Comparação entre modelos Sandero produzidos na Europa e Brasil revela diferenças significativas de segurança
1. Crash-Test no Brasil Já
O Brasil vive uma situação caótica no trânsito. Em 2011 foram mais de 40.000 fatalidades em função de
acidentes de trânsito (http://carroonline.terra.com.br/noticia,9448,mais-de-61-000-mortes-no-transito-em-
2012). Muito se fala sobre a imprudência dos motoristas brasileiros e que este é o grande responsável por
estes números. Mas se as causas de tal mortandade forem analisadas com mais cuidado e rigor, veremos
que o fator humano é apenas um dos responsáveis por este cenário catastrófico.
É possível citar mais dois grandes responsáveis que nunca, ou quase nunca, são mencionados nas
reportagens sobre o tema: O primeiro deles, quando o acidente ocorre em rodovias, é a qualidade da via.
Muitas das vias brasileiras são do tipo simples, sem separação física entre os dois sentidos de rodagem.
São projetos antigos e obsoletos. Nestas vias é relativamente fácil ocorrer a colisão frontal entre os
veículos, onde as chances de sobrevivência são mínimas, sendo o tipo de colisão mais grave existente. O
outro fator, nunca citado, é a característica de segurança do veículo envolvido no acidente.
No geral, os automóveis comercializados no Brasil não oferecem os mesmos recursos de segurança (ABS,
Air-Bags adicionais, Controle de Tração e Controle Eletrônico de Estabilidade, Auxílio e Frenagem de
Emergência, dentre outros) que são relativamente comuns em mercados mais evoluídos. E, quando o
oferecem, são restritos aos modelos e versões mais caras, limitando seu acesso aos consumidores com
maior poder aquisitivo.
Na Europa, por exemplo, a lógica do mercado é outra. As versões mais baratas dos automóveis podem vir
equipadas com os mesmo itens de segurança das versões mais caras. Por lá a segurança tem grande
importância e serve inclusive como motivo de propaganda para as montadoras. Conquista o consumidor a
montadora que oferece o produto mais seguro. No Brasil, numa lógica perversa de mercado, segurança
automotiva é restrita a quem pode pagar por ela. E o consumidor, na maioria das vezes, dá mais atenção a
itens de aparência, tais como rodas, equipamento de som e outros penduricalhos.
Desde 2011 os automóveis fabricados no Brasil têm sido submetidos a Testes de Colisão Frontal pela
entidade não governamental LATIN NCAP (http://www.latinncap.com). Os Testes simulam, sob condições
controladas e padronizadas, a capacidade dos automóveis em proteger seus ocupantes dos efeitos da
colisão. Existem Testes adicionais que simulam outras formas de colisão ainda não adotadas pelo LATIN
NCAP, mas que virão a ser utilizadas ainda em 2013. Estes Testes de Colisão Frontal comprovaram que os
automóveis de fabricação brasileira, principalmente os do segmento popular, estão, ao menos, vinte anos
atrasados em relação a seus similares estrangeiros, tendo sido reprovados neste Teste.
Esta realidade foi recentemente constatada por órgãos de imprensa internacionais, as quais classificaram
os automóveis brasileiros como pouco seguros ou como armadilhas mortais
(http://carros.uol.com.br/noticias/redacao/2013/05/13/imprensa-internacional-descobre-que-carro-brasileiro-
e-inseguro.htm). Para a Associação dos Fabricantes de Veículos Automotores, ANFAVEA, que representa
os fabricantes de veículos instalados no Brasil, a culpa da alta mortandade verificada nas estradas
brasileiras é quase sempre do motorista ou das vias em que se trafega, nunca dos veículos produzidos
pelas montadoras por ela representada (http://economia.estadao.com.br/noticias/economia-geral,anfavea-
refuta-artigo-sobre-carros-mortais-e-culpa-motoristas-e-vias-ruins,153660,0.htm).
Estas montadoras, de capital estrangeiro, quando confrontadas com a realidade de trânsito brasileira, se
esquivam e limitam-se a dizer que seus automóveis estão de acordo com a legislação vigente. Pouco
importa se esta legislação é eficaz ou não na proteção à vida. De acordo com a Lei nº 11.910 de 18 de
março de 2009, a partir de 2014 será obrigatório que todo veículo brasileiro seja equipado com sistema de
Air-Bags e ABS. Porém, como veremos adiante, o fato do automóvel ser equipado com estes itens de
segurança não necessariamente significa que seja seguro, muito pelo contrário.
