Este documento fornece informações sobre um projeto do Programa de Iniciação à Docência (PIBID) que aborda a cultura afro-brasileira no módulo 1. O projeto é conduzido por 5 professoras e tem como objetivo apresentar aos alunos aspectos da cultura africana e sua influência na cultura brasileira.
GUIA DE APRENDIZAGEM 2024 9º A - História 1 BI.doc
Módulo Racismo
1. PIBIDPrograma de Iniciação à Docência
PROJETO
BASE ARTÍSTICA E REFLEXIVA
PROFESSORAS: BRUNA MARIA, GORETTE ANDRADE,
HAIANY LEÔNCIO, MILENA DAFFANI, STEFANIE NASCIMENTO
MÓDULO I
Cultura Afro: a África está em nós!
ALUNO(A):____________________________________________________________
2. 2
ELE QUEM MESMO?1
(Martha Medeiros)
Depois de um bom tempo dizendo que eu era a mulher da vida dele, um belo
dia eu recebo um e-mail dizendo:"olha, não dá mais".
Tá certo que a gente tava quase se matando e que o namoro já tinha acabado
mesmo, mas não se termina nenhuma história de amor (e eu ainda o amava muito) com
um e-mail, não é mesmo?Liguei pra tentar conversar e terminar tudo decentemente e ele
respondeu: "mas agora eu to comendo um lanche com amigos".
Enfim, fiquei pra morrer algumas semanas até que decidi que precisava ser
uma mulher melhor para ele.
Quem sabe eu ficando mais bonita, mais equilibrada ou mais inteligente, ele
não volta pra mim?
Foi assim que me matriculei simultaneamente numa academia de ginástica,
num centro budista e em um curso de cinema.
Nos meses que se seguiram eu me tornei dos seres mais malhados, calmos,
espiritualizados e cinéfilos do planeta.
E sabe o que aconteceu? Nada, absolutamente nada, ele continuou não
lembrando que eu existia.
Aí achei que isso não podia ficar assim, de jeito nenhum, eu precisava ser ainda
melhor pra ele, sim, ele tinha que voltar pra mim de qualquer jeito.
Decidi ser uma mulher mais feliz, afinal, quando você é feliz com você mesma,
você não põe toda a sua felicidade no outro e tudo fica mais leve.
Pra isso, larguei de vez a propaganda, que eu não suportava mais, e resolvi me
empenhar na carreira de escritora, participei de vários livros, terminei meu próprio livro,
ganhei novas colunas em revistas, quintupliquei o número de leitores do meu site e nada
aconteceu.
Mas eu sou taurina com ascendente em áries, lua em gêmeos e filha única!
Eu não desisto fácil assim de um amor, e então resolvi que eu tinha que ser uma super
ultra mulher para ele, só assim ele voltaria pra mim.
Foi então que passei 35 dias na Europa, exclusivamente em minha companhia,
conhecendo lugares geniais, controlando meu pânico em estar sozinha e longe de casa,
me tornando mais culta e vivida.
Voltei de viagem e tchân, tchân, tchân, tchân: nem sinal de vida.
Comecei um documentário com um grande amigo, aprendi a fazer strip, cortei
meu cabelo 145 vezes, aumentei a terapia, li mais uns 30 livros, ajudei os pobres, rezei
pra Santo Antônio umas 1.000 vezes, torrei no sol, fiz milhares de cursos de roteiro,
1 Disponivel em:
<http://www.senado.gov.br/senado/portaldoservidor/jornal/jornal93/mania_escrever2.aspx>.
3. 3
astrologia e história, aprendi a nadar, me apaixonei por praia, comprei todas as roupas
mais lindas de Paris.
Como última cartada para ser a melhor mulher do planeta, eu resolvi ir morar
sozinha.
Aluguei um apartamento charmoso, decorei tudo brilhantemente, chamei
amigos para a inauguração, servi bom vinho e comidinhas feitas, claro, por mim, que
também finalmente aprendi a cozinhar.
Resultado disso tudo: silêncio absoluto.
O tempo passou, eu continuei acordando e indo dormir todos os dias querendo
ser mais feliz para ele, mais bonita para ele, mais mulher para ele.
Até que algo sensacional aconteceu.
Um belo dia eu acordei tão bonita, tão feliz, tão realizada, tão mulher, que eu
acabei me tornando Mulher demais para ele. Ele quem mesmo?
ILÊ PÉROLA NEGRA2
(Daniela Mercury)
O canto do negro veio lá do alto
É belo como a íris dos olhos de Deus, de Deus
E no repique, no batuque, no choque do aço
Eu quero penetrar no laço afro que é meu, e seu
Vem cantar meu povo, vem cantar você
Bate os pés no chão moçada
E diz que é do ilê a yê
Lá vem a negrada que faz o astral da avenida
Mas que coisa tão linda, quando ela passa me faz chorar (bis)
Tú és o mais belo dos belos, traz paz, riqueza
Tens o brilho tão forte por isso te chamo de pérola negra (bis)
Êêê, pérola negra
Pérola negra ilê a yê, ilê a yê
Minha pérola negra (bis)
2 Disponível em: <http://www.vagalume.com.br/daniela-mercury/ile-perola-negra.html>.
4. 4
Lá vem a negra que faz o astral da avenida...
Com sutileza cantando e encantando a nação
Batendo bem forte cada coração
Fazendo subir a minha adrenalina
Como dizia Buziga
É de mim
Em me pé nagô de ilê
É de mim
Em me pé nagô de ilê a yê
Êêê, pérola negra…
VOCÊ SABE O QUE É UMA HASTAG?!3
Para saber usar a hashtag é preciso entender o que elas são. A hashtag é uma
palavra-chave procedida do símbolo # e serve para marcar algum assunto nas redes
sociais. A hashtag ajuda a localizar tudo que foi escrito sobre o assunto, pois ela
transforma a palavra-chave em Hiperlink. Resumindo, ao colocar o símbolo # na frente
de uma palavra, ela vira um link que irá mostrar todas as postagens públicas da mesma
rede social que utilizaram a mesma hashtag.
3 Disponível em: < http://blog.agenciahive.com.br/hashtag/>.
5. 5
Tudo começou no Twitter, e de repente lá estavam elas no Facebook,
Instagram, Tumblr entre outras redes sociais. Com a popularização dessa ferramenta, o
site Mashable criou algumas dicas para você não errar na hora de usá-las. Confira as
dicas:
● Não exagere nas #hashtag.
