Gravidez é espera, ansiedade e temor. No entanto, se a angústia se transformar em uma enorme tristeza e num desprezo pelo recém-nascido, pode ser sinal de depressão pós-parto. O apoio familiar e tratamento médico são cruciais para evitar que o problema se intensifique e afete a saúde da mãe e do bebê.
1. T
oda aquela expectativa da che- principais sintomas visíveis são a falta de
gada do bebê nem sempre é só cuidado consigo mesma e com o bebê, a
flores, berços ou mamadeiras. ausência de higiene, constante expressão
Muitas mamães, principalmente de tristeza, facilidade de chorar e altera-
as de primeira viagem, não conseguem ções graves no sono, humor e apetite”,
lidar com a angústia e ansiedade comuns afirma Araceli Albino, psicanalista e pre-
do momento. Por isso, é importante ficar sidente do Sindicato dos Psicanalistas do
atento às transformações comportamen- Estado de São Paulo.
tais e psicológicas para que a magia da O perfil daquelas que sofrem ou sofreram
gravidez não seja substituída por uma fase desse mal costuma ser de alguém com bai-
conturbada e cheia de lágrimas e rejeição. xa autoestima, que não sabe enfrentar per-
A depressão, de acordo com a Organi- das, além de quem passou por problemas
zação Mundial da Saúde (OMS), atinge de infertilidade e busca uma completude
121 milhões de pessoas no mundo e 17 ao engravidar. Essa mãe, então, não supor-
milhões só no Brasil. A psicanálise não tará perder tal laço, o que acaba desencade- Para manter o
diferencia a “comum” da pós-parto, que ando um esmorecimento passageiro e leve
acomete entre 10% a 20% das brasilei- ou mesmo uma profunda melancolia. “No consumo mais
Gravidez é espera, ansiedade e temor. No entanto, se ras, pois o que as distingue é o objeto que entanto, é importante não confundir com o saudável, é crucial
a angústia se transformar em uma enorme tristeza e desencadeia tal abatimento. No segundo baby blues, etapa normal que acontece logo
descartar o óleo
caso, ela aparece depois de três ou quatro no terceiro ou quarto dia após o nascimen-
num desprezo pelo recém-nascido, pode ser sinal de semanas após o nascimento do neném, to do filho e é caracterizada por uma triste- utilizado até
ou seja, no período puerperal. za discreta e apenas uma dificuldade para mesmo se existir
depressão pós-parto Entretanto, os sinais apresentados nes- dormir e comer”, explica Gustavo Kroger,
sa fase que deveria ser tão especial são ginecologista da Faculdade de Medicina da
uma segunda leva
n por Fernanda emmerick n ilustração melissa lagôa
os mesmos da depressão “comum”. “Os Universidade de São Paulo (FMUSP). para fritar
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2. depressão pós-parto
das alterações que vão ocorrer e estar aber- Tratamento x aleitamento
tos para tais mudanças, as quais irão aconte- Para impedir que a relação e o víncu-
cer tanto na vida social quanto emocional”, lo com o pequeno sejam afetados, assim
10 coisas que você pode fazer para ajudar quem têm depressão complementa Eneida. Trata-se do preparo que diagnosticada já deve se iniciar os
do ambiente, que em situações de mulheres primeiros cuidados. Esse processo será
1. Conversar e explicar para a mãe preocupar com julgamentos 8. Apontar a importância do que não contam com um relacionamento delicado, já que tem base psicoterapêu-
que se trata de uma mudança e que daqueles ao seu redor. cuidado com a alimentação e dos
5. Convidar a pessoa para fazer estável com o pai da criança, deve ser redo- tica e será medicamentoso. A preocupa-
ela será capaz de cuidar bem do filho benefícios de evitar alimentos que
brado. A família e todos que convivem com ção, então, passa a ser em relação à ama-
2. deixar claro que a família a parte de sua rotina. solicitar a colaborem com o mal, como aqueles
ela devem cercá-la de segurança e conforto. mentação e as incertezas relacionadas ao
apoiará nesse momento, mas companhia dela para almoçar, que são mais ricos em gordura
O acompanhamento do obstetra precisa perigo de passar resquícios dos remédios
que um tratamento psiquiátrico é fazer compras ou exercícios físicos 9. estimular que ela mantenha uma ser próximo, para que ele consiga ganhar por meio do aleitamento, além da possi-
fundamental para o processo 6. Fazer com que a mãe ganhe vida social e constantemente ativa ,
conhecimento de todas as angústias e afli- bilidade de cortar essa ligação para dar
3. Mostrar que a medicação na conhecimento do seu problema. saindo com amigos, familiares etc
ções da paciente. “A família ajuda sendo continuidade ao tratamento.
