3. tenreiro@mat.uc.pt
Nota pr´via
e
Os presentes apontamentos tˆm por base o curso de Medida
e
e Integra¸˜o leccionado no primeiro semestre dos anos lectivos de
ca
1998/99, 1999/00 e 2000/01, a alunos do Ramo Cient´ ıfico, especi-
aliza¸˜o em Matem´tica Pura, do terceiro ano da licenciatura em
ca a
Matem´tica da Universidade de Coimbra.
a
Na elabora¸˜o deste texto, tal como na lecciona¸˜o do curso, as-
ca ca
sumimos, naturalmente, que o estudante tem conhecimentos s´lidoso
´
sobre as mat´rias leccionadas nas disciplinas de Algebra Linear e de
e
An´lise Infinitesimal dos dois primeiros anos da licenciatura. De en-
a
tre estas, real¸am-se as relativas ao integral de Riemann, quer num
c
contexto univariado quer multivariado. No entanto, como a aborda-
gem ao integral de Riemann seguida nessas disciplinas de An´lise,a
privilegia a vertente calculat´ria em detrimento duma constru¸˜o
o ca
rigorosa da entidade matem´tica, op¸˜o essa a que n˜o ´ estranha
a ca a e
a morosidade desta ultima abordagem, apresentamos num cap´
´ ıtulo
preliminar, mas de forma muito sucinta, as diversas etapas da cons-
tru¸˜o do integral de Riemann em IRd bem como os principais re-
ca
sultados e limita¸˜es deste integral.
co
No presente texto, surgem tamb´m t´picos, como os do teorema
e o
p
da representa¸˜o de Riesz em L , do teorema da diferencia¸˜o de
ca ca
Lebesgue, ou da transformada de Fourier de medidas finitas em
IRd , que n˜o foram abordados durante o curso em qualquer dos
a
anos lectivos referidos.
Carlos Tenreiro
9. Cap´
ıtulo 0
tenreiro@mat.uc.pt
Integral de Riemann e medida de
Jordan
Neste cap´tulo preliminar passamos em revista as no¸oes de integral de Riemann e de
ı c˜
d
medida de Jordan em IR bem como algumas das suas propriedades. F´-lo-emos de
a
forma muito sucinta. Aconselha-se por isso a consulta das monografias referidas no
final deste cap´tulo.
ı
0.1 Rectˆngulos em IRd
a
Chamamos rectˆngulo em IRd a todo o subconjunto de IRd da forma A = I1 ×. . .×Id
a
onde, para i = 1, . . . , d, Ii ´ um intervalo real e limitado, isto ´, um intervalo da
e e
forma [ai , bi ], ]ai , bi [, ]ai , bi ] ou [ai , bi [, com ai , bi ∈ IR e ai < bi . O rectˆngulo A
a
dir-se-´ fechado, aberto, semi-aberto ` esquerda ou semi-aberto ` direita se todos os
a a a
intervalos Ii forem fechados, abertos, semi-abertos ` esquerda, ou semi-abertos ` direita,
a a
respectivamente. Se as diferen¸as bi − ai , para i = 1, . . . , d, n˜o dependerem de i,
c a
d
dizemos que A ´ um cubo em IR de aresta b1 − a1 . Ao n´mero real
e u
d
v(A) = (bi − ai ),
i=1
chamamos volume do rectˆngulo A.
a
Uma parti¸˜o do rectˆngulo fechado A ´ um conjunto P do tipo P = P1 × . . . × Pd ,
ca a e
onde cada Pi , para i = 1, . . . , d, ´ uma parti¸˜o de [ai , bi ], isto ´, um subconjunto finito
e ca e
de [ai , bi ] contendo ai e bi . Uma parti¸˜o P do rectˆngulo fechado A determina uma
ca a
′ ′ ′
decomposi¸˜o de A em sub-rectˆngulos fechados da forma I1 × . . . × Id , onde cada Ii ´
ca a e
um subintervalo fechado da decomposi¸˜o que Pi determina em [ai , bi ]. Designaremos
ca
por R(P ) o conjunto de tais sub-rectˆngulos.
a
1
10. 2 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
0.2 Integral duma fun¸˜o definida num rectˆngulo
ca a
Dadas uma fun¸˜o f : A ⊂ IRd → IR limitada no rectˆngulo fechado A e P uma
ca a
parti¸˜o de A, sejam mB (f ) = inf{f (x) : x ∈ B} e MB (f ) = sup{f (x) : x ∈ B}, para
ca
B ∈ R(P ). Consideremos ainda as somas
s(f ; P ) = mB (f )v(B) e s(f ; P ) = MB (f )v(B),
B∈R(P ) B∈R(P )
tenreiro@mat.uc.pt
a que chamamos somas inferior e superior de Darboux, respectivamente. Ao supremo
das somas inferiores e ao ´
ınfimo das somas superiores tomados sobre todas as parti¸˜es
co
de A, chamamos integral inferior e integral superior de f em A e denot´-los-emos por
a
−
−A f dx e A f dx, respectivamente.
Defini¸˜o 0.2.1 (Riemann) Dizemos que f : A ⊂ IRd → IR limitada no rectˆngulo
ca a
−
fechado A ´ integr´vel em A se −A f dx = A f dx. O valor comum das quantidades
e a
anteriores diz-se integral (de Riemann) de f em A e ´ denotado por A f (x)dx.
e
0.3 Conjuntos mensur´veis e medida de Jordan
a
Defini¸˜o 0.3.1 (Jordan) Dizemos que um subconjunto limitado E de IRd ´ mensur´-
ca e a
vel a Jordan quando tomando-se um rectˆngulo fechado A que contenha E a fun¸ao in-
` a c˜
dicatriz em A, 1 E : A → IR, definida por
I
1 se x ∈ E
1 E (x) =
I
0 se x ∈ A − E
´ integr´vel em A. Denotaremos por J(IRd ) a classe de tais conjuntos. Ao n´mero real
e a u
v(E) = A 1 E (x)dx chamamos volume de E.
I
Um subconjunto limitado E de IRd ´ assim mensur´vel ` Jordan quando e s´ quando
e a a o
supP B∈R(P ):B⊂E v(B) = inf P B∈R(P ):B∩E=∅ v(B), ou, por outras palavras, o “volu-
me interior de E” ´ igual ao “volume exterior de E”. Assim, o volume de E n˜o ´ mais
e a e
de que o valor comum dos volumes interior e exterior de E.
Os conjuntos mensur´veis ` Jordan podem ser caracterizados a partir da respectiva
a a
fronteira. Uma tal caracteriza¸ao baseia-se na no¸˜o de conjunto de medida de Lebesgue
c˜ ca
d
nula. Dizemos que um subconjunto M de IR tem medida de Lebesgue nula se para
todo o ǫ > 0 existirem rectˆngulos fechados A1 , A2 , . . . em IRd tais que M ⊂ ∞ Ai e
a i=1
∞
i=1 v(Ai ) ≤ ǫ.
Teorema 0.3.2 (de Lebesgue) Um conjunto limitado E ⊂ IRd ´ mensur´vel a Jor-
e a `
dan sse f r(E) tem medida de Lebesgue nula.
11. 0 Integral de Riemann e medida de Jordan 3
Conjuntos “simples” podem n˜o ser mensur´veis ` Jordan. Por exemplo, o conjunto
a a a
dos racionais do intervalo [0, 1] n˜o ´ mensur´vel ` Jordan.
a e a a
A aplica¸˜o v : J(IRd ) → [0, +∞[ que a cada subconjunto mensur´vel de IRd associa
ca a
o seu volume diz-se medida de Jordan e satisfaz as propriedades:
v1 ) v(∅) = 0;
∞
v2 ) Para E1 , E2 , . . . ∈ J(IRd ), com Ei ∩ Ej = ∅ para i = j, e i=1 Ei ∈ J(IRd ),
tem-se v ( ∞ Ei ) = ∞ v(Ei ).
i=1 i=1
tenreiro@mat.uc.pt
Como veremos no Cap´
ıtulo 2 as propriedades v1 ) e v2 ) justificam a designa¸˜o de
ca
“medida”.
