europa
(Alemanha, Espanha, França, Inglaterra, Itália, Suécia, Suíça, Portugal e Iugoslá-via);
Ásia (Japão,Coréia do Sul e Índia);África (CaboVerde);América do Nor-te
(Estados Unidos e México);Caribe (Cuba); eAmérica do Sul (Argentina,Bra-sil,
Chile,Uruguai eVenezuela).
Entre os seus principais trabalhos no Brasil destacam-se os livros Empresas
transnacionais e internacionalização da produção (Vozes, 1992);Ô abre-alas: a nova in-serção
do Brasil na economia mundial (Relume-Dumará, 1994); Globalização e des-nacionalização
(Paz e Terra, 1999); O Brasil e o comércio internacional (Contexto,
2000), Vagão descarrilhado (Record, 2002);O nó econômico (Record, 2003); A he-rança
e a ruptura (Garamond, 2003);Comércio e investimento externo (Fase, 2004); e
Economia política internacional (Elsevier, 2005).
É co-autor de outros livros, como: A nova economia internacional.Uma perspec-tiva
brasileira (Campus, 1998); O Brasil endividado (Perseu Abramo, 2000); A ar-madilha
da dívida (Perseu Abramo, 2002); e Economia internacional.Teoria e expe-riência
brasileira (Elsevier, 2004).
Seus trabalhos receberam os seguintes prêmios: Prêmio Fundação Universi-tária
José Bonifácio em 1991; Prêmio Jabuti 2001 (Câmara Brasileira do Livro);
Troféu Cultura Econômica em 2004 (Caixa Econômica-Jornal do Comércio
RS);Troféu Cultura Econômica em 2005; e Personalidade Econômica do Ano
(Conselho Federal de Economia) em 2004.
12 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
12. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 13
Tabelas, quadros e gráficos
Tabelas
Tabela 1.1 Indicadores de vulnerabilidade externa, Brasil emundo: 1995-2006.
Tabela 1.2 Índices de vulnerabilidade externa comparada, Brasil: 1995-2006.
Tabela 1.3 Vulnerabilidade externa do Brasil, Indicadores: governo Lula versus
governo Cardoso.
Tabela 1.4 Os países comosmaiores spreads nos títulos nomercado internacional:
2002-2007.
Tabela 2.1 Indicadores de vulnerabilidade externa conjuntural: 1994-2006.
Tabela 2.2 Transações correntes: 1995-2006.
Tabela 2.3 Serviços e rendas, valores acumulados: 1995/2006.
Tabela 2.4 Ingresso de Investimento Externo Direto (IED): 1990-2006.
Tabela 2.5 Fluxos líquidos de capitais: 1995-2006.
Tabela 2.6 Balança comercial: 1995-2006.
Tabela 2.7 Contribuição ao crescimento do PIB (%).
Tabela 2.8 Evolução das exportações por fator agregado: 1999-2006.
Tabela 2.9 Padrão das exportações por fator agregado: 1995-2006 (%).
Tabela 2.10 Padrão das exportações por tipo de produto: 1995-2006 (%).
Tabela 2.11 Padrão das exportações segundo grupos de produtos: 1999-2006.
Tabela 2.12 Padrão das exportações segundo intensidade tecnológica dos produtos:
1999-2006.
Tabela 2.13 Participação dos vinte principais produtos de exportação (%).
Tabela 3.1 Transações correntes do balanço de pagamentos: 2003-2006.
Tabela 3.2 Transações correntes do balanço de pagamentos, valores acumulados:
1995-2006.
Tabela 3.3 Metas e taxas de inflação: 2003-2006.
Tabela 3.4 Dívida líquida do setor público, anos selecionados: 1994-2006.
Tabela 3.5 Finanças públicas, valores acumulados: 1995-2006.
Tabela 3.6 Renda, investimento e emprego: 2003-2006.
Tabela 3.7 Renda, investimento e emprego: governo Lula versus governo Cardoso.
Tabela 3.8 Perda de eficência sistêmica do Brasil: 2003-2007.
A economia política do governo Lula 13
13. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 14
Tabela 4.1 Variáveismacroeconômicas segundo omandato presidencial: 1890-2006.
Tabela 4.2 Índice de desempenho presidencial.
Tabela 4.3 Índice de desempenho presidencial segundo a ordemde classificação.
Tabela 4.4 Desempenho do governo Lula: síntese das variáveis e dos índices.
Tabela 4.5 Desempenho do governo Lula: síntese das posições segundo
o índice de desempenho presidencial e a análise de componentes principais.
Tabela 5.1 Execução do Orçamento da União, 2000-2006.
Tabela 5.2 Execução do Orçamento (social) da União, 2000-2006.
Tabela 6.1 Financiamento das campanhas eleitorais para a Presidência da República,
segundo o setor econômico: 2002 e 2006.
Tabela 7.1 Investimentos eminfra-estrutura no PAC, acumulado: 2007-2010
Tabela 7.2 Indicadoresmacroeconômicos previstos no PAC: 2007-2010
Tabela 7.3 Subestimativa de investimentos emlogística e transportes no PAC.
Tabela 7.4 Massa salarial, regiõesmetropolitanas, 2003-2006.
Tabela 7.5 Mais jovens fora da escola.
Tabela 7.6 Mortes e homicídios de jovens: recordesmundiais.
Tabela 7.7 Maior desemprego dos jovens.
Tabela 7.8 Maior consumo de drogas e álcool pelos jovens.
Tabela 7.9 Jovens brasileiros emigramcada vezmais.
Tabela 7.10 Jovens pessimistas como futuro.
Tabela 7.11 Cenáriosmacroeconômicos: 2007-2010.
Quadros
Quadro 1.1 Vulnerabilidade externa: conceitos.
Quadro 1.2 Principais conclusões: capítulo 1.
Quadro 2.1 Doença holandesa.
Quadro 2.2 Principais conclusões: capítulo 2.
Quadro 3.1 Modelo liberal periférico.
Quadro 3.2 Principais conclusões: capítulo 3.
Quadro 4.1 Lula:melhor do que JK ou quase tão ruimquanto Collor?
Quadro 4.2 Principais conclusões: capítulo 4.
14 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
14. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 15
Quadro 5.1 Políticas sociais de Estado.
Quadro 5.2 Importância da aposentadoria rural.
Quadro 5.3 Universalização versus focalização.
Quadro 5.4 Prouni.
Quadro 5.5 Conceitos inapropriados de ricos.
Quadro 5.6 Políticas focalizadas: lógica perversa.
Quadro 5.7 CPMF: desvios da saúde para o pagamento de juros.
Quadro 5.8 Importância do Bolsa Família.
Quadro 5.9 Hegemonia às avessas.
Quadro 5.10 “Não existe reforma agrária no governo Lula”.
Quadro 5.11 Principais conclusões: capítulo 5.
Quadro 6.1 O transformismo segundo Olavo Setúbal.
Quadro 6.2 O transformismo segundo César Benjamin.
Quadro 6.3 Etanol e seus efeitos.
Quadro 6.4 Lula e o lulismo.
Quadro 6.5 Principais conclusões: capítulo 6.
Quadro 7.1 Risco de apagão de energia continua.
Quadro 7.2 Crescente custo ambiental.
Quadro 7.3 Principais conclusões: capítulo 7.
Gráficos
Gráfico 1.1 PIBmundial, var. %,médiamóvel quatro anos: 1890-2006.
Gráfico 1.2 PIB e investimento na economiamundial: 1999-2006.
Gráfico 1.3 Taxa de investimento e investimento externo direto: 1999-2006.
Gráfico 1.4 Inflaçãomédiamundial, IPC (%): 1999-2006.
Gráfico 1.5 Comérciomundial de bens, var. %: 1999-2006.
Gráfico 1.6 Preços internacionais, var. %: 1999-2006.
Gráfico 1.7 Déficit na conta corrente do balanço de pagamentos, % do PIB: 1997-2006.
Gráfico 1.8 Reservas internacionais: 1999-2006.
Gráfico 1.9 Países emdesenvolvimento, contas externas (US$ bilhões): 1999-2006.
Gráfico 1.10 Países emdesenvolvimento, indicadores das contas externas (%): 1999-2006.
Gráfico 1.11 Spreads dos títulos dosmercados emergentes: 1998-2006.
Gráfico 1.12 Indicadores de progresso técnico: 1999-2005.
Gráfico 1.13 PIBmundial, var. % segundo omandato presidencial: 1890-2006.
Gráfico 1.14 Índices de vulnerabilidade externa, Brasil: 1995-2006.
A economia política do governo Lula 15
15. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 16
Gráfico 2.1 Taxa de câmbio efetiva real,médiamóvel 12meses: 1995-2006.
Gráfico 2.2 Pagamentos de juros e taxas pelo Brasil ao FMI: 1984-2006.
Gráfico 2.3 Termos de troca e rentabilidade das exportações.
Gráfico 2.4 Exportações e PIB: 1995-2006.
Gráfico 2.5 Exportações de bens e serviços, contribuição % no crescimento do PIB: 1995-2006.
Gráfico 3.1 Dívida líquida do setor público (% do PIB): 2003-2006.
Gráfico 3.2 Índice de Liberalização Econômica: 1995-2007.
Gráfico 3.3 Eficácia do governo e qualidade do aparato regulatório: 1996-2006.
Gráfico 3.4 Respeito à lei e controle da corrupção: 1996-2006.
Gráfico 4.1 PIB Brasil, var. %,médiamóvel quatro anos: 1890-2006.
Gráfico 4.2 PIB Brasil, índice de desempenho presidencial.
Gráfico 4.3 Hiato de crescimento,médiamóvel quatro anos.
Gráfico 4.4 Hiato de crescimento, índice de desempenho presidencial.
Gráfico 4.5 Renda per capita do Brasil como percentual da renda per capitamundial:
1890-2006.
Gráfico 4.6 Renda per capita do Brasil como percentual da renda per capitamundial:
1990-2006.
Gráfico 4.7 Formação bruta de capital fixo, var. %,médiamóvel quatro anos.
Gráfico 4.8 FBCF, índice de desempenho presidencial.
Gráfico 4.9 Inflação %,médiamóvel quatro anos.
Gráfico 4.10 Inflação, índice de desempenho presidencial.
Gráfico 4.11 Fragilidade financeira %,médiamóvel quatro anos.
Gráfico 4.12 Fragilidade financeira, índice de desempenho presidencial.
Gráfico 4.13 Vulnerabilidade externa %,médiamóvel quatro anos.
Gráfico 4.14 Vulnerabilidade externa, índice de desempenho presidencial.
Gráfico 4.15 Índice de desempenho presidencial,média.
Gráfico 7.1 Saláriomínimo real, var. % anual emsubperíodos: 1995-2011.
Gráfico 7.2 Coeficiente de Gini: 1995-2005.
