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Carlos Manuel Ribeiro Teixeira




             Notícias em Russo para imigrantes
            Influências no processo de integração




Instituto Superior de Ciências da Informação e da Administração
                         Aveiro, 2006
Carlos Manuel Ribeiro Teixeira




           Notícias em Russo para imigrantes
         Influências no processo de integração




   Monografia apresentada ao Instituto Superior de Ciências da Informação e da
Administração como parte dos requisitos para obtenção do grau de licenciado em
                                                                Comunicação.


                                               Orientador: Doutor Dinis Alves
Resumo




O trabalho desenvolvido tem por objectivo analisar o impacto das ferramentas da
comunicação na criação de condições para o processo de integração de imigrantes de Leste
em Portugal tomando como referência o caso da região de Aveiro.

Os primeiros capítulos analisam a vertente teórica do fenómeno imigração e da entrada do
tema nas agendas das empresas de comunicação. Segue-se uma análise do caso prático
protagonizado pela Rádio Terra Nova que assumiu o lançamento de um serviço noticioso para
imigrantes do Leste, segmentando a sua oferta noticiosa. Os objectivos, os métodos e a aposta
nesta realidade são alvo de análise.

Este projecto assume a ideia de que o processo comunicacional pode ser uma ferramenta de
apoio social e de integração. Sem intervenções directas que visem esse objectivo, são, de
forma indirecta, os motores de uma realidade que passou a fazer parte das agendas das
empresas de comunicação. Não há rádio, jornal ou canal de televisão que não aborde a
temática. Não há quem não critique as abordagens sensacionalistas ou o tratamento dado em
determinado acontecimento.

Falar de imigrantes como força geradora de um novo modelo cultural poderá parecer, à
primeira vista, um exagero, mas é certo que este fluxo veio produzir alterações no tecido
social com reflexo em vários pontos do país, permitindo a criação de conceitos que se
difundem por grandes cidades e pequenos povoados portugueses. Aveiro sentiu estas
alterações que têm reflexo nos principais núcleos urbanos, mas também em recônditas aldeias
do distrito. Poderíamos estar a falar de modas, épocas ou correntes. Talvez não seja suficiente.
É um movimento silencioso que está a criar novas formas de estar, novos públicos, novas
ambições e novos estratos sociais. Uma revolução silenciosa porque mexe com a cultura de
um povo.

Este estudo quis assumir uma abordagem mais qualitativa, procurando o lado mais positivo
que é, também, a marca dos noticiários em Russo na Rádio Terra Nova.




                                                                                              v
Abstract




The present essay aims to analyse the impact of the migration movements in the Portuguese
society, in particular, in Aveiro, and the contribution of certain media tools in the creation of
favourable conditions for the integration process.

The first chapter analyses the theoretical aspects of the immigration phenomenon and the way
the subject has entered the agendas of media firms. Next, is presented the case study of Radio
Terranova, which created a news service for Eastern European immigrants and, therefore,
segmented its programmes. The goals, methods and the reasons behind the choice of this
reality are analysed here.

Why the Eastern European immigration and why now? These questions are the core of this
study, which involves hearing people with different occupations, so to understand if the
phenomenon has a global impact or is limited to specific areas.

This project assumes the idea that the communication process may be a tool for social support
and integration. Without intention, the immigrants have, indirectly, become a strong subject in
the media firms´ agendas. There is not a radio station, newspaper or television station, which
doesn’t focus the issue. All criticise the sensationalist approaches or the coverage given to a
certain incident.

To talk about immigrants as a generating force of a new cultural model may seem, at first,
rather exaggerated; but it is true that this flow has produced changes in society, created
concepts that have been diffused in large cities and small Portuguese villages. Aveiro has felt
those changes, reflected in the main urban centres, as well as in the most secluded villages of
the district. We could be talking about a trend. But, maybe, this is not enough. There is a
silent movement, creating new lifestyles, new publics, new ambitions and new social classes.
It is a silent revolution because it deals with the culture of a certain group.

This study assumes a more qualitative approach, seeking the more positive side of the issue
which is, also, the distinctive mark of the Russian news in Radio Terranova.




                                                                                              vii
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração




8
Agradecimentos




Este projecto resulta de múltiplos apoios dos quais gostaria de destacar os mais
significativos.

A primeira palavra de agradecimento para o orientador da Monografia, Professor
Dinis Alves, pelo interesse demonstrado e pelo incentivo permanente ao longo da
elaboração.

Não posso deixar de agradecer a colaboração de Valentina Ribau pelos elementos
fornecidos e pelos contactos facultados que serviram de base à monografia.

Outras pessoas deram sugestões e pistas que se revelaram importantes ao
desenvolvimento do estudo:


   •   À Dra. Eliana Silva, da área formativa da Associação Industrial do Distrito de
       Aveiro, pelo apoio na promoção dos inquéritos;


   •   À família que ao longo de todo este percurso nunca me negou apoio;

   •   Aos colegas da Rádio Terra Nova que são suporte do trabalho diário;


   •   Ao Engº Vasco Lagarto pela liderança que faz da RTN campo de inovação
       permanente com preocupações sociais;


   •   A todos quantos deram o seu contributo;

   •   Aos que responderam aos questionários e entrevistas




A todos quantos apoiaram e forneceram elementos essenciais ao projecto e souberam
na hora certa incentivar a realização da Monografia, pois sem eles não teria sido
possível uma abordagem prática do tema.

                                                                                   ix
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração




10
Índice Geral

Resumo .......................................................................................................................................5
Abstract.......................................................................................................................................7
Agradecimentos ..........................................................................................................................9
Índice Geral ..............................................................................................................................11
Índice de quadros......................................................................................................................13
Abreviaturas mais utilizadas.....................................................................................................15
Introdução...................................................................................................................................1
   Capítulo I ................................................................................................................................5
       1. Imigração como fenómeno social...................................................................................5
           1.1. Relativismo cultural.................................................................................................5
           1.2 Factores condicionantes da Imigração......................................................................7
       2. Imigração em Portugal ...................................................................................................8
           2.1 Imigração no contexto Europeu..............................................................................12
       3. Estruturas de apoio ao imigrante ..................................................................................14
   Capítulo II.............................................................................................................................17
       1. Imigração do Leste na região de Aveiro.......................................................................17
           1.1 Associativismo como ferramenta ...........................................................................19
       2. Influência social............................................................................................................22
           2.1 Barreira linguística .................................................................................................25
           2.3 Potencial económico...............................................................................................26
       3. Integração e legalidade .................................................................................................28
           3.1 Reforma legal .........................................................................................................29
           3.2 Acolhimento sustentado .........................................................................................32
           3.3 Criticas ao processo legislativo ..............................................................................33
   Capitulo III ...........................................................................................................................37
       1. Imigração na agenda dos Media ...................................................................................37
           1.1 Notícias sobre imigração - estudo ..........................................................................39
           1.2 Meios de comunicação multiculturais ....................................................................41
           1.3 “Arrastão” de notícias.............................................................................................42
       2. Informação em cadeia...................................................................................................44
           2.1 Soluções de equilíbrio ............................................................................................45
   Capitulo IV ...........................................................................................................................49


                                                                                                                                             xi
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


        1. Caso de estudo: Noticiários em Russo na Rádio Terra Nova ......................................49
            1.1 Enquadramento institucional ..................................................................................49
            1.2 Projecto notícias em Russo.....................................................................................51
        2. Agenda diária................................................................................................................53
            2.1 Informação em rede ................................................................................................54
            2.2 Informação e cultura...............................................................................................56
            2.3 Noticiários em Russo e publicidade .......................................................................58
        3. Estudo junto dos potenciais ouvintes do serviço ..........................................................60
            3.1 Objectivos...............................................................................................................60
            3.2 Metodologia da investigação ..................................................................................61
            3.2.1 Método de obtenção de dados .............................................................................61
            3.2.2 Selecção do universo e da amostra ......................................................................62
            3.2.3 Tratamento dos dados..........................................................................................62
            3.3 Apresentação e análise de resultados .....................................................................62
            3.3.1 Caracterização da amostra ...................................................................................63
            3.3.2 Dificuldades na adaptação ...................................................................................64
            3.3.3 Conclusão da caracterização da amostra .............................................................73
     Considerações Finais ............................................................................................................75




12
Índice de quadros




Quadro 1 – Distribuição da amostra por países de origem……………………...


Quadro 2 – Anos de residência em Portugal……………………………………


Quadro 3 – Grau de dificuldade no processo de integração…………………….


Quadro 4 – Tipificação das dificuldades no processo de integração……………


Quadro 5 – Frequência de ouvintes dos noticiários em Russo………………….


Quadro 6 – Horário preferido para ouvir noticiários em Russo…………….......


Quadro 7 – Âmbito dos assuntos de interesse para imigrantes…………………


Quadro 8 – Temas preferidos nos noticiários em Russo…………………….....


Quadro 9 – Participação em eleições nos países de origem…………………....


Quadro 10 – Influência dos noticiários no sentido de voto……………………


Quadro 11 – Influência dos noticiários na promoção de espectáculos…………




                                                                           xiii
Abreviaturas mais utilizadas




Abreviaturas mais utilizadas




ACIME – Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas

RTN – Rádio Terra Nova

UA – Universidade de Aveiro

SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

IEFP – Instituto de Emprego e Formação Profissional

AIDA – Associação Industrial do Distrito de Aveiro

JN – Jornal de Notícias




                                                                xv
Introdução




A experiência profissional de 18 anos como colaborador e profissional da Rádio Terra Nova e
o trajecto académico seguido até à conclusão do curso de comunicação no ISCIA permitem o
cruzamento de duas vertentes essenciais à opção tomada de desenvolver o estudo
monográfico sobre a influência da difusão de notícias em Russo, na Terra Nova, no processo
de integração de imigrantes na sociedade aveirense.

O estudo destaca a produção noticiosa como algo dinâmico ajustado às realidades sociais que
se vão construindo pelos fluxos migratórios. Este será um dos campos de acção, uma vez que
o mundo do jornalismo, em particular na rádio onde exerço a profissão de jornalista, não
ignorou a criação de um nicho de mercado interessado num tipo de informação diferenciado
dos hábitos tradicionais em Portugal. Em simultâneo obriga a desenvolver uma reflexão sobre
a importância de estar atento aos fenómenos sociais porque serão um dos motores da
dinâmica registada em Portugal na última década.

A importância do jornalismo nas sociedades modernas é inquestionável e os movimentos
migratórios vieram alterar a ordem social. Onde antes se debatia o estrato social ou as faixas
etárias como mercado alvo hoje descobrem-se novos critérios que permitem pensar em ajustar
oferta e procura no mundo do jornalismo.

Loviglio (2005), citando Carey e Brecht, sobre rádio, acreditava estar perante um instrumento
destinado a funcionar com interactividade, e parte de um espaço de liberdade democrática.
Carey defendia a existência de dois modelos em perspectiva para o século XX com a
emergência da rádio: um associado ao controlo social e outro destinado a criar um sentido
ritual de comunidade. A América vivia a entrada na era dos talk-shows.

O conceito de serviço público sofre transformações que o colocam em discussão. Existem
vários factores a levar em conta na análise:




       A proliferação de meios de comunicação

       A especialização de meios com predominância para as rádios de música

                                                                                            1
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


       A crescente capacidade de encontrar informação à escala mundial




Conceito a que se junta uma nova realidade social ditada pela entrada de imigrantes do Leste
Europeu:




       O interesse dos imigrantes que escolheram Portugal como país de acolhimento

       A capacidade económica dos imigrantes que operam na região de Aveiro

       A crescente criação de associações de apoio aos imigrantes

       A barreira linguística




A democratização desta distribuição é hoje uma realidade incontornável num país como
Portugal onde os imigrantes do Leste Europeu, descobriram que as oportunidades podem estar
em cidades médias ou até em pequenos povoados onde o nível de vida, não sendo tão elevado,
oferece algumas possibilidades de sobrevivência nos primeiros e difíceis momentos da
instalação num novo país.

O exemplo do Leste Europeu será um dos mais interessantes em termos de estudo porque
apresenta realidades recentes e dados em permanente mutação. Os números disponíveis sobre
imigração no distrito de Aveiro tornam esta realidade num campo de estudo.

Um caso a merecer análise e mobilização da sociedade na forma como se concentra sobre
uma interacção cultural com implicações na vida diária de populações que estão cada vez
mais próximas e que, segundo Eduardo Sá (2006), “a médio e longo prazo poderão estar na
génese de uma cultura nova.

Um esforço que conta com o apoio de associações de apoio ao imigrante. Não é fácil a
montagem das estruturas de apoio que registam ainda as rivalidades próprias das diferentes
comunidades. Todas desejam ter uma associação. As freguesias em concelhos vizinhos de
Aveiro passaram a ser desafiadas para a criação de espaços de apoio, mas esses movimentos

2
nunca ganharam espaço de intervenção. Trata-se de uma fase do sistema marcada por avanços
e recuos, fases de maior credibilidade ou momentos de menor consistência que acabam por
destruir os verdadeiros propósitos do associativismo.

A aprendizagem da língua e os recenseamentos serão alguns dos sinais mais visíveis desta
ligação entre culturas, mas outras existem que esbatem fronteiras e permitem falar da criação
de uma nova realidade em grande aceleração e com múltiplas formas. Cita-se, como exemplo,
a música, os produtos bancários e até os negócios na área da pesca e transformação do
bacalhau.

Tal envolvimento justifica, por si só, um olhar atento a que os órgãos de comunicação não
escapam. Seja na vertente mais social ou numa perspectivas económica, a verdade é que a
imigração criou um espaço de intervenção para os órgãos de comunicação. Os que agarraram
esse papel parecem satisfeitos com a aposta e muitos outros equacionam o lançamento de
novas propostas.

O objectivo geral do tema proposto consiste em enquadrar o fenómeno da imigração no tecido
social e a importância que os órgãos de comunicação podem ter na construção de um processo
bem sucedido. Tomando como referência a Rádio Terra Nova, que tem um serviço de notícias
em Russo, será feita uma abordagem às notícias e ao impacto que tal serviço tem na vida dos
imigrantes.




Como objectivos mais específicos, propomo-nos:

       Identificar a estrutura do noticiário preparado para imigrantes do leste

       Determinar o impacto que esse serviço tem na vida dos imigrantes em particular nos
       primeiros meses de vida em Portugal

       Descobrir potenciais novos serviços




Uma realidade que vai ao ponto de proporcionar debates alargados sobre a forma como os
acontecimentos são tratados e que efeitos têm no processo de integração. Podemos dizer que

                                                                                           3
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


se cria um quadro de natureza construtiva que procura pontos de apoio e pistas para
facilitar a integração de imigrantes em Portugal onde, apesar de tudo, os agentes
envolvidos falam de uma realidade de relativo sucesso.

O projecto desenvolvido em torno da presença de imigrantes de Leste em Portugal – com
particular incidência na região de Aveiro – é elaborado tendo por fundo a relação entre
culturas. A ligação entre sociedades diferentes, que em determinado momento convergem, faz
da imigração um caso de leitura fascinante.

No caso dos imigrantes, sobretudo os imigrantes do Leste, há inúmeras manifestações que
estão para lá do lado negativo da interligação. Mais habituados a reconhecer nas sociedades
de Leste marcas da criminalidade, desemprego e alcoolismo – traços mais difundidos pelos
meios de comunicação –, os portugueses habituaram-se a olhar para os jornais russos nas
bancas, a ouvir noticiários e programas musicais dedicados a comunidades do Leste, a
reconhecer médicos de culturas das antigas repúblicas socialistas soviéticas, a aprender com
reputados professores do ensino superior e a admirar o esforço de imigrantes no sector da
construção civil. Tal evolução intensificou-se na última década. Começou em vagas
controladas e depressa passou para uma explosão que gerou disfunções ao nível dos fluxos e
dos circuitos paralelos criados, muitas vezes, à margem da lei.

A estrutura da Monografia assenta:

- No primeiro capítulo, no enquadramento da Imigração enquanto fenómeno social;

- No segundo capítulo, nos reflexos e nos impactos da imigração na Área Metropolitana de
Aveiro;

- No terceiro capítulo, no agendamento das questões da imigração nos meios de comunicação;

- No quarto capítulo, com a abordagem de um caso prático protagonizado por uma rádio local
(Terra Nova) que assumiu o desafio de lançar um noticiário em Russo para imigrantes de
Leste.




4
Capítulo I


Capítulo I




“Tenho dito que a escola foi a invenção mais bonita da humanidade, e que a educação
para todos foi a maior (e mais tranquila) de todas as revoluções. E será ainda mais
bonita se promover a diversidade e a criatividade, a reciprocidade e os bons exemplos”.

Eduardo Sá (2006)




1. Imigração como fenómeno social

1.1. Relativismo cultural




Marcado por diferentes fases, o conceito de cultura tem apontado para um sistema de
costumes, valores, comportamentos e crenças que redundam na criação material e que são
partilhados por comunidades. O que define estas comunidades? A ligação entre os indivíduos
e a sua relação com outras comunidades e com o mundo apostando no fortalecimento de
valores e costumes enraizados pelo tempo.

São valores que alcançam a sua afirmação com a passagem de geração em geração.

Segundo Titiev, “a antropologia assentou, no século XIX, o seu estudo na visão parcelar,
fragmentada e pouco dinâmica das sociedades. Vivia-se o tempo em que os padrões eram
dominados pela era Vitoriana. Qualquer análise cultural resultava de relatos de comerciantes,
viajantes e missionários e os dados eram analisados como fósseis ou espécies animais sempre
à luz dos padrões vigentes no mundo ocidental. Estas peças serviram, muitas vezes, para
avaliar o estágio de desenvolvimento das sociedades. Apesar de ser rotulada como um todo, a
cultura não era mais do que um somatório de elementos, tendo como referência a sociedade
industrializada inglesa”.

Hoje continuam a ser evidentes as marcas desta cultura dominante, em que os padrões
ocidentais representam importantes pontos de referência na análise das sociedades, mas é cada

                                                                                           5
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


vez mais determinante o abandono das expressões assentes no etnocentrismo. Ganha
preponderância o estudo que deixa de lado a análise cultural tendo como referência uma
determinada cultura que é considerada dominante.

O século XX fica marcado pela chegada do “relativismo cultural”, corrente que defende a
aprendizagem como via para a constituição de determinados aspectos culturais e renega a
influência de aspectos biológicos.

A influência desses condicionamentos culturais passa ainda por actos inconscientes e não por
deliberações racionais muito embora se considere que existem questões racionais a explicar
valores culturais.

Todas as culturas são desenvolvidas de acordo com as suas prioridades e valores. Nenhuma é
melhor ou mais avançada. Traços culturais não devem ser avaliados à luz de um contexto
mundial, mas apenas no seu contexto de inter-relações.

Segundo Titiev, “marcas culturais tais como língua, tecnologia, instituições, crenças e valores,
são transmitidas através de gerações e mantêm continuidade nos processos de aculturação
entre gerações. E se o processo não depende exclusivamente da biologia não dispensa alguns
contributos. Características humanas acabaram por ser potenciadas pelas capacidades físicas e
pelas capacidades intelectuais que são susceptíveis de afectar o desenvolvimento cultural.
Contudo, estes factores não determinam capacidades específicas. Podem criar condições para
aprender línguas, mas a aprendizagem depende do esforço do ensino.

A substituição das teorias da transmissão genética do comportamento pela aprendizagem
própria da evolução humana teve efeitos na ponderação da herança humana. Cada vez mais, a
adaptação ao meio ambiente depende de estratégias culturais em detrimento de predisposições
genéticas”.

Ao longo de milhares de anos, o ser humano deu mostras de adaptação em diferentes
ambientes e testou a sua capacidade em diversos ecossistemas. As diferenças culturais
mostraram-se mais profundas e limitadoras. Funcionam como campo de estudo de inegável
interesse.

Já em 1958, Titiev preconizava: “tal como a mobilidade dos factores económicos significa
que recursos como capitais, formação ou tecnologia podem deslocar-se para zonas de


6
Capítulo I

maximização e geradores de riqueza também as migrações laborais procuram a melhor
remuneração para a capacidade produtiva. A evolução da tecnologia que está na base da
organização das empresas e que promove a concorrência entre modelos de sociedades, trouxe
também instabilidade das hierarquias sociais, das categorias profissionais e dos rendimentos”.

Mas os factores económicos ou a tecnologia não são os pioneiros das movimentações
humanas. Desde sempre que as assimetrias religiosas, económicas, culturais ou políticas, para
referir apenas algumas, originaram êxodos humanos, na tentativa de encontrar condições de
vida melhores do que aquelas de que gozam nos seus países de origem.




