Este documento apresenta um trabalho de conclusão de curso sobre ética, moral e deontologia jornalística em tempos de cibercultura. O trabalho analisa a produção informativa originada de blogs, discutindo os processos de apuração, seleção e apresentação de notícias nesse meio. Faz um estudo de caso de um blog específico para ilustrar esses processos e reflexões.
1. UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA/UNIPAMPA
COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO: JORNALISMO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
DEISE ELENICE KOBER JESKE
ÉTICA, MORAL E DEONTOLOGIA
JORNALÍSTICA EM TEMPOS DE
CIBERCULURA
UM ESTUDO DE CASO SOBRE A BLOGOSFERA
E A IMPORTÂNCIA DO NEWSMAKING
SÃO BORJA
2010
2. 2
DEISE ELENICE KOBER JESKE
ÉTICA, MORAL E DEONTOLOGIA
JORNALÍSTICA EM TEMPOS DE CIBERCULTURA:
UM ESTUDO DE CASO SOBRE A BLOGOSFERA E A IMPORTÂNCIA DO
NEWSMAKING.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Comunicação Social da
Universidade Federal do Pampa, como
requisito parcial para a obtenção do Título de
Bacharel em Jornalismo.
Orientador: Prof. Ms. Marco Bonito
São Borja
2010
3. 3
DEISE ELENICE KOBER JESKE
ÉTICA, MORAL E DEONTOLOGIA
JORNALÍSTICA EM TEMPOS DE CIBERCULTURA:
UM ESTUDO DE CASO SOBRE A BLOGOSFERA E A IMPORTÂNCIA DO
NEWSMAKING.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Comunicação Social da
Universidade Federal do Pampa, como
requisito parcial para a obtenção do Título de
Bacharel em Jornalismo.
Monografia defendida e aprovada em:____/_____/2010
Banca examinadora:
__________________________________________________________________
Prof. Ms. Marco Bonito
Orientador
Comunicação Social/Hab.: Jornalismo – Unipampa
___________________________________________________________________
Profª. Ms. Mara Ribeiro
Comunicação Social/Hab.: Jornalismo – Unipampa
____________________________________________________________________
Profª. Drª. Michele Negrini
Comunicação Social/Hab.: Jornalismo – UFPel
4. 4
Dedico este Trabalho de Conclusão de Curso
aos meus amados pais, maiores incentivadores
e fontes inesgotáveis de apoio, amor e
compreensão.
5. 5
AGRADECIMENTO
Ao professor Marco Bonito, pela orientação, dando-me liberdade na produção e rigor
metodológico.
À Professora Mara Ribeiro, quem fez com que eu me interessasse pelo assunto.
Á todas as pessoas que, direta ou indiretamente contribuíram para a realização desta pesquisa.
6. 6
“Não existe uma ética específica do jornalista:
sua ética é a mesma do cidadão”.
Cláudio Abramo.
7. 7
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo discutir a ética, a moral e a deontologia jornalísticas a
partir da produção informativa, jornalística e comunicacional originários dos weblogs. Uma
vez que a comunicação blogueira, enquanto comunicação digital, só se tornou possível graças
aos avanços da internet e dos estudos sobre a cibercultura, analisaremos a ética e a moral em
tempos de cibercultura, visto que a blogosfera situa-se no ciberespaço. Proporemos analisar
também a importância do Newsmaking e do Gatekeeper neste processo de produção
informativa proveniente dos weblogs, ensejando examinar os cuidados éticos nesses
processos. O estudo de caso que se fará pretende discutir como a produção jornalística
convencional percebe a importância do jornalismo participativo que se legitima nos weblogs.
Palavras-chave: Ética. Moral. Deontologia jornalística. Cibercultura. Ciberespaço.
Blogosfera. Weblogs. Newsmaking. Gatekeeper.
8. 8
ABSTRACT
This paper aims to discuss ethics, morals and ethics news from the production information,
news and communications originating in the weblogs. Since the communication blogger,
while digital communication was only possible thanks to advances in Internet and
cyberculture studies, we analyze the ethics and morality in times of cyberculture, since the
blogosphere lies in cyberspace. Propose to analyze the importance of Newsmaking and
Gatekeeper in the process of production information from blogs, occasioning examine ethical
guidelines in such cases. The case study that will want to discuss how conventional news
production realizes the importance of participatory journalism that legitimates itself in
weblogs.
Keywords: Ethics. Moral. Journalistic ethics. Cyberculture. Cyberspace. Blogosphere.
Weblogs. Newsmaking. Gatekeeper.
9. 9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Blog do Políbio Braga – parte 1...............................................................................49
Figura 2: Blog do Políbio Braga – parte 2...............................................................................49
Figura 3: Blog do Políbio Braga – parte 3...............................................................................50
Figura 4: Blog do Políbio Braga – parte 4...............................................................................50
Figura 5: Blog do Políbio Braga – parte 5...............................................................................51
10. 10
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Percentual de notícias diárias por tema.....................................................................55
Tabela 2: Análise dos critérios de noticiabilidade.....................................................................55
11. 11
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 12
2. JUSTIFICATIVA .................................................................................................................. 13
3. OBJETIVOS ......................................................................................................................... 14
4. METODOLOGIA ................................................................................................................ 14
CAPÍTULO I ............................................................................................................................ 16
ÉTICA ...................................................................................................................................... 16
1.1 O Princípio da ética e da moral .......................................................................................... 17
1.2 Desvios éticos e morais ...................................................................................................... 21
1.3 Ética no Jornalismo ............................................................................................................ 24
CAPÍTULO II ........................................................................................................................... 29
JORNALISMO EM TEMPOS DE CIBERCULTURA ........................................................... 29
2.1 Cibercultura ........................................................................................................................ 32
2.2 A Blogosfera ....................................................................................................................... 35
2.3 Modelos e características do jornalismo digital ................................................................. 42
CAPÍTULO III ......................................................................................................................... 46
ANÁLISE DE CASO DO WEBLOG “BLOG DO POLÍBIO BRAGA” ................................ 46
3.1 O Newsmaking ................................................................................................................... 51
3.2 O Gatekeeper ...................................................................................................................... 56
3.3 Desvios ciber-éticos ............................................................................................................ 58
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................... 61
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................................64
12. 12
1. INTRODUÇÃO
Ao falarmos da importância da comunicação e o acesso às informações, uma vez que
estamos em meio aos avanços tecnológicos que possibilitam a comunicação interativa,
estamos falando também de democratizar a forma de como produzimos informações.
Independente do meio que procuramos informação há sempre a concepção de que essa seja
jornalística. Dessa forma, remetemos essa noção de “notícia verdadeira” aos valores e práticas
morais que fazem do jornalismo convencional uma informação apurável e credível. Conforme
Gomes (2004),
...a moral caminhou em direção mais específica ao ser vinculada ao conjunto de
valores que norteiam uma sociedade ou determinado segmento social. A ética
também assume por vezes esse significado, como é o caso da referência freqüente à
ética do jornalismo. (GOMES, 2004, p. 17)
Como podemos ver, há uma preocupação em relação ao comportamento profissional
do jornalista. Independentemente do media, seja ela impressa, radiofônica, televisiva ou
digital, o jornalista tem seus valores e modus operandi estabelecidos por normas de condutas.
Nos últimos anos, com o surgimento da internet, uma ferramenta tornou possível a publicação
de informações e divulgação rápida no ciberespaço, tornando o processo de escrita e
divulgação de textos e demais conteúdos de forma simultânea e interativa. Esta ferramenta
chama-se weblog.
De acordo com André Lemos apud Recuero (online, s.d.) “ciberdiários, webdiários ou
weblogs são práticas contemporâneas de escrita online, onde usuários comuns escrevem sobre
suas vidas privadas, sobre suas áreas de interesse pessoais ou sobre outros aspectos da cultura
contemporânea”.1
Segundo SILVA (2003), os weblogs tornaram-se um dos meios mais utilizados na rede
para a difusão de informações, notícias e conteúdos de caráter jornalístico:
O weblog se tornou então um dos formatos de publicação mais populares na web,
que conseguiu fomentar uma cultura própria em relação a outros sítios, mecanismos
e subsistemas incorporados que facilitam a criação das páginas e o estabelecimento
de processos comunicacionais e interativos entre indivíduos e pequenos grupos.
(SILVA, 2003. pág. 04)
Nesse sentido, analisaremos o comportamento moral dos blogueiros no processo de
captura da informação, apuração, edição e publicação (no caso dos blogs, a publicação
chama-se postagem) de conteúdo. Essa variedade de sítios proporciona uma série de
problemáticas no que diz respeito ao processo de apuração dessas informações. Vê-se então, a
1
Disponível em: <http://www.bocc.uff.br/pag/recuero-raquel-war-blogs.pdf > Acessado em 29 Jun 2010
13. 13
necessidade de analisar o lugar da moral nesse emaranhado de informações que muitas vezes
potencializam o trabalho da mídia convencional.
Dessa forma, proporemos analisar as potencialidades dessa nova ferramenta, como
fomentadora de conteúdo noticioso – aliado ao jornalismo convencional, ou uma ameaça para
o exercício do jornalismo tradicional.
2. JUSTIFICATIVA
Estudar as manifestações informativas na era da internet exige compreender o
fenômeno dos blogs. A rede mundial de computadores é o canal onde todos podem interagir,
participar ativa (autor) e passivamente (leitor), publicar e produzir conteúdos. Os blogs
surgiram como principal ferramenta deste evento, democratizando o acesso à informação e
possibilitando para muitos o acesso à comunicação, unindo os vários cantos do planeta com
rapidez e facilidade. Mas que informação é essa que todos têm acesso rápido e imediato? A
informação em quantidade também ganha em qualidade?
Por isso, o lugar da moral no newsmaking2 deve ser observado e analisado como
baluarte de todo processo de produção de notícias. Atualmente, mais de 70 mil blogs são
criados diariamente e acredita-se que um em cada quatro internautas brasileiros recorra aos
blogs todos os dias em busca de informação e atualização3. Dessa forma, estudar as intenções
na publicação da mensagem e a responsabilidade moral são necessárias, de forma que
possibilitemos refletir se os blogs possam possibilitar mais uma forma de fazer jornalismo
ético de forma independente ou se essa nova ferramenta representa uma crítica ao jornalismo
convencional.
