O documento discute as recentes manifestações de jovens brasileiros, que expressam insatisfação com problemas como saúde, educação e segurança, além de corrupção. Apesar do crescimento econômico, há falta de oportunidades e perspectivas para os jovens. As manifestações pedem menos gastos com a Copa e mais investimentos em áreas essenciais, porém os governantes não têm compreendido totalmente os anseios dos manifestantes.
1. 1
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
Texto faz uma reflexão sobre as recentes manifestações da juventude brasileira, que
iniciou-se durante a Copa das Confederações, tentando um entendimento desse
histórico momento para a sociedade e para os seus poderes legalmente instituídos - os
quais não conseguiram perceber e alinhar as suas políticas públicas e nem as suas
ações aos anseios dos milhões de jovens que foram às ruas, reivindicar e manifestar a
sua indignação.
________________________________________________________
Enquanto os graves problemas de saúde, da falta de oportunidades de
trabalho, de educação, de habitação, de saneamento, da impunidade aos
corruptos, da falta de segurança com aumento da criminalidade e de outros,
como o dos indígenas, dos sem teto, dos sem terra, da tentativa da retirada
dos avanços e da segurança institucional com a PEC 37; embora sejamos um
país que apareça como estandarte dos novos tempos – aberto ao mundo e a
todos, com uma economia pujante e crescente - “livre de crises mundiais” -
vemos a retomada da inflação e o aumento do custo de vida, a falta de
segurança crescente e a saúde pública num verdadeiro caos, enquanto
esmaece o sentimento de que tenhamos representatividade .
O Brasil passa por uma crise de representatividade e de insatisfação
generalizada, que tem origem em várias fontes. É um país que menos
oportunidade dá aos seus jovens, que assim, encontram outros caminhos mais
fáceis e convidativos: o do álcool, o das drogas, o da criminalidade e, também
o do vandalismo e da rebeldia.
Mas jovens em busca dos seus sonhos, de caminhos e no exercício prático da
cidadania, agora agem e mostram pelo Brasil a sua consciência dos
problemas, a organização e a indignação, que vem junto com essa parte de
rebeldia. Poucos dentre estes praticam o vandalismo, que também é uma
2. 2
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
forma de comunicação da indignação extrema, mas que pode levar ao
terrorismo – e algumas ações se aproximam muito disso – embora os
movimentos sejam pacíficos.
O álibe para demonstração do descontentamento foi o do aumento das
passagens de ônibus, mas o contexto é o da “insatisfação – deles – em nome
de todo o povo brasileiro” e do seu direito de protestar. Junto com a
indignação dos jovens, está a insatisfação dos adultos, dos idosos, dos
excluídos; que também participaram destes movimentos e manifestações.
E essa demonstração chega a Brasília, à Esplanada dos Ministérios; ao
Congresso Nacional, ao Palácio do Planalto e a todas as sedes de governo das
capitais e dos Estados da Federação, encampando as principais ruas das
capitais brasileiras. Chega às portas da concentração da seleção brasileira em
Fortaleza, hospedada num hotel para a disputa contra o México; chega à
Arena Castelão, onde o jogo se realizou, no “Movimento Mais Pão, Menos
Circo – Copa Pra Quem ?”, que busca melhores serviços públicos e menos
gastos com a copa e se espraia pelo Brasil.
Mas a mensagem parece que não está sendo entendida por completo, pois
governantes anunciam redução de cinco, dez, vinte centavos no preço das
passagens. Os protestos, não são só pelo aumento das passagens; pedem
menos dinheiro para a copa e mais investimentos em saúde, em educação;
em segurança pública e, explicitam um conjunto de indignações para com
suas vidas sem perspectivas num país que abre suas portas para o trabalho
estrangeiro sem dá-lo a certeza aos nossos; que relega os espaços que seriam
para a sua inclusão – como os de esportes, de lazer e recreação; de cultura,
de educação1 – os quais poderiam ajudar no processo desta inclusão e de
1 - Há 3 anos propusemos “o inventário completo da infraestrutura de esporte e lazer em todos os
3. 3
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
exercício da cidadania; mas não encontram os canais para tal.
É essencial dar a oportunidade e criar programas de inclusão dos jovens,
para termos no futuro uma sociedade sustentável !
Os movimentos nas ruas vêem pela insatisfação dos jovens e, eles
tradicionalmente mudam e mudarão os rumos – como mudaram no
movimento dos “caras-pintadas”, nas “diretas já” e marcarão a história do
país – como já marcaram - como um exercício de cidadania, de consciência
e de paz da juventude brasileira; embora os excessos de alguns manifestantes
e do vandalismo praticado pela minoria.
Segundo Paulo Zornitta, “Quem teve educação, faz manifestação e comunica
seus anseios educadamente, em paz; quem não teve, as vezes usa formas não
tão educadas, como a baderna, a arruaça, o vandalismo” 2 e, as vezes até o
anarquismo e o terrorismo – que agridem sem ver a quem.