Assim podemos citar o automóvel JAC J3, de origem chinesa, equipado com ABS e Air-Bag, e que recebeu
apenas uma estrela dentre cinco possíveis no Teste de Colisão Frontal realizado pelo LATIN NCAP. A nota
final deste modelo, no quesito proteção aos ocupantes adultos (Motorista e Passageiro), foi de apenas 3,50
pontos, contra um máximo de 16,00 pontos de acordo com metodologia de Testes utilizada. As chances de
sobrevivência do usuário deste automóvel em caso de acidente com colisão frontal seriam mínimas uma
vez que, conforme o LATIN NCAP, temos:
“A estrutura não é capaz de suportar maiores cargas que as da batida. Foram observadas
estruturas perigosas na área do painel contra as quais poderiam impactar os joelhos dos
passageiros. A proteção proporcionada à parte inferior das pernas foi marginal. A área dos pés do
2. lado impactado sofreu uma grande deformação, aproximando-se os pedais dos pés do motorista, o
que representa um risco para a parte inferior das pernas pela intrusão e o bloqueio dos pedais. O
painel na área dos pés começou a se desprender do caixilho, deixando um acesso direto ao
compartimento da parte inferior do carro.”.
Este automóvel é comercializado livremente no Brasil, onde houve grande divulgação nos meios de
comunicação quanto às suas “excelentes” qualidades e pelo fato de ser “completão”. Pelos resultados do
Teste de colisão deveria ser banido do mercado brasileiro, pois não é seguro em caso de acidentes
podendo levar seus ocupantes a óbito ou mesmo sequelas gravíssimas.
Os automóveis populares brasileiros utilizam plataformas obsoletas, já substituídas em seus países de
origem, e adotam métodos produtivos com custo reduzido. Há informações de que as montadoras praticam
economia até mesmo no processo de solda o qual utiliza intensivamente energia elétrica, um insumo que
responde por grande parte dos custos de produção do automóvel
(http://g1.globo.com/carros/noticia/2013/05/indice-de-mortes-por-acidentes-de-carro-no-brasil-e-4-vezes-o-
dos-eua.html).
Também utilizam matérias primas obsoletas que não incorporaram os últimos avanços tecnológicos
desenvolvidos, mesmo estando disponíveis localmente, como os aços de maior resistência. É importante
notar que no Brasil utiliza-se em maior proporção os aços do tipo Carbono, ao passo que na Europa os aços
do tipo TRIP e Dual Phase são utilizados em maior proporção. Estes aços, que oferecem resistência
mecânica superior, são utilizados em conjunto com uma estrutura de deformação progressiva, que em caso
de colisão protegem os ocupantes de maneira mais eficiente, minimizando a probabilidade de ferimentos e
mesmo óbito (http://www.vrum.com.br/app/301,19/2012/08/02/interna_noticias,46240/sem-seguranca-meu-
chapa.shtml).
Em função das diferenças existentes nas plataformas utilizadas, no processo produtivo adotado e nas
matérias primas empregadas, é interessante saber se existe diferenças detectáveis no Teste de Colisão
para um mesmo modelo, porém produzido para a Europa e para o Brasil. Sendo idênticas as metodologias
utilizadas pelo LATIN NCAP e pelo EURO NCAP (http://www.euroncap.com), é possível comparar somente
a pontuação obtida pelo mesmo modelo oferecido simultaneamente no Brasil e na Europa, para um mesmo
Teste, neste caso, e por enquanto, para o Teste de Colisão Frontal.
Uma das comparações possíveis é a do modelo SANDERO, fabricado no Brasil pela Renault e na Europa
pela Dacia. Para o Teste de Colisão Frontal, quesito Proteção aos Adultos, o SANDERO oferecido na
Europa conseguiu uma pontuação de 12,00 pontos ao passo que seu similar brasileiro conseguiu apenas
4,61 pontos. Esta diferença comprova que existem diferenças significativas entre os modelos produzidos
para o consumidor europeu e para o consumidor brasileiro.
Como já exposto antes, alterações nas plataformas utilizadas, no processo produtivo adotado e nas
matérias primas empregadas, além da redução dos sistemas de segurança existentes, certamente são os
grandes responsáveis por esta diferença entre as unidades testadas. Portanto é inevitável perguntar: Por
que o consumidor europeu é privilegiado em relação ao consumidor brasileiro? Por que o consumidor
europeu tem a sua disposição veículos mais seguros? Como veremos a seguir a discrepância verificada
para o SANDERO significa a diferença entre sair andando após o acidente e de sair na maca para o
hospital, com mínimas chances de sobrevivência.
Veja abaixo a comparação entre os dois automóveis, realizada pela página Crash-Test no Brasil Já
(https://www.facebook.com/CrashTestBrasil):
3. A Organização Mundial de Saúde, OMS, no relatório “World Report on Road Traffic Injury Prevention”
(http://www.who.int/violence_injury_prevention/publications/road_traffic/world_report/en/) relaciona os
seguintes fatores que contribuem com o maior grau de severidade de uma colisão:
• Proteção inadequada proporcionada pelo automóvel;
• Proteção inadequada proporcionada pela rodovia;
• Não utilização de sistemas de segurança nos automóveis;
• Velocidade excessiva e não apropriada;
• Uso de bebidas alcólicas.
