1) O Brasil investe pouco em pesquisa e desenvolvimento e possui poucos produtos de alto tecnologia, ficando atrás de outros países na economia do conhecimento.
2) O governo lançou uma estratégia nacional para investir mais em ciência, tecnologia e inovação, mas o país precisa melhorar bastante em rankings internacionais.
3) Casos bem-sucedidos de inovação no Brasil são vistos como "ilhas de excelência" isoladas, sem estímulo e investimento suficientes no país como um todo.
1. Revista de audiências públicas do Senado Federal Ano 3 – Nº 12 – setembro de 2012
INOVAÇÃO
País constrói pontes
entre ciência e indústria
Seminário no Senado mostra que Brasil deve aumentar gastos,
inclusive privados, para entrar na economia do conhecimento
2. SECS | SUPRES – Criação e Marketing | Foto: Cléber Medeiros
Informação clara
e imparcial, onde
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3. Burocracia e poucos
recursos limitam inovação
O necessário ingresso de forma mais contundente do Brasil na economia
do conhecimento depende de mudanças legais e de mentalidade,
discutidas em seminário promovido pelo Senado
Carta ao leitor
A situação econômica e a inserção internacional do brasil são, possi-
velmente, as melhores da história. de “país do futuro”, em muitos
indicadores, como emprego e renda, o brasil aparenta ter se tornado o
“país do presente”.
porém, uma comparação com as maiores economias do mundo apon-
ta que o país ainda não incorporou a grande parte da produção as ten-
dências da economia do conhecimento. liderada pela indústria, essa nova
organização é chamada de terceira revolução industrial ou revolução tec-
nocientífica. tem como pilar a incorporação de grandes aportes de tec-
nologia a novos produtos e serviços oferecidos à população por meio da
inovação, pela qual há integração entre ciência e produção, envolvendo
áreas como automação, robótica e engenharia genética.
o problema é que a participação da indústria no produto interno bru-
to (pib) nacional vem caindo. A pauta de exportações brasileira conta
com poucos produtos de alto ou médio aporte tecnológico, sendo domi-
nada pelas commodities da agricultura e da mineração.
Além disso, o país investe pouco na área de ciência e tecnologia,
apresentando desempenho pouco satisfatório nos rankings internacionais
de inovação e de competitividade. registra, em alguns deles, tendência
de queda.
o governo e o senado já identificaram a necessidade de dar novo
rumo à produção nacional. para isso, será necessário um grande esforço
para dotar o país de política industrial capaz de aumentar os investimen-
tos em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos e processos que
sejam incorporados às linhas de produção. o plano brasil Maior, de agos-
to de 2011, e a estratégia nacional de Ciência, tecnologia e inovação,
lançada este ano, fazem esse diagnóstico e tentam apresentar algumas
soluções, especialmente, mais recursos para o setor.
isso porque, mais que um desafio pontual, a entrada do brasil na eco-
nomia do conhecimento implica empenho em um setor básico, apontado
como uma das maiores dívidas sociais do país: a educação.
esses temas fizeram parte dos debates travados no senado durante o
seminário Caminhos para a inovação, realizado pela Comissão de Ciência,
tecnologia, inovação, Comunicação e informática (CCt), com alguns dos
nomes mais importantes da ciência nacional, como o físico Marcelo glei-
ser e o neurocientista Miguel nicolelis.
As informações do seminário serviram como base para esta edi-
ção, que apresenta o problema, faz um diagnóstico da posição do brasil
no cenário internacional, mostra as experiências de sucesso no país e,
finalmente, apresenta as propostas — várias delas estão em discussão no
senado na forma de projetos de lei — que podem acelerar e tornar mais
eficientes iniciativas que melhorem a competitividade nacional.
boa leitura!
4. SUMÁRIO
Mesa do Senado Federal
Contexto
eMbrAer
presidente: José sarney
1ª vice-presidente: Marta suplicy
2º vice-presidente: Waldemir Moka
1º secretário: Cícero lucena
2º secretário: João ribeiro
3º secretário: João Vicente Claudino
4º secretário: Ciro nogueira
suplentes de secretário: Casildo Maldaner, João
durval, Maria do Carmo Alves e Vanessa grazziotin
diretora-geral: doris peixoto
secretária-geral da Mesa: Claudia lyra
Expediente
Secretaria Especial de
Comunicação Social
Em busca de espaço
na economia do conhecimento
6
diretor: Fernando Cesar Mesquita Indústria nacional ainda contribui pouco com inovação
diretor de Jornalismo: davi emerich 12
A revista Em Discussão! é editada pela
Universidades e empresas, a polêmica da integração
17
secretaria Jornal do senado
diretor: eduardo leão (61) 3303-3333
editor-chefe: João Carlos teixeira
editores: Joseana paganine, sylvio guedes e
thâmara brasil
Realidade brasileira
reportagem: João Carlos teixeira, Joseana paganine,
sylvio guedes e thâmara brasil
Capa: priscilla paz sobre imagens de stock.XChng Brasil ainda sente falta de
diagramação: bruno bazílio e priscilla paz
Arte: bruno bazílio, Cássio Costa, diego Jimenez e bases sólidas para a inovação
priscilla paz
revisão: André Falcão, Fernanda Vidigal e pedro pincer 18
pesquisa de fotos: braz Félix e leonardo sá
sCott bAuer/usdA-Ars
tratamento de imagem: edmilson Figueiredo
Circulação e atendimento ao leitor:
País continua
shirley Velloso (61) 3303-3333 longe dos líderes
tiragem: 2.500 exemplares 24
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E-mail: jornal@senado.gov.br
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tel.: 0800 612211
26
Fax: (61) 3303-3137
praça dos três poderes, Anexo 1 do
Indústria não
senado Federal, 20º andar
Cep 70165-920, brasília (dF) contrata doutores
Impresso pela Secretaria Especial de 30
Editoração e Publicações — Seep
5. Casos de sucesso
reproduÇÃo
Há nichos de excelência, mas
ainda são casos isolados
34
Incubadoras atestam sucesso da
união universidade-indústria
42
Parques tecnológicos formam
núcleos de conhecimento
46
Propostas
Veja e ouça mais em:
Primeiro passo é melhorar o ensino da ciência
50
MArCos sAntos/usp
Programa de bolsas aposta no
intercâmbio internacional
56
Senado busca saída para facilitar
caminho para a pesquisa
63
sCott bAuer/usdA-Ars
Decisão do Congresso sobre
royalties é vital para o setor
68
Saiba mais
70
6. CONTEXTO
Brasil quer maior fatia
do mercado da inovação
Sem investir fortemente em pesquisa,
semente da inovação, país segue como
consumidor de produtos de tecnologia
estrangeira e exportador de commodities
M
ais que uma questão valor à produção do país, que, tiza a necessidade de “incor-
acadêmica, a pesquisa por sua vez, ganha competitivi- porar conhecimento científico
feita em laboratórios dade internacional na chamada ao processo produtivo”. Já a
por cientistas é, cada vez mais, economia do conhecimento. Comissão de Ciência, Tecnolo-
um tema econômico, que ganha No Brasil, o assunto está na gia, Inovação, Comunicação e
grande atenção dos governos pauta do Executivo e do Legis- Informática (CCT) do Senado
mundo afora. Isso porque a tec- lativo. O governo federal lançou realizou, em junho deste ano,
nologia pode levar a descobertas este ano a Estratégia Nacional o seminário Caminhos para a
que geram novos produtos e ser- de Ciência, Tecnologia e Ino- Inovação, em que avaliou, com
viços, com grande valor comer- vação (Encti) para o período alguns dos maiores nomes da
cial. Essas inovações agregam de 2012 a 2015, em que enfa- ciência nacional, os programas
Pesquisa, tecnologia e, finalmente, inovação
inovação é a tecnologia que, ao tudo começa com uma pesquisa de desenvolvimento tecnológico
ser processada por uma empresa, básica, geralmente feita nas uni- e inovação do MCti, álvaro prata.