Mas a comunicação de uma mensagem parece ser o objetivo, que no final é a
mesma. Uma forma – a pacifica - deve ser reconhecida e a outra – radical
aos olhos dos avanços da Lei – punida, mas também compreendida.
No governo de Jack Chirac na França, jovens incendiaram 450 automóveis
em um único dia na França - o que foi chamado de “rebeldia juvenil”, um
movimento que perdurou por meses naquele país. O que diziam eles era
simples, mas o vandalismo foi a sua linguagem para serem ouvidos e
atendidos. Queriam oportunidades, perspectivas, sustentabilidade; serem
municípios brasileiros para fundamentar as políticas e a implantação dos equipamentos e atividades”. Levamos
como Delegado eleito por Fortaleza à III Conferência Nacional do Esporte em Brasília; esta proposta, que foi
aprovada e é constante do PLANO DECENAL DE ESPORTE E LAZER do Governo Federal (Eixo 9, ação 5 e metas)....
......Também propusemos o PLANO NACIONAL DE QUALIFICAÇÃO DOS ESPAÇOS DE ESPORTE E LAZER e, desde
2010 em várias instâncias tentamos sensibilizar gestores para a necessidade, mas, até hoje não recebeu a atenção
devida.
2 Tanto que a maioria dos que partiram para o vandalismo nas manifestações, já tinham passagem
pela polícia.
4. 4
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
ouvidos por uma sociedade que não estava dando o rumo esperado ao país e
ao mundo.
Naquela oportunidade encaminhamos projeto de inclusão pelo esporte e o
lazer à Presidência daquele país, que em dois dias nos enviou resposta,
demonstrando a preocupação em resolver os conflitos e a aceitação de idéias
para tal.
“O importante não é correr e chegar por primeiro, o essencial é saber se
certa é a direção em que se vai !”, sabiamente afirmou Humberto Rhoden.
O Brasil hoje avança e promove eventos de espetáculos esportivos de
abrangência global, como as duas copas e os Jogos Olímpicos, investindo
pesadas somas para isso, enquanto os espaços da prática desportiva e de
lazer nas cercanias dos bairros ficam no esquecimento, entregues ao mais
completo abandono e a criminalidade.
A qualificação e a animação destes espaços em todos os recantos do país,
concomitantemente com os gastos com a Copa, é que poderiam ter
oferecidos um pouco de alento e compensação na linha do lazer, do esporte e
da prática desportiva, mas não houve essa preocupação e o foco dos
investimentos ficou só nos grandes eventos.
Um país que precisa de grandes eventos para olhar para si mesmo e
promover obras, não é um país que se planeja para o futuro. As cidades se
mobilizaram para estes eventos e promoveram obras apressadas e sem
planejamento; destinadas a ligação com as “arenas”3, mas não pensou, por
exemplo, na acessibilidade geral para pessoas com deficiência, idosos e com
mobilidade reduzida; que não se ateve à questões ambientais, de legado e
3
Não temos mais estádios, mas sim arenas – denominação idealizada pela FIFA.
5. 5
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
sustentabilidade.
“– Vem pra rua !”, foi a chamadas de um dos movimentos, que levou
milhões de jovens e manifestantes às ruas para contestar e dizer de forma
clara o seu descontentamento e as suas reivindicações – que não estão sendo
percebidas pelos poderes constituídos.
Está faltando ao poder público ouvir mais a sociedade e o “potencial
endógeno da população” que se oferece para contribuir fora do sistema
político-partidário vigente e que não lhes dá atenção e nem aproveita as suas
idéias.
Para o cidadão que tem a contribuir, que tem competências e que não é
ouvido, é deprimente, frustrante, desestimulador, pois vê-se alijado do
exercício pleno da cidadania. Mormente porque políticos ineptos e
despreparados assumem o comando dos seus destinos e de todos, ocupando
cargos em todas as esferas do executivo, do legislativo e em todos os escalões;
enquanto aqueles que se preparam nas diversas áreas do conhecimento – e
através da “educação” - não encontram o espaço para darem a sua
contribuição e ainda vêem ameaçada a perspectiva de futuro profissional com
a abertura dos portões ao trabalho estrangeiro.
A educação, embora alardeada por todos, não é a lógica praticada na gestão
do país, mas sim a acomodação político-partidária. Isso é patente, isso é
indignante, isso é trágico e paradoxal.
Vamos trocar o Felipão por um político e vamos ver se a seleção vai !!!
(não iria e também causaria derrotas e indignação).
O Brasil está precisando ouvir a sociedade e contar com os seus talentos;
com a voz dos jovens e de toda a população !!!
6. 6
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
E, para aqueles que estão no poder, os políticos de plantão; de uma pseudo–
estrutura esquizofrênica de “governabilidade”, mas não mais de princípios e
ideologia - que dantes fomentava a organização política - que efetivamente
não têm tido a percepção e menos ainda ouvidos; que não mais atende aos
princípios de representatividade de quem constituímos no poder; as
mensagens que estão vindo da contestação, devem ser repensadas pelos
grupos de poder aos quais estes partidos e políticos representam.
