1. Os fluxos de investimento direto estrangeiro em Portugal são marcados por altas taxas de saída de fundos, diminuindo o aumento líquido efetivo.
2. Grande parte do investimento estrangeiro acumula-se no setor financeiro, tendo pouco impacto na produção, emprego e exportações.
3. Os rendimentos obtidos pelos investidores estrangeiros em Portugal entre 1996-2013 correspondem a 127% do PIB português de 2013.
IDE em Portugal: Fluxos, Rendimentos e Impacto Limitado
1. Investimento estrangeiro em Portugal - Entre o mito e a propaganda
3ª parte
Resumo
A entrada de novo investimento direto estrangeiro (IDE) é acompanhada por uma
elevada saída sendo relativamente reduzido o aumento efetivo, como também é pouco
relevante o impacto no aumento da capacidade produtiva, no emprego e nas
exportações uma vez que parte substancial se acumula no sector financeiro.
Portugal deixou de ter atrativos como destino do investimento estrangeiro mas, apenas
como plataforma para terceiros terem uma entrada fácil no grande espaço da UE e
como centro de lavagem de dinheiros bastante encardidos. Para os capitalistas
europeus, nomeadamente, tornou-se mais atrativo esperar que trabalhadores
portugueses surjam nos seus países.
A saída de capitais como rendimento do investimento neste período corresponde a a
127% do PIB de 2013 e as taxas de rendabilidade situam-se, no último ano em torno
dos 4%, após nítidas quebras nos últimos anos.
Sumário
1 - Os fluxos de investimento direto estrangeiro (IDE) em 1996/2013
2 – O IDE consolidado
3 – Os rendimentos obtidos pelos investidores estrangeiros
4 - Taxas de rendabilidade
++++++++++ / ++++++++++
Este é um terceiro texto sobre o IDE (investimento direto estrangeiro) em Portugal. Nos
artigos anteriores observámos a sua posição no contexto da UE e o perfil sectorial do
IDE em Portugal1; e ainda as origens desse IDE, o investimento e o desinvestimento e
ainda a sua importância nas contas externas em tempos recentes2.
Sublinha-se que, doravante, este tipo de abordagem será dificilmente concretizável
devido às alterações que, nesta área, se verificaram nas organizações internacionais
que produzem dados estatísticos (Eurostat, FMI, OCDE, BCE); e, como é óbvio, o Banco
de Portugal reflete essas alterações. À partida, essas alterações no que se refere à
disponibilidade pública vêm tornar mais opaco o conhecimento quantificado da
realidade. A realidade dos números ficará confinada aos serventuários do capital
financeiro, o qual assim demonstra a pouca consideração que tem pelas pessoas e a
1 http://grazia-tanta.blogspot.pt/2013/10/investimento-estrangeiro-em-portugal.html
2 http://grazia-tanta.blogspot.pt/2014/01/investimento-estrangeiro-em-portugal.html
GRAZIA.TANTA@GMAIL.COM 9/12/2014 1
2. valia que dá à democracia, mesmo sob a forma truncada e grotesca de “democracia
representativa”.
1 - Os fluxos de investimento direto estrangeiro (IDE) em 1996/2013
Observa-se no gráfico seguinte que o volume das saídas de fundos relativos ao IDE, em
relação ao das entradas é elevado, variando entre 73% em 2000 e 95% dez anos
depois. Trata-se de um indicador de mobilidade dos capitais; isto é, por cada novo
investimento estrangeiro de €1000 M, em 2013, devidamente colocado na lapela dos
mandarins de turno, há € 950000 que são desinvestidos e rumam a outras paragens.
Fonte primária já não disponível: Banco de Portugal
Comparativamente à evolução do PIB, as entradas/saídas de IDE mantêm-se
relativamente estáveis na primeira década do século, depois de um forte crescimento
nos finais dos anos noventa. Nos últimos anos, observa-se um elevado crescimento das
duas variáveis mas, com uma quebra acentuada em 2013. O aumento líquido do IDE
observa-se em todo o período, com maiores volumes em 2000 e 2001, nas vésperas da
adopção do euro com 2002 a revelar o impacto da crise das dot.com.
