QUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptx
Salt
1. Uma abordagem na área da Psicologia
Psicologia A
Prof. Paulo Gomes
2. O Filme Salt, não se tratando duma obra-prima cinematográfica, permite ,
contudo, levantar uma série de questões cuja abordagem pode ser muito
útil na disciplina de Psicologia.
O enredo é relativamente pobre, perdendo-se em muitos momentos na
acção pela acção, uma vez que se trata duma história linear, praticamente
sem densidade, mas que prende o espectador.
E isso acontece devido à ambiguidade com que nos é apresentada a
personagem principal, Evelyn Salt, interpretada por Angelina Jolie: uma
espiã americana, apresentada no início do filme como uma heroína, mas
que cedo deixa de figurar entre os bons da história, para passar a ser
encarada como uma traidora ao serviço dos serviços secretos russos.
Nós como espectadores ficamos na dúvida sobre a personalidade de
Evelyn e toda a história gira em torno desta dúvida.
3. Aqui surge o primeiro problema que vale a pena investigar a partir do visionamento do
filme: até que ponto uma pessoa consegue dissimular a sua verdadeira
personalidade?
Evelyn aparentemente engana todos os seus colegas da CIA. Mas há mais
personagens cuja personalidade se vai revelar como falsa, uma vez que fazem
parte duma conspiração dos serviços secretos russos para atacarem a América a
partir de dentro.
Neste caso, temos a personagem Ted Winter (protagonizada por Liev Shreiber),
chefe de Evelyn. Ted Winter vai revelar-se como traidor, numa reviravolta
totalmente inesperada para o espectador.
Durante muitos anos Evelyn e Ted Winter passaram por testes de personalidade
bastante exaustivos, sem que a CIA suspeitasse da sua lealdade.
4. Será que um ser humano “normal” suportaria a
pressão de tantos anos de dissimulação?
A identidade dum indivíduo consolida-se
durante a infância e constrói-se, de forma
determinante, na adolescência. De acordo
com Erikson a tarefa fundamental da
adolescência é a construção da identidade
No caso destas personagens, dado que se
trata de indivíduos que foram
‘programados’ desde a infância para
assumirem o papel de espiões russos
dentro da sociedade americana (com a
agravante de o fazerem na agência de
espionagem americana, a CIA), o
condicionamento a que foram sujeitos na
infância e na adolescência terá sido forte o
suficiente para moldar a sua
personalidade futura?
5. No filme contactamos com uma série de
personagens que, tal como Salt,
passaram pelo programa soviético
criado por Orlov.
Todas elas se mostram fiéis ao seu
mentor, excepto Salt.
Porquê?
A explicação não é simples. A
personalidade dos indivíduos é um todo
dinâmico que está constantemente a
sofrer mutações.
Embora exista um núcleo que
permanece estável (mas não imune a
mudanças), há factores que podem
continuar a influenciar a forma como os
indivíduos se encaram a si próprios e,
dessa forma, a sua personalidade.
6. O facto de Evelin se ter casado com um
homem por quem se apaixonou, depois
de se ter aproximado dele por razões
profissionais pode ser uma das razões
pelas quais ela se terá libertado do
condicionamento a que foi sujeita na
sua infância, contrariando a perspectiva
behaviorista (ou pavloviana) que terá
estado na origem da criação do
programa secreto de Orlov.
Os indivíduos não são totalmente
moldáveis pelo meio social. A educação
é muito mais do que um mero processo
de condicionamento.
A experiência do amor e do casamento,
contrária à programação de Orlov,
tornou Salt numa mulher plenamente
segura de si e da sua identidade.
7. No fundo, Evelin é uma mulher que se tornou fiel a si própria. A sua
Pátria é a sua própria identidade. Tendo crescido dividida entre a
fidelidade à Rússia ou à América, o que aconteceu é que conseguiu
centrar-se e assumir uma identidade autónoma, não manipulável.
Trata-se duma mulher independente que sempre procurou ser a melhor
em tudo o que fazia: é este desejo de ser a melhor (mesmo quando isso
olhe valia castigos severos) que acabou por sabotar o seu
condicionamento através do programa de Orlov.
8. Pode dizer-se que um programa desse género só poderia ter sentido se
contrariasse a tendência dos seus ‘alunos’ para o individualismo e para a
independência.
É isso que acontece, por exemplo, com a formação de bombistas suicidas,
há uma despersonalização que leva a que os indivíduos deixem de ser
motivados nas suas acções por motivos de ordem pessoal, para passarem
a assumir-se como representantes dum colectivo que urge defender e
exaltar.
9. No caso dos ‘irmãos’ de Evelin Salt parece que foi isso que aconteceu.
Mas qual é o colectivo cujo destino eles incarnam?
A União Soviética colapsou dando lugar a uma Rússia em busca da grandeza
perdida, mas que não se assume como herdeira do passado soviético.
Orlov parece pretender que a Rússia ressuscite sob a forma duma
superpotência sem concorrência a nível planetário. Mas parece que os seus
‘discípulos’ são movidos apenas pelo seu apego ao seu mestre, encarado
como um pai que os criou e é a sua razão de ser. Há um sentido de família que
os mantém unidos e fiéis ao propósito que esteve na base do seu
condicionamento.
10. Ora, o problema que se coloca aqui é o de saber se um programa
como o de Orlov pode existir na vida real. Ou seja, a Psicologia
permite fundamentar um programa deste tipo?
Aparentemente, de acordo com o behaviorismo de Watson e
com a reflexologia de Pavlov isso seria possível.
11. É bem conhecida a provocação de Watson:
"Dêem-me uma dúzia de crianças sadias, bem constituídas e a
espécie de mundo que preciso para as educar, e eu garanto que,
tomando qualquer uma delas, ao acaso, prepará-la-ei para se
tornar um especialista que eu seleccione: um médico, um
comerciante, um advogado e, sim, até um pedinte ou ladrão,
independentemente dos seus talentos, inclinações, tendências,
aptidões, assim como da profissão e da raça dos seus
antepassados."
12. Mas na realidade as coisas são bem mais complexas.
O ser humano não é um mero produto do meio.
É essa a mensagem do construtivismo de Piaget, por exemplo.
E é isso que se pode ver na seguinte passagem de Paulo Freire, um dos
maiores pedagogos lusófonos:
“Exactamente porque somos programados, somos capazes de pôr-nos diante
da programação e pensar sobre ela, indagar e até desviar-nos dela. Somos
capazes de interferir até na programação da qual somos resultado . A
vocação humana é a de “saber” o mundo através da linguagem que fomos
capazes de inventar socialmente. Tornamo-nos capazes de desnudar o
mundo e de “falar” o mundo. Só podemos falar do mundo porque
transformamos o mundo, e o processo não poderia ser ao contrário.”
|Paulo Freire, À sombra desta mangueira, Olho de d’Água, São Paulo, 1995.