E, não ser ouvido por políticos reconhecidamente corruptos ou acusados
de corrupção, cuja justiça não consegue impor–lhes as penas; é o caminho
do fim, criado pela crise de representatividade, pois assim, perde-se todos
os possíveis vínculos de respeito e de representatividade de quem foi
constituído para nos representar.
Nas manifestações atuais dos jovens brasileiros, o descontentamento e a
rebeldia manifestados e que têm várias vertentes, merecem uma maior
atenção e soluções. A mensagem essencial deve ser buscada também nas
entrelinhas, mesmo que venham de formas agressivas.
“Rebeldia ou Sabedoria” era o título de um artigo escrito por mim em
1988, baseado numa observação de uma cena que ocorreu em via pública,
de um jovem que esparramou um spray de espuma em uma senhora que
vestia um vistoso e caro casaco de peles de animais em Roma.
Talvez tenha sido a única forma encontrada pelo jovem para contestar e
dizer a essa rica senhora que ela devia reavaliar a sua conduta anti-ecológica
e mórbida - pois vestia a pele de dezenas de animais mortos – coisa só
admissível no tempo dos nossos antepassados trogloditas, que não tinham
outra alternativa para se protegerem do frio, mas não hoje e na concepção
ecológica deste e da maioria dos jovens contemporâneos.
7. 7
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
A semiótica da mensagem é o que deve ser buscada e entendida, nesse caso
observado na Itália e no recente dos jovens brasileiros, sem deixar de punir os
vândalos e baderneiros; mas também os corruptos e as quadrilhas que
acharcam e envergonham o país e, cuja impunidade deixa margem à
indignação e, consequentemente fazem ocorrer as manifestações.
E nessa linha, analisem-se também a desvantagem do aval a todas as
exigências da FIFA – a promotora das Copas e dos “espetáculos
futebolísticos”; pois isso tem posto mais lenha na fogueira dos movimentos e
na imagem que é passada para a população, que gosta de futebol, mas que
não tem os espaços adequados e nem a orientação para a sua prática.
Vê-se hoje nas arenas (antes chamados de “estádios”, que foram renomeados
de “arenas” pela FIFA4) – de norte a sul, de leste a oeste do país - jovens
torcendo, litigando pelos seus clubes, mas não vêem-se como dantes – no
país do futebol – o jovem praticando esta modalidade e os outros esportes,
pela ausência de espaços nas cercanias dos seus lares e pela falta de políticas
de incentivo para tal.
Mas não só pão e nem só circo querem os jovens; nem só maçãs prontas para
serem comidas, mas a semente e solo fértil para gerar milhões de frutos;
sementes do talento juvenil sufocado pelo ufanismo do crescimento sem
limites e pela falta de sensibilidade de entender o ser humano sem
oportunidade e em evolução.
_____________________________________
Fernando Zornitta, Ambientalista, Arquiteto e Urbanista, Especialista em Lazer e Recreação (Escola Superior de
Educação Física da UFRGS) e em Turismo (OMT-ONU/Gov. Italiano). Estágio de Aperfeiçoamento em Planejamento
Turístico na Un. de Messina – Itália. Período presencial do Curso de Doutorado em Planejamento e Desenvolvimento
Regional na Universidade de Barcelona (com foco no turismo e projeto de pesquisa na América Latina e no Caribe).
Curso de Técnico de Realização Audiovisual e desenvolve atividades como artista plástico e designer. Tem produção
4
Melhor seria chamarmos como antes, de “Estádio”, pois “Arena” lembra o espaço do confronto,
do litígio, da guerra – onde só há um vencedor - e não o da sadia competição. Sugere-se a
retomada do termo “Estádio”, se queremos acabar com a violência nos esportes e entre torcidas.
8. 8
NNããoo SSóó PPããoo;; NNeemm SSóó CCiirrccoo !!
AA SSeemmiioollooggiiaa ddaass MMaanniiffeessttaaççõõeess ddooss JJoovveennss BBrraassiilleeiirrooss
V.1 Junho 2013 Fernando Zornitta
literária – livro e artigos técnicos publicados. É co-idealizador e sócio-fundador de ONGs atuantes nas áreas de
meio-ambiente, cinema e vídeo, esportes e lazer – dentre outras. É membro do do GTMA (Grupo de Trabalho de
Meio Ambiente do CREA-CE), membro do GTPA (Grupo de Trabalho em Planejamento da Acessibilidade do CREA-CE),
membro do Fórum do Idoso e da Pessoa com Deficiência do Ceará (FID/MPE) e de movimentos em prol das PCDs e
com mobilidade reduzida.
E-mail: fzornitta@hotmail.com
Fones: (85) 99480120 / 86291385
- O autor autoriza a publicação do texto para fins educativos, bastando solicitar através do e-mail ou
dos telefones acima; quando será fornecida a versão no Word diretamente ao solicitante.