0.4 Integral duma fun¸˜o definida num mensur´vel
ca a
Defini¸˜o 0.4.1 Dizemos que f : E ⊂ IRd → IR limitada em E ∈ J(IRd ) ´ integr´vel a
ca e a `
Riemann em E quando tomando-se um rectˆngulo fechado A que contenha E a fun¸ao
a c˜
¯ f (x) se x ∈ E
f (x) =
0 se x ∈ A − E
for integr´vel em A. Neste caso, o integral de f em E, que denotamos por
a E f (x)dx
¯
´ dado por A f (x)dx.
e
Teorema 0.4.2 (de Lebesgue) f : E ⊂ IRd → IR limitada em E ∈ J(IRd ) ´ integr´vel
e a
a Riemann em E sse o conjunto dos seus pontos de descontinuidade tem medida nula.
`
Um exemplo cl´ssico duma fun¸˜o n˜o integr´vel ` Riemann ´ o da fun¸˜o de
a ca a a a e ca
Dirichelet definida no intervalo [0, 1] por f (x) = 1, se x ´ racional, e f (x) = 0, se x ´
e e
irracional.
Teorema 0.4.3 Sejam f, g : E ⊂ IRd → IR limitadas e integr´veis em E ∈ J(IRd ) e
a
α ∈ IR. Ent˜o:
a
a) f + g ´ integr´vel e
e a E (f + g)(x)dx = E f (x)dx + E g(x)dx;
b) αf ´ integr´vel e
e a E (αf )(x)dx =α E f (x)dx;
c) Se f (x) ≥ 0 para todo o x ∈ E, ent˜o
a E f (x)dx ≥ 0;
d) |f | ´ integr´vel e |
e a E f (x)dx| ≤ E |f |(x)dx.
Notemos que a integrabilidade de |f | n˜o implica a de f . A fun¸˜o f : [0, 1] → IR
a ca
definida por f (x) = 1, se x ´ racional, e f (x) = −1, se x ´ irracional, n˜o ´ integr´vel
e e a e a
mas o seu m´dulo ´-o.
o e
12. 4 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
0.5 C´lculo de integrais m´ ltiplos: Teorema de Fubini
a u
No caso real, o c´lculo do integral duma fun¸˜o limitada e integr´vel f : [a, b] → IR ´
a ca a e
habitualmente efectuado utilizando o teorema fundamental do c´lculo: Se f ´ limitada
a e
e integr´vel, e possui uma primitiva F : [a, b] → IR, isto ´, se existe F diferenci´vel com
a e a
F ′ = f , ent˜o b f (x)dx = F (b) − F (a).
a a
No caso multivariado, o c´lculo do integral duma fun¸˜o definida num rectˆngulo
a ca a
p q
A × B ⊂ IR × IR pode reduzir-se ao c´lculo de dois integrais, um sobre A e o outro
a
tenreiro@mat.uc.pt
sobre B. A aplica¸˜o sucessiva duma tal regra permite-nos concluir que o integral duma
ca
fun¸˜o real de n vari´veis se reduz ao c´lculo de n integrais simples.
ca a a
Teorema 0.5.1 (de Fubini) Seja f : A × B → IR integr´vel com A ⊂ IRp e B ⊂ IRq
a
rectˆngulos fechados. Para x ∈ A e y ∈ B sejam fx : B → IR e f y : A → IR as sec¸oes
a c˜
de f em x e y definidas por fx (y) = fy (x) = f (x, y), respectivamente. Ent˜o
a
−
f d(x, y) = fx (y)dy dx = fx (y)dy dx
A×B A −B A B
−
= f y (x)dx dy = f y (x)dx dy.
B −A B A
ınua em A × B, as suas sec¸˜es s˜o cont´
Em particular, se f ´ cont´
e co a ınuas e a f´rmula
o
anterior reduz-se a
f d(x, y) = fx (y)dy dx = f y (x)dx dy.
A×B A B B A
A extens˜o do resultado anterior a dom´
a ınios mensur´veis ` Jordan n˜o rectangulares
a a a
´ simples. Notemos que a existˆncia de algum dos integrais iterados de f n˜o implica
e e a
a integrabilidade de f . Para f : [0, 1] × [0, 1] → IR definida por f (x, y) = 2y, se x ´e
1 1
irracional, e f (x, y) = 1, se x ´ racional, temos 0 ( 0 f (x, y)dy)dx = 1 mas f n˜o ´
e a e
integr´vel.
a
0.6 Integrais param´tricos
e
Se f : A×B → IR ´ cont´
e ınua em A×B com A ⊂ IRp e B ⊂ IRq rectˆngulos fechados, o
a
teorema de Fubini garante a integrabilidade do “integral param´trico” x → B f (x, y)dy.
e
Os resultados seguintes d˜o conta da continuidade e diferenciabilidade desta fun¸˜o.
a ca
Teorema 0.6.1 Se f : A × B → IR, com A ⊂ IRp e B ⊂ IRq rectˆngulos fechados, ´
a e
cont´nua ent˜o x → B f (x, y)dy, para x ∈ A, ´ uma fun¸ao cont´nua.
ı a e c˜ ı
13. 0 Integral de Riemann e medida de Jordan 5
Teorema 0.6.2 (Regra de Leibniz) Seja f : A × B → IR, com A ⊂ IRp e B ⊂ IRq
∂f
rectˆngulos fechados, cont´nua com derivada parcial ∂xi cont´nua em A×B, para algum
a ı ı
i ∈ {1, . . . , p}. Ent˜o x → B f (x, y)dy, para x ∈ A, admite derivada parcial cont´nua
a ı
em ordem a xi e
∂ ∂f
f (x, y)dy = (x, y)dy.
∂xi B B ∂xi
0.7 Um teorema de convergˆncia
e
tenreiro@mat.uc.pt
O limite (simples) duma sucess˜o de fun¸˜es integr´veis ` Riemann n˜o ´ necessaria-
a co a a a e
mente integr´vel ` Riemann mesmo que uma tal sucess˜o seja uniformemente limitada.
a a a
´ esse o caso da sucess˜o
E a
1 se x = rk , k = 1, . . . , n
fn (x) =
0 se x ∈ [a, b]{r1 , . . . , rn }
onde r1 , r2 , . . . ´ uma enumera¸˜o dos racionais do intervalo [a, b]. (fn ) ´ uma sucess˜o
e ca e a
b
crescente de fun¸˜es integr´veis ` Riemann em [a, b] com a fn (x)dx = 0 e lim fn (x) =
co a a
f (x), para todo o x ∈ [a, b], onde f ´ a fun¸˜o de Dirichelet que sabemos n˜o ser
e ca a
integr´vel ` Riemann.
a a
A integrabilidade da fun¸˜o limite ´ preservada se a convergˆncia for uniforme. Re-
ca e e
d
cordemos que uma sucess˜o de fun¸˜es (fn ) de A ⊂ IR em IR converge uniformemente
a co
para f em B ⊂ A, se
∀ǫ > 0 ∃n0 ∈ IN ∀n ≥ n0 ∀x ∈ B |fn (x) − f (x)| < ǫ.
Teorema 0.7.1 Se uma sucess˜o de fun¸oes integr´veis fn : A ⊂ IRd → IR definidas
a c˜ a
em A J-mensur´vel, convergir uniformemente para f : A → IR, ent˜o f ´ integr´vel a
a a e a `
Riemann e
lim fn (x)dx = f (x)dx.
n→+∞ A A
0.8 Integral impr´prio de Riemann
o
A no¸˜o de integral de Riemann duma fun¸˜o f : E ⊂ IRd → IR exige, ` partida,
ca ca a
que sejam satisfeitas duas condi¸˜es: o dom´
co ınio de integra¸˜o E deve ser mensur´vel `
ca a a
Jordan (sendo em particular limitado) e f ´ limitada em E.
e
Vejamos agora como podemos extender a no¸˜o de integral de Riemann a um con-
ca
junto mais vasto fun¸˜es. Comecemos pelas fun¸˜es n˜o-negativas.
co co a
Defini¸˜o 0.8.1 Seja f : E ⊂ IRd → IR+ uma fun¸ao definida num dom´nio E para o
ca c˜ ı
d ∞
qual existe uma sucess˜o E1 ⊂ E2 ⊂ . . . em J(IR ) com E = i=1 Ei sendo f limitada e
a
14. 6 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
integr´vel em cada Ei , i = 1, 2, . . .. Chamamos integral impr´prio de f em E ao limite
a o
E f (x)dx = limi→+∞ Ei f (x)dx (possivelmente +∞).
