O documento discute problemas comportamentais que podem levar à demissão de funcionários, como mau comportamento, mentiras, agressividade e falta de capacidade de trabalhar em equipe. Comportamento é a principal causa de demissão, responsável por 34% dos casos.
1. 75 RH Supermercado moderno • fevereiro 2011
mau comportamento
Decisivo na demissão
A
Por Fernando Salles |
salles@lund.com.br |
Não adianta ser competente.
O profissional que gera
formação acadêmica incluía curso
superior e pós-graduação em uni- atritos entre colegas, mente
versidades conceituadas. Dotado com frequência, é explosivo,
de raciocínio rápido, era campeão
em proatividade nas dinâmicas de arrogante, passa horas
grupo. Com ótimo português, pos- improdutivas na internet
tura confiante e dicção perfeita, fa-
lar em público estava longe de ser um problema. As quali-
costuma fazer estragos no
dades do candidato eram tantas, que a diretora de recur- clima das empresas e não é
sos humanos brincou que o gestor havia ganho na loteria.
Considerado, de cara, “um líder nato”, o candidato em
bem-vindo. Conheça os
questão não havia parado muito tempo em nenhuma em- principais problemas
presa, é bem verdade, mas sabia justificar tal fato com a comportamentais e saiba
“necessidade de, no passado, adquirir experiência em to-
das as vertentes da área que escolheu”. como lidar com eles.
Na estreia no novo trabalho, chegou sem dizer
“bom dia” a nenhum colega. “Ansiedade do pri-
meiro dia”, pensou o chefe. Veio a primeira
reunião, momento em que apresentou boas
ideias, mas reagiu de forma ríspida a quase to-
dos os questionamentos que recebeu e mostrou
total desinteresse em ouvir as sugestões dos
outros. Na segunda semana, aproveitava a
hora do cafezinho para falar mal de
algum colega ausente no momento.
Com menos de um mês no empre-
go, já tinha a antipatia dos fun-
cionários de todas as áreas.
Apesar de competente em sua
função, criou tantos atritos,
que fez despencar a pro-
dutividade e os índices
de satisfação do restan-
2. 76 | RH | Supermercado moderno • fevereiro 2011
demiSSõeS
te da equipe. Manteve a conduta
mesmo após advertência do ges- O Que MOtiVa uMa DeMissÃO
tor e da diretora de RH, e termi-
nou demitido. 34% 28%
Comportamento Baixo
O exemplo é fictício, mas re- 5%
desempenho
trata situação comum em muitos Outros
ambientes de trabalho. “As com- 1%
petências técnicas estão no currí- Meta não
atingida uma
culo, mas elas não bastam para só vez 20%
Falta de
garantir bom desempenho. A 6% alinhamento
Metas não 6% com valores/
postura comportamental, mais atingidas Cortes de objetivos da
difícil de ser avaliada, também in- recorrentemente custos empresa
fluencia muito”, explica Meiry Ka-
foNte: Site de eMPreGoS CUrriCULUM.CoM.Br
mia, diretora da Human Value,
empresa de consultoria, treina- Para Juliana Saldanha, psicóloga e consultora de
mento e desenvolvimento de pes- RH do Grupo Soma, se antes a capacidade do profis-
soas. Os números dão razão a ela: sional fazia com que muitas empresas fechassem os
pesquisa realizada pelo site de em- olhos para desvios de conduta, hoje é cada vez mais
pregos Curriculum com 417 em- raro que isso aconteça. “Atualmente, há no mercado
presas mostra que comportamen- muita gente boa tecnicamente. O desafio é ser supe-
to é o principal motivo das demis- rior nos quesitos comportamentais”, garante.
sões, com 34,1% de participação.