gera bem ou serviço que chega à versidades. depois vem o desen- o pesquisador edwin Mansfield,
sociedade. enquanto a tecnologia volvimento da tecnologia, que é da universidade da pensilvânia
não for colocada à disposição da a pesquisa aplicada. então, vem (euA), em estudo sobre as fontes
sociedade, não é inovação. então, a prova de conceito, ou seja, um de ideias para inovação tecnoló-
o caminho para a inovação de- modelo para teste do mecanis- gica, verificou que nove em cada
pende de uma empresa que faça mo. somente aí é que se tem dez inovações nascem na empre-
a ponte entre as novas ideias e a ideia se aquela tecnologia vai ser sa. Apesar de, na maioria, não
oferta para a população. produzida em escala de demons- serem inventos de universidades,
pai da economia moderna, Adam tração, para, então, chegar à es- os produtos são desenvolvidos
smith já observava, em 1776, cala de mercado. com base em pesquisa acadêmi-
que as principais fontes de inova- “Ciência é o conhecimento; tec- ca, que fornece descobertas teó-
ção eram “os homens que traba- nologia é o fazer; inovação é o ricas ou empíricas.
lhavam com as máquinas e que mudar; empreender é materiali- A indústria é fundamental no
descobriam maneiras engenho- zar e realizar. para inovar, deve- processo por dominar detalhes
sas de melhorá-las, bem como mos conhecer, mas, mais do que de mercado e técnicas de pro-
os fabricantes de máquinas que isso, é preciso que tenhamos a dução e ter habilidade para reco-
desenvolviam melhoramentos em confiança de que podemos mu- nhecer e pesar riscos técnicos e
seus produtos”. dar”, disse o secretário nacional comerciais.
6
setembro de 2012
7. VAgner CArVAlho
Cristovam Buarque (C), Vital do Rêgo (D) e o secretário
executivo do MCTI, Luiz Antônio Elias, participam do seminário
governamentais e a capacidade do de avanços que vêm da ciência,
país de criar ideias e produtos no- especialmente nas áreas de in-
vos para o mercado internacional. formática e automação em que o
A preocupação procede, tendo Brasil continua a ser um grande
em vista que o Brasil oferece pou- consumidor.
cos produtos com alto aporte de Um dos indicadores usados
tecnologia agregado (uma célebre para medir o desempenho de um
exceção são os aviões da Embraer). país no que diz respeito à inovação
Quase metade (48%) do total das é o ranking da escola de negócios
exportações brasileiras se concen- IMD Foundation Board (World
tra em agropecuária, extração mi- Competitiveness Yearbook). Na úl-
neral, madeira, petróleo e gás (veja tima versão, lançada este ano, o
o infográfico na pág. 30). Brasil ocupa o 46º lugar, atrás de
Já as grandes economias do Hong Kong, Estados Unidos, Su-
mundo — especialmente Estados íça, Cingapura e Suécia e também
Unidos, Europa, Japão e, mais de China, Chile, Índia, México,
recentemente, China e Coreia Peru, Malásia e Irlanda (veja o
do Sul — vêm ampliando a uti-
lização, na indústria,
Art
e: b
ru
no
bA
zíl
io
8. infográfico na página ao lado). não é surpresa que os casos senador Cristovam Buarque
Pior que isso, o Brasil vem de sucesso sejam tratados (PDT-DF).
perdendo posições no ranking como“ilhas de excelência”.
desde 2010, quando apare- “Os centros de produção de Enorme esforço
ceu em 38º lugar. Em 2011, conhecimento do país, em vez Para o Brasil não ficar para
caiu para 44º e, agora, perdeu de regra, são tratados como trás, o governo identificou na
mais duas posições. experiências bem-sucedidas Estratégia Nacional de Ci-
Em setembro, o Fórum em meio a um universo de fal- ência, Tecnologia e Inovação
Econômico Mundial apresen- ta de estímulo e investimen- que terá de realizar um “enor-
tou seu ranking de competi- to”, observou o neurocientista me esforço” para diminuir a
tividade e inovação em que o Miguel Nicolelis. distância que separa o perfil
Brasil aparece em posição se- Mais que novos produtos, a de sua produção do das eco-
melhante: 48º lugar entre 144 mudança no perfil da produ- nomias que lideram o merca-
países. Porém, nesse compara- ção mundial, já chamada de do internacional. Isso porque
tivo, o país apareceu cinco po- terceira revolução industrial, os diagnósticos não apontam
sições acima da calssificação incorporou grande aumento uma situação confortável
de 2011 e dez da de 2010. de produtividade com redu- quando o assunto é inovação.