Mais relevante é registar-se que a esse aumento do IDE líquido em Portugal não
corresponde um acréscimo da capacidade produtiva do país (FBCF) a qual se vem
reduzindo desde o princípio do século. De facto, o IDE em Portugal tem-se vindo a
concentrar na área financeira3, desmistificando-se assim o caráter do investimento
estrangeiro como incentivador da capacidade produtiva, do emprego e das
exportações, estas últimas tomadas como a salvação da grei nos discursos da idiotia
governamental; e como se evidenciou no recente caso de corrupção dos “vistos gold”.
Sabendo-se que o PIB tem tido uma fraca evolução neste século, o valor líquido do
IDE, para além de não se refletir em investimento também não se evidencia como
compensação para as quebras do consumo público e privado ou do investimento por
parte de capitalistas nativos.
3 http://grazia-tanta.blogspot.pt/2013/10/investimento-estrangeiro-em-portugal.html
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3. Fonte primária já não disponível: Banco de Portugal
A comparação das entradas ou saídas dos capitais classificados como IDE, com os
fluxos da balança de transações correntes a débito (saídas) ou a crédito (entradas de
fundos) revela uma dinâmica muito maior das entradas ou saídas dos capitais
classificados como IDE até 2003, posicionando-se, a partir daí num patamar mais baixo,
medido em termos de percentagem dos valores da balança corrente; e apesar do
dinamismo dos montantes da balança de transações só se ter perdido a partir de 2009.
Após o início do empobrecimento programado ainda em curso, a evolução do IDE –
que se não inclui na balança corrente - em pouco contribui como compensação para o
tradicional deficit naquela balança. De facto, não dominando no IDE, em tempos
recentes, as aplicações na produção de bens transacionáveis com o exterior, o seu
contributo para o aumento das exportações é escasso.
Fonte primária já não disponível: Banco de Portugal
2 – O IDE consolidado
O gráfico que se segue, evidencia a evolução do IDE consolidado, acumulado; isto é, a
posição do conjunto dos investidores estrangeiros em Portugal e ainda, como vem
evoluindo nos seus componentes básicos. Desde 1996 e no capítulo do investimento
mais vocacionado para uma maior permanência (no capital, incluindo os lucros
reinvestidos) cresce seis vezes – cinco vezes até 2007 -enquanto o PIB em 2013 é
apenas 77% superior ao calculado, dezassete anos atrás. Perante um capitalismo nativo
débil, endividado e pouco munido em termos de tecnologia e gestão, Portugal
interessa ao capital externo pelas potencialidades de muitos trabalhadores,
competentes e pouco reivindicativos ou pela relevância de uma população
consumidora superior a dez milhões de pessoas.
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4. A quebra de ritmo de crescimento a partir de 2007 revela a concorrência dos países da
periferia Leste, recentemente incorporados na UE (2004 e 2007), mais próximos da
Alemanha, com melhores qualificações e menores salários que os portugueses; e revela
também a estagnação da economia europeia e algum desinteresse pela periferia Sul
por parte dos capitalistas do Centro da UE. Note-se, que as privatizações decretadas
pela troika foram aproveitadas em grande parte por capitais chineses, angolanos e até
brasileiros, pendor grotescamente confirmado pelo trabalho de fancaria protagonizado
por Portas com os seus vistos gold. Portugal deixou de ter atrativos como destino do
investimento estrangeiro mas, apenas como plataforma para terceiros terem uma
entrada fácil no grande espaço da UE e como centro de lavagem de dinheiros bastante
encardidos. Para os capitalistas europeus, nomeadamente, tornou-se mais atrativo
esperar que trabalhadores portugueses surjam nos seus países em situação de
desespero, dispostos a aceitar trabalho por preços “competitivos”; Passos, ao incitar à
emigração, mostrou-se brilhante no seu repelente papel de manageiro.
Se o “outro investimento” tem uma evolução pouco distanciada dos investimentos em
capital, diretamente ou através de lucros reinvestidos, o mesmo não acontece com o
investimento de carteira que cai abruptamente a partir de 2009, parecendo estabilizar
no último ano de que se possuem dados.
3 – Os rendimentos obtidos pelos investidores estrangeiros
Interessa-nos agora os fluxos dos rendimentos do IDE gerados em Portugal,
contabilizados como saídos para o exterior - em termos físicos ou meramente
contabilizando um acréscimo de direitos por parte de entidades externas - e observar a
sua composição. Esses fluxos inserem-se numa balança de rendimentos que
contempla, para além de capitais (97% a 99% do total) os rendimentos do trabalho,
que cobrem a reduzida fatia restante. Englobam-se nos rendimentos do capital aqueles
que resultam da posse de ações, outras participações ou da concessão de
empréstimos; e de obrigações ou outros títulos de dívida, sem ligação com qualquer
investimento direto, sem outro objetivo que não o rendimento desses títulos ou o jogo
especulativo com os mesmos.