depressão é tão importante quanto dê a ela livros, reportagens e textos 10. Contar casos de pessoas compreensiva, apoiando sem afirmações Inicialmente todo o acompanhamento é
tomar remédios para uma gripe ou 7. incentivar que a progenitora conhecidas ou públicas que também
faça alguma atividade física
moralizantes e sem cobrar uma atitude feito pelo próprio obstetra. “Porém, quan-
cuidar de uma perna quebrada enfrentaram o mal e conseguiram
idealizada. O médico indicará como proce- do o caso torna-se mais grave, é necessária
4. pedir para que a pessoa fale periodicamente, para assim liberar superar. será uma forma de
der caso veja indícios da doença”, explica a ajuda de um psiquiatra para medicar com
abertamente sobre todos seus endorfina, uma substância que é tranquilizá-la e expor que qualquer
reduzida naqueles com depressão
Blenda Marcelletti, psicanalista da Socie- ansiolíticos e antidepressivos, além de che-
medos e pensamentos, sem se um pode passar pelo mesmo
dade Brasileira de Psicanálise (SBPSP). car como ficará a alimentação do bebê”,
Ser mãe exige aprendizado, pois muitas informa Rosa Maria Neme, ginecologista
mudanças incidem assim como desconfor- da Federação Brasileira de Ginecologia e
tos. A pessoa com depressão está doente fí- Obstetrícia e da Sociedade de Ginecologia
Depressão ou melancolia Um apoio que pode salvar sica e emocionalmente e o melhor cuidado do Estado de São Paulo (FEBRASGO/ SO-
Tanto a melancolia do baby blues como a Parece impossível rejeitar aquele ros- é incentivá-la a fazer o tratamento adequa- GESP). Essa amamentação muitas vezes
depressão intensa são resultados, também, tinho bonito, só que quando a gestação é do, já que é fundamental que se saiba o que passa a ser feito por meio da mamadeira, o
de alterações hormonais e do processo de indesejada, o relacionamento amoroso ter- está acontecendo para evitar uma postura que visa causar menos efeitos colaterais e
deixar de ser filha para se tornar mãe. “O mina durante o período ou existe uma falta assustada perante o momento vivido. danosos para a saúde dessa criança.
diagnóstico prévio seguido de tratamen- de estrutura familiar e financeira, ocorre
to médico e acompanhamento familiar é uma contribuição para que essa recusa já
crucial para que o problema não se inten- dê as caras desde cedo e não somente após
sifique e dê origem às psicoses e ideias de o parto. “A depressão pré-natal tem a capa-
infanticídio ou mesmo suicídio”, explica cidade de influenciar no desenvolvimento Antes e depois dA gestAção
Jorge Huberman, pediadra e neonatolo- do bebê, como no peso e na formação”, Toda mulher sofre modificações desde o início da gestação devido às alterações
gista do Hospital Albert Einsten (SP). A alerta Alexandrina Meleiro, do Departa- hormonais, como seu nível de progesterona. O sistema nervoso central passa por um
psicose puerperal é uma perda total do mento de Psiquiatria da FMUSP. abatimento graças a essas mudanças e alguns sintomas precisam de mais atenção para
senso de realidade, sempre acompanhada Mulheres que já tiveram depressão, pos- que não se desenvolvam e ocasionem uma depressão profunda.