1.1 HIPÓTESES RELACIONADAS
Para o desenvolvimento deste trabalho definimos algumas hipóteses que pudessem nos
orientar e contribuir para a resolução do problema proposto, são elas:
2
Processo que também se conhece por rotinas de produção. As fases principais de produção cotidiana de
informação, as que podem ser encontradas em todos os aparatos e incidem principalmente na qualidade da
informação. Essas fases são três: a coleta, a seleção, a apresentação. Cada uma delas dá lugar a rotinas e
procedimentos de trabalhos articulados, dos quais são tratados apenas alguns aspectos significativos. In: WOLF,
Mauro. Teorias das comunicações de massa. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
3
HEWITT, Hugh. Blog: Entenda a revolução que vai mudar seu mundo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson,
2007.
14. 14
- Serão os blogs aliados do jornalismo convencional, exercendo papel de continuidade,
abastecendo-se deste para garantir a sua própria existência?
- Os blogs funcionam como extensões que negligenciam os processos de apuração e
edição do jornalismo tradicional e por isso são uma crítica ao jornalismo convencional?
3. OBJETIVOS
3.1 GERAL
- Observar o lugar da moral no processo de publicação blogueira, situados em âmbito
cibercultural e analisado sob o ponto de vista dos estudos relacionados ao newsmaking.
Analisar como acontecem as etapas de apuração da informação e se há esse processo;
3.2 ESPECÍFICOS
- Perceber as potencialidades dessa nova ferramenta como fomentadora de conteúdo
noticioso aliado ao jornalismo convencional, observando os códigos morais e éticos;
- Compreender de que forma as postagens em blogs interagem com o jornalismo
convencional e se há essa interação;
- Colaborar com o campo da comunicação social e do jornalismo em âmbito científico.
4. METODOLOGIA
Etimologicamente, método (mete= através de, odos= caminhos) é o caminho através
do qual se chega a um fim ou objetivo. Para produzir o presente trabalho de conclusão de
curso, o método utilizado será o estudo de caso, que me permitirá estudar com mais precisão e
objetividade as propostas dessa pesquisa.
Estudo de caso, segundo Gil (2007, pág. 54) “consiste no estudo profundo e exaustivo
de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento.” Por
isso, escolheremos um objeto de estudo, que será um blog, definido no corpo do trabalho.
5. RESULTADOS E REPERCUSSÕES ESPERADOS
Levando em consideração os objetivos e hipóteses da pesquisa, as escolhas
15. 15
metodológicas e bibliográficas, esperamos contribuir de forma significativa na compreensão
dos novos espaços da configuração jornalística. Contribuir também para o campo da
comunicação e do jornalismo, a fim de colaborar na produção de novos espaços de
manifestações informativas com procedimentos éticos e morais que levem em conta a
responsabilidade na divulgação de uma informação, em um espaço plural, democrático e
interativo chamado ciberespaço.
6. CRONOGRAMA
ATIVIDADE Abril Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
Pesquisa bibliográfica x
Leituras iniciais x x
Preparação pré-projeto x x
Entrega pré-projeto x
Leituras concentradas x x x x
Produção monográfica x x x x
Entrega de TCC x
7. OUTROS PROJETOS E FINANCIAMENTOS
Não existem projetos relacionados ao presente trabalho, como também não existem
financiamentos para o presente projeto.
16. 16
CAPÍTULO I
ÉTICA
Neste capítulo, trataremos das noções de ética, moral e códigos de conduta, ou
“prescrições morais”. Ao tratar da ética, abordaremos o sentido histórico e filosófico do
termo, discutindo como a ética está inserida no comportamento humano. Na discussão sobre
moral, definiremos quais são as distinções dadas ao que se denomina por moral ou imoral,
juntamente com as problemáticas que se criam em torno de tais alcunhas. Ao passo que essas
denominações também acompanham as decisões dos indivíduos, que muitas vezes
denominam por “ética” àquilo que se encontra no moral. Dessa forma, aproximaremos os
estudos sobre moral das convenções prescritivas que norteiam o comportamento humano: os
códigos, as leis e as normativas.
Como veremos, falar de moral implica entender que existem díspares entendimentos,
tais como moral, moralidade e comportamento, uma vez que, moral implica também noção de
valores. Deste modo, articularemos tais concepções do moral com a ciência em que se
encontra: a comunicação e a aplicação de códigos de conduta na atuação do profissional de
jornalismo. Para tanto, utilizaremos a distinção entre ética e moral para elucidar o conceito de
“código de ética”.
Os estudos que examinam o comportamento humano desenvolvem-se em uma ciência
que se chama ética. Segundo Adolfo Sánchez Vázquez (2010, pág. 23), “A ética é a teoria ou
ciência do comportamento moral dos homens em sociedade”. Vázquez sublinha, ainda, a
necessidade de se encarar a ética com um caráter científico: “isto é, corresponde à necessidade
de uma abordagem científica dos problemas morais” (idem).
No entanto, a ética vem também sofrendo alterações conceituais, como aponta José
Trasferetti (2007, pág. 48): “o termo ética, como o qual indicamos a reflexão ou o saber sobre
o ethos, tem origem grega. Aristóteles, responsável pela introdução desse termo na filosofia
ocidental, entendia que era desnecessário demonstrar a existência do ethos, pois era evidente”.
Para o pensador, o homem se revela não somente na natureza, mas igualmente no exercício
humano, ou seja, no ethos, compreendido como hábitos, costumes, instituições, produzidos
pela sociedade (TRASFERETTI, 2007, pág. 48).
É comum entender por ética o conjunto de tomadas de decisões que parte do princípio
do bem ou do bom, do mal ou do mau, do certo para o errado, pois para Trasferetti (2007, pág.
49) “o ser humano vive sempre em tensão, nessa busca perene entre o conhecimento do bem e
17. 17
a tentativa de vivenciá-lo em seu cotidiano pessoal e social”.
Desde a Antiguidade às sociedades mais complexas até a contemporânea, estudar a
ética implica entender que o homem é movido por escolhas, e a reflexão que se faz sobre elas
é que está a razão de ser a ética. De acordo com Jung Mo Sung e Josué Cândido da Silva “De
modo geral é comum usar o conceito de ética e moral como sinônimos ou, quando muito, a
ética é definida como o conjunto de práticas morais de uma determinada sociedade, ou então,
os princípios que norteiam estas práticas.” (2007, pág. 13). Sobre essa aproximação de
significados, Vázquez (2010, pág. 24) explica assim: “ética e moral se relacionam, pois como
uma ciência específica e seu objeto”. Diferencia ainda, a teoria do objeto de estudo: “a ética
não é a moral e, portanto, não pode ser reduzida a um conjunto de normas e prescrições; sua
missão é explicar a moral efetiva e, neste sentido, pode influir na própria moral” (idem).
Nesse sentido, vê-se a necessidade de diferenciar as peculiaridades de cada conceito,
de modo que possamos ampliar as características de cada idéia.
1.1 O Princípio da ética e da moral
Historicamente, ética e moral possuíam significados etimológicos semelhantes,
indicando uma conexão entre ambos os termos, sendo que o primeiro refere-se à postura
individual do homem e o segundo a uma maneira de ser, ou costume. De acordo com Karam
(1997, pág. 33) “Em sua origem, ética e moral tinham significado quase idêntico, o de
caráter, costume, maneira de ser, sendo que o primeiro termo é derivado do grego ethos,
enquanto o segundo é originário do latim moralis”. Nesse sentido, Vázquez (2010, pág. 24) é
ainda mais didático:
Certamente, moral vem do latim mos ou mores, “costume” ou “costumes”, no
sentido de conjunto de normas ou regras adquiridas por hábito. A moral se refere
assim, ao comportamento adquirido ou modo de ser conquistado pelo homem. Ética
vem do grego ethos, que significa analogamente “modo de ser” ou “caráter”,
enquanto forma de vida também adquirida ou conquistada pelo homem.
(VÁZQUEZ, 2010, pág. 24)
Embora ética e moral tivessem inicialmente conceituações equivalentes, não se pode
confundi-las, pois, a diferença reside no “refletir o ato” e a distinção entre os dois termos foi
acontecendo ao longo da história da sociedade humana, conforme aponta Karam (1997, pág.
34):
Ao longo da história humana, foi-se diferenciando ética de moral. Enquanto esta
envolvia-se com o conjunto de normas que refletia determinado comportamento,
cultura, período, aquela, para alguns autores (...), significava a reflexão sobre o
mundo moral dos homens. (KARAM, 1997, pág. 34)
18. 18
Dessa forma, toma igual sentido o aporte de Vázquez (2010, pág. 22) na distinção
entre ética e moral: “(...) não se podem confundir a ética da moral. A ética não cria a moral.
Conquanto seja certo que toda moral supõe determinados princípios, normas ou regras de
comportamento, não é a ética que os estabelece numa determinada comunidade”. Pois, “A
ética é a ciência da moral, isto é, de uma esfera do comportamento humano. Não se deve
confundir aqui a teoria com o seu objeto: o mundo moral” (VÁZQUEZ, 2010, pág. 23).
Portanto, podemos inferir que a moral é, em primeiro grau, um fato histórico, pois
percebemos que ela é conseqüência de um modo de agir, da mesma forma que a ética, não
pode ser deduzida a um termo único. Desse modo, afirma Vázquez (2010, pág. 37):
Portanto, a moral é um fato histórico e, por conseguinte, a ética, como ciência da
moral, não pode concebê-la como dada de uma vez para sempre. A moral é histórica
precisamente porque é um modo de comportar-se de um ser – o homem – que por
natureza é histórico. (VÁZQUEZ, 2010, pág. 37)
Entretanto, para além de um ser histórico, o homem também é um ser social, e o moral
efetivamente surge quando o indivíduo atinge este grau social. De acordo com Vázquez
(2010, pág. 39): “A moral só pode surgir – e efetivamente surge – quando o homem supera a
sua natureza natural, instintiva, e já possui uma natureza social, isto é, quando já é membro de
uma coletividade”. Desta forma, o homem passa de um ser puramente “natural” e histórico
para um ser social, de forma que faça parte de uma sociedade ou comunidade. A moral, nesse
sentido, tem função de regular o comportamento do homem, para fins de sustentação da
ordem daquela comunidade ou sociedade. Destarte:
Como regulamentação do comportamento dos indivíduos entre si e destes com a
comunidade, a moral exige necessariamente não só que o homem esteja em relação
com os demais, mas para também certa consciência – por limitada e imprecisa que
seja – desta relação para que se possa comportar de acordo com as normas ou
prescrições que o governam. (VÁZQUEZ, 2010, pág. 39)
Podemos entender, então que, a moral, por ter um caráter regulamentar, assume um
papel de estabelecer princípios, para que se mantenha uma estrutura adequada. Para isso,
podemos partir do princípio que a moral, então “é um conjunto de normas, aceitas livre e
conscientemente, que regulam o comportamento individual e social do homem”. (VÁZQUEZ,
2010, pág. 63). Da mesma forma observa o pesquisador Muniz Sodré (In KOSOVSKI, 2008,
pág. 58): “Desse „Ethos‟ vem o termo „Ethiké‟ (Ética) para designar o conjunto dos „nomoi‟ –
regras e valores que dão forma à territorialização do indivíduo humano, que organizam, em
vários níveis, a morada do grupo num determinado lugar”.