A escrita duma fun¸˜o f : E ⊂ IRd → IR como diferen¸a de duas fun¸˜es n˜o-
ca c co a
-negativas, f = f + − f − , onde f + (x) = max(f (x), 0) e f − (x) = max(−f (x), 0) para
x ∈ IRd , permite-nos generalizar a no¸˜o de integral impr´prio para fun¸˜es cujo sinal
ca o co
n˜o ´ constante.
a e
tenreiro@mat.uc.pt
Defini¸˜o 0.8.2 Seja f : E ⊂ IRd → IR uma fun¸ao definida num dom´nio E nas
ca c˜ ı
condi¸oes da defini¸ao anterior. Dizemos que f ´ integr´vel em E (sentido impr´prio)
c˜ c˜ e a o
se E f + (x)dx < +∞ e − (x)dx < +∞. O integral impr´prio de f em E ´ dado
Ef o e
por E f (x)dx = E f + (x)dx − − (x)dx.
Ef
Se f ´ limitada e integr´vel ` Riemann em E ∈ J(IRd ), ent˜o f ´ integr´vel no
e a a a e a
sentido impr´prio e os integrais pr´prio e impr´prio coincidem. As propriedades do
o o o
integral de Riemann apresentadas no Teorema 0.4.3 valem para o integral impr´prio.
o
0.9 Insuficiˆncias do integral de Riemann
e
At´ finais do s´culo XIX a utiliza¸˜o do integral de Riemann foi revelando algu-
e e ca
mas insuficiˆncias que n˜o permitiam uma utiliza¸˜o satisfat´ria deste instrumento
e a ca o
matem´tico:
a
— Fun¸˜es muito simples podem n˜o ser integr´veis ` Riemann (caso, por exemplo,
co a a a
da fun¸˜o de Dirichelet definida em §0.4).
ca
— Para uma fun¸˜o integr´vel ` Riemann no rectˆngulo [a, b] × [c, d] a f´rmula
ca a a a o
b d
cl´ssica [a,b]×[c,d] f (x, y)dxdy = a ( c f (x, y)dy)dx n˜o ´ verdadeira pois um dos in-
a a e
tegrais simples do segundo membro pode n˜o ter sentido ` Riemann. Tal ´ o caso da
a a e
fun¸˜o f : [0, 1] × [0, 1] → IR definida por f (x, y) = 0, se x = 1/2, e f (x, y) = 1 Q (y), se
ca I
x = 1/2.
— A mais importante limita¸˜o do integral de Riemann tem a ver com as opera¸˜es
ca co
de passagem ao limite. Podemos ter uma sucess˜o (fn ) de fun¸˜es integr´veis e “bem
a co a
comportadas” em [a, b] com lim fn (x) = f (x), para todo o ponto x ∈ [a, b], e no entanto
b b b
a igualdade lim a fn (x)dx = a lim fn (x)dx = a f (x)dx n˜o ser v´lida (ver §0.7).
a a
As insuficiˆncias anteriores foram finalmente superadas com a introdu¸˜o duma
e ca
nova no¸˜o de integral devida a Lebesgue. O ponto de partida de Lebesgue ´ a no¸˜o
ca e ca
de medida introduzida por Emile Borel em 1898. Seguindo esta mesma abordagem, de-
senvolveremos nos pr´ximos cap´
o ıtulos a teoria geral da medida e integra¸˜o ` Lebesgue.
ca a
d
O integral de Lebesgue em IR surgir´ como caso particular dessa teoria geral.
a
15. 0 Integral de Riemann e medida de Jordan 7
0.10 Bibliografia
Chae, S.B. (1980). Lebesgue Integration, Marcel Dekker, New York.
Dieudonn´, J. (1978). Int´gration et mesure, In: Abr´g´ d’Histoire des Math´matiques
e e e e e
1700-1900, Vol. 2, Hermann, Paris.
Gomes, R.L., Barros, L. (1946). Medida de Jordan, Junta de Investiga¸˜o Ma-
ca
tem´tica.
a
tenreiro@mat.uc.pt
Lima, E.L. (1989). Curso de An´lise, Vol. 2, 3a ed., IMPA, Rio de Janeiro.
a
Weinholtz, A.B. (1996). Integral de Riemann e de Lebesgue em IRn , Textos de Ma-
tem´tica, Universidade de Lisboa.
a
17. Cap´
ıtulo 1
tenreiro@mat.uc.pt
Conjuntos e classes de conjuntos
Neste cap´tulo estudamos determinadas classes de subconjuntos dum conjunto arbitr´rio
ı a
X que desempenhar˜o um papel fundamental na primeira parte do curso. Relevo par-
a
ticular ser´ dado as no¸oes de σ-anel gerado por uma classe e de σ-´lgebra de Borel.
a ` c˜ a
1.1 Opera¸˜es com conjuntos
co
Com o intuito principal de fixar nota¸˜o, referimos neste par´grafo algumas opera¸˜es
ca a co
com conjuntos que usaremos durante o curso. Todas elas, com excep¸˜o possivelmente
ca
da no¸˜o de limite duma sucess˜o de conjuntos, s˜o j´ do nosso conhecimento tendo
ca a a a
sido usadas no cap´ ıtulo preliminar anterior.
Salvo indica¸˜o em contr´rio, denotaremos por X um conjunto arbitr´rio n˜o-vazio
ca a a a
e por P(X) o conjunto das partes de X, isto ´, o conjunto de todos os subconjuntos de
e
X.
Chamaremos classe a um qualquer conjunto de subconjuntos de X. Uma classe
´ assim um subconjunto de P(X) (a palavra “classe” tem, em algumas abordagens `
e a
teoria dos conjuntos, um significado distinto do que aqui lhe atribu´ ımos).
Dados A, B ∈ P(X) denotaremos por A ∩ B ou AB a intersec¸˜o de A e B, e por
ca
A ∪ B a reuni˜o de A e B. Sendo A e B disjuntos, i.e., A ∩ B = ∅, a reuni˜o de A e B
a a
´ tamb´m denotada por A + B.
e e
O complementar de A ´ denotado por Ac e a diferen¸a entre A e B ´ denotada por
e c e
A−B = A∩B c . Se B est´ contido em A, B ⊂ A, a diferen¸a A − B diz-se pr´pria.
a c o
Ao conjunto A△B = (A − B) + (B − A) chamamos diferen¸a sim´trica de A e B.
c e
Dada uma fam´ Ai , i ∈ I, de subconjuntos de X indexada por um conjunto
ılia
arbitr´rio I, denotaremos por i∈I Ai a sua intersec¸˜o e por i∈I Ai a sua reuni˜o.
a ca a
Sendo os conjuntos Ai , i ∈ I, disjuntos dois a dois, i.e., Ai ∩ Aj = ∅, para todo o i = j,
a sua reuni˜o ´ tamb´m denotada por i∈I Ai .
a e e
9
18. 10 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
A intersec¸˜o, a reuni˜o e a complementa¸˜o est˜o relacionadas pelas leis de De
ca a ca a
Morgan:
c c
Ai = Ac
i e Ai = Ac .
i
i∈I i∈I i∈I i∈I
Se (An ) ´ uma sucess˜o de subconjuntos de X, chamamos limite inferior da sucess˜o
e a a
ao conjunto
∞ ∞
Ai ≡ lim inf An ,
tenreiro@mat.uc.pt
n=1 i=n
e limite superior da sucess˜o ao conjunto
a
∞ ∞
Ai ≡ lim sup An .
n=1 i=n
Notemos que lim inf An ´ o conjunto dos pontos x ∈ X que pertencem a todos os
e
An com excep¸˜o dum n´mero finito deles, enquanto que lim sup An ´ o conjunto dos
ca u e
pontos x que pertencem a uma infinidade de conjuntos An (ver Exerc´ 1.5.3). Por
ıcio
isso, o conjunto lim sup An ´ tamb´m denotado por An i.o. (do inglˆs, infinitely often).
e e e
Sempre que lim sup An = lim inf An , dizemos existe o limite da sucess˜o (An ). Um
a
tal limite, que denotaremos por lim An , ´ definido por lim An = lim sup An = lim inf An .
e
A sucess˜o (An ) diz-se crescente se An ⊂ An+1 para todo o n ∈ IN e decrescente
a
se An+1 ⊂ An para todo o n ∈ IN. No primeiro caso indicaremos (An ) ↑ e no segundo
(An ) ↓. Diz-se mon´tona uma sucess˜o que ´ crescente ou decrescente. Sendo (An )
o a e
∞
crescente, vale a igualdade lim An = n=1 An . Se (An ) ´ decrescente, temos lim An =
e
∞
n=1 An .