O índice é superior MentIrosos reCorrentes
Competências ao fator que aparece eles podem estar procurando um novo emprego
técnicas não em segundo lugar, o
baixo desempenho, Mentir frequentemente é um exemplo de falha de
bastam para com 28,1%. comportamento que pode tornar inviável a presença
garantir bom de um profissional na empresa. Meiry Kamia, da
Human Value, explica que desculpas para justificar
desempenho. atrasos estão entre as mais comuns. Algumas são
o comportamento inofensivas, desde que não se tornem frequentes.
também deve No entanto, há também quem minta para justificar
faltas que atrapalham a produtividade e sobrecarre-
ser analisado gam os colegas de trabalho. Casos em que a des-
para se evitar culpa de um inexistente problema familiar
problemas. de saúde é usada, podem ter como moti-
vo real um “bico” (outro trabalho) para
conseguir dinheiro extra ou mesmo
uma entrevista de emprego em outra
empresa. Ambas as situações são
geradas, sobretudo, por insatisfa-
ções com o trabalho ou com o salá-
rio recebido. Sofrem menos com
3. 78 | RH | Supermercado moderno • fevereiro 2011
demiSSõeS
elas, conforme lem- Mentirosos gerar problemas maiores conforme atin-
bra Meiry, empresas ge níveis hierárquicos mais altos. “É um
com políticas estabe-
em altos cargos: grande risco ter alguém com esse com-
lecidas de desenvolvi- lembre que eles portamento acessando dados confi-
mento profissional, têm acesso a denciais da empresa”, exemplifica a
como plano de carrei- consultora. Sobre informações confi-
ra e estratégia de car-
dados denciais, Juliana Saldanha, do Grupo
gos e salários que in- confidenciais Soma, acrescenta que divulgá-las sem
clua possibilidade de permissão é um dos motivos geradores
promoções e de aumento nos ren- de demissão por justa causa nas empresas.
dimentos por mérito.
Investir em cursos e treina- aCoMoDaÇÃo e DesMotIVaÇÃo
mentos é outra forma de reter o profissional precisa ser desafiado a assumir novos projetos
bons profissionais e retardar a
busca por oportunidades fora da Torcer para não ser lembrado na hora em que sur-
empresa. Nesse quesito, um bom gem projetos além das rotinas de trabalho e jamais
exemplo vem da rede carioca Pre- sugerir algo novo pode ser sintoma de acomodação
zunic. A empresa mantém pro- e desmotivação, dois problemas de comportamen-
gramas como o Novo Telecurso, to que podem surgir isoladamente ou em conjunto.
que estimula os colaboradores a Para a consultora Meiry Kamia, profissionais aco-
retomar os estudos, com apoio de modados são ruins em muitas situações, mas não
orientadores especiais de apren- em todas. A especialista explica que a característica
dizado, além de material didático. aparece, muitas vezes, em alguém que desempenha
Ao gestor também cabe o papel muito bem aquilo que se propõe a fazer, mas não
de identificar outras mentiras que tem ambição de galgar posições. Se a empresa tam-
apareçam no dia a dia. Prin- bém não tem planos de crescimento para aquele
cipalmente porque al- profissional – e, claro, precisa dele na função atual
guém com essa falha – não há razões para preocupação. É o que costuma
de conduta pode acontecer em empresas conservadoras, onde pla-
nos de expansão inexistem, ou em
cargos estritamente técnicos, por
exemplo. Complicado mesmo é
“o gestor deve
joão de freitaS
quando a empresa está em cresci-
revelar para o mento e conta com estratégia para
funcionário a sucessão de cargos. Nesse caso, o
conduta que funcionário “estacionado” precisa ser
desafiado a assumir novas responsa-
desaprova
bilidades. Sem uma reação positiva,
e solicitar a demissão costuma ocorrer.
mudança” Pior ainda quando a acomodação
é gerada por um sentimento de des-
MEIRY KAMIA,
DIRETORA DA HUMAN VALUE motivação com a empresa ou com a
função exercida. Sobrecarga de traba-
4. 80 | RH | Supermercado moderno • fevereiro 2011
demiSSõeS
odos suficientes de descanso e cujos efeitos prejudi-
cam o desempenho profissional e a vida pessoal.