Tal como afirma Maria do Rosário Dias na obra “Investigação Transcultural” sobre Atitudes
Face aos Imigrantes – estudos piloto de Lisboa, Sociologia Problemas (1997) “até hoje, e ao
longo de toda a história, o conceito de imigração tem sido definido como a necessidade
humana de deslocação de próprio contexto vital para outros contextos com recursos
económicos e sociais suficientes. É, por conseguinte, uma manifestação estruturada em
diversas dimensões, quer sociais, culturais e linguísticas, quer económicas, jurídicas e
políticas”.




1.2 Factores condicionantes da Imigração




Múltiplos factores influenciam a decisão de emigrar. São os chamados factores de repulsão e
factores de atracção. Os primeiros relacionados com o país de origem e os segundos com o
país de destino. Ambos são decisivos.

Sendo um fenómeno histórico e também actual, poder-se-á conjecturar sobre o seu
desenvolvimento futuro, os efeitos e consequências do seu percurso a curto, médio ou longo
prazo.




                                                                                             7
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


Actas do Colóquio Internacional sobre a Emigração e Imigração em Portugal, em 19931,
falavam de uma «tendência para a fuga para países mais desenvolvidos de países de economia
mais débil como fenómeno inevitável a curto e médio prazo. Importa ainda referir que a
imigração tem tendência para um efeito multiplicador, tanto por força do reagrupamento
familiar, como pelo clima de opinião que se gera na comunidade de origem face à melhoria
das condições de vida obtida no estrangeiro por alguns dos seus membros».




2. Imigração em Portugal




Para além da presença secular de uma comunidade cigana, sabe-se que no final do século XVI
existia em Lisboa uma numerosa comunidade africana, cuja diluição se deveu, por um lado, à
gradual miscigenação com os portugueses e, por outro, à proibição da escravatura em finais
do século XVIII.

É a partir dos finais de 1970 que se verifica um acréscimo acentuado da população estrangeira
residente em Portugal. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, publicados em
anexo, a curva tem mantido nível ascendente. Em 1980 eram 50750 e até 2005 não cessam de
aumentar, atingindo os 276450, como documenta o gráfico apresentado, referente a dados do
Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).




1
    Emigração e Imigração em Portugal, Actas do Colóquio Internacional sobre a Emigração e Imigração em Portugal, secs. XIX e XX,
Fragmentos, Algés, 1993, pp415/416



8
Capítulo I




Figuras 1 e 2 – Dados do SEF2



2
    Fonte: www.sef.pt

                                9
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração




O número de imigrantes em Portugal representa 2,65 do total da população do país. Estes
dados são referentes a 2005, quando o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) assumiu ter
registado 276450 estrangeiros a residir legalmente no país3.

Para nos referirmos apenas a um dos anos mais recentes, em 2005 o número de registos
evidenciava acréscimo de 6%, baseado sobretudo em imigrantes europeus (mais 8,6%),
América Central e do Sul (mais 8%), Ásia (mais 7,1%) e África (mais 4,3%). Estas são as
principais áreas de origem dos imigrantes que vivem em grandes áreas metropolitanas como
Lisboa, Faro, Setúbal e Porto.

De 50000 estrangeiros residentes legalmente em 1980, a comunidade estrangeira em Portugal
passou, em 90, para as 107767 pessoas. Após a entrada em vigor da Convenção de Aplicação
do Acordo de Schengen, em 1995, e as alterações daí resultantes, os números da imigração
sofreram um crescimento contínuo e exponencial em todos os países signatários, surgindo
como nova realidade o afluxo maciço de cidadãos do Leste Europeu. No ano 2000 já residiam
em Portugal 220000 pessoas. Paralelamente, o fluxo de imigração ilegal não só não diminuiu
como aumentou de forma acentuada, distribuindo-se por todo o território nacional.

Entretanto, a realidade, dinâmica, acentua hoje uma tendência de redução. Jorge Malheiro, do
Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa, responsável pelo tratamento de
dados em Portugal, admite a quebra. “É já evidente que os fluxos sofrem nova diminuição”
afirmava ao JN.

No caso da imigração de países do Leste Europeu, as maiores quebras notam-se entre
ucranianos e russos, enquanto moldavos e romenos mantêm um nível constante.

Os níveis de desemprego estão a fazer baixar as expectativas dos imigrantes e, no caso dos
ucranianos, essa taxa terá duplicado segundo informação daquele investigador. Estas
condicionantes estão na origem da diversificação da oferta de emprego com os imigrantes a
procurarem novas postos de instalação e a criarem alternativas ao mercado de emprego. “A
maior novidade é a entrada em sectores industriais, mas não só. Há a adesão a negócios de


3
    vide anexo IX

10
Capítulo I

entretenimento e medicinas alternativas…ofertas muito diferentes da tradicional dominância
quase exclusiva da construção civil”, explica Jorge Malheiros.

A população imigrante representa 6% da população activa do país mas a concorrência pelo
retorno ao país de origem faz-se sentir com propostas que chegam, por exemplo, da Rússia.
Há um programa de regresso voluntário que oferece viagens de retorno e emprego garantido.

Há também a concorrência do mercado espanhol onde os salários são mais altos mas o
sucesso da integração continua a falar mais alto. No caso de famílias agrupadas e com bom
encaixe social, a opção é ficar em Portugal.

Pode dizer-se que Portugal vive a fase de amadurecimento da imigração depois da vaga
maciça de entradas. É tempo de estabilização. A fase em que se percebe se a integração foi
bem conseguida e se as “raízes” são estáveis.

É o melhor aferidor da estabilidade nos movimentos migratórios e o estudo sobre a
importância dos noticiários em russo gira em torno desta capacidade de ajudar a integrar os
cidadãos mas também da capacidade para passar a uma fase de compromisso em que o
cidadão vê esbatidas as qualidades de imigrante para se tornar parte de uma nova “unidade”.

Estes dados dizem respeito apenas aos imigrantes com residência legalizada, isto é, não
incluem os clandestinos que entraram no nosso país e aqui permanecem de forma ilegal.

Em relação aos factores de atracção, Fernando Luís Machado (1991) enumera os mais
relevantes para a fixação de minorias em Portugal.




“Entre os factores de atracção exercida pela sociedade portuguesa destaca-se, em primeiro
lugar, a conjuntura de crescimento económico, baixo desemprego e aumento da procura de
pessoal em sectores de mão-de-obra intensiva, como é o caso da construção civil e obras
públicas, o que vem garantindo as possibilidades de emprego quase imediatamente após a
chegada.”




                                                                                          11
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


A imigração do Leste afasta-se da lógica descrita para a imigração dos países de língua oficial
portuguesa que apresentava sinais de continuidade ou comunhão. Segundo Machado (1993)




“Nenhuma das comunidades imigrantes residentes em Portugal se encontra em situação de
forte contraste com a população portuguesa, simultaneamente no que se refere às condições
sócio-económicas, à situação residencial, à identidade linguística, à filiação religiosa e aos
modos de vida. Há diferenciações em algumas destas dimensões mas, noutras, há claras
continuidades”.4




Quer se verifiquem continuidades ou diferenciações entre os dois tipos é necessário abordar o
problema a partir do ponto de vista social, porque é nas relações sociais diárias que surgem
sinais de integração ou marginalização. Rosário Dias (1997) justifica com a necessidade de
criar dinâmicas interculturais.




“Sob uma perspectiva social, a incorporação dos imigrantes é exequível a partir de um
processo de interculturalidade. Tal significa, segundo Vachon (1995) um reencontro entre as
culturas maioritárias e minoritárias a partir dos seus critérios e valores mais profundos para
afrontar uma perspectiva transcultural e supercultural que as supere a ambas. É certo que
esse reencontro implica necessariamente um choque profundo que deriva dos símbolos,
mitos, princípios e costumes ancestrais, mas que poderá ser resolvido se cada uma das
culturas aprender a conhecer os seus limites inerentes, se auto interprete e dialogue.”




2.1 Imigração no contexto Europeu



4
    Fernando Luís Machado, Etnicidade em Portugal: O grau de politização zero, Actas de Colóquio Internacional Sobre Emigração e
Imigração em Portugal, Séculos XIX e XX, Fragmentos, Algés, 1993.



12
Capítulo I

Numa época em que são cada vez mais são visíveis os efeitos da globalização, os fluxos
migratórios de homens e mulheres de uns países para outros assumem uma importância
crescente no contexto europeu.

Os anos 90 confirmaram a constituição de uma nova ordem mundial, com a reunificação da
Alemanha (9 de Novembro de 1989). A “queda do muro de Berlim” foi determinante no curso
da história e nas relações entre ocidente e oriente. Dentro da Europa, a Alemanha voltava a
ser uma Nação unificada e soberana, com um grande peso que lhe advém da população (80
milhões) e da capacidade industrial que lhe deram o epíteto de motor da União Europeia. Com
o desaparecimento da “cortina de ferro”, a Alemanha deixa de ser “espaço fronteira”, entre
dois blocos, e assume um lugar central na Europa que garante transição entre ocidente, oriente
e Balcãs.

Para a antiga Europa comunista abria-se a porta à assunção de uma identidade plenamente
europeia. Para esses países do leste, o desfio era como lançar-se nos circuitos económicos
internacionais e na zona oeste da Europa.

Segundo Moreau (1997), “a Rússia, que emerge das ruínas da antiga União Soviética (1992),
mantém dilemas que retratam a vida quotidiana das populações: por um lado surge liberta da
carga imperial em que procura criar a nação democrática e, por outro, permanece um gigante
com inúmeras populações em risco de decomposição se abandonar a herança de poder de
aço”.

Esta realidade que assentava em dois blocos fortes e equilibrados, dá lugar a uma nova ordem
com novas dinâmicas.

Foi também a década do desmembramento da Jugoslávia e do nascimento de nações como a
Croácia e a Bósnia. Movimentos que não serenaram as comunidades e que obrigaram à
intervenção das Nações Unidas.

O que parecia uma fase de apaziguamento, continuou como época de tensões mais ou menos
evidentes. Época de dificuldades económicas pela destruição e pelo afastamento dos circuitos
comerciais durante décadas.

Cenário propício ao movimento de povos que encontravam menos barreiras na circulação e,
ao mesmo tempo, muitos argumentos a favor da procura de novos espaços de instalação. O


                                                                                           13
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


extremo ocidental da Europa não terá sido o local mais procurado, mas será seguramente um
dos mais distantes.


3. Estruturas de apoio ao imigrante




A democratização desta distribuição é hoje uma realidade incontornável num país como
Portugal onde os imigrantes, sobretudo os europeus do leste, descobriram que as
oportunidades podem estar em cidades médias ou até em pequenos povoados onde o nível de
vida não sendo tão elevado oferece algumas possibilidades de sobrevivência nos primeiros e
difíceis momentos da instalação num novo país.

Este será um fenómeno recente e que Portugal vivia apenas na condição de visitante e não
como país de acolhimento obrigado a criar condições para grandes fluxos migratórios.

Integrado na União Europeia, Portugal é visto como espaço de oportunidades. Uma porta
aberta para uma Europa que mantém uma imagem de sonho com trabalho e estabilidade. Pode
discutir-se o modelo europeu e a fase de crise instalada com elevadas taxas de desemprego –
actualmente estável com tendência para decréscimo – mas a imagem sólida criada ao longo
das últimas décadas, nomeadamente por via do processo de integração europeia, favoreceu a
expansão.

Haverá casos de sucesso e insucesso, mas a tentativa efectuada por muitos não é travada pelas
barreiras enfrentadas e o contacto estreita-se de forma a interligar culturas e civilizações.

Portugal viu nascer uma rede de associações destinadas a apoiar os imigrantes que chegaram
ao país na última década. Reconhecidas pelo Alto Comissariado para a Imigração e Minorias
Étnicas estima-se que existam cerca de uma dezena de associações vocacionadas para
representar os cidadãos do Leste da Europa.

Aveiro possuiu um desses espaços, nascido na freguesia de São Bernardo que viveu nos
últimos anos a transformação de uma matriz rural para um quadro mais urbano que facilmente
se confunde com a área urbana de Aveiro. Muitos instalaram-se num local onde a construção
civil teve e tem implantação e essa dinâmica favoreceu a escolha.




14
Capítulo I

O espaço universitário surge como outro dos atractivos para os cidadãos de Leste. Para a
geração mais antiga é porta para pedidos de equivalências nos graus académicos e para os
mais jovens é um centro de formação prestigiado em Portugal que garante a frequência no
ensino superior.

O conjunto de associações de apoio ao imigrante destaca a centralidade de Lisboa e prova a
diluição das comunidades por unidades geográficas mais reduzidas:

Associação de Apoio ao Imigrante de Aveiro

Associação dos Imigrantes Russófonos de Lisboa.

Associação dos Imigrantes nos Açores

Associação dos Imigrantes dos Países do Leste de Setúbal

Associação dos Ucranianos em Portugal de Lisboa

Centro Cultural Moldavo em São Domingos de Rana

Associação de Imigrantes de Gondomar

Associação de Imigrantes Romenos e Moldavos em Setúbal

Associação Tavirense de Apoio ao Imigrante

Centro de Apoio à População Emigrante de Leste Europeu e Amigos em Portimão5




Encontramos associações ligadas à própria dinâmica das comunidades imigrantes mas,
também, ao apoio de poderes públicos locais (câmaras e juntas de freguesia)6 que quiseram
assumir desde o início um papel de charneira na integração das comunidades. Muito desse
apoio ficou associado à disponibilização de espaço para as actividades das associações e à
marca institucional que representa a participação de poderes públicos na vida das
comunidades deixando um sinal de presença e valorização.

5
    Fonte: ACIME (www.acime.gov.pt)

6
    Vide anexo VI

                                                                                        15
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


Paralelamente as estruturas de apoio foram complementadas por centros locais de apoio à
integração de imigrantes de natureza mais social, patrocinados pelo Alto Comissariado para a
Imigração e Minorias Étnicas com intervenção directa das autarquias e de centros sociais que
se empenharam na liderança do processo de integração.

Existem 53 centros de apoio local registados em Portugal. Aveiro, Oliveira de Azeméis e
Santa Maria da Feira são os três concelhos do Distrito de Aveiro que possuem tal valência. No
caso de Aveiro, o serviço junta-se ao já citado serviço fornecido pela Associação de Apoio ao
Imigrante. O espaço funciona nas instalações do Centro Paroquial da Vera Cruz (Aveiro) e
pode definir-se por um tipo de proximidade com a realidade mais citadina.

Os dois centros nacionais de apoio ao imigrante funcionam em Lisboa e Porto sob a tutela
directa do Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas.




16
Capítulo II


Capítulo II

1. Imigração do Leste na região de Aveiro



Faltam dados rigorosos sobre a presença de imigrantes do Leste na região de Aveiro, entre
cidadãos legais e outros ilegais, mas admite-se a existência de cerca de cinco mil imigrantes
em municípios como Aveiro, Ílhavo, Vagos, Águeda, Albergaria, Sever do Vouga e Estarreja.
O estudo circunscreve o universo aos municípios da Grande Área Metropolitana de Aveiro
que coincide com os concelhos da Associação de Municípios da Ria em função do mercado
definido pela Rádio Terra Nova.

Os números oficiais que resultam das publicações do SEF, apresentadas em anexo, registam
como população residente no distrito de Aveiro um total de 9657 cidadãos imigrantes em
2005. As comunidades de Leste estão distribuídas da seguinte forma tendo por base os
cidadãos residentes.



Bielorússia        20

Lituânia           17

Moldávia           75

Rússia             129

Ucrânia            195



Se os dados a considerar forem referentes à prorrogação de vistos de longa duração verifica-se
um aumento.




                                                                                           17
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração



Bielorússia                 28

Lituânia                    2

Moldávia                    92

Rússia                      66

Ucrânia                     431



Estes dados acabam por ter correspondência directa com as mudanças na Lei inseridas na
proposta defendida pelo Governo em Conselho de Ministros no dia 10 de Agosto de 2006.
Sobre o teor do documento, destacava-se “a criação de um tipo único de visto, que permita ao
seu titular entrar em Portugal para fixação de residência, que será concedido de acordo com
objectivos específicos (exercício de actividade profissional, reagrupamento familiar, estudos):
o visto para obtenção de autorização de residência. Esta medida, ao substituir os seis tipos de
visto de longa duração (4 tipos de visto de trabalho, visto de residência e visto de estudo) por
um único visto, permite racionalizar procedimentos”7.

Mobilizados pela vontade de atingirem níveis de vida melhorados, muitos imigrantes do Leste
aproveitam para descobrir Portugal onde dizem encontrar bom acolhimento por parte dos
cidadãos. Outros são “empurrados” de países como França e Espanha, de onde saíram
“traídos” por ofertas falseadas. Esta será uma das marcas da interacção cultural já que as
pontes são construídas com alguma facilidade8.

A maioria dos imigrantes vive fora do seu sector de actividade profissional, distante das áreas
de formação académica. O caminho para o crescimento profissional revela-se tortuoso e nem
todos conseguem resistir durante largos períodos de espera, em que o mercado de trabalho
manifesta incapacidade para adequar disponibilidade e necessidades.

Citando um estudo publicado pelo Jornal de Notícias (JN), em Julho de 2003, a Terra Nova
colocava em evidência os dados fundamentais de um estudo de caracterização dos imigrantes.




7
    Fonte: Revista BI- edição Agosto/Setembro do ACIME


8
    vide anexo VI

18
Capítulo II

“Um estudo de caracterização sociográfica dos imigrantes residentes no concelho de Aveiro
revela que 29 por cento são licenciados, noticia hoje o Jornal de Notícias. Mas, de acordo
com o matutino, a grande maioria destes trabalhadores encontram-se na construção civil ou
são operários fabris. O estudo foi desenvolvido pelo Centro Social e Paroquial da Vera Cruz
junto de 250 cidadãos de Leste”.9




O início mais comum passa pela tentativa de integração em espaços provisórios que acolham
um dos membros da família e pela procura de um emprego que permita suportar as despesas.
As vias mais habituais passam pela entrada nos sectores da construção e das limpezas, áreas
que empregam inúmeros imigrantes.

Numa primeira fase as liberdades e garantias costumam perigar devido às dificuldades de
comunicação. A língua é uma barreira que impede conhecimentos aprofundados sobre a lei
em vigor no país de acolhimento.10

Sendo um país rico em oferta legislativa, Portugal não consegue ainda a melhor comunicação
com os imigrantes que revelam dificuldades para perceber, com rigor, a letra e o espírito da
lei que consagra os seus direitos. Nem percebem, nem se fazem compreender numa falta de
comunicação que cria zonas dúbias ao nível do entendimento dos acordos laborais feitos com
agentes que, nalgumas situações, revelam falta de escrúpulos.




1.1 Associativismo como ferramenta




O associativismo ganha papel relevante neste esforço de integração e a região de Aveiro não é
excepção tendo em funcionamento a Associação de Apoio ao Imigrante, sedeada em São
Bernardo. Naquela freguesia do concelho de Aveiro, em instalações cedidas pela Junta,
começaram a ser tratados temas como as comunicações com os familiares e amigos nos países
de origem, apoio ao preenchimento de formulários, o ensino da língua portuguesa e a
instituição de um grupo de pressão capaz de representar a comunidade. Ganhar “peso
político” que permita, por exemplo, a instalação de mesas de voto em eleições nos países de

9
     www.terranova.pt publicado em 2003-07-16
10
     Dados confirmados pelo estudo apresentado no último capítulo deste estudo monográfico.

                                                                                              19
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


origem e a criação de canais de comunicação com poderes públicos são algumas das metas
deste grupo de pressão que funciona ancorado na iniciativa dos dirigentes associativos. Na
mira da Associação passaram a estar, quase em permanência, as representações diplomáticas
de países do Leste acreditadas em Lisboa. O fenómeno da dispersão e a disseminação acabou
por acelerar este processo. A última década permitiu diversos fenómenos no cruzamento de
diferentes culturas. Um dos exemplos flagrantes foi dado pela língua, uma vez que os serviços
de tradução passaram a ser requisitados por tribunais, forças de segurança e serviços de saúde.