19. 19
Dessa forma, a moral assume natureza de norma, ou normatização, conforme alguns
autores observam e da qual comunga Vázquez (2010, pág. 63-4):
encontramos na moral dois planos: a) o normativo, constituído pelas normas ou
regras de ação e pelos imperativos que enunciam algo que deve ser; (...) No plano
normativo, estão as regras que postulam determinado tipo de comportamento.
(VÁZQUEZ, 2010, pág. 63-64)
Uma vez que a moral ganha dimensão normativa, entendemos então que ela diz como
algo deve ser e requer uma série de prescrições, com relação ao comportamento individual.
Segundo Vázquez (2010, pág. 64): “A norma postula um tipo de comportamento e, com isso,
exige-se que passem a fazer parte do mundo dos fatos morais”.
Entretanto, segundo o mesmo autor “o normativo existe para ser realizado, o que não
significa que se realize necessariamente; postula um comportamento que se julga dever ser;
isto é, que deve realizar-se, embora na realidade efetiva não se cumpra a norma”. (Pág. 64-5).
Desta forma, as normas existem como dever e não como obrigação.
Na mesma direção, caminha o pressuposto da moralidade das normas, que além do
comportamento indicado, leva em consideração os princípios que considera moral. De acordo
com Vázquez (2010, pág. 65): “Ou seja, tanto o conjunto dos princípios, valores e prescrições
que os homens, numa dada comunidade, consideram válidos como atos reais em que aqueles
se concretizam ou encarnam”. Contudo, moral e moralidade não podem confundir-se. A moral
possui efeito de orientar, de estar no plano da recomendação. Já a moralidade seria um
elemento que efetivamente influencia uma tomada de decisão. Para Vázquez (2010, pág. 66):
“A moral estaria em plano ideal; a moralidade, no plano real. A „moralidade‟ seria um
componente efetivo das relações humanas concretas (entre os indivíduos e a comunidade)”.
Mesmo quando falamos de moral e/ou moralidade, estamos diante de fatores que
interferem nas tomadas de decisões. O comportamento moral depende de atitudes individuais,
mas que possuem um caráter coletivo. Como afirma Vázquez (2010, pág. 68): “A moral
possui um caráter social enquanto regula o comportamento individual cujos resultados e
conseqüências afetam outros”.
Dessa forma, o homem é um ser consciente e livre, que tem autonomia para, de acordo
com os seus valores, decidir o seu comportamento moral perante a sociedade. Ainda que
existam “normas” pré-estabelecidas, o ser individual é tencionado a refletir segundo seus
próprios julgamentos. É nesta área em que ocorre uma atuação consciente de uma vontade
exclusiva em que se discerne uma vontade específica e livre. (LOPES DE SÁ, 2005, pág.
20. 20
104). Ainda que o homem seja um ser livre e consciente, este se encontra em um espaço em
que ele mesmo condiciona-se no ambiente das obrigações e deveres, como afirma Muniz
Sodré (In KOSOVSKI, 2008, pág. 58-9):
No jogo do reconhecimento, vê-se de um lado, o valor ético-institucional, que impõe
obrigações (a pressão no sentido de se manter a integridade do grupo), e do outro, a
regra universal da linguagem (logos), que impõe o sistema das posições (o sistema
lingüístico dos pronomes pessoais) pelo qual o indivíduo se oferece ao
reconhecimento, entrando no jogo das obrigações. (MUNIZ SODRÉ In:
KOSOVSKI, 2008, pág. 58-59)
Neste sentido, ainda que condicionado nas regras pré-estabelecidas, o sujeito, além
disso, possui valores que nortearão seus atos e determinarão sua convivência com o grupo,
que afetam o coletivo. Esta passagem da obrigação moral imposta pelo coletivo e da mesma
obrigação que precisa da aprovação individual consciente é resgatada nas definições de
Vázquez (2010, pág. 72): “O indivíduo age então de acordo com as normas aceitas por um
grupo social ou por toda a comunidade, sancionadas pela opinião e sustentadas pela
fiscalização atenta dos demais.”; e “A consciência moral é a esfera em que se operam as
decisões de caráter moral”. (pág. 73).
A moral, nesse sentido, por possuir caráter social (porque age na sociedade e para a
sociedade, no sentido de prescrever a constituição do comportamento) não pode dissociar a
atividade individual na composição da esfera moral para o coletivo. Refere-se Vázquez (2010,
pág. 74): “Desta maneira, portanto, quando se sublinha o caráter social da moral, e a
decorrente relação entre o individual, está-se muito longe de negar o papel do indivíduo no
comportamento moral”.
Podemos concluir então, que, a moral compõe um conjunto de elementos que
constituem o comportamento de uma sociedade ou grupo, aceitas ou entendidas entre os
indivíduos para manter certa ordem, e para isso, essas normas, ou leis, são aceitas
conscientemente e livremente. Conclui Vázquez (2010, pág. 84):
A moral é um sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são
regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a
comunidade, de tal maneira que estas normas, dotadas de um caráter histórico social,
sejam acatadas livre e conscientemente, por uma convicção íntima, e não de uma
maneira mecânica, externa ou impessoal. (VÁZQUEZ, 2010, pág. 84)
Desta forma, o indivíduo que aceita um sistema de normas, de forma livre e
espontânea, tem certa independência nas tomadas de decisões, ou seja, ele tem um
comportamento que é autônomo.
21. 21
No próximo tópico deste capítulo completaremos as peculiaridades da ética e do moral
refletindo sobre os problemas relacionados ao tema que afetam a sociedade.
1.2 Desvios éticos e morais
Como vimos anteriormente, as convicções íntimas determinam diretamente as
prescrições normativas. Estas efetivadas por um grupo que não é passivo de qualquer regra
que se imponha. Este indivíduo, segundo Vázquez (2010, pág. 78) é um ser dotado de
consciência: “O ato moral supõe um sujeito real dotado de consciência moral, isto é, da
capacidade de interiorizar as normas ou regras de ação estabelecidas pela comunidade e de
atuar de acordo com elas”. Tais concepções morais do sujeito implicam uma possível
valoração daquilo o que se determina como apropriado para se tornar norma. Quando se refere
à valoração, Vázquez aponta: “Quando falamos em valores, temos presente a utilidade, a
bondade, a beleza, a justiça, etc., assim como os respectivos pólos negativos: inutilidade,
maldade, fealdade, injustiça, etc.” (Pág. 136).
Dessa forma, vivemos numa sociedade que está passando por uma crise de valores,
conforme anuncia Leão (In KOSOVSKI, 2008, pág. 19):
A nossa época dá um espetáculo de verdadeira má-fé no absurdo e de incoerência no
reino dos valores: do ponto de vista ético, bem e mal não são dois princípios
separados que se opusessem (...). O bem e o mal constituem, ambos, o mistério
insondável de toda ética digna deste nome. (LEÃO In: KOSOVSKI, 2008, pág. 19)
Como podemos perceber, há uma tendência em relativizar e/ou separar aquilo que é
bom do mau, do certo e do errado, etc. Assim sendo, o homem é guiado por escolhas entre
valores. Como afirma Vázquez (2010, pág. 135): “Ter de escolher supõe, portanto, que
preferimos o mais valioso ao menos valioso moralmente ou ao que constitui uma negação de
valor desse gênero (valor moral negativo ou desvalor)”. De acordo com Leão (In
KOSOVSKI, 2008, pág. 19): “É uma atitude sempre empenhada em determinar escolhas e
definir decisões. O mistério se faz o indeterminável determinante de toda determinação ética”.
Para Leão (In KOSOVSKI, 2008, pág. 18), “Vivemos uma aberração ética” 4, com
relação aos sentidos mortal e venal. Para o autor, a sociedade julga com condescendência
crimes diários e por vezes até tolerados, enquanto crimes de outra natureza são severamente
4
Leão refere- se aos crimes políticos, considerado pecado mortais, contrapondo-os aos crimes comuns, esses
considerados crimes venais, mas que de certa forma, trata-se da mesma crise ética.
22. 22
condenados (LEÃO, In: KOSOVSKI, 2008, pág. 18). Entretanto, para Vázquez (2010, pág.
109), podemos apenas condenar moralmente um ato, ou um indivíduo, se este detiver uma
responsabilidade na conseqüência do ato. Para o autor, o sujeito, deve ainda estar gozando de
condições como liberdade e opção de escolha para poder ser responsabilizado:
Mas o problema da responsabilidade moral está estreitamente relacionado, por sua
vez, com o da necessidade e liberdade humanas, pois somente admitindo que o
agente tem certa liberdade de opção e de decisão é que se pode responsabilizá-lo
pelos seus atos.(VÁZQUEZ, 2010, pág. 109)
Por isso, o fator fundamental na tomada de decisões, segundo o mesmo autor, é
também o elemento da consciência compreendido como discernimento das suas ações, neste
caso, para julgar moralmente um ato. Para ele, o sujeito não pode ignorar a ocasião nem os
efeitos de sua ação: “que o sujeito não ignore nem as circunstâncias nem as conseqüências da
sua ação, ou seja, que seu comportamento possua um caráter consciente” (VÁZQUEZ, 2010,
pág. 110). Neste sentido, o indivíduo traz consigo o sentido da responsabilidade.
Estudo que vai ao encontro do que Vázquez diz, Gomes (2004, pág. 65) também
examina o fator da liberdade como capacidade para responder por atos morais e a capacidade
de responder a si próprio: “A autonomia tem, então, que restringir sua significação à
possibilidade de reflexão e escolha de uma visada normativa. Ora, tanto uma quanto a outra
só se realizam na condição de liberdade”. Observa também, o fator da responsabilidade na
escolha como um ser não isolado e sim partícipe de uma organização, nas palavras de
Marilena Chauí, a autora delineia a ação ética como uma alternativa autônoma e não provinda
de uma coação externa:
Assim uma ação só será ética se consciente, livre e responsável e será virtuosa se
realizada em conformidade como o bom e o justo. A ação ética só é virtuosa se for
livre e só o será se for autônoma, isto é, se resultar de uma decisão interior do
próprio agente e não de uma pressão externa. (CHAUÍ apud GOMES, 2004, pág.
