1) O documento é um diário fictício de um viajante flamengo no Brasil do século XVII, que descreve sua chegada a Pernambuco e observações sobre os engenhos de açúcar e o trabalho dos escravos.
2) Ele também narra um encontro assustador na mata com o dono do engenho, João, que o acusa de espionagem.
3) A carta é escrita pelo viajante para o imperador da Holanda, relatando detalhes sobre a produção de açúcar no Brasil colonial e o
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Revista Hermes
1. O BRASIL DO SÉC. XVII AO XIX E NOTÍCIAS DO MUNDO CURUMIM
2. EDITOR
RAFAEL GONZAGA DE MACEDO
COLABORADORES
ANTONIO RAMOS DA SILVA
RINA CORTEZ
AUDREY
AGRADECIMENTOS
A TODOS OS ALUNOS DA CURUMIM
A TODA EQUIPE DA CURUMM
ESCOLA CURUMIM
2012
EDITORIAL
A Hermes chegou!
Você tem em mãos agora a mais nova revista de
História e Jornalismo: a Hermes!
Nela, você, leitor, encontrará textos fictícios sobre
viajantes europeus, engenhos e escravos do início do
Brasil e também reportagens sobre o mundo escolar
da Curumim, tocando em temas como a nova constru-
ção na escola, aulas de música no ensino fundamental
II, o uso da tecnologia no ambiente escolar, os pro-
jetos do ginásio e as diversas profissões que ajudam
a Curumim a existir - além de incríveis ilustrações e SUMÁRIO
fotografias realizadas pelos estudantes.
Os textos que compõem a Hermes são resultado de
um longo trabalho. Durante as aulas de História, es- Editorial....................................................2
tudamos, com a ajuda do livro “Uma breve história O Brasil dos Viajantes.............................3
do Brasil”, de Mary Del Priori, e a orientação do pro- Notícias do mundo Curumim................26
fessor Rafael Gonzaga, como foi a chegada dos por- Relato visual de uma Bienal....contracapa
tugueses ao nosso país, o poder dos reinos europeus,
como eram suas embarcações, o massacre dos índios,
os minerais preciosos que aqui existiam, os alimen-
tos e plantações e a escravidão. A partir desse estudo
aprofundado, fizemos textos ficcionais com persona- Ficha Catalográfica
gens que viveram aventuras no Brasil muito tempo Revista 8°. Ano “HERMES”
atrás. Ano 1, n.1 Dezembro (2012),
Paralelamente, durante as aulas de Português, com Anual, Campinas: Escola Curumim,
o professor Antônio Ramos da Silva, discutimos no- tel. 3256-2648,
tícias, fontes de informação, vimos vídeos, ouvimos
programas de rádio e lemos revistas que nos serviram
de base para iniciarmos reportagens com entrevistas, http://www.escolacurumim.com.br/
pesquisas e gráficos sobre o que acontece em nosso
dia a dia na Curumim.
Durante oito meses nos dedicamos bastante com
muito carinho, entusiasmo, criatividade e a ajuda dos
professores.
A revista está bastante instrutiva e divertida!
Esperamos que gostem!
2
3. O BRASIL DOS VIAJANTES
O projeto Brasil dos Viajantes é a consequência de muito trabalho e de algumas ati-
vidades que aconteceram nas aulas de História das turmas de 8º ano da escola Curu-
mim. Iniciamos o projeto a partir da leitura de alguns capítulos do livro Uma Breve
História do Brasil, de autoria da historiadora Mary Del Priori e, também, de material
organizado pelo professor, como, por exemplo, vestígios visuais, textuais e sonoros
que restaram daqueles dias e que nos ajudam a compreender o Brasil do século XVII
ao XIX, além de filmes, textos de outros historiadores e do próprio professor. Neste
processo, a partir daquilo que foi estudado, desenvolvemos narrativas textuais e visu-
ais sobre a principal atividade econômica do Brasil até então – a produção de açúcar
nos engenhos -, o que, consequentemente, nos levou à questão da escravidão, passando
pelos costumes, a cultura material e a resistência de pessoas comuns no cotidiano em
um “Brasil” bastante distinto do Brasil que conhecemos.