Notícias difundidas pela Terra Nova e publicadas no site da estação anunciavam novas
dinâmicas no Verão de 2001:



“Um projecto de apoio à imigração. A Junta de Freguesia de São Bernardo prepara a
criação de um Centro de Apoio ao Imigrante. Quer dar condições para uma inserção social
eficaz. Promete ajudar no ensino da língua portuguesa, e na colocação de imigrantes no
mercado de trabalho. A Junta de Freguesia está a promover o projecto junto das embaixadas
dos países de leste. É um dos primeiros passos na criação de um centro que vai funcionar
com base no voluntariado”.11



“É preciso olhar com atenção para os imigrantes. Está criada uma nova realidade social na
região de Aveiro. O apelo é explicado por Maria Emilia Carvalho, directora do Centro
Paroquial da Vera Cruz, instituição disposta a lançar um programa de integração social.
quot;Há uma nova realidade para enfrentarquot;, afirma a directora do centro. Uma realidade nova
que vai exigir um trabalho de fundo com alguns riscos que é preciso analisar. quot;Sabemos que
estamos a tratar de redes organizadas e isso não é fácilquot;, adianta a responsável pelo Centro
Paroquial e Social da Vera Cruz. Não é fácil quantificar o número de imigrantes, mas há
indicadores que justificam a intervenção humanitária, junto de famílias instaladas em aldeias
da região, em más condições. O primeiro passo é ganhar a confiança dos imigrantes, para
depois apostar na assistência social e integração condigna”.12



Não é fácil a montagem destas estruturas de apoio condicionadas, muitas vezes, pelas
rivalidades próprias das diferentes origens. Todas as comunidades desejam ter uma
associação. As freguesias em concelhos vizinhos de Aveiro passaram a ser desafiadas para a
11
     www.terranova.pt publicado em 2001-06-07
12
     www.terranova.pt publicado em 2001-05-21

20
Capítulo II

criação de espaços de apoio, mas esses movimentos nunca ganharam espaço de intervenção.
Trata-se de uma fase do sistema que fica marcado por avanços e recuos, fases de maior
credibilidade ou momentos de menor consistência que acabam por destruir os verdadeiros
propósitos do associativismo.



“Uma nova associação para apoio de cidadãos imigrantes vai nascer em Aveiro. Chama-se
Associação de Solidariedade Social e InterCultural da Federação Russa em Portugal e os
respectivos corpos gerentes vão ser eleitos no próximo dia 27 de Junho. Alex Romanov, um
russo em Portugal há 13 anos, quer mais actividade cultural na cidade, para todos os grupos
de pessoas: Em nossa opinião deverão ser reflectidas e amadurecidas as oportunidades de
investimento cultural na sociedade de qualquer grupo de pessoas.

A integração e a inserção dos imigrantes em Portugal é um dos grandes objectivos da nova
associação que aposta também no desenvolvimento de acções de apoio aos imigrantes e seus
descendentes visando a melhoria das suas condições de vida”.13



“Os imigrantes de leste que habitam e trabalham na Gafanha da Nazaré já têm associação
de apoio. Chama-se Nach Dom e foi registada há poucos dias. Para já, funciona a título
provisório num estabelecimento comercial. Anatoly Silva, um dos dinamizadores do projecto,
espera que a associação funcione como espaço de afirmação da comunidade imigrante. Esta
ideia nasceu na Gafanha da Nazaré dentro do nosso grupo. Precisamos defender os nossos
direitos e criar postos de trabalho. Não queremos consumir produtos. Queremos produzir.
Temos educação e experiência e muita gente anda em trabalhos duros em que o dinheiro não
dá para manter famílias. Desejamos abrir novas empresas, revela Anatoly Silva. Nach Dom é
a nova associação de apoio ao imigrante, um nome que em português significa a nossa casa.
A falta de sede social é o grande problema enfrentado pelos responsáveis da associação que
desejam encontrar uma solução definitiva, até porque o estabelecimento comercial de
Anatoly Silva não é o local mais indicado”.14




13
     www.terranova.pt publicado em 2004-06-02
14
     www.terranova.pt publicado em 2004-11-21

                                                                                        21
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


A aprendizagem da língua e os recenseamentos serão alguns dos sinais mais visíveis desta
ligação entre culturas, mas outras existem que esbatem fronteiras e permitem falar da criação
de uma nova realidade em grande aceleração e com múltiplas formas. Cita-se, como exemplo,
a música, os produtos bancários e até os negócios na área da pesca e transformação do
bacalhau15. No entanto, a abordagem política mereceu amplo destaque ao longo dos últimos
quatro anos.



“Depois da representação ucraniana foi a vez do consulado russo visitar a Associação de
Apoio ao Imigrante. Cônsul e vice-cônsul da Rússia passaram este fim-de-semana pela sede
da associação em São Bernardo. Ouvir os imigrantes e dar respostas às suas preocupações
são as tarefas da associação que foi elogiada pelo vice-cônsul russo. “Estou muito contente
com esta visita. Agradeço às autoridades pela recepção e penso que temos que organizar
mais encontros destes para tentar resolver os problemas dos imigrantes”, disse o Vice-
cônsul”.16




2. Influência social

Parece consensual a existência de mais-valias no contacto entre populações portuguesas e
imigrantes do Leste Europeu que vão para lá do mero contributo económico. Reconhecidos
pela formação académica e por marcas enraizadas em hábitos transportados para Sul, os
imigrantes vieram revolucionar e popularizar o ensino da música. Este espaço de
aprendizagem foi popularizado e ganhou contornos de formação básica para centenas de
crianças aveirenses que encontraram espaços como o da Sociedade Musical Santa Cecília, na
freguesia de São Bernardo, um espaço de ensino de elevada qualidade sem que isso signifique
segregar os alunos com falta de poder económico.

O testemunho apresentado por António Maio, presidente da Sociedade Musical Santa Cecília,
nas comemorações do centenário, em 2005, volta a realçar o salto qualitativo dado com a
presença de professores especializados no ensino de música.




15
     vide anexo VIII
16
     www.terranova.pt publicado em 2003-03-17

22
Capítulo II

“Temos duas professoras de música de Leste e 12 nacionais. Presença significativa pela
qualidade no desempenho da função. Uma mais valia indiscutível. Basta olharmos para os
resultados escolares dos filhos dos imigrantes de Leste”.17



Os resultados técnicos são de elevada qualidade e as apresentações à comunidade resultam em
espaços de convívio social onde não se distinguem as nacionalidades ou as origens. Acabam
por funcionar em sistema comunitário dentro de um espaço que é partilhado e cujas
conquistas acabam por ser sentidas como triunfo colectivo.

E mais uma vez se nota que os espaços de interacção escapam à lógica centralizadora de que
só as grandes cidades com conservatório ou com universidades que leccionam a disciplina de
música podem ser espaços de aprendizagem. De alguma maneira, as freguesias ou as aldeias
de uma determinada região, acabam por dar um exemplo do retorno à personalização do
ensino feito com bases em acções de proximidade.

E a presença de filhos de imigrantes junto de gerações mais novas acaba por produzir um
efeito catalizador, uma vez que o nível elevado dos alunos traça novos paradigmas atraindo,
de forma natural, o interesse e a competitividade entre alunos. O ensino da matemática
funciona como um dos exemplos mais actuais. A capacidade dos alunos de famílias do Leste
está a conseguir reunir vontades em torno de um objectivo comum e eleva a capacidade dos
alunos portugueses. Realidade confirmada pela professora Teresa Marçal cujo trajecto
profissional inclui uma Escola Básica 2.3 da freguesia de São Bernardo.



“Como professores e tendo colegas com experiência no contactos com filhos de imigrantes
do Leste posso dizer que os alunos demonstram mais empenho e mais interesse e os pais são
exigentes na educação. Andam sempre próximos da escola. Quando o director tenta
desculpabilizar qualquer situação, eles exigem. Os pais estão mais perto a escola”.18



Mas há outros exemplos no sector do ensino e em graus académicos superiores. Os centros de
explicações da cidade de Aveiro passaram a incorporar docentes oriundos de países do Leste e
os resultados acabam por contribuir para o prestígio da comunidade Académica. Numa
disciplina como a matemática cujos resultados preocupam as Universidades Portuguesas,


17
     vide anexo IV
18
     vide anexo IV

                                                                                         23
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


tornando-se por vezes a última barreira de um curso dependente de uma nota, é interessante
perceber que os resultados com recurso a uma explicadora doutorada em matemática por uma
universidade pública russa, contribui para o sucesso. Dos alunos da turma formada em 2005,
todos conseguiram aprovação de acordo com as orientações dadas pela “explicadora”. Mera
coincidência ou uma prova de que os resultados da interacção podem ser positivos?



“A nossa escola dá apoio à disciplina de matemática em todos os anos. A professora
colabora com os alunos universitários normalmente de 3 e 4 anos. Se for a nível linguístico, o
contacto entre a professora e os alunos processa-se da mesma maneira como entre outro
professor de origem portuguesa, canadiana ou outra qualquer. Possui já um nível vocabular
bom que lhe permite a passagem da mensagem que quer transmitir a 100 %. Os alunos não
têm qualquer problema em percebê-la e apreciam o seu método de ensino. Isto é o mais
importante”. 19



Assim se cruzam duas vertentes decisivas na integração: a aprendizagem em conjunto com
troca de experiências em ambiente escolar e a excelência das apresentações que juntam
famílias portuguesas e imigrantes em espaços comuns. Serões familiares que ajudam a
reforçar o espírito comunitário e que ajudam a criar hábitos culturais que não estavam
enraizados em Portugal e que, de repente, entraram no dia-a-dia dos cidadãos.



“No que me diz respeito, tenho alguns amigos dessa origem, bem como alunos, a quem
ministro aulas de português. Gosto bastante de juntar os meus alunos das várias
nacionalidades e realizar festas, durante as quais partilhamos experiências, costumes e
hábitos alimentares, lendas e até anedotas”.20



E se os imigrantes aprendem a língua portuguesa, é cada vez mais frequente ver os
portugueses atentos à língua Russa21 onde procuram reconhecer palavras e descobrir sentidos
para as frases pronunciadas. Não raras vezes encontram-se públicos interessados em
frequentar cursos de línguas e já não apenas os tradicionais cursos de inglês ou francês. E se a
Universidade de Aveiro tem procurado criar condições para os estudos chineses, não esqueceu

19
   vide anexo IV
20
   videanexo IV
21
   vide anexi I

24
Capítulo II

o russo e as associações cívicas parecem claramente voltadas para o ensino de línguas cuja
base social parece ser o seu maior aliado. Muitas vezes não se trata de um qualquer interesse
económico ditado pela importância dos mercados, mas tão-só pelo peso social que acarreta
num determinado espaço de interacção. Pode não ser uma comunidade extensa mas tem
“peso” na forma como se projecta.



“A Associação de Apoio ao Imigrante de São Bernardo já iniciou as aulas em Russo. Alunos
portugueses mostram interesse na disciplina. Querem aprender para melhor comunicar com
os imigrantes do leste. Lyudmila é a professora que orienta os trabalhos. Lembra que há
muitos profissionais interessados nesta língua. Temos funcionários da Loja do Cidadão,
Segurança Social, agentes da Polícia Judiciária e professores, adianta a responsável pela
classe. Nós estudamos cultura portuguesa e os portugueses mostram interesse na cultura
Russa. Fazemos uma troca cultural, explica a professora de São Bernardo. José Caseiro,
professor de línguas assume o lugar de aluno. Explica que se trata de um complemento na
formação. Sou professor de línguas e gosto de línguas estrangeiras. Uma língua é sempre
uma porta aberta para outra cultura, afirma José Caseiro. Helena é uma aluna interessada
na língua e na cultura. Há pouco tempo esteve na Rússia em visita e as palavras que
aprendeu em São Bernardo tornaram-se úteis. Já consegui entender alguma coisa e eles já
me entenderam, disse aquela aluna do curso de Russo. O ano lectivo começa agora. Já estão
inscritas 12 pessoas para iniciação. O ano passado terminou com 17 pessoas e 17
certificados”.22



Os exemplos sobre a forma como se posicionam os imigrantes e a interligação com outros
sectores da sociedade são frequentes. Bastará uma pesquisa por diferentes áreas para se
entender este esforço de conhecimento, compreensão e, por consequência, afirmação.




2.1 Barreira linguística

A experiência de uma ex-juíza do Tribunal de Trabalho de Aveiro revela estes dados
qualitativos. Sem especificar o número de processos ou as variantes assumidas em Tribunal,
chama a atenção para uma realidade comum nas salas de audiências. O surgimento de


22
     www.terranova.pt publicado em 2003-09-19

                                                                                          25
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


litigantes com bons conhecimentos da língua portuguesa e os tradutores que são chamados a
participar nas sessões apenas por uma questão de segurança. Segundo Teresa Madaíl (juíza) a
comunicação é eficaz:



“Os imigrantes de Leste fazem parte da realidade dos Tribunais como os povos de outras
nacionalidades, ocupando posições diferentes, uns como litigantes e outros servindo de
tradutores. A maioria dos imigrantes de Leste que em Tribunal solicita a intervenção de um
intérprete, tem conhecimentos bastantes da Língua Portuguesa para perceber o que lhe é
perguntado”23.



A utilização de um tradutor não é mais que uma medida de segurança para confirmar ou
validar as informações tal como são apreendidas pelos litigantes em ambiente de tribunal e,
segundo depoimento recolhido, não atinge números elevados.

É mais uma prova que confirma a já referida implantação quase silenciosa de uma
comunidade nova com reflexos em diversos sectores da sociedade. Não se faz notar de forma
ruidosa, nem pelos números maciços. Está intimamente ligada à preocupação de afirmação
qualitativa cuja presença se torna cada vez mais familiar. E se os primeiros passos levantam a
dificuldade da língua, a verdade é que esse problema é superado com relativa facilidade.




2.3 Potencial económico

Ignorar a força das novas comunidades e a sua importância na economia regional seria um
erro. Os bancos lançam produtos especiais para o envio de remessas e os imigrantes são
“aliciados” com campanhas publicitárias que passam pelos espaços noticiosos destinados às
comunidades do Leste. Aí são tratados de acordo com a importância dos mercados
representados e pelas comunidades mais numerosas.

Para as instituições bancárias começa a tornar-se tão importante gerir produtos para
emigrantes portugueses em Paris ou nos Estados Unidos, como dar atenção a uma nova
realidade social em território nacional. Jorge Portugal, responsável no BES pela área de novos
residentes, salienta a importância do sector.


23
     vide anexo IV

26
Capítulo II




“O segmento imigrante representa mais de 15% do crescimento do negócio de clientes
particulares”.24



São inúmeros os exemplos, mas destacam-se os serviços bancários e o fornecimento de
parabólicas colocadas no mercado a pensar nos imigrantes. São equipamentos com
capacidade para captar canais do leste Europeu que mais cedo ou mais tarde serão alvo do
interesse dos imigrantes. Mesmo que numa primeira fase os rendimentos não permitam
“luxos” como a parabólica, é certo que a melhoria do nível de vida vai acabar por facilitar a
retoma de ligações ao país de origem.

Neste capítulo convém referenciar que há diferentes extractos sociais representados dentro de
uma comunidade imigrante. Haverá pobres que vivem da mendicidade, assalariados com
rendimentos que não permitem elevados níveis de consumo e uma elite composta por
técnicos, médicos e professores universitários, devidamente integrados, que conseguem
manter padrões de vida ao nível do estavam habituados: casa própria, carro e gosto por
viagens.

A vaga de imigrantes do leste levanta alguns problemas que, pela sua natureza, acaba por
estigmatizar as próprias comunidades. Casos que apontam para redes de crime organizado,
tráfico de seres humanos e mendicidade. Dados que os órgãos de comunicação relevam com
frequência e que serão objecto de abordagem no capítulo III dedicado à imigração na agenda
dos media25.

A imigração do leste foi acompanhada pela instalação em Portugal de verdadeiras máfias
russas e ucranianas que operam de forma violenta. São dados revelados pela imprensa
portuguesa, com alguns exemplos evidenciados em anexo26, e que as forças de segurança
estão obrigadas a considerar de forma cuidada. Os dados estatísticos apontam para o aumento
da criminalidade organizada tipificada como violenta. A integração de portugueses nestas
redes são um dado abordado nalguns relatórios sobre criminalidade e a morte de alguns
imigrantes é associada à acção das máfias.




24
   vide anexo IV
25
   vide anexo V
26
   vide anexo VI

                                                                                          27
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


3. Integração e legalidade

Uma verdadeira rede de tráfico de mulheres do leste para a prostituição está estabelecida em
toda a Europa, Portugal neste contexto não foge à regra. Muitas destas mulheres são trazidas
por máfias russas, ucranianas, moldavas, romenas e até albanesas. A mendicidade em
Portugal não é um fenómeno recente, mas a verdade é que conheceu um aumento muito
significativo a partir dos anos 90 com a entrada de milhares de ciganos romenos. Estão neste
momento espalhados por todo o país e operam em grupos organizados, utilizando com
frequência crianças e deficientes.

Como nota exemplificativa cita-se a referência ao anúncio da leitura de uma audiência
referente a um caso de auxílio à imigração ilegal.



“O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) realizou em Maio de 2003 uma operação, na
zona metropolitana de Lisboa, que resultou no desmantelamento da ligação portuguesa de
uma rede internacional de falsificação de documentos e auxílio à imigração ilegal, que
operaria a partir do estrangeiro. À época foram apreendidas 7 viaturas, mais de 18 mil
contos em dinheiro, telemóveis, material informático e apreendida documentação falsa e
falsificada diversa. Foram detidos 11 cidadãos estrangeiros, dos quais dez ficaram em prisão
preventiva. A investigação do SEF que levou às detenções em apreço durou cerca de um ano
e teve início com a detecção de casos de documentação portuguesa falsa, no aeroporto de
Lisboa”. 27



No contexto actual do espaço europeu e num mundo que tende cada vez mais para a
globalização como aquele em que vivemos, os fluxos migratórios de milhões de homens e
mulheres tornaram-se um fenómeno de estudo obrigatório.

Assumindo a inevitabilidade da imigração, importa assegurar condições para que este
fenómeno se processe em bases legais. É este o verdadeiro desafio da União Europeia e de
cada um dos Estados membros - combater a imigração ilegal promovendo a imigração legal.

A alteração da lei da imigração em Portugal, cujo diploma foi aprovado no Verão de 2006, em
Conselho de Ministros, representa esta adequação aos novos tempos e os artigos merecem



27
     www.acime.gov.pt

28
Capítulo II

discussão partidária, ao mesmo tempo que os dirigentes das ONG´s e o Alto Comissariado
para as Imigrações e Minorias Étnicas acompanham o debate com interesse redobrado.




3.1 Reforma legal




Parece hoje indiscutível tratar a imigração como realidade de factores positivos para o
progresso do País. Tanto mais que é reconhecido o papel que desempenham no
desenvolvimento económico e social. Em plena era da globalização seria irrealista pretender
implementar uma política de imigração “zero”, difícil de defender no plano dos princípios.
Mas irresponsável seria adoptar uma política despreocupada, não regulamentada, que,
inevitavelmente, geraria exclusão social dos próprios imigrantes e, no limite, o aparecimento
de ideologias inaceitáveis num Estado de direito, como recentemente ocorreu em alguns
países europeus. Citando dados de um estudo do ACIME, a Terra Nova apresentava números
referentes a um estudo sobre a tolerância dos portugueses em relação aos imigrantes.



“Três em cada quatro portugueses estão contra a vinda de mais imigrantes para Portugal,
embora desejem para os que actualmente vivem no país condições de vida idênticas às dos
naturais. Estes dados fazem parte de um estudo promovido pelo Alto Comissariado para a
Imigração e Minorias Étnicas (ACIME), através de uma sondagem feita à população
portuguesa em Novembro de 2002 e abrangendo 1.419 pessoas (margem de erro de 2,6%). O
estudo, feito pela Universidade Católica, abrangeu inquiridos de todas as regiões do país.

De acordo com os primeiros resultados, divulgados pelo ACIME, a maioria dos portugueses
responde negativamente à pergunta quot;concorda com a vinda de mais imigrantes para o nosso
país?quot;, independentemente da origem: africana (74,4 por cento), brasileira (71,7) ou de Leste
(73,4). Nesta matéria foram os inquiridos com graus de instrução mais baixos os que mais
discordaram da vinda de novas vagas de imigrantes. Curioso é o facto de, apesar de apenas
um quarto dos portugueses admitir mais fluxos de imigrantes, a quase totalidade (97,2%)
considera que estes devem ter os mesmos direitos que os portugueses têm no estrangeiro.


                                                                                             29
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


Em situação legal, actualmente, encontram-se em Portugal cerca de 450 mil imigrantes,
representando cinco por cento da população portuguesa e dez por cento da população activa.