1.2 Classes de conjuntos
No que se segue, denotamos por C uma classe n˜o-vazia de subconjuntos de X.
a
C diz-se um semi-anel se ´ est´vel para a intersec¸˜o finita (se A, B ∈ C ent˜o
e a ca a
A ∩ B ∈ C; dizemos neste caso que C ´ um π-sistema), e se dados A, B ∈ C ent˜o
e a
m
A − B = i=1 Ci para algum m ∈ IN e C1 , . . . , Cm ∈ C.
C diz-se um anel se ´ est´vel para a reuni˜o finita (se A, B ∈ C ent˜o A ∪ B ∈ C) e
e a a a
para a diferen¸a (se A, B ∈ C ent˜o A − B ∈ C).
c a
C diz-se um σ-anel se ´ est´vel para a diferen¸a e para a reuni˜o numer´vel (se
e a c a a
∞
A1 , A2 , . . . ∈ C ent˜o n=1 An ∈ C).
a
Notemos que se C ´ um semi-anel ent˜o ∅ ∈ C. Al´m disso, um anel ´ um semi-anel
e a e e
(A∩B = A∪B−((A−B)+(B−A))) e um σ-anel ´ um anel (A∪B = A∪B∪∅∪· · ·). Um
e
σ-anel ´ ainda est´vel para a intersec¸˜o numer´vel ( +∞ Ai = A1 − +∞ (A1 − Ai )).
e a ca a i=1 i=1
19. 1 Conjuntos e classes de conjuntos 11
Um σ-anel (resp. semi-anel, anel) que contenha X diz-se uma σ-´lgebra (resp.
a
semi-´lgebra, ´lgebra).
a a
Uma classe C diz-se mon´tona se ´ est´vel para os limites mon´tonos (se (An ) ´
o e a o e
mon´tona ent˜o lim An ∈ C). Uma classe mon´tona que contenha X e seja est´vel para
o a o a
a diferen¸a pr´pria (se A, B ∈ C e B ⊂ A ent˜o A − B ∈ C), diz-se um d-sistema (ou
c o a
sistema de Dynkin).
Uma σ-´lgebra ´ um d-sistema e um σ-anel ´ uma classe mon´tona.
a e e o
tenreiro@mat.uc.pt
Exemplos: 1. {∅, X} e P(X) s˜o σ-´lgebras.
a a
2. A classe C de subconjuntos de IR definida por C = {]a, b] : −∞ < a ≤ b < +∞},
´ semi-anel (ver Exerc´ 1.5.9). A classe S dos subconjuntos de IR obtidos por reuni˜o
e ıcio a
finita de elementos de C ´ anel.
e
3. A classe C de todos os subconjuntos de IR que admitem uma das formas ]− ∞, a],
]a, b] ou ]b, +∞[, com a, b ∈ IR, ´ semi-anel mas n˜o ´ anel. A classe S dos subconjuntos
e a e
de IR obtidos por reuni˜o finita de elementos de C ´ ´lgebra.
a ea
4. Sejam X infinito e C a classe de todos os subconjuntos A de X tais que A ou Ac
´ finito. C ´ ´lgebra mas n˜o ´ σ-´lgebra.
e ea a e a
1.3 σ-anel gerado por uma classe
Veremos de seguida que a partir duma classe C de partes de X, ´ poss´ construir
e ıvel
classes mais “ricas” que gozam das propriedades anteriores. Tal como para conjuntos,
definimos a intersec¸˜o i∈I Ci e a reuni˜o i∈I Ci duma fam´ de classes Ci , i ∈ I,
ca a ılia
por i∈I Ci = {A ∈ P(X) : A ∈ Ci , para todo o i ∈ I} e i∈I Ci = {A ∈ P(X) : A ∈
Ci , para algum i ∈ I}. Diremos que C est´ contida numa classe D de partes de X se
a
todo o elemento de C (subconjunto de X) ´ elemento de D, e indicaremos C ⊂ D.
e
Proposi¸˜o 1.3.1 A intersec¸ao duma qualquer fam´lia de σ-an´is ´ um σ-anel.
ca c˜ ı e e
Proposi¸˜o 1.3.2 Se Ψ ´ a fam´lia de todos os σ-an´is de partes de X que contˆm
ca e ı e e
C, ent˜o B∈Ψ B, ´ o menor (no sentido da inclus˜o) σ-anel que cont´m C. Um tal
a e a e
σ-anel, que denotaremos por s(C), diz-se σ-anel gerado pela classe C.
As proposi¸˜es anteriores permanecem v´lidas para todas as classes de conjuntos
co a
consideradas atr´s. A defini¸˜o anterior pode assim ser extendida a tais classes. Em
a ca
particular denotaremos por σ(C), d(C) e m(C), a σ-´lgebra, d-sistema e classe mon´tona
a o
gerados por C, respectivamente.
Duma forma geral, se C ´ uma classe de partes de X, s˜o v´lidas as inclus˜es
e a a o
m(C) ⊂ d(C) ⊂ σ(C) e m(C) ⊂ s(C) ⊂ σ(C).
20. 12 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
Sob certas condi¸˜es sobre a classe C s˜o tamb´m v´lidas as inclus˜es contr´rias.
co a e a o a
Teorema 1.3.3 (de Dynkin) Se C ´ um π-sistema ent˜o d(C) = σ(C).
e a
Demonstra¸˜o: Atendendo ao Exerc´
ca ıcio 1.5.8, basta mostrar que d(C) ´ π-sistema.
e
Para B ∈ P(X), consideremos a classe K(B) = {A ∈ P(X) : A ∩ B ∈ d(C)}. Notemos
que: i) A ∈ K(B) sse B ∈ K(A); ii) K(B) ´ d-sistema, para B ∈ d(C); iii) d(C) ⊂ K(A),
e
para todo o A ∈ C (pois C ´ π-sistema); e iv) C ⊂ K(B), para todo o B ∈ d(C). Assim,
e
tenreiro@mat.uc.pt
d(C) ⊂ K(B), para todo o B ∈ d(C), o que permite concluir.
O resultado seguinte estabelece-se de forma an´loga.
a
Teorema 1.3.4 Se C ´ um anel ent˜o m(C) = s(C).
e a
Corol´rio 1.3.5 Se C ´ uma algebra ent˜o m(C) = d(C) = s(C) = σ(C).
a e ´ a
1.4 σ-´lgebras de Borel
a
Por topologia em X entendemos uma classe TX de subconjuntos de X, a que chama-
mos abertos, satisfazendo as seguintes propriedades: T1. O conjunto vazio e o pr´prio o
X s˜o abertos; T2. A intersec¸˜o finita de abertos ´ um aberto; T3. A reuni˜o ar-
a ca e a
bitr´ria de abertos ´ um aberto. O conjunto X munido duma topologia TX diz-se um
a e
espa¸o topol´gico. Os complementares dos conjuntos abertos dizem-se fechados. A
c o
classe dos conjuntos fechados satisfaz as seguintes propriedades: F1. O conjunto vazio
e o pr´prio X s˜o fechados; F2. A reuni˜o finita de fechados ´ um fechado; F3. A
o a a e
intersec¸˜o arbitr´ria de fechados ´ um fechado.
ca a e
Um exemplo bem nosso conhecido de espa¸o topol´gico ´ o do conjunto IRd onde
c o e
d
por aberto entendemos todo o subconjunto A de IR tal que para todo o ponto x ∈ A
existe uma bola aberta de centro x contida em A.