A nossa ideia inicial era encarnar o olho e o espírito, a bocas e ouvidos de antigos
viajantes estrangeiros, que à moda de Marco Polo ou Debret, viajam (ou sonhavam
viajar) para contar aquilo que haviam percebido em um mundo diferente. No caso da
nossa atividade, os alunos precisavam criar um personagem que, por alguma razão, era
enviado ao Brasil de forma legal ou ilegalmente para relatar os costumes, natureza e
construir um Brasil por meio de “intenções estrangeiras” - para utilizarmos um termo
de Ana Maria Belluzzo, no clássico O Brasil dos Viajantes. Brasil, que já era atraves-
sado por problemas de ordem social, como muitos dos textos nos revelarão, marcado
profundamente por uma sociedade escravocrata.
Esperamos que vocês façam uma boa leitura das narrativas produzidas, repleta de da-
dos históricos, muita aventura e curiosidades.
Rafael Gonzaga, professor de História
Clio, a musa da História, filha de Zeus com Mnemósine
(memória), inspirava contadores de história como
Heródoto que viajava e contava o que via...
3
4. várias mulheres negras e cravos, é o que devem fazer,
mulatas prontas para nos eu paguei por eles, agora
Diário de um servia na mesa, estas não se sou seu Senhor.
flamengo juntaram para jantar, o que Ao ver tal resposta, e a ma-
achei estranho. neira em que foi respondida, tão
Logo depois da janta, calmamente, fiquei pasmo. Não
Estamos em 1615, feve- João pediu que uma dessas comentei nem perguntei mais
reiro. Minha Viagem para mulheres me mostrasse o nada, e continuamos a contem-
a terra nova começava. Es- quarto, onde, depois de lon- plar os escravos. Então João co-
tava indo ao Rio de Janeiro ga viajem, pudesse descan- mentou:
para uma pesquisa sobre os sar. - Já observou bastante de
Engenhos e sobre como é a Meu quarto era bem es- como eles cortam a cana, diga-
vida dos escravos. paçoso. Acomodei minhas me, o que aprendeu?
Já era hora de partir. Pe- coisas e me joguei na cama. - Bom... Eles usam facões e
guei minha bolsa, coloquei foices, e fazem movimentos le-
meus materiais (prancheta II ves para corta-la - Respondi um
de desenho, bloco de anota- No dia seguinte fui acor- tanto nervoso.
ção, grafites) e parti. dado pela luz forte que entra- - Sim, exato - Disse João.
A viajem foi longa, du- va pela janela. Levantei-me Em seguida convidou - Não
rou mais ou menos 60 dias e da cama e procurei alguém gostaria de ver como a cana é
60 noites, até que finalmen- da casa. Logo encontrei Ma- transformada no açúcar que tú
te cheguei. Fiz uma breve ria e Manuela que estavam conheces?
pintura do local e aguardei sentadas à mesa. Maria en- - Claro - Respondi sem pes-
o Senhor do Engenho, pois sinava Manuela a ler. Ha- tanejar.
em sua casa me hospedaria. via outras crianças e duas Ele me levou então a uma
Não tardou muito para que mulheres sentadas ao chão, casa isolada.
o senhor chegasse, este veio estas ajudavam Maria com Lá havia três escravos traba-
acompanhado por quatro ho- os pergaminhos e livros, po- lhando em uma maquina. Esta
mens, que o carregavam em rém não liam. Ao ver aqui- era o novo moinho.
uma liteira. Já estava anoite- lo me subiu a adrenalina e A maquina era formada por
cendo, o homem me convi- quase me escapa a pergunta um tronco de arvore, que dois
dou a sentar na liteira para do porque aquilo, por que os escravos faziam girar; o tronco
que os quatro homens que negros eram tratados como estava em conexão com os tritu-
o acompanhavam nos levas- animais? radores de cana e fazia com que
sem, esses homens que por Ao me passar a adrenali- eles funcionassem. Um terceiro
certo eram negros. Fiquei na, perguntei a Maria onde escravo colocava a cana e tirava
um pouco indignado com o estava João, esta me disse do moedor até que retirasse todo
fato de que outros homens que estava lá fora; me aguar- seu caldo. O caldo de cana caía
fossem obrigado a nos car- dava para que eu pudesse em um recipiente, depois era es-
regar, achei uma injustiça, começar minha pesquisa. quentado até ficar sólido, e mo-
porém aceitei sem contestar. Saí em busca de João, ído para ficar em grãos, que é o
Partimos. A casa do Se- encontrei-o á observar ne- que chamamos de açúcar.
