Aula ministrada pela Mestra Maíra Libertad, no I Workshop de Humanização do Parto e Nascimento, Belém - PA, ocorrido no dia 11/10/12
http://humanizabelem.wordpress.com
1. Obstetrícia e Medicina
Baseada em Evidências
Maíra Libertad Soligo Takemoto, Enfermeira Obstétrica
ANOVA, UERJ, NUPAR da ReHuNa
Agenda
Definir Medicina Baseada em Evidências e discutir sua
importância
Discutir de que modo a MBE dialoga com a área de Obstetrícia
Rever evidências relacionadas ao cuidado ao parto
Debater sobre a relevância da MBE no cenário da Humanização
do Parto
2. Medicina Baseada em Evidências
“Uso consciencioso, explícito e judicioso das melhores evidências
científicas correntemente disponíveis para tomar decisões
relativas ao cuidado de pacientes individuais ”
SACKETT DL, ROSENBERG WM, GRAY JA, HAYNES RB, RICHARDSON WS.
Evidence-based medicine: what it is and what it isn't. Br Med J. 1996; 312:71-72.
Editorial
Integração de...
Características
Experiência
e expectativas
clínica individual
dos pacientes
Melhores
evidências
clínicas
disponíveis
obtidas em
pesquisas
sistemáticas
3. O que não é?
MBE não é “receita de bolo”
(as evidências precisam ser extrapoladas para as características únicas
de cada indivíduo)
MBE não tem por finalidade o corte de gastos
(às vezes quando a eficácia é otimizada os custos se elevam, e não
caem)
MBE nem é fácil de seguir nem impossível de se praticar
MBE não se restringe aos ensaios clínicos controlados e às
metanálises
(algumas questões da prática clínica requerem outros tipos de estudos)
Evidências
O que são? Dados obtidos em pesquisas com seres humanos
Tipo de Ensaios clínicos randomizados (padrão-ouro)
estudo?
Tempo? Recentes – últimos 10 anos
Função? Substituir tecnologias existentes por outras mais
eficazes e/ou seguras
4. Alternativas à MBE
Medicina Baseada em Eminência
Medicina Baseada em Veemência
Medicina Baseada em Eloquência
Medicina Baseada na Previdência
Medicina Baseada na Deficiência
Medicina Baseada no Nervosismo
Medicina Baseada na Onipotência
(Isaacs and Fitzgerald, BMJ, 1999;3189:1618)
Níveis de Evidência
Ia Metanálises e ensaios clínicos randomizados
Ib Estudos clínicos randomizados
IIa Ao menos um estudo clínico bem desenhado sem randomização
IIb Ao menos um outro tipo de estudo bem desenhado
III Estudos descritivos bem desenhados
IV Relatos de comitês de experts e/ou experiência clínica de autoridades
5. Hierarquia da Evidência
Problema
Há uma falta de Uma proporção dos
Uma proporção dos relação entre a pacientes recebe
pacientes não recebe evidência proveniente práticas que não são
as práticas provadas da investigação necessárias ou que são
como efetivas. científica e a prática potencialmente
clínica. prejudiciais
6. Se a decisão não é
tomada com base em
evidências...
... Então em que?
Terapia Trombolítica
Recomendações/
Cumulativa 0.5 1.0 2.0 Livros Textos
Ano ECRs Pts
Não mencionado
1 23
Experimental
Raro/Nunca
1960
Específica
Rotina
2 65
1965 3 149
21
4 316 5
1970
7 1793
1 10
10 2544 1 2
11 2651 P<.01
15 3311
17 3929 2 8
22 5452 7
23 5767
1980 8
1
27 6125 12
P<.001
30 6346 1 8 4
1985
33 6571
43 21 059 1 7 3
54 22 051 P<.00001
65 47 185 5 2 2 1
67 47 531
1990 15 8 1
70 48 154
6 1
Odds Ratio (escala logarítmica)
Favorece a Terapia Trombolítica Favorece Controle
7. Lidocaína Profilática em IAM
Desfecho = Óbito por IAM
Favorece o tratamento Favorece o placebo
Risco Relativo (IC 95%)
0.5 1 1.5 2
Recomendações
Cumulativo
Ano no. ECR Sujeitos Sim Não Não mencionado
1970 2 304 9 1 1
1974 9 1451 8 0 2
1976 11 1686 5 0 2
1978 12 1986 8 0 3
1985 14 8412 14 4 6
1988 15 8745 4 2 1
Um profissional que não pratica MBE
Devemos dar um
beta-bloqueador Claro!
para Dona Maria, Funciona!
que infartou?