De acordo com os resultados de um estudo realizado pelo Observatório nacional para a
Imigração, aquelas 450 mil pessoas são oriundas de 179 países diferentes. 25 por cento são
de países de Leste. Actualmente, 230 línguas diferentes são faladas em Portugal. No distrito
de Aveiro registam-se 13 mil imigrantes».28

A solução para esta complexa conjuntura pressupõe a criação de mecanismos legais de gestão
dos fluxos migratórios de forma realista através de um controlo rigoroso de entrada e
permanência de cidadãos estrangeiros nos países de acolhimento, estabelecendo, ao mesmo
tempo, condições para que aqueles que o façam nos termos da lei possam esperar uma
integração real e humanista nestas sociedades.



“O Centro Social Paroquial da Vera Cruz inaugurou, esta tarde, as novas instalações do
Centro Local de Apoio ao Imigrante de Aveiro e do Gabinete de Acção Comunitária, situadas
na avenida Lourenço Peixinho. O padre Rocha, presidente do Centro Social Paroquial da
Vera Cruz, revelou que, hoje, os problemas e as necessidades da comunidade imigrante são
diferentes e prendem-se com o afastamento das famílias: Quando vieram era mais
acolhimento, saber o que queriam, entender a língua, roupa, alimentos, higiene e, depois, a
procura de trabalho. Hoje a fase é diferente. A seguir ao trabalho veio o problema das
famílias. Para um ucraniano, por exemplo, significa muito ter cá a família”.29



Portugal, consciente da sua história e do facto de durante muitos anos ter sido um país de
emigração, enquanto signatário da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, deve
assumir políticas de carácter humanista ao nível do acolhimento e da integração dos
imigrantes que residem no nosso país.

A política de imigração deve assentar em três eixos fundamentais: promoção da imigração
legal em conformidade com as possibilidades reais do País, integração efectiva dos imigrantes
e combate firme à imigração ilegal.

Sabe-se que, por proposta legislativa do Governo português, se pretende revogar o regime das
autorizações de permanência, permitindo que “as condições de estada em Portugal resultem

28
     www.terranova.pt publicado em 2003-06-13
29
     www.terranova.pt publicado em 2006-02-01


30
Capítulo II

apenas da concessão de vistos ou de autorizações de residência, sem prejuízo da protecção das
expectativas criadas àqueles que atempadamente apresentaram os seus pedidos de autorização
e daqueles que pretendam a sua prorrogação”.

Outra das propostas é estabelecer um limite máximo anual de entradas em Portugal de acordo
com pareceres do Instituto do Emprego e Formação Profissional, das Regiões Autónomas, da
Inspecção-Geral do Trabalho, da Associação Nacional de Municípios Portugueses, das
confederações patronais e sindicais e do Alto-Comissariado para a Imigração e as Minorias
Étnicas.



“A partir desses pareceres serão definidos critérios económicos e sociais na determinação
das necessidades de mão-de-obra e da capacidade de acolhimento de cada região,
assegurando a participação das autarquias locais em todo o processo. Admite-se também a
consagração legal da possibilidade de os titulares de visto de estada temporária em casos
devidamente fundamentados poderem exercer uma actividade profissional em termos
similares        aos    do   visto   de   trabalho,   a   definir   no   decreto   regulamentar”.30


O novo quadro legislativo prevê um “novo tipo de visto de trabalho para o exercício de uma
actividade de investigação científica ou actividade que pressuponha um conhecimento técnico
altamente qualificado, o que facilitará a instalação em Portugal de cientistas e quadros
técnicos superiores”. De igual modo serão reduzidos os períodos mínimos de residência
necessários aos cidadãos estrangeiros para que possam obter autorização de residência
permanente, permitindo a legalização de todos os imigrantes que se encontrem efectivamente
integrados na sociedade portuguesa.

Altera-se, ainda, o instituto do reagrupamento familiar, exigindo-se para a sua concessão uma
real ligação do requerente ao País, nomeadamente a permanência legal durante um certo
período de tempo, conforme o previsto em diversas decisões comunitárias, optando-se,
contudo, pelo menor período de tempo definido nestas disposições, reforçando a visão
humanista que Portugal tem defendido naquelas instâncias.

Alterações maturadas em processos que envolveram, nalguns casos, os imigrantes de Leste e
mobilizaram o apoio das associações de apoio ao imigrante. Mais um exemplo reportado pelo
serviço noticioso em Russo da Terra Nova, com reflexo nas edições portuguesas.


30
     www.acime.gov.pt

                                                                                                 31
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração




“Inquérito aos filhos dos imigrantes para mudar a lei da obtenção da nacionalidade
portuguesa. O projecto visa facilitar a naturalização de filhos de imigrantes nascidos em
Portugal. A Associação de Apoio ao Imigrante, sedeada em São Bernardo, vai colaborar
nesta iniciativa a pedido da Associação para a Cooperação e Desenvolvimento. Segundo
António Baptista, os interessados deverão dirigir-se às instalações da Junta de São Bernardo.

Fomos solicitados para a colocação de um inquérito junto da população imigrante, mais
propriamente para os filhos de imigrantes nascidos em Portugal, para a possibilidade de ser
apresentado na Assembleia da República de alteração da lei da nacionalidade, explicou”.31


Por fim, sublinhe-se o desejo do Governo em manter o acesso à protecção social, à educação e
aos cuidados de saúde que a comunidade imigrante actualmente dispõe no nosso país.




3.2 Acolhimento sustentado

O combate à imigração ilegal exige harmonização de políticas nacionais e europeias no que
respeita ao controlo dos fluxos migratórios. Exige agilidade nos processos de afastamento do
espaço comunitário de pessoas ilegais e este processo implica um forte investimento ao nível
dos meios de controlo do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e às forças de segurança para o
cumprimento efectivo e atempado das decisões dos tribunais.

Consagra-se, ainda, um conjunto de alterações que visam desburocratizar os procedimentos de
actuação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, para além da previsão de um regime
sancionatório criminal mais adequado a prevenir e reprimir os actos ilícitos relacionados com
a imigração clandestina e com a exploração de mão-de-obra dos estrangeiros em situação não
regularizada.
De mais-valia cultural e económica, a imigração deve ser olhada com rigor científico para
garantir melhor integração e um apoio social capaz de evitar a degradação. Só assim será
capaz de criar novos traços culturais de forma harmoniosa. Tudo o que não obedecer a esta
regra criará zonas de risco e até de possível descontrolo social.

Como factores de sustentabilidade, o Governo por intermédio de diferentes organismos prevê
a criação de mecanismos para apoiar a integração de imigrantes.

31
     www.terranova.pt publicado em 2005-01-21

32
Capítulo II

O programa “Portugal acolhe” integra-se nestas acções visando facilitar à população
imigrante residente em Portugal o acesso a um conjunto de conhecimentos, indispensáveis a
uma inserção de pleno direito na sociedade portuguesa. Visa promover, junto dos
trabalhadores imigrantes, a aquisição de competências necessárias à sua inserção na sociedade
portuguesa e, em particular, no mercado de trabalho, através, designadamente, de uma
formação em Português Básico e em Cidadania.

Representa formação profissional contínua que promove a capacidade de expressão e
compreensão na língua portuguesa e o conhecimento dos direitos básicos.

O cidadão imigrante vai desenvolver competências no domínio da língua portuguesa numa
acção que resulta da parceria entre IEFP e a actual Direcção-Geral de Formação Vocacional.
O curso de Cidadania visa promover o exercício de uma cidadania activa, nomeadamente
através de uma sensibilização para os direitos e deveres inerentes à inserção na sociedade
portuguesa. No final dos dois módulos haverá certificado de Formação Profissional. Podem
participar imigrantes legalizados.

A Associação Industrial do Distrito de Aveiro também segue um plano de promoção das
competências de cidadãos do Leste com forte procura. Eliana Silva, responsável pela área,
confirma uma aposta na mão-de-obra de imigrantes.



“Neste momento sou Técnica Responsável por um projecto que é destinado aos imigrantes de
Leste (projecto FIC). Realizo Balanço de Competências, reencaminho para formação de
Português e no final faço o Plano Pessoal e profissional do Imigrante.

Procuro passar informação relativa ao Projecto em si, os imigrantes é que me fornecem
informação. E tento ajudar dando informações que me são solicitadas, cursos formação,
emprego…

Acho um povo muito dedicado, gosta de apreender mais e mais, simpático e inteligente.
Muito qualificado”. 32




3.3 Criticas ao processo legislativo


32
     vide anexo IV

                                                                                          33
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração




Mas as mudanças legislativas continuam a gerar pouco consenso e algumas desconfianças.
Em entrevista publicada no Correio da Manhã, edição de dia 3 de Setembro de 2006, o
director da Obra Católica Portuguesa de Migrações, padre Rui Pedro, criticava os excessos
burocráticos da nova lei de imigração.



“A Igreja acolhe bem algumas alterações, nomeadamente o facto de se voltar a contemplar a
participação das ONG, sindicatos e associações de imigrantes na prova do vínculo laboral de
imigrantes que são seres explorados. Essa possibilidade, que existia em 2000, foi retirada na
lei seguinte e agora volta a ser consagrada e permite-nos colaborar na integração e
regularização                           de                        imigrantes.
A admissão dos imigrantes candidatos a trabalho em Portugal é uma das questões mais
problemáticas. O Artigo 59 sobre a obtenção de visto de residência para trabalhar por conta
de outrem permanece um obstáculo que os imigrantes terão de ultrapassar.
Devido à burocracia que implica e à impossibilidade de o Governo cumprir tudo o que está
escrito a respeito aos consulados, do IEFP no que respeita às vagas de trabalho e à
satisfação das necessidades. Diz-nos a experiência que este é um caminho que dificulta a
legalização. Esta lei não será capaz de garantir a admissão e a abertura de canais legais
expeditos e acessíveis a quem queira imigrar para Portugal. Há redes e intermediários que
poderão continuar a explorar e a ser mais rápidos do que o Estado na colocação de pessoas
no    mercado       informal.    Se          ele   existe   é     porque        há     necessidades.”




Medidas que mereceram ainda uma referência crítica por parte a Plataforma para das
Estruturas Representativas das Comunidades de Imigrantes em Portugal que sugere alterações
à Lei da Imigração ao nível da regularização dos indocumentados e ter em conta as
necessidades reais dos empregadores. Pedem a exclusão do sistema de quotas e da carga
burocrática que tal sistema acarreta.

Outro instrumento importante será o Plano para a Integração dos Imigrantes que foi colocado
em discussão pública no final de 2006. Prevê mais fácil acesso a novos produtos bancários,
certificação mais rápida de habilitações e serviços de tradução em todos os momentos de
interacção com o sistema judicial.


34
Capítulo II

Este documento envolve a participação de 13 Ministérios e propõe 123 medidas em áreas
sectoriais: “fiscalização laboral e apoio ao sindicalismo”; “facilitar crédito para compra de
habitação”; “avaliar e promover o acesso ao Serviço Nacional de Saúde”; “formar professores
e equilibrar turmas”, “bolsa de tradutores para sistema judicial”.




                                                                                          35
Capitulo III


Capitulo III




1. Imigração na agenda dos Media



Faz todo o sentido perceber como entra na agenda dos “media” a questão da imigração.
Segundo Marini (2006), os modelos teóricos afirmam a existência de uma agenda que pode
ser construída a partir da influência politica e da importância que determinado tema tem nas
estratégias de poder mas também pela própria interacção cultural dos grupos. Sabe-se como as
guerras, os conflitos e as agitações mobilizam as agendas. Farão parte do interesse do público
mas também de uma chamada de atenção para o público perceber as movimentações do
espaço em que habitam. Este agendamento está intimamente ligado a essa acção política que
pode estar ligada à conquista ou à manutenção do poder. E encerra visões políticas muito
diferentes.

No caso concreto da imigração, não se trata de uma questão consensual. Uns defendem-na
como necessidade, direito, essencial à economia ou fundamental na estabilidade. Outros
criticam-na como realidade que vai cercear espaços dos nativos de determinado país. Em
Portugal esta foi, nos anos 90, uma realidade que entrou na rede social e que, nos primeiros
anos de 2000, entrou na agenda dos “media” por via das agendas políticas de partidos de
direita e esquerda. Foram os motores da colocação do tema no centro de um debate político
que, porventura, já existira, em momentos específicos, com comunidades ciganas e outras.
Até com os próprios emigrantes. Uma cultura política que em Portugal acaba por balizar-se
muito entre Direita e Esquerda.

A verdade é que o fenómeno não se esgota nos partidos e ressalta imediatamente para grupos
de pressão. Podem ser associações culturais, movimentos cívicos, agentes de poder local,
movimentos religiosos ou outros. E, à escala local, serão estes os motores da colocação do
tema na agenda mediática como a chegada aos meios de comunicação. Refere-se o exemplo
local porque, mais uma vez, este é o tema central deste projecto de estudo. Quando os
movimentos migratórios começaram a ser mais conhecidos, rapidamente se passaram a
conhecer associações de apoio aos imigrantes, sectores específicos de apoio aos imigrantes
dentro de movimentos da Igreja e, também, espaços de intervenção ligados aos serviços
públicos descentralizados.

                                                                                           37
Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


Governo Civil, Câmaras Municipais, Juntas de Freguesia, forças policiais e outros organismos
passaram a incluir o fenómeno nas suas próprias agendas, transportando depois o fluxo para
as redacções. Foi um movimento incrementado pela criação dos gabinetes de comunicação
nestes organismos que viviam até aos anos noventa sem estratégias de comunicação ou
estratégias que assentavam sobretudo no contacto directo. Apenas nesses momentos de
contacto existiria alguma informação específica sobre determinados sectores de actividade e a
influência dos imigrantes era mais uma peça neste puzzle. O advento dos gabinetes de
comunicação e a valorização social destes agentes impulsionou o fluxo de informações que
viria a chegar à constituição de serviços de informação fortes. O recrutamento de antigos
profissionais do sector dos media tornou evidente que a agenda estava a ser condicionada.

E não era fácil resistir a esta realidade. Os inquéritos feitos sobre o interesse da população em
assuntos como a criminalidade rapidamente deu visibilidade ao tema imigração, uma vez que,
nalguns casos, as vítimas ou os arguidos eram imigrantes e assim eram identificados ao ponto
do tema ter gerado algumas das discussões mais acesas sobre a questão.

A percepção do jornalista obriga a ter um olhar sobre o acontecimento e sobre a mediação.
Isso significa que a narração do acontecimento encerra subjectividade. Autores recordam
mesmo a influência de um ponto de vista na criação de uma explosão de acontecimentos a
partir um facto.



“O acontecimento reportado na sequência da actualidade é, antes de tudo, uma história
sobre esse mesmo acontecimento.” V. Morin, 1976: 31)



Essa participação do jornalista na intermediação torna-se, em si, outro acontecimento ou no
acontecimento. “A palavra torna-se, ela mesmo, o acontecimento.” dizia Roland Barthes
(Barthes, 1968: 108)



O acontecimento acaba por ficar em segundo plano e tende a cair no esquecimento. O que é
narrado existe e o que não é narrado tem dificuldade para existir aos olhos do público. As
histórias surgem como fait-divers carentes de explicação e contextualização. Tornam-se
objectos de análise, parte de um todo importante na recomposição da narração do
acontecimento.



38
Capitulo III




1.1 Notícias sobre imigração - estudo

Um estudo realizado pelo OBERCOM (Observatório da Comunicação) para o ACIME33 com
o apoio da Fundação para a Ciência e Tecnologia conseguiu retractar algumas das
características do real produzido sobre imigração na imprensa portuguesa.

Foram analisadas cerca de 4000 notícias, entre jornais e revistas de distribuição nacional e
regional num período entre 1 de Janeiro de 2001 e 31 de Março de 2002.

Em termos gerais, o estudo do ORBECOM conclui que os imigrantes de Leste são tema
preferencial em 30% das notícias. Facto que surge associado ao calendário do estudo que se
relaciona com a vaga de imigrantes de Leste. Visibilidade garantida pelo número de
autorizações de residência.

Os delitos figuram entre os temas mais tratados (12,2%), seguido pelo acolhimento (8,5%),
“Convivência” (5,6%) e “Exploração e máfias” (5,6%), “Luta contra as máfias, exploração e
tráfico ilegal” (5,1%).

Na imprensa regional o tema que reúne maior atenção por parte da imprensa é o do
“Acolhimento” (13,4%), seguido do ensino de cursos de português (8,3%); as notícias sobre
os “Delitos” surgem em terceiro lugar com 7,3%; “Convivência” e “Exploração e máfias”
(ambas como 6,6%) são seguidas de perto pelos temas relacionados com a “Cultura“ dos
imigrantes e minorias étnicas (6,4%).

Imigrantes e Imigrantes de Leste são os protagonistas do estudo assim definidos na realidade
apresentada pelos meios de comunicação mas, no caso dos imigrantes de Leste, a tipologia é
associada às notícias sobre “Delitos”. Quando o tema é “habitação, realojamento, e más
condições de vida” os imigrantes do Leste surgem como segundos protagonistas logo após a
comunidade cigana. Os acidentes de trabalho surgem associados a Imigrantes de Leste.

Outro dos pontos interessantes do estudo coordenado por Francisco Rui Cádima, publicado no
site do ACIME, é a relação entre marcadores temáticos e fontes. Os delitos surgem agregados
ao Poder Judicial, Policial e Executivo. Quando se fala de “pessoas” e “acolhimento” os
principais referentes são os organismos sociais, os poderes executivos locais e os meios de
comunicação social. Organismos sociais e poder local estão, ainda, intimamente ligados a
temas como habitação, convivência, associativismo e cultura. No caso de temas como o

33
     www.acime.gov.pt

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Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração


debate sobre imigração associados a fenómenos como racismo e xenofobia está a
Comunicação Social ainda que em conjunto com outras fontes.

Dados importantes e que no capítulo dedicado à experiência da Rádio Terra Nova ganham
expressão prática, mormente por se tratar de uma abordagem qualitativa.

Uma análise global do estudo confirma que os temas considerados como avanços regista
43,2% das notícias, enquanto questões classificadas como dificuldades surgem com 40,09%
desse universo.

A verdade é que esses valores, apesar de próximos sofrem inversão quando falamos da
imprensa nacional. Aí, as dificuldades ocupam 45% do universo noticioso, enquanto os
“avanços” ocupam 38%.

A imprensa regional aposta nas notícias que abordam os “avanços” da integração com um
total de 55% do universo em estudo.

No comparativo quanto aos temas abordados, a imprensa nacional destaca os delitos com
14,5% do universo, seguido do acolhimento com 6,3%, enquanto a imprensa local aposta no
tema acolhimento com 13% da produção de notícias, seguindo-se a educação (ensino do
Português) com 8,3%.

Os imigrantes surgem associados aos delitos num quadro que não contextualiza a
criminalidade em Portugal, num processo que acaba por contribuir para associar o fenómeno
aos “estrangeiros”. A diferenciação étnica acaba por ajudar a reportar a notícia. Afinal, a
notícia reporta um acontecimento relevante ou é notícia porque o facto jornalístico nasce da
presença de um “não Português” como actor.

O quadro agrava-se no caso dos imigrantes de Leste quando surgem como marcadores
referenciais em notícias sobre “delitos”. Quando a notícia realça as condições de vida, em
particular falta de alojamento e dificuldades de convivência, aí surgem os referenciais aos
imigrantes do Leste e comunidade cigana.

Acidentes de trabalho e exploração relacionada com máfias são temas associados aos
Imigrantes de Leste mas também aos africanos e brasileiros.

São sinais que levantam interrogações sobre a conduta dos jornalistas e sobre a dicotomia
entre maioria e minoria. O uso de expressões que reforçam modelos de análise acabam por
agravar o quadro de análise social e os media deixam fugir a oportunidade de levantar novos
temas no campo da imigração.


40
Capitulo III

1.2 Meios de comunicação multiculturais




O Fórum Barcelona 2004 debateu estas questões para analisar o tratamento dispensado pelos
órgãos de informação aos temas da imigração. Em 2004, na cidade de Barcelona, Estrella
Rodriguez Pardo, directora-geral para a integração de imigrantes no Ministério do Trabalho e
dos Assuntos Sociais do Governo Espanhol declarava que “as atitudes direccionadas aos
imigrantes estavam muito ligadas à imagem dada dos imigrantes nos media”. Acrescentava
que “era necessário desenvolver esforços no sentido de assegurar que os órgãos de
comunicação conseguiam empregar gente de outras culturas para alertar as consciências para
estas questões, para ilustrar um modelo de sociedade multicultural e para desenvolver códigos
de deontologia”.