66).
Entretanto, o indivíduo está inserido numa natureza moral, em que ele é o agente
desses conflitos e autor dos valores que constituem a esfera moral. Conforme Gomes (2004,
pág. 67):
Ora, essa adesão consciente só pode ser medida pelo investimento, pelo
engajamento real numa linha de ação que assume o nome de responsabilidade pelas
próprias escolhas e atos. (...) Assim, essa responsabilidade não diz respeito à pessoa
isoladamente, mas sempre em relação a todos os outros partícipes da condição.
(GOMES, 2004, pág. 67)
23. 23
Segundo Vázquez (2010, pág. 77), os motivos também são fatores que devem ser
considerados na atitude da esfera moral: “Os motivos constituem, por conseguinte, um
aspecto importante do ato moral”. Mais adiante, discorre que todo ato moral é um ato único e
determinado: “Com ajuda da norma, o ato moral se apresenta como a solução de um caso
determinado, singular. A norma, que apresenta um caráter universal, se singulariza, desta
maneira, no ato real” (VÁZQUEZ, 2010. pág. 81).
Até agora, sustentamos os atos morais nos valores. Isto implica em determinar a
moralidade dos próprios valores, a fim de deduzir a singularidade dos atos morais.
Ocupamos-nos agora, então, em objetivar os valores. Os valores não existem por si só, são
criados pelo homem e para o homem que, como já dissemos, é um ser histórico e social.
Segundo Vázquez (2010, pág. 147), os valores, por conseguinte, existem unicamente em um
mundo social; isto é, pelo homem e para o homem.
Logo, examinamos a avaliação da valoração moral como um ato de consciência, ao
determinar a distinção entre os valores que os indivíduos estabelecem com os produtos
criados pelos homens, realizados de modo consciente e voluntário. Contudo, numa avaliação
sobre ética, o autor Karam (1997, pág. 90) afirma que “a ética não deve estar subordinada (...)
a critérios pessoais. A única forma de se movimentar no campo dos valores, com um projeto
de liberdade, (...) é que a particularidade transite para a universalidade e vice-versa”. Neste
sentido, os critérios pessoais são fundamentais, mas não únicos no processo de valoração, pois
a ética se movimenta no sentido coletivo, universal e não somente no sentido particular, mas
de forma que os critérios pessoais também transitem para o campo universal.
Para configurar a objetivação dos valores, encontramo-nos agora num campo em que
os valores possuem um caráter de virtude, que são os valores morais e não-morais. Neste
campo, entram em cena os adjetivos como o bom e o belo como unívocos de virtude.
Entretanto, valores morais como o bom quando sinônimo de qualidade difere do bom que não
possui a natureza moral, ou seja, não compete à moral a valoração, Como confirma Vázquez
(2010, pág. 148): “Por isso, o uso do termo „bom‟ não pode levar a confundir o „bom‟ em
sentido geral, relativo a qualquer valor, e „bom‟ em sentido estrito, com um significado
moral”. Tal compreensão sobre o bom também se aplica ao certo e ao errado, neste sentido, as
concepções já aparecem como juízos de valores, aplicando-se como juízos da moral. Os
juízos morais refletem-se nos atos que foram executados ou que denotem a disposição a um
ato à que outro. De acordo com Vázquez (2010, pág. 237) e ainda sobre a questão da bondade
e da maldade ele diz:
os enunciados sobre a bondade ou a maldade dos atos realizados, assim como a
24. 24
preferibilidade de uma ação possível em relação a outras, ou sobre o dever ou a
obrigatoriedade de comportar-se de certo modo, conformando o comportamento
com determinada norma ou regra de ação, se expressam sobre a forma de juízos.
(VÁZQUEZ, 2010, pág. 237)
Nesse sentido, os juízos morais também constituem a organização das prescrições
morais. Juízos que enunciam como algo deve ser, prescrita em norma – normativa ou
imperativa – levam em consideração a qualidade do valor para poder ser expressa através de
norma. Assim, nas palavras de Vázquez (2010, pág. 240): “Mas esses tipos de juízos –
normativos ou imperativos – não pode ser separado dos juízos de valor, porque aquilo que se
julga que deve ser realizado é sempre algo considerado valioso”. Sendo assim, a forma lógica
da norma, que é a de regulamentar o comportamento assenta-se nos juízos de valor, que se
arrolam a essa necessidade de regrar. Contudo, correspondendo a essa necessidade de se
comportar de tal maneira e a ordem de agir de determinada postura, é que discerne o juízo
normativo do juízo de valor. (VÁZQUEZ, 2010, pág. 241).
Portanto, cada indivíduo apela à consciência para justificar seus atos morais e
compreender o que devemos fazer ou não. As normas – ou prescrições morais – atuam como
“receitas” a fim de regular o comportamento humano. Podemos concluir então que, os
códigos morais exercem a função de regulamentar tanto o comportamento quanto os atos dos
indivíduos. Porém, a obrigatoriedade moral afirma o que devemos fazer, e não como fazer,
por isso, no próximo tópico, abordaremos as teorias mais importantes sobre a obrigação moral
e sua relação com a sociedade e com a comunicação.
1.3 Ética no Jornalismo
No decorrer do nosso estudo, percebemos que a função social da moral compõe-se na
regulamentação das relações entre os homens (entre os indivíduos e entre estes e a sociedade).
Como podemos ver, os atos humanos estão sempre ligados a uma instância moral, geralmente
ligada a uma norma. Como as normas estão arroladas em códigos, veremos o que os códigos
morais prescrevem para a atividade do jornalista.
Os códigos morais visam preservar a sociedade no seu conjunto e no seu interior a
integridade de um grupo social (VÁZQUEZ, 2010, pág. 69). Neste sentido, podemos perceber
que há um progresso moral e do comportamento dos homens através dos códigos. Ao longo
do tempo, os indivíduos vivem num ambiente moral, na qual se desenha um conjunto de
sistemas de normas e regras de ação.
25. 25
Uma vez que o jornalista opera no campo da comunicação social, as normas que o
cercam estão carregadas por uma expressão que equivocadamente é chamada de “código de
ética” quando na verdade, trata-se de um código moral. A respeito disso, Gomes (2004, pág.
19) aponta:
Quando dizemos ética do jornalismo, nosso referencial é então o conjunto de regras
postas que agrupamos sob os códigos profissionais. Esse é o campo ao qual se
dedica a deontologia, como estudo das normas instituídas – tratado dos deveres.
Mas, a rigor, não temos uma ética do jornalismo ou de tal e tal profissão. (GOMES,
2004, pág. 19)
Neste sentido, apesar de ética, moral e deontologia estarem conectadas entre si, é
preciso distinguir um termo do outro. De acordo com Karam (1997, pág. 33):
Deontologia, derivado do grego deontos, significa o que deve ser, isto é, a
cristalização provisória do mundo moral, validado pela reflexão ética, em normas
sociais concretas, em princípios formais e em alguns casos em normas jurídicas.
(KARAM, 1997, pág. 33)
A normatização deontológica de regras e condutas morais reflete, portanto, a
sistematização social daquilo que existe na esfera moral e é objeto da reflexão ética. A norma,
como já assinalamos, possui o caráter de orientar e coibir certas atitudes.
De acordo com Vázquez (2010, pág. 189): “Uma teoria da obrigação moral recebe o
nome de deontológica (...) quando não se faz depender a obrigatoriedade de uma ação
exclusivamente das conseqüências da própria ação ou da norma com a qual se conforma”.
Portanto, a doutrina aponta para aquilo o que é obrigatório fazer e pretende responder à
questão de como definir o que deve ser feito a fim de que essa determinação possa guiar uma
situação particular. Desta forma, o caráter é orientado pelo dever. Uma vez que a ética pode
ser entendida como aquilo que se pensa ser bom e a moral aquilo que se impõe como
obrigatório, a teoria deontológica parece estar bem mais a fim da conceituação da moral,
embora tenha sempre o fundamento de se fazer o bem (princípio ético) para que se possa
obter um final satisfatório (moral). Conforme Paul Ricoeur, apud Cornu (1998, pág. 09):
A distinção entre moral e ética pode também ser compreendida como a expressão da
diferença entre preceitos gerais e preceitos específicos de um determinado campo de
atividade. A deontologia que se aplica ao dever, seria então o conjunto de regras da
aplicação de uma ética „no campo que lhe é próprio‟, ética aplicada a um grupo, a
uma profissão, no caso a mídia e os jornalistas. (PAUL RECOIR apud CORNU,
1998, pág. 09)
Assim, os códigos de “ética” do jornalismo identificam-se com os códigos morais,
neste sentido, por orientarem os indivíduos, atuam como prescrições morais, e por a ética
26. 26
operar em âmbito acima da moral, a deontologia revela-se como um conjunto de deveres cujo
modelo estabelece um sistema hermético de regras. De acordo com Cornu (1998, pág. 10-1):
“A deontologia concebida como um conjunto de deveres que regulam a prática somente
poderia (...) derivar da moral, da qual constituiria um tipo de território fechado”.
Desta forma, podemos compreender também, que, se os códigos deontológicos são
sistemas fechados, poderiam também esses sistemas “fecharem” os indivíduos nas suas leis.
Valemo-nos então pressupor que o sujeito “obrigue-se” a participar dela, por mais que
tenhamos sublinhado o papel fundamental da liberdade de escolha no comportamento
humano, resgataremos o que Vázquez propôs a partir da Teoria Kantiana sobre deontologia:
Agir por dever é operar puramente conforme a lei moral que se expressa nos
imperativos universalizáveis, e a vontade que age desta maneira, movida pelo
sentimento do dever, independentemente de condições e circunstâncias, interesses
ou inclinações, é uma vontade „boa‟. O dever não é outra coisa senão a exigência de
cumprimento da lei moral, em face da qual as paixões, os apetites e inclinações
silenciam. O dever se cumpre pelo próprio dever, pelo sentimento do dever de
obedecer aos imperativos universalizáveis. (VÁZQUEZ, 2010. pág. 195)
Por isso, podemos entender que o “Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros
(CEJB)” está mais para um código moral deontológico, pois define as normas a que o
jornalista deverá subordinar-se, tanto para a sua atuação nas relações com a sociedade, quanto
para com as fontes de informação e também para com os próprios jornalistas. Sobre o CEJB,
em relação ao sistema “fechado de normas” que impõe a teoria deontológica, analisamos a
disposição do código em seus direitos e deveres. O código possui 27 artigos, dos quais os
cinco primeiros dispõem sobre o direito de informação em relação ao coletivo, ou seja, para a
sociedade; seis artigos que tratam de 15 deveres do jornalista, um artigo que enumera cinco
itens que o profissional “não pode” realizar e seis artigos distribuem as responsabilidades
penais do jornalista. No código todo consta apenas um direito relacionado à prática
jornalística.