Gráfico 7.3 Distribuição primária da renda (%): 2000-2005.
Gráfico 7.4 Diferencial entre a variação do saláriomédio e a variação do PIB per capita:
1996-2006.
Gráfico 7.5 Diferencial entre a variação do saláriomédio e a variação do PIB per capita
por subperíodos: 1995-2006.
Gráfico 7.6 Relação juro / salário: 1995-2006.
Gráfico 7.7 Participação dos grandes bancos no PIB (%), por subperíodos: 1995-2006.
16 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
16. Introdução
a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 17
Este livro analisa as políticas econômicas e sociais do governo Lula e o desem-penho
da economia brasileira a partir de 2003.As principais características do
texto são as seguintes: (i) orientação didática; (ii) perspectiva histórica; (iii) ava-liação
crítica; (iv) esforço de inovação analítica; (v) enfoque abrangente; (vi) abor-dagem
da Economia Política; (vii) caráter prospectivo.Naturalmente, estes são os
propósitos dos autores.Cabe ao leitor julgar até que ponto o livro atinge seus ob-jetivos.
A orientação didática é necessária, visto que o livro não se destina apenas a
economistas ou especialistas. Foi escrito para um público mais amplo: estudan-tes,
profissionais de áreas diversas e todos os interessados em entender melhor a
atual situação do país e suas perspectivas. Para reforçar o caráter didático, no fi-nal
de cada capítulo há um quadro com a síntese das principais conclusões.As
questões ou os conceitos são definidos da forma mais precisa e concisa possível.
Os conceitos técnicos são tratados nos anexos e em quadros específicos. No
Anexo IV apresentam-se os principais conceitos usados no livro.
A perspectiva histórica fornece o referencial adequado para a análise da dinâ-mica
e do desempenho da economia brasileira.Essa perspectiva exige que a ava-liação
da política econômica do governo Lula e seus resultados leve em conta o
contexto internacional.Não há como fazer uma análise robusta sem que se con-sidere
o que está acontecendo no resto mundo, já que o grau de inserção do
país no sistema econômico internacional atingiu níveis elevados.A análise do
desempenho da economia brasileira também deve considerar o seu padrão his-tórico
de desenvolvimento. Ou seja, trata-se de comparar o seu atual desem-penho
com o das economias do resto do mundo e com o seu próprio desem-penho
ao longo da história. Neste último caso, a referência é todo o período
republicano.
A avaliação crítica das estratégias e políticas do governo Lula é uma exigên-cia
do método científico.Rigor científico e honestidade intelectual exigem, an-
A economia política do governo Lula 17
17. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 18
tes de tudo, o compromisso com uma análise crítica desprovida de interesses.O
objetivo é compreender a realidade da melhor maneira possível – condição ne-cessária
para transformá-la.Essa questão é particularmente relevante no Brasil no
momento atual, pois o debate sobre a realidade nacional está empobrecido.Tra-ta-
se, de fato, de uma situação peculiar porque os intelectuais orgânicos do blo-co
dominante estão constrangidos.O governo Lula está implementando as es-tratégias
e políticas desse bloco, até mesmo com resultados superiores, obser-vando-
se os interesses de suas frações hegemônicas.Por outro lado,os intelectuais
de esquerda, em sua maioria, estão tímidos, visto que o governo Lula tem como
principal base política no Congresso o Partido dos Trabalhadores e conta com
o apoio de organizações da sociedade civil (por exemplo, centrais sindicais).En-tretanto,
esse governo aprofunda um modelo de economia, sociedade e política
(modelo liberal periférico) que consolida e aprofunda os atuais padrões de do-minação
no país.Naturalmente, na literatura atual sobre o desempenho do go-verno
Lula há alguns trabalhos críticos, que estão referidos no texto, e outros
que estão listados na bibliografia.
O esforço de inovação analítica está associado à introdução de novos concei-tos
(como vulnerabilidade externa estrutural e modelo liberal periférico), ao
aperfeiçoamento de indicadores (Índice deVulnerabilidade Externa Compara-da,
Índice de Desempenho Presidencial) e à aplicação, ao Brasil, de conceitos já
existentes (transformismo, bloco dominante). Esse esforço busca uma com-preensão
mais precisa da realidade brasileira contemporânea.
O enfoque abrangente decorre da preocupação de entender o governo Lula
nas suas dimensões econômica, social e política.Freqüentemente, análises parciais,
centradas em uma dessas dimensões, deixam de lado fatores relevantes e tendem
a se concentrar em movimentos mais conjunturais. Esses fatores, principalmen-te
os de natureza estrutural, permitem uma visão mais geral e, portanto,mais di-nâmica
e orgânica da trajetória recente do Brasil e de suas perspectivas.Para ilus-trar,
a maior parte dos observadores tem concentrado suas análises na evolução
de indicadores de vulnerabilidade externa conjuntural.Por isso, há uma tendên-cia
a se negligenciar a crescente vulnerabilidade externa estrutural, decorrente do
avanço do processo de liberalização nas esferas produtivo-real, comercial e mo-netário-
financeira das relações econômicas internacionais do país.Outro exem-plo
de parcialidade e fragilidade científica é a análise econômica que despreza a
influência dos interesses do bloco dominante na formulação e execução das es-
18 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
18. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 19
tratégias de governo.Adicionalmente, o fenômeno do “transformismo” político
promovido por Lula e pelo PT, de forma rápida e ampla, pegou de surpresa mui-tos
“companheiros de viagem” e, inclusive, representantes do bloco dominante.
A abordagem da Economia Política reside no uso de um método de análise
em que os fenômenos econômicos estão vinculados diretamente à dinâmica dos
interesses de grupos e classes sociais. Nesse método, a acumulação de riqueza
depende das estratégias e políticas de Estado. E o Estado é o espaço privilegia-do
da disputa entre grupos e classes sociais. Portanto, a acumulação de riqueza
está associada ao exercício do poder ideológico, político e econômico.
O caráter prospectivo do livro está presente em todos os capítulos, especial-mente
no último.A análise das questões econômicas, sociais e políticas durante
o governo Lula tem como referência os elementos de conjuntura e, principal-mente,
os eixos estruturantes das estratégias e políticas governamentais. O ob-jetivo
é distinguir o que é estrutural e o que é conjuntural, o que é primário e
o que é secundário. Esse procedimento permite uma visão mais clara das incer-tezas
críticas existentes quanto à trajetória futura do país.A análise das perspec-tivas
é apresentada de forma mais direta no último capítulo, que avalia o Pro-grama
de Aceleração do Crescimento (PAC) lançado por Lula no início do seu
segundo mandato em 2007, a questão estrutural da distribuição da riqueza e as
perspectivas em geral.
O livro está dividido em sete capítulos. Os quatro primeiros concentram-se
em temas econômicos: contexto internacional, inserção externa, política e mo-delo
econômico, além de desempenho em perspectiva histórica.O quinto capí-tulo
trata da política social, enquanto o sexto analisa o governo Lula levando em
consideração a dinâmica das classes sociais,o papel do Estado e a atuação dos gru-pos
dominantes.O sétimo capítulo discute as perspectivas.
Os principais argumentos e as principais conclusões do livro são apresentados
a seguir.
No capítulo 1 examinam-se a evolução da economia mundial e a questão da
vulnerabilidade externa.A análise da situação internacional abarca as quatro es-feras
relevantes: produtivo-real, comercial, tecnológica e monetário-financeira.A
evidência apresentada é conclusiva: a conjuntura internacional tem sido ex-traordinariamente
favorável desde 2003.Em poucos momentos da histórica eco-nômica
mundial podem ser encontrados indicadores tão evidentes de uma fase
ascendente de um ciclo econômico.
A economia política do governo Lula 19
19. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 20
O contexto internacional favorável é determinante para a evolução da vul-nerabilidade
externa, principalmente, dos países em desenvolvimento.A vulne-rabilidade
externa é entendida como a capacidade de determinado país resistir
a pressões, fatores desestabilizadores e choques externos.
A aceleração da economia mundial, a partir de 2003, teve como uma das suas
conseqüências mais evidentes a melhora generalizada dos indicadores de vulne-rabilidade
externa conjuntural do conjunto dos países em desenvolvimento.O
Brasil não fugiu a essa regra.A evidência empírica é conclusiva: os indicadores
de vulnerabilidade externa conjuntural, que tendiam a melhorar desde a crise
cambial de 1999, continuam progredindo durante o governo Lula.
Não houve melhora na vulnerabilidade externa da economia brasileira, compa-rativamente
ao resto do mundo, durante o governo Lula.Trata-se, aqui, da vulne-rabilidade
externa comparada, ou seja, de se analisar a evolução dos indicadores
brasileiros em relação aos indicadores do resto do mundo.A metodologia de cál-culo
do Índice deVulnerabilidade Externa Comparada é apresentada no Anexo I.
Os indicadores de vulnerabilidade externa comparada do Brasil não apresentam
avanços significativos quando se confronta o período 2003-2006 com o período
1995-2002.No contexto de queda generalizada dos indicadores de vulnerabilida-de
externa no conjunto da economia mundial, o governo Lula não mostra de-sempenho
superior ao do governo Cardoso.Na realidade, o índice de vulnerabili-dade
externa comparada do Brasil durante o governo Lula é menor do que este
mesmo índice no segundo mandato de Cardoso e maior do que o índice médio
no primeiro mandato.Considerando a média dos dois mandatos de Cardoso, o ín-dice
médio de vulnerabilidade externa comparada do governo Lula é maior.
O corolário dos argumentos e da evidência empírica é que a melhora dos in-dicadores
de vulnerabilidade externa conjuntural da economia brasileira, a par-tir
de 2003, decorre de um contexto internacional extraordinariamente favorá-vel.
No que diz respeito ao ajuste externo, não há motivos para se atribuir
méritos específicos à condução da política econômica do governo Lula.Ao con-trário.
Esse governo manteve a mesma política econômica do governo anterior,
sendo responsável pela perda da extraordinária oportunidade criada pelo con-texto
internacional pós-2003, que permitiria colocar o país em uma trajetória
de desenvolvimento econômico estável e dinâmico.
No capítulo 2 analisam-se em maiores detalhes a inserção do Brasil na econo-mia
internacional e seu padrão de vulnerabilidade externa a partir de 2003.Nesse
20 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
20. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 21
capítulo distingue-se a vulnerabilidade externa conjuntural e a vulnerabilidade ex-terna
estrutural.O argumento geral é que as políticas do governo Lula reforçam o
avanço de estruturas de produção e padrões de inserção internacional retrógrados,
que tendem a aumentar a vulnerabilidade externa estrutural do país.Não há dú-vida
de que a redução dos indicadores de vulnerabilidade externa conjuntural de-corre
fundamentalmente do desempenho favorável das exportações.O crescimen-to
das exportações de bens primários é a variável fundamental que diferencia o de-sempenho
da economia antes e depois de 1999 e,particularmente, a partir de 2003.