Um dos indicadores ob- ção dos custos de cada unida- “No que diz respeito à par-
servados nesse ranking é jus- de produzida. ticipação dos setores inten-
tamente a inovação. Apesar “Não há futuro sem que sivos em tecnologia diferen-
da melhoria geral, o Brasil um país domine os caminhos ciada na sua matriz interna,
perdeu cinco posições nesse da inovação. O Brasil ain- o Brasil está muito abaixo.
quesito. da não despertou para isso Embora tenha crescido, ain-
Diante de avaliações assim, suficientemente”, alertou o da precisa alcançar patamares
Aviões da Embraer são um dos raros exemplos de produtos
exportados pelo país com alto aporte de tecnologia agregado
8
setembro de 2012
9. Contexto
mais avançados na microeletrô-
nica, nas tecnologias de informa- Sexta economia do mundo Brasil aparece
ção e comunicação”, admite Luiz apenas entre os 50 em competitividade
Antônio Elias, secretário execu-
tivo do Ministério da Ciência, Em dois rankings que levam em consideração a capacidade de inovação, país se
Tecnologia e Inovação (MCTI). encontra atrás de norte-americanos, europeus, asiáticos e de alguns vizinhos
As explicações para essa situa-
ção são muitas. O Brasil investe WEF* WCY**
Países Classificação da educação está
menos em ciência e tecnologia 2012 2011 2012 2010
que os competidores internacio- abaixo da média do país
nais, com pouca participação do Suíça 1o 1o 3o 4o
Indicadores do WCY* Posição brasileira
setor privado, maiores respon- Cingapura 2o 2o 4o 1o
Mercado de trabalho 17o
sáveis pela introdução de novos
Suécia 4o 3o 5o 6o Economia doméstica 25o
produtos nas indústrias (confira o
infográfico na pág. 32). Alemanha 6o 6o 9o 16o Financiamentos 28o
Para reverter o quadro e co- Infraestrutura científica 33o
Estados Unidos 7o 5o 2o 3o
locar o Brasil rumo à economia Política fiscal 37o
do conhecimento, são esperados Reino Unido 8o 10o 18o 22o Infraestrutura básica 50o
investimentos, públicos e priva- Hong Kong 9o 11o 1o 2o Produtividade e eficiência 52o
dos, previstos na Encti para os Infraestrutura tecnológica 54o
Japão 10o 9o 27o 27o
próximos quatro anos. A princi- Educação 54o
pal meta é elevar os recursos des- Coreia do Sul 19o 24o 22o 23o
Preços 55o
tinados ao setor do atual 1,16% Austrália 20o 20o 15o 5o Quadro institucional 55o
(percentual inferior inclusive
ao de economias menores que a França 21o 18o 29o 24o Comércio internacional 56o
brasileira) para 1,8% do produto China 29o 26o 23o 18o Indicadores do WEF** Posição brasileira
interno bruto (PIB) até 2014, ou
Chile 33o 31o 28o 28o Tamanho do mercado 9o
eMbrAer
Espanha 36o 36o 39o 36o Sofisticação dos negócios 33o
Mercado financeiro 46o
Itália 42o 43o 40o 40o
Prontidão tecnológica 48o
Brasil 48o 53o 46o 38o Inovação 49o
Portugal 49o 45o 41o 37o Macroeconomia 62o
Educação superior 66o
México 53o 58o 37o 47o
Mercado de trabalho 69o
Índia 59o 56o 35o 31o
Infraestrutura 70o
Peru 61o 67o 44o 41o Instituições 79o
Argentina 85o 94o 55o 55o Saúde e educação primária 88o
*entre 144 países Fonte: IMD World Competitiveness Yearbook (WCY) 2012.
**entre 59 países World Economic Forum (WEF) Global Competitiveness Report 2012-2013.
quase R$ 25 bilhões entre empre- recursos gastos ter crescido, a par-
sas e governo. No total, o gover- ticipação relativa no gasto global
no espera investir cerca de R$ 75 da União não se alterou.
bilhões no período, superando os E ainda há outros obstáculos
R$ 41,2 bilhões previstos no Plano a superar. Em 2011, o governo
de Ação de Ciência, Tecnologia e federal cortou 22,3% do orçamen-
Inovação para o Desenvolvimento to do MCTI, que ficou em R$ 6,5
Nacional (Pacti) para o período bilhões, abaixo dos R$ 7,9 bilhões
2007–2010 (leia mais na pág. 54). de 2010. Em 2012, os valores fo-
Porém, em função, entre ou- ram de novo reduzidos em R$ 1,5
tros fatores, de cortes no orça- bilhão, dos R$ 6,7 bilhões previs-
mento destinado ao setor, metas tos no Orçamento aprovado no
estabelecidas antes, como no Pacti Congresso.
2007–2010, não foram cumpri- “A Anpei acompanha com pre-
das. Naquela ocasião, o objetivo ocupação os cortes do governo fe-
era fazer com que os investimentos deral no orçamento de CT&I nos
atingissem 1,5% do PIB em ciên- últimos dois anos, 22% só neste
cia, tecnologia e inovação (CT&I) ano. A falta de um ambiente mais
até o fim da década passada. Nes- previsível reforça a necessidade de
se período, apesar de o volume de continuar construindo contexto
www.senado.gov.br/emdiscussao
9
10. MoreirA MAriz/AgênCiA senAdo
metade (45,7%) do total, recursos humanos capazes de
índice inferior ao de paí- conduzir pesquisa de ponta e
ses como Estados Unidos, publicar cada vez mais artigos
Alemanha, China, Coreia e estudos em revistas cientí-
do Sul e Japão, onde o ficas (veja os infográficos nas
índice beira os 70% (veja págs. 26 e 28).
infográfico na pág. 25). Ainda assim, um maior
Como resultado dos número de cientistas não vem
baixos investimentos, do correspondendo a um aumen-
perfil da pesquisa, reali- to proporcional nos indicado-
zada na maior parte nas res de inovação do país. A ex-
universidades, e da bu- plicação pode estar na própria
rocracia, o país também história da industrialização do
registra pouquíssimas Brasil, cujo progresso técnico
patentes, indicador usa- se deu por meio da importa-
do para medir o nível de ção de equipamentos e tecno-
inovação de um país (leia logias geradas em outros paí-
mais a partir da pág. 61). ses em vez de levar como base
o desenvolvimento científico
Poucas patentes nacional e a incorporação dele
“O pequeno núme- ao processo produtivo (leia
ro de patentes nacionais mais a partir da pág. 30).