Comecemos por considerar a balança de rendimentos do investimento e os seus
componentes, na parte correspondente à saída de capitais (débito), para o período
1996/2013. A saída de capitais por este efeito neste período corresponde a pouco
menos do que a dívida pública atual ou, mais precisamente a 127% do PIB de 2013.
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5. Será também curioso apresentar a evolução dos rendimentos do capital beneficiando
entidades externas por cada elemento da população com emprego, tomando esta pelo
valor médio do período – cerca de 4.7 milhões de pessoas – e ainda quanto isso
significa em tempo de trabalho.
A distribuição do total dos rendimentos do investimento saídos de Portugal apresenta,
no gráfico abaixo, duas fases de crescimento – uma, anterior a 2001 e outra em
2004/08 – e duas de quebra, uma em 2002/03 em virtude do início do abrandamento
da economia e da crise global associada ao fim da bolha dot.com e a posterior a 2008,
como resultado da crise financeira europeia e do afundamento da economia
portuguesa.
As remunerações do investimento em carteira compreendem as que se prendem com
juros de empréstimos em que os mutuantes não têm participação no mutuário, bem
como lucros de ações ou participações que envolvam objetivos de mera aplicação de
capital, sem intenções de intervenção na gestão e ainda, os rendimentos associados a
derivados financeiros. Todos, em geral, com propósitos de curto prazo, evidenciam os
efeitos da conjuntura retomando, a partir de 2009, uma evolução regular. No capítulo
dos rendimentos do outro investimento, uma categoria compósita e residual, a sua
evolução é paralela à do total dos rendimentos mas, com uma quebra mais acentuada
que aqueles em 2009/10.
Fonte primária já não disponível: Banco de Portugal
As remunerações do investimento em carteira compreendem as que se prendem com
juros de empréstimos em que os mutuantes não têm participação no mutuário, bem
como lucros de ações ou participações que envolvam objetivos de mera aplicação de
capital, sem intenções de intervenção na gestão e ainda, os rendimentos associados a
derivados financeiros. Todos, em geral, com propósitos de curto prazo, evidenciam os
efeitos da conjuntura retomando, a partir de 2009, uma evolução regular. No capítulo
dos rendimentos do outro investimento, uma categoria compósita e residual, a sua
evolução é paralela à do total dos rendimentos mas, com uma quebra mais acentuada
que aqueles em 2009/10.
O crescimento das remunerações do IDE saídas de Portugal apresenta três momentos
de quebras, que se vão acentuando em profundidade e duração, em 2002, 2007/08 e a
partir de 2011, seguindo-se nos dois primeiros casos, períodos de elevado crescimento.
Os negócios em Portugal, para o capital estrangeiro, serão mais aliciantes na compra
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6. de participações e ativos, mormente em contexto de privatizações impostas pela troika,
do que pela sua rendabilidade imediata; embora a sua rendabilidade global não seja
despicienda. As dificuldades das empresas portuguesas, historicamente muito
endividadas, as restrições de acesso a novos créditos e a regressão do poder de
compra da população, tornam-nas presas fáceis e baratas para a aquisição por
capitalistas estrangeiros; que as inserirão nos seus negócios globais e com distribuição
de rendimentos adiada.
A evolução recente dos vários tipos de rendimentos do investimento, saídos de
Portugal precisa ser complementada com uma aferição do peso de cada um desses
componentes no total.
Fonte primária já não disponível: Banco de Portugal
Como atrás se disse e é verificável no gráfico acima, a representatividade dos
rendimentos do IDE reduz-se nos últimos anos, evidenciando a sua menor
rendabilidade como adiante se observará (4. Taxas de rendabilidade), correspondendo
à evolução económica em Portugal que se revelou débil numa primeira fase, caindo no
desastre periférico a partir de 2009. O crescimento do peso dos outros tipos de
investimento reflete a preponderância para operações de curto prazo, de rendabilidade
assegurada ou mesmo especulativas, sem qualquer impacto na estrutura produtiva ou
na sua modernização.