Mais geralmente, um espa¸o m´trico, isto ´, um conjunto X onde podemos definir
c e e
uma aplica¸˜o, d, dita distˆncia, que a cada par de pontos x e y de X associa um n´mero
ca a u
real d(x, y), dito distˆncia entre x e y, e que satisfaz: D1. d(x, y) ≥ 0 e d(x, y) = 0 sse
a
x = y, D2. d(x, y) = d(y, x), D3. d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y), para todo o x, y, z ∈ X, ´ e
d
tamb´m um espa¸o topol´gico. A no¸˜o de aberto ´ an´loga ` de IR , entendendo-se
e c o ca e a a
por bola aberta de centro x e raio r > 0 o conjunto dos pontos y de X cujas distˆncias
a
a x ´ inferior a r, isto ´, d(y, x) < r.
e e
d
Para x = (x1 , . . . , xd ) e y = (y1 , . . . , yd ) em IRd , a aplica¸˜o d(x, y) =
ca i=1 (xi − yi )
2
´, como sabemos, uma distˆncia, dita distˆncia euclideana. IRd munido da distˆncia
e a a a
euclideana ´ assim um espa¸o m´trico. O conjunto das fun¸˜es reais e limitadas defini-
e c e co
d
das num subconjunto A de IR munido da distˆncia do supremo d(f, g) = supx∈A |f (x)−
a
21. 1 Conjuntos e classes de conjuntos 13
g(x)|, e o conjunto das fun¸˜es reais e cont´
co ınuas definidas num subconjunto J-mensur´vel
a
d
A de IR munido da distˆncia d(f, g) = A |f (x) − g(x)|dx, s˜o outros exemplos de
a a
espa¸os m´tricos.
c e
Sendo X um espa¸o topol´gico chamamos σ-´lgebra de Borel ` σ-´lgebra gerada
c o a a a
pela classe dos abertos de X. Denot´-la-emos por B(X). Os seus elementos dizem-se
a
borelianos.
tenreiro@mat.uc.pt
Teorema 1.4.1 Se F ´ a classe de todos os fechados de X ent˜o B(X) = σ(F).
e a
No caso particular em que X = IRd , a σ-´lgebra de Borel B(IRd ) al´m de ser gerada
a e
d
pelos abertos de IR (e pelos fechados) ´ tamb´m gerada por outras classes de conjuntos.
e e
Antes de apresentarmos tais classe necessitamos de obter uma decomposi¸˜o b´sica dos
ca a
d
abertos de IR . Se d = 1 sabemos que qualquer aberto de IR pode ser escrito como
reuni˜o numer´vel de rectˆngulos abertos (intervalos abertos) disjuntos dois a dois (ver
a a a
Lima, 1995, pg. 132). Um tal resultado falha para d > 1. Vale, no entanto, o seguinte
resultado.
Teorema 1.4.2 Todo o aberto de IRd ´ reuni˜o numer´vel (disjunta) de cubos semi-
e a a
-abertos a esquerda.
`
Demonstra¸˜o: Para k ∈ IN, seja Ck a classe dos subconjuntos de IRd da forma
ca
ji ji + 1
(x1 , . . . , xd ) : k
< xi ≤ , para i = 1, . . . , d ,
2 2k
onde j1 , . . . , jd s˜o inteiros. Ck ´ uma parti¸˜o numer´vel de IRd constitu´ por cubos
a e ca a ıda
semi-abertos ` esquerda. Para k1 < k2 , cada elemento de Ck2 est´ contido nalgum
a a
elemento de Ck1 .
Dado um aberto A em IRd , consideremos a classe D1 de todos os elementos de C1
contidos em A; a classe D2 de todos os elementos de C2 contidos em A que n˜o est˜oa a
contidos em nenhum elemento de D1 ; a classe D3 de todos os elementos de C3 contidos
em A que n˜o est˜o contidos em nenhum elemento de D1 ∪ D2 ; duma forma geral seja
a a
Dk a classe de todos os elementos de Ck contidos em A que n˜o est˜o contidos em
a a
k−1 ∞
nenhum elemento de n=1 Dn . Finalmente, seja D = n=1 Dn .
Mostremos que A = B∈D B, o que atendendo ` numerabilidade de D permitir´
a a
concluir. Claramente B∈D B ⊂ A. Reciprocamente, sejam x ∈ A e Ck (x) o elemento
de Ck que cont´m x. Sendo A aberto, existe k0 ∈ IN tal que Ck (x) ⊂ A para k ≥ k0 e
e
Ck (x) ⊂ A para k < k0 . Assim Ck0 (x) ∈ Dk0 e x ∈ B∈D B.
O resultado anterior permanece v´lido para cubos fechados. No entanto, a reuni˜o
a a
deixa de ser disjunta.
22. 14 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
Teorema 1.4.3 A σ-´lgebra de Borel de IRd ´ gerada por cada uma das classes se-
a e
guintes classes de conjuntos:
a) a classe de todos os fechados em IRd ;
b) a classe de todos os subconjuntos de IRd da forma
{(x1 , . . . , xd ) : xi ≤ b} , para i ∈ {1, . . . , d} e b ∈ IR;
c) a classe de todos os subconjuntos de IRd da forma
{(x1 , . . . , xd ) : ai < xi ≤ bi , para i = 1, . . . , d} , para a1 , . . . , ad , b1 , . . . , bd ∈ IR.
tenreiro@mat.uc.pt
1.5 Exerc´
ıcios
1. Sendo A, B e C subconjuntos de X, mostre que:
(a) A − B = A − (A ∩ B) = (A ∪ B) − B;
(b) A ∩ (B − C) = (A ∩ B) − (A ∩ C);
(c) (A ∪ B) − C = (A − C) ∪ (B − C).
2. Sendo A, B e C subconjuntos de X, mostre que:
(a) A△B = B△A;
(b) A△(B△C) = (A△B)△C;
(c) A ∩ (B△C) = (A ∩ B)△(A ∩ C);
(d) A△B = (A ∪ B) − (A ∩ B);
(e) A△B ⊂ (A△C) ∪ (B△C).
3. Se A e (An ) s˜o subconjuntos de X, mostre que:
a
(a) lim inf An ⊂ lim sup An ;
(b) A − lim inf An = lim sup(A − An ) e A − lim sup An = lim inf(A − An );
(c) (lim inf An )c = lim sup An e (lim sup An )c = lim inf An ;
c c
(d) lim sup An = {x ∈ X : ∃ (nk ) subsucess˜o de (n) ∀ k ∈ I x ∈ Ank }
a N,
+∞
= {x ∈ X : n=1 1 An (x) = +∞}, e
I
lim inf An = {x ∈ X : ∃ n0 = n0 (x) ∈ I ∀ n ≥ n0 , x ∈ An }
N
+∞
= {x ∈ X : n=1 1 Ac (x) < +∞},
I n
onde, para B ⊂ X, 1 B denota a fun¸˜o indicatriz de B definida por 1 B (x) = 1 se
I ca I
x ∈ B e 1 B (x) = 0 se x ∈ B;
I /
(e) lim An = A sse x ∈ An para n suficientemente grande, para todo o x ∈ A, e x ∈ An
/
para n suficientemente grande, para todo o x ∈ A;
/
(f) Se (An ) ´ mon´tona ent˜o
e o a
∞
n=1 An , se (An ) ´ crescente
e
lim An = ∞
n=1 An , se (An ) ´ decrescente.
e
4. Se An = A para n par e An = B para n ´ ımpar, onde A e B s˜o subconjuntos de X,
a
mostre que lim inf An = A ∩ B e lim sup An = A ∪ B.
23. 1 Conjuntos e classes de conjuntos 15
5. Mostre que se (An ) ´ uma sucess˜o de conjuntos disjuntos dois a dois ent˜o lim An = ∅.
e a a
6. Mostre que se (An ) ´ uma sucess˜o em P(X) ent˜o as sucess˜es (Bn ) e (Cn ) definidas
e a a o
por Bn = n Ai , para n ≥ 1 e C1 = A1 e Cn = An − n−1 Ai , para n ≥ 2, satisfazem:
i=1 i=1
∞ ∞
(a) (Bn ) ´ crescente, An ⊂ Bn para todo o n ≥ 1 e
e n=1 Bn = n=1 An ;
(b) (Cn ) ´ formada por conjuntos disjuntos dois a dois, Cn ⊂ An para todo o n ≥ 1 e
e
∞ ∞
n=1 Cn = n=1 An ;
(c) Se (An ) ⊂ C, com C um anel de partes de X, ent˜o (Bn ) ⊂ C e (Cn ) ⊂ C.
a
tenreiro@mat.uc.pt
7. Prove que se C ⊂ P(X) ´ uma classe complementada ent˜o C ´ est´vel para a intersec¸ao
e a e a c˜
(finita ou infinita) sse ´ est´vel para a reuni˜o.
e a a
8. Seja C uma classe n˜o-vazia de partes de X. Prove que:
a
(a) Se C ´ semi-anel ent˜o ∅ ∈ C;
e a
(b) C ´ anel ⇐⇒
e C ´ semi-anel est´vel para a reuni˜o finita
e a a
⇐⇒ C ´ est´vel para reuni˜o finita e diferen¸a pr´pria
e a a c o
⇐⇒ C ´ est´vel para intersec¸˜o finita e diferen¸a sim´trica
e a ca c e
⇐⇒ C ´ est´vel para reuni˜o finita disjunta, intersec¸˜o finita e diferen¸a
e a a ca c
pr´pria;
o
(c) C ´ σ-anel ⇐⇒ C ´ anel est´vel para a reuni˜o numer´vel.