nhor do Engenho, que du- gros cortando a cana. Me
rante a viajem se apresentou posicionei a seu lado e não III
como João, não era muito resisti, perguntei o porque Já tarde, João e eu fomos para
longe da praia e chegamos daquilo, o que recebiam em a casa dele para jantar e descan-
rapidamente ao local. troco de tanto trabalho? João sar. Percebi que João me olhava
Lá conheci sua mulher, calmamente disse: com aparencia estranha durante
Maria, e sua filha, pequena - Percebi que algo o in- o jantar. Antes de ir dormir João
Manuela, estas nos espe- comodava, agora sei o que me anunciou que iríamos a um
ravam para jantar. Percebi é - Após um longo tempo in- lugar diferente no dia segunte.
também que na casa havia terrupto continuou - São es- Durante a manhã, João me
4
5. acordou. Mal havia acordado para construir esse tal engenho, mais.
quando João tampou minha pois bem além de gigantescas Senhor, você tinha que estar
boca, me prendeu e me levou rodas, movidas à água ou com aqui para ver como são engraça-
para a mata; totalmente assus- animais (para fazê-la girar, das as coisas, eles usam formas
tado e confuso, tentei me soltar, água, normalmente usam bois cônicas de barro com um furo,
mas em vão, pois outro homem ou cavalos, depende da escolha onde fica escorrendo o melado
também estava me segurando. dos senhores de engenho), uni- por alguns dias. Já o açúcar,
Um dos homens estava ar- da ao mesmo diâmetro da roda depois de feito, há diferentes
mado. Já um tanto metidos na d’água. tipos de açucares eram emba-
floresta, João me mostrou meu Tem uma outra roda me- lados para a venda. O açúcar
livro de anotações. E então dis- nor, dentada, chamada rodete, era guardado de acordo com o
se: e como o mesmo diâmetro da valor comercial, na parte supe-
- Pensou que poderia nos roda d’água que chamam de bo- rior, o branco, mais caro e fino;
enganar bancando o cientista, landeira, este eixo (bolandeira) na inferior o mascavo. Eles são
seu espiãozinho - exclamou - é revestido de um cilindro den- levados em caixas por transpor-
Nós encontramos seu caderno tado e reforçado com aros de te fluvial ou lombo de animais
de anotações, contém informa- ferro, entre eles passa a cana. e carros de boi, até chegar aos
ções de como é o local, de como Eles (senhores de engenhos) pontos de embarque.
trabalhamos, se você quisesse escolhem os escravos fortes e
mandava uma carta para Holan- robustos (caldeiros e tacheiros), A escravidão de negros em
da ela teria um belo plano para para cozinhar o caldo extraído associação aos engenhos de açú-
invadir! da moenda. car é comum, muitas vezes im-
Sem falar nenhuma outra A mão-de-obra (que impor- portam africanos para cobrir a
palavra, olhou nos meus olhos, tava escravos da África para o falta de mão-de-obra, caso con-
pegou a arma, e “bum”, vi um Brasil) é pouca, a empresa de trario os africanos plantam, co-
flash de luz, e morri. açúcar precisa de pequenos em- lhem, botam a cana para moer,
preendores que possam abaste- acondicionam e transportam o
cer seu engenho com suas canas. açúcar até o mar, junto a eles os
Diego Zoppi, 8° manhã Você sabia que somente 40% escravos indígenas (que também
dos engenhos aqui em Pernam- fazem as mesmas coisas).
buco moem canas próprias, o No planalto paulistano,
Carta para resto depende da matéria prima
fornecida por lavradores, o Se-
(principalmente aqui em Per-
nambuco) estão escravizando
Jenkim Berg nhor deve estar se perguntando os indígenas, que é responsá-
como sei disso, ai vai, eu e meus vel pela pequena produção de
colegas fomos ver para termos trigo para o consumo interno.