Use hashtag com moderação! Pessoas que exageram não são muito bem vistas, e
é chato ver postagens com centenas de #hashtags
● Sem relação com assunto.
Postar foto de comida e #sol #nuvem #céu #carro, por exemplo, vai contra a
principal finalidade da ferramenta, além de desorganizar uma certa categoria, dá
impressão de que a pessoa quer chamar atenção.
● Criar # para quase todas as palavras.
#Desde #quando #passamos #a #falar #dessa #forma? Fica muito confuso botar
hashtag em todas as palavras.
● Hashtag gigante.
Escrever mais de uma palavra para uma # não tem problema, mas quando
alguém junta várias palavras, fica feio e ninguém consegue entender nada. Tente fazer
uma # curta.
● Pesquise a # mais apropriada para cada rede social.
Usar uma hashtag que está bombando no Twitter não significa que quando for
usar ela no Instagram irá garantir bons resultados. Quando for usar as # pesquise antes,
veja o que está sendo falado em cada uma das redes sociais.
Agora que você já aprendeu a usar, corre lá e bombe suas redes sociais!
#BoaSorte.
CAMPANHA ‘#SOMOSTODOSMACACOS’ DIVIDE OPINIÕES NA
INTERNET4
Campanha iniciada por Neymar causou polêmica nas redes sociais
Por Philippe Azevedo
A campanha #somostodosmacacos levantada pelo jogador Neymar ganhou
uma repercussão imensa após Daniel Alves comer uma banana atirada por torcedores
racistas durante o jogo entre Barcelona e Villareal.
4 Disponível em: < http://www.portaldenoticia.com/campanha-somostodosmacacos-divide-opinioes-na-
internet/>.
6. 6
No entanto, a campanha dividiu a opinião de internautas e famosos. De um
lado, Claudia Leitte, Michel Teló, Luciano Huck, jogadores brasileiros, entre outros,
aderiram a hastag #somostodosmacacos.
Por outro lado, grupos que lutam contra o racismo, como o rapper Emicida, não
gostaram da expressão e decidiu iniciar uma nova campanha: #nãosoumacaco. “Eu não
sou um macaco. As pessoas que são humilhadas no dia a dia por racistas que
permanecem impunes achando na rua achando que é ela, também não (sic)”, disse o
rapper no Twitter.
O assunto rendeu ainda mais polêmica quando a agência de publicidade
Loducca revelou que foi responsável pela hastag, criada em março quando Neymar foi
vítima de racismo, e aguardavam o momento oportuno para lança-la.
7. 7
#SOMOS TODOS MACACOS COISA NENHUMA5
Por : Marcos Sacramento
A reação foi rápida. Horas depois de Daniel Alves reagir com maestria a uma
provocação racista, Neymar postou no Instagram uma foto segurando uma banana com
a hashtag “somostodosmacacos”. O protesto viralizou e ganhou a adesão de famosos:
5 Disponível em: < http://www.diariodocentrodomundo.com.br/somos-todos-macacos-coisa-nenhuma/>.
8. 8
Luciano Huck e Angélica, Ivete Sangalo, Alexandre Pires e até Inri Cristo posaram
com a banana.
Seria tudo lindo e altruísta não fossem duas coisas.
A primeira é que nós, negros e pardos, não somos e nem gostamos de ser
chamados de macacos. Chamar uma pessoa de cor de macaco é um dos xingamentos
mais comuns e cruéis. Coloca o negro em uma posição subalterna em relação ao branco,
ao aludir a um animal que apesar de semelhante aos humanos está alguns andares
abaixo na escala evolutiva. É pesado e cheio de subtextos, diferente de “tição”, por
exemplo, que alude só ao tom da pele.
Admitir que “somos todos macacos” é uma defesa equivocada e perigosa.
Equivocada porque nenhum racista questiona que os humanos são primatas. Perigosa
porque traz o significado implícito de que somos todos iguais, mas para combater o
racismo de frente é melhor destacar as diferenças.
O outro problema é que o movimento “Somos todos macacos” não foi tão
espontâneo. A sacada de Neymar na verdade já estava planejada por uma agência de
publicidade. Até aí tudo bem, porque as ofensas são tão corriqueiras que não surpreende
deixar uma resposta pronta.
Só que hoje a grife do Luciano Huck lançou a camisa referente à campanha.
Com uma estampa fazendo referência à manjada banana de Andy Warhol, está sendo
vendida a 69 reais. A imagem promocional mostra um casal de modelos brancos.
Daniel Alves protestou com espontaneidade e irreverência. Seu ato já pode ser
considerado um marco na luta contra o racismo no futebol. Mas não significa que
devemos dar de ombros para o racismo e achar que a melhor saída é ignorar a ofensa.
Ele fez o melhor que possível naquele momento, em pleno campo e antes de
cobrar um escanteio.
Foi notícia no mundo inteiro e o problema do racismo voltou para a agenda de
discussão sem a necessidade de hashtags artificiais e famosos forçando semblante
indignado no Instagram.
Aí vem a tal campanha e na cola dela uma camisetinha bem oportunista, sem
buscar questionamentos mais elaborados sobre a questão racial. Tudo bem superficial,
na velocidade das redes sociais, sem se prender a questões mais profundas como
defender cotas raciais ou questionar porque morrem mais negros do que brancos por
causas violentas.
Talvez porque, como eles dizem, “somos todos macacos”, ou seja, iguais, e
racismo é uma coisa de idiotas que estão lá do outro lado do mundo.
9. 9
ONDE VOCÊ GUARDA SEU RACISMO?6
Pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo mostrou que grande parte dos
brasileiros - 87% - admite que há discriminação racial no país, mas apenas 4% da
população se considera racista.
Há racismo sem racistas?
A campanha Onde você guarda o seu racismo? tem o objetivo de provocar uma
reflexão individual e, principalmente, conscientizar a população de que a luta contra o
preconceito racial é responsabilidade de todas/os.
"O racismo só se manifesta diretamente? Não e não! Agressões físicas e verbais
diretas manifestam racismo sim, mas não só elas. Falta de representação é racismo
violento! Desamor e desafeto também! Negação da história de um povo também é!