No governo Lula configura-se um processo de adaptação passiva e regressiva
do país ao sistema econômico internacional, em geral, e ao sistema mundial de
comércio, em particular.A maior competitividade internacional está centrada
nos produtos intensivos em recursos naturais e se dá, no essencial, mantendo o
mesmo padrão de especialização já existente.
Ademais, o governo Lula é responsável por anomalias como a forte aprecia-ção
cambial e a exportação de capital produtivo, bem como o pagamento de va-lores
extraordinariamente elevados ao FMI em um contexto de melhora evi-dente
das contas externas do país.Vale destacar que a manutenção das linhas de
crédito junto ao FMI custou ao país US$ 3,65 bilhões na forma de pagamento
de juros e taxas de administração no período 2003-2006. Isto representou um
enorme desperdício de recursos.
A inserção passiva do país no sistema econômico internacional tem como re-sultado
o aumento da dependência do crescimento do PIB em relação à de-manda
externa. Isto se deve, principalmente, ao crescimento da participação das
exportações no PIB.O país tornou-se estruturalmente mais vulnerável frente às
oscilações da conjuntura internacional.
O aumento da vulnerabilidade externa estrutural da economia brasileira de-corre
também do aprofundamento do padrão de especialização retrógrada que
envolve a reprimarização das exportações, com a crescente participação de pro-dutos
primários no valor das exportações.O país tem sido incapaz de promover
o upgrade do seu padrão de comércio exterior. Há perda de posição relativa de
produtos de exportação com maior intensidade tecnológica. Os ganhos relati-vos
têm ocorrido nos produtos de baixo conteúdo tecnológico e nos produtos
intensivos em recursos naturais.
Como determinante da inserção passiva no sistema econômico internacional,
cabe destacar a perda de dinamismo da indústria de transformação, com a espe-
A economia política do governo Lula 21
21. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 22
cialização em setores intensivos em recursos naturais e a desarticulação de cadeias
produtivas.A ausência de progresso na estrutura produtiva implica consolidar
um padrão de inserção retrógrada no sistema mundial de comércio, com cres-cente
dependência em relação à exportação de commodities.
O desempenho recente do comércio exterior do Brasil não resulta de trans-formações
estruturais, mas de circunstâncias conjunturais associadas às elevadas
taxas de crescimento do comércio mundial e à melhora nos termos de troca.A
melhora dos indicadores de vulnerabilidade externa conjuntural, decorrente do
crescimento das exportações de commodities, não tem impedido o aumento da
vulnerabilidade externa estrutural da economia brasileira.
No capítulo 3 avaliam-se a política e a dinâmica macroeconômica do país
durante o governo Lula, bem como os seus determinantes estruturais.A análise
da dinâmica macroeconômica refere-se, em grande medida, ao desempenho da
economia brasileira em questões específicas, a saber, contas externas, inflação, fi-nanças
públicas, renda, investimento e emprego.A discussão dos determinantes
estruturais está vinculada às características do modelo liberal periférico que são
aprofundadas e consolidadas a partir de 2003.
Considerando que o conceito de modelo liberal periférico é central para a
análise desenvolvida no livro, cabe explicitá-lo desde o início. Esse modelo
tem três conjuntos de características marcantes: liberalização, privatização e
desregulação; subordinação e vulnerabilidade externa estrutural; e dominân-cia
do capital financeiro.O modelo é liberal porque é estruturado a partir da
liberalização das relações econômicas internacionais nas esferas comercial, pro-dutiva,
tecnológica e monetário-financeira; da implementação de reformas
no âmbito do Estado (em especial na área da Previdência Social) e da priva-tização
de empresas estatais, que implica reconfigurar a intervenção estatal na
economia e na sociedade; e de um processo de desregulação do mercado de
trabalho, que reforça a exploração da força de trabalho.O modelo é periféri-co
porque é uma forma específica de realização da doutrina neoliberal e da
sua política econômica em um país que ocupa posição subalterna no sistema
econômico internacional, ou seja, um país que não tem influência na arena in-ternacional
e se caracteriza por significativa vulnerabilidade externa estrutu-ral
nas suas relações econômicas internacionais. Por fim, a dinâmica macroe-conômica
do modelo subordina-se à predominância do capital financeiro e da
lógica financeira.
22 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
22. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 23
O governo Lula manteve a mesma política econômica do segundo governo
Cardoso:metas de inflação, ajuste fiscal permanente e câmbio flutuante. Entre-tanto,
a redução das restrições externas tem possibilitado menor instabilidade
macroeconômica.Essa oportunidade tem sido usada pelo governo Lula para re-forçar
o modelo liberal periférico e suas políticas econômicas.Trata-se, pois, da
continuidade e do aprofundamento do modelo.
A melhora da situação das contas externas é causada pelos crescentes superá-vits
comerciais que ultrapassam, a partir de 2003,os déficits estruturais da balança
de serviços e rendas. Entre os principais determinantes do desempenho da ba-lança
comercial, podem-se mencionar: a desvalorização cambial de 2002, o cres-cimento
das economias americana e chinesa, que puxaram o comércio mundial,
a recuperação da Argentina e a disparada nos preços das commodities.
As taxas de inflação caíram sistematicamente a partir de 2003.Os principais
fatores determinantes são: a apreciação cambial, decorrente dos elevados saldos
na balança comercial e da manutenção de grande diferencial entre as taxas de ju-ros
interna e externa; a fraca pressão da demanda interna causada pelas políticas
fiscais (mega-superávit primário) e monetária (juros elevados); e a queda dos sa-lários
reais durante a maior parte do período.
A mudança do cenário internacional e a acentuada melhora das contas ex-ternas
do país também implicam resultados mais favoráveis para a trajetória da
dívida pública a partir de 2003.A redução relativa da dívida total se deve à di-minuição
sistemática da dívida externa em todos os anos, tanto em valores ab-solutos
quanto como proporção do PIB. Por outro lado, a relação dívida inter-na/
PIB é crescente, pois tem havido a troca de dívida externa, de maior prazo e
menor juro, por dívida interna, de prazo menor e taxas de juros mais elevadas.
Os governos Cardoso e Lula propiciaram ao capital financeiro mais de R$ 1
trilhão em juros da dívida pública, o que correspondeu, em média, a 8% do PIB
no segundo governo Cardoso e a 8,2% no governo Lula.Neste, as elevadas ta-xas
de juros praticadas acarretaram pagamentos de R$ 590 bilhões em juros,
montante 61% maior do que o acumulado entre 1999 e 2002.
No governo Lula, a trajetória instável e as baixas taxas de crescimento do PIB
estão associadas a taxas de investimento baixas e de desemprego altas.A evolu-ção
medíocre do nível do produto, do investimento e do emprego é particular-mente
impressionante porque ocorreu em uma conjuntura internacional bas-tante
favorável a partir de 2003.
A economia política do governo Lula 23
23. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 24
No governo Lula, a taxa média de crescimento do PIB (3,3%) foi maior do
que as taxas crescimento dos dois governos Cardoso, que foram de 2,4% e 2,1%,
respectivamente. Por outro lado, a taxa média de investimento do governo Lula
(16,1%) é menor que as taxas dos governos Cardoso.No que se refere à taxa de
desemprego, apesar da tendência de queda durante o governo Lula, ela tem se
mantido em níveis elevados, chegando a ser superior aos níveis observados du-rante
o primeiro mandato de Cardoso.
De um ponto de vista estrutural, o governo Lula recolocou na ordem do dia
a continuação do modelo liberal ao implementar a reforma da Previdência dos
servidores públicos, iniciar o processo de reforma sindical e sinalizar a reforma
das leis trabalhistas.
O governo Lula tem implementado uma série de medidas para consolidar o
modelo liberal periférico. Elas aumentam a volatilidade da conta de capital e fi-nanceira
do balanço de pagamentos. Portanto, consolida-se o modelo marcado
pela enorme concentração de riqueza e de renda, as reduzidas taxas de cresci-mento
e investimento, a inserção internacional passiva e a grande vulnerabilida-de
externa estrutural.
Os efeitos do avanço do processo de liberalização e desregulamentação eco-nômica
não se restringem às contas externas e à esfera da distribuição.A evi-dência
empírica disponível aponta para uma perda de eficiência sistêmica da
economia brasileira e um retrocesso institucional durante o governo Lula.
O fato relevante é que o governo Lula reafirmou a política econômica her-dada
do governo anterior e, apoiado no melhor desempenho conjuntural do se-tor
externo, deu novo fôlego ao modelo, legitimando-o politicamente e soldan-do
mais fortemente os interesses das diversas frações de classes participantes do
bloco de poder dominante.
No capítulo 4 discute-se o desempenho da economia brasileira durante o go-verno
Lula em perspectiva histórica.As variáveis macroeconômicas analisadas
são: variação da renda real; hiato de crescimento (diferencial entre a variação da
renda no Brasil e no mundo); acumulação de capital (variação da formação bru-ta
de capital fixo); inflação (deflator implícito do PIB); fragilidade financeira do
Estado (relação dívida interna/PIB); e vulnerabilidade externa (relação dívida
externa/exportação).O procedimento metodológico básico consiste em anali-sar
a evolução temporal de cada uma dessas variáveis ao longo da história da
República (1890-2006) e avaliar o desempenho econômico segundo os man-
24 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
24. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 25
datos presidenciais.Desde o início da República, o país teve 28 presidentes, com
trinta mandatos, visto que até 2006 somente dois (GetúlioVargas e Fernando
Henrique Cardoso) tiveram mais de um mandato.O segundo mandato de Lu-la
inicia-se em 2007 e não está contemplado na análise.
No período 1890-2006, a renda real do Brasil cresce à taxa média anual de
4,5%.Durante o governo Lula (2003-2006) a taxa média anual de crescimento
real do PIB é de 3,3%, ou seja, é inferior a 3/4 da taxa de crescimento de lon-go
prazo.No conjunto de trinta mandatos na história da República, o governo
Lula está na nona pior posição.Assim, pelos padrões históricos brasileiros, o pe-ríodo
do primeiro mandato de Lula caracteriza-se pelo pífio desempenho do
crescimento da renda.
O hiato de crescimento expressa a diferença entre a taxa de crescimento do
PIB brasileiro e a taxa de crescimento do PIB mundial. Ele indica a velocidade
com que o país está encurtando a diferença entre seu nível de renda e o nível
médio da renda mundial.O hiato secular de crescimento da economia brasilei-ra
(média do período 1890-2006) é de 1,2%, que é o diferencial entre a taxa
média anual de crescimento econômico de longo prazo do Brasil (4,5%) e a ta-xa
média anual de crescimento de longo prazo da economia mundial (3,2%).