Nicolelis: é preciso convencer a
iniciativa privada de que vai ganhar e a carência de maiores “Trouxemos a pesquisa
mais dinheiro se investir em pesquisa incentivos à inovação e para a universidade, forma-
à pesquisa e desenvolvi- mos as pessoas, fomentamos,
mais favorável à inovação tec- mento comprometem a através de bolsas a formação
nológica, com recursos asse- competitividade brasileira. Os de 12 mil doutores e 38 mil
gurados e regulares”, diz do- países mais resistentes às con- médicos por ano. Ao mesmo
cumento elaborado em junho vulsões da economia mundial tempo, não temos nenhuma
pela Associação Nacional de são os que investiram pesado universidade entre as 200 me-
Pesquisa e Desenvolvimen- na educação, na ciência e tec- lhores do mundo, mas a que
to das Empresas Inovadoras nologia, como componentes mais forma doutores no mun-
(Anpei). de política industrial”, aler- do é a USP, na frente de boas
Além de elevar o nível de ta o senador Vital do Rêgo universidades americanas”,
investimento para finalmen- (PMDB-PB). destaca Luiz Antônio Elias.
te atingir a meta da Encti, o Mas também há avanços
governo precisa incentivar as a registrar. Nos últimos 50 Começar pela escola
empresas a gastar mais em anos, o país ampliou a infra- Além das propostas de no-
pesquisa e desenvolvimen- estrutura de pós-graduação, vas leis e críticas às atuais (leia
to (P&D). O gasto privado formando cada vez mais mes- mais a partir da pág. 50), os
representa hoje menos da tres e doutores e uma base de participantes do seminário
A ciência começa na educação
Participantes do seminário organizado pelo Senado Tudo em ciência e tecnologia começa
destacaram a ligação crucial entre uma e outra com a educação dos jovens. É preciso uma
estratégia de encantamento em inovação”
Ainda é difícil convencer as pessoas de que a inovação Marcelo Gleiser
começa na educação de base. Ciência e tecnologia
começam com a criança que o cientista foi no passado”
Cristovam Buarque
Todo mundo quer falar de inovação, mas poucas pessoas
A inovação não se faz sem ciência entendem que inovação começa com gente, e gente para fazer
e ciência não se faz sem educação” inovação tem que ser educada. O grande gargalo da ciência
Luiz Antônio Elias brasileira é a educação brasileira”
Miguel Nicolelis
10
setembro de 2012
11. Contexto
Caminhos da Inovação sugeri- para fazer inovação. Sem isso, a Encti, os salários são 80,5%
ram que o país necessita de um vamos pegar receitas que vêm maiores que a média nas indús-
sistema educacional eficiente, de fora e tentar aplicar esses mo- trias que inovam. Os postos de
que desperte nos alunos o gos- delos numa cultura totalmen- trabalho gerados nessas empre-
to pela ciência. Essa condição é te diferente”, analisou Miguel sas exigem 20,9% a mais de
considerada fundamental para Nicolelis. escolaridade e a permanência
que mais pessoas escolham a média do trabalhador é 30,4%
carreira de cientista e possam Radical e rápido maior que média.
levar adiante mais pesquisas Outro consenso é que a defi- “Não dá para esperar 60 anos
que levem a novas tecnologias e nição de estratégia para reverter com pequenas medidas para
inovações. o quadro atual de educação, ci- desenvolver ciência e tecnolo-
“Admiramos o que aconteceu ência e tecnologia, com inovação gia. É preciso algo mais radical,
de bom nessas últimas décadas. na indústria, é urgente para que mais rápido. Não em resultados
Mas temos que ser mais ambi- o país possa embarcar na econo- imediatos, mas que comecem a
ciosos. Precisamos massificar a mia do conhecimento e compe- preparar agora a ciência do fu-
prática da ciência e convencer a tir no mercado internacional em turo, que é a educação de base.
iniciativa privada de que vai ga- pé de igualdade com outros paí- Os cientistas têm um discurso
nhar mais dinheiro se investir ses, gerando empregos e riqueza ambicioso e os políticos e admi-
em pesquisa básica e em pesqui- no próprio país. nistradores têm o discurso do
sa aplicada. Enquanto essa mas- Já se sabe, por exemplo, que a que foi feito e não da ambição
sificação não for realizada, não inovação tecnológica gera postos do que falta fazer, como se fosse
adianta a gente discutir inova- de trabalho mais bem remune- absolutamente impossível. E não
ção, porque não vamos ter gente rados e mais estáveis. Segundo é”, apelou Cristovam Buarque.
A Olimpíada do Conhecimento, promovida pela CNI,
incentiva o elo essencial entre trabalho e inovação
JosÉ pAulo lACerdA
www.senado.gov.br/emdiscussao
11
12. Pilar da inovação mundial,
indústria pouco participa
Um elo importante na cadeia de ponta, a indústria continue a cientista Marcelo Gleiser.
de inovação é considerado mui- perder peso relativo na compo- A falta de iniciativa das em-
to fraco no Brasil: a indústria. sição do produto interno bruto presas — que em outros países
Responsável por grandes inves- brasileiro e, pior, no cenário são responsáveis por traduzir os
timentos em pesquisa e desen- internacional. avanços tecnológicos em produ-
volvimento de novos produtos “Não basta importar a má- tos e serviços para a sociedade
mundo afora, no Brasil a par- quina, se não tivermos geração — para investir em inovação no
ticipação da indústria é modes- de conhecimento local. Com Brasil pode ser observada em
ta, não chegando à metade dos a importação da máquina, no vários indicadores. Um deles:
gastos nacionais, já considera- curto prazo, faremos frente à elas praticamente não contra-
dos baixos. concorrência naquele setor, na- tam mestres ou doutores. Es-
“Nossos empresários ainda quele momento. Mas não fa- ses profissionais, que estariam
preferem copiar técnicas im- remos frente, no longo prazo, prontos para pesquisar e inovar,
portadas. Daí, temos muitos à necessidade de conhecimen- estão, na grande maioria, nas
produtos made in Brazil, mas to local”, avalia Luiz Antô- universidades (que concentram
não temos praticamente ne- nio Elias, secretário executi- a produção científica nacional)
nhum created in Brazil. São vo do Ministério da Ciência, ou na administração pública.
produtos fabricados aqui com Tecnologia e Inovação. O presidente da Financia-
invenções de fora”, observa “A indústria brasileira precisa dora de Estudos e Projetos (Fi-
o senador Cristovam Buar- se conscientizar de que é muito nep), Glauco Arbix, revelou,
que, economista e ex-reitor da melhor criar a própria máquina em audiência realizada em maio
Universidade de Brasília. do que ficar comprando as que na CCT, que a maioria dos pes-
A avaliação feita é que, sem vêm de fora. Existe indepen- quisadores brasileiros (57%)
atenção para a incorporação de dência tecnológica e acho que trabalha nas universidades,
novos processos, com produtos ainda não estamos lá”, reforça o 37% estão nas empresas e 5%,
Fábrica na Zona Franca de Manaus: muitos produtos
made in Brazil, poucos created in Brazil
suFrAMA
12
setembro de 2012
13. Contexto
Com efeito, são basicamen-
Finep
te as estatais, como Petrobras
e Eletrobras, ou as antigas
Doutor não tem
estatais, como Embraer, Vale
e as empresas de telecomuni-
vez em faculdade
cações, que mais investem em privada
inovação no país.