Olhares, emanações, expressões, diversas formas de tratamento podem ser racismo
que, se somado ao longo da vida, mata trajetórias e gera incríveis feridas em toda
uma população, tolhe seu caminho. Todo um leque de ação no mundo vê e trata a/o
sujeita/o negra/o como alvo de violações, ainda que de forma supostamente velada
e inconsciente."
(Natália Maria Alves Machado, "Mulheres Negras e Relações Afetivas: novas
linguagens hão de ser sentidas!". NOSSO JORNAL 2ª Edição: Suplemento Mulheres
Negras, página 07).
6 Disponível em: <http://nossocoletivonegro.blogspot.com.br/p/campanha-onde-voce-guarda-o-seu-
racismo.html>.
10. 10
RACISMO
(Luís Fernando Veríssimo)
- Escuta aqui, ó criolo…
- O que foi?
- Você andou dizendo por aí que no Brasil existe racismo.
- E não existe?
- Isso é negrice sua. E eu que sempre te considerei um negro de alma branca… É, não
adianta. Negro quando não faz na entrada…
- Mas aqui existe racismo.
- Existe nada. Vocês têm toda a liberdade, têm tudo o que gostam. Têm carnaval, têm
futebol, têm melancia… E emprego é o que não falta. Lá em casa, por exemplo, estão
precisando de empregada. Pra ser lixeiro, pra abrir buraco, ninguém se habilita.
Agora, pra uma cachacinha e um baile estão sempre prontos. Raça de safados! E ainda
se queixam!
- Eu insisto, aqui tem racismo.
- Então prova, Beiçola. Prova. Eu alguma vez te virei a cara? Naquela vez que te
encontrei conversando com a minha irmã, não te pedi com toda a educação que não
aparecesse mais na nossa rua? Hein, tição? Quem apanhou de toda a família foi a minha
irmã. Vais dizer que nós temos preconceito contra branco?
- Não, mas…
- Eu expliquei lá em casa que você não fez por mal, que não tinha confundido a menina
com alguma empregadoza de cabelo ruim, não, que foi só um engano porque negro é
burro mesmo. Fui teu amigão. Isso é racismo?
- Eu sei, mas…
- Onde é que está o racismo, então? Fala, Macaco.
- É que outro dia eu quis entrar de sócio num clube e não me deixaram.
- Bom, mas pera um pouquinho. Aí também já é demais. Vocês não têm clubes de
vocês? Vão querer entrar nos nossos também? Pera um pouquinho.
- Mas isso é racismo.
- Racismo coisa nenhuma! Racismo é quando a gente faz diferença entre as pessoas por
causa da cor da pele, como nos Estados Unidos. É uma coisa completamente diferente.
Nós estamos falando do crioléu começar a freqüentar clube de branco, assim sem mais
nem menos. Nadar na mesma piscina e tudo.
- Sim, mas…
- Não senhor. Eu, por acaso, quero entrar nos clubes de vocês? Deus me livre.
- Pois é, mas…
- Não, tem paciência. Eu não faço diferença entre negro e branco, pra mim é tudo igual.
Agora, eles lá e eu aqui. Quer dizer, há um limite.
- Pois então. O …
- Você precisa aprender qual é o seu lugar, só isso.
11. 11
- Mas…
- E digo mais. É por isso que não existe racismo no Brasil. Porque aqui o negro conhece
o lugar dele.
- É, mas…
- E enquanto o negro conhecer o lugar dele, nunca vai haver racismo no Brasil. Está
entendendo? Nunca. Aqui existe o diálogo.
- Sim, mas…
- E agora chega, você está ficando impertinente. Bate um samba aí que é isso que tu faz
bem.
IDENTIDADE
(José Carlos Limeira)
Houve um tempo em que
constava de sua carteira
o dado cor
na minha: pardaescuracabeloscarapinhados.
Diante do espelho, me pergunto
que faço com estes lábios grossos,
este nariz achatado?
Que faço com esta memória
de tantos grilhões,
destas crenças me lambendo as entranhas?
Será que não é demais não ter o direito
de ser negro?
Causa espanto?
Pardaescura é o aspecto que vocês deram
à nossa história.
Morra de susto!
Sou, vou sempre ser: NEGRO!
ENE, É, GÊ, ERRE, Ô.
Aqui, Ô!
In: Atabaques
12. 12
MALCOLM X e MARTIN LUTHER KING7
Dois líderes negros e duas formas diferentes de lutar pelos direitos dos negros
americanos.
Por Luiz Augusto
Malcolm X e Marthin Luther King foram dois líderes negros mundiais.
Lutaram por suas convicções e incanssávelmente pelos direitos civis dos negros norte
americanos na década de 60, mas percorreram caminhos diferentes para terem a
consideração, conceito, idolatria por de alguns e reconhecimento e respeito por muitos.
Malcolm X teve uma adolescência problemática por causa de seus problemas com a Lei.
Foi preso e dentro da prisão se converteu ao Islamismo e quando saiu começou
a militar contra a segregação racial no Estados Unidos, possuía um discurso radical e
extremista diante da supremacia branca e dos conflitos raciais que abalava o país
naquele momento.
Já Martin Luther King diferentemente de seu "companheiro" de luta teve uma
vida mais tranquila. Era pastor protestante, ativista político e formado em sociologia,
tinha ideias pacifistas, um discursos paz e amor ao próximo, uma campanha de não
violência, lutava com ações pacifistas, sonhava com integração racial entre negros e
brancos e chegou a ganhar o Prêmio Nobel da paz em 1964.
Modos diferentes de lutar e fim trágico
O que os diferenciava também era a religião que cada um seguia, Martim
L.King era da igreja protestante e Malcolm X era convertido ao islamismo. Duas
7 Disponível em: < http://auggusto.blogspot.com.br/2009/04/malcolm-x-e-martin-luther-king.html>.
13. 13
pregações totalmente diferentes. Mas era na religião que eles encontravam forças para
lutar contra o racismo e a opressão da maioria branca de seu país.
Ambos lutaram pelo direitos dos afrodescendentes norte americanos cada um a
seu modo sem parar, e tiveram a morte como premio, os dois foram brutalmente
assassinados aos 39 anos.
KU KLUX KLAN - O que é isso?8
Cartaz da época, com o qual os membros da Ku Klux Klan propagavam sua seita e
recrutavam novos integrantes.