No período do governo Lula,o hiato médio anual é negativo (-1,5%), pois a eco-nomia
brasileira cresce à taxa média anual de 3,3%, que é menor do que a taxa
de crescimento da economia mundial (4,9%). Levando em conta os mandatos
presidenciais, constata-se que o governo Lula ocupa a 27ª pior posição. Somen-te
outros três presidentes (Floriano,Collor e Castelo Branco) tiveram desempe-nhos
inferiores.A evidência é conclusiva: o Brasil “anda para trás” durante o go-verno
Lula, pois há hiato de crescimento negativo, ou seja, a economia brasilei-ra
cresce a taxas significativamente menores do que a economia mundial. O
desempenho de Lula consegue ser pior do que o desempenho dos dois manda-tos
de Fernando Henrique Cardoso.
No que se refere à acumulação de capital, a taxa média de crescimento real
da formação bruta de capital fixo (FBCF) no Brasil é de 4,2% no período 1890-
2006.Durante o governo Lula, a taxa média anual de variação da FBCF é 3,5%,
abaixo da taxa média histórica. Comparativamente aos outros presidentes, Lula
mostra desempenho insatisfatório: está na décima primeira pior posição.
A taxa média de inflação é de 15,7% no período republicano, se for excluído
o período de alta inflação (1984-1994), e de 138,4% se esse período for consi-
A economia política do governo Lula 25
25. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 26
derado.Durante o governo Lula, a taxa média de inflação (8,7%) é muito infe-rior
à taxa média da história da República.Não resta dúvida de que esse gover-no
tem sido bem-sucedido no combate à inflação. Somente outros onze presi-dentes
lograram manter a inflação em níveis inferiores ao da taxa observada em
2003-2006.
Na história da República, a relação média dívida pública interna/PIB é de
7,5%. No período 2003-2006 a relação dívida interna/PIB mostra tendência
crescente e atinge o mais alto nível de endividamento público da história do
Brasil (Império e República).A relação chega a 45% em 2006. Pelos padrões
históricos brasileiros, o governo Lula é responsável pela mais alta relação dívida
interna/PIB da história do país.
A análise da vulnerabilidade externa concentrou-se na relação dívida exter-na/
exportação de bens, tendo em vista as limitações de dados para um perío-do
histórico tão longo.A média dessa relação é de 203% no período 1890-
2006. Durante o governo Lula essa relação se reduz à metade entre 2002
(365%) e 2006 (181%). São números bastante significativos e mostram um de-sempenho
muito favorável, permitindo que Lula ocupe a nona melhor posi-ção
no conjunto dos presidentes. Como discutido no capítulo 2, o governo
Lula tem se beneficiado de uma conjuntura internacional extraordinariamen-te
favorável.
Os indicadores macroeconômicos mostram que, pelos padrões históricos
brasileiros, o governo Lula tem desempenho medíocre ou desfavorável quan-to
ao crescimento econômico, ao hiato de crescimento, à acumulação de capi-tal
e às finanças públicas. Por outro lado, tem desempenho favorável no con-trole
da inflação e na redução do nível de endividamento externo.A aprecia-ção
geral do desempenho do governo Lula é feita com base no Índice de
Desempenho Presidencial (IDP).A metodologia de cálculo desse índice é apre-sentada
no Anexo II.
O IDP médio de Lula (43,8) é o quarto mais baixo, sendo inferior à média
(57,5) e à mediana (58,7) do conjunto de presidentes brasileiros.Ou seja, no que
se refere ao desempenho da economia brasileira, Lula é o quarto pior presiden-te
da história da República. Somente os governos Sarney, Cardoso (segundo
mandato) e Collor têm desempenho pior.
No Anexo III há o cálculo dos índices de desempenho dos governos no pe-ríodo
republicano com base na técnica de Análise de Componentes Principais
26 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
26. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 27
(ACP).Os resultados obtidos com aACP confirmam os resultados do IDP. Ade-mais,
quando se “desconta” o efeito da conjuntura econômica internacional a
ACP mostra que os dois piores desempenhos da história republicana são o go-verno
Cardoso (segundo mandato) e o governo Lula.Ou seja,mesmo modelo,
políticas similares, resultados igualmente medíocres.
No capítulo 5 investigam-se a natureza e as principais características da políti-ca
social do governo Lula.O principal argumento é que essa política tem estrei-ta
relação com a política econômica liberal-ortodoxa, legada pelo governo anterior
como uma “herança maldita”,mas mantida e aprofundada pelo novo governo.
A visão dominante sobre políticas sociais restringe o tratamento e a análise das
desigualdades de riqueza e renda e da pobreza, assim como limita as políticas
públicas ao âmbito apenas das classes trabalhadoras e de seus rendimentos. Essa
visão, adotada pelo governo Lula, deixa de fora as causas estruturais desses fenô-menos,
bem como desconsidera os rendimentos do capital, ambos localizados no
âmago das relações entre as classes sociais.
O Banco Mundial é a organização que formulou o conceito restrito de po-breza
que passou a ser adotado internacionalmente, bem como propôs a adoção
de políticas sociais focalizadas.A síntese do debate sobre políticas sociais univer-sais
e políticas sociais focalizadas evidencia a lógica perversa destas últimas.Tais
políticas têm natureza mercantil: concebem a redução da pobreza como um
“bom negócio” e transformam o cidadão portador de direitos e deveres sociais
em consumidor tutelado, por meio da transferência direta de renda. E a seleção,
para que os indivíduos e famílias participem desses programas, subordina-se a
critérios ‘‘técnicos’’ definidos ad hoc, a depender do governo de plantão e do ta-manho
do ajuste fiscal – uma operação ideológica que despolitiza o conflito dis-tributivo.
A crítica da política social do governo Lula destaca sua estreita relação e com-patibilidade
com a política econômica praticada.A política social é a contraface
do ajuste fiscal, isto é, dos elevados superávits primários definidos desde o se-gundo
governo Cardoso e que o governo Lula manteve, estabelecendo metas
ainda mais elevadas.Na realidade, o conteúdo da política social do governo Lu-la,
no essencial, é o mesmo da política social do governo anterior, apesar dos
discursos em contrário, que tentam diferenciá-la – apresentando-a como uma
política (supostamente) articulada a medidas de natureza estrutural de combate
à pobreza.
A economia política do governo Lula 27
27. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 28
A política social do governo Lula, tal como a sua política econômica, é também
de natureza liberal, coerente com o modelo econômico vigente. Serve como po-deroso
instrumento de manipulação política de uma parcela significativa da so-ciedade
brasileira, ao mesmo tempo em que permite um discurso “politicamente
correto”.O principal eixo da atual política social é o Bolsa Família, programa que
resulta em uma política assistencialista, com grande potencial clientelista.
Essa política social combina perfeitamente a flexibilização e precarização do
trabalho com programas focalizados e flexíveis de combate à pobreza.Ambos
regidos pela mesma lógica: o curto prazo, o imediatismo inconseqüente, inter-venções
pontuais e precárias, que, para não se contrapor à “ordem econômica
neoliberal”, subordinam-se ao reino da conveniência, sem mudar e sem intervir
nas causas estruturais dos problemas da sociedade brasileira.
No capítulo 6 evidenciam-se a natureza e a composição do atual bloco de po-der
dominante, bem como a sua relação orgânica com o modelo liberal perifé-rico
e com a política macroeconômica implementados pelo governo Lula. Este,
no fundamental, tem trilhado o mesmo caminho daquele que o precedeu, dan-do
nova legitimidade a um modelo econômico – e à sua política macroeconô-mica
– que, do ponto de vista político, parecia estar em estado terminal no final
do segundo governo Cardoso.
A disputa travada atualmente no Brasil, sobre o nível da taxa de juro e o ta-manho
do superávit fiscal primário,não se resume apenas à melhor forma de ma-nipular,
conjunturalmente, o instrumento usual da política monetária, ou mes-mo
à pertinência ou não de se redefinir o conjunto da política macroeconômi-ca.
Além disso, e mais importante, o que está em jogo é a mudança ou
manutenção do modelo econômico atual, com as suas correspondentes políti-cas
macroeconômicas e sociais.A mudança tem como condição prévia, indubi-tavelmente,
a derrota política do atual bloco de poder dominante.
O transformismo do governo Lula se expressa no prosseguimento da políti-ca
econômica implementada no segundo governo Cardoso, desde a crise cam-bial
de janeiro de 1999, e no reforço do modelo dominante.Lula e a aliança po-lítica
que o elegeu adaptaram as suas ações, o seu programa e a sua política aos
limites da disputa das diversas frações do capital. Eles mantêm em primeiro pla-no
os interesses e a política econômica do capital financeiro.Na mesma linha do
segundo governo Cardoso,o governo Lula também destaca a importância das ex-portações
para a redução da vulnerabilidade externa.
28 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
28. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 29
Durante o governo Lula assiste-se à crise das instituições políticas e de repre-sentação
política (dos sindicatos e partidos). Essa crise decorre tanto do proces-so
objetivo de redefinição da composição da classe trabalhadora como da coop-tação
político-institucional de parcela importante das direções sindicais e parti-dárias.
A crise de representação é fortemente alimentada pelo governo Lula, ao rea-lizar
o amálgama entre governo, partido e sindicato, na mais pura tradição stali-nista
(“fora de lugar”) de aparelhamento do Estado e transformação das organi-zações
de massa em “correias de transmissão” do governo. O comportamento
subserviente da CUT ao governo Lula e a indicação do presidente da entidade
para ocupar o cargo de ministro doTrabalho são exemplos paradigmáticos des-se
fenômeno.
No contexto da dominação financeira, o modelo liberal é incapaz de incor-porar,
mesmo parcialmente, as demandas mais significativas das classes trabalha-doras,
especialmente dos seus segmentos organizados. Portanto, resta ao mode-lo
articular de forma precária e marginal a massa pauperizada e desorganizada,
por meio de políticas sociais focalizadas de caráter assistencialista.
Daí a necessidade do governo Lula controlar politicamente os movimentos so-ciais
e sindical por meio da cooptação – material e ideológica – das suas dire-ções.
O objetivo é reduzir as tensões e impedir a sua autonomia, dificultando, as-sim,
as ações de mobilização e construção de um projeto democrático-popular
alternativo ao do bloco dominante.
Acentua-se a balcanização do Estado brasileiro, que expressa a redução da au-tonomia
relativa do Estado frente aos interesses imediatos dos setores dominan-tes.
Mais especificamente, as distintas frações do capital se apoderam abertamente
de segmentos do aparelho estatal.
Com o governo Lula, o capital financeiro mantém o controle sobre o mi-nistério
da Fazenda e o Banco Central, e, entre outros aspectos, exige a inde-pendência
legal deste último – pois já a conquistou na prática.A partir dessas
duas instituições, o capital financeiro determina a política econômica e con-trola
a execução do Orçamento federal, subordinando as ações do Estado nas
demais áreas.No limite, se necessário, ameaça desestabilizar econômica e po-liticamente
o país.