“Se tirarmos a Petrobras, A falta de envolvimento da in-
o nosso investimento privado dústria no processo de inovação
some do gráfico, simplesmen- foi ilustrada no seminário Cami-
te desaparece”, complemen- nhos para a inovação pelo professor
ta o neurocientista Miguel Marcelo sampaio de Alencar, pro-
Nicolelis. fessor do depar tamento de
Segundo André Araújo, engenharia elétrica da universidade
assessor da presidência da Fi- Federal de Campina grande, que
nep, entre 7 mil e 10 mil em- tem doutorado no Canadá.
presas respondem pelo total segundo ele, as universidades
Glauco Arbix, presidente da do gasto privado em P&D privadas são as primeiras a dar o
Finep, destaca concentração dos
pesquisadores nas universidades
no Brasil, equivalente a cer- exemplo de como as empresas não
ca de 0,5% do PIB. Delas, contratam mestres e doutores no
entre 600 e 700 respondem brasil.
no governo. Nos Estados Uni- por mais de 90% do total, "As universidades privadas não
dos, segundo ele, a estatística é sendo que mais da metade é contratam mestres e doutores.
diferente: 79% dos pesquisado- estrangeira. Como é que as empresas vão con-
res estão nas empresas, 14,8% “Estamos precisando é de tratar doutores, se as universidades
nas universidades e 3,6% no fábricas de empresa. Precisa- os demitem?", questionou Alencar
governo. mos de mais dez Petrobras, no senado.
“Funcionamos diferente dos Vale, Embraer. O caminho ele denunciou que muitas insti-
Estados Unidos. Os doutores da inovação é o caminho da tuições privadas de ensino superior
não vão para as indústrias, com empresa”, afirmou Araújo, no contratam doutores apenas para
raras exceções. As exceções são seminário patrocinado pela cumprir exigências do Ministério da
as estatais, a Petrobras e algu- CCT do Senado. educação (MeC), para dispensá-los
mas empresas do setor elétrico”, depois do credenciamento da insti-
afirma Segen Estefen. Mais investimentos tuição pelo órgão.
privados "isso é um absurdo! É o que
Representante do Executi- ocorre nas universidades privadas,
vo no debate no Senado, Luiz multinacionais, tipo Anhanguera,
Antônio Elias deu o recado estácio, deVry (norte-americana
para os empresários: o go- que está entrando no brasil). Apro-
verno espera que a indústria vou-se o curso, os doutores são
avance em inovação. Para ele, demitidos. e o MeC, aparente-
o setor “é muito conserva- mente, faz vista grossa. isso é um
dor, não quer correr o risco problema gravíssimo. Vi c a sos
do processo inovatório”. Elias em que centenas de professores
reconhece que o setor públi- com doutorado foram demitidos",
co deve fazer o esforço para testemunhou.
que haja benefícios fiscais e
ambiente regulatório positi-
vo, “mas não sem contrapar- indústria também pode ser me-
tida da área empresarial e da dida pelos investimentos que o
sociedade”. setor faz em P&D. Hoje, me-
Como exemplo, o físico nos da metade do que se gasta
Marcelo Gleiser, professor titu- em inovação no Brasil vem das
lar de uma universidade norte- empresas. Por isso, a meta do
-americana, narrou que, nos governo é que os gastos do setor
Estados Unidos, o investimento produtivo em P&D passem de
privado em pesquisa e ensino 0,56% do produto interno bru-
é grande. “O ônus da inova- to (registrados em 2010) para
ção tecnológica e científica não 0,9%, em 2014. Ou seja, espe-
deve ser só do governo. Para ra-se que a participação privada
criar, tem que arriscar”, sugere. nesses investimentos chegue a
A baixa participação da 50% do total.
www.senado.gov.br/emdiscussao
13
14. CeCiliA bAstos
1,16% atual (índice inferior ao “A meta representa um esfor-
de economias menores que a ço brutal para um prazo curto,
brasileira) para 1,8% até 2014 de quatro anos. Significa pra-
— vai precisar de grande mo- ticamente dobrar o esforço do
bilização do empresariado, que setor produtivo. Desde a cria-
tem como meta chegar a inves- ção do marco regulatório, há 11
timentos de 0,9% do PIB. anos, vamos ver que o desempe-
“No Brasil, a gente só ten- nho não foi muito grande. Mas
de a falar de mecanismos es- tem havido disponibilidade de
tatais, que são importantes recursos crescente e exponencial
e devem continuar e ser am- para a inovação”, confirmou
pliados. O investimento pú- André Araújo.
blico americano em ciência é O professor Carlos Henrique
de cerca de US$ 400 bilhões. de Brito Cruz, diretor científico
O investimento do Departa- da Fundação de Amparo à Pes-
Para Carlos Henrique Cruz, da Fapesp, maior
mento de Defesa pode dobrar quisa do Estado de São Paulo
desafio é construir no país ambiente que esse orçamento. E há ainda o (Fapesp), considera que o maior
estimule empresário a investir em P&D investimento privado. Isso ex- desafio será criar um ambiente
plica por que não temos uma que estimule e viabilize o au-
“A grande diferença está no Apple bra sileira”, recla ma mento do gasto empresarial em
setor industrial. Aí está a di- Nicolelis. P&D. “Esse é um objetivo mui-
ficuldade, porque países que Segundo o representante da to mais complexo do que o sim-
estão na frente, por exemplo, Confederação Nacional da In- ples aumento do dispêndio go-
a Finlândia e a Coreia do Sul, dústria (CNI) no debate pro- vernamental, pois envolve obter
têm o setor industrial, sozi- movido pelo Senado, Rodrigo um aumento substancial no
nho, investindo acima de 2%, de Araújo Teixeira, o cresci- investimento privado por meio
2,5% [do PIB]”, afirmou Álva- mento do investimento privado de políticas governamentais”.
ro Prata, secretário nacional de em inovação tem sido de 15% Para Marcelo Sampaio de
Desenvolvimento Tecnológico e ao ano, taxa insuficiente para Alencar, professor de Engenha-
Inovação do MCTI. alcançar o objetivo. “Para atin- ria Elétrica da Universidade Fe-
Ou seja, a proposta governa- gir a meta, o investimento pri- deral de Campina Grande (PB),
mental de elevar o percentual vado em inovação tem de cres- os empresários somente estão
do PIB investido na área — do cer 22% ao ano”, afirmou. dispostos a investir se houver
14
15. Contexto
compensação governamental Caminhos para a Inovação. inovação nas empresas, modelos
pelos gastos feitos, geralmente Com a ausência de empresas de gestão do século 19, hierár-
por meio de renúncia fiscal. que invistam mais em P&D e quicos, departamentalizados,
“Os empresários vão às uni- diante da instabilidade do gas- pouca liberdade, ambiente bu-
versidades porque eles contam to público no setor (leia mais rocrático, baixa motivação,
com a renúncia fiscal. Estão na pág. 68), os pesquisadores alta rotatividade. Como fazer
viciados. Esse paradigma, cria- brasileiros ainda tratam com inovação com esse ambiente?