Por Demercino Júnior
Em 1865, no sul dos Estados Unidos, surgiu um grupo de racistas, que se
vestiam com roupas brancas e capuzes, montavam cavalos e perseguiam negros (ex-
escravos, libertos na Guerra de Secessão) e seus defensores, denominado Ku Klux Klan.
Formada por jovens veteranos da Confederação Sulista (Calvin Jones, Frank
McCord, Richard Reed, John Kennedy, John Lester e James Crowe) com o intuito de
8 Disponível em: < http://www.brasilescola.com/historiag/ku-klux-klan.htm>.
14. 14
prolongar a fraternidade das armas, a Ku Klux Klan se tornou grande com o decorrer do
tempo, abrangendo outros estados. O nome vem do grego “kuklos”, que significa
círculo.
O que começou como uma brincadeira tomou proporções maiores à medida
que jovens racistas ouviram falar do clã e se filiaram. Divertiam-se aterrorizando os
negros, estes detestados pelos membros do clã por serem “preguiçosos, inconstantes e
economicamente incapazes e, por natureza, destinados à escravidão1”. Também
atacavam brancos que protegiam os negros, principalmente os professores que
lecionavam em escolas para negros, temendo que os negros se instruíssem, tornando
impossível a volta à escravidão.
A identidade dos membros do clã não era divulgada, uma vez que vestiam
roupas brancas e cobriam o rosto com capuzes. Para entrar na seita, o candidato era
fechado em um tonel e empurrado ladeira abaixo. A seita foi se espalhando e uma filial
foi montada no Alabama, onde foi introduzido pela primeira vez o castigo físico aos
negros. Além da prática racista, os klanistas faziam visitas-surpresa aos negros,
obrigando-os a votar nos democratas, acompanhadas de algumas chibatadas. Em
consequência dos excessos, o grupo foi posto na ilegalidade em 1871 pelo então
presidente estadunidense Ulysses Grant. Muitos racistas foram presos e, para escapar da
lei, fundaram outros clãs com a mesma proposta e alcunhas diferentes: White League,
Shot Gun Plan, Rifle Club, entre outros. A Ku Klux Klan foi desfeita.
Em 1915, o cineasta Griffith dirigiu um filme intitulado “O nascimento de uma
nação”. Nesse filme, o diretor não escondeu sua simpatia pelo clã. Motivados pela
película, vários racistas se reuniram e retomaram a seita, dessa vez perseguindo, além de
negros, judeus e estrangeiros. Estima-se que, a partir desse momento, o número de
klanistas chegou a cinco milhões. Com a crescente, o grupo se fortaleceu e ganhou mais
simpatizantes, estes mesmos que se julgavam os defensores da moral. Agora eles
também caçavam médicos charlatões, prostitutas e marginais. Suas vítimas eram
marcadas com três letras K na testa. A situação chegou a um ponto tão extremo que o
governo interveio, aprovando a lei antimáscara, que proibia o uso de máscaras fora do
Dia de Todos os Santos e do carnaval. O clã foi perdendo forças, alguns integrantes
foram amadurecendo, e a mentalidade foi mudando até que o clã se desfez novamente.
Nos dias atuais, alguns racistas ainda se reúnem em grupos, promovendo a
superioridade dos arianos. Mas, em termos de contingente, não se compara com o auge
do clã, no século XIX. Felizmente!
EU TENHO UM SONHO9
(Martin Luther King)
9 Disponível em: < http://somostodosum.ig.com.br/blog/b.asp?id=09800>.
15. 15
Eu digo a vocês hoje, meus amigos, que embora nós enfrentemos as dificuldades de
hoje e amanhã. Eu ainda tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no
sonho americano.
Eu tenho um sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado
de sua crença - nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os
homens são criados iguais.
Eu tenho um sonho que um dia nas colinas vermelhas da Geórgia os filhos dos
descendentes de escravos e os filhos dos desdentes dos donos de escravos poderão se
sentar junto à mesa da fraternidade.
Eu tenho um sonho que um dia, até mesmo no estado de Mississippi, um estado que
transpira com o calor da injustiça, que transpira com o calor de opressão, será
transformado em um oásis de liberdade e justiça.
Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma
nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter.
Eu tenho um sonho hoje!
Eu tenho um sonho que um dia, no Alabama, com seus racistas malignos, com seu
governador que tem os lábios gotejando palavras de intervenção e negação; nesse justo
dia no Alabama meninos negros e meninas negras poderão unir as mãos com meninos
brancos e meninas brancas como irmãs e irmãos. Eu tenho um sonho hoje!
Eu tenho um sonho que um dia todo vale será exaltado, e todas as colinas e montanhas
virão abaixo, os lugares ásperos serão aplainados e os lugares tortuosos serão
endireitados e a glória do Senhor será revelada e toda a carne estará junta.
Esta é nossa esperança. Esta é a fé com que regressarei para o Sul. Com esta fé nós
poderemos cortar da montanha do desespero uma pedra de esperança. Com esta fé nós
poderemos transformar as discórdias estridentes de nossa nação em uma bela sinfonia
de fraternidade. Com esta fé nós poderemos trabalhar juntos, rezar juntos, lutar juntos,
para ir encarcerar juntos, defender liberdade juntos, e quem sabe nós seremos um dia
livre. Este será o dia, este será o dia quando todas as crianças de Deus poderão cantar
com um novo significado.
"Meu país, doce terra de liberdade, eu te canto.
Terra onde meus pais morreram, terra do orgulho dos peregrinos,
De qualquer lado da montanha, ouço o sino da liberdade!"
E se a América é uma grande nação, isto tem que se tornar verdadeiro.
E assim ouvirei o sino da liberdade no extraordinário topo da montanha de New
Hampshire.
Ouvirei o sino da liberdade nas poderosas montanhas poderosas de Nova York.
16. 16
Ouvirei o sino da liberdade nos engrandecidos Alleghenies da Pennsylvania.
Ouvirei o sino da liberdade nas montanhas cobertas de neve Rockies do Colorado.
Ouvirei o sino da liberdade nas ladeiras curvas da Califórnia.
Mas não é só isso. Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Pedra da Geórgia.
Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Vigilância do Tennessee.
Ouvirei o sino da liberdade em todas as colinas do Mississipi.