O agronegócio e os interesses exportadores, por sua vez, apoderam-se do Mi-nistério
da Agricultura e do Ministério do Desenvolvimento, da Indústria e do
A economia política do governo Lula 29
29. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 30
Comércio Exterior.A partir desses órgãos, defendem seus interesses (por exem-plo,
conseguiram aprovar a liberação dos transgênicos na agricultura e obtiveram
medidas compensatórias para o câmbio valorizado).
O governo Lula renovou o patrimonialismo e o empreguismo na relação do
governo com as direções dos partidos que compõem a sua base de apoio e com
os dirigentes sindicais. Os instrumentos são, principalmente, as diretorias dos
fundos de pensão das empresas estatais (Previ,Petrus e Funcef) e os conselhos dos
bancos oficiais.Cargos públicos são ocupados por sindicalistas e funcionários do
Partido dos Trabalhadores, com poder de decisão sobre o direcionamento de
vultosos recursos financeiros.
Não obstante as diferenças, o modus operandi do governo Lula e do PT não
é significativamente distinto daquele do PSDB.No fundamental, a equação é
composta pelas mesmas variáveis: financiamento das campanhas pelo bloco do-minante,
nepotismo e ocupação patrimonialista do Estado, relações fisiológi-cas
como balizador dos acordos e relações utilitaristas com os grandes grupos
econômicos.O diferencial é o uso funcional das políticas assistencialistas.Ao se
agregar o assistencialismo na equação acima, compreende-se o fenômeno do
“lulismo”.
O capítulo 7 destaca as perspectivas para o segundo mandato do governo Lu-la.
Está dividido em quatro seções.A primeira aborda o Programa de Acelera-ção
do Crescimento (PAC) que foi lançado em janeiro de 2007 e inclui diretri-zes
gerais para o futuro. O PAC é um documento híbrido e, definitivamente,
não é um plano de desenvolvimento.A seção chama atenção para a ausência de
mudanças significativas nas diretrizes estruturais do processo de acumulação de
capital fixo e o reforço da dinâmica do modelo liberal periférico.O PAC reve-la,
também, a ausência de mudanças significativas no padrão de gestão macroe-conômica.
Não há razões para perspectivas otimistas.
Na segunda seção discute-se o tema fundamental da distribuição de riqueza
e renda.O argumento central é que a tendência observada a partir de 1998, de
melhora na distribuição pessoal da renda, não reflete mudanças estruturais.Ou
seja, a distribuição funcional da renda, que contrapõe trabalhadores e capitalis-tas,
não se altera.O argumento é verdadeiro tanto para o governo Cardoso quan-to
para o governo Lula.Nessa questão também não há perspectivas otimistas.
O Brasil parece experimentar um processo peculiar em que a melhora da dis-tribuição
pessoal da renda (que exclui, em grande medida, juros e lucros), vem
30 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
30. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 31
acompanhada de uma piora na distribuição funcional da renda (de um lado, sa-lários;
de outro, juros e lucros).Na ausência de sinais evidentes de mudanças no
padrão de acumulação de capital e na gestão macroeconômica, é muito prová-vel
que esse processo peculiar continue avançando no futuro próximo.
A terceira seção trata das perspectivas futuras do Brasil a partir da óptica dos
jovens.Para os autores do livro, é uma óptica fundamental, visto que também so-mos
educadores preocupados com o futuro das novas gerações.A evidência mos-tra
que o Brasil tem índices de violência muito elevados, e a violência atinge,
principalmente, a população mais jovem.Houve aumento do consumo de taba-co,
bebidas alcoólicas, maconha, solventes e cocaína no país no período 2001-
2005, afetando principalmente os jovens.Nos últimos anos, tem crescido signi-ficativamente
a taxa de desemprego entre eles.Há também nítida tendência de
aumento do número de brasileiros que emigram.Durante o governo Lula atin-ge-
se o nível recorde de emigrantes brasileiros para os Estados Unidos, princi-palmente
jovens.Não surpreende a evidência de que os jovens brasileiros este-jam
pessimistas em relação ao futuro.
Na quarta seção chama-se atenção para o fato de que os cenários otimistas pa-ra
o segundo governo Lula (2007-2010) têm em comum a manutenção do con-texto
internacional favorável e das diretrizes da atual política macroeconômica:
metas de inflação; superávit fiscal primário; câmbio flutuante; e liberalização ex-terna.
Esses cenários implicam: taxa de inflação constante; redução gradual da ta-xa
de juro real;manutenção do nível e do processo de apreciação real do câm-bio;
menor grau de restrição dos gastos públicos de investimento; déficits fiscais
decrescentes; redução gradual do superávit das contas de transações correntes do
balanço de pagamentos; redução dos gargalos setoriais na infra-estrutura física;
melhoras marginais na situação social; manutenção da governança e da gover-nabilidade;
continuidade e consolidação do bloco dominante; e estabilidade do
modelo liberal periférico.
A distinção fundamental entre os cenários econômicos otimistas reflete, fun-damentalmente,
diferenças quanto à evolução da economia mundial, da taxa de
investimento da economia brasileira e das restrições na infra-estrutura. Estas são
incertezas críticas, cujo comportamento futuro pode não corresponder às hipó-teses
dos cenários otimistas.Ademais, há outras incertezas críticas que são des-prezadas
pelos otimistas como, por exemplo, governança, governabilidade, ro-bustez
institucional e coesão do bloco dominante.
A economia política do governo Lula 31
31. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 32
O capítulo termina mostrando que, no início do segundo governo Lula, pros-segue
o processo de desarticulação dos campos político-ideológicos, com a ocor-rência
de mais uma série de escândalos envolvendo a base de sustentação do go-verno
e o Congresso Nacional.A pequena política predomina cada vez mais.
Do ponto de vista econômico, o país parece viver mais um miniciclo de oti-mismo.
Mesmo no interior das correntes críticas, o debate e a ação política ten-dem
a se restringir à fiscalização da implementação do PAC, à possibilidade se
obter maiores taxas de crescimento e à dinâmica da relação entre a taxa de juro
e o câmbio. Portanto, o questionamento do modelo liberal periférico e, conse-qüentemente,
do bloco de poder dominante continua, no essencial, ausente do
processo político em curso. Em que pese os sinais de descontentamento e mo-bilização
de alguns segmentos do movimento social, estes estão circunscritos, es-sencialmente,
ao plano econômico-corporativo.
A eventual reversão da atual conjuntura internacional terá impactos decisivos
sobre a dinâmica da economia brasileira. Essa mudança terá um efeito desesta-bilizador
tanto maior quanto mais frágil for a inserção internacional de cada país.
Se e quando isso ocorrer, qualquer que venha a ser o futuro governante do Bra-sil,
as fragilidades do país reaparecerão com toda a força, evidenciando mais uma
vez os limites estruturais do modelo liberal periférico e da sua política macroe-conômica.
32 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
32. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 33
Contexto internacional
A economia brasileira é marcada por forte vulnerabilidade externa nas esferas
monetário-financeira, produtivo-real, tecnológica e comercial.Esta tem sido,his-toricamente,
a principal restrição estrutural ao nosso processo de desenvolvi-mento
econômico.O país tem baixa capacidade de resistência a pressões, fato-res
desestabilizadores e choques externos; ademais, os processos de ajuste a esses
fenômenos implicam alto custo para a sociedade.A conseqüência imediata é que
as estratégias e políticas econômicas, bem como o desempenho da economia,
são determinados, em grande medida, pelo contexto internacional.
Se, por um lado, é verdade que o Brasil tem elevada vulnerabilidade externa
estrutural, por outro, também é verdade que há algum grau de liberdade nas es-tratégias
e políticas de ajuste. Portanto, conjunturas externas desfavoráveis não
significam, necessariamente, um fraco desempenho da economia brasileira.Nes-se
caso funciona o mecanismo desafio-resposta: frente a incertezas, riscos e cus-tos
impostos pela situação internacional, os grupos dirigentes, por razões diver-sas
(inclusive a própria sobrevivência política), adotam políticas de ajuste pró-ati-vas
e eficazes.
Há exemplos históricos relevantes.No primeiro governoVargas, para se pro-teger
dos efeitos causados pela Grande Depressão de 1929 e que se estenderam
pela década de 1930, os grupos dirigentes implementaram estratégias e políticas
que representaram uma ruptura com o modelo herdado da Primeira Repúbli-ca.
No conjunto das medidas mais importantes, vale destacar a renegociação da
dívida externa e o impulso à industrialização. Exemplo mais recente é o do go-verno
Geisel, que por meio do II Plano Nacional de Desenvolvimento, em 1974,
também permitiu melhorar qualitativamente a economia brasileira, a fim de re-duzir
sua vulnerabilidade externa, principalmente, nas esferas comercial, produ-tivo-
real e tecnológica.No entanto, no caso do governo Geisel houve sério er-ro
estratégico: parte do financiamento da acumulação de capital foi baseada no
endividamento externo. Isso implicou o aumento da vulnerabilidade externa fi-
A economia política do governo Lula 33
33. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 34
nanceira do país, que ficou evidente quando a crise da dívida externa eclodiu em
1982.
O principal objetivo deste capítulo é analisar o contexto internacional no pe-ríodo
pós-2002.Trata-se de examinar a situação econômica internacional que,
em suas diferentes esferas, define as condições externas que afetam a dinâmica da
economia brasileira.Esta dinâmica abrange as estratégias, as políticas e o próprio
desempenho da economia nacional.
O ponto de partida da análise é que a conjuntura internacional tem sido par-ticularmente
favorável desde 2003. Muitos especialistas identificam esse fenô-meno
como um“choque externo positivo”.Mas, independentemente das qua-lificações,
o fato é que a situação econômica internacional tem sido muito fa-vorável
em todas as esferas das relações econômicas internacionais, ou seja, nas
esferas comercial, produtivo-real, tecnológica e monetário-financeira.
O capítulo está dividido em três seções. Na primeira apresenta-se evidência
empírica conclusiva a respeito da expansão da economia mundial desde 2003.A
evidência abarca as esferas mencionadas acima, com o exame de indicadores es-pecíficos
para cada uma delas.
Na segunda seção analisa-se a vulnerabilidade externa da economia brasilei-ra
no período 2003-2006, considerando as condições internacionais.O contex-to
internacional favorável tem permitido um progresso generalizado nos indi-cadores
de vulnerabilidade externa conjuntural dos países, inclusive aqueles com
elevada vulnerabilidade externa estrutural da África e daAmérica Latina.O Bra-sil
não é exceção. Portanto, cabe analisar em que medida os indicadores de vul-nerabilidade
externa conjuntural do Brasil melhoram vis-à-vis os indicadores do
resto do mundo. Como houve progresso generalizado, a discussão relevante é
saber se o Brasil tem avanço relativo. O argumento central desta seção é que,
durante o governo Lula a melhora foi determinada exogenamente; em termos
comparativos, não se alterou a vulnerabilidade externa do país.