Para que problemas desse tipo não ocorram, uma
boa alternativa – já utilizada em muitas companhias
– é montar um programa de qualidade de vida no
trabalho (QVT). Com várias possibilidades de im-
plantação, o recurso tem o objetivo de orientar os
funcionários sobre eventuais riscos à saúde e encora-
jar a adoção de um estilo de vida saudável, com
ações como boa alimentação e prática de atividades
físicas. Uma dica é buscar na sua região empresas de
outros segmentos que obtiveram sucesso na imple-
mentação de um programa de QVT. Distribuir as
tarefas de modo a evitar sobrecargas de trabalho e
definir metas ousadas, mas possíveis, são ações que
Sobrecarga de trabalho, metas podem partir do gestor. Já para o funcionário, a re-
inatingíveis, falta de comendação é conversar sobre os seus problemas e,
quando preciso, saber dizer “não” ao ser destacado
reconhecimento e de perspectivas
para tarefas adicionais.
de ascensão estão entre as
principais causas da Internet para uso pessoal
desmotivação excesso prejudica produtividade e qualidade do trabalho
Uso abusivo da internet é outro problema recorren-
lho, metas inatingíveis, falta de re- te nas corporações. Os jovens, tão acostumados a
conhecimento e de perspectivas utilizar redes sociais como Orkut, Twitter e Face-
de ascensão estão entre as princi- book e programas de comunicação como MSN, le-
pais causas. Nesse estágio, o es- vam o costume para o ambiente de trabalho. Em
tresse ocupacional costuma ser muitas áreas, a utilização desses recursos é necessá-
tão alto a ponto de prejudicar a ria para buscar informações relevantes à área de
saúde do funcionário. “Quem pas- atuação. O problema começa quando o uso para
sa por isso costuma ter dores de fins pessoais passa a ser exagerado e a prejudicar o
cabeça e musculares mais frequen- desempenho. “Há casos de empresas que, ao moni-
tes. Dependendo da função, ocor- torar os acessos, perceberam que alguns funcioná-
rem lesões por esforço repetitivo e rios passavam tardes inteiras utilizando a internet
até acidentes de trabalho”, comen- para fins pessoais”, conta Meiry Kamia.
ta a diretora da Human Value. A melhor forma de minimizar o problema é esta-
Sem uma interrupção nesse pro- belecer regras claras para utilização dessas ferra-
cesso, o quadro pode evoluir para mentas. Para isso, algumas empresas adotam como
algo conhecido na área psiquiátri- procedimento exigir, no primeiro dia de trabalho,
ca como Síndrome de Burnout, que o funcionário assine um termo comprovando
um transtorno gerado pelo exces- estar ciente das regras. Feito isso, não há como ale-
so de estafa no trabalho sem perí- gar desconhecimento. “Há quem não perceba o
5. 82 | RH | Supermercado moderno • fevereiro 2011
demiSSõeS
tempo perdido na internet e se outros casos, ela parte de quem é, comprovadamen-
faça de vítima quando questiona- te, muito capaz, mas julga-se acima do bem e do
do”, afirma a consultora. “É im- mal, a ponto de menosprezar ideias de terceiros e
portante mostrar claramente quais não aceitar que as suas sejam contestadas.
foram os excessos, apontando, por Agressivos ao extremo e pessoas incapazes de
exemplo o dia e o tempo de nave- manter a calma em momentos de pressão também
gação”, recomenda Meiry. são figuras fáceis no ambiente corporativo. Juliana
Saldanha, consultora de RH do Grupo Soma, avisa
relaÇÃo Interpessoal que, na medida certa, a postura agressiva pode ser
o inferno nem sempre são os outros útil para quem trabalha em determinadas áreas,
como a comercial, na qual negociações duras fa-
Quando o assunto é a relação com zem parte da rotina. Em excesso, porém, prejudica
chefes e colegas, a lista de com- o profissional e quem convive com ele. “Trabalhar
portamentos que só atrapalham é bem em equipe é cada vez mais necessário, e o mer-
cado valoriza quem tem mais traços democráticos
do que autoritários”, afirma a consultora.