de delírios e alucinações. suem familiares com a doença, viveram pe-
Todo ciclo gravídico-puerperal é ríodos de grande ansiedade ou distúrbios
considerado um período de risco para o alimentares também têm uma tendência Na gravidez Pós-parto
psiquismo devido à intensidade da expe- maior para desenvolver depressão. “Além Cansaço exagerado esgotamento para realizar qualquer tarefa
riência vivida pela mulher, a qual pode disso, as sedentárias e com vida social restri- Choro fácil tristeza profunda
provocar abalos sobre psiquismos menos ta estão mais aptas a atravessarem essa fase Agitação irritabilidade e desorganização
estruturados e também naquelas com boa de descontentamento e insegurança”, res- Redução/aumento de apetite perda total do apetite ou descontrole
organização emocional. Por isso, a gestan- salta Eneida Bittar, enfermeira consultora Um pouco de dificuldade para dormir insônia
te precisa se sentir à vontade para contar em aleitamento materno pela Universidade desinteresse por sexo Ausência de libido
ao seu médico sobre a vida profissional, da Califórnia (EUA) e terapeuta familiar. pessimismo ideias suicidas
conjugal e social. A gravidez é um estado Um fator que ajuda para que o mal não se
que sofre influência conforme a maneira desenvolva é o preparo do casal para a che-
que as pessoas se relacionam. gada do primeiro filho. “Eles precisam saber
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3. depressão pós-parto
Ainda que seja um dos gestos mais aprecia-
dos da maternidade, tal necessidade depen-
derá do risco/beneficio, afinal é primordial
que o medicamento não passe para o leite e
seja ingerido pelo filho. “É claro que o ideal
é evitar o uso de antidepressivos durante o
aleitamento, mas se for mandatório, vale mais
medicar e interromper a amamentação”, es-
clarece Marcos Gebara, da Associação Bra-
sileira de Psiquiatria (ABP). O processo tem
que ser levado a sério para o bem-estar físico
e mental também do neném.
O coração fica em pedacinhos, só que as
consequências de um método terapêutico
incompleto são ruins para mães e crianças.
“Mulheres deprimidas tendem a ser negli-
gentes nos cuidados com seus filhos, impac-
tando diretamente na saúde e no desenvol-
vimento cognitivo deles”, esclarece Isabel
Correa, ginecologista e especialista em re-
produção humana da SOGESP. Essa pro-
genitora que perde o interesse, e o próprio
instinto maternal, deixa de tomar medidas
É pOssível eviTar a depressãO esperadas dela desde a saída do hospital.
Os distúrbios resultantes, se tiverem du-
l no período da gestação, cuide do setor emocional como cuida do ração prolongada, podem deixar cicatrizes
seu físico. tenha cautela, paciência e também bastante empenho. nas crianças, que são capazes de crescer
l Busque conversar sobre o que está se passando com você e verá com um sentimento de rejeição e culpa sem
como certas fantasias, emoções e desejos são comuns. pode ser com fundamento. Casos que não são cuidados
consultoria: recomendações da associação brasileira de imunizações (sbim)
seu médico, um psicoterapeuta ou com um grupo de gestantes. dão lugar a jovens que se tornarão adultos
l Aceite que a chegada do bebê trará mudanças e nem sempre igualmente inseguros ou despreparados
saberá como fazer. Ficará atrapalhada, perdida, irritada e triste, mas para constituir uma família.
nada disso quer dizer que você está doente ou não gosta dele.
l não fique fechada dentro de casa ou se dedicando somente a
pensamentos sobre o filho. Continue fazendo passeios, saindo com os
amigos e conhecendo lugares e pessoas novas. se mexa!
l prepare o ambiente familiar e conjugal para as alterações que irão,
inevitavelmente, acontecer na vida de todos. Converse bastante sobre
como poderão reestruturar o cotidiano de cada um envolvido.
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