Nesse sentido, o jornalista fica “engessado” em meio às obrigações, responsabilidades
e deveres. Segundo Cornu (1998, pág. 79) “o jornalista exerce sua profissão em meio a um
esquema de restrições e de limitações que determinam suas escolhas na aplicação natural das
regras profissionais”. As normas, nesse sentido, impõem certa restrição à atuação do
jornalista. Entretanto, a simples aplicação de normas dispostas em códigos, não tem a função
de desestimular o desempenho do comunicólogo, nem angustiar o jornalista a uma prática
honesta da profissão. Para o autor, as restrições permitem aos jornalistas “trabalhar” sobre os
determinismos aos quais estão submetidos, objetivando melhor definir e explorar o espaço de
27. 27
liberdade que lhes é próprio (CORNU, 1998, pág. 79-80).
Apesar disso, os códigos deontológicos têm deixado falhas quando tenta responder às
expectativas de natureza moral, uma vez que a própria consciência moral (e individual) tem
parte na gerência dos atos morais. Nos códigos deontológicos, segundo Cornu: “A atividade
jornalística fica então compreendida como uma atividade enquadrada em parâmetros, mas não
servil” (pág. 97).
É por isso que Cornu defende uma “ética da informação”. Para o autor, a ética da
informação pressupõe abandonar o conceito de moral. Para tornar possível falar em ética da
informação sem fazer referências à moral, é preciso situar a ética em níveis: Uma ética
descritiva, que aproxime à etimologia das práticas da informação, costumes e procedimentos
dos jornalistas e da mídia, valores referenciados na prática jornalística, ou seja, uma
declaração das exigências dos jornalistas. Uma ética estratégica, em que se situam as
responsabilidades dos meios de comunicação e que abordaria a regulamentação deles, e não o
jornalista isolado. Uma ética normativa que regule as práticas e aplique não só deveres, mas
também direitos. Neste sentido, Cornu assegura que aqui, a ética possui o mesmo sentido dos
códigos deontológicos que garantem a fiscalização. E por fim, uma ética reflexiva, esta,
possui um maior alcance do que as outras, que funciona como legitimação das práticas e
normas. Segundo Cornu (1998, pág.14): “É por isso que uma ética da informação não se
limita a ação de seus agentes mais visíveis: os jornalistas. (...) Ela compreende igualmente,
pelas ações de seus dirigentes, os meios de comunicação como organizações”.
Como percebemos, as palavras: “valor e responsabilidade” mais uma vez aparecem
como elementos que constituem tanto uma moral quanto a deontologia. É nesse sentido que
Karam comunga dos mesmos conceitos que Cornu:
cada princípio, contido em cada código deontológico, carrega consigo uma
afirmação ontológico-moral profissional. Com isso, há neles uma tentativa de
afirmação de valores que devem ser compartilhados por todos aqueles que exercem
o jornalismo – valores que também compõem o patrimônio jornalístico. Os valores,
expressos em palavras, devem integrar o universo da categoria dos jornalistas, dos
proprietários dos veículos de comunicação, dos demais trabalhadores da informação,
das fontes que fornecem informações de interesse público, dos anunciantes, etc.
precisamente por serem profissionais são eles os responsáveis diretos pela
incorporação e aplicação de determinados valores (...). (KARAM, 2004, pág. 90-1)
Desta forma, podemos inferir que todos que de alguma forma possuem contato com a
informação têm responsabilidades na publicação da mesma. Percebe-se que, estão
internalizados nos códigos deontológicos, éticos e de conduta, o cuidado na transmissão ética
e correta da informação, e caminham na direção de respeitar a atividade jornalística. Como
28. 28
aponta Karam (2004, pág. 91): “Os códigos buscam, de certa maneira, um „controle de
qualidade‟, feito por quem apura a informação ou vive imediatamente no e do mundo da
informação”. A partir disso, é que Claude-Jean Bertrand estabelece uma clara distinção entre
moral, deontologia e controle de qualidade. Por moral, o autor entende aquilo o que se pensa
individualmente, seu entendimento pessoal do mundo. Por deontologia, um conjunto tácito de
deveres e controle de qualidade uma junção dos termos anteriores, tornando a atividade mais
valorizada e reconhecida:
Pode-se reservar o termo moral para a ética íntima de cada indivíduo, seu sentido de
dever, fundados na sua visão pessoal do mundo, na sua experiência da vida. (...) A
deontologia aplica-se a uma profissão. É freqüentemente uma tradição não escrita
que determina, por consenso, o que “se faz” e “não se faz”. O “controle de
qualidade” (...) tem, primeiramente, a vantagem de ser amplo: engloba moral,
deontologia e também as iniciativas da direção da mídia visando melhor satisfazer o
público. Tem sobretudo, a vantagem de ser neutro, de poder agradar todos os
protagonistas. (BERTRAND,1999, pág. 52-3)
Com efeito, a relevância moral do jornalismo torna-se evidente, pois ancorado sob
diversos códigos e sistemas, a atividade tem sua importância reconhecida na construção da
sociedade. Jornalismo é, portanto, um campo de conhecimento fundamental para a sociedade,
em que a inscrição ética é o ponto central da atividade.
É nesse sentido que Karam (1997) defende uma justificação ética da profissão e que
atente à importância do jornalismo: “A defesa da necessidade de uma ética jornalística exige
que se considere a atividade importante moralmente e se reconheça, nela, alguma
especificidade que a distinga das outras”. (pág. 37). Portanto, podemos considerar que existe a
necessidade de se reconhecer a moral que envolve a profissão, e de uma ética que envolva o
profissional.
Existe ainda, um elemento que define a importância e o reconhecimento moral do
jornalismo: a informação como componente determinante da atual sociedade. Conforme
Karam (2004, pág. 94): “A relevância moral do jornalismo é tão reconhecida e tão valorizada
em códigos porque aparentemente, conforme Alsius, a informação tornou-se „o principal
elemento definidor‟ da atual sociedade democrática”. Informação que hoje, ganha espaço
mais democrático com o advento da internet. A rede propiciou a criação dos mais diversos
conteúdos informativos possíveis, descentralizando o jornalismo impresso, radiofônico e
televisivo. Esse espaço tão amplo de possibilidades permite que consideremos a mídia uma
nova fonte de informação. Portanto, não se pode ignorar um estudo ético desse novo campo
de leitura. Segundo Josaphat (2006, pág. 164): “Mais que as outras formas anteriores da
mídia, a internet oferece reais espaços de liberdade, de participação, de interação e de
29. 29
intercâmbio (...)”.
Não se pode, portanto, negar a influência deste novo meio de comunicação. A internet
tem ingerência na forma de produção informativa. É possível, então, estudar as produções
jornalísticas neste novo campo comunicacional, que agora encontra um espaço mais amplo,
democrático e acessível. Um espaço que está mudando a forma de como vivemos e nos
comunicamos. É nesse sentido que buscamos estudar o jornalismo na cultura que se
denominou por cibercultura e tentar tornar possível um estudo crítico e ético deste mundo
virtual.
CAPÍTULO II
JORNALISMO EM TEMPOS DE CIBERCULTURA
Como já adiantamos no capítulo anterior, o poder transformador da internet na forma
de comunicação é evidente e agora se encontra num ambiente chamado “ciberespaço”. Como
veremos adiante, o jornalismo produziu nesse espaço uma nova forma de se comunicar, os
jornalistas apropriaram-se da nova ferramenta para produzir diferentes conteúdos com
liberdade, rapidez e atualização instantânea.
Estudaremos com mais análise e acuidade, o que se entende por cibercultura e como o
jornalismo se adequou e se adaptou a essa nova configuração sociocultural. No segundo
momento deste capítulo, estudaremos a ferramenta que vem atraindo a produção jornalística e
informativa no contexto atual propiciado pelo espaço cibernético a blogosfera5. Não
poderemos deixar de estudar, uma vez que a web modificou a forma de produzir e consumir
conteúdos jornalísticos, as características do jornalismo digital, anterior ao movimento dos
blogs. Tentaremos dar lógica ao estudo que fizemos anteriormente e assentar as considerações
sobre os modelos e características do jornalismo digital ante a configuração da blogosfera.
Antes mesmo que se pensasse em cibercultura, a informação era um conceito que
carecia de definições claras e objetivas. Entretanto, em 1948, um artigo científico intitulado
“Magna carta da era da informática” de Claude Shannon, propunha esclarecer a natureza
digital da informação. Shannon decidiu trabalhar na conceitualização do que era a
informação, uma vez que havia incertezas sobre o assunto. Ele transformou informação
5
Termo denominado ao universo dos blogs na web.
30. 30
simples em informação simbolicamente representável. Em linguagem computacional,
podemos dizer que informação é “tudo aquilo que reduz a incerteza de um sistema” Conforme
Haven apud Bonito (2010, pág. 1-2) 6:
Shannon ultrapassou as tentativas de outros para trabalhar com tipos específicos de
informação – textos, números, imagens, sons, etc. Ele também decidiu que ia
trabalhar com nenhuma forma única de transmitir informação – por um único fio,
ondas sonoras pelo ar, ondas de rádio, microondas e etc. Em vez disso, Shannon
decidiu concentrar-se em uma questão tão básica, mas que ninguém tinha pensado
em estudar. O que é informação? O que acontece quando a informação viaja do
remetente ao receptor? (Haven apud Bonito, 2010, pág. 01-02)
Desta forma, Shannon descrevia ingenuamente um dos maiores produtos da
comunicação e dava um pontapé nos estudos da cibercultura. Dessa forma, a informação e a
evolução tecnológica puderam caminhar não de forma antagônica ou indiferente, mas de
forma associada.
A evolução do aparato técnico que dá suporte à comunicação de forma geral e ao
jornalismo esteve sempre em constante mudança. Desde a invenção da prensa de Gutenberg, o
jornalismo ou a comunicação como um todo, vem se desenvolvendo. Ao longo do progresso
tecnológico, vieram o rádio, a fotografia e a televisão para dar ao jornalismo novos conceitos,
formas, linguagens e expansão informativa. Como aponta Christofoletti (2008, pág. 93-4):
O jornalismo sempre esteve ligado à tecnologia. A invenção dos tipos móveis por
Gutenberg, no século XV, permitiu que a difusão de textos escritos se ampliasse
muito (...). Bem mais tarde, o jornalismo continuou a se desenvolver com o advento
de novos aparatos tecnológicos, notadamente com os meios eletrônicos. Amparados
pelo telégrafo e pelo telefone, rádio e televisão estenderam ainda mais o raio de
cobertura do jornalismo e seu atendimento às demandas da sociedade.