Restringindo agora a abordagem ao IDE, observe-se a evolução dos vários tipos de
origens dos rendimentos ali contabilizados, no período considerado.
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7. Rendimentos do IDE em Portugal - Evolução (1996=100)
5000
4500
4000
3500
3000
2500
2000
1500
1000
500
0
-500
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Rendimentos do IDE - total Dividendos e lucros distribuidos
Lucros reinvestidos Rendimentos de empréstimos
Fonte primária já não disponível: Banco de Portugal
Em relação ao total dos rendimentos constituídos em torno do IDE, é particularmente
claro que aumentou substancialmente o nível dos rendimentos de empréstimos,
sobretudo a partir de 2006, depois de um ponto elevado em 2000/02, tempo de
implantação do euro. Será que as empresas estrangeiras instaladas em Portugal
encontram condições de financiamento mais favoráveis fora do país, beneficiando da
ligação às suas casas-mãe, aproveitando-se de excedentes formados naquelas, numa
lógica de aproveitamento de sinergias de grupo? Em anos mais recentes, esse
financiamento externo estará também relacionado com as dificuldades dos bancos
portugueses que necessitaram do artifício da subscrição de dívida pública para se
financiarem ou que recorreram à linha de crédito incluída no empréstimo da troika.
O crescimento referido para a saída de rendimentos dos empréstimos contrasta com o
dinamismo muito menor dos lucros distribuídos, em queda depois de 2010, por razões
que se prendem com as quebras da atividade e de poder de compra, de todos bem
conhecidas. Pior que isso é a evolução dos lucros reinvestidos, que estagna a partir de
2005/06 indicando a falta de perspetivas de crescimento por parte das empresas, a
ausência de investimento e a insuficiente confiança numa evolução interessante do
“mercado” português.
4 - Taxas de rendabilidade
Nem em todas as rubricas em que se repartem os rendimentos do investimento
externo em Portugal se pode fazer uma correspondência com o valor consolidado do
mesmo para se calcular uma taxa implícita de rendabilidade. Por exemplo, no caso do
IDE, os lucros distribuídos, tal como os reinvestidos nas empresas, têm uma relação
direta com o valor investido. Isso não acontece com os juros dos empréstimos
concedidos pelas casas-mãe às suas antenas em Portugal que, em princípio se devem
relacionar com capitais cedidos por empréstimo e como reforço do valor investido e
incorporado no capital. Não se conhecendo o montante acumulado de empréstimos
tomaram-se os juros pagos correspondentes, como equiparados a lucros; isso
corresponderá a algum empolamento da rendabilidade do IDE considerada no gráfico
abaixo. Contudo, refira-se que os rendimentos saídos como juros de empréstimos de
sócios/acionistas têm um significado irregular, no período considerado, mas limitado;
correspondem a 6.5% dos rendimentos do IDE relativos a ações e participações, em
2013.
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8. O IDE propriamente dito revela no período em análise as contingências próprias da
conjuntura pois o investimento direto, sendo mais estável, tem menos mobilidade para
se esquivar às flutuações típicas dos ciclos mais curtos do capitalismo. As taxas de
rendabilidade implícitas do IDE revelam relativa estabilidade até 2001, caindo no ano
seguinte – adopção do euro e crise das dot.com - para iniciarem um ciclo de
crescimento que atinge um cômputo superior a 7% em 2006; o início da crise
financeira global reduziu ligeiramente a taxa em 2007/08 mas subiu vertiginosamente
nos dois anos seguintes atingindo um máximo da ordem dos 10% em 2010, quando as
dificuldades dos bancos afetam as contas públicas e os níveis de emprego. A partir daí,
as contrações do poder de compra e dos níveis de investimento mostram os seus
impactos sobre os níveis de rendabilidade dos capitais estrangeiros em Portugal.
Fonte primária já não disponível: Banco de Portugal
Nos investimentos de carteira, os seus dois componentes apresentam taxas de
rendabilidade diferenciadas até ao início do século, quase se confundindo desde então.
As diferenças de rendabilidade face ao IDE acentuam-se a partir de 2003 e só voltam a
aproximar-se quase dez anos depois. Quanto ao outro investimento, ele apresenta
taxas de rendabilidade próximas dos investimentos em carteira mas, caindo
substancialmente a partir de 2009, para valores em torno de 1.5%
Este e outros textos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/
http://pt.scribd.com/profiles/documents/index/2821310
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
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