8. Um profissional que pratica MBE
Devemos dar um
beta-bloqueador Estudos prospectivos sugerem que o
para Dona Maria, risco de óbito da Dona Maria no 1º
que infartou? ano após IAM é de 8%. Uma
metánalise de ECRs avaliando beta-
bloqueadores após IAM sugere uma
redução de risco de 25%.
Considerando-se o baixo custo e a
toxicidade aceitável, um beta-
bloqueador parece uma opção
adequada.
Por que se preocupar com MBE?
Sem MBE, nós estamos vulneráveis diante de:
Especialistas equivocados ou desatualizados
Especialistas muito entusiasmados com o novo
Conflitos de interesse com fabricantes
Sem MBE, nossa habilidade é limitada para:
Rever nossas práticas
Ajudar os pacientes diante de escolhas difíceis
9. Assistência ao parto
baseada em
evidências
Alguns exemplos
Não há evidências que justifiquem...
Enemas de rotina Kristeller/pressão no fundo uterino
Tricotomia de rotina Condução do trabalho de parto com
ocitocina de rotina
Jejum de rotina
Valsava/”força comprida”
Episiotomia de rotina
Clampeamento imediato do cordão
Proibição de acompanhante/pessoa
de suporte durante o parto Aspiração de rotina dos recém-
nascidos sadios
Posições supinas (litotomia)
Restrição à liberdade de escolha do
Apenas médicos na assistência ao local do parto
parto
10. Quem presta assistência ao parto?
Médico
Médico
obstetra
Obstetra
Parteira Médico
tradicional de família
Obstetriz/ Enfermeira
Midwife obstetra
Assistência por Midwives
Evidência nível A
Hatem M, Sandall J, Devane D, Soltani H, Gates S. Midwife-led
versus other models of care for childbearing Women. Cochrane
Review, 2008.
↓ 10%
11 ECR: 12.276 mulheres
Menor risco de hospitalização pré-natal: 0,90 (0,81 – 0,99) ↓ 19%
Menor risco de analgesia regional: 0,81 (0,73 – 0,91)
Menor risco de episiotomia: 0,82 (0,77 – 0,88) ↓ 18%
Menor risco de parto instrumental: 0,86 (0,78 – 0,96)
↓ 14%
Maior chance de parto espontâneo: 1,04 (1,02 – 1,06)
Maior sensação de controle: 1,74 (1,32 – 2,30)
↑ 4%
↑ 74%
11. Assistência por Midwives
Evidência nível A
Hatem M, Sandall J, Devane D, Soltani H, Gates S. Midwife-led
versus other models of care for childbearing Women. Cochrane
Review, 2008. ↑ 784%
Maior probabilidade de ser atendida pelo mesmo provedor no parto:
7,84 (4,15 – 14,81)
↑ 35%
Maior chance de iniciar aleitamento: 1,35 (1,03 – 1,76)
Menor risco de perda fetal < 24 semanas: 0,79 (0,65 – 0,97) ↓ 21%
Menor hospitalização neonatal: - 2 dias (-2,15 – 1,85)
Mortalidade perinatal inalterada: 0,83 (0,70 – 1,00)
Similar!!!
Posições Maternas durante o TP
Evidência nível A
Lawrence A, Lewis L, Hofmeyr GJ, Dowswell T, Styles C. Maternal
positions and mobility during first stage labour (Cochrane Review,
2009)
21 ECR = 3706 mulheres
TP mais curto em mulheres que adotaram posições verticalizadas/
deambulação vs. decúbito (em torno de 1 hora): -99 min (-1,6 – -0,39) ↓ 17%
Menor necessidade de analgesia peridural: RR= 0,83 (0,72 – 0,96)
Não houve diferença significativa nos outros desfechos maternos e
perinatais
Não houve efeitos negativos para o binômio mãebebê
Mulheres devem ser encorajadas a escolher a posição em que se
sentem mais confortáveis durante o TP
12. Imersão em água para alívio da dor
Evidência nível A
Cluett E R, Burns EE. Immersion in water in pregnancy, labour and
birth (Cochrane Review, 2011)
12 ECR = 3243 mulheres
Imersão em água durante o primeiro estágio do parto reduz
efetivamente a dor e a necessidade de analgesia
↓ duração do 1o. estágio do parto (média de -32,4 minutos)
Não há diferença em relação a cesariana, parto instrumental, uso de
ocitocina, infecção materna, trauma perineal e resultados neonatais
Aumento da satisfação com a experiência do nascimento
Imersão em água - Uso de analgesia
Cluett E R, Burns EE. Immersion in water in pregnancy, labour and birth (Cochrane
Review, 2011)
13. Imersão em água – Redução na duração do 1º
estágio
Cluett E R, Burns EE. Immersion in water in pregnancy, labour and birth (Cochrane
Review, 2011)
Puxos dirigidos
Evidência nível A
Brancato et al. A meta-analysis of passive descent versus
immediate pushing in nulliparous women with epidural analgesia
in the second stage of labor. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs
2008;37:4-12.