Caro imperador Jenkim Berg, aproximadamente um calculo A porcentagem de escravos ín-
já cheguei aqui em Pernambuco, para apresentar para o Senhor, e dios envolvidos na produção do
Brasil, aqui é tudo diferente e mostrar nosso trabalho. açúcar foi, por um lado, baixan-
eu acho que podemos melhorar Aqui os mais valorizados do à medida que os senhores
muitas coisas na Holanda, como são os mestres de açúcar, eles enriqueciam e podiam importar
colocar engenhos. Os engenhos “dão ponto para meladura” ou africanos.
fabricam caldo de cana, açúcar e “acham o pulso aos açucares”,
o que mais gostei e estou levan- os mestres de açúcar são os se- Aqui, tratar escravos como
do para você é a marmelada. Os nhores de engenho. ”coisas” é natural, aliás é regra
senhores de engenhos comem Os senhores de engenho são da Igreja Católica. Rações de
muito mal, comem carne seca tratados com muitos mimos. Nos farinha de mandioca ou milho,
dura em excesso. Os engenhos engenhos também tem feitor, coquinhos chamados aquês, fei-
se localizam na beira de rios, carpinteiros, mestres de açúcar jões e hortaliças, compõem o
próximos aos portos. Proval- e outros, os senhores lhes dão cardápio dos moradores do en-
mente Vossa Senhoria deve es- mesa e cem mil réis e outros até genho e também dos escravos.
tar se perguntando o que precisa A cachaça, maconha, ou pango,
5
6. são usadas para aliviar os sofri- transportavam o açúcar até o suas dores. Os escravos são
mentos do cativeiro. mar. Descobrimos que há gru- considerados muito inferiores
pos de homens, entre os escra- aos brancos, por causa disso,
Bom, Senhor, muito obriga- vos, que são diferenciandos pela eles são obrigados a não ves-
do pela atenção, por me dar essa cor. Vi , por exemplo, um criou- tirem sapato e usarem poucas
oportunidade de trabalhar aqui lo pedindo ao seu senhor para roupas, eles sempre se sentam
no Brasil, agora vou continuar que a terefa mais pesada fosse no chão das casas enquanto os
meu trabalho, ainda tenho que feita por um escravo boçal, isto senhores brancos em cadeiras e
espiar muitas coisas, para poder é, recém chegado da África. E bancos.
construir nossos engenhos, etc. foi isso que ele fez.
Mando mensagens, depois que Notei também que alguns Os brancos não batem com
terminar minha pesquisa. senhores diziam a outros que paus na cabeça de seus escravos,
era perda de tempo bater ou ma- mas não por pena, por medo de
chucar a cabeça de um escravo, machucá-los, uma vez que eles
Adrielle, 8° tarde pois isso faria com que danos valiam dinheiro, por isso só da-
ocorressem no escravo e ele va- vam chicotadas nas costas dos
leria menos na hora da venda, escravos com bambus, chicotes
Noelle - Diário de assim prejudicando os próprios e varas.
Viagem senhores.
Estou gostando daqui e so-
brevivi aos primeiros dias, o Thomas Passos, 8° manhã
Meu nome é Noelle e par- que é muito difícil. Boa noite.
ti para o Brasil para conhecer
o lugar relatar, neste diário de Tuani Ximenes, 8°
viagem, aquilo que eu achei in- manhã
teressante.
Viajei de barco com meus Thomas Giveway
pais e alguns companheiros de
viagem e quando cheguei lá,
achei tudo muito estranho e di-
ferente do que estou acostuma- Eu, Thomas Giveway Pig,
da a ver na França. parti em 1773 em minha mis-
A primeira coisa que obser- são para investigar a vida dos
vei foi que os escravos cobrem- escravos, para depois trazer mi-
se com muito pouco. Mas, a nhas impressões para a Europa,
Igreja incentiva os senhores pois eu sou contra a escravidão
para que evitem trazê-los “in- e acho que se o povo da Euro-
decentemente vestidos” para as pa souber sobre as condições de
missas. vida dos escravos, poderemos
As mulheres vestem saias abolir a escravidão.
feitas com panos de Surrate ou Consegui descobrir muito
Baeta, e os homens usam ape- sobre os escravos, eles são qua-
nas calça, permanecendo sem se todos africanos e eu imagino
camisa. Depois de melhor co- que seja por que são mais fortes
nhecer o lugar, conforme o tem- do que os índios.
po, passamos a nos acostumar
com isso. A maior parte dos escravos
De tarde fomos conhecer as trabalham nas áreas rurais, eles
plantações. Os escravos planta- fumam pango – um tipo de erva
vam, colhiam, botavam a cana contrabandeada da África - e
para moer, acondicionavam e cachaça, que serve para aliviar
6
7. exemplo, podiam “danificar” o
trabalhador e ele acabar se tor-
Carta para o nando inútil para o seu proprie-
Príncipe e Engenhos do tário.
leitores Novo Mundo Samir Jobim, 8° manhã
Querido Príncipe, neste ano, Meu nome é Estyler Anke-
1773, eu Vauban Runtelar, es- rouv e pretendo contar um pou- Relato sobre
co sobre minha viagem para o
tou no Novo Mundo.