Participantes no fórum deixavam dados sobre estudos dedicados à imigração realçando a
forma como os meios tratam os históricos imigrantes europeus (italianos, alemães e
portugueses) associados a palavras como cultura, inovação e trabalho, os imigrantes de outras
latitudes (leste) cuja identificação ressalta imediatamente para crime, intolerância e imigrantes
de países da América do Sul que, usualmente, são citados a partir de relatórios de
organizações não governamentais.

As palavras utilizadas são outro foco de estudo ao ponto de concluir que se trata de
conotações muitas vezes de sentido negativo.

As diferentes intervenções protagonizadas por gente de todo o mundo alertaram para a
necessidade de criar códigos de regulação ética e defenderam aposta na educação como forma
de lutar contra a discriminação.

Recordava-se no Fórum de Barcelona, os diferentes tratamentos dados, por exemplo, num
caso de tiroteio entre imigrantes que acabou abordado de forma ligeira quando comparado
com temas como a doença das vacas loucas, o plano hidrológico nacional e o transporte de
alta velocidade. A forma como os assuntos são tratados é quase tão importantes como os
assuntos em si para o leitor, ouvinte ou telespectador.

E os estudos apresentados neste encontro de Barcelona concluíam que as notícias sobre
imigrantes são, na esmagadora maioria das vezes, negativas e os artigos estabeleciam uma
relação directa entre a origem dos imigrantes e os factos relatados. Outro estudo apresentava a
colocação de notícias por secção conforme os meios. Os jornais apostavam na emissão das