Considerando que o atual processo de expansão da economia mundial deve-rá
sofrer reversão em algum momento no futuro, é fundamental identificar os
avanços relativos. É estreito e tecnicamente frágil focar a análise exclusivamente
na evolução de indicadores brasileiros sem considerar o contexto internacional.
Subjacente ao enfoque proposto neste capítulo está a seguinte percepção lógi-ca:
os países que não obtêm melhoras relativas na fase ascendente do ciclo in-ternacional
são aqueles que, ceteris paribus, têm mais chances de ser afetados por
34 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
34. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 35
fatores desestabilizadores externos na fase descendente do ciclo. Este parece ser
o caso do Brasil, pois os indicadores de vulnerabilidade externa comparada não
mostram tendência de evolução favorável durante o governo Lula.
A última seção apresenta a síntese da evidência empírica e das principais con-clusões
do capítulo.
O Quadro 1.1 resume os distintos conceitos de vulnerabilidade externa usa-dos
neste capítulo e nos seguintes.
Quadro 1.1
Vulnerabilidade externa: Conceitos
Vulnerabilidade externa é a capacidade de resistência a pressões, fatores desestabili-zadores
e choques externos.
Vulnerabilidade externa conjuntural é determinada pelas opções e custos do processo
de ajuste externo. A vulnerabilidade externa conjuntural depende positivamente das op-ções
disponíveis e negativamente dos custos do ajuste externo. Ela é, essencialmente,
umfenômeno de curto prazo.
Vulnerabilidade externa estrutural decorre das mudanças relativas ao padrão de co-mércio,
da eficiência do aparelho produtivo, do dinamismo tecnológico e da robustez
do sistema financeiro nacional. A vulnerabilidade externa estrutural é determinada, prin-cipalmente,
pelos processos de desregulamentação e liberalização nas esferas comer-cial,
produtivo-real, tecnológica emonetário-financeira das relações econômicas inter-nacionais
do país. Ela é, fundamentalmente, umfenômeno de longo prazo.
Vulnerabilidade externa comparada é dada pelo desempenho externo relativo de deter-minado
país comparativamente ao desempenho externo relativo de outros países. Ela
expressa a comparação entre países do diferencial relativo de indicadores de inserção
econômica internacional.
Fonte: Elaboração própria.
1. Ciclo internacional favorável
Nesta seção apresenta-se evidência empírica a respeito da evolução da eco-nomia
mundial nas esferas produtivo-real, comercial, monetário-financeira e
tecnológica.
A economia política do governo Lula 35
35. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 36
1.1 Esfera produtivo-real
A taxa secular de crescimento real da renda mundial – taxa média no período
1890-2006 – é 3,2%, e no mesmo período a mediana das taxas de crescimento
anual é 3,8%.Durante o governo Lula (2003-2006) a taxa média de crescimen-to
real da renda mundial foi de 4,9%. Portanto, na esfera produtivo-real, a eco-nomia
mundial tem tido, no período 2003-2006, um desempenho muito supe-rior
à sua média e mediana desde 1890.Ou seja, o contexto internacional tem
sido muito favorável: no período 2003-2006, a taxa de crescimento econômico
real foi 50% maior do que a média histórica. Com a taxa secular, a economia
mundial duplicava a renda mundial em 22 anos, enquanto com a taxa média do
período 2003-2006 a duplicação ocorre em 14 anos.
Conjuntura econômica tão favorável já ocorreu em outros momentos histó-ricos:
segunda metade da década de 1920; segunda metade da década de 1930;
Segunda Guerra Mundial; início da década de 1950 até o final da de 1970; e de
meados da década de 1990 até o momento atual.O comportamento cíclico da
economia mundial é mostrado no Gráfico 1.1.
Gráfico 1.1
PIBmundial, var. %,média móvel quadrienal: 1890-2006
10
8
6
4
2
0
-2
-4
-6
1890
1894
1898
1902
1906
1910
1914
1918
1922
1926
1930
1934
1938
1942
1946
1950
1954
1958
1962
1966
1970
1974
1978
1982
1986
1990
1994
1998
2002
2006
Fonte: Maddison (1991, Tabela 4.7) e FMI, World Economic Outlook, Database.
36 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
36. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 37
Quando se considera a ampliação da capacidade produtiva, também fica evi-dente
o dinamismo da esfera produtivo-real.O crescimento é robusto na medi-da
em que a taxa de investimento na economia mundial cresceu continuamen-te
a partir de 2003, como mostra o Gráfico 1.2.Esta taxa aumenta de 20,8% em
2002 para 22,8% em 2006.O gráfico mostra, ainda, a forte correlação entre a ta-xa
de crescimento do PIB e a taxa de investimento na economia mundial, bem
como a tendência de elevação dessas taxas a partir, principalmente, de 2003.
Gráfico 1.2
PIB e investimento na economia mundial: 1999-2006
6,0
5,0
4,0
3,0
2,0
1,0
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
23,0
22,5
22,0
21,5
21,0
20,5
20,0
A expansão da produção e da renda gera volumes crescentes de excedente
econômico que são usados para expandir a capacidade global de produção.Tra-ta-
se, de fato, do avanço do processo de globalização produtivo-real. Portanto, a
elevação do volume de investimentos não expressa somente o dinamismo das
economias domésticas.A evidência apresentada no Gráfico 1.3 aponta para o
crescimento do investimento externo direto a partir de 2003 e sua forte relação
com a taxa média de investimento da economia mundial. Portanto, o processo
de acumulação de capital também ocorre em escala global por meio do avanço
do processo de internacionalização da produção via compra de ativos produti-vos
no exterior, principalmente, por parte das grandes empresas internacionais
(empresas transnacionais).
A economia política do governo Lula 37
0,0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
19,5
PIB, var. % Investimento (% do PIB)
37. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 38
Gráfico 1.3
Taxa de investimento e investimento externo direto: 1999-2006
23,0
22,5
22,0
21,5
21,0
20,5
20,0
19,5
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Fonte: UNCTAD-WIR (2006).
1600
1400
1200
1000
800
600
400
200
Há inúmeras causas do atual ciclo de expansão da economia mundial.A mais
importante refere-se ao dinamismo das “locomotivas” do sistema econômico in-ternacional,
a saber, Estados Unidos e China.
Os Estados Unidos têm tido crescimento médio real do PIB de 3,2% no pe-ríodo
2003-2006, próximo da sua taxa média secular (3,3%).No entanto, o efei-to
“locomotiva” dos Estados Unidos, que responde por 20% do PIB mundial
(conceito paridade do poder de compra, PPP), decorre da natureza das suas po-líticas
macroeconômicas e do seu impacto sobre o restante da economia mun-dial.
No período em questão, as políticas monetária e fiscal têm sido expansio-nistas,
embora a tendência tenha sido reduzir o grau de expansionismo dessas po-líticas.
Em 2001-2002, a economia dos Estados Unidos teve fraco desempenho.
Havia riscos de profundo ciclo recessivo.O governo, então, por meio de políti-cas
expansionistas, decidiu retirar a economia dessa trajetória. Isto significou, na
prática, a redução da taxa de juro e o aumento dos gastos públicos.
A taxa de juro básica nos Estados Unidos foi reduzida do nível médio de 6,4%
em 2000 e chegou a 1% em 2003. Os gastos públicos cresceram: o saldo fiscal
do governo central (como proporção do PIB) saiu do superávit de 2,0% em
2000 para o déficit de 4,8% em 2003.Revertido o ciclo recessivo de 2001-2002,
a taxa de juro aumentou continuamente a partir de 2003 até chegar a 5% em
38 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
0
Investimento (% do PIB) Investimento externo direto, entradas US$ bilhões
38. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 39
2006.O déficit fiscal do governo central reduziu-se para 2,6% em 2006.Por ou-tro
lado, a relação entre a dívida pública líquida (governo central) e o PIB au-mentou
de 41,1% em 2003 para 43,4% em 2006.
O “efeito locomotiva” dos Estados Unidos se transmite internacionalmente
por meio do déficit das contas de transações correntes do balanço de pagamen-tos
do país.Esse déficit aumentou continuamente, de US$ 472 bilhões em 2002
para US$ 857 bilhões em 2006. Como proporção do PIB, o déficit passou de
4,5% em 2002 para 6,5% em 2006. Ele tem um efeito multiplicador não des-prezível
sobre o conjunto da economia mundial.
Além das políticas macroeconômicas expansionistas, a dinâmica da economia
estadunidense também tem sido determinada, na esfera financeira, pelo “efeito
riqueza”. Esse efeito é provocado pela elevação dos preços das ações e dos ati-vos
reais (imóveis). O aumento desse tipo de riqueza induz maiores gastos de
consumo e investimentos na economia estadunidense.
A taxa de investimento nos Estados Unidos mostra nítida tendência de alta no
período 2003-2006. Essa taxa aumenta continuamente de 18,4% em 2003 para
20,0% em 2006.O aumento do investimento, por seu turno, expressa o dinamis-mo
tecnológico estadunidense, principalmente na indústria de computadores. Os
avanços nessa indústria têm se disseminado pelo conjunto da economia, e uma das
conseqüências é o aumento de produtividade,que permite o aumento da produção
com menor intensidade no uso de fatores de produção, especialmente o trabalho.
O“efeito locomotiva” da China decorre, fundamentalmente, da sua “veloci-dade”
e do seu crescente peso relativo na economia mundial.Atualmente, a eco-nomia
chinesa responde por 15% do PIB (PPP) mundial. No período 2003-
2006, a economia chinesa cresceu à taxa média anual de 10,3%.Vale destacar
que as taxas anuais são continuamente crescentes no período. Em 2003, a taxa
foi de 10,0%; em 2006, chegou a 10,7%.
O principal fator determinante da expansão chinesa é a elevada taxa de in-vestimento,
que tem crescido continuamente nos últimos anos.A relação média
entre a formação bruta de capital fixo e o PIB é de 40%.O dinamismo da eco-nomia
chinesa decorre, ainda, da sua enorme competitividade internacional.
No que se refere aos países desenvolvidos da Europa e ao Japão, as políticas fis-cais
e monetárias expansionistas também têm provocado melhora no desempe-nho
econômico em 2003-2006 comparativamente ao desempenho observado na
década de 1990.
A economia política do governo Lula 39
39. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 40
A expansão das “locomotivas” também tem se transmitido internacionalmente
por meio do comércio.A exportação tem sido importante fonte de expansão da
renda, principalmente, em países da Ásia.Um dos destaques é a Índia, que tem
tido elevadas taxas de crescimento econômico nos últimos anos.