Em todas as montanhas, ouviu o sino da liberdade.
E quando isto acontecer, quando nós permitimos o sino da liberdade soar, quando nós
deixarmos ele soar em toda moradia e todo vilarejo, em todo estado e em toda cidade,
nós poderemos acelerar aquele dia quando todas as crianças de Deus, homens pretos e
homens brancos, judeus e gentios, protestantes e católicos, poderão unir mãos e cantar
nas palavras do velho spiritual negro:
"Livre afinal, livre afinal.
Agradeço ao Deus todo-poderoso, nós somos livres afinal."
28 de agosto de 1963
17. 17
OLHOS COLORIDOS
(Sandra de Sá)
Os meus olhos coloridos
Me fazem refletir
Eu estou sempre na minha
E não posso mais fugir...
Meu cabelo enrolado
Todos querem imitar
Eles estão baratinado
Também querem enrolar...
Você ri da minha roupa
Você ri do meu cabelo
Você ri da minha pele
Você ri do meu sorriso...
A verdade é que você
(Todo brasileiro tem!)
Tem sangue crioulo
Tem cabelo duro
Sarará, sarará
Sarará, sarará
Sarará crioulo...
Sarará crioulo
Sarará crioulo...(2x)
Os meus olhos coloridos
Me fazem refletir
Que eu tô sempre na minha
Não! Não!
Não posso mais fugir
Não posso mais!
Não posso mais!
Não posso mais!
Não posso mais!
Meu cabelo enrolado
Todos querem imitar
Eles estão baratinados
Também querem enrolar...
Cê ri! Cê ri! Cê ri!
Cê ri! Cê ri!
Cê ri da minha roupa
Cê ri do meu cabelo
Cê ri da minha pele
Cê ri do meu sorriso...
Mas verdade é que você
(Todo brasileiro tem!)
Tem sangue crioulo
Tem cabelo duro
Sarará, sarará
Sarará, sarará
Sarará crioulo...
Sarará crioulo
Sarará crioulo...(3x)
18. 18
INCIDENTE NA RAIZ
(Cuti)
Jussara pensa que é branca. Nunca lhe disseram o contrário. Nem o cartório.
No cabelo crespo deu um jeito. Produto químico e fim! Ficou esvoaçante e
submetido diariamente a uma drástica auditoria no couro cabeludo para evitar que as
raízes pusessem as manguinhas de fora. Qualquer indício, munia-se de pasta alisante,
ferro e outros que tais e...
O nariz, já não havia nenhuma esperança de eficácia no método de prendê-lo
com pregador de roupa durante horas por dia. A prática materna não dera certo em sua
infância. Pelo contrário, tinha-lhe provocado algumas contusões de vasos sanguíneos.
Agora, já moça, suas narinas voavam mais livremente ao impulso da
respiração. Detestava tirar fotografias frontais. Preferia de perfil, uma forma paliativa,
enquanto sonhava e fazia economias para realizar operação plástica.
E os lábios? Na tentativa de esconder-lhes a carnosidade, adquirira um cacoete
– já apontado por amigos e namorados (sempre brancos) – de mantê-los dentro da boca.
Sobre a pele, naturalmente bronzeada, muito creme e pó para clarear.
Lá um dia, veio alguém com a notícia de “alisamento permanente”. Era passar
o produto nos cabelos uma só vez e pronto, livrava-se de ficar de olho nas raízes. Um
gringo qualquer inventara a tal fórmula. Cobrava caro, mas garantia o serviço. Segundo
diziam, a substância alisava a nascente dos pêlos. Jussara deixou-se influenciar. Fez um
sacrifício nas economias, protelou o sonho da plástica e submeteu-se.
Com as queimaduras químicas na cabeça, foi internada às pressas, depois de
alguns espasmos e desmaios.
Na manhã seguinte, ao abrir com dificuldade os olhos, no leito de hospital, um
enfermeiro crioulo perguntou-lhe:
- Tá melhor, nêga?
Ela desmaiou de novo.
10
10 Disponível em: <http://trancanago.blogspot.com.br/2010/10/debora-dos-santos-profissao-
ilustradora.html>.
20. 20
CANTORA NIGERIANA TORNA-SE BRANCA APÓS O USO DE
COSMÉTICOS QUE ALTERAM PIGMENTO DA PELE11
FONTE: JORNAL CIÊNCIA
Nas fotografias, aparece sua mudança radical: ela passou de um marrom
saudável para um branco pálido, usando sua própria marca de clareamento de pele, um
creme chamado Whitenicious.
O produto cosmético controverso lhe trouxe muitas críticas por causa do que
ela representa, mas ela tem apenas uma resposta para silenciar seus críticos: "Eu não me
importo, porque são eles que estão me trazendo dinheiro.".
Whitenicious é vendido como um removedor de manchas escuras e clareia a
pele eficazmente em apenas sete dias. O creme se tornou bastante popular na África
Ocidental, onde algumas mulheres estão simplesmente obcecadas com a cor de sua pele.
E de acordo com Denica, ela não acha que está incentivando as pessoas a mudarem: ela
está apenas dando às meninas o que elas querem. "Essas meninas não estão somente
tentando clarear a pele. Elas estão apenas tentando se livrar de pequenas coisas que
estão fazendo com que se sintam desconfortáveis, sabe?", disse ela, referindo-se às
manchas escuras.
Denica também tentou se justificar, explicando que muitos de seus clientes
foram afro-americanos, e não africanos. Os críticos não estão aceitando sua explicação
também. Ela foi especialmente criticada por mudar o seu próprio tom de pele como uma
jogada de marketing. Seu antes e depois nas fotos mostram uma transformação quase
inacreditável.
11 Reportagem disponível em: <http://www.primeirahora.com.br/noticia/99289/cantora-nigeriana-torna-
se-branca-apos-o-uso-de-cosmeticos-que-alteram-pigmento-da-pele>.
21. 21
Muitas pessoas sentem que o que ela está fazendo é fundamental para
promover o auto-ódio entre os jovens africanos negros. Quando o produto foi lançado
em janeiro, uma pessoa chegou a responder no Twitter: "Este creme #whitenicious de
vocês é uma abominação e cria mais insegurança entre as mulheres em todo o mundo".
Entretanto, parece que a pop star não está muito preocupada com isso.