do no governo de Fernando ceticismo o desenvolvimento Então, não se trata apenas de
Collor e estimulado no de Fer- de uma política industrial e de incentivo”, afirma o professor e
nando Henrique Cardoso, tem inovação de longo prazo, como engenheiro Juan Carlos Sotuyo,
de mudar. O empresário tem a proposta do Plano Brasil diretor-superintendente da Fun-
de ser estimulado de outra for- Maior (leia matéria a seguir). dação Parque Tecnológico Itai-
ma. Não tem só de ganhar di- “Marcos legais, temos um pu, um dos poucos nichos de
nheiro”, reclamou no seminário monte. Cultura empresarial, excelência no país.
indústria pede que governo
compartilhe riscos da inovação
Se, por um lado, cien- Indústria (CNI) e da Mo- e planejado pode não ser
tistas e governo gostariam bilização Empresarial pela bem-sucedido”.
de ver o empresariado in- Inovação (MEI) no seminá- Teixeira avalia que exis-
vestindo mais em P&D, os rio organizado pelo Senado, te um “vale da morte das
empresários acusam a falta Rodrigo Teixeira, com base tecnologias das inovações”,
de política industrial em em análises, apontou ten- que seria na fase de intro-
que o governo estimule a dência de aumento do in- duzir novas tecnologias em
indústria a assumir os ris- vestimento privado em ino- escala comercial, que de-
cos de gastar com desenvol- vação, superando, inclusive, pende fundamentalmente
vimento de novos produtos. o gasto público. Mas, para da indústria. O problema,
Representante da Con- isso, colocou duas condi- segundo ele, é que somente
federação Naciona l da ções: um cenário de indica- os empresários se respon-
dores econômicos estáveis e sabilizam por esses cus-
noKiA
satisfatórios e apoio do go- tos, diferentemente do que
verno aos “riscos inerentes” acontece em outros países,
a esse processo. como o Canadá e os EUA,
Na análise do professor onde o governo é solidário
Carlos Henrique de Bri- (leia mais na pág. 24).
to Cruz, da Fapesp, não “Ou seja, se o processo
se trata de o empresário der errado, a empresa fe-
brasileiro não valorizar cha. Então, há aversão ao
a inovação tecnológica, risco. É importante repen-
mas, sim, da existência de sarmos o f inanciamento
um “ambiente econômi- para compartilhar os riscos
co instável, extremamente de tecnologias de ponta”,
desfavorável e até mesmo afirmou.
hostil para que as empre- Como sugestão, Teixeira
sas realizem investimentos citou um modelo de finan-
de retorno certo, mas em ciamento utilizado pelos
prazo muitas vezes longo, Estados Unidos para um
como são os investimen- projeto de uso de biomassa
tos em P&D, que contém para produção de energia.
uma incerteza intrínseca. No início, diz, 100% dos
Pesquisa-se, em geral, so- financiamentos são públi-
bre o que não se conhece cos, mas, à medida que o
e, muitas vezes, um projeto projeto avança para a eta-
perfeitamente organizado pa de operação e venda, a
Na Finlândia, sede da Nokia (foto), indústria responde,
sozinha, por até 2,5% do PIB em investimentos
15
16. parcela de investimento da em- empresas de menor porte “co- de comércio exterior. O plano,
presa vai aumentando. Dessa meçaram a entender que inova- no qual a Encti se insere, tem
maneira, com participação pú- ção é algo importante”. como foco a inovação para agre-
blica e privada, é possível “dar gar valor e competitividade à
um salto e sobreviver ao vale da Brasil Maior produção da indústria nacional.
morte”. O diretor da Fapesp consi- Prevê, além do aumento dos
No Brasil, narrou Teixeira, dera que, para isso acontecer, é gastos públicos e privados em
há um projeto-piloto em anda- preciso “uma política industrial P&D, desoneração de investi-
mento em que a Finep repassa associada à política para ciên- mentos e das exportações, cré-
recursos para a CNI, que, en- cia e tecnologia, coerente com dito, aperfeiçoamento do marco
tão, os repassa para institutos as mudanças necessárias nas regulatório da inovação, forta-
de pesquisa vinculados à indús- condições macroeconômicas e lecimento da defesa comercial e
tria. “Nossa meta é investir até de infraestrutura existentes no ampliação de incentivos fiscais.
R$ 90 milhões [até 2013] em país, que são hoje obstáculo ao Parte desse projeto, a Encti
projetos de inovação tecnoló- desenvolvimento sustentável enfatiza que o Estado deve in-
gica, com recursos do governo. e vêm levando o Brasil a uma vestir mais na subvenção ou no
Vamos alavancar mais um ter- progressiva desindustrialização”. subsídio às empresas para fa-
ço de contrapartida econômica O governo acredita que já vorecer a busca pela inovação,
das entidades de ciência, tec- existem condições econômicas para transformar o meio em-
nologia e inovação, e as empre- (estabilidade monetária, cres- presarial em um setor mais dis-
sas vão colocar mais um terço”, cimento econômico e geração posto a correr riscos para criar
explicou. de emprego e renda) para isso. novos produtos e tecnologias em
Ele reconheceu, porém, que Tanto que lançou, em agosto de áreas nas quais o Brasil possa,
é preciso maior conscientiza- 2011, o Plano Brasil Maior, uma efetivamente, se sobressair no
ção dos empresários, ainda que política industrial, tecnológica e mercado internacional.
Presidente Dilma assina o Plano Brasil Maior observada por Guido Mantega (E),
Marco Maia, Michel Temer, José Sarney, Gleisi Hoffmann e Fernando Pimentel
Wilson diAs/Abr
16
setembro de 2012
17. Contexto
VAgner CArVAlho
Lugar de empresa é
na universidade?