(CHRISTOFOLETTI, 2008, pág. 93-94)
Uma vez que rádio e televisão são considerados meios eletrônicos de difusão, um novo
avanço tecnológico e eletrônico facilitou imediatamente as formas de produção noticiosa: a
informática. Por conta dela, a digitalização possibilitou facilidade na distribuição da
informação. A chegada dos computadores fez com que as diversas mídias então existentes
pudessem ter uma linguagem computacional (CHRISTOFOLETTI, 2008, pág. 95). A
máquina de escrever foi então, substituída pelo computador, além disso, as edições deixaram
de ser analógicas/cronológicas para digitais/atemporais.
Com o advento da internet, aliada às oportunidades trazidas pelos meios eletrônicos e
6
Trabalho apresentado no DT 7 – GP Mídia, Cultura e Tecnologias Digitais na América Latina, no Intercom
- Congresso de Ciências da Comunicação, realizado de 2 a 6 de setembro de 2010.
31. 31
pela informática, o jornalismo vê então, no espaço on-line, uma nova mídia de comunicação,
e a internet, um novo instrumento de informação7. Para nos encaminharmos ao campo da
cibercultura e da comunicação digital adequadamente, precisamos situá-los no ambiente onde
a internet propiciou uma expansão na difusão da informação. É graças à internet que qualquer
informação pode ser sabida globalmente. Conforme Pinho (2003, pág. 49):
A velocidade de disseminação da Internet em todo o mundo deve transformá-la
efetivamente na decantada superestrada da informação. Oferecendo notícias,
entretenimento, serviços e negócios, a rede mundial ainda é um novo meio de
comunicação que rivaliza com a televisão, o jornal e outros veículos de troca e
difusão da informação. (PINHO, 2003, pág. 49)
É nesse sentido que o jornalismo tende a ser cada vez mais instantâneo, sendo essa
uma das características mais importantes desta mídia. A internet, agora como aliada do
jornalista, mostra-se também como vilã. O tempo de divulgação da notícia, “em primeira
mão” dá ao jornalista a possibilidade do furo, ao mesmo tempo em que potencializa falhas em
alguma das etapas de produção da notícia. É neste sentido que a internet modificou a
produção informativa, pois “No jornalismo atual, e principalmente o que é oferecido na
internet, o tempo da produção de informações é distinto do que era há duas ou três décadas. O
intervalo entre o acontecimento e a distribuição do seu relato está muito menor”.
(CHRISTOFOLETTI, 2008, pág. 98).
No que se refere ao tempo da informação, a autora Mielniczuk8 (2001, pág. 06) aponta
para a mesma direção, colocando em evidência a rotina de produção da notícia. A autora
sinaliza para o intervalo de tempo entre o acontecimento do fato e a sua publicação, que
diminuiu muito com o processo online de notícias; aponta ainda para os problemas que esta
redução de tempo pode influenciar na qualidade da informação e na rotina do jornalista.
Se inferirmos que uma parcela dessas informações não condiz com a verdade, temos
de ter em mente que uma boa parte, senão a maioria dos meios convencionais de imprensa
abastece-se das informações da web para utilizar os dados, reproduzindo os mesmos erros
(CHRISTOFOLETTI, 2008, pág. 99). O tempo, portanto, pode comprometer a credibilidade
de um veículo tanto quanto da informação.
Independente de a internet inserir-se nessa gangorra de valores, créditos e/ou
descréditos, é certo que a interação do jornalista com o computador vem avançando cada vez
7
PINHO, J. B. Jornalismo na Internet: Planejamento e produção da informação on-line. São Paulo: Summus
editorial, 2003. Pág. 49.
8
MIELNICZUK, Luciana. Características e implicações do jornalismo na Web. Trabalho apresentado no II
Congresso da SOPCOM, Lisboa, 2001.
32. 32
mais nos últimos tempos. O mutualismo entre homem e máquina é uma característica do que
se chama de cibercultura. Conforme Rüdiger, (2007, pág. 183) cibercultura é o “conjunto de
práticas e representações que surge e se desenvolve com a crescente mediação da vida
cotidiana pelas tecnologias da informação e, assim, pelo pensamento cibernético e civilização
maquinística, apareceu como termo nos anos 1990.”
Veremos que a evolução das tecnologias da informação e desenvolvimento de novas
estruturas informativas possibilitam ao campo da comunicação novas formas de produzir
jornalismo. Uma das ferramentas que mais cresceram foram os weblogs. Na próxima fase do
trabalho, examinaremos o jornalismo digital (ou webjornalismo), os blogs9 como parte conexa
deste, inteirando a esfera da cibercultura.
2.1 Cibercultura
Como antecipamos na introdução deste capítulo, cibercultura é toda a ação mútua
entre homem e máquina, cuja interação cibernética se deu através destas mediações. O campo
onde atuam estes atores “cibernéticos” é o ciberespaço, lugar remoto em que se operam as
relações entre o homem e aparelho tecnológico, ou dispositivo computacional capaz de gerar
informação virtual. Para Piere Lévy (1999), o ciberespaço tem condições de agregar todos
esses dispositivos de criação de informação digitalizados e é o principal canal de
comunicação. Nas palavras do autor:
Eu defino o ciberespaço como o espaço de comunicação aberto pela interconexão
mundial dos computadores e das memórias dos computadores. Essa definição inclui
o conjunto dos sistemas de comunicação eletrônicos (aí incluídos os conjuntos de
redes hertzianas e telefônicas clássicas), na medida em que transmitem informações
provenientes de fontes digitais ou destinadas à digitalização. (...) Esse novo meio
tem a vocação de colocar em sinergia e interfacear todos os dispositivos de criação
de informação, de gravação, de comunicação (...). (LÉVY, 1999, pág. 95)
Essa perspectiva certamente torna a cibercultura e o ciberespaço o ambiente, ou canal
de informação e suporte da memória da comunicação. Lugar em que se pode otimizar
informações e unir mídias (impressos, rádio, televisão), torna-se então, um outro caminho
para a comunicação. Uma vez que as novas formas de relação com a máquina trouxeram ao
homem uma permuta informacional, as novas relações com o saber também são
transformadas. O ciberespaço admite tecnologias intelectuais que potencializam, exteriorizam
e alteram numerosas funções do conhecimento humano, tais como banco de dados,
9
Forma reduzida do termo weblog.
33. 33
hiperdocumentos, arquivos digitais de todas as espécies. (LÉVY, 1999, pág. 159)
São assim, então, novas formas de acesso à comunicação: a navegação por
hipertextos10, e a procura por informações através de canais de busca, novas formas de
conhecimento e entendimentos e experiências do pensamento. Enfim, são novas tecnologias
intelectuais. São, também, mecanismos para compartilhar informações entre “numerosos
indivíduos11” que aumentam de forma significativa, a inteligência coletiva. É então, um fluxo
do conhecimento, ou do saber.
Este saber compartilhado, ou fluxo de conhecimento proporcionado pelas tecnologias
remotas de inteligência coletiva e individual mudam a forma como são percebidos os
subsídios da educação. Conforme Lévy, 1999, pág. 160: “Devemos construir novos modelos
do espaço dos conhecimentos”. Certamente, o ciberespaço é o campo mais fértil para fazer
brotar essas novas configurações do conhecimento. De acordo com o mesmo autor, o
ciberespaço fornece as ferramentas que permitem pensar sistemas automatizados acessíveis a
qualquer momento em redes. Organizando a comunidade, as academias e universidades, as
organizações cooperariam para o movimento de uma nova economia do conhecimento.
Uma das observações mais importantes a serem feitas em torno da cibercultura,
sobretudo no ciberespaço é a comunicação mediada através do computador. É neste espaço
que o jornalista vive cotidianamente: rodeado de informações e mídias diversas. Desde que a
informatização da informação tornou-se possível, a hipermídia, de fato, além de agregar
mídias convencionais (jornais, rádio e televisão), possibilita também suportes cada vez mais
independentes. Percebe-se que, a informatização avança no sentido de até mesmo
“desconstruir” o computador em benefício de uma comunicação navegável, centrado na
informação. Como aponta Lévy, (1999, pág. 43): “Nota-se também o uso crescente de padrões
descritivos de estruturas de documentos textuais ou multimídia, os quais permitem conservar
intacta toda informação, apesar das mudanças de suportes de programas e hardware”.
Destaca-se agora, a relação que a cibercultura estabelece com as mídias de massa. As
mídias de massa, já citadas, dão seqüência a uma linearidade universalizante encetado pela
imprensa escrita. Visto que a informação midiática será lida, ouvida e vista por uma
multiplicidade de indivíduos, ela é conformada a encontrar o que o autor definiu como o
“denominador comum” mental de seus destinatários. Para Lévy, a comunicação de massa
10
Hipertexto, segundo Carlos Inireu da Costa, é “uma forma não-linear de apresentar e consultar informações.
Um hipertexto vincula as informações contidas em seus documentos (ou “hiperdocumentos”, como preferem
alguns) criando uma rede de associações complexas através de hyperlinks ou, mais simplesmente links.” (LÉVY,
1999, pág. 264)
11
LÉVY, 1999, pág. 160.
34. 34
pensando a cibercultura, deve propor algum tipo de interação entre autor e receptor. Logo que
contextualiza:
A verdadeira ruptura com a pragmática da comunicação instaurada pela escrita não
pode estar em cena com o rádio ou a televisão, já que estes instrumentos de difusão
em massa não permitem nem uma verdadeira reciprocidade nem interações
transversais entre participantes. (LÉVY, 1999, pág. 119)
Contudo, o espaço cibercultural proposto por Lévy, que insere uma interação entre
partícipes, não irá afetar de maneira eliminatória os demais aparatos tecnológicos anteriores, o
oposto disto, irão fomentar sim, novos “planos de existência”: nos modos de relação –
comunicação interativa em espaços coletivamente construídos – nos modos de conhecimento,
aprendizagem e de pensamentos – comunicações transversais em espaços de comunicação
abertos, inteligência coletiva – e nos gêneros literários e artísticos – em hiperdocumentos,
criação virtual coletiva e obras interativas12.
