1. A autora moveu ação de cumprimento contra a ré alegando descumprimento de acordo coletivo que previa negociações apenas com federações regularmente constituídas.
2. A ré argumentou que negocia com sindicatos e não diretamente com a federação autora, e que a federação em questão mantém legitimidade.
3. A sentença julgou improcedentes os pedidos da autora, entendendo que a federação em questão mantém legitimidade para representar trabalhadores, mesmo com registro suspenso, uma vez que a
1. 1
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO 10ª
REGIÃO
17ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA/DF
Fl.________
S E N T E N Ç A
PROCESSO Nº 0000197-75.2015.5.10.0017
PROCEDIMENTO: AÇÃO DE CUMPRIMENTO
AUTOR: FEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM EMPRESAS DE
CORREIOS,
TELÉGRAFOS E SIMILARS - FENTECT
RÉ: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT
Aos trinta dias do mês de junho do ano de dois mil e quinze, às
17h14min, na sala de audiências desta VARA DO TRABALHO, foram
apregoadas as partes: autora FEDERAÇÃO NACIONAL DOS
TRABALHADORES EM EMPRESAS DE CORREIOS, TELÉGRAFOS E SIMILARS -
FENTECT e ré EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT.
Submetido o feito a julgamento, foi proferida a sentença
nos seguintes termos:
I – RELATÓRIO
A autora FEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM EMPRESAS DE
CORREIOS, TELÉGRAFOS E SIMILARS - FENTECT ajuizou ação de
cumprimento em face da ré EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E
TELÉGRAFOS - ECT, na qual pleiteia as parcelas constantes na
petição inicial. Juntou os documentos de fls. 25-81.
Frustrada a tentativa conciliatória e rejeitado o pedido de
antecipação da tutela de mérito (fl. 87).
2. 2
A ré apresentou contestação em peça escrita às fls. 90-106,
acompanhada dos documentos de fls. 108-306.
A autora apresentou réplica às fls. 310-330, acompanhada do
parecer de fls. 331-336.
Foi encerrada a instrução processual (fl. 337).
Razões finais remissivas pelas partes presentes.
Rejeitada a última tentativa conciliatória (fl. 337).
É o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO
PRELIMINAR DE IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA AUTORA
A ré argui a irregularidade de representação da entidade
autora, haja vista que o Secretário-Geral da FENTECT outorgou
sozinho poderes ao advogado, descumprindo o disposto no artigo
43, III, do Estatuto da autora, por não ter sido concedida em
conjunto com um diretor.
Aduz que também não foi observado o rito previsto no artigo
76, VI, do Estatuto quanto à tomada de decisões pelos membros da
diretoria.
Por fim, fundamenta a preliminar no fato de não haver
deliberação em assembleia para ajuizamento da ação em comento,
nos termos da Lei nº 9.494/97.
Pois bem.
O artigo 43, IV, do Estatuto (fl. 28-verso) confere ao
Secretário Geral o oder de constituir mandatários, pelo que
entendo que é regular a representação da autora, vez que a
procuração do causídico foi outorgada pelo secretário geral.
Por outro lado, o rito previsto no artigo 76, VI, do
Estatuto (fl. 30) refere-se à ordem de precedência para tomada
de decisões administrativas e não relativas ao ajuizamento de
ações.
Por fim, é cediço que a ação de cumprimento não é uma ação
de caráter coletivo, pelo que não há necessidade de o
ajuizamento ser precedido por aprovação em assembleia.
3. 3
Diante disso, rejeito a preliminar de irregularidade de
representação da autora.
PRELIMINAR DE INTERESSE DE AGIR
A ré aduz que a federação autora não tem interesse
procesual, visto que as negociações coletivas são efeivadas com
os sindicatos e não diretamente com a FINDECT.
O interesse processual significa que o direito de invocar a
tutela do Estado somente poderá ser exercido se a prestação
jurisdicional solicitada for necessária, útil e adequada.
A necessidade da tutela jurisdicional repousa na
impossibilidade de a parte satisfazer sua pretensão sem a
intervenção do Estado.
Por sua vez, a utilidade do provimento jurisdicional revela-
se quando o processo aponta para um resultado capaz de ser útil
ao demandante, removendo o óbice posto ao exercício de seu
suposto direito.
Já a adequação é a relação existente entre a situação
lamentada pelo autor ao vir a juízo e o provimento jurisdicional
concretamente solicitado. O sistema legal pátrio condiciona o
exercício da atividade jurisdicional à exata correlação entre a
pretensão e o procedimento proposto.
No caso dos autos, não se constata a ausência de interesse
de agir, visto que as negociações coletivas também podem ocorrer
com a FINDECT.
Desse modo, rejeito a preliminar de ausência de interesse
de agir.
MÉRITO
A autora alega que foi celebrado em 2014 o acordo coletivo
de trabalho 2014/2015 com a ré e a Federação Interestadual dos
Sindicatos dos Trabalhadores e das Trabalhadoras dos Correios –
FINDECT, na qual ficou estabelecido na cláusula 22ª entre outras
cláusulas, que a ré manteria processo permanente de negociação
apenas com as federações legalmente constituídas.
4. 4
Assevera que em 18/11/2014 foi publicado no Diário Oficial
da União o ato administrativo de suspensão do registro sindical
da FINDECT, o que motivou a autora a enviar correspondência à ré
informando da impossibilidade de manutenção de negociação
permanente com a FINDECT.
Relata que mesmo assim a ré insiste em manter negociação com
a FINDECT, tendo inclusive concedido a liberação do trabalho aos
dirigentes sindicais da referida federação.