A relação entre empresa e uni- transformar numa fá-
versidade gerou polêmica entre brica de empresas, a
debatedores do seminário. o gente olha de forma
assessor da Finep André Araújo positiva, mas tam-
levantou dúvidas com relação b ém com descon-
ao modelo em que a universida- fiança. não sei se isso
de serve como base para novos é viável dentro das
negócios, como acontece em di- universidades. não
versas instituições, como o ins- sei como um polo
tituto Alberto luiz Coimbra de com multinacionais
pós-graduação e pesquisa de dentro do Fundão
engenharia (Coppe), por meio [onde está a Coppe]
de parques tecnológicos ou in- pode levar o brasil à
cubadoras de empresas (leia grande autonomia
a partir da pág. 34). A afirma- do ponto de vista de
ção levou à reação do professor inovação tecnológi-
segen estefen, da Coppe. ca. talvez seja uma
Mesmo admitindo que, para ino- visão conser vado-
Estefen, da Coppe/UFRJ, defende modelo de
var, o país precisa de “fábricas ra, mas não consigo parques tecnológicos como saída para inovação
de empresa”, Araújo questionou ver a dinâmica que
a vocação da universidade para vai ser construída a partir daí”, posições do assessor da Finep.
cumprir esse papel. “Quan- confessou. “eu acho que o parque tecno-
do a universidade procura se segen estefen discordou das lógico, com empresas estran-
geiras, gera uma dinâmica ex-
tremamente importante para
a universidade, até para a
criação das empresas de base
tecnológica, que vão conviver
nesse ambiente”, afirmou.
para ele, não há como fazer
inovação no brasil sem as uni-
versidades. “os doutores es-
tão lá, em sua grande maioria.
os núcleos, as ilhas, os oásis
de ciência e tecnologia do
brasil estão nas universidades,
e é impossível pensar diferen-
te”, considerou.
Justamente por isso, estefen
acredita que a inovação não
será feita nas empresas, por-
que ela s não investem em
pesquisadores. “elas têm que
investir nisso primeiro para,
depois, fazer inovação. elas
são incipientes, não inves-
tem em p&d. temos empre-
sas familiares equivalentes às
da Coreia do sul, que são as
nossas empreiteiras, mas não
investem em p&d”, lembrou.
o professor avalia que é pre-
ciso, primeiro, pensar onde
estão os recursos para, a par-
tir daí, construir a inovação.
www.senado.gov.br/emdiscussao
17
18. REALIDADE BRASILEIRA
País ainda
constrói bases
para inovação
Baixo investimento em pesquisa, falhas na educação e
pouca participação da indústria deixam Brasil longe dos
líderes mundiais. Mas formação de pesquisadores avança
C
ada vez mais, a re- mundial, o Brasil busca agregar próprio conceito do transporte,
lação entre conhe- valor à produção por meio de a matriz do transporte. A saída
cimento científ ico uma política que leve a indús- para o futuro não está apenas na
e c a p a c id a de de tria nacional a oferecer produtos inovação do combustível, mas
inovação tecnológica se estrei- com competitividade internacio- na inovação do propósito do uso
ta, colocando na liderança as nal. Caso contrário, continuará das inovações”.
nações que mais investem em a ser, cada vez mais, fornecedor Apesar de ter um sistema edu-
pesquisa. E o Brasil não vem se de matérias-primas (as chama- cacional falho, o Brasil também
apresentando como uma delas. das commodities, ou seja, alimen- dispõe de alguns requisitos para
O país é superado não apenas tos, minérios e petróleo bruto) que isso aconteça. O país possui
pelos tradicionais países desen- para os países mais ricos. hoje grande estrutura de pesqui-
volvidos, mas também, a partir Para mudar a situação, o sa, forma milhares de pesquisa-
da década de 1990, por países senador Cristovam Buarque dores, que produzem e publicam
emergentes, em especial China (PDT-DF) resumiu a situação os resultados das descobertas em
e Coreia do Sul, que percebe- atual e o que precisa ser feito revistas científicas.
ram mais cedo a necessidade de para que o país adote nova pos- No entanto, os dados tam-
investir pesado em educa- tura e vire o jogo. “O simples bém demonstram que a indús-
ção e montar um sistema uso de ciência e tecnologia para tria participa pouco do esforço
de inovação dinâmico e continuar produzindo a mesma nacional para inovar, muito
eficiente, capaz de con- cesta de bens não vai dar resul- abaixo do que o setor prati-
correr, inclusive, com as tados. Por exemplo, a ciência e a ca nos países que lideram os
grandes potências. tecnologia que colocam baterias rankings de inovação.
Para se tornar elétricas em automóveis, que co- Em Discussão! apresenta
efetivamente locam os chamados combustí- nas próximas páginas dados
uma lide- veis verdes no lugar de gasolina que demonstram a situação bra-
rança não bastam para construir uma sileira na corrida pela evolução
sociedade nova. Para uma nova no mundo, comparando-a com
sociedade, é preciso mudar o a de outros países.
18
setembro de 2012
20. Commodities dominam
pauta de exportações
Embora nos últimos anos o madeira). Ao mesmo tempo em produtos intensivos em recur-
Brasil tenha se beneficiado de que o país é beneficiado por essa sos naturais é de apenas 9,3%),
circunstâncias econômicas ex- produção, a avaliação é de que se Estados Unidos (15%), México
ternas e internas especialmente trata de uma pauta de exportação (23%) ou Índia (29%), percebe-
favoráveis, economistas alertam muito vulnerável a variações nos -se que há um equilíbrio entre
para a crescente participação de preços internacionais e ao padrão esses produtos e os de valor tec-
produtos primários na matriz de consumo de outros países. nológico agregado (veja infográ-
de exportação brasileira. Quase Ao se analisar as matrizes de fico na pág. 22). Só para se ter
metade (48%) dela é composta exportação de outros países que uma ideia, a participação dos
por produtos in natura (princi- participam ativamente do co- produtos intensivos em recur-
palmente produtos agropecu- mércio internacional, como a sos naturais em todo o comércio
ários, minérios, petróleo, gás e China (onde a participação dos mundial é de apenas 26%, média
rodrigo leAl/AppA
20
setembro de 2012
21. Realidade brasileira
bastante inferior ao percentual Hoje, segundo o Ministério Consequentemente, o déficit
brasileiro. da Ciência, Tecnologia e Inova- n a b a l a nç a c ome rc i a l do s
ção (MCTI), mais de 60% das segmentos de média-alta e alta
Reprimarização exportações brasileiras são cons- tecnologia, segundo o MCTI,
A chamada “reprimarização” da tituídas de produtos não indus- passou de US$ 10,1 bilhões em
pauta de exportações do país já é triais ou de relativamente baixa 2007 para US$ 28,4 bilhões em
um fato, de acordo com o Instituto intensidade tecnológica (com- 2010, um aumento de 184% .
de Pesquisa Econômica Aplicada modities, produtos intensivos em Os componentes eletrônicos,
(Ipea). Entre 2007 e 2010, a par- mão de obra e recursos naturais) por exemplo, em especial os se-
ticipação das commodities na pauta e menos de 30% são produtos de micondutores e displays (opto-
de exportações brasileiras saltou de maior conteúdo tecnológico. Há eletrônicos), com um mercado
41% para 51%, depois de ficar em sete anos o país exportava 3,77% mundial estimado, em 2010, em
torno dos 40% durante todos os de todas as commodities nego- US$ 410 bilhões, representam
anos 1990. Os dados são do estudo ciadas no mundo. Em 2009, a cerca de 80% das importações
A Primarização da Pauta de Expor- participação subiu para 4,66%, de componentes eletrônicos (cer-
tações no Brasil: ainda um dilema, índice bastante superior à par- ca de US$ 6 bilhões em 2010).