Uma das idéias da cibercultura é a interconexão, e uma das características mais
latentes nas origens do ciberespaço. Para a cibercultura, a conexão entre um partícipe ou mais,
via conexão pela rede é preferível à que o isolamento. É nesse sentido que a noção de espaço
ganha caracterização, principalmente no que se refere à comunicação em seu aspecto físico,
ou o território que ela ocupa, pois para a cibercultura, os veículos não estariam mais no meio
a um espaço, e sim, em meio a mudanças “territoriais”. Por isso afirma Lévy (1999, pág.
129): “Os veículos de informação não estariam mais no espaço, mas por meio de uma espécie
de reviravolta topológica, todo o espaço se tornaria um canal interativo”. Por tudo isso, a
cibercultura seria ainda, o ambiente onde a interconexão constitui a humanidade em um
movimento contínuo e sem fronteiras.
É nesse sentido que o ciberespaço estabelece na rede uma organização dos saberes, das
informações e das ideias, de todos aqueles que estão conectados a ele. São nessas relações
virtuais que se ordenam as comunidades virtuais. São as comunidades virtuais que a partir de
interesses e projetos em comum, saberes e objetivos, que se estabelece através da rede, um
grupo, sociedade ou comunidade no virtual. São através das comunidades virtuais que as
interconexões, já citadas, legitimam-se. Segundo Lucia Santaella (2003, pág. 121):
Todos os tipos de ambientes comunicacionais na rede se constituem em formas
culturais e socializadoras do ciberespaço naquilo que vem se chamando de
comunidades virtuais, isto é, grupo de pessoas globalmente conectadas na base de
interesses e afinidades, em lugar de conexões acidentais ou geográficas.
12
LÉVY, 1999, pág. 225.
35. 35
(SANTAELLA, 2003, pág. 121)
Lévy afirma ainda que as comunidades virtuais sejam o espaço de um “processo de
cooperação ou de troca, tudo isso independentemente das proximidades geográficas e das
filiações institucionais” (1999, pág. 130). Quanto a isso, então, podemos entender que essas
comunidades estabelecem um “espaço” virtual que explora no ciberespaço a oportunidade de
expressar novas formas de comunicação e de informação; as mídias tradicionais, por assim
dizer, automaticamente representam uma forma excludente de expressão de opinião, uma vez
que respondem aos critérios editoriais de uma empresa, e que nesse sentido são excludentes.
As comunidades virtuais situam-se num espaço em que então a prática da “total liberdade de
palavra é encorajada e os internautas são, como um todo, opostos a qualquer forma de
censura” (Lévy, 1999, pág. 131). Uma vez que o espaço cibernético é polifônico, fica mais
evidente o caráter livre e democrático do ciberespaço (através das redes telemáticas). Quanto
a isso, Lévy é pontual: “as comunidades virtuais exploram novas formas de opinião pública.
Sabemos que o destino da opinião pública encontra-se intimamente ligado ao da democracia
moderna” (idem). É nesse espaço de múltiplas vozes e opiniões que o ciberespaço
proporcionou aos internautas, em especial àqueles que se ocupam de comunicação, que
podemos perceber o crescimento de ferramentas de caráter noticioso. Uma dessas ferramentas
chama-se weblog (blog), instrumento de informação e entretenimento que por muitas vezes
pautam portais e sites jornalísticos. Os blogs, em certa medida, abastecem a sociedade com
informação e conteúdo. Será essa crescente ferramenta que analisaremos no próximo tópico
deste estudo.
2.2 A Blogosfera
Ao longo do trabalho, delineamos a cibercultura como um elemento fundador das
trocas informativas por meio da rede e a partir disso, possibilitar à comunicação alternativa
para operar no ambiente jornalístico. Para dar continuidade e chegarmos ao estudo de caso –
os blogs – veremos com mais detalhamento como a cibercultura pode ainda dar subsídio para
o assunto. Retomaremos, portanto, algumas contribuições de Lévy e Santaella.
O ambiente do ciberespaço provocou de sobremaneira as relações de troca com os
usuários da rede. Nesse espaço, segundo Lévy, tem a finalidade da utilidade: “Todos
reconhecem que o melhor uso que podemos fazer do ciberespaço é colocar em sinergia os
36. 36
saberes, as imaginações, as energias espirituais daqueles que estão conectados a ele” (Lévy,
1999, pág. 133). Podemos, então, acrescentar que nesses “saberes” inclui-se a informação.
A blogosfera, como prática da comunicação, assemelha-se muito com os fundamentos
do ciberespaço, lugar em que a relação é voluntária, mútua e variada. O sentido dessa
comunicação mútua opera numa via de mão-dupla é a propriedade distintiva do ciberespaço.
Segundo Lévy,
..., o ciberespaço como prática da comunicação interativa, recíproca, comunitária e
intercomuntária, o ciberespaço como horizonte de mundo virtual vivo, heterogêneo e
intotalizável no qual cada ser humano pode participar e contribuir. Qualquer
tentativa para reduzir o novo dispositivo de comunicação às formas midiáticas
anteriores (esquema de difusão “um - todos” de um centro emissor em direção a uma
periferia receptora) só pode empobrecer o alcance do ciberespaço para a evolução da
civilização. (LÉVY, 1999, pág. 128).
13
Com a cibercultura, o ciberespaço, opera no campo “todos - todos” , em que a
comunicação está acessível e é produzida por todos aqueles que têm acesso a um computador
e que esteja conectado à rede. Esse dispositivo de comunicação descentralizado é um exemplo
de comunicação em que a informação atua de forma autônoma. A natureza dos blogs é
evidentemente oferecida pela independência do ciberespaço. Dessa forma,
Pessoas sem nenhum conhecimento de programação podem usar as funções de
correio e de conferência eletrônica, ou consultar um hiperdocumento a distância
dentro de uma mesma rede. Geralmente basta saber clicar nos botões corretos ou
escolher as operações que se quer efetuar em um “menu” ou, na pior das hipóteses,
digitar alguns comandos que são rapidamente decorados. (LÉVY, 1999, pág. 108)
Com isso, a forma que a blogosfera tomou tem como característica a conseqüência
natural da evolução desses conhecimentos que o ciberespaço provocou, uma vez que as
plataformas que permitem a publicação na web são cada vez mais acessíveis. Quando a web
atinge esta capacidade de integração, de saberes e procedimentos, Santaella (2003) então
enxerga no ciberespaço, o elemento cultural que a cibercultura ocasionou:
Para realizar tudo isso, o ciberespaço se apropria promiscuamente de todas as
linguagens preexistentes: a narrativa textual, a enciclopédia, os quadrinhos, os
desenhos animados (...). Nessa malha híbrida de linguagens nasce algo novo que,
sem perder o vínculo com o passado, emerge com uma identidade própria. Essa
reconfiguração de linguagem é responsável por uma ordem simbólica específica que
afeta nossa constituição como sujeitos culturais e os laços sociais que
estabelecemos. (SANTAELLA, 2003, pág. 125).
13
LÉVY, 1999, pág. 108.
37. 37
Percebemos que o ciberespaço propiciou algo que a rede está desenvolvendo como
cultura (ou hábitos de se relacionar, no nosso caso, na web). A blogosfera neste sentido é um
campo de comunicação já consolidado devido ao grande número de blogs e páginas do tipo
que emergem todo dia na rede. Para darmos seqüência ao campo da blogosfera, ou
simplesmente dos blogs, teremos de situá-lo historicamente e conceituá-lo, enfatizando,
sobretudo a sua estrutura. A partir de 1999, a democratização da informação passa a ser
efetiva. Uma pluralidade de editores individuais começa a publicar no novo fórum público
que a internet oferece: o ciberespaço. Valem-se das novas tecnologias de publicação da
informação para chegar até os confins da rede até pessoas que tenham os mesmos interesses e
gostos (VARELA In: ORIHUELA, 2007, pág. 60).
Blog é a contração do termo Weblog. Log, por sua vez, adquire significado de diário,
logo, “diário da web”. São páginas mantidas na internet com o objetivo de relato, por um ou
mais autores. Percebemos a importância que essas páginas adquirem por possuírem
autonomia no conteúdo divulgado, além de ser uma ferramenta que não requer conhecimentos
avançados em HTML. Como esclarece José Orihuela (2007, pág. 02):
Weblogs ou blogs são páginas pessoais da web que, à semelhança de diários on-line,
tornaram possível a todos publicar na rede. Por ser a publicação on-line centralizada
no usuário e nos conteúdos, e não na programação ou no design gráfico, os blogs
multiplicaram o leque de opções dos internautas de levar para a rede conteúdos
próprios sem intermediários, atualizados e de grande visibilidade para os
pesquisadores. (ORIHUELA, 2007, pág. 02).
Dessa forma, pela simplicidade na manipulação da ferramenta que, como já citado,
proporcionou a qualquer internauta publicar conteúdo na rede, os programas que permitem a
hospedagem de um blog no sistema permitem acesso simples e resolvem obstáculos técnicos,
permitindo ao usuário centrar mais no conteúdo. É, portanto, um meio de publicação na rede
sem intermediários, no caso do jornalismo, sem editores. Os blogs são em sua natureza, um
meio oriundo da rede, por ser proveniente dela14. O objetivo inicial dos blogs era publicar
pequenas notas, mais tarde eles foram tomando forma de diários pessoais. Genericamente, os
blogs tinham como base o link, como indica Orihuela (2007, pág. 03): “links com um breve
comentário, um registro (log) da navegação na web”. Originalmente, em 1999, com o
crescimento da rede e o acesso a internet pela população em geral, existiam apenas 23 blogs,
entretanto, com o aparecimento de serviços de publicação e criação de blogs, como o Blogger,
fez o panorama da situação mudar completamente, porque proporcionaram sua popularização.
14
ORIHUELA, 2007, pág. 02.
38. 38
Segundo Hugh Hewitt (2007, pág. 09), os blogs ganharam grande visibilidade quando
entraram para a seara política e do jornalismo com força. Desde 1999, o número de blogs
aumentou significativamente, chegando a mais de quatro milhões deles em apenas cinco anos
mais tarde. Os usuários são os mais diversos, e por isso, qualquer um pode se tornar um
jornalista em potencial15.
Tanto quanto o número de blogs que vem crescendo, o número de leitores, que buscam
na web informação e conteúdo, também tem aumentado. Os blogs constituem neste campo,
portanto, uma mídia independente de obtenção e produção de informação. Conforme Hewitt
(2007, pág. 21):
A blogosfera está evoluindo a um ritmo inacreditavelmente acelerado, abocanhando
bom número de leitores, mas ainda há excelentes oportunidades entre centenas de
milhões que precisam olhar além da TV para perceber que há um acesso mais
rápido, mais específico, mais emocionalmente satisfatório à informação. (HEWITT,
2007, pág. 21).