os Mal-HuMoraDos
Pessimismo pode contaminar colegas
Quem não mede a agressividade perde pontos com
chefe e colegas, e o mesmo acontece com os mal-
humorados de plantão, nos casos em que o pessi-
mismo contamina colegas. Mas vale ressaltar que
divULGaÇão
todos estamos sujeitos a dias dis-
tantes do bom humor e isso, co-
mumente, passa longe de se tor-
“o saldo entre nar um problema. “A questão é o
capacidade técnica impacto gerado na equipe e no
negócio. Se for nulo, não há ra-
e comportamento
zões para preocupação”, destaca
das mais extensas. define como é Juliana, que faz questão de desfa-
Vai desde situações um profissional” zer o mito de que o ideal é ter na
pontuais, como in- JULIANA SALDANHA, CONSULTORA
equipe quem enxergue apenas o
trigas e fofocas ge- DE RH DO GRUPO SOMA lado bom das coisas. “Otimismo
radoras de descon- demais pode ser sinal de falta de
fiança e atritos, até senso crítico e de leitura errada
ocorrências ainda da realidade”, comenta.
mais problemáticas. Postura arro- Com maior ou menor impacto, o fato é que cer-
gante é uma delas. Às vezes a arro- tas atitudes nas relações com colegas costumam
gância no trabalho é sinal de inse- surpreender os gestores envolvidos na contratação
gurança e medo de que descu- do profissional. Uma forma de minimizar decep-
bram as próprias deficiências. Em ções é fazer a lição de casa antes de iniciar o proces-
6. 84 | RH | Supermercado moderno • fevereiro 2011
demiSSõeS
so de seleção. O primeiro passo, empresa incentiva a troca de informações entre as
segundo Juliana, é traçar detalha- equipes”. A solução não virá em 100% dos casos, já
damente o perfil procurado para que depende também da disponibilidade do profis-
a função – técnico e, claro, com- sional em mudar o comportamento, mas a advertên-
portamental. Por mais urgência cia servirá para deixar claro quais práticas a empresa
que a empresa tenha, o processo valoriza e quais comportamentos ela reprova. Aliás,
deve ser conduzido com calma e essa é uma tarefa sem data de conclusão. A cada
envolver várias etapas, como aná- novo funcionário, um novo desafio. Sm
lise de currículos, entrevistas, di-
nâmicas de grupo, testes psicoló-
gicos e provas situacionais, que
simulam rotinas de trabalho com
as quais o candidato terá de lidar.
Nessas provas sempre é possível
identificar posturas que poderão
prejudicar a relação do profissio-
joão de freitaS
nal com chefes, colegas e subordi-
nados. “Alguns testes avaliam se a
pessoa tem mais traços
O feedback é extrovertidos ou intro-
um dos recursos vertidos, o que ou di-
trazer facilidades
pode
que a empresa ficuldades para o profis- Postura do chefe pode ser
‘convite’ ao mau comportamento
pode usar para sional no exercício da
orientar o atividade, que for ocu- Q
dependendo uestionado sobre as características de um bom
do cargo técnico de futebol, o craque Romário certa vez
funcionário e par”, diz Juliana, com a disparou: “É aquele que não atrapalha”. Não seria justo
corrigir atitudes ressalva de que os testes afirmar que o mesmo raciocínio define um bom líder,
não são eliminatórios. mas é fato que a má liderança influencia a maioria dos
Quando essa ação preventiva desligamentos de funcionários. Pelo menos é nisso
que acredita TaTsumi Ebina , sócio da consultoria
não dá resultados, é hora de o ges-
Muttare. Para ele, muitos líderes se envolvem nas
tor agir e dar o chamado feedback
rotinas de trabalho e deixam de gerir a equipe. São
(retorno sobre o desempenho),
pessoas centralizadoras, que resistem a delegar tarefas,
conforme orienta Meiry Kamia. inibem a criatividade e a proatividade de funcionários.
Nessa conversa, o gestor deve ter o “Sem espaço, o profissional deixa de ousar, falta com
cuidado de ser objetivo e relem- frequência ao trabalho e se mantém na empresa apenas
brar tempo e espaço da ocorrência até receber outra proposta”, afirma. “É preciso, portanto,
que o desagradou. Vale dizer, por cuidar também das lideranças.”
exemplo: “na reunião da última
sexta você reagiu com agressivida- Mais infO rMações:
de quando sua colega fez aquele CurriCuluM: www.curriculum.com.br
HuMan Value: www.hvalue.com.br
comentário. Esse não é um proce- GruPO sOMa: www.gruposoma.net
Muttare: www.muttare.com.br
dimento recomendado, pois nossa PrezuniC: www.prezunic.com.br