E também acrescenta que:
“Em países de baixa renda (Ou em desenvolvimento), a regulamentação dos padrões de segurança
dos veículos automotores não é tão sistemática como ocorre em países de alta renda (Ou de
primeiro mundo). Muitos avanços de Engenharia que são encontrados em veículos disponíveis para
estes países de alta renda não são padronizados em veículos de países de baixa renda.”
Verifica-se que as características do automóvel têm sim correlação direta com o grau de severidade de um
acidente de trânsito. A OMS por fim faz a seguinte declaração:
“Se todos os automóveis fossem projetados para serem iguais em padrão ao melhor automóvel
atualmente disponível de cada classe, então uma estimada redução de 50% de todas as fatalidades
e ferimentos incapacitantes poderiam ser evitadas”.
Esta declaração contraria os argumentos da ANFAVEA: De que seus veículos, mesmo os que foram
reprovados em Testes de Colisão pelo LATIN NCAP, não têm nenhuma influência na mortandade do
trânsito brasileiro e que suas “excelentes características” são responsáveis pela preservação da vida em
caso de acidente. Vejam a seguir:
4. “A realidade é que muitos ocupantes são salvos exatamente pela boa qualidade dos veículos
produzidos no País, com a adoção de todos os quesitos de segurança passiva e ativa
regulamentados pelo Contran. Mais ainda: a indústria cumpre todas as prescrições de segurança
regulamentadas pelos órgãos de governo e atestadas por Testes realizados conforme
procedimentos normatizados e auditáveis.”.
É uma surpreendente justificativa, forjada para atender aos obscuros interesses das montadoras, os quais
serão discutidos adiante, e que não resiste a uma simples análise crítica utilizando os péssimos e
vexaminosos resultados obtidos nos Testes de Colisão realizados pelo LATIN NCAP:
“Os automóveis produzidos por estas montadoras, principalmente os populares, quando colidem
frontalmente contra uma barreira fixa a velocidades iguais a 64km/h, se transformam em gaiolas
mortais, vindo a provocar ou a morte de seus ocupantes ou sequelas gravíssimas. Se o mesmo
acidente tivesse ocorrido com um automóvel aprovado pelo LATIN NCAP ou pelo EURO NCAP
(Classificado nesta como cinco estrelas a partir de vários tipos de Testes de colisão), certamente os
passageiros teriam sofrido, quando muito, apenas escoriações e o grande susto do evento.”.
Em relação ao obscuro interesse das montadoras temos que a margem de lucro do setor automobilístico
brasileiro gira em torno de 10% contra uma média mundial de 5% e de apenas 3% nos Estados Unidos da
América (http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/joel-silveira-leite-margem-de-lucro-das-montadoras-no-
brasil-e-tres-vezes-maior-que-nos-eua.html). A partir das discussões prévias percebe-se que existe uma
perniciosa e criminosa relação entre lucro obtido e Óbitos/Feridos no trânsito:
“QUANTO MENOR A SEGURANÇA DO AUTOMÓVEL, MAIOR A GRAVIDADE DOS
FERIMENTOS ORIUNDOS DOS ACIDENTES”, conforme a OMS.
E sendo o automóvel brasileiro menos seguro que seu simular europeu, consequência da “pioria contínua”
em projetos, matérias-primas e métodos produtivos, temos que o custo de produção é MENOR com
consequente MAIOR lucro por unidade produzida, como citado anteriormente. Seria o caso de se perguntar
se os acionistas destas montadoras estão satisfeitos com os resultados de suas operações brasileiras...
E não é que estão satisfeitos! Conforme divulgado pela imprensa, as montadoras brasileiras remetem
grandes lucros para suas matrizes, localizadas em países como Estados Unidos da América, Alemanha,
Itália, Japão, França, Coréia do Sul e China. Entre 2009 e 2012 foram remetidos pelo setor automobilístico
cerca de US$14,6 bilhões para o exterior (http://www.viomundo.com.br/denuncias/estadao-montadoras-
remeteram-u-146-bi-em-tres-anos-e-meio.html). Disso deduz-se que:
“QUANTO MENOR O CUSTO DE PRODUÇÃO DO AUTOMÓVEL, A QUAL É OBTIDA ATRAVÉS
DA REDUÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS DE SEGURANÇA QUE GARANTEM A
SOBREVIVÊNCIA DE SEUS PASSAGEIROS EM CASO DE ACIDENTE, MAIOR É O LUCRO
OBTIDO POR UNIDADE PRODUZIDA. RESULTADO FINAL: ACIONISTA SATISFEITO COM A
SUBSTANCIAL REMESSA DE LUCROS PARA AS MATRIZES.”
Para entendermos o impacto desta política de baixo custo de produção dos automóveis no Brasil, via
redução de suas características de segurança, vamos comparar o número de óbitos para cada 100.000
automóveis entre o Brasil e a Europa (Base 2009 e 2010):
“Enquanto a Europa possui uma frota de 267.000.0002009
de automóveis e o Brasil 64.817.9742010
tem-se uma taxa de mortalidade 4,9 vezes inferior na Europa. Tal fato também reflete a
disponibilidade de melhores estradas e de melhores automóveis, além da possível maior
fiscalização das autoridades de trânsito e Justiça mais atuante.”.
E qual seria a relação da frota de automóveis com esta estatística, do ponto de vista de resultados de Teste
de Colisão? Para responder a esta pergunta foi realizada, pela página Crash-Test no Brasil Já
(https://www.facebook.com/CrashTestBrasil), um estudo comparativo entre os dez automóveis mais
vendidos na Europa e no Brasil em 2012. São comparados os resultados obtidos no Teste de Colisão
Frontal, nos quesitos Proteção aos Adultos e Proteção às Crianças.
5. Percebe-se grande diferença entre os dez automóveis mais vendidos de cada região. A nota média dos dez
mais do Brasil, quesito Proteção aos Adultos, foi de apenas 5,18 pontos ao passo que para os dez mais da
Europa foi de 15,10 pontos, uma diferença de quase 200%! No quesito Proteção às Crianças esta diferença
foi de mais de 80%!
Fica claro que na Europa os veículos mais comercializados são muito mais seguros que os veículos mais
comercializados no Brasil, que são justamente os do segmento popular, aqueles com piores resultados no
Teste de Colisão Frontal. Evidentemente o fato de existirem veículos mais seguros circulando implica em
maior proteção de seus ocupantes e da população como um todo. Na Europa, em caso de acidentes, a
probabilidade das pessoas se ferirem ou de virem a óbito, é significativamente MENOR. No Brasil é
justamente o contrário. Aqui morre-se 4,9 vezes mais que na Europa!
Aplicada a estimativa da OMS, se todos os automóveis comercializados no Brasil fossem do melhor padrão
possível, em cada classe, poderia haver uma redução anual de mais de 20.000 fatalidades, conforme
cenário de 2011, fora os feridos e definitivamente incapacitados. O impacto nos gastos governamentais
certamente seria significativa...
Haveria enorme redução nos gastos do Sistema Único de Saúde com o tratamento dos feridos, das
concessões do Auxílio Doença (Para aqueles com Carteira de Trabalho assinada), das indenizações pagas
pelo DPVAT, das aposentadorias por invalidez e das pensões pós-morte. Caso não houvesse toda esta
tragédia anunciada, os cidadãos afetados poderiam continuar normalmente com sua vida, inclusive
continuando a pagar seus elevados impostos da forma como sempre fizeram. Apenas para ilustrar, em 2012
foram pagas mais de 500.000 indenizações do DPVAT!! (http://carroonline.terra.com.br/noticia,9448,mais-
de-61-000-mortes-no-transito-em-2012)
Uma possível solução para este problema é atualizar o Código Brasileiro de Trânsito com a exigência de
classificação mínima, igual a, por exemplo, 4 Estrelas, no Teste de Colisão (Crash-Test, nas diversas
variações: Frontal, Lateral, etc.), a ser realizado por entidade independente, como o LATIN NCAP, e com
base em metodologias já utilizadas com sucesso em outros países, como aquelas adotadas pelo EURO
6. NCAP. O resultado obtido nos Testes poderia ser levada ao conhecimento do público através de Etiqueta
de Conformidade de Produto, a exemplo do que ocorre com as etiquetas que mostram a eficiência
energética dos automóveis, emitidas pelo INMETRO (PBE, Programa Brasileiro de Etiquetagem,
http://www2.inmetro.gov.br/pbe/). Assim este público teria a informação necessária para decidir sobre a
compra ou não do automóvel, tendo como critério sua capacidade de proteção à vida em caso de acidente.
Como consequência imediata desta política a montadora seria obrigada a aprimorar seu produto através do
uso de plataformas mais modernas, de matérias-primas mais avançadas, de métodos produtivos adequados
e do uso de sistemas de segurança tecnologicamente atualizados, além de não restringir estes recursos às
versões mais caras de cada modelo. O automóvel somente deveria ter sua comercialização aprovada se
obtivesse esta classificação mínima, de 4 Estrelas. Os automóveis reprovados teriam sua comercialização
interrompida até que se adequassem à regra.
Finalizando,a segurança viária é caso de saúde pública no Brasil e ações urgentes são necessárias para
melhorar este trágico quadro.