É nessa estreita relação entre blogs e informação que a blogosfera representa grande
número de páginas mantidas por jornalistas e tecnólogos16, e outra grande parte de blog com
conteúdo jornalístico. Em função dessa facilidade de publicação e manipulação, os blogs
deixaram de ser apenas diários pessoais, e tornaram-se influentes instrumentos de trabalho pra
jornalistas, etc. De acordo com Alex Primo (2010, internet), os blogs são alvo de estereótipos
sobre o movimento da cibercultura, reiterando o que já havíamos sublinhado sobre
comunidades no ciberespaço:
não se pode esquecer que blogs/texto (...) são criados através de um processo de
escrita coletiva. Além dos posts do(s) blogueiro(s), que ocupam o espaço mais
privilegiado na interface, os comentários devem ser vistos como parte do blog/texto.
Os debates tem um impacto sobre o grupo e inclusive sobre a redação de novos
posts. Tendo em vista essa produção colaborativa, não se pode deixar de reconhecer
os blogs como importante espaço de sociabilidade. Portanto, o blog/espaço pode se
transformar em um ponto de encontro de um grupo de interagentes. A interação
recursiva e o comprometimento dos participantes com o grupo pode resultar na
emergência de uma comunidade virtual. 17(PRIMO, 2007, internet)
Percebemos que Primo vai ao encontro com o que Lévy registra sobre comunidades
15
HEWITT, Hugh. Blog: Entenda a revolução que vai mudar o seu mundo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson
Brasil, 2007.
16
Pesquisa mostra que 57% dos blogueiros mais populares do Brasil tem formação em Comunicação e
Informática. Disponível em: <
http://www.interney.net/blogs/alexprimo/2010/06/23/pesquisa_mostra_que_57_dos_blogueiros_ma > Acesso
em: 23, Jun 2010.
17
O que são blogs, afinal? Ou, manifesto pelo respeito à complexidade da blogosfera. Disponível em: <
http://www.interney.net/blogs/alexprimo/2007/08/20/o-que-sa-227-o-blogs-afinal-ou-manifesto/> Acesso em: 10
Ago, 2010.
39. 39
virtuais e sociais, pois vemos na blogosfera as relações possíveis para a criação de
comunidades ou redes sociais virtuais, por isso, a blogosfera torna-se uma ferramenta
dinâmica. Para a pesquisadora Raquel Recuero os blogs constituem atualmente, um dos
grandes componentes de transformação do jornalismo do ponto de vista tecnológico.
Corroborando com a nossa hipótese anterior, de que a internet promoveu uma alternativa de
fluxo de informação. Segundo a autora, “Esse diálogo entre o pessoal e o coletivo forma e
constitui novas formas e espaços de interação com a informação e com a notícia, que
acabaram por modificar também o jornalismo” (RECUERO, s.d., pág. 02).
Outra característica importante que merece ser relembrada, a partir do que estudamos
sobre cibercultura e ciberespaço, é o que referencia André Lemos apud Recuero, ao passo que
weblogs são o mesmo que “ciberdiários”: “Ciberdiários, webdiários ou weblogs são práticas
contemporâneas de escrita online, onde usuários comuns escrevem sobre suas vidas privadas,
sobre suas áreas de interesse pessoais ou sobre outros aspectos da cultura contemporânea”.
(LEMOS apud RECUERO s.d., pág. 03). Como se pode observar, os weblogs são um
fenômeno complexo, para isso, é necessário que se categorize a estrutura dos blogs, pois
como já citamos, a que nos interessa é aquela que se assemelha dos formatos
jornalísticos/informativos. Para isso, nos valeremos das categorizações que Recuero
organizou. De acordo com a autora, os blogs atualmente não podem ser fundamentados em
apenas uma categoria de publicação.
Com base na divisão da pesquisadora, os blogs podem ser categorizados em: Blogs
Diários, em que se referem apenas na publicação da vida pessoal do usuário. Blogs de
Publicação, em “que destinam principalmente a trazer informação de modo opinativo. São
18
informações que são discutidas pelo autor, sempre discutidas ou comentadas (...) ”. Blogs
Literários, estes são destinados a contar uma história ficcional. Blogs de Clippings, que se
destinam apenas a organizar um apanhado de links disponíveis na web ou retalhos de outras
publicações e blogs com publicações mistas, que são aqueles que evidentemente misturam-se
posts pessoais entre posts informativos. De qualquer forma, a matéria-prima dos blogs é a
informação19.
Para Orihuela “Os visitantes procuram no blog o ponto de vista, o estilo e a temática
do seu autor (...). Finalmente, o blog é um meio sem editores”. (Orihuela, 2007, pág. 05).
Enfim, chegamos a um ponto em que o diferencial dos demais mecanismos de publicação-
padrão na internet, como sites, por exemplo, dos blogs: os jornalistas das redações on-line
18
RECUERO, s.d., pág. 04
19
Idem;
40. 40
ainda possuem a figura do Gatekeeper; entretanto, o blogueiro é o seu próprio editor. Nesse
sentido, o blog funciona sem editores, sem prazos e em muitas vezes, sem qualquer vínculo
com a grande mídia; a independência é o mote dos blogs. Segundo Orihuela (2007, pág. 06):
Diante da “realidade jornalística”, o blog possui uma resposta mais rápida, mais
impressionista e mais pessoal do que os meios de comunicação tradicionais e, por
sua vez, contribui para ampliar as fronteiras da realidade midiática. Um dos efeitos
da apropriação paulatina da rede por parte dos novos atores que produzem o
conteúdo é que a agenda pública já não é exclusivamente marcada pelos grandes
meios de comunicação. (ORIHUELA, 2007, pág. 06)
Dessa forma, podemos concluir que os blogs possuem grande interferência na procura
por conteúdo na rede. Os meios sociais devolvem às pessoas a possibilidade da comunicação
e opinião pública, incluindo a circulação da informação e a construção de uma nova agenda
pública, que em sua maioria, era até o momento gerenciado exclusivamente pelos meios
midiáticos tradicionais. Nesse sentido, os blogs contribuíram de forma significativa para
alavancar os meios sociais ou compartilhados que permitem acesso á informação
desvinculada de qualquer interesse hegemônico. É claro, que, um blog, por ser exatamente
pessoal, ainda que informativo, pode de alguma maneira, vincular uma opinião sobre o
conteúdo. Entretanto, é exatamente essa visão ou opinião independente que o internauta
procura neste tipo de ferramenta. Conforme aponta Recuero, “essa personalização acaba por
gerar empatia e debate, pois os leitores vêm a informação não como proveniente de uma fonte
“toda-poderosa”, mas como proveniente de alguém” (RECUERO, s.d., pág. 11).
É neste sentido que a mídia hegemônica (tradicional) vem perdendo força. Como
resultado, temos espaços de comunicação mais abertos, de interação e discussão que permite
não apenas uma segunda visão, e de forma mais independente, mas uma discussão entre leitor
e internauta e entre leitor e leitor, algo que até então não era possível em relação à mídia
tradicional. Dentro dessa idéia, segundo Primo (2001, online) apud Recuero (s.d., online),
“um weblog é constituído de interação mútua”, sendo essa interação fundamental para a
constituição de um espaço para o jornalismo democrático, simbolizado pelos posts,
comentários e reações, representados pela forma hipertextual dos textos20.
Muitos autores têm comparado os blogs como o novo jornalismo participativo, pois
muitos acreditam que já não é mais possível fazer jornalismo sem a colaboração dos leitores.
É o jornalismo participativo, ou jornalismo 3.0, é a terceira versão do jornalismo digital. Para
esses estudiosos, o jornalismo deve ser uma conversa com o leitor e não mais um envio
20
RECUERO, s.d., pág. 09
41. 41
unidirecional de mensagens no sentido um > todos. O jornalismo participativo, ou blogs, neste
caso, têm poder de intercâmbio e trata-se, portanto, de uma mudança cultural que surgiu com
a oportunidade da internet. O resultado é que as pessoas começam a fazer comunicação graças
aos instrumentos que a ciberinformação proporcionaram.
No jornalismo participativo, as comunidades virtuais tornam-se muito mais evidentes,
que são definidos pela convergência de indivíduos em redes sociais, pelo uso de novos meios
e pela união de texto, idéias e outros conteúdos informativos e de opinião. De acordo com
Varela (In: Orihuela, 2007, pág. 54): “os meios sociais de comunicação utilizam ferramentas
de comunicação, inter-relação e publicação na internet a fim de facilitar e estimular a
participação dos cidadãos na criação de conteúdos em rede”. Neste sentido, comunidades
virtuais, no jornalismo participativo “são grupos sociais que emergem da rede quando um
número suficiente de pessoas participa de discussões durante certo tempo, com os sentimentos
necessários, para formar redes de relações pessoais no ciberespaço” (Howard Rheingold apud
Varela, In: Orihuela, 2007, pág. 55).
Outra modificação que nos parece que os blogs têm promovido ao jornalismo online é
a relação que se estabelece com o hipertexto. Os blogs, por sua vez, são muito mais
hipertextuais que os jornais tradicionais online, pois linkam todas as fontes de outros blogs,
sites e portais, a fim de enriquecer o conteúdo do seu próprio blog. Segundo Recuero (s.d.,
pág. 11): “Os blogs podem, portanto, levar ainda mais longe a pluralidade de informações,
mas de uma forma organizada, trabalhando com uma filtragem crítica do conteúdo da mídia”.
É essa a forma mais democrática de se produzir e consumir informações, mas é claro que se
fazendo uma ressalva proposta por Varela (In: Orihuela, 2007, pág. 67) de que simplesmente
publicar não é o mesmo que informar, pois “o jornalismo, a investigação, e elaboração e a
difusão da informação necessitam de tempo, de recursos e de uma atitude ética e
profissional”.
Tamanha pluralidade de informações e publicações que em meio a tanto conteúdo faz-
se necessário analisar o fluxo dessa informação proveniente especificamente da internet, que
este espaço vantajoso, sugere novos filtros de informação. É evidente que as tecnologias da
informação deram à comunicação a possibilidade de cooperação, em última instância, ao
jornalismo a possibilidade de inserir-se no ciberespaço através da blogosfera. Por muitas
razões, a blogosfera é considerada para se avaliar a opinião dominante na internet sobre
qualquer tema ou assunto que esteja em pauta no jornalismo hegemônico, por isso, os blogs
converteram-se em um indicador de relevância das notícias veiculadas pelas versões
eletrônicas dos meios de comunicação tradicionais. É neste sentido que os blogs estão se