"Quando você tira a foto e você coloca em comparação com uma foto minha mais
escura, é isso que você está dizendo às pessoas: que o produto realmente funciona. E
adivinhem? As pessoas realmente querem comprá-lo. É o que é. Eu realmente não me
importo", ela admitiu.
Denica também é rápida em apontar que a maioria das mulheres não usaria
Whitenicious para mudar seu tom de pele completamente, por conta do seu alto preço.
O pote pequeno custa em média R$ 130 e o grande, R$ 320. "Eu não consigo ver
ninguém gastar todo esse dinheiro para branquear toda a sua pele”, disse. "Tenho
clientes que chegam na loja e compram coisas de mais de R$ 4 mil? Sim, eu tenho. Eu
pergunto-lhes o que eles querem fazer com ele? Não, eu não me importo, pois é o
dinheiro deles, é como eles querem gastá-lo.".
Ela nem parece muito preocupada com a possibilidade do creme ser canceroso.
Quando avisada sobre isso, ela se mostrou completamente imperturbável: "Mas
adivinhem? O ar que você respira lá fora faz com que você tenha câncer. Tudo no
mundo faz com que as pessoas tenham câncer”.
"Whitenicious é o que é", disse ela simplesmente.
23. 23
O EMBONDEIRO QUE SONHAVA PÁSSAROS
[Mia Couto, Cada Homem é uma Raça]
Pássaros, todos os que no chão desconhecem morada.
Esse homem sempre vai ficar de sombra: nenhuma memória será bastante para
lhe salvar do escuro. Em verdade, seu astro não era o Sol. Nem seu país não era a vida.
Talvez, por razão disso, ele habitasse com cautela de um estranho. O vendedor de
pássaros não tinha sequer o abrigo de um nome. Chamavam-lhe o passarinheiro. Todas
manhãs ele passava nos bairros dos brancos carregando suas enormes gaiolas. Ele
mesmo fabricava aquelas jaulas, de tão leve material que nem pareciam servir de prisão.
Parecia eram gaiolas aladas, voláteis. Dentro delas, os pássaros esvoavam suas cores
repentinas. À volta do vendedeiro, era uma nuvem de pios, tantos que faziam mexer as
janelas: - Mãe, olha o homem dos passarinheiros! E os meninos inundavam as ruas. As
alegrias se intercambiavam: a gritaria das aves e o chilreio das crianças. O homem
puxava de uma muska (Muska - nome que, em chissena, se dá à gaita-de-beiços.) e
harmonicava sonâmbulas melodias. O mundo inteiro se fabulava.Por trás das cortinas,
os colonos reprovavam aqueles abusos. Ensinavam suspeitas aos seus pequenos filhos -
aquele preto quem era? Alguém conhecia recomendações dele? Quem autorizara
aqueles pés descalços a sujarem o bairro? Não, não e não. O negro que voltasse ao seu
devido lugar. Contudo, os pássaros tão encantantes que são - insistiam os meninos. Os
pais se agravavam: estava dito. Mas aquela ordem pouco seria desempenhada. Mais que
todos, um menino desobedecia, dedicando-se ao misterioso passarinheiro. Era Tiago,
criança sonhadeíra, sem outra habilidade senão perseguir fantasias. Despertava cedo,
colava-se aos vidros, aguardando a chegada do vendedor. O homem despontava e Tiago
descia a escada, trinta degraus em cinco saltos. Descalço, atravessava o bairro,
desaparecendo junto com a mancha da passarada. O sol findava e o menino sem
regressar. Em casa de Tiago se poliam as lástimas: - Descalço, como eles. O pai
ambicionava o castigo. Só a brandura materna aliviava a chegada do miúdo, em plena
noite. O pai reclamava nem que fosse esboço de explicação: - Foste a casa dele? Mas
esse vagabundo tem casa? A residência dele era um embondeiro, o vago buraco do
tronco. Tiago contava: aquela era uma árvore muito sagrada, Deus a plantara de cabeça
para baixo. - Vejam só o que o preto anda a meter na cabeça desta criança. O pai se
dirigia à esposa, encomendando-lhe as culpas. O menino prosseguia: é verdade, mãe.
Aquela árvore é capaz de grandes tristezas. Os mais velhos dizem que o embondeiro,
em desespero, se suicida por via das chamas. Sem ninguém pôr fogo. É verdade, mãe. -
Disparate - suavizava a senhora. E retirava o filho do alcance paterno. O homem então
se decidia a sair, juntar as suas raivas com os demais colonos. No clube, eles todos se
aclamavam: era preciso acabar com as visitas do passarinheiro. Que a medida não podia
ser de morte matada, nem coisa que ofendesse a vista das senhoras e seus filhos. O
remédio, enfim, se haveria de pensar.No dia seguinte, o vendedor repetiu a sua alegre
24. 24
invasão. Afinal, os colonos ainda que hesitaram: aquele negro trazia aves de belezas
jamais vistas. Ninguém podia resistir às suas cores, seus chilreios. Nem aquilo parecia
coisa deste verídico mundo. O vendedor se anonimava, em humilde desaparecimento de
si: - Esses são pássaros muito excelentes, desses com as asas todas de fora. Os
portugueses se interrogavam: onde desencantava ele tão maravilhosas criaturas? onde,
se eles tinham já desbravado os mais extensos matos? O vendedor se segredava,
respondendo um riso. Os senhores receavam as suas próprias suspeições - teria aquele
negro direito a ingressar num mundo onde eles careciam de acesso? Mas logo se
aprontavam a diminuir-lhe os méritos: o tipo dormia nas árvores, em plena passarada.
Eles se igualam aos bichos silvestres, concluíam. Fosse por desdenho dos grandes ou
por glória dos pequenos, a verdade é que, aos pouco-poucos, o passarinheiro foi virando
assunto no bairro do cimento. Sua presença foi enchendo durações, insuspeitos vazios.