7 ECR, 2827 mulheres
↑ 8%
Descida passiva:
↑ chance de parto vaginal espontâneo: RR = 1,08 (1,01 – 1,15)
↓ duração dos puxos: -0,19h (-0,27 – -0,12) ↓ 23%
↓risco de parto instrumental: RR = 0,77 (0,77 – 0,85)
Sem diferença na taxa de cesariana, episiotomia e lacerações
14. Puxos dirigidos – Duração dos puxos
BRANCATO et al. A meta-analysis of passive descent versus immediate pushing in
nulliparous women with epidural analgesia in the second stage of labor. J Obstet
Gynecol Neonatal Nurs 2008;37:4-12.
Puxos dirigidos – Parto Instrumental
BRANCATO et al. A meta-analysis of passive descent versus immediate pushing in
nulliparous women with epidural analgesia in the second stage of labor. J Obstet
Gynecol Neonatal Nurs 2008;37:4-12.
15. E a episiotomia?
Episiotomia seletiva vs. Rotineira
Evidência nível A
Perda de sangue menor
Menor quantidade de fios de sutura
Episiotomia NÃO é mais fácil de reparar do que lacerações
espontâneas
Episiotomia JÁ é uma laceração de 2º Grau
Episiotomia NÃO encurta o 2º estágio do parto
Episiotomia NÃO melhora os escores de Apgar
Dor local, edema e dispareunia mais frequentes
16. Episiotomia seletiva vs. Rotineira
Evidência nível A
Carroli G, Mignini L. Episiotomy for vaginal birth (Cochrane
Review, 2009)
8 ECR, 5541 mulheres: episiotomia de rotina vs. restritiva
Taxa de episiotomia: 75,2% vs. 28,4%
Menor risco de trauma posterior – Maior risco de trauma anterior
Menor necessidade de sutura perineal
Menor risco de infecção, dor perineal e complicações da sutura
Menor risco de trauma perineal grave
Sem diferença na incidência de IUE e dor tardia
Episiotomia seletiva vs. Rotineira -
Qualquer trauma posterior
17. Episiotomia seletiva vs. Rotineira -
Trauma perineal severo
Episiotomia seletiva vs. Rotineira -
Necessidade de sutura
18. Quando a episiotomia é necessária?
OMS indica taxas de no máximo 10% de episiotomias
Marsden Wagner, 1999: MUTILAÇÃO GENITAL FEMININA
Não há evidências clínicas corroborando qualquer indicação de
episiotomia: “ameaça de ruptura perineal grave”, distócia de
ombros, sofrimento fetal, parto prematuro, parto pélvico
Causando dano
Quando não há evidência de benefícios E há evidência de prejuízo, se continuamos
realizando o procedimento, estamos causando DANO.
19. “Eu teria um parto domiciliar. Fiz massagem
no períneo para evitar lacerações. Estava
devidamente preparada. Mas como a
A voz das mulheres pequena resolveu nascer antes do tempo [...]
tive que parir no hospital. A minha parteira
esteve o tempo todo do meu lado, mas como
estava dentro do hospital não tinha voz ativa.
Plantonista “fez o parto”. Não chamei o
obstetra que me acompanhava pois ele
Experiência Características iria cortar também se fizesse o parto. Já tinha
clínica e expectativas deixado isso bem claro para mim nas
individual dos pacientes consultas. Mesmo gritando, urrando,
berrando “não corta, não precisa, por favor,
eu assumo, deixa rasgar”. Ela cortou. Disse
Melhores que “só sabia fazer cortando”. Eu chorei,
evidências minha parteira chorou. Perdi. Me sinto
clínicas mutilada, invadida. É como ser abusada. É a
disponíveis mesma coisa. Dá pra ver, dá pra sentir. Dá
obtidas em pra lembrar a cada “namoro” com o marido.”
pesquisas
sistemáticas
Pamela M. B.
18,67% de episiotomia (mai-set/2012)
20. Por que não realizar episiotomia?
Por que não realizar episiotomia?