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  • 1. Carlos Manuel Ribeiro Teixeira Notícias em Russo para imigrantes Influências no processo de integração Instituto Superior de Ciências da Informação e da Administração Aveiro, 2006
  • 2.
  • 3. Carlos Manuel Ribeiro Teixeira Notícias em Russo para imigrantes Influências no processo de integração Monografia apresentada ao Instituto Superior de Ciências da Informação e da Administração como parte dos requisitos para obtenção do grau de licenciado em Comunicação. Orientador: Doutor Dinis Alves
  • 4.
  • 5. Resumo O trabalho desenvolvido tem por objectivo analisar o impacto das ferramentas da comunicação na criação de condições para o processo de integração de imigrantes de Leste em Portugal tomando como referência o caso da região de Aveiro. Os primeiros capítulos analisam a vertente teórica do fenómeno imigração e da entrada do tema nas agendas das empresas de comunicação. Segue-se uma análise do caso prático protagonizado pela Rádio Terra Nova que assumiu o lançamento de um serviço noticioso para imigrantes do Leste, segmentando a sua oferta noticiosa. Os objectivos, os métodos e a aposta nesta realidade são alvo de análise. Este projecto assume a ideia de que o processo comunicacional pode ser uma ferramenta de apoio social e de integração. Sem intervenções directas que visem esse objectivo, são, de forma indirecta, os motores de uma realidade que passou a fazer parte das agendas das empresas de comunicação. Não há rádio, jornal ou canal de televisão que não aborde a temática. Não há quem não critique as abordagens sensacionalistas ou o tratamento dado em determinado acontecimento. Falar de imigrantes como força geradora de um novo modelo cultural poderá parecer, à primeira vista, um exagero, mas é certo que este fluxo veio produzir alterações no tecido social com reflexo em vários pontos do país, permitindo a criação de conceitos que se difundem por grandes cidades e pequenos povoados portugueses. Aveiro sentiu estas alterações que têm reflexo nos principais núcleos urbanos, mas também em recônditas aldeias do distrito. Poderíamos estar a falar de modas, épocas ou correntes. Talvez não seja suficiente. É um movimento silencioso que está a criar novas formas de estar, novos públicos, novas ambições e novos estratos sociais. Uma revolução silenciosa porque mexe com a cultura de um povo. Este estudo quis assumir uma abordagem mais qualitativa, procurando o lado mais positivo que é, também, a marca dos noticiários em Russo na Rádio Terra Nova. v
  • 6.
  • 7. Abstract The present essay aims to analyse the impact of the migration movements in the Portuguese society, in particular, in Aveiro, and the contribution of certain media tools in the creation of favourable conditions for the integration process. The first chapter analyses the theoretical aspects of the immigration phenomenon and the way the subject has entered the agendas of media firms. Next, is presented the case study of Radio Terranova, which created a news service for Eastern European immigrants and, therefore, segmented its programmes. The goals, methods and the reasons behind the choice of this reality are analysed here. Why the Eastern European immigration and why now? These questions are the core of this study, which involves hearing people with different occupations, so to understand if the phenomenon has a global impact or is limited to specific areas. This project assumes the idea that the communication process may be a tool for social support and integration. Without intention, the immigrants have, indirectly, become a strong subject in the media firms´ agendas. There is not a radio station, newspaper or television station, which doesn’t focus the issue. All criticise the sensationalist approaches or the coverage given to a certain incident. To talk about immigrants as a generating force of a new cultural model may seem, at first, rather exaggerated; but it is true that this flow has produced changes in society, created concepts that have been diffused in large cities and small Portuguese villages. Aveiro has felt those changes, reflected in the main urban centres, as well as in the most secluded villages of the district. We could be talking about a trend. But, maybe, this is not enough. There is a silent movement, creating new lifestyles, new publics, new ambitions and new social classes. It is a silent revolution because it deals with the culture of a certain group. This study assumes a more qualitative approach, seeking the more positive side of the issue which is, also, the distinctive mark of the Russian news in Radio Terranova. vii
  • 8. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração 8
  • 9. Agradecimentos Este projecto resulta de múltiplos apoios dos quais gostaria de destacar os mais significativos. A primeira palavra de agradecimento para o orientador da Monografia, Professor Dinis Alves, pelo interesse demonstrado e pelo incentivo permanente ao longo da elaboração. Não posso deixar de agradecer a colaboração de Valentina Ribau pelos elementos fornecidos e pelos contactos facultados que serviram de base à monografia. Outras pessoas deram sugestões e pistas que se revelaram importantes ao desenvolvimento do estudo: • À Dra. Eliana Silva, da área formativa da Associação Industrial do Distrito de Aveiro, pelo apoio na promoção dos inquéritos; • À família que ao longo de todo este percurso nunca me negou apoio; • Aos colegas da Rádio Terra Nova que são suporte do trabalho diário; • Ao Engº Vasco Lagarto pela liderança que faz da RTN campo de inovação permanente com preocupações sociais; • A todos quantos deram o seu contributo; • Aos que responderam aos questionários e entrevistas A todos quantos apoiaram e forneceram elementos essenciais ao projecto e souberam na hora certa incentivar a realização da Monografia, pois sem eles não teria sido possível uma abordagem prática do tema. ix
  • 10. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração 10
  • 11. Índice Geral Resumo .......................................................................................................................................5 Abstract.......................................................................................................................................7 Agradecimentos ..........................................................................................................................9 Índice Geral ..............................................................................................................................11 Índice de quadros......................................................................................................................13 Abreviaturas mais utilizadas.....................................................................................................15 Introdução...................................................................................................................................1 Capítulo I ................................................................................................................................5 1. Imigração como fenómeno social...................................................................................5 1.1. Relativismo cultural.................................................................................................5 1.2 Factores condicionantes da Imigração......................................................................7 2. Imigração em Portugal ...................................................................................................8 2.1 Imigração no contexto Europeu..............................................................................12 3. Estruturas de apoio ao imigrante ..................................................................................14 Capítulo II.............................................................................................................................17 1. Imigração do Leste na região de Aveiro.......................................................................17 1.1 Associativismo como ferramenta ...........................................................................19 2. Influência social............................................................................................................22 2.1 Barreira linguística .................................................................................................25 2.3 Potencial económico...............................................................................................26 3. Integração e legalidade .................................................................................................28 3.1 Reforma legal .........................................................................................................29 3.2 Acolhimento sustentado .........................................................................................32 3.3 Criticas ao processo legislativo ..............................................................................33 Capitulo III ...........................................................................................................................37 1. Imigração na agenda dos Media ...................................................................................37 1.1 Notícias sobre imigração - estudo ..........................................................................39 1.2 Meios de comunicação multiculturais ....................................................................41 1.3 “Arrastão” de notícias.............................................................................................42 2. Informação em cadeia...................................................................................................44 2.1 Soluções de equilíbrio ............................................................................................45 Capitulo IV ...........................................................................................................................49 xi
  • 12. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração 1. Caso de estudo: Noticiários em Russo na Rádio Terra Nova ......................................49 1.1 Enquadramento institucional ..................................................................................49 1.2 Projecto notícias em Russo.....................................................................................51 2. Agenda diária................................................................................................................53 2.1 Informação em rede ................................................................................................54 2.2 Informação e cultura...............................................................................................56 2.3 Noticiários em Russo e publicidade .......................................................................58 3. Estudo junto dos potenciais ouvintes do serviço ..........................................................60 3.1 Objectivos...............................................................................................................60 3.2 Metodologia da investigação ..................................................................................61 3.2.1 Método de obtenção de dados .............................................................................61 3.2.2 Selecção do universo e da amostra ......................................................................62 3.2.3 Tratamento dos dados..........................................................................................62 3.3 Apresentação e análise de resultados .....................................................................62 3.3.1 Caracterização da amostra ...................................................................................63 3.3.2 Dificuldades na adaptação ...................................................................................64 3.3.3 Conclusão da caracterização da amostra .............................................................73 Considerações Finais ............................................................................................................75 12
  • 13. Índice de quadros Quadro 1 – Distribuição da amostra por países de origem……………………... Quadro 2 – Anos de residência em Portugal…………………………………… Quadro 3 – Grau de dificuldade no processo de integração……………………. Quadro 4 – Tipificação das dificuldades no processo de integração…………… Quadro 5 – Frequência de ouvintes dos noticiários em Russo…………………. Quadro 6 – Horário preferido para ouvir noticiários em Russo……………....... Quadro 7 – Âmbito dos assuntos de interesse para imigrantes………………… Quadro 8 – Temas preferidos nos noticiários em Russo……………………..... Quadro 9 – Participação em eleições nos países de origem………………….... Quadro 10 – Influência dos noticiários no sentido de voto…………………… Quadro 11 – Influência dos noticiários na promoção de espectáculos………… xiii
  • 14.
  • 15. Abreviaturas mais utilizadas Abreviaturas mais utilizadas ACIME – Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas RTN – Rádio Terra Nova UA – Universidade de Aveiro SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras IEFP – Instituto de Emprego e Formação Profissional AIDA – Associação Industrial do Distrito de Aveiro JN – Jornal de Notícias xv
  • 16.
  • 17. Introdução A experiência profissional de 18 anos como colaborador e profissional da Rádio Terra Nova e o trajecto académico seguido até à conclusão do curso de comunicação no ISCIA permitem o cruzamento de duas vertentes essenciais à opção tomada de desenvolver o estudo monográfico sobre a influência da difusão de notícias em Russo, na Terra Nova, no processo de integração de imigrantes na sociedade aveirense. O estudo destaca a produção noticiosa como algo dinâmico ajustado às realidades sociais que se vão construindo pelos fluxos migratórios. Este será um dos campos de acção, uma vez que o mundo do jornalismo, em particular na rádio onde exerço a profissão de jornalista, não ignorou a criação de um nicho de mercado interessado num tipo de informação diferenciado dos hábitos tradicionais em Portugal. Em simultâneo obriga a desenvolver uma reflexão sobre a importância de estar atento aos fenómenos sociais porque serão um dos motores da dinâmica registada em Portugal na última década. A importância do jornalismo nas sociedades modernas é inquestionável e os movimentos migratórios vieram alterar a ordem social. Onde antes se debatia o estrato social ou as faixas etárias como mercado alvo hoje descobrem-se novos critérios que permitem pensar em ajustar oferta e procura no mundo do jornalismo. Loviglio (2005), citando Carey e Brecht, sobre rádio, acreditava estar perante um instrumento destinado a funcionar com interactividade, e parte de um espaço de liberdade democrática. Carey defendia a existência de dois modelos em perspectiva para o século XX com a emergência da rádio: um associado ao controlo social e outro destinado a criar um sentido ritual de comunidade. A América vivia a entrada na era dos talk-shows. O conceito de serviço público sofre transformações que o colocam em discussão. Existem vários factores a levar em conta na análise: A proliferação de meios de comunicação A especialização de meios com predominância para as rádios de música 1
  • 18. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração A crescente capacidade de encontrar informação à escala mundial Conceito a que se junta uma nova realidade social ditada pela entrada de imigrantes do Leste Europeu: O interesse dos imigrantes que escolheram Portugal como país de acolhimento A capacidade económica dos imigrantes que operam na região de Aveiro A crescente criação de associações de apoio aos imigrantes A barreira linguística A democratização desta distribuição é hoje uma realidade incontornável num país como Portugal onde os imigrantes do Leste Europeu, descobriram que as oportunidades podem estar em cidades médias ou até em pequenos povoados onde o nível de vida, não sendo tão elevado, oferece algumas possibilidades de sobrevivência nos primeiros e difíceis momentos da instalação num novo país. O exemplo do Leste Europeu será um dos mais interessantes em termos de estudo porque apresenta realidades recentes e dados em permanente mutação. Os números disponíveis sobre imigração no distrito de Aveiro tornam esta realidade num campo de estudo. Um caso a merecer análise e mobilização da sociedade na forma como se concentra sobre uma interacção cultural com implicações na vida diária de populações que estão cada vez mais próximas e que, segundo Eduardo Sá (2006), “a médio e longo prazo poderão estar na génese de uma cultura nova. Um esforço que conta com o apoio de associações de apoio ao imigrante. Não é fácil a montagem das estruturas de apoio que registam ainda as rivalidades próprias das diferentes comunidades. Todas desejam ter uma associação. As freguesias em concelhos vizinhos de Aveiro passaram a ser desafiadas para a criação de espaços de apoio, mas esses movimentos 2
  • 19. nunca ganharam espaço de intervenção. Trata-se de uma fase do sistema marcada por avanços e recuos, fases de maior credibilidade ou momentos de menor consistência que acabam por destruir os verdadeiros propósitos do associativismo. A aprendizagem da língua e os recenseamentos serão alguns dos sinais mais visíveis desta ligação entre culturas, mas outras existem que esbatem fronteiras e permitem falar da criação de uma nova realidade em grande aceleração e com múltiplas formas. Cita-se, como exemplo, a música, os produtos bancários e até os negócios na área da pesca e transformação do bacalhau. Tal envolvimento justifica, por si só, um olhar atento a que os órgãos de comunicação não escapam. Seja na vertente mais social ou numa perspectivas económica, a verdade é que a imigração criou um espaço de intervenção para os órgãos de comunicação. Os que agarraram esse papel parecem satisfeitos com a aposta e muitos outros equacionam o lançamento de novas propostas. O objectivo geral do tema proposto consiste em enquadrar o fenómeno da imigração no tecido social e a importância que os órgãos de comunicação podem ter na construção de um processo bem sucedido. Tomando como referência a Rádio Terra Nova, que tem um serviço de notícias em Russo, será feita uma abordagem às notícias e ao impacto que tal serviço tem na vida dos imigrantes. Como objectivos mais específicos, propomo-nos: Identificar a estrutura do noticiário preparado para imigrantes do leste Determinar o impacto que esse serviço tem na vida dos imigrantes em particular nos primeiros meses de vida em Portugal Descobrir potenciais novos serviços Uma realidade que vai ao ponto de proporcionar debates alargados sobre a forma como os acontecimentos são tratados e que efeitos têm no processo de integração. Podemos dizer que 3
  • 20. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração se cria um quadro de natureza construtiva que procura pontos de apoio e pistas para facilitar a integração de imigrantes em Portugal onde, apesar de tudo, os agentes envolvidos falam de uma realidade de relativo sucesso. O projecto desenvolvido em torno da presença de imigrantes de Leste em Portugal – com particular incidência na região de Aveiro – é elaborado tendo por fundo a relação entre culturas. A ligação entre sociedades diferentes, que em determinado momento convergem, faz da imigração um caso de leitura fascinante. No caso dos imigrantes, sobretudo os imigrantes do Leste, há inúmeras manifestações que estão para lá do lado negativo da interligação. Mais habituados a reconhecer nas sociedades de Leste marcas da criminalidade, desemprego e alcoolismo – traços mais difundidos pelos meios de comunicação –, os portugueses habituaram-se a olhar para os jornais russos nas bancas, a ouvir noticiários e programas musicais dedicados a comunidades do Leste, a reconhecer médicos de culturas das antigas repúblicas socialistas soviéticas, a aprender com reputados professores do ensino superior e a admirar o esforço de imigrantes no sector da construção civil. Tal evolução intensificou-se na última década. Começou em vagas controladas e depressa passou para uma explosão que gerou disfunções ao nível dos fluxos e dos circuitos paralelos criados, muitas vezes, à margem da lei. A estrutura da Monografia assenta: - No primeiro capítulo, no enquadramento da Imigração enquanto fenómeno social; - No segundo capítulo, nos reflexos e nos impactos da imigração na Área Metropolitana de Aveiro; - No terceiro capítulo, no agendamento das questões da imigração nos meios de comunicação; - No quarto capítulo, com a abordagem de um caso prático protagonizado por uma rádio local (Terra Nova) que assumiu o desafio de lançar um noticiário em Russo para imigrantes de Leste. 4
  • 21. Capítulo I Capítulo I “Tenho dito que a escola foi a invenção mais bonita da humanidade, e que a educação para todos foi a maior (e mais tranquila) de todas as revoluções. E será ainda mais bonita se promover a diversidade e a criatividade, a reciprocidade e os bons exemplos”. Eduardo Sá (2006) 1. Imigração como fenómeno social 1.1. Relativismo cultural Marcado por diferentes fases, o conceito de cultura tem apontado para um sistema de costumes, valores, comportamentos e crenças que redundam na criação material e que são partilhados por comunidades. O que define estas comunidades? A ligação entre os indivíduos e a sua relação com outras comunidades e com o mundo apostando no fortalecimento de valores e costumes enraizados pelo tempo. São valores que alcançam a sua afirmação com a passagem de geração em geração. Segundo Titiev, “a antropologia assentou, no século XIX, o seu estudo na visão parcelar, fragmentada e pouco dinâmica das sociedades. Vivia-se o tempo em que os padrões eram dominados pela era Vitoriana. Qualquer análise cultural resultava de relatos de comerciantes, viajantes e missionários e os dados eram analisados como fósseis ou espécies animais sempre à luz dos padrões vigentes no mundo ocidental. Estas peças serviram, muitas vezes, para avaliar o estágio de desenvolvimento das sociedades. Apesar de ser rotulada como um todo, a cultura não era mais do que um somatório de elementos, tendo como referência a sociedade industrializada inglesa”. Hoje continuam a ser evidentes as marcas desta cultura dominante, em que os padrões ocidentais representam importantes pontos de referência na análise das sociedades, mas é cada 5
  • 22. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração vez mais determinante o abandono das expressões assentes no etnocentrismo. Ganha preponderância o estudo que deixa de lado a análise cultural tendo como referência uma determinada cultura que é considerada dominante. O século XX fica marcado pela chegada do “relativismo cultural”, corrente que defende a aprendizagem como via para a constituição de determinados aspectos culturais e renega a influência de aspectos biológicos. A influência desses condicionamentos culturais passa ainda por actos inconscientes e não por deliberações racionais muito embora se considere que existem questões racionais a explicar valores culturais. Todas as culturas são desenvolvidas de acordo com as suas prioridades e valores. Nenhuma é melhor ou mais avançada. Traços culturais não devem ser avaliados à luz de um contexto mundial, mas apenas no seu contexto de inter-relações. Segundo Titiev, “marcas culturais tais como língua, tecnologia, instituições, crenças e valores, são transmitidas através de gerações e mantêm continuidade nos processos de aculturação entre gerações. E se o processo não depende exclusivamente da biologia não dispensa alguns contributos. Características humanas acabaram por ser potenciadas pelas capacidades físicas e pelas capacidades intelectuais que são susceptíveis de afectar o desenvolvimento cultural. Contudo, estes factores não determinam capacidades específicas. Podem criar condições para aprender línguas, mas a aprendizagem depende do esforço do ensino. A substituição das teorias da transmissão genética do comportamento pela aprendizagem própria da evolução humana teve efeitos na ponderação da herança humana. Cada vez mais, a adaptação ao meio ambiente depende de estratégias culturais em detrimento de predisposições genéticas”. Ao longo de milhares de anos, o ser humano deu mostras de adaptação em diferentes ambientes e testou a sua capacidade em diversos ecossistemas. As diferenças culturais mostraram-se mais profundas e limitadoras. Funcionam como campo de estudo de inegável interesse. Já em 1958, Titiev preconizava: “tal como a mobilidade dos factores económicos significa que recursos como capitais, formação ou tecnologia podem deslocar-se para zonas de 6
  • 23. Capítulo I maximização e geradores de riqueza também as migrações laborais procuram a melhor remuneração para a capacidade produtiva. A evolução da tecnologia que está na base da organização das empresas e que promove a concorrência entre modelos de sociedades, trouxe também instabilidade das hierarquias sociais, das categorias profissionais e dos rendimentos”. Mas os factores económicos ou a tecnologia não são os pioneiros das movimentações humanas. Desde sempre que as assimetrias religiosas, económicas, culturais ou políticas, para referir apenas algumas, originaram êxodos humanos, na tentativa de encontrar condições de vida melhores do que aquelas de que gozam nos seus países de origem. Tal como afirma Maria do Rosário Dias na obra “Investigação Transcultural” sobre Atitudes Face aos Imigrantes – estudos piloto de Lisboa, Sociologia Problemas (1997) “até hoje, e ao longo de toda a história, o conceito de imigração tem sido definido como a necessidade humana de deslocação de próprio contexto vital para outros contextos com recursos económicos e sociais suficientes. É, por conseguinte, uma manifestação estruturada em diversas dimensões, quer sociais, culturais e linguísticas, quer económicas, jurídicas e políticas”. 1.2 Factores condicionantes da Imigração Múltiplos factores influenciam a decisão de emigrar. São os chamados factores de repulsão e factores de atracção. Os primeiros relacionados com o país de origem e os segundos com o país de destino. Ambos são decisivos. Sendo um fenómeno histórico e também actual, poder-se-á conjecturar sobre o seu desenvolvimento futuro, os efeitos e consequências do seu percurso a curto, médio ou longo prazo. 7
  • 24. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração Actas do Colóquio Internacional sobre a Emigração e Imigração em Portugal, em 19931, falavam de uma «tendência para a fuga para países mais desenvolvidos de países de economia mais débil como fenómeno inevitável a curto e médio prazo. Importa ainda referir que a imigração tem tendência para um efeito multiplicador, tanto por força do reagrupamento familiar, como pelo clima de opinião que se gera na comunidade de origem face à melhoria das condições de vida obtida no estrangeiro por alguns dos seus membros». 2. Imigração em Portugal Para além da presença secular de uma comunidade cigana, sabe-se que no final do século XVI existia em Lisboa uma numerosa comunidade africana, cuja diluição se deveu, por um lado, à gradual miscigenação com os portugueses e, por outro, à proibição da escravatura em finais do século XVIII. É a partir dos finais de 1970 que se verifica um acréscimo acentuado da população estrangeira residente em Portugal. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, publicados em anexo, a curva tem mantido nível ascendente. Em 1980 eram 50750 e até 2005 não cessam de aumentar, atingindo os 276450, como documenta o gráfico apresentado, referente a dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). 1 Emigração e Imigração em Portugal, Actas do Colóquio Internacional sobre a Emigração e Imigração em Portugal, secs. XIX e XX, Fragmentos, Algés, 1993, pp415/416 8
  • 25. Capítulo I Figuras 1 e 2 – Dados do SEF2 2 Fonte: www.sef.pt 9
  • 26. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração O número de imigrantes em Portugal representa 2,65 do total da população do país. Estes dados são referentes a 2005, quando o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) assumiu ter registado 276450 estrangeiros a residir legalmente no país3. Para nos referirmos apenas a um dos anos mais recentes, em 2005 o número de registos evidenciava acréscimo de 6%, baseado sobretudo em imigrantes europeus (mais 8,6%), América Central e do Sul (mais 8%), Ásia (mais 7,1%) e África (mais 4,3%). Estas são as principais áreas de origem dos imigrantes que vivem em grandes áreas metropolitanas como Lisboa, Faro, Setúbal e Porto. De 50000 estrangeiros residentes legalmente em 1980, a comunidade estrangeira em Portugal passou, em 90, para as 107767 pessoas. Após a entrada em vigor da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, em 1995, e as alterações daí resultantes, os números da imigração sofreram um crescimento contínuo e exponencial em todos os países signatários, surgindo como nova realidade o afluxo maciço de cidadãos do Leste Europeu. No ano 2000 já residiam em Portugal 220000 pessoas. Paralelamente, o fluxo de imigração ilegal não só não diminuiu como aumentou de forma acentuada, distribuindo-se por todo o território nacional. Entretanto, a realidade, dinâmica, acentua hoje uma tendência de redução. Jorge Malheiro, do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa, responsável pelo tratamento de dados em Portugal, admite a quebra. “É já evidente que os fluxos sofrem nova diminuição” afirmava ao JN. No caso da imigração de países do Leste Europeu, as maiores quebras notam-se entre ucranianos e russos, enquanto moldavos e romenos mantêm um nível constante. Os níveis de desemprego estão a fazer baixar as expectativas dos imigrantes e, no caso dos ucranianos, essa taxa terá duplicado segundo informação daquele investigador. Estas condicionantes estão na origem da diversificação da oferta de emprego com os imigrantes a procurarem novas postos de instalação e a criarem alternativas ao mercado de emprego. “A maior novidade é a entrada em sectores industriais, mas não só. Há a adesão a negócios de 3 vide anexo IX 10