Conforme dele se comprava, as casas mais se repletavam de doces cantos. Aquela
música se estranhava nos moradores, mostrando que aquele bairro não pertencia àquela
terra. Afinal, os pássaros desautenticavam os residentes, estrangeirando-lhes? Ou
culpado seria aquele negro, sacana, que se arrogava a existir, ignorante dos seus deveres
de raça? O comerciante devia saber que seus passos descalços não cabiam naquelas
ruas. Os brancos se inquietavam com aquela desobediência, acusando o tempo. Sentiam
ciúmes do passado, a arrumação das criaturas pela sua aparência. O vendedor, assim
sobremisso, adiantava o mundo de outras compreensões. Até os meninos, por graça de
sua sedução, se esqueciam do comportamento. Eles se tornavam mais filhos da rua que
da casa. O pãssarinheiro se adentrara mesmo nos devaneios deles: - Faz conta eu sou
vosso tio. As crianças emigravam de sua condição, desdobrando-se em outras felizes
existências. E todos se familiavam, parentes aparentes. - Tio? Já se viu chamar de tio a
um preto? Os pais lhes queriam fechar o sonho, sua pequena e infinita alma. Surgiu o
mando: a rua vos está proibida, vocês não saem mais. Correram-se as cortinas, as casas
fecharam suas pálpebras. Parecia a ordem já governava. Foi quando surgiram as
ocorrências. Portas e janelas se abriam sozinhas, móveis apareciam revirados, gavetas
trocadas. Em casa dos Silvas: - Quem abriu este armário? Ninguém, ninguém não tinha
sido. O Silva maior se indignava: todos, na casa, sabiam que naquele móvel se
guardavam as armas. Sem vestígios de força quem podia ser o arrombista? Dúvida do
indignatário. Em casa dos Peixotos: - Quem espalhou alpista na gaveta dos
documentos? O qual, ninguém, nenhum, nada. O Peixoto máximo advertia: vocês muito
bem sabem que tipo de documentos tenho aí guardados. Invocava suas secretas funções,
seus sigilosos assuntos. O alpisteiro que se denunciasse. Merda da passarada,
resmungava. No lar do presidente do município: - Quem abriu a porta dos pássaros?
Ninguém abrira. O governante, em desgoverno de si: ele tinha surpreendido uma ave
dentro do armário. Os sérios requerimentos municipais cheios de caganitas. - Vejam
este: cagado mesmo na estampilha oficial. No somado das ocorrências, um geral
alvoroço se instalou no bairro. Os colonos se reuniram para labutar em decisão. Se
juntaram em casa do pai de Tiago. O menino iludiu a cama, ficou na porta escutando as
graves ameaças. Nem esperou escutar a sentença. Lançou-se pelo mato, rumo ao
embondeiro. O velho lá estava ajeitando-se no calor de uma fogueira. - Eles vem aí,
25. 25
vêm-te buscar. Tiago ofegava. O vendedor não se desordenou: que já sabia, estava à
espera. O menino se esforçava, nunca aquele homem lhe tivera tanto valor. - Foge,
ainda dá tempo. Mas o vendedor se confortava, em sonolentidão. Sereno, entrou no
tronco e ali se ademorou. Quando saiu já vinha gravatado, de fato mesungueiro
(Mesungueiro - de “mesungo”, homem branco). De novo, se sentou, limpando as areias
por baixo. Depois, ficou varandeando, retocando o horizonte. - Vai, menino. É noite.
Tiago deixou-se. Espreitava o passarinheiro, aguardando o seu gesto. Ao menos, o
velho fosse como o rio: parado mas movente. Enquanto não. O vendedeiro se guardava
mais em lenda que em realidade. E porquê vestiste o fato? Explicou: ele é que era
natural, rebento daquela terra. Devia de saber receber os visitantes. Lhe competia o
respeito, deveres de anfitrião. - Agora, você vai, volta na sua casa. Tiago levantou-se,
difícil de partir. Olhou a enorme árvore, conforme lhe pedisse protecção. - Está a ver a
flor? - perguntou o velho. E lembrou a lenda. Aquela flor era moradia dos espíritos.
Quem que fizesse mal ao embondeiro seria perseguido até ao fim da vida.Barulhosos, os
colonos foram chegando. Cercaram o lugar. O miúdo fugiu, escondeu-se, ficou à
espreita. Ele viu o passarinheiro levantar-se, saudando os visitantes. Logo procederam
pancadas, chambocos, pontapés. O velho parecia nem sofrer, vegetável, não fora o
sangue. Amarram-lhe os pulsos, empurraram-lhe no caminho escuro. Os colonos foram
atrás deixando o menino sozinho com a noite. A criança se hesitava, passo atrás, passo
adiante. Então, foi então: as flores do embondeiro tombaram, pareciam astros de feltro.
No chão, suas brancas pétalas, uma a uma, se avermelharam. O menino, de pronto, se
decidiu. Lançou-se nos matos, no encalço da comitiva. Ele seguia as vozes, se
entendendo que levavam o passarinheiro para o calabouço. Quando se ensombrou por
trás do muro, no próximo da prisão, Tiago sufocava. Valia a pena rezar? Se, em volta, o
mundo se despojara das belezas.E, no céu, tal igual o embondeiro, já nenhuma estrela
envaidecia. A voz do passarinheiro lhe chegava, vinda de além-grades. Agora, podia ver
o rosto de seu amigo, o quanto sangue lhe cobria. Interroguem o gajo, espremam-no
bem. Era ordem dos colonos, antes de se retirarem. O guarda continenciou-se,
obediente. Mas nem ele sabia que segredos devia arrancar do velho. Que raivas se
comprovavam contra o vendedor ambulante? Agora, sozinho, o retrato do detido lhe
parecia isento de suspeita. - Peço licença de tocar. É uma música da sua terra, patrão. O
passarinheiro ajeitou a harmónica, tentou soprar. Mas recuou da intenção com um esgar.