Em razão disso, postula o cumprimento da cláusula 22ª do ACT
2014/2015, para que a ré abstenha-se de manter negociação com a
FINDECT, bem como o cancelamento da liberação do trabalho dos
dirigentes da FINDETC e aplicação da multa estabelecida na
cláusula 72ª do ACT.
Por sua vez, a ré impugna o pedido alegando que as
negociações são essencialmente celebradas com os sindicatos
profissionais e não diretamente com a FINDETC.
No mais, defende a legitimidade do FINDETC para negociar os
interesses dos trabalhadores a ela filiados.
Analisa-se.
De fato, a cláusula 22ª do Acordo Coletivo de Trabalho
2014/2015 (fl. 37-verso) estabelece que a ré deverá manter
permanente negociação com as federações legalmente constituídas:
“Cláusula 22 – PROCESSO PERMANENTE DE NEGOCIAÇÃO – A ECT manterá o
processo permanente de negociação com as Federações legalmente constituídas e Sindicatos dos
Empregados dos Correios, por meio do Sistema Nacional de Negociação Permanente – SNNP –
Correios, com regras definidas em conjunto com as representações dos trabalhadores.”
Com efeito, entendo que a disposição “legalmente
constituídas” constante na cláusula da norma coletiva não tem o
condão de excluir das negociações as entidades que estejam com
irregularidades administrativas no registro sindical, pelos
motivos a seguir expostos.
O art. 8°, caput, da Constituição Federal/88 estabeleceu a
liberdade de associação profissional ou sindical. Tal preceito
de liberdade sindical deriva do direito fundamental de liberdade
de associação estabelecido no artigo 5º, incisos XVII e XVIII,
da Carta Magna.
A Constituição Federal muito embora garanta a liberdade
sindical, impôs o modelo de sindicato único na base mínima de um
município para representação de categoria profissional ou
econômica, requisito esse aferido por meio do registro sindical
conferido pelo órgão do Ministério do Trabalho e Emprego.
Todavia, a jurisprudência do STF sedimentada pela Súmula nº
677 consagra que o registro sindical presta-se tão somente para
5. 5
zelar pela observância do princípio da unicidade sindical, sendo
esta a única hipótese constitucional apta a possibilitar o
controle do Estado no funcionamento das entidades sindicais
(artigo 8º, inciso II, da CF), conferindo personalidade sindical
à entidade.
Desse modo, não é o registro sindical que confere a
representação dos trabalhadores, mas sim a deliberação soberana
da assembleia dos trabalhadores interessados.
Esse mesmo posicionamento é extraído da jurisprudência do
STF (RTJ 147/868) a seguir:
“(...) 2. A diferença entre o novo sistema, de simples
registro, em relação ao antigo de outorga discricionária do
reconhecimento sindical não resulta de caber o registro dos
sindicatos ao Ministério do Trabalho ou a outro ofício de registro
público.
3. Ao registro das entidades sindicais inere a função de
garantia da imposição de unicidade – esta,sim, a mais importante
das limitações constitucionais ao princípio da liberdade sindical.”
Portanto, o fato de a FINDETC estar com seu registro
sindical suspenso não significa que seja ilegal, ao ponto de não
poder representar seus filiados em negociação coletiva, visto
que o fator que subsidia as liberdades constitucionais das
associações sindicais não é o seu registro em cartório ou no
Ministério do Trabalho, mas sim os trabalhadores interessados
que legitimaram sua atuação em assembleia.
Ademais, não se pode olvidar que a FINDETC e os demais
sindicados indicados na petição inicial possuem personalidade
jurídica, sendo que a suspensão do registro sindical da FINDETC
pode ser revertida se sanadas as irregularidades que a
ensejaram.
Por outro lado, estranhamente a federação autora fundamenta
seu pedido em cláusula de norma coletiva celebrada entre o
FINDETC e a ré em 24/09/2014, acordo coletivo este ao qual a
autora tão somente aderiu em 10/10/2014.
Ou seja, resta demonstrado nos autos que a FINDETC têm
representado seus filiados, tanto que celebra acordos coletivos
com a ré, exercendo a defesa dos interesses dos trabalhadores
que a ela se filiaram espontaneamente, sendo, portanto,
legalmente constituída.
Diante desses fundamentos, julgo improcedentes os pedidos
formulados na petição inicial.
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JUSTIÇA GRATUITA
Defiro os benefícios da justiça gratuita à autora.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
A reclamante pretende o recebimento dos honorários
advocatícios, no importe de 20% incidente sobre o valor da
condenação.
Contudo, a autora foi sucumbente em todos os pedidos
formulados na petição inicial, pelo que julgo improcedente o
pedido de pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.
III - DISPOSITIVO
Posto isso e considerando o mais que dos autos consta, na
ação de cumprimento proposta por FEDERAÇÃO NACIONAL DOS
TRABALHADORES EM EMPRESAS DE CORREIOS, TELÉGRAFOS E SIMILARES -
FENTECT em face de EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS -
ECT decido: rejeitar as preliminares de irregularidade de
representação da autora e ausência de interesse de agir, além de
julgar TOTALMENTE IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. Custas pela autora,
no importe de R$ 700,00, calculadas sobre o valor atribuído à
ação, R$ 35.000,00, de cujo recolhimento fica isento, ante a
concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.
Tudo nos termos e limites constantes da fundamentação, a
qual passa a fazer parte integrante desse dispositivo, como se
nele estivesse integralmente transcrita.
Intimem-se as partes.
Nada mais.
Brasília, 30 de junho de 2015.
ANGÉLICA GOMES REZENDE
Juíza do Trabalho