  • 27. Capítulo I entretenimento e medicinas alternativas…ofertas muito diferentes da tradicional dominância quase exclusiva da construção civil”, explica Jorge Malheiros. A população imigrante representa 6% da população activa do país mas a concorrência pelo retorno ao país de origem faz-se sentir com propostas que chegam, por exemplo, da Rússia. Há um programa de regresso voluntário que oferece viagens de retorno e emprego garantido. Há também a concorrência do mercado espanhol onde os salários são mais altos mas o sucesso da integração continua a falar mais alto. No caso de famílias agrupadas e com bom encaixe social, a opção é ficar em Portugal. Pode dizer-se que Portugal vive a fase de amadurecimento da imigração depois da vaga maciça de entradas. É tempo de estabilização. A fase em que se percebe se a integração foi bem conseguida e se as “raízes” são estáveis. É o melhor aferidor da estabilidade nos movimentos migratórios e o estudo sobre a importância dos noticiários em russo gira em torno desta capacidade de ajudar a integrar os cidadãos mas também da capacidade para passar a uma fase de compromisso em que o cidadão vê esbatidas as qualidades de imigrante para se tornar parte de uma nova “unidade”. Estes dados dizem respeito apenas aos imigrantes com residência legalizada, isto é, não incluem os clandestinos que entraram no nosso país e aqui permanecem de forma ilegal. Em relação aos factores de atracção, Fernando Luís Machado (1991) enumera os mais relevantes para a fixação de minorias em Portugal. “Entre os factores de atracção exercida pela sociedade portuguesa destaca-se, em primeiro lugar, a conjuntura de crescimento económico, baixo desemprego e aumento da procura de pessoal em sectores de mão-de-obra intensiva, como é o caso da construção civil e obras públicas, o que vem garantindo as possibilidades de emprego quase imediatamente após a chegada.” 11
  • 28. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração A imigração do Leste afasta-se da lógica descrita para a imigração dos países de língua oficial portuguesa que apresentava sinais de continuidade ou comunhão. Segundo Machado (1993) “Nenhuma das comunidades imigrantes residentes em Portugal se encontra em situação de forte contraste com a população portuguesa, simultaneamente no que se refere às condições sócio-económicas, à situação residencial, à identidade linguística, à filiação religiosa e aos modos de vida. Há diferenciações em algumas destas dimensões mas, noutras, há claras continuidades”.4 Quer se verifiquem continuidades ou diferenciações entre os dois tipos é necessário abordar o problema a partir do ponto de vista social, porque é nas relações sociais diárias que surgem sinais de integração ou marginalização. Rosário Dias (1997) justifica com a necessidade de criar dinâmicas interculturais. “Sob uma perspectiva social, a incorporação dos imigrantes é exequível a partir de um processo de interculturalidade. Tal significa, segundo Vachon (1995) um reencontro entre as culturas maioritárias e minoritárias a partir dos seus critérios e valores mais profundos para afrontar uma perspectiva transcultural e supercultural que as supere a ambas. É certo que esse reencontro implica necessariamente um choque profundo que deriva dos símbolos, mitos, princípios e costumes ancestrais, mas que poderá ser resolvido se cada uma das culturas aprender a conhecer os seus limites inerentes, se auto interprete e dialogue.” 2.1 Imigração no contexto Europeu 4 Fernando Luís Machado, Etnicidade em Portugal: O grau de politização zero, Actas de Colóquio Internacional Sobre Emigração e Imigração em Portugal, Séculos XIX e XX, Fragmentos, Algés, 1993. 12
  • 29. Capítulo I Numa época em que são cada vez mais são visíveis os efeitos da globalização, os fluxos migratórios de homens e mulheres de uns países para outros assumem uma importância crescente no contexto europeu. Os anos 90 confirmaram a constituição de uma nova ordem mundial, com a reunificação da Alemanha (9 de Novembro de 1989). A “queda do muro de Berlim” foi determinante no curso da história e nas relações entre ocidente e oriente. Dentro da Europa, a Alemanha voltava a ser uma Nação unificada e soberana, com um grande peso que lhe advém da população (80 milhões) e da capacidade industrial que lhe deram o epíteto de motor da União Europeia. Com o desaparecimento da “cortina de ferro”, a Alemanha deixa de ser “espaço fronteira”, entre dois blocos, e assume um lugar central na Europa que garante transição entre ocidente, oriente e Balcãs. Para a antiga Europa comunista abria-se a porta à assunção de uma identidade plenamente europeia. Para esses países do leste, o desfio era como lançar-se nos circuitos económicos internacionais e na zona oeste da Europa. Segundo Moreau (1997), “a Rússia, que emerge das ruínas da antiga União Soviética (1992), mantém dilemas que retratam a vida quotidiana das populações: por um lado surge liberta da carga imperial em que procura criar a nação democrática e, por outro, permanece um gigante com inúmeras populações em risco de decomposição se abandonar a herança de poder de aço”. Esta realidade que assentava em dois blocos fortes e equilibrados, dá lugar a uma nova ordem com novas dinâmicas. Foi também a década do desmembramento da Jugoslávia e do nascimento de nações como a Croácia e a Bósnia. Movimentos que não serenaram as comunidades e que obrigaram à intervenção das Nações Unidas. O que parecia uma fase de apaziguamento, continuou como época de tensões mais ou menos evidentes. Época de dificuldades económicas pela destruição e pelo afastamento dos circuitos comerciais durante décadas. Cenário propício ao movimento de povos que encontravam menos barreiras na circulação e, ao mesmo tempo, muitos argumentos a favor da procura de novos espaços de instalação. O 13
  • 30. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração extremo ocidental da Europa não terá sido o local mais procurado, mas será seguramente um dos mais distantes. 3. Estruturas de apoio ao imigrante A democratização desta distribuição é hoje uma realidade incontornável num país como Portugal onde os imigrantes, sobretudo os europeus do leste, descobriram que as oportunidades podem estar em cidades médias ou até em pequenos povoados onde o nível de vida não sendo tão elevado oferece algumas possibilidades de sobrevivência nos primeiros e difíceis momentos da instalação num novo país. Este será um fenómeno recente e que Portugal vivia apenas na condição de visitante e não como país de acolhimento obrigado a criar condições para grandes fluxos migratórios. Integrado na União Europeia, Portugal é visto como espaço de oportunidades. Uma porta aberta para uma Europa que mantém uma imagem de sonho com trabalho e estabilidade. Pode discutir-se o modelo europeu e a fase de crise instalada com elevadas taxas de desemprego – actualmente estável com tendência para decréscimo – mas a imagem sólida criada ao longo das últimas décadas, nomeadamente por via do processo de integração europeia, favoreceu a expansão. Haverá casos de sucesso e insucesso, mas a tentativa efectuada por muitos não é travada pelas barreiras enfrentadas e o contacto estreita-se de forma a interligar culturas e civilizações. Portugal viu nascer uma rede de associações destinadas a apoiar os imigrantes que chegaram ao país na última década. Reconhecidas pelo Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas estima-se que existam cerca de uma dezena de associações vocacionadas para representar os cidadãos do Leste da Europa. Aveiro possuiu um desses espaços, nascido na freguesia de São Bernardo que viveu nos últimos anos a transformação de uma matriz rural para um quadro mais urbano que facilmente se confunde com a área urbana de Aveiro. Muitos instalaram-se num local onde a construção civil teve e tem implantação e essa dinâmica favoreceu a escolha. 14
  • 31. Capítulo I O espaço universitário surge como outro dos atractivos para os cidadãos de Leste. Para a geração mais antiga é porta para pedidos de equivalências nos graus académicos e para os mais jovens é um centro de formação prestigiado em Portugal que garante a frequência no ensino superior. O conjunto de associações de apoio ao imigrante destaca a centralidade de Lisboa e prova a diluição das comunidades por unidades geográficas mais reduzidas: Associação de Apoio ao Imigrante de Aveiro Associação dos Imigrantes Russófonos de Lisboa. Associação dos Imigrantes nos Açores Associação dos Imigrantes dos Países do Leste de Setúbal Associação dos Ucranianos em Portugal de Lisboa Centro Cultural Moldavo em São Domingos de Rana Associação de Imigrantes de Gondomar Associação de Imigrantes Romenos e Moldavos em Setúbal Associação Tavirense de Apoio ao Imigrante Centro de Apoio à População Emigrante de Leste Europeu e Amigos em Portimão5 Encontramos associações ligadas à própria dinâmica das comunidades imigrantes mas, também, ao apoio de poderes públicos locais (câmaras e juntas de freguesia)6 que quiseram assumir desde o início um papel de charneira na integração das comunidades. Muito desse apoio ficou associado à disponibilização de espaço para as actividades das associações e à marca institucional que representa a participação de poderes públicos na vida das comunidades deixando um sinal de presença e valorização. 5 Fonte: ACIME (www.acime.gov.pt) 6 Vide anexo VI 15
  • 32. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração Paralelamente as estruturas de apoio foram complementadas por centros locais de apoio à integração de imigrantes de natureza mais social, patrocinados pelo Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas com intervenção directa das autarquias e de centros sociais que se empenharam na liderança do processo de integração. Existem 53 centros de apoio local registados em Portugal. Aveiro, Oliveira de Azeméis e Santa Maria da Feira são os três concelhos do Distrito de Aveiro que possuem tal valência. No caso de Aveiro, o serviço junta-se ao já citado serviço fornecido pela Associação de Apoio ao Imigrante. O espaço funciona nas instalações do Centro Paroquial da Vera Cruz (Aveiro) e pode definir-se por um tipo de proximidade com a realidade mais citadina. Os dois centros nacionais de apoio ao imigrante funcionam em Lisboa e Porto sob a tutela directa do Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas. 16
  • 33. Capítulo II Capítulo II 1. Imigração do Leste na região de Aveiro Faltam dados rigorosos sobre a presença de imigrantes do Leste na região de Aveiro, entre cidadãos legais e outros ilegais, mas admite-se a existência de cerca de cinco mil imigrantes em municípios como Aveiro, Ílhavo, Vagos, Águeda, Albergaria, Sever do Vouga e Estarreja. O estudo circunscreve o universo aos municípios da Grande Área Metropolitana de Aveiro que coincide com os concelhos da Associação de Municípios da Ria em função do mercado definido pela Rádio Terra Nova. Os números oficiais que resultam das publicações do SEF, apresentadas em anexo, registam como população residente no distrito de Aveiro um total de 9657 cidadãos imigrantes em 2005. As comunidades de Leste estão distribuídas da seguinte forma tendo por base os cidadãos residentes. Bielorússia 20 Lituânia 17 Moldávia 75 Rússia 129 Ucrânia 195 Se os dados a considerar forem referentes à prorrogação de vistos de longa duração verifica-se um aumento. 17
  • 34. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração Bielorússia 28 Lituânia 2 Moldávia 92 Rússia 66 Ucrânia 431 Estes dados acabam por ter correspondência directa com as mudanças na Lei inseridas na proposta defendida pelo Governo em Conselho de Ministros no dia 10 de Agosto de 2006. Sobre o teor do documento, destacava-se “a criação de um tipo único de visto, que permita ao seu titular entrar em Portugal para fixação de residência, que será concedido de acordo com objectivos específicos (exercício de actividade profissional, reagrupamento familiar, estudos): o visto para obtenção de autorização de residência. Esta medida, ao substituir os seis tipos de visto de longa duração (4 tipos de visto de trabalho, visto de residência e visto de estudo) por um único visto, permite racionalizar procedimentos”7. Mobilizados pela vontade de atingirem níveis de vida melhorados, muitos imigrantes do Leste aproveitam para descobrir Portugal onde dizem encontrar bom acolhimento por parte dos cidadãos. Outros são “empurrados” de países como França e Espanha, de onde saíram “traídos” por ofertas falseadas. Esta será uma das marcas da interacção cultural já que as pontes são construídas com alguma facilidade8. A maioria dos imigrantes vive fora do seu sector de actividade profissional, distante das áreas de formação académica. O caminho para o crescimento profissional revela-se tortuoso e nem todos conseguem resistir durante largos períodos de espera, em que o mercado de trabalho manifesta incapacidade para adequar disponibilidade e necessidades. Citando um estudo publicado pelo Jornal de Notícias (JN), em Julho de 2003, a Terra Nova colocava em evidência os dados fundamentais de um estudo de caracterização dos imigrantes. 7 Fonte: Revista BI- edição Agosto/Setembro do ACIME 8 vide anexo VI 18
  • 35. Capítulo II “Um estudo de caracterização sociográfica dos imigrantes residentes no concelho de Aveiro revela que 29 por cento são licenciados, noticia hoje o Jornal de Notícias. Mas, de acordo com o matutino, a grande maioria destes trabalhadores encontram-se na construção civil ou são operários fabris. O estudo foi desenvolvido pelo Centro Social e Paroquial da Vera Cruz junto de 250 cidadãos de Leste”.9 O início mais comum passa pela tentativa de integração em espaços provisórios que acolham um dos membros da família e pela procura de um emprego que permita suportar as despesas. As vias mais habituais passam pela entrada nos sectores da construção e das limpezas, áreas que empregam inúmeros imigrantes. Numa primeira fase as liberdades e garantias costumam perigar devido às dificuldades de comunicação. A língua é uma barreira que impede conhecimentos aprofundados sobre a lei em vigor no país de acolhimento.10 Sendo um país rico em oferta legislativa, Portugal não consegue ainda a melhor comunicação com os imigrantes que revelam dificuldades para perceber, com rigor, a letra e o espírito da lei que consagra os seus direitos. Nem percebem, nem se fazem compreender numa falta de comunicação que cria zonas dúbias ao nível do entendimento dos acordos laborais feitos com agentes que, nalgumas situações, revelam falta de escrúpulos. 1.1 Associativismo como ferramenta O associativismo ganha papel relevante neste esforço de integração e a região de Aveiro não é excepção tendo em funcionamento a Associação de Apoio ao Imigrante, sedeada em São Bernardo. Naquela freguesia do concelho de Aveiro, em instalações cedidas pela Junta, começaram a ser tratados temas como as comunicações com os familiares e amigos nos países de origem, apoio ao preenchimento de formulários, o ensino da língua portuguesa e a instituição de um grupo de pressão capaz de representar a comunidade. Ganhar “peso político” que permita, por exemplo, a instalação de mesas de voto em eleições nos países de 9 www.terranova.pt publicado em 2003-07-16 10 Dados confirmados pelo estudo apresentado no último capítulo deste estudo monográfico. 19
  • 36. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração origem e a criação de canais de comunicação com poderes públicos são algumas das metas deste grupo de pressão que funciona ancorado na iniciativa dos dirigentes associativos. Na mira da Associação passaram a estar, quase em permanência, as representações diplomáticas de países do Leste acreditadas em Lisboa. O fenómeno da dispersão e a disseminação acabou por acelerar este processo. A última década permitiu diversos fenómenos no cruzamento de diferentes culturas. Um dos exemplos flagrantes foi dado pela língua, uma vez que os serviços de tradução passaram a ser requisitados por tribunais, forças de segurança e serviços de saúde. Notícias difundidas pela Terra Nova e publicadas no site da estação anunciavam novas dinâmicas no Verão de 2001: “Um projecto de apoio à imigração. A Junta de Freguesia de São Bernardo prepara a criação de um Centro de Apoio ao Imigrante. Quer dar condições para uma inserção social eficaz. Promete ajudar no ensino da língua portuguesa, e na colocação de imigrantes no mercado de trabalho. A Junta de Freguesia está a promover o projecto junto das embaixadas dos países de leste. É um dos primeiros passos na criação de um centro que vai funcionar com base no voluntariado”.11 “É preciso olhar com atenção para os imigrantes. Está criada uma nova realidade social na região de Aveiro. O apelo é explicado por Maria Emilia Carvalho, directora do Centro Paroquial da Vera Cruz, instituição disposta a lançar um programa de integração social. quot;Há uma nova realidade para enfrentarquot;, afirma a directora do centro. Uma realidade nova que vai exigir um trabalho de fundo com alguns riscos que é preciso analisar. quot;Sabemos que estamos a tratar de redes organizadas e isso não é fácilquot;, adianta a responsável pelo Centro Paroquial e Social da Vera Cruz. Não é fácil quantificar o número de imigrantes, mas há indicadores que justificam a intervenção humanitária, junto de famílias instaladas em aldeias da região, em más condições. O primeiro passo é ganhar a confiança dos imigrantes, para depois apostar na assistência social e integração condigna”.12 Não é fácil a montagem destas estruturas de apoio condicionadas, muitas vezes, pelas rivalidades próprias das diferentes origens. Todas as comunidades desejam ter uma associação. As freguesias em concelhos vizinhos de Aveiro passaram a ser desafiadas para a 11 www.terranova.pt publicado em 2001-06-07 12 www.terranova.pt publicado em 2001-05-21 20
  • 37. Capítulo II criação de espaços de apoio, mas esses movimentos nunca ganharam espaço de intervenção. Trata-se de uma fase do sistema que fica marcado por avanços e recuos, fases de maior credibilidade ou momentos de menor consistência que acabam por destruir os verdadeiros propósitos do associativismo. “Uma nova associação para apoio de cidadãos imigrantes vai nascer em Aveiro. Chama-se Associação de Solidariedade Social e InterCultural da Federação Russa em Portugal e os respectivos corpos gerentes vão ser eleitos no próximo dia 27 de Junho. Alex Romanov, um russo em Portugal há 13 anos, quer mais actividade cultural na cidade, para todos os grupos de pessoas: Em nossa opinião deverão ser reflectidas e amadurecidas as oportunidades de investimento cultural na sociedade de qualquer grupo de pessoas. A integração e a inserção dos imigrantes em Portugal é um dos grandes objectivos da nova associação que aposta também no desenvolvimento de acções de apoio aos imigrantes e seus descendentes visando a melhoria das suas condições de vida”.13 “Os imigrantes de leste que habitam e trabalham na Gafanha da Nazaré já têm associação de apoio. Chama-se Nach Dom e foi registada há poucos dias. Para já, funciona a título provisório num estabelecimento comercial. Anatoly Silva, um dos dinamizadores do projecto, espera que a associação funcione como espaço de afirmação da comunidade imigrante. Esta ideia nasceu na Gafanha da Nazaré dentro do nosso grupo. Precisamos defender os nossos direitos e criar postos de trabalho. Não queremos consumir produtos. Queremos produzir. Temos educação e experiência e muita gente anda em trabalhos duros em que o dinheiro não dá para manter famílias. Desejamos abrir novas empresas, revela Anatoly Silva. Nach Dom é a nova associação de apoio ao imigrante, um nome que em português significa a nossa casa. A falta de sede social é o grande problema enfrentado pelos responsáveis da associação que desejam encontrar uma solução definitiva, até porque o estabelecimento comercial de Anatoly Silva não é o local mais indicado”.14 13 www.terranova.pt publicado em 2004-06-02 14 www.terranova.pt publicado em 2004-11-21 21
  • 38. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração A aprendizagem da língua e os recenseamentos serão alguns dos sinais mais visíveis desta ligação entre culturas, mas outras existem que esbatem fronteiras e permitem falar da criação de uma nova realidade em grande aceleração e com múltiplas formas. Cita-se, como exemplo, a música, os produtos bancários e até os negócios na área da pesca e transformação do bacalhau15. No entanto, a abordagem política mereceu amplo destaque ao longo dos últimos quatro anos. “Depois da representação ucraniana foi a vez do consulado russo visitar a Associação de Apoio ao Imigrante. Cônsul e vice-cônsul da Rússia passaram este fim-de-semana pela sede da associação em São Bernardo. Ouvir os imigrantes e dar respostas às suas preocupações são as tarefas da associação que foi elogiada pelo vice-cônsul russo. “Estou muito contente com esta visita. Agradeço às autoridades pela recepção e penso que temos que organizar mais encontros destes para tentar resolver os problemas dos imigrantes”, disse o Vice- cônsul”.16 2. Influência social Parece consensual a existência de mais-valias no contacto entre populações portuguesas e imigrantes do Leste Europeu que vão para lá do mero contributo económico. Reconhecidos pela formação académica e por marcas enraizadas em hábitos transportados para Sul, os imigrantes vieram revolucionar e popularizar o ensino da música. Este espaço de aprendizagem foi popularizado e ganhou contornos de formação básica para centenas de crianças aveirenses que encontraram espaços como o da Sociedade Musical Santa Cecília, na freguesia de São Bernardo, um espaço de ensino de elevada qualidade sem que isso signifique segregar os alunos com falta de poder económico. O testemunho apresentado por António Maio, presidente da Sociedade Musical Santa Cecília, nas comemorações do centenário, em 2005, volta a realçar o salto qualitativo dado com a presença de professores especializados no ensino de música. 15 vide anexo VIII 16 www.terranova.pt publicado em 2003-03-17 22
  • 39. Capítulo II “Temos duas professoras de música de Leste e 12 nacionais. Presença significativa pela qualidade no desempenho da função. Uma mais valia indiscutível. Basta olharmos para os resultados escolares dos filhos dos imigrantes de Leste”.17 Os resultados técnicos são de elevada qualidade e as apresentações à comunidade resultam em espaços de convívio social onde não se distinguem as nacionalidades ou as origens. Acabam por funcionar em sistema comunitário dentro de um espaço que é partilhado e cujas conquistas acabam por ser sentidas como triunfo colectivo. E mais uma vez se nota que os espaços de interacção escapam à lógica centralizadora de que só as grandes cidades com conservatório ou com universidades que leccionam a disciplina de música podem ser espaços de aprendizagem. De alguma maneira, as freguesias ou as aldeias de uma determinada região, acabam por dar um exemplo do retorno à personalização do ensino feito com bases em acções de proximidade. E a presença de filhos de imigrantes junto de gerações mais novas acaba por produzir um efeito catalizador, uma vez que o nível elevado dos alunos traça novos paradigmas atraindo, de forma natural, o interesse e a competitividade entre alunos. O ensino da matemática funciona como um dos exemplos mais actuais. A capacidade dos alunos de famílias do Leste está a conseguir reunir vontades em torno de um objectivo comum e eleva a capacidade dos alunos portugueses. Realidade confirmada pela professora Teresa Marçal cujo trajecto profissional inclui uma Escola Básica 2.3 da freguesia de São Bernardo. “Como professores e tendo colegas com experiência no contactos com filhos de imigrantes do Leste posso dizer que os alunos demonstram mais empenho e mais interesse e os pais são exigentes na educação. Andam sempre próximos da escola. Quando o director tenta desculpabilizar qualquer situação, eles exigem. Os pais estão mais perto a escola”.18 Mas há outros exemplos no sector do ensino e em graus académicos superiores. Os centros de explicações da cidade de Aveiro passaram a incorporar docentes oriundos de países do Leste e os resultados acabam por contribuir para o prestígio da comunidade Académica. Numa disciplina como a matemática cujos resultados preocupam as Universidades Portuguesas, 17 vide anexo IV 18 vide anexo IV 23
  • 40. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração tornando-se por vezes a última barreira de um curso dependente de uma nota, é interessante perceber que os resultados com recurso a uma explicadora doutorada em matemática por uma universidade pública russa, contribui para o sucesso. Dos alunos da turma formada em 2005, todos conseguiram aprovação de acordo com as orientações dadas pela “explicadora”. Mera coincidência ou uma prova de que os resultados da interacção podem ser positivos? “A nossa escola dá apoio à disciplina de matemática em todos os anos. A professora colabora com os alunos universitários normalmente de 3 e 4 anos. Se for a nível linguístico, o contacto entre a professora e os alunos processa-se da mesma maneira como entre outro professor de origem portuguesa, canadiana ou outra qualquer. Possui já um nível vocabular bom que lhe permite a passagem da mensagem que quer transmitir a 100 %. Os alunos não têm qualquer problema em percebê-la e apreciam o seu método de ensino. Isto é o mais importante”. 19 Assim se cruzam duas vertentes decisivas na integração: a aprendizagem em conjunto com troca de experiências em ambiente escolar e a excelência das apresentações que juntam famílias portuguesas e imigrantes em espaços comuns. Serões familiares que ajudam a reforçar o espírito comunitário e que ajudam a criar hábitos culturais que não estavam enraizados em Portugal e que, de repente, entraram no dia-a-dia dos cidadãos. “No que me diz respeito, tenho alguns amigos dessa origem, bem como alunos, a quem ministro aulas de português. Gosto bastante de juntar os meus alunos das várias nacionalidades e realizar festas, durante as quais partilhamos experiências, costumes e hábitos alimentares, lendas e até anedotas”.20 E se os imigrantes aprendem a língua portuguesa, é cada vez mais frequente ver os portugueses atentos à língua Russa21 onde procuram reconhecer palavras e descobrir sentidos para as frases pronunciadas. Não raras vezes encontram-se públicos interessados em frequentar cursos de línguas e já não apenas os tradicionais cursos de inglês ou francês. E se a Universidade de Aveiro tem procurado criar condições para os estudos chineses, não esqueceu 19 vide anexo IV 20 videanexo IV 21 vide anexi I 24
  • 41. Capítulo II o russo e as associações cívicas parecem claramente voltadas para o ensino de línguas cuja base social parece ser o seu maior aliado. Muitas vezes não se trata de um qualquer interesse económico ditado pela importância dos mercados, mas tão-só pelo peso social que acarreta num determinado espaço de interacção. Pode não ser uma comunidade extensa mas tem “peso” na forma como se projecta. “A Associação de Apoio ao Imigrante de São Bernardo já iniciou as aulas em Russo. Alunos portugueses mostram interesse na disciplina. Querem aprender para melhor comunicar com os imigrantes do leste. Lyudmila é a professora que orienta os trabalhos. Lembra que há muitos profissionais interessados nesta língua. Temos funcionários da Loja do Cidadão, Segurança Social, agentes da Polícia Judiciária e professores, adianta a responsável pela classe. Nós estudamos cultura portuguesa e os portugueses mostram interesse na cultura Russa. Fazemos uma troca cultural, explica a professora de São Bernardo. José Caseiro, professor de línguas assume o lugar de aluno. Explica que se trata de um complemento na formação. Sou professor de línguas e gosto de línguas estrangeiras. Uma língua é sempre uma porta aberta para outra cultura, afirma José Caseiro. Helena é uma aluna interessada na língua e na cultura. Há pouco tempo esteve na Rússia em visita e as palavras que aprendeu em São Bernardo tornaram-se úteis. Já consegui entender alguma coisa e eles já me entenderam, disse aquela aluna do curso de Russo. O ano lectivo começa agora. Já estão inscritas 12 pessoas para iniciação. O ano passado terminou com 17 pessoas e 17 certificados”.22 Os exemplos sobre a forma como se posicionam os imigrantes e a interligação com outros sectores da sociedade são frequentes. Bastará uma pesquisa por diferentes áreas para se entender este esforço de conhecimento, compreensão e, por consequência, afirmação. 2.1 Barreira linguística A experiência de uma ex-juíza do Tribunal de Trabalho de Aveiro revela estes dados qualitativos. Sem especificar o número de processos ou as variantes assumidas em Tribunal, chama a atenção para uma realidade comum nas salas de audiências. O surgimento de 22 www.terranova.pt publicado em 2003-09-19 25
  • 42. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração litigantes com bons conhecimentos da língua portuguesa e os tradutores que são chamados a participar nas sessões apenas por uma questão de segurança. Segundo Teresa Madaíl (juíza) a comunicação é eficaz: “Os imigrantes de Leste fazem parte da realidade dos Tribunais como os povos de outras nacionalidades, ocupando posições diferentes, uns como litigantes e outros servindo de tradutores. A maioria dos imigrantes de Leste que em Tribunal solicita a intervenção de um intérprete, tem conhecimentos bastantes da Língua Portuguesa para perceber o que lhe é perguntado”23. A utilização de um tradutor não é mais que uma medida de segurança para confirmar ou validar as informações tal como são apreendidas pelos litigantes em ambiente de tribunal e, segundo depoimento recolhido, não atinge números elevados. É mais uma prova que confirma a já referida implantação quase silenciosa de uma comunidade nova com reflexos em diversos sectores da sociedade. Não se faz notar de forma ruidosa, nem pelos números maciços. Está intimamente ligada à preocupação de afirmação qualitativa cuja presença se torna cada vez mais familiar. E se os primeiros passos levantam a dificuldade da língua, a verdade é que esse problema é superado com relativa facilidade. 2.3 Potencial económico Ignorar a força das novas comunidades e a sua importância na economia regional seria um erro. Os bancos lançam produtos especiais para o envio de remessas e os imigrantes são “aliciados” com campanhas publicitárias que passam pelos espaços noticiosos destinados às comunidades do Leste. Aí são tratados de acordo com a importância dos mercados representados e pelas comunidades mais numerosas. Para as instituições bancárias começa a tornar-se tão importante gerir produtos para emigrantes portugueses em Paris ou nos Estados Unidos, como dar atenção a uma nova realidade social em território nacional. Jorge Portugal, responsável no BES pela área de novos residentes, salienta a importância do sector. 23 vide anexo IV 26