e e a a a
⇐⇒ C ´ anel mon´tono
e o
⇐⇒ C ´ est´vel para a intersec¸˜o finita, diferen¸a pr´pria e reuni˜o
e a ca c o a
numer´vel disjunta;
a
(d) Se C ´ semi-´lgebra ent˜o ∅ ∈ C e X ∈ C;
e a a
(e) C ´ semi-´lgebra ⇐⇒ C ´ est´vel para a intersec¸˜o finita, o complementar de qual-
e a e a ca
quer elemento de C ´ reuni˜o finita disjunta de elementos de
e a
C e X ∈ C;
(f) C ´ ´lgebra ⇐⇒ C ´ est´vel para a reuni˜o finita e para a complementa¸˜o
ea e a a ca
⇐⇒ C ´ est´vel para a intersec¸˜o finita e para a complementa¸ao;
e a ca c˜
(g) C ´ σ-´lgebra ⇐⇒ C ´ est´vel para a reuni˜o numer´vel e para a complementa¸ao
e a e a a a c˜
⇐⇒ C ´ est´vel para a interse¸˜o numer´vel e para a complemen-
e a ca a
ta¸ao
c˜
⇐⇒ C ´ π-sistema e d-sistema
e
⇐⇒ C ´ ´lgebra mon´tona
ea o
∞
⇐⇒ C ´ σ-anel e existe uma sucess˜o (Xn ) ⊂ C com n=1 Xn = X;
e a
(h) C ´ d-sistema ⇐⇒ C ´ est´vel para a complementa¸˜o, para a reuni˜o numer´vel
e e a ca a a
disjunta e X ∈ C
⇐⇒ C ´ est´vel para os limites crescentes, para a diferen¸a pr´pria
e a c o
e X ∈ C.
9. Seja C a classe de subconjuntos de IR definida por C = {]a, b] : −∞ < a ≤ b < +∞}.
Denotando por x ∨ y e por x ∧ y o m´ximo e o m´
a ınimo entre x e y, respectivamente,
mostre que:
(a) ]a, b]∩]c, d] =]a ∨ c, b ∧ d];
(b) ]a, b]−]c, d] =]a, b ∧ c]∪]a ∨ d, b];
24. 16 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
(c) C ´ um semi-anel de partes de IR.
e
10. Generalize o exerc´ anterior, mostrando que a classe de subconjuntos de IRd definida
ıcio
d
por C = i=1 ]ai , bi ] : −∞ < ai ≤ bi < +∞, para i = 1, . . . , d ´ um semi-anel.
e
11. Sejam X um conjunto n˜o-numer´vel e C a classe de todos os subconjuntos finitos ou
a a
numer´veis de X. Mostre que C ´ σ-anel mas n˜o ´ σ-´lgebra.
a e a e a
12. Seja {Ai , i ∈ I} uma parti¸˜o numer´vel de X e C =
ca a i∈J Ai : J ⊂ I . Mostre que C
´ uma σ-´lgebra de partes de X.
e a
13. (Anel gerado por um semi-anel) Sejam C um semi-anel de partes de X e
tenreiro@mat.uc.pt
m
R= Ci : Ci ∈ C, i = 1, . . . , m, para algum m ∈ I .
N
i=1
Mostre que:
(a) R ´ um π-sistema est´vel para a reuni˜o finita disjunta;
e a a
(b) R ´ est´vel para a diferen¸a;
e a c
(c) R ´ est´vel para a reuni˜o finita;
e a a
(d) r(C) = R, onde r(C) denota o anel gerado por C.
14. Mostre que se C1 e C2 s˜o classes de partes de X ent˜o
a a
s(C1 ) = s(C2 ) ⇐⇒ C1 ⊂ s(C2 ) e C2 ⊂ s(C1 ).
Verifique que o resultado continua v´lido para σ-´lgebras, d-sistemas e classes mon´tonas.
a a o
15. Sejam {Ct , t ∈ T } uma fam´ de partes de X e denotemos por s(Ct , t ∈ T ) o σ-anel por
ılia
ela gerado, isto ´, o mais pequeno σ-anel que cont´m todas as classes Ct , t ∈ T . Mostre
e e
que
s(Ct , t ∈ T ) = s(s(Ct ), t ∈ T ) = s Ct .
t∈T
16. Sejam C uma classe de partes de X e C ∩ A = {C ∩ A : C ∈ C} com A ⊂ X. Mostre que:
(a) s(C ∩ A) = s(C) ∩ A. (Sugest˜o: considere a classe S = {B ∪ (C − A) : B ∈
a
s(C ∩ A), C ∈ s(C)} e mostre que S ´ um σ-anel que cont´m C e S ∩ A = s(C ∩ A));
e e
(b) σA (C ∩A) = σ(C)∩A, onde σA designa a σ-´lgebra gerada em A pela classe indicada.
a
17. Mostre que a σ-´lgebra de Borel de IRd ´ gerada por cada uma das classes de todos os
a e
subconjuntos da forma:
(a) {(x1 , . . . , xd ) : ai ≤ xi ≤ bi , para i = 1, . . . , d}, ai , bi ∈ IR, i = 1, . . . , d;
(b) {(x1 , . . . , xd ) : xi ≤ bi , para i = 1, . . . , d}, bi ∈ IR, i = 1, . . . , d;
(c) {(x1 , . . . , xd ) : ai ≤ xi < bi , para i = 1, . . . , d}, ai , bi ∈ IR, i = 1, . . . , d;
(d) {(x1 , . . . , xd ) : ai < xi < bi , para i = 1, . . . , d}, ai , bi ∈ IR, i = 1, . . . , d.
ıneas anteriores ai ∈ Q ou bi ∈ Q
Verifique que o mesmo se passa se em qualquer das al´
para algum i = 1, . . . , d.
18. Sejam E um subconjunto de IRd e B(E) a σ-´lgebra de Borel de E, isto ´, a σ-´lgebra
a e a
d
de partes de E gerada pela classe {E ∩ A : A aberto em IR }. Mostre que:
(a) B(E) = E ∩ B(IRd );
(b) Se E ∈ B(IRd ) ent˜o B(E) = {B ∈ B(IRd ) : B ⊂ E}.
a
25. 1 Conjuntos e classes de conjuntos 17
1.6 Bibliografia
Cohn, D.L. (1980). Measure Theory, Birkh¨user, Boston.
a
Fernandez, P.J. (1976). Medida e Integra¸ao, IMPA, Rio de Janeiro.
c˜
Halmos, P.R. (1950). Measure Theory, D. Van Nostrand Company, New York.
Lima, E.L. (1995). Curso de An´lise, Vol. 1, 8a ed., IMPA, Rio de Janeiro.
a
tenreiro@mat.uc.pt
27. Cap´
ıtulo 2
tenreiro@mat.uc.pt
Medidas e prolongamento de
medidas
Neste cap´tulo abordamos os problemas da constru¸ao duma medida a partir duma me-
ı c˜
dida exterior, do prolongamento duma medida definida num semi-anel ao σ-anel por
ele gerado e do completamento de medidas. Como aplica¸ao, definimos a medida de
c˜
d
Lebesgue em IR e estudamos algumas das suas propriedades.
2.1 Fun¸˜es de conjunto e medidas
co
Chamamos fun¸˜o de conjunto a toda a fun¸˜o µ definida numa classe C de subcon-
ca ca
juntos de X com valores em IR = IR ∪ {−∞} ∪ {+∞}. Em IR consideramos a rela¸˜oca
de ordem ´bvia com −∞ e +∞ os elementos m´
o ınimo e m´ximo, respectivamente.
a
Seremos frequentemente conduzidos a operar os elementos de IR com +∞ e −∞.
Usaremos para o efeito as seguintes conven¸˜es:
co
(±∞) + (±∞) = (±∞) + x = x + (±∞) = ±∞, ∀x ∈ IR,
x/(±∞) = 0, ∀x ∈ IR,
±∞, x ∈ ]0, +∞]
x · (±∞) = (±∞) · x = 0, x=0
∓∞, x ∈ [−∞, 0[.