- Me bateram muito-muito na boca. É muita pena, senão havia de tocar. O polícia lhe
desconfiou. A gaita-de-beiços foi lançada pela janela, caindo junto do esconderijo de
Tiago. Ele apanhou o instrumento, juntou seus bocados. Aqueles pedaços lhe
semelhavam sua alma, carecida de mão que lhe fizesse inteira. O menino se enroscou,
aquecido em sua própria redondura. Enquanto embarcava no sono levou a muska à boca
e tocou como se fizesse o seu embalo. Dentro, quem sabe, o passarinheiro escutasse
aquele conforto? Acordou num chilreino. Os pássaros! Mais de infinitos, cobriam toda a
esquadra. Nem o mundo, em seu universal tamanho, era suficiente poleiro. Tiago se
acercou da cela, vigiou o calabouço. As portas estavam abertas, a prisão deserta. O
vendedor não deixara nem rasto, o lugar restava amnésico. Gritou pelo velho,
responderam os pássaros. Decidiu voltar à árvore. Outro paradeiro para ele já não
26. 26
existia. Nem rua nem casa: só o ventre do embondeiro. Enquanto caminhava, as aves
lhe seguiam, em cortejo de piação, por cima do céu. Chegou à residência do
passarinheiro, olhou o chão coberto de pétalas. Já vermelhas não estavam, regressadas
ao branco originário. Entrou no tronco, guardou-se na distância de um tempo. Valia a
pena esperar pelo velho? No certo, ele se esfumara, fugido dos brancos. No enquanto,
ele voltou a soprar na muska. Foi-se embalando no ritmo, deixando de escutar o mundo
lá fora. Se guardasse a devida atenção, ele teria notado a chegada das muitas vozes. - O
sacana do preto está dentro da árvore. Os passos da vingança cercavam o embondeiro,
pisando as flores. - É o gajo mais a gaita. Toca, cabrão, que já danças! As tochas se
chegaram ao tronco, o fogo namorou as velhas cascas. Dentro, o menino desatara um
sonho: seus cabelos se figuravam pequenitas folhas, pernas e braços se madeiravam. Os
dedos, lenhosos, minhocavam a terra. O menino transitava de reino: arvorejado, em
estado de consentida impossibilidade. E do sonâmbulo embondeiro subiam as mãos do
passarinheiro. Tocavam as flores, as corolas se envolucravam: nasciam espantosos
pássaros e soltavam-se, petalados, sobre a crista das chamas. As chamas? De onde
chegavam elas, excedendo a lonjura do sonho? Foi quando Tiago sentiu a ferida das
labaredas, a sedução da cinza. Então, o menino, aprendiz da seiva, se emigrou inteiro
para suas recentes raízes.
MAIS UM NEGRO
(José Carlos Limeira)
Sou um negro,
mais um,
destes que não aceitam,
como adjetivo a alma branca.
Sou um negro,
mais um,
consciente de nossa história,
que não se ilude com os heróis
que me forçam a aceitar.
Sou um negro,
mais um,
destes que não usariam henê no cabelo,
por não querer cabelos lisos.
Sou um negro,
mais um,
meio louco
27. 27
meio torto
esperando muitos outros
para engrossar o cordão,
e horrorizar de espanto,
este engodo imbecil,
a tal convencionada,
Democracia Racial.
In: Alabaques
CINEMA NO B.A.R
SINOPSE: Quase Deuses conta a história verdadeira e emocionante de dois homens
que desafiaram as regras em sua época para iniciar uma revolução médica. Na
Baltimore dos anos 40, o Dr. Alfred Blalock (Alan Rickman, de Harry Potter e o Cálice
de Fogo) e o técnico de laboratório Vivien Thomas (Mos Def, de Uma Saída de Mestre)
realizam cirurgias cardíacas usando uma técnica sem precedentes, atuando como equipe
de uma maneira impressionante. Mas ao mesmo tempo em que travam uma corrida
contra o tempo para salvarem a vida de um bebê, ambos ocupam diferentes condições
sociais na cidade. Blalock é o saudável homem branco que comanda o Departamento
Cirúrgico do Hospital Johns Hopkins; Thomas é negro e pobre, um habilidoso
carpinteiro. Quando Blalock e Thomas desbravam um novo campo na medicina,
Ficha Técnica
Título: Quase Deuses
Título original: Something the
Lord Made
Duração: 110 minutos (1 hora e
50 minutos)
Gênero: Drama
Direção: Joseph Sargent
Ano: 2004
País de origem: EUA
28. 28
salvando milhares de vidas graças ao processo, as pressões sociais ameaçam minar sua
parceria e por um fim à amizade que nasceu entre eles. Vencedor de três prêmios
Emmy, incluindo melhor filme de TV.
CHARGE 1:
A CAMPANHA PUBLICITÁRIA12
Campanha Publicitária é um conjunto de peças que são criadas objetivando
atingir um determinado público-alvo. É a forma como é exposta a mensagem e a
abordagem do diferencial do produto e/ou o apelo central do produto, feito de forma
criativa e diferenciada para chamar a atenção do observador e persuadi-lo a compra.
Uma campanha é composta por um conjunto de peças publicitárias, que podem
ser lidas individualmente, pois são mensagens completas. Porém o uso de várias peças
em diferentes mídias se vale para criar na mente do consumidor memorização da marca.
As peças não devem ser baseadas umas nas outras, pelo contrário, elas devem
ter autonomia no processo de comunicação, pois se elas são fragmentadas (dependentes)
elas não fazem efeito de memorização e de persuasão do consumidor, não conseguindo
completar a mensagem.
12 Disponível em: <http://napublicidade.wordpress.com/2010/06/28/campanha-publicitaria/>.
29. 29
Sendo assim, uma campanha publicitária é uma forma de “amarrar” todas as
ideias que as diferentes peças em diferentes mídias irão abordar. É uma forma de
construir a unidade do processo de comunicação.
A Propaganda, é um dos gêneros frequentemente utilizados na realização de
uma Campanha Publicitária. Vejamos:
Propaganda13
Propaganda é o ato de divulgar ideias, conceitos e valores, geralmente, sem
fins lucrativos, tendo por objetivo tentar convencer o público de alguma coisa.
A fabricação de uma propaganda exige saber:
a) O produto: utilidade, características, qualidades, desvantagens e vantagens.
b) O público: qual é o público-alvo: jovens, adolescentes, adultos, crianças. É
importante determiná-lo para saber o tipo de linguagem que deverá ser utilizada.
c) Objetivo: vender sempre é a principal meta. Contudo, pode se apresentar
algo novo, causar impacto, despertar a curiosidade, aumentar a venda ou audiência, etc.
d) Estilo: cores, tamanhos, tipos de objetos, tipo de letra, pano de fundo, etc.
13 Disponível em: <http://www.brasilescola.com/redacao/a-propaganda-persuasao.htm>.
30. 30
Mãos à obra!
Aluno (a):
A partir de tudo o que vimos nas aulas anteriores, use sua criatividade e imaginação para
produzir sua própria Campanha Publicitária.
Título:
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
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18
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