Novo Mundo...
o Brasil dos
Já fazem dois anos que es- O Novo Mundo é completa- engenhos e
tou aqui, observando os escra- mente diferente da nossa que-
vos negros e índios trabalharem rida Dinamarca. Para começar, dos escravos
nos engenhos de seus senhores os trabalhadores são escuros
brancos. e grandes, e não usam roupa
alguma, as mulheres exibem Meu nome é Rodolfo Pires
Os escravos vestem apenas
seus seios como se fosse uma da Silva e tenho 35 anos. Sou
calças, sem camisetas e mesmo
coisa normal, além disso, eles da Dinamarca. Fiz uma viagem
as mulheres, aquelas que traba-
não são remunerados pelo seu para o Brasil, pois estava curio-
lham na lavoura, andam quase
trabalho, eu diria que eles são so em relação às condições de
nuas, apenas as mulheres que
pitorescos. vida dos escravos. Então sai
trabalham nas casas das senho-
Tenho amizade com um de- com um navio em direção ao
ras brancas, vestem-se um pou-
les. Ele me diz que quando não Brasil. Estava viajando quan-
co melhor.
embalava dois sacos de açúcar do encontrei um navio negreiro
Uma vez, um senhor muito por dia apanhava do feitor. Ele indo na mesma rota.
rico explicou para os outros se- também era obrigado a dormir
na senzala onde sempre bebiam Lá haviam escravos que
nhores, que não se podia bater
cachaça, fumavam pango – uma eram trazidos da África a for-
nos escravos com pedaços de
erva contrabandeada da África ça. Fiquei observando e vi que
pau, pedra nem coisas do tipo,
- e comiam alguns tipos de do- todos os escravos tinham uma
porque poderiam machucar o
ces feitos do caldo e do açúcar, marca de ferro ou na coxa ou no
escravo. Mas essa preocupação
extraído da cana nos engenhos. ombro e estavam acorrentados.
não era por causa do escravo e
Os escravos trabalhavam até Vi um português dando somen-
sim devido a preocupação com
dezoito horas por dia no enge- te um copinho d’água para cada
a propriedade do senhor, pois
nho, lá eles plantam, colhem e escravo, então, eles deviam ter
ele machucasse demais um
moem a cana, além de, também, uma péssima alimentação. E
escravo ele poderia ficar sem
transportá-la até o porto. pelo que eu observei do local
mão-de-obra e só dar despesas.
Algumas mulheres pitores- onde os escravos ficavam eles
Então os senhores preferem não tinham nenhuma higiene.
cas trabalham em casas como
bater e punir os escravos com
costureiras, bordadeiras e nas Essa viagem demorou 65
varas e cipó, assim ele pune o
hortas que existem no quintal. dias, porem finalmente che-
escravos sem fazer com que o
Elas também cuidam de crian- guei ao Brasil, e ainda ao mes-
escravo pare de trabalhar.
ças brancas e muitos outros tra- mo tempo em que os escravos
Na casa grande, as mulhe- balhos domésticos. chegavam. Vi que eles eram
res brancas tinham pedaços de Dias atrás ouvi um jesuíta, separados em vários grupos, os
galhos para bater nas escravas que advertia os senhores do en- recém-chegados da áfrica eram
caso estas a desobedecessem. genho a bater nos trabalhadores distinguidos em boçais, os que
apenas com chicotes e objetos já entendiam o português eram
do gênero, pois se os agredis- chamados de ladinos. Eles eram
Marcos, 8° manhã sem com um pau na cabeça, por vendidos para proprietários de
7
8. terra. E não permaneciam com Viagem ao Novo 40 escravos domésticos, mas
seu nome de origem, seus do- isso depende do dinheiro do
nos davam-lhes nomes, sem Mundo de Felipe senhor de engenho e do apoio
mesmo perguntar seus antigos Vanperci da coroa portuguesa.