As opera¸˜es (+∞) + (−∞), (−∞) + (+∞) e ∞/∞ n˜o est˜o definidas.
co a a
Uma fun¸˜o de conjunto µ diz-se aditiva se para todo o A, B ∈ C, com A ∪ B ∈ C e
ca
A ∩ B = ∅, a soma µ(A) + µ(B) est´ bem definida e
a
µ(A + B) = µ(A) + µ(B).
19
28. 20 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
µ diz-se finitamente aditiva se para toda a classe disjunta {A1 , . . . , An } ⊂ C, com
n
i=1 Ai∈ C, a soma µ(Ai ) + µ(Aj ) est´ bem definida para todo o i = j e
a
n n
µ Ai = µ(Ai ).
i=1 i=1
µ diz-se σ-aditiva ou completamente aditiva se para toda a sucess˜o de conjuntos
a
∞
disjuntos A1 , A2 , . . . ∈ C, com i=1 Ai ∈ C, a soma µ(Ai ) + µ(Aj ) est´ bem definida
a
tenreiro@mat.uc.pt
para todo o i = j e
∞ ∞
µ Ai = µ(Ai ).
i=1 i=1
Uma fun¸˜o de conjunto σ-aditiva ´ finitamente aditiva se ∅ ∈ C. Uma fun¸˜o de
ca e ca
conjunto aditiva pode n˜o ser finitamente aditiva.
a
Se µ ´ uma fun¸˜o de conjunto aditiva, a soma µ(A) + µ(B) est´ definida para todo
e ca a
par de conjuntos disjuntos A e B em C cuja reuni˜o esteja em C. Assim, se C ´ um anel
a e
de partes de X, µ toma apenas um dos valores +∞ ou −∞. Com efeito, se existissem
A e B em C com µ(A) = +∞ e µ(B) = −∞, ent˜o a
+∞ = µ(A) = µ(A − B) + µ(A ∩ B)
e
−∞ = µ(B) = µ(B − A) + µ(A ∩ B),
o que implica que |µ(A ∩ B)| < +∞. Assim µ(A − B) = +∞ e µ(B − A) = −∞, ficando
sem sentido a igualdade
µ(A△B) = µ(A − B) + µ(B − A).
Coment´rios an´logos valem para as outras no¸˜es de aditividade.
a a co
Durante a primeira parte deste curso, estudamos determinadas fun¸˜es de conjunto
co
n˜o-negativas a que chamamos medidas (ver §0.3). Mais precisamente:
a
Defini¸˜o 2.1.1 Sendo C uma classe de subconjuntos de X com ∅ ∈ C, chamamos
ca
medida em C a toda a fun¸ao de conjunto µ, n˜o-negativa e σ-aditiva com µ(∅) = 0.
c˜ a
Se A ∈ C, µ(A) diz-se medida de A.
No que se segue, quando dizemos que µ ´ uma medida em C admitiremos que ∅ ∈ C.
e
Exemplos: 1. Sejam X um conjunto n˜o-vazio e x ∈ X. A aplica¸˜o δx : P(X) →
a ca
{0, 1} definida por
0 se x ∈ A
/
δx (A) =
1 se x ∈ A
29. 2 Medidas e prolongamento de medidas 21
´ uma medida em P(X), dita medida de Dirac no ponto x.
e
2. A fun¸˜o µ : P(X) → [0, +∞] definida por µ(A) = #A (:= cardinal de A) se
ca
A ´ finito e µ(A) = +∞ se A ´ infinito, ´ uma medida em P(X) a que chamamos
e e e
medida contagem em X. Se X = {x1 , x2 , . . .} a medida contagem pode ser escrita na
forma
+∞ +∞
µ(A) = δxi (A) = 1 A (xi ),
I
i=1 i=1
tenreiro@mat.uc.pt
onde 1 A : X → IR ´ a fun¸˜o indicatriz de A (1 A (x) = 1 se x ∈ A e 1 A (x) = 0 se
I e ca I I
x ∈ A). Se nada for dito em contr´rio, consideramos 1 A definida em todo o espa¸o X.
/ a I c
3. Sendo C o semi-anel definido no Exemplo 1.2.2, a fun¸˜o de conjunto λ : C →
ca
[0, +∞[ definida por λ(]a, b]) = b − a, que coincide em C com a medida de Jordan, ´e
uma medida em C (ver Exerc´ 2.9.4).
ıcio
De entre todas as medidas, aquelas que sabemos verdadeiramente estudar s˜o as
a
medidas finitas e as medidas σ-finitas. Se µ ´ uma medida em C, um conjunto A ∈ C
e
diz-se de medida finita se µ(A) < +∞. A medida de A diz-se σ-finita quando existe
uma sucess˜o (An ) em C tal que A ⊂ ∞ An e µ(An ) < +∞, n = 1, 2, . . .. Se a
a n=1
medida de todo o conjunto de C ´ finita (resp. σ-finita), µ diz-se finita em C (resp.
e
σ-finita em C). As no¸˜es anteriores podem, de forma natural, ser extendidas a fun¸˜es
co co
de conjunto quaisquer.
Finalmente, uma medida definida numa σ-´lgebra de partes de X diz-se uma
a
probabilidade se µ(X) = 1.
2.2 Propriedades das medidas
Neste par´grafo obtemos as primeiras propriedades das medidas. No que se segue
a
µ ´ uma medida num anel C de partes de X.
e
Teorema 2.2.1 Se A, B ∈ C com A ⊂ B, ent˜o µ(A) ≤ µ(B) (monotonia de µ).
a
Demonstra¸˜o: Como B = A + (B − A), da aditividade e da n˜o-negatividade de µ
ca a
obtemos µ(B) = µ(A) + µ(B − A) ≥ µ(A).
Teorema 2.2.2 Se A, B ∈ C com A ⊂ B e µ(A) < +∞, ent˜o µ(B−A) = µ(B)−µ(A).
a
Demonstra¸˜o: Consequˆncia da igualdade µ(B) = µ(A) + µ(B − A) obtida na
ca e
demonstra¸˜o anterior.
ca
Teorema 2.2.3 Se A ∈ C e (An ) ⊂ C ´ uma sucess˜o de conjuntos disjuntos dois a
e a
∞ ∞
dois com n=1 An ⊂ A, ent˜o n=1 µ(An ) ≤ µ(A).
a
30. 22 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
Demonstra¸˜o: Como k An ⊂ A, da monotonia e aditividade finita de µ con-
ca n=1
ımos que k µ(An ) ≤ µ(A), para todo o k ∈ IN (reparar que ∞ An n˜o est´
clu´ n=1 n=1 a a
necessariamente em C).
Teorema 2.2.4 Se A ∈ C e (An ) ⊂ C com A ⊂ ∞ An , ent˜o µ(A) ≤ ∞ µ(An ).
n=1 a n=1
∞ ∞ ∞
Em particular, µ( n=1 An ) ≤ n=1 µ(An ) se n=1 An ∈ C (µ ´ σ-subaditiva ou com-
e
pletamente subaditiva).
tenreiro@mat.uc.pt
Demonstra¸˜o: Sendo C um anel, existe (Bn ) ⊂ C com Bn ⊂ An , para todo o
ca
n ∈ IN, tal que ∞ An = ∞ Bn (cf. Exerc´ 1.5.6). Como A = ∞ A ∩ An =
n=1 n=1 ıcio n=1
∞
n=1 A ∩ Bn e A ∩ Bn ∈ C, para todo o n ∈ IN, obtemos µ(A) = ∞ µ(A ∩ Bn ) ≤
n=1
∞
n=1 µ(Bn ) ≤ ∞ µ(An ).
n=1
Teorema 2.2.5 Se (An ) ´ uma sucess˜o crescente em C tal que lim An ∈ C, ent˜o
e a a
µ(lim An ) = lim µ(An ) (continuidade ascendente de µ).
Demonstra¸˜o: Definindo A0 = ∅, obtemos sucessivamente µ(lim An ) = µ( ∞ An ) =
ca n=1
µ( n=1 (An −An−1 )) = ∞ µ(An −An−1 ) = lim k µ(An −An−1 ) = lim µ( k (An
∞
n=1 n=1 n=1
−An−1 )) = lim µ(Ak ).
Teorema 2.2.6 Se (An ) ´ uma sucess˜o decrescente em C com pelo menos um dos seus
e a
elementos de medida finita e lim An ∈ C, ent˜o µ(lim An ) = lim µ(An ) (continuidade
a
descendente de µ).
Demonstra¸˜o: Basta usar a continuidade ascendente de µ relativamente ` sucess˜o
ca a a
(Am − An )n≥m , onde m ∈ IN ´ tal que µ(Am ) < +∞.
e
Apresentamos de seguida algumas caracteriza¸˜es das medidas.
co
Teorema 2.2.7 Sendo µ uma fun¸ao de conjunto, n˜o-negativa e aditiva em C com
c˜ a
µ(∅) = 0, as proposi¸oes seguintes s˜o equivalentes:
c˜ a
i) µ ´ uma medida;
e
ii) µ ´ ascendentemente cont´nua.
e ı
Sendo µ finita, as proposi¸oes anteriores s˜o ainda equivalentes a:
c˜ a
iii) µ ´ descendentemente cont´nua;
e ı
iv) µ ´ descendentemente cont´nua em ∅.
e ı
Demonstra¸˜o: Pelos Teoremas 2.2.5 e 2.2.6, i) ⇒ ii) e i) ⇒ iii). Como iii) ⇒ iv),
ca
basta ent˜o mostrar que ii) ⇒ i) e iv) ⇒ i).
a
ii) ⇒ i): Seja (An ) uma sucess˜o em C de conjuntos disjuntos dois a dois tal que
a
∞
A = n=1 An ∈ C. Para n ∈ IN, consideremos Bn = n Ak . A sucess˜o (Bn ) est´ em
k=1 a a
31. 2 Medidas e prolongamento de medidas 23
C e satisfaz Bn ↑ A. Assim, por hip´tese e pela aditividade de µ, µ(A) = µ(lim Bn ) =
o
n ∞
lim µ(Bn ) = lim k=1 µ(Ak ) = k=1 µ(Ak ).
iv) ⇒ i): Mantendo a nota¸˜o anterior, a sucess˜o Cn = A − Bn , n ∈ IN, ´ uma
ca a e
sucess˜o decrescente de elementos de C com lim Cn = ∅. Por hip´tese, lim µ(Cn ) =
a o
µ(∅) = 0. Para concluir, basta agora notar que, pela aditividade de µ, µ(A) = µ(Cn ) +
n
k=1 µ(Ak ), para todo o n ∈ IN.
Notemos que se C ´ um σ-anel, as propriedades anteriores podem ser enunciadas
e
tenreiro@mat.uc.pt
de forma mais simples visto poderem ser, nesse caso, suprimidas parte das hip´teses.
o
Notemos tamb´m que, tendo em conta o Exerc´ 2.9.8, os Teoremas 2.2.1-2.2.6 valem
e ıcio
para C semi-anel de partes de X, bastando, no caso dos Teoremas 2.2.1-2.2.3, exigir
que µ seja finitamente aditiva.
2.3 Medida exterior e medida induzida
Em geral, a defini¸˜o duma medida num σ-anel de partes dum conjunto n˜o pode ser
ca a
feita explicitando a medida de cada um dos seus elementos. Exceptuam-se naturalmente
casos simples como os considerados nos Exemplos 2.1.1 e 2.1.2 anteriores, ou o caso de
medidas definidas ` custa de medidas previamente definidas no σ-anel (ver os Exerc´
a ıcios
2.9.5 e 2.9.6).
O m´todo geral para construir medidas que vamos estudar, passa pela no¸˜o de
e ca
medida exterior que consideramos de seguida. Uma medida exterior ´, como veremos,
e
uma fun¸˜o de conjunto definida numa classe n˜o-vazia H de partes de X que cont´m
ca a e
todos os subconjuntos de todos os seus elementos, isto ´, dados A ∈ H e B ⊂ A ent˜o
e a
B ∈ H. Dizemos ent˜o que H ´ uma classe heredit´ria. O conjunto vazio pertence a
a e a
qualquer classe heredit´ria.
a
Um exemplo simples duma classe heredit´ria ´ a classe P(X) das partes de X.
a e
Notemos que se H ´ classe heredit´ria, ent˜o H = P(X) se e s´ se H cont´m X.
e a a o e
Interessar-nos-emos em particular pelas classes heredit´rias que s˜o σ-an´is, a que cha-
a a e
mamos σ-an´is heredit´rios. Facilmente se conclui que uma classe heredit´ria ´ um
e a a e
σ-anel se e s´ se for est´vel para a reuni˜o numer´vel. Se H ´ um σ-anel heredit´rio,
o a a a e a
∞
ent˜o H = P(X) se e s´ se H cont´m uma sucess˜o (Xn ) tal que X = n=1 Xn .
a o e a
Passemos ent˜o ` no¸˜o de medida exterior (o Teorema 2.4.2 ´ esclarecedor no que
a a ca e
respeita a esta designa¸˜o).
ca
Defini¸˜o 2.3.1 Uma fun¸ao de conjunto ϕ definida num σ-anel herdit´rio H, diz-se
ca c˜ a
uma medida exterior quando:
a) ϕ(∅) = 0;
32. 24 Apontamentos de Medida e Integra¸ao
c˜
b) se A, B ∈ H com A ⊂ B ent˜o ϕ(A) ≤ ϕ(B) (monotonia);
a
∞ ∞
c) para toda a sucess˜o (An ) em H, ϕ(
a i=1 Ai ) ≤ i=1 ϕ(Ai ) (subaditividade com-
pleta ou σ-subaditividade).
Uma medida exterior ´ n˜o-negativa, mas n˜o ´ necessariamente σ-aditiva (consi-
e a a e
dere ϕ : P(X) → [0, +∞] definida por ϕ(A) = 0 se A = ∅ e ϕ(A) = 1 se A = ∅). No
entanto a σ-subaditividade implica a subaditividade finita. Toda a medida num σ-anel
tenreiro@mat.uc.pt
herdit´rio ´ uma medida exterior.
a e
Sabemos j´ que uma medida exterior em H n˜o ´ necessariamente uma medida em
a a e
H. No entanto, como veremos de seguida, uma medida exterior ϕ induz uma medida
definida numa adequada subclasse de H.
Defini¸˜o 2.3.2 (Carath´odory) Diz-se que A ∈ H ´ ϕ-mensur´vel se
ca e e a
ϕ(Q) = ϕ(QA) + ϕ(QAc ), para todo o Q ∈ H.
Como Q = QA + QAc ent˜o se A ´ ϕ-mensur´vel, ϕ ´ aditiva na parti¸˜o de Q
a e a e ca
por A, para todo o Q ∈ H. Notemos que como H ´ classe herdit´ria, QA e QAc s˜o
e a a
elementos de H visto serem subconjuntos de Q.
O conjunto vazio ´ ϕ-mensur´vel, e se X ∈ H, X ´ tamb´m ϕ-mensur´vel.
e a e e a
Proposi¸˜o 2.3.3 (crit´rio de ϕ-mensurabilidade) Para que A ∈ H seja ϕ-mensu-
ca e
r´vel basta que ϕ(Q) ≥ ϕ(QA) + ϕ(QAc ), para todo o Q ∈ H com ϕ(Q) < +∞.
a
Demonstra¸˜o: Consequˆncia da subaditividade finita de ϕ.
ca e
Provamos de seguida que a classe Λ das partes ϕ-mensur´veis de X ´ um σ-anel e
a e
que a restri¸˜o de ϕ a Λ ´ uma medida.
ca e
Lema 2.3.4 A classe Λ das partes ϕ-mensur´veis de H ´ um anel de partes de X.
a e
Demonstra¸˜o: Dados A, B ∈ Λ e Q ∈ H, temos sucessivamente ϕ(Q) = ϕ(QA) +
ca
ϕ(QA c ) = ϕ(QAB) + ϕ(QAB c ) + ϕ(QAc B) + ϕ(QAc B c ) ≥ ϕ(Q(A − B)) + ϕ(Q(AB c +
Ac B + Ac B c )) = ϕ(Q(A − B)) + ϕ(Q(A − B)c ). Λ ´ assim est´vel para a diferen¸a. De
e a c
forma an´loga se conclui que Λ ´ est´vel para a reuni˜o finita.
a e a a
Lema 2.3.5 Para qualquer sucess˜o (An ) de elementos de Λ disjuntos dois a dois e
a
para todo o k ∈ I ∪ {+∞}, ϕ(Q k Ai ) = k ϕ(QAi ), para todo o Q ∈ H. Al´m
N i=1 i=1 e
disso, se (Bn ) ´ uma sucess˜o crescente de elementos de Λ convergente para B, ent˜o
e a a
ϕ(QBn ) ↑ ϕ(QB), para todo o Q ∈ H.