  • 43. Capítulo II “O segmento imigrante representa mais de 15% do crescimento do negócio de clientes particulares”.24 São inúmeros os exemplos, mas destacam-se os serviços bancários e o fornecimento de parabólicas colocadas no mercado a pensar nos imigrantes. São equipamentos com capacidade para captar canais do leste Europeu que mais cedo ou mais tarde serão alvo do interesse dos imigrantes. Mesmo que numa primeira fase os rendimentos não permitam “luxos” como a parabólica, é certo que a melhoria do nível de vida vai acabar por facilitar a retoma de ligações ao país de origem. Neste capítulo convém referenciar que há diferentes extractos sociais representados dentro de uma comunidade imigrante. Haverá pobres que vivem da mendicidade, assalariados com rendimentos que não permitem elevados níveis de consumo e uma elite composta por técnicos, médicos e professores universitários, devidamente integrados, que conseguem manter padrões de vida ao nível do estavam habituados: casa própria, carro e gosto por viagens. A vaga de imigrantes do leste levanta alguns problemas que, pela sua natureza, acaba por estigmatizar as próprias comunidades. Casos que apontam para redes de crime organizado, tráfico de seres humanos e mendicidade. Dados que os órgãos de comunicação relevam com frequência e que serão objecto de abordagem no capítulo III dedicado à imigração na agenda dos media25. A imigração do leste foi acompanhada pela instalação em Portugal de verdadeiras máfias russas e ucranianas que operam de forma violenta. São dados revelados pela imprensa portuguesa, com alguns exemplos evidenciados em anexo26, e que as forças de segurança estão obrigadas a considerar de forma cuidada. Os dados estatísticos apontam para o aumento da criminalidade organizada tipificada como violenta. A integração de portugueses nestas redes são um dado abordado nalguns relatórios sobre criminalidade e a morte de alguns imigrantes é associada à acção das máfias. 24 vide anexo IV 25 vide anexo V 26 vide anexo VI 27
  • 44. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração 3. Integração e legalidade Uma verdadeira rede de tráfico de mulheres do leste para a prostituição está estabelecida em toda a Europa, Portugal neste contexto não foge à regra. Muitas destas mulheres são trazidas por máfias russas, ucranianas, moldavas, romenas e até albanesas. A mendicidade em Portugal não é um fenómeno recente, mas a verdade é que conheceu um aumento muito significativo a partir dos anos 90 com a entrada de milhares de ciganos romenos. Estão neste momento espalhados por todo o país e operam em grupos organizados, utilizando com frequência crianças e deficientes. Como nota exemplificativa cita-se a referência ao anúncio da leitura de uma audiência referente a um caso de auxílio à imigração ilegal. “O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) realizou em Maio de 2003 uma operação, na zona metropolitana de Lisboa, que resultou no desmantelamento da ligação portuguesa de uma rede internacional de falsificação de documentos e auxílio à imigração ilegal, que operaria a partir do estrangeiro. À época foram apreendidas 7 viaturas, mais de 18 mil contos em dinheiro, telemóveis, material informático e apreendida documentação falsa e falsificada diversa. Foram detidos 11 cidadãos estrangeiros, dos quais dez ficaram em prisão preventiva. A investigação do SEF que levou às detenções em apreço durou cerca de um ano e teve início com a detecção de casos de documentação portuguesa falsa, no aeroporto de Lisboa”. 27 No contexto actual do espaço europeu e num mundo que tende cada vez mais para a globalização como aquele em que vivemos, os fluxos migratórios de milhões de homens e mulheres tornaram-se um fenómeno de estudo obrigatório. Assumindo a inevitabilidade da imigração, importa assegurar condições para que este fenómeno se processe em bases legais. É este o verdadeiro desafio da União Europeia e de cada um dos Estados membros - combater a imigração ilegal promovendo a imigração legal. A alteração da lei da imigração em Portugal, cujo diploma foi aprovado no Verão de 2006, em Conselho de Ministros, representa esta adequação aos novos tempos e os artigos merecem 27 www.acime.gov.pt 28
  • 45. Capítulo II discussão partidária, ao mesmo tempo que os dirigentes das ONG´s e o Alto Comissariado para as Imigrações e Minorias Étnicas acompanham o debate com interesse redobrado. 3.1 Reforma legal Parece hoje indiscutível tratar a imigração como realidade de factores positivos para o progresso do País. Tanto mais que é reconhecido o papel que desempenham no desenvolvimento económico e social. Em plena era da globalização seria irrealista pretender implementar uma política de imigração “zero”, difícil de defender no plano dos princípios. Mas irresponsável seria adoptar uma política despreocupada, não regulamentada, que, inevitavelmente, geraria exclusão social dos próprios imigrantes e, no limite, o aparecimento de ideologias inaceitáveis num Estado de direito, como recentemente ocorreu em alguns países europeus. Citando dados de um estudo do ACIME, a Terra Nova apresentava números referentes a um estudo sobre a tolerância dos portugueses em relação aos imigrantes. “Três em cada quatro portugueses estão contra a vinda de mais imigrantes para Portugal, embora desejem para os que actualmente vivem no país condições de vida idênticas às dos naturais. Estes dados fazem parte de um estudo promovido pelo Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME), através de uma sondagem feita à população portuguesa em Novembro de 2002 e abrangendo 1.419 pessoas (margem de erro de 2,6%). O estudo, feito pela Universidade Católica, abrangeu inquiridos de todas as regiões do país. De acordo com os primeiros resultados, divulgados pelo ACIME, a maioria dos portugueses responde negativamente à pergunta quot;concorda com a vinda de mais imigrantes para o nosso país?quot;, independentemente da origem: africana (74,4 por cento), brasileira (71,7) ou de Leste (73,4). Nesta matéria foram os inquiridos com graus de instrução mais baixos os que mais discordaram da vinda de novas vagas de imigrantes. Curioso é o facto de, apesar de apenas um quarto dos portugueses admitir mais fluxos de imigrantes, a quase totalidade (97,2%) considera que estes devem ter os mesmos direitos que os portugueses têm no estrangeiro. 29
  • 46. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração Em situação legal, actualmente, encontram-se em Portugal cerca de 450 mil imigrantes, representando cinco por cento da população portuguesa e dez por cento da população activa. De acordo com os resultados de um estudo realizado pelo Observatório nacional para a Imigração, aquelas 450 mil pessoas são oriundas de 179 países diferentes. 25 por cento são de países de Leste. Actualmente, 230 línguas diferentes são faladas em Portugal. No distrito de Aveiro registam-se 13 mil imigrantes».28 A solução para esta complexa conjuntura pressupõe a criação de mecanismos legais de gestão dos fluxos migratórios de forma realista através de um controlo rigoroso de entrada e permanência de cidadãos estrangeiros nos países de acolhimento, estabelecendo, ao mesmo tempo, condições para que aqueles que o façam nos termos da lei possam esperar uma integração real e humanista nestas sociedades. “O Centro Social Paroquial da Vera Cruz inaugurou, esta tarde, as novas instalações do Centro Local de Apoio ao Imigrante de Aveiro e do Gabinete de Acção Comunitária, situadas na avenida Lourenço Peixinho. O padre Rocha, presidente do Centro Social Paroquial da Vera Cruz, revelou que, hoje, os problemas e as necessidades da comunidade imigrante são diferentes e prendem-se com o afastamento das famílias: Quando vieram era mais acolhimento, saber o que queriam, entender a língua, roupa, alimentos, higiene e, depois, a procura de trabalho. Hoje a fase é diferente. A seguir ao trabalho veio o problema das famílias. Para um ucraniano, por exemplo, significa muito ter cá a família”.29 Portugal, consciente da sua história e do facto de durante muitos anos ter sido um país de emigração, enquanto signatário da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, deve assumir políticas de carácter humanista ao nível do acolhimento e da integração dos imigrantes que residem no nosso país. A política de imigração deve assentar em três eixos fundamentais: promoção da imigração legal em conformidade com as possibilidades reais do País, integração efectiva dos imigrantes e combate firme à imigração ilegal. Sabe-se que, por proposta legislativa do Governo português, se pretende revogar o regime das autorizações de permanência, permitindo que “as condições de estada em Portugal resultem 28 www.terranova.pt publicado em 2003-06-13 29 www.terranova.pt publicado em 2006-02-01 30
  • 47. Capítulo II apenas da concessão de vistos ou de autorizações de residência, sem prejuízo da protecção das expectativas criadas àqueles que atempadamente apresentaram os seus pedidos de autorização e daqueles que pretendam a sua prorrogação”. Outra das propostas é estabelecer um limite máximo anual de entradas em Portugal de acordo com pareceres do Instituto do Emprego e Formação Profissional, das Regiões Autónomas, da Inspecção-Geral do Trabalho, da Associação Nacional de Municípios Portugueses, das confederações patronais e sindicais e do Alto-Comissariado para a Imigração e as Minorias Étnicas. “A partir desses pareceres serão definidos critérios económicos e sociais na determinação das necessidades de mão-de-obra e da capacidade de acolhimento de cada região, assegurando a participação das autarquias locais em todo o processo. Admite-se também a consagração legal da possibilidade de os titulares de visto de estada temporária em casos devidamente fundamentados poderem exercer uma actividade profissional em termos similares aos do visto de trabalho, a definir no decreto regulamentar”.30 O novo quadro legislativo prevê um “novo tipo de visto de trabalho para o exercício de uma actividade de investigação científica ou actividade que pressuponha um conhecimento técnico altamente qualificado, o que facilitará a instalação em Portugal de cientistas e quadros técnicos superiores”. De igual modo serão reduzidos os períodos mínimos de residência necessários aos cidadãos estrangeiros para que possam obter autorização de residência permanente, permitindo a legalização de todos os imigrantes que se encontrem efectivamente integrados na sociedade portuguesa. Altera-se, ainda, o instituto do reagrupamento familiar, exigindo-se para a sua concessão uma real ligação do requerente ao País, nomeadamente a permanência legal durante um certo período de tempo, conforme o previsto em diversas decisões comunitárias, optando-se, contudo, pelo menor período de tempo definido nestas disposições, reforçando a visão humanista que Portugal tem defendido naquelas instâncias. Alterações maturadas em processos que envolveram, nalguns casos, os imigrantes de Leste e mobilizaram o apoio das associações de apoio ao imigrante. Mais um exemplo reportado pelo serviço noticioso em Russo da Terra Nova, com reflexo nas edições portuguesas. 30 www.acime.gov.pt 31
  • 48. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração “Inquérito aos filhos dos imigrantes para mudar a lei da obtenção da nacionalidade portuguesa. O projecto visa facilitar a naturalização de filhos de imigrantes nascidos em Portugal. A Associação de Apoio ao Imigrante, sedeada em São Bernardo, vai colaborar nesta iniciativa a pedido da Associação para a Cooperação e Desenvolvimento. Segundo António Baptista, os interessados deverão dirigir-se às instalações da Junta de São Bernardo. Fomos solicitados para a colocação de um inquérito junto da população imigrante, mais propriamente para os filhos de imigrantes nascidos em Portugal, para a possibilidade de ser apresentado na Assembleia da República de alteração da lei da nacionalidade, explicou”.31 Por fim, sublinhe-se o desejo do Governo em manter o acesso à protecção social, à educação e aos cuidados de saúde que a comunidade imigrante actualmente dispõe no nosso país. 3.2 Acolhimento sustentado O combate à imigração ilegal exige harmonização de políticas nacionais e europeias no que respeita ao controlo dos fluxos migratórios. Exige agilidade nos processos de afastamento do espaço comunitário de pessoas ilegais e este processo implica um forte investimento ao nível dos meios de controlo do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e às forças de segurança para o cumprimento efectivo e atempado das decisões dos tribunais. Consagra-se, ainda, um conjunto de alterações que visam desburocratizar os procedimentos de actuação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, para além da previsão de um regime sancionatório criminal mais adequado a prevenir e reprimir os actos ilícitos relacionados com a imigração clandestina e com a exploração de mão-de-obra dos estrangeiros em situação não regularizada. De mais-valia cultural e económica, a imigração deve ser olhada com rigor científico para garantir melhor integração e um apoio social capaz de evitar a degradação. Só assim será capaz de criar novos traços culturais de forma harmoniosa. Tudo o que não obedecer a esta regra criará zonas de risco e até de possível descontrolo social. Como factores de sustentabilidade, o Governo por intermédio de diferentes organismos prevê a criação de mecanismos para apoiar a integração de imigrantes. 31 www.terranova.pt publicado em 2005-01-21 32
  • 49. Capítulo II O programa “Portugal acolhe” integra-se nestas acções visando facilitar à população imigrante residente em Portugal o acesso a um conjunto de conhecimentos, indispensáveis a uma inserção de pleno direito na sociedade portuguesa. Visa promover, junto dos trabalhadores imigrantes, a aquisição de competências necessárias à sua inserção na sociedade portuguesa e, em particular, no mercado de trabalho, através, designadamente, de uma formação em Português Básico e em Cidadania. Representa formação profissional contínua que promove a capacidade de expressão e compreensão na língua portuguesa e o conhecimento dos direitos básicos. O cidadão imigrante vai desenvolver competências no domínio da língua portuguesa numa acção que resulta da parceria entre IEFP e a actual Direcção-Geral de Formação Vocacional. O curso de Cidadania visa promover o exercício de uma cidadania activa, nomeadamente através de uma sensibilização para os direitos e deveres inerentes à inserção na sociedade portuguesa. No final dos dois módulos haverá certificado de Formação Profissional. Podem participar imigrantes legalizados. A Associação Industrial do Distrito de Aveiro também segue um plano de promoção das competências de cidadãos do Leste com forte procura. Eliana Silva, responsável pela área, confirma uma aposta na mão-de-obra de imigrantes. “Neste momento sou Técnica Responsável por um projecto que é destinado aos imigrantes de Leste (projecto FIC). Realizo Balanço de Competências, reencaminho para formação de Português e no final faço o Plano Pessoal e profissional do Imigrante. Procuro passar informação relativa ao Projecto em si, os imigrantes é que me fornecem informação. E tento ajudar dando informações que me são solicitadas, cursos formação, emprego… Acho um povo muito dedicado, gosta de apreender mais e mais, simpático e inteligente. Muito qualificado”. 32 3.3 Criticas ao processo legislativo 32 vide anexo IV 33
  • 50. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração Mas as mudanças legislativas continuam a gerar pouco consenso e algumas desconfianças. Em entrevista publicada no Correio da Manhã, edição de dia 3 de Setembro de 2006, o director da Obra Católica Portuguesa de Migrações, padre Rui Pedro, criticava os excessos burocráticos da nova lei de imigração. “A Igreja acolhe bem algumas alterações, nomeadamente o facto de se voltar a contemplar a participação das ONG, sindicatos e associações de imigrantes na prova do vínculo laboral de imigrantes que são seres explorados. Essa possibilidade, que existia em 2000, foi retirada na lei seguinte e agora volta a ser consagrada e permite-nos colaborar na integração e regularização de imigrantes. A admissão dos imigrantes candidatos a trabalho em Portugal é uma das questões mais problemáticas. O Artigo 59 sobre a obtenção de visto de residência para trabalhar por conta de outrem permanece um obstáculo que os imigrantes terão de ultrapassar. Devido à burocracia que implica e à impossibilidade de o Governo cumprir tudo o que está escrito a respeito aos consulados, do IEFP no que respeita às vagas de trabalho e à satisfação das necessidades. Diz-nos a experiência que este é um caminho que dificulta a legalização. Esta lei não será capaz de garantir a admissão e a abertura de canais legais expeditos e acessíveis a quem queira imigrar para Portugal. Há redes e intermediários que poderão continuar a explorar e a ser mais rápidos do que o Estado na colocação de pessoas no mercado informal. Se ele existe é porque há necessidades.” Medidas que mereceram ainda uma referência crítica por parte a Plataforma para das Estruturas Representativas das Comunidades de Imigrantes em Portugal que sugere alterações à Lei da Imigração ao nível da regularização dos indocumentados e ter em conta as necessidades reais dos empregadores. Pedem a exclusão do sistema de quotas e da carga burocrática que tal sistema acarreta. Outro instrumento importante será o Plano para a Integração dos Imigrantes que foi colocado em discussão pública no final de 2006. Prevê mais fácil acesso a novos produtos bancários, certificação mais rápida de habilitações e serviços de tradução em todos os momentos de interacção com o sistema judicial. 34
  • 51. Capítulo II Este documento envolve a participação de 13 Ministérios e propõe 123 medidas em áreas sectoriais: “fiscalização laboral e apoio ao sindicalismo”; “facilitar crédito para compra de habitação”; “avaliar e promover o acesso ao Serviço Nacional de Saúde”; “formar professores e equilibrar turmas”, “bolsa de tradutores para sistema judicial”. 35
  • 52.
  • 53. Capitulo III Capitulo III 1. Imigração na agenda dos Media Faz todo o sentido perceber como entra na agenda dos “media” a questão da imigração. Segundo Marini (2006), os modelos teóricos afirmam a existência de uma agenda que pode ser construída a partir da influência politica e da importância que determinado tema tem nas estratégias de poder mas também pela própria interacção cultural dos grupos. Sabe-se como as guerras, os conflitos e as agitações mobilizam as agendas. Farão parte do interesse do público mas também de uma chamada de atenção para o público perceber as movimentações do espaço em que habitam. Este agendamento está intimamente ligado a essa acção política que pode estar ligada à conquista ou à manutenção do poder. E encerra visões políticas muito diferentes. No caso concreto da imigração, não se trata de uma questão consensual. Uns defendem-na como necessidade, direito, essencial à economia ou fundamental na estabilidade. Outros criticam-na como realidade que vai cercear espaços dos nativos de determinado país. Em Portugal esta foi, nos anos 90, uma realidade que entrou na rede social e que, nos primeiros anos de 2000, entrou na agenda dos “media” por via das agendas políticas de partidos de direita e esquerda. Foram os motores da colocação do tema no centro de um debate político que, porventura, já existira, em momentos específicos, com comunidades ciganas e outras. Até com os próprios emigrantes. Uma cultura política que em Portugal acaba por balizar-se muito entre Direita e Esquerda. A verdade é que o fenómeno não se esgota nos partidos e ressalta imediatamente para grupos de pressão. Podem ser associações culturais, movimentos cívicos, agentes de poder local, movimentos religiosos ou outros. E, à escala local, serão estes os motores da colocação do tema na agenda mediática como a chegada aos meios de comunicação. Refere-se o exemplo local porque, mais uma vez, este é o tema central deste projecto de estudo. Quando os movimentos migratórios começaram a ser mais conhecidos, rapidamente se passaram a conhecer associações de apoio aos imigrantes, sectores específicos de apoio aos imigrantes dentro de movimentos da Igreja e, também, espaços de intervenção ligados aos serviços públicos descentralizados. 37
  • 54. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração Governo Civil, Câmaras Municipais, Juntas de Freguesia, forças policiais e outros organismos passaram a incluir o fenómeno nas suas próprias agendas, transportando depois o fluxo para as redacções. Foi um movimento incrementado pela criação dos gabinetes de comunicação nestes organismos que viviam até aos anos noventa sem estratégias de comunicação ou estratégias que assentavam sobretudo no contacto directo. Apenas nesses momentos de contacto existiria alguma informação específica sobre determinados sectores de actividade e a influência dos imigrantes era mais uma peça neste puzzle. O advento dos gabinetes de comunicação e a valorização social destes agentes impulsionou o fluxo de informações que viria a chegar à constituição de serviços de informação fortes. O recrutamento de antigos profissionais do sector dos media tornou evidente que a agenda estava a ser condicionada. E não era fácil resistir a esta realidade. Os inquéritos feitos sobre o interesse da população em assuntos como a criminalidade rapidamente deu visibilidade ao tema imigração, uma vez que, nalguns casos, as vítimas ou os arguidos eram imigrantes e assim eram identificados ao ponto do tema ter gerado algumas das discussões mais acesas sobre a questão. A percepção do jornalista obriga a ter um olhar sobre o acontecimento e sobre a mediação. Isso significa que a narração do acontecimento encerra subjectividade. Autores recordam mesmo a influência de um ponto de vista na criação de uma explosão de acontecimentos a partir um facto. “O acontecimento reportado na sequência da actualidade é, antes de tudo, uma história sobre esse mesmo acontecimento.” V. Morin, 1976: 31) Essa participação do jornalista na intermediação torna-se, em si, outro acontecimento ou no acontecimento. “A palavra torna-se, ela mesmo, o acontecimento.” dizia Roland Barthes (Barthes, 1968: 108) O acontecimento acaba por ficar em segundo plano e tende a cair no esquecimento. O que é narrado existe e o que não é narrado tem dificuldade para existir aos olhos do público. As histórias surgem como fait-divers carentes de explicação e contextualização. Tornam-se objectos de análise, parte de um todo importante na recomposição da narração do acontecimento. 38
  • 55. Capitulo III 1.1 Notícias sobre imigração - estudo Um estudo realizado pelo OBERCOM (Observatório da Comunicação) para o ACIME33 com o apoio da Fundação para a Ciência e Tecnologia conseguiu retractar algumas das características do real produzido sobre imigração na imprensa portuguesa. Foram analisadas cerca de 4000 notícias, entre jornais e revistas de distribuição nacional e regional num período entre 1 de Janeiro de 2001 e 31 de Março de 2002. Em termos gerais, o estudo do ORBECOM conclui que os imigrantes de Leste são tema preferencial em 30% das notícias. Facto que surge associado ao calendário do estudo que se relaciona com a vaga de imigrantes de Leste. Visibilidade garantida pelo número de autorizações de residência. Os delitos figuram entre os temas mais tratados (12,2%), seguido pelo acolhimento (8,5%), “Convivência” (5,6%) e “Exploração e máfias” (5,6%), “Luta contra as máfias, exploração e tráfico ilegal” (5,1%). Na imprensa regional o tema que reúne maior atenção por parte da imprensa é o do “Acolhimento” (13,4%), seguido do ensino de cursos de português (8,3%); as notícias sobre os “Delitos” surgem em terceiro lugar com 7,3%; “Convivência” e “Exploração e máfias” (ambas como 6,6%) são seguidas de perto pelos temas relacionados com a “Cultura“ dos imigrantes e minorias étnicas (6,4%). Imigrantes e Imigrantes de Leste são os protagonistas do estudo assim definidos na realidade apresentada pelos meios de comunicação mas, no caso dos imigrantes de Leste, a tipologia é associada às notícias sobre “Delitos”. Quando o tema é “habitação, realojamento, e más condições de vida” os imigrantes do Leste surgem como segundos protagonistas logo após a comunidade cigana. Os acidentes de trabalho surgem associados a Imigrantes de Leste. Outro dos pontos interessantes do estudo coordenado por Francisco Rui Cádima, publicado no site do ACIME, é a relação entre marcadores temáticos e fontes. Os delitos surgem agregados ao Poder Judicial, Policial e Executivo. Quando se fala de “pessoas” e “acolhimento” os principais referentes são os organismos sociais, os poderes executivos locais e os meios de comunicação social. Organismos sociais e poder local estão, ainda, intimamente ligados a temas como habitação, convivência, associativismo e cultura. No caso de temas como o 33 www.acime.gov.pt 39
  • 56. Notícias em Russo para imigrantes: Influências no processo de integração debate sobre imigração associados a fenómenos como racismo e xenofobia está a Comunicação Social ainda que em conjunto com outras fontes. Dados importantes e que no capítulo dedicado à experiência da Rádio Terra Nova ganham expressão prática, mormente por se tratar de uma abordagem qualitativa. Uma análise global do estudo confirma que os temas considerados como avanços regista 43,2% das notícias, enquanto questões classificadas como dificuldades surgem com 40,09% desse universo. A verdade é que esses valores, apesar de próximos sofrem inversão quando falamos da imprensa nacional. Aí, as dificuldades ocupam 45% do universo noticioso, enquanto os “avanços” ocupam 38%. A imprensa regional aposta nas notícias que abordam os “avanços” da integração com um total de 55% do universo em estudo. No comparativo quanto aos temas abordados, a imprensa nacional destaca os delitos com 14,5% do universo, seguido do acolhimento com 6,3%, enquanto a imprensa local aposta no tema acolhimento com 13% da produção de notícias, seguindo-se a educação (ensino do Português) com 8,3%. Os imigrantes surgem associados aos delitos num quadro que não contextualiza a criminalidade em Portugal, num processo que acaba por contribuir para associar o fenómeno aos “estrangeiros”. A diferenciação étnica acaba por ajudar a reportar a notícia. Afinal, a notícia reporta um acontecimento relevante ou é notícia porque o facto jornalístico nasce da presença de um “não Português” como actor. O quadro agrava-se no caso dos imigrantes de Leste quando surgem como marcadores referenciais em notícias sobre “delitos”. Quando a notícia realça as condições de vida, em particular falta de alojamento e dificuldades de convivência, aí surgem os referenciais aos imigrantes do Leste e comunidade cigana. Acidentes de trabalho e exploração relacionada com máfias são temas associados aos Imigrantes de Leste mas também aos africanos e brasileiros. São sinais que levantam interrogações sobre a conduta dos jornalistas e sobre a dicotomia entre maioria e minoria. O uso de expressões que reforçam modelos de análise acabam por agravar o quadro de análise social e os media deixam fugir a oportunidade de levantar novos temas no campo da imigração. 40
  • 57. Capitulo III 1.2 Meios de comunicação multiculturais O Fórum Barcelona 2004 debateu estas questões para analisar o tratamento dispensado pelos órgãos de informação aos temas da imigração. Em 2004, na cidade de Barcelona, Estrella Rodriguez Pardo, directora-geral para a integração de imigrantes no Ministério do Trabalho e dos Assuntos Sociais do Governo Espanhol declarava que “as atitudes direccionadas aos imigrantes estavam muito ligadas à imagem dada dos imigrantes nos media”. Acrescentava que “era necessário desenvolver esforços no sentido de assegurar que os órgãos de comunicação conseguiam empregar gente de outras culturas para alertar as consciências para estas questões, para ilustrar um modelo de sociedade multicultural e para desenvolver códigos de deontologia”. Participantes no fórum deixavam dados sobre estudos dedicados à imigração realçando a forma como os meios tratam os históricos imigrantes europeus (italianos, alemães e portugueses) associados a palavras como cultura, inovação e trabalho, os imigrantes de outras latitudes (leste) cuja identificação ressalta imediatamente para crime, intolerância e imigrantes de países da América do Sul que, usualmente, são citados a partir de relatórios de organizações não governamentais. As palavras utilizadas são outro foco de estudo ao ponto de concluir que se trata de conotações muitas vezes de sentido negativo. As diferentes intervenções protagonizadas por gente de todo o mundo alertaram para a necessidade de criar códigos de regulação ética e defenderam aposta na educação como forma de lutar contra a discriminação. Recordava-se no Fórum de Barcelona, os diferentes tratamentos dados, por exemplo, num caso de tiroteio entre imigrantes que acabou abordado de forma ligeira quando comparado com temas como a doença das vacas loucas, o plano hidrológico nacional e o transporte de alta velocidade. A forma como os assuntos são tratados é quase tão importantes como os assuntos em si para o leitor, ouvinte ou telespectador. E os estudos apresentados neste encontro de Barcelona concluíam que as notícias sobre imigrantes são, na esmagadora maioria das vezes, negativas e os artigos estabeleciam uma relação directa entre a origem dos imigrantes e os factos relatados. Outro estudo apresentava a colocação de notícias por secção conforme os meios. Os jornais apostavam na emissão das 41