dos pesquisadores Fernanda De ticipação do Brasil no total do Outro setor que importa mui-
Negri e Gustavo Varela Alvarenga comércio internacional, estimado to é o da saúde, responsável por
(veja infográfico abaixo). em cerca de 1,5%. um déficit de US$ 10 bilhões na
Ou seja, desde 2005 vem cain- balança comercial do Brasil em
do a participação do país nas ex- 2010.
portações mundiais em todas as Por outro lado, no mercado de
Porto de Paranaguá, no Paraná: quase demais categorias. Enquanto em alta tecnologia, Índia, Indonésia,
metade das exportações brasileiras 2005 o país detinha 0,94% do Malásia, Filipinas, Cingapura,
ainda é composta de produtos
primários, como grãos, minérios,
total das exportações mundiais Coreia do Sul, Taiwan e Tailân-
petróleo e madeira de produtos de média intensidade dia, na Ásia, exportaram mais
tecnológica, em 2009 o percen- de US$ 550 bilhões no período
tual caiu para 0,74%. Já a contri- 1998 –2010, enquanto a Chi-
buição do Brasil para o total de na, sozinha, vendeu ao resto do
exportações mundiais de produtos mundo mais de US$ 450 bilhões
de alta intensidade tecnológica no mesmo período.
foi de 0,5% para 0,49% no mes-
mo período, segundo o estudo do Desindustrialização
Ipea. Como se vê, índice bastan- De acordo com os pesquisa-
te inferior à participação nacional dores do Ipea, além da conjun-
nas trocas entre os países. tura dos últimos 15 anos, a atual
Índice de produtos complexos nas exportações é baixo
Brasil vende poucos produtos de alta tecnologia: entre 2005 e 2009, a
participação oscilou de 0,5% para 0,49% do total exportado no mundo
100
5 7 8 8 7 9 11 11 13 13 14
18 16 15 12 12 12 12 12 11 11 9
80 19
18 18 17 19 20 20 18 14
16 13
60 8 10 7 6
8 7 8 10 8 8 9 6
13 7
14 13 13 12 11 10 9 7 51
49
40 41 43
37 39 39 40 39 38 39
20
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Commodities primárias Trabalho e recursos naturais Baixa intensidade
Média intensidade Alta intensidade Outros
Fonte: A Primarização da Pauta de Exportações no Brasil: ainda um dilema,
Fernanda De Negri e Gustavo Varela Alvarenga, Ipea, 2010
www.senado.gov.br/emdiscussao
21
22. Participação das commodities nas vendas brasileiras ao sou a perda na balança comercial
representada pela menor compe-
exterior aumenta e indústria perde competitividade titividade da indústria brasileira
%
no mercado internacional. Em-
80 bora os autores do Ipea conside-
71%
70 68% rem cedo para diagnosticar uma
62% “desindustrialização” do país, já
60 56%
48%
que tem havido um aumento da
50
42% produção provocado pela cres-
40 cente demanda doméstica, eles
29%
30 23% 26% alertam que esse não é um ciclo
20 15% sustentável em longo prazo.
9,3%
10
Cenário
0
China EUA México Mundial Índia Canadá Brasil Chile Austrália Argentina Rússia O MCTI, em seu Balanço das
Atividades Estruturantes 2011,
considera que o cenário global
Agropecuária Extração mineral Petróleo e álcool Alimentos e bebidas
seguirá muito favorável às expor-
Madeira Papel e celulose Minerais não metálicos tações de commodities, mantendo
Fonte: BNDES, Visão de Desenvolvimento, nº 36, 2007 a elevada rentabilidade relativa
desses produtos frente aos pro-
dutos industrializados. Assim,
os produtos primários tendem
Brasil não figura entre exportadores de alta tecnologia a dominar a pauta de exporta-
ções brasileiras por muito tempo
Mesmo países emergentes, que há poucas décadas tinham desempenho
ainda.
tímido, como a Coreia do Sul, conseguiram saltar muito à frente em inovação
O maior risco para o país, se-
U$S (bilhões) gundo o ministério, é a acomo-
700 dação a essa condição de grande
produtor e exportador de com-
600
Ásia* modities, que momentaneamente
China traz divisas e desenvolvimento,
500 União Europeia** desviando a atenção da impor-
Estados Unidos tância de investir em inovação e
400 Resto do mundo
Japão tecnologia. O resultado no lon-
go prazo seria um aumento cada
300 vez maior da vulnerabilidade do
país à flutuação dos preços inter-
200
nacionais do petróleo, alimentos
e minérios, e uma dependência
100
cada vez maior da importação de
0 produtos de alto valor agregado,
1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 com forte impacto sobre a balan-
*Cingapura, Coreia do Sul, Filipinas, Índia, Indonésia, Malásia, Tailândia e Taiwan ça comercial.
**Excluídas as exportações entre os países do bloco econômico México e Holanda são exem-
Fonte: Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, 2012 plos do que pode dar errado
quando um país se empolga com
a rentabilidade de produtos pri-
crise econômica internacional das commodities importadas pela mários e deixa o setor industrial
também contribuiu para a pri- China vinham do Brasil. à míngua de investimentos em
marização da matriz brasileira de Além do bom desempenho das inovação. O primeiro tornou-se
exportações. Mostra disso é que, commodities e da atração que o mero montador de produtos de
em 2009, enquanto o comércio país exerce sobre os capitais in- mais alta complexidade tecnoló-
mundial caiu 22%, o crescimen- ternacionais na crise, que man- gica, enquanto o segundo sofreu
to da economia chinesa diminuiu têm o real forte e encarecem os na década de 1960 a chamada
apenas 11%, e o país se consoli- produtos brasileiros, facilitan- “doença holandesa”: benefician-
dou como o principal parceiro do as importações, a primari- do-se do boom dos preços do gás,
comercial do Brasil. Entre 2000 zação resulta também da perda o que aumentou substancialmen-
e 2009, a participação dos pro- de competitividade da indústria te as receitas de exportação, o
dutos brasileiros no total das nacional por falta de inovação. país deixou de investir na indús-
importações chinesas cresceu de Para De Negri e Alvarenga, o tria, que sofreu uma dramática
0,49% para 2%. Em 2009, 2,5% boom das commodities compen- perda de competitividade.
22
setembro de 2012