nomes. Fiquei perplexo ao ver Outra parte essencial de um
isto. engenho é a fazenda de cana-
Acompanhei alguns escra- Dia 5 de Abril de 1771, aqui de-açúcar, que pode ser uma
vos até um local chamado en- estou eu, Felipe Sauchen Du- pequena plantação, até gigan-
genho, onde trabalhavam na chan Kuaiver Vanperci, escre- tescos campos de cana-de-açú-
produção da cana de açúcar. Os vendo o meu primeiro relató- car. Nestes campos, trabalham
escravos exerciam varias fun- rio sobre a colônia portuguesa muitos escravos, que na maio-
ções como o plantio de cana- denominada Brasil. Durante a ria das vezes são homens, adul-
de-açúcar bem como a colheita viagem pelo oceano enfrentei tos e fortes, pois o trabalho com
e ainda botavam-na para moer, problemas quase catastróficos a cana é difícil em todas as suas
acondicionavam-na e por fim, como tempestades, fome, sede etapas, desde sua plantação até
transportavam-na para os por- e o menor deles: a falta de hi- seu moimento para virar açúcar
tos e navios que levavam o açú- giene. e fazer deliciosos doces.
car para a Europa. Outra parte importante é o
Acabamos de chegar ao
Percebi que o uso de roupa porto e estou espantado com a próprio moinho que pode ser
era raro por parte dos escravos, natureza bela e abundante des- manual, a água ou ambos, de-
eles usavam pouquíssimas rou- te local, mas logo em seguida pendendo da quantidade de
pas. As mulheres usavam uma recordo que não sou bem vin- açúcar que se desejava produ-
blusa e saia de um tecido velho do aqui, então volto a me sen- zir e da riqueza do senhor.
e os homens usavam somente tar no convés imundo do navio E por último, mas não menos
uma calça. Além disso, tam- que me trouxe até o momento importante, a senzala, ah, meus
bém reparei que os escravos do desembarque em terra. Tam- queridos leitores, se eu contar
homens trabalhavam em tare- bém tenho que procurar um a vocês não irão acreditar, es-
fas manuais, por exemplo, no local onde poderei ficar por um tas senzalas abrigam muitos e
engenho ou na lavoura... Já as tempo, enquanto faço meus re- muitos negros amontoados que
mulheres trabalhavam em tare- latos sobre a vida das pesso- dançam uma estranha dança,
fas domésticas e eram tratadas as aqui e como tudo funciona, que fumam pango – uma erva -
como inferiores. para obviamente, publicar em e que vivem praticamente nus,
meu livro que se chamará Via- trabalhando arduamente.
Depois fui com eles ao lugar gem ao Novo Mundo.
onde comiam. Porém, nem se Felipe, 8° manhã
pode falar que eles comiam, os Dia 7 de Abril De 1771, aqui
escravos ingeriam somente car- estou eu em meu segundo rela-
ne seca e raramente verduras e tório, nós já arranjamos um lu-
alguns frutos. Também encon- gar seguro para ficar, mas agora
trei alguns animais como patos, lhes contarei sobre os engenhos Viagem e batalhas
cabritos e leitões, que serviam e como eles funcionam, já que
de alimento – aos senhores. Po- estou, como posso dizer, em no Novo Mundo
rém, mesmo os fazendeiros ri- um.
cos se alimentavam muito mal. Um engenho tem várias
“partes” que formam sua “en- Sou Rodrigo Van Roos, um
Carolina S. 8° manhã
grenagem”, e a primeira que Holandês.
descreverei será a casa do se-
Saí da Holanda no dia 25
nhor de engenho que pode va-
de fevereiro de 1630, durante a
riar desde uma casa simples
viagem meu barco naufragou,
com apenas um criado até um
sorte que ele afundou perto da
enorme casarão com mais de
8
9. terra firme, assim consegui na- e da comida. que também estava indo pela
dar até lá. primeira vez ao novo mundo,
Rações de farinha de mandio- quando chegamos perto do por-
Cheguei ao Novo Mundo ca ou milho, coquinhos chama- to, o barco soltou alguns sina-
no final da lenta guerra entre dos aquês, feijões e hortaliças, lizadores para avisar que não
os flamengos (holandeses) e os faziam parte do cardápio ali- havia peste. No mesmo dia,
esquadrