O documento descreve a vida de um emigrante português que trabalha como limpa-vias no metro de Nova Iorque. Ele escreve uma carta ao irmão contando sobre seu trabalho difícil e sobre como tem recebido grãos de arroz misteriosamente que o ajudam a alimentar sua família de nove. Ele acredita que é Deus quem envia esta ajuda.
3. O conto Arroz do Céu narra o quotidiano de um emigrante de leste cujo
trabalho é o de limpar o lixo que os cidadãos inconscientes deitam para a
rua, nomeadamente para os respiradouros das galerias do metro.Vive
então como uma toupeira ou rato dos canos, metáfora perfeita da sua
condição social, gozando apenas a luz do sol de forma indirecta – aquela
que “cai”no respiradouro. Mas, no outro respiradouro próximo da Igreja,
aos domingos, acontece sempre um estranho fenómeno. Sempre que o
sino toca, festivo, anunciando um casamento, pelo respiradouro caem
grãos de arroz aos milhares, que o limpa-vias tem que apanhar. Não é lixo
para ele. É uma dádiva vinda dos céus. É ouro para si e para a sua família
faminta. E ele agradece aquela dádiva com a humildade dos
desprotegidos. Afinal, aquele arroz vem do céu, porque não? O casamento
não acontece com a bênção de Deus? Logo… (Deus escreve direito por
linhas tortas) pelo respiradouro do metro.
Início
4. José Rodrigues Miguéis foi um autor que nasceu em
Lisboa, em Dezembro de 1901, em Alfama
(Lisboa), formando-se em Direito, em 1926. Desde novo
que sempre trabalhou na imprensa, vindo a ser
Presidente da Segunda Liga da Mocidade
Republicana, mais tarde. Além de ser Presidente da
Segunda Liga da Mocidade Republicana, também era
director do semanário Globo, onde passou a ser
conhecido como orador. Mais tarde foi
advogado, professor do ensino secundário, secretário da
Liga Propulsora da Instrução e colaborou com Raúl
Brandão na reedição duma série de leituras primárias.
Depois de ter passado estes anos todos fora, viveu nos
Estados Unidos até à sua morte, em 27 de Outubro de
1980.
Início
5. Pessoa que
Limpa-vias
limpa as vias
Subway Máquina
(Metro)
Chewing gum Chicletes
Início
7. Nova Iorque, 4 Dezembro de 1965
Escrevo esta carta que espero te vá encontrar de boa saúde junto dos teus.
Já passaram dez anos desde a minha partida. Tenho tanto para te contar!
Quando cá cheguei com a minha esposa, senti-me perdido. O meu primeiro emprego foi a trabalhar nas
escavações, só escuridão, poeira, etc. Agora já há sete anos que trabalho no subway como limpa-vias.
Continuo na escuridão, apanho papéis, pontas de cigarros, chewing gum, limpo as casas de banho, ajudo a
chegar graxa nas calhas e até já ajudei a remover cadáveres.
Aqui a minha vida não é fácil. Somos nove bocas para alimentar, eu, a esposa e sete filhos. Isto para ti é uma
novidade, mas é verdade. Já tens sete sobrinhos desejosos de te conhecer.
A minha esposa não tem emprego, nem podia, já muito faz ela, cuidar da casa e dos filhos, já dá trabalho
suficiente.
Olha mano, todos os meses acontece o mesmo, sobra mês e falta dinheiro, mas há uns tempos para
cá, aconteceu-me algo inexplicável.
Estava na minha rotina diária, apanhando tudo o que os outros deixam cair, quando vejo aos meus pés grãos
de arroz. Então olhei para o alto para ver quem mo atirava, mas o que vi foi uma luz distante e nada mais.
Varri o arroz, apanhei-o para um saco de papel que trazia no bolso e levei-o para casa.
Ao chegar a casa contei à minha esposa o acontecido, ela olhou para o arroz um pouco espantada, em
seguida lavou-o e cozinhou-o sendo este o nosso jantar. Isto vem-me acontecendo vezes sem conta e até
hoje, a única explicação que encontro é que Alguém lá no Alto resolveu ajudar-me nesta vida árdua e difícil.
Meu irmão, a minha vida não é fácil, mas graças a Deus tenho tido saúde, muita força, e tenho conseguido
dar o essencial à minha família.
Agora vou-me despedir, prometendo não demorar a escrever-te novamente e espero ansiosamente notícias
tuas.
Um grande e saudoso abraço
Início
António