Na realidade, a expansão do comércio mundial é, ao mesmo tempo, causa e
conseqüência da expansão da produção. O crescimento da demanda por im-portações,
principalmente, dos Estados Unidos e da China, tem sido importan-te
fonte de expansão das exportações e, portanto, da renda em escala global.
A economia mundial tem tido elevadas taxas de crescimento com taxas rela-tivamente
baixas de inflação, como mostra o Gráfico 1.4.De fato, há importan-tes
transformações estruturais que têm tido impacto global (Filgueiras, 2003, cap.
1).O aumento da produtividade, o acirramento da concorrência internacional,
a liberalização comercial e financeira, a desregulamentação do mercado de tra-balho
e os fluxos migratórios têm sido os fatores determinantes da reduzida pres-são
inflacionária nos últimos anos.
Gráfico 1.4
Inflaçãomédia mundial, IPC (%): 1999-2006
12,0
10,0
8,0
6,0
4,0
2,0
0,0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
2,0
1,8
1,6
1,4
1,2
1,0
0,8
0,6
0,4
0,2
A taxa média de inflação mundial (preços ao consumidor) se estabilizou em
torno da média de 3,7% no período 2003-2006.No caso dos países desenvolvi-dos,
a taxa média de inflação tem sido da ordem de 1,9%, enquanto para os paí-
40 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
0,0
Países em desenvolvimento, média
Países em desenvolvimento, mediana
Países desenvolvidos, média (eixo da direita)
40. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 41
ses em desenvolvimento as médias e as medianas das taxas de inflação têm osci-lado
em torno de 5,5%. Essa estabilidade ocorre apesar da significativa elevação
dos preços das commodities internacionais a partir de 2003.
1.2 Esfera comercial
A atual fase ascendente do ciclo da economia mundial caracteriza-se pelo cres-cimento
do volume de comércio exterior e pela elevação dos preços interna-cionais,
como mostra o Gráfico 1.5.De fato, acelerou-se o processo de interna-cionalização
da produção via comércio mundial, pois o crescimento real das ex-portações
é superior ao crescimento real do PIB mundial em todos os anos do
período em questão.
Gráfico 1.5
Comérciomundial de bens, var. %: 1999-2006
14
12
10
8
6
4
2
0
-2
-4
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
A pressão dos preços internacionais não é desprezível, especialmente no caso
do petróleo e de outras commodities, como mostra o Gráfico 1.6. No período
2003-2006 o petróleo acumula elevação de preços superior a 150%, enquanto
as outras commodities acumulam aumentos de preços de 80%.A aceleração dos
preços internacionais abrange também os manufaturados, que acumularam au-mentos
de preços de 35% no período em questão.
A economia política do governo Lula 41
-6
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Volume Preços US$ PIB, var. %
41. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 42
Gráfico 1.6
Preços internacionais, var. %: 1999-2006
70
60
50
40
30
20
10
0
-10
-20
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
O determinante mais importante da elevação dos preços internacionais tem
sido a pressão de demanda decorrente das elevadas taxas de crescimento da ren-da.
Ademais, cabe destacar a crescente importância da China na economia mun-dial
e sua demanda por matérias-primas e produtos agrícolas. Em 2005, a Chi-na
foi responsável por 7,3% do valor das exportações mundiais de bens (tercei-ro
lugar, depois da Alemanha e dos Estados Unidos) e 6,1% do valor das
importações mundiais de bens.Ou seja, ao se tornar um“país grande”, as taxas
extraordinariamente elevadas de investimento e crescimento econômico chine-sas
exigem volumes crescentes de insumos – principalmente, produtos primários
– que são comprados no mercado internacional.
Naturalmente, há fatores específicos que explicam o comportamento dos pre-ços
internacionais de cada uma das commodities. Por exemplo, no caso do petróleo
há inúmeras incertezas críticas que, de uma forma ou de outra, afetaram ou conti-nuam
a influenciar a formação de preços desta commodity.Entre estes fatores podem
ser destacados: pressão de demanda (Estados Unidos e China); conflito na Rússia;
guerra no Iraque; sabotagem naVenezuela e na Nigéria; risco de sabotagem naArá-bia
Saudita; apreciação do dólar; especulação; estoques baixos nos países consumi-dores;
baixa capacidade ociosa; atuação da OPEP; e catástrofes naturais.
42 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
Manufaturados Petróleo Commodities, excl. petróleo
42. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 43
1.3 Esfera monetário-financeira
O dinamismo da economia mundial gerou aumento do excedente econômico,
que se materializou na expansão dos investimentos em escala global.No entan-to,
esse excedente também se orienta para aplicações financeiras internacionais.
Têm crescido o nível de liquidez internacional (quantidade de ativos monetá-rios)
e a quantidade de ativos financeiros negociados internacionalmente.
O fator determinante do aumento da liquidez internacional é, sem dúvida, o
chamado “déficit gêmeo” dos Estados Unidos, ou seja, o déficit das contas ex-ternas
e o déficit das contas públicas.O resultado é que o restante da economia
mundial encontra-se frente a uma situação de “excesso de dólares”.Não é por
outra razão que, por exemplo, o dólar se desvalorizou 30% em relação ao euro
entre 2002 e 2006.De fato, a contrapartida do aumento do déficit de transações
correntes dos Estados Unidos é a diminuição deste mesmo déficit no resto do
mundo, como mostra o Gráfico 1.7.
Gráfico 1.7
Déficit na conta corrente do balanço de pagamentos, % do PIB: 1997-2006
7
6
5
4
3
2
1
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
A evidência da expansão da liquidez internacional é dada pelo volume de re-servas
internacionais mundiais. Essas reservas mais do que duplicam entre 2002
e 2006: passam de US$ 2,4 trilhões no final de 2002 para US$ 4,9 trilhões em
2006, como mostra o Gráfico 1.8.A relação entre as reservas internacionais e o
PIB mundial aumentou continuamente, de 10,9% em 2002 para 14,1% em 2006.
A economia política do governo Lula 43
0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Média mundial Estados Unidos
43. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 44
Gráfico 1.8
Reservas internacionais: 1999-2006
16
14
12
10
8
6
4
2
0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
6000
5000
4000
3000
2000
1000
A conjuntura financeira internacional é especialmente favorável para os países em
desenvolvimento que têm problemas estruturais de vulnerabilidade externa.A me-lhora
dos indicadores de vulnerabilidade financeira externa é generalizada e con-tínua
ao longo do período 2003-2006.O saldo da conta corrente do balanço de
pagamentos desses países aumenta de US$ 77 bilhões em 2002 para US$ 544 bi-lhões
em 2006, como mostra o Gráfico 1.9.A melhora do saldo global das contas
externas permitiu que as reservas internacionais desses países praticamente tripli-cassem,
passando de US$ 1.075 bilhões em 2002 para US$ 3.019 bilhões em 2006.
Gráfico 1.9
Países em desenvolvimento, contas externas (US$ bilhões): 1999-2006
600
500
400
300
200
100
0
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
44 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
0
Reservas internacionais mundiais / PIB mundial (%), excl. EUA
Reservas internacionais mundiais, Total, US$ bilhões (excl. EUA)
-100
3500
3000
2500
2000
1500
1000
500
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 0
Saldo em conta corrente do balanço de pagamentos
Reservas internacionais
44. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 45
Indicadores relativos também apontam para a redução da vulnerabilidade fi-nanceira
conjuntural dos países em desenvolvimento, como mostra o Gráfico
1.10.A relação entre as reservas internacionais e as importações de bens e servi-ços
aumenta de 55,3% em 2002 para 71,4% em 2006.Ademais, verifica-se sig-nificativo
processo de desendividamento externo ao longo do período.A rela-ção
entre a dívida externa e a exportação de bens e serviços reduziu-se de 119%
em 2002 para 67% em 2006.Vale destacar que essas tendências abarcam movi-mentos
contínuos dos indicadores ao longo do período em questão.
Gráfico 1.10
Países em desenvolvimento, indicadores das contas externas (%): 1999-2006
80
70
60
50
40
30
20
10
Fonte: FMI, World Economic Outlook, Database.
180
160
140
120
100
80
60
40
20
A melhora dos indicadores tem como conseqüência a redução da percepção
de risco a respeito dos países em desenvolvimento.A queda do risco-país é ge-neralizada.
O indicador mais evidente desse processo é o spread dos títulos dos
países em desenvolvimento negociados no mercado financeiro internacional.O
spread é o diferencial entre a taxas de juros efetivas dos títulos desses países e as
taxas dos títulos correspondentes emitidos pelo governo dos Estados Unidos.A
partir de 2003 há queda praticamente contínua dos spreads do conjunto dos cha-mados
mercados emergentes, como mostra o Gráfico 1.11. Essa queda também
ocorre nos países daAmérica Latina que, de modo geral, são considerados de al-to
risco, inclusive o Brasil.
A economia política do governo Lula 45
0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
0
Reservas internacionais / Importações de bens e serviços (%)
Dívida externa / Exportações de bens e serviços (%)
45. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 46
Gráfico 1.11
Spreads dos títulos dosmercados emergentes: 1998-2006
1800
1600
1400
1200
1000
800
600
400
200
0
01/02/1998
06/17/1998
Fonte: JP Morgan.
12/01/1998
05/17/1999
10/28/1999
04/12/2000
09/25/2000
Os indicadores acima mostram, de forma conclusiva,que a situação econômica
internacional na esfera monetário-financeira também tem sido muito favorável,
principalmente, para os países em desenvolvimento.
1.4 Esfera tecnológica
O progresso técnico, ancorado nas indústrias de informática e telecomunicações,
continua a ser fator determinante na trajetória de crescimento de longo prazo da
economia mundial.Os indicadores mostrados no Gráfico 1.12 envolvem aplicações
de patentes, pagamentos de royalties e licenças, e gastos com pesquisa e desenvolvi-mento
tecnológico.Ainda que tais indicadores não sejam tão robustos, a evidência
disponível aponta para a continuação do dinamismo tecnológico.
46 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
03/12/2001
08/22/2001
02/12/2002
07/26/2002
01/10/2003
06/25/2003
12/09/2003
05/24/2004
11/04/2004
04/21/2005
10/03/2005
03/21/2006
08/31/2006
Spread - EMBI Spread - EMBI América Latina
46. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 47
Gráfico 1.12
Indicadores de progresso técnico: 1999-2005
1400
1200
1000
800
Fonte: Banco Mundial. World Development Indicators Online.
2,30
2,25
2,20
2,15
2,10
2,05
2. Vulnerabilidade externa
A análise da seção anterior apresenta evidência conclusiva acerca da conjuntura
econômica internacional extraordinariamente favorável a partir de 2003. Essa
situação abarca todas as esferas das relações econômicas internacionais.A evi-dência
também assinala a melhora generalizada da situação econômica dos paí-ses
em desenvolvimento, especialmente no que diz respeito aos indicadores de
inserção no sistema econômico internacional.Mais especificamente, a atual fa-se
ascendente do ciclo da economia internacional tem causado a melhora dos in-dicadores
conjunturais de vulnerabilidade externa dos países em desenvolvi-mento.
A questão da vulnerabilidade externa é fundamental para se entender a evo-lução
da economia brasileira (Carcanholo, 2005).Os temas do padrão de inser-ção
internacional e da vulnerabilidade externa estrutural do Brasil são analisa-dos
em maiores detalhes no capítulo 2.Nesta seção, avalia-se a vulnerabilidade
externa do Brasil comparativamente à do resto do mundo.O período de análi-se
é 1995-2006,pois se pretende, também, fazer a análise comparativa entre o go-verno
Lula e o governo Cardoso.Durante o governo Lula há progresso nos in-dicadores
de vulnerabilidade externa conjuntural da economia brasileira.Na rea-lidade,
vale ressaltar, esse progresso também acontece no conjunto da economia
mundial.O argumento central desta seção é que, quando se descontam os efei-tos
da conjuntura internacional extraordinariamente favorável, chega-se à con-
A economia política do governo Lula 47
600
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
2,00
Patentes aplicações, residentes
Royalties e licenças, pagamentos(US$milhões)
Pesquisa e desenvolvimento, gastos (% PIB)
47. clusão que a vulnerabilidade externa da economia brasileira no período 2003-
2006 não é menor do que no período 1995-2002.
2.1 Vulnerabilidade externa comparada
A vulnerabilidade externa é a capacidade de resistência a pressões, fatores desesta-bilizadores
e choques externos.A vulnerabilidade externa conjuntural é determina-da
pelas opções e custos do processo de ajuste externo.A vulnerabilidade externa
conjuntural depende positivamente das opções disponíveis e negativamente dos
custos do ajuste externo. Ela é, essencialmente, um fenômeno de curto prazo.A
vulnerabilidade externa comparada é dada pelo desempenho externo relativo de de-terminado
país, comparativamente ao desempenho externo relativo de outros
países. Ela expressa a comparação entre países do diferencial relativo de indica-dores
de inserção econômica internacional.
Em raros momentos da história republicana a economia brasileira defrontou-se
com uma conjuntura internacional tão favorável quanto aquela que se iniciou
em 2003. Somente nos mandatos de Café Filho (1955),Castelo Branco (1964-
66) e Garrastazu Médici (1970-73) a conjuntura internacional foi mais favorá-vel
do que no governo Lula, como mostra o Gráfico 1.13.Nesse gráfico, a taxa
média de crescimento do PIB mundial nos períodos de mandato presidencial é
usada como referência para o dinamismo da economia internacional.
Gráfico 1.13
PIBmundial, var. % segundo omandato presidencial: 1890-2006
7
6
5
4
3
2
1
Fonte: Elaboração própria. Ver Anexo II.
48 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
Lula
0
Afonso Pena
Washington Luís
Epitácio Pessoa
Hermes da Fonseca
Dutra
Floriano
Deodoro
Collor
Figueiredo
Venceslau Brás
Vargas I
Campos Sales
Itamar
FHC II
Juscelino
Prudente de Morais
FHC I
Geisel
Nilo Peçanha
Rodrigues Alves
Sarney
Jânio
Artur Bernardes
Costa e Silva
Vargas II
Goulart
Lula
Médici
Castelo Branco
Café Filho
a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 48
48. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 49
A conjuntura econômica internacional foi menos favorável durante o gover-no
Cardoso do que durante o governo Lula.A taxa média anual de crescimen-to
do PIB mundial foi de 3,7% em 1995-98, 3,5% em 1999-2002 e 4,9% em
2003-2006.Nesses três momentos, as taxas foram superiores à taxa secular (1890-
2006) de crescimento da economia mundial (3,2%).No que se refere ao perío-do
1995-2002, houve fatores desestabilizadores externos que afetaram negativa-mente
o Brasil.No entanto, países em desenvolvimento, que sofreram os efeitos
desses mesmos fatores, apresentaram resultados bem superiores aos do Brasil.A
diferença fundamental é que esses países escolheram e foram capazes de imple-mentar
políticas de ajuste distintas das que são recomendadas pelo FMI e pela
ortodoxia.
No período 2003-2006 houve dois fatos relevantes: (i) diminuição dos indi-cadores
conjunturais de vulnerabilidade externa do Brasil; e (ii) este fenômeno
é generalizado para o conjunto da economia mundial.Ou seja, a redução da vul-nerabilidade
externa conjuntural é determinada, principalmente, por variáveis
exógenas.
A análise comparativa da vulnerabilidade externa da economia brasileira, rea-lizada
nesta seção, utiliza três indicadores convencionais.O primeiro é a relação
entre o saldo da conta corrente do balanço de pagamentos e o PIB. Este indica-dor
é o mais freqüentemente usado para se avaliar as condições das contas ex-ternas
de cada país.Alguns analistas apontam limites “críticos” para esse coefi-ciente,
que não devem ser ultrapassados (por exemplo, déficit máximo de 3%).
Porém, não há qualquer fundamentação científica para tal procedimento.
O segundo é a relação entre as reservas internacionais brutas e o valor mé-dio
mensal das importações CIF de bens.Este indicador informa quantos me-ses
de importação são garantidos, ceteris paribus, pelas reservas internacionais.
Segundo relatório do FMI (2000, p. 6) este indicador é útil para se medir vul-nerabilidade
externa, principalmente, no caso de países com acesso limitado
ao financiamento internacional.Da mesma forma que no indicador mencio-nado
acima, aqui também não há qualquer nível crítico que seja cientifica-mente
recomendado.
O terceiro indicador é o grau de abertura comercial, ou seja, a relação entre
as exportações de bens FOB e o PIB. Estudo recente do staff do Banco Mun-dial
(Loayza e Raddatz, 2006) conclui que o grau de abertura é determinante es-trutural
da vulnerabilidade externa na medida em que este grau está significati-
A economia política do governo Lula 49
49. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 50
vamente relacionado com o impacto da deterioração dos termos de troca sobre
a renda.Generalizações a respeito de “alto” ou “baixo” grau de abertura também
têm pouca fundamentação científica quando se desconsideram variáveis estru-turais
relevantes, como o tamanho do país, a disponibilidade de recursos natu-rais
e o dinamismo do mercado interno.
Neste capítulo não se usa um dos indicadores mais relevantes de vulnerabili-dade
externa (dívida externa/exportação), embora ele seja usado no capítulo 4
para se analisar a evolução da vulnerabilidade externa do Brasil ao longo do tem-po.
A razão é a falta de dados internacionais para um conjunto representativo de
países.Assim, a disponibilidade de uma série histórica para o Brasil (1890-2006)
permite que esse indicador seja utilizado para analisar a evolução da vulnerabi-lidade
externa do país ao longo da sua história. Porém, a falta de dados interna-cionais
impede que esse indicador seja usado na análise da vulnerabilidade ex-terna
do Brasil comparativamente a outros países.
O procedimento metodológico desta seção consiste na análise da evolução
dos indicadores mencionados, bem como no cálculo de índices de vulnerabili-dade
externa comparada (IVEC) para cada um desses indicadores. Em seguida,
calcula-se o IVEC geral, que é a média simples dos índices de vulnerabilidade
para cada uma das variáveis.
O IVEC é uma variável reduzida com intervalo de zero (vulnerabilidade nu-la)
a 100 (vulnerabilidade máxima) (Gonçalves, 2005, capítulo 4). Em cada ano
o IVEC do Brasil para cada indicador é calculado como a diferença entre o va-lor
deste indicador para o Brasil e o valor mínimo do indicador para todos os paí-ses
do mundo como proporção da diferença entre o valor máximo e o valor mí-nimo
do indicador para todos os países do mundo. No Anexo I encontra-se a
descrição do cálculo dessa variável reduzida.
ATabela 1.1 apresenta as médias das variáveis macroeconômicas para o Bra-sil
e o conjunto da economia mundial no período 1995-2006.
50 Luiz Filgueiras | Reinaldo Gonçalves
50. a_LULA_intr_cap1e2 rev:Layout 1 31/10/07 5:05 PM Page 51
Tabela 1.1
Indicadores de vulnerabilidade externa, Brasil emundo: 1995-2006
Saldo de transações Reservas internacionais /
correntes do balanço Importações de bens Exportações de bens
de pagamentos (% PIB) CIF,mensal (%) FOB / PIB (%)
Brasil Mundo Brasil Mundo Brasil Mundo
1995 -2,4 -4,2 11,1 4,3 6,0 27,1
1996 -2,8 -4,7 12,4 4,6 5,7 27,2
1997 -3,5 -4,3 9,7 4,7 6,1 27,5
1998 -4,0 -5,7 8,4 4,8 6,1 27,4
1999 -4,3 -3,7 8,1 5,0 8,2 27,9
2000 -3,8 -2,0 6,6 4,9 8,5 31,2
2001 -4,2 -3,1 7,3 5,1 10,5 30,8
2002 -1,5 -2,9 9,1 5,9 11,9 30,9
2003 0,8 -2,2 11,6 6,0 13,2 31,6
2004 1,8 -2,1 9,5 5,8 14,5 33,6
2005 1,6 -2,5 8,3 5,8 13,4 34,3
2006 1,3 -2,1 10,7 5,7 12,9 36,4
Fontes: Banco Mundial. World Development Indicators Online. FMI, World Economic Outlook Database, abril 2007.
O primeiro indicador é a relação entre o saldo da conta corrente do balanço
de pagamentos e o PIB (doravante chamado de indicador BOP).Para o conjunto
da economia mundial, o BOP mostra tendência de elevação do déficit até 1999
e de redução do déficit a partir desse ano. No caso da economia brasileira, o
BOP mostra nítida tendência de aumento do déficit ao longo do período 1995-
99, que se estabilizou nos três anos seguintes.A partir de 2003 surge uma ten-dência
de melhora desse indicador, que passou de déficit (-1,5%) em 2002 para
superávit (1,3%) em 2006. Portanto, não há dúvida de que no período 2003-
2006 houve progresso do BOP tanto para o Brasil como para o conjunto da
economia mundial.Ou seja, o Brasil acompanha a tendência internacional de re-dução
da vulnerabilidade externa informada por esse indicador.
O segundo indicador é a relação entre as reservas internacionais brutas e o va-lor
médio mensal das importações CIF de bens (RIM).Para o conjunto da eco-nomia
mundial observa-se pequena tendência de aumento do RIM até 2003 e
certa estabilidade a partir de então.No caso do Brasil, há tendência de queda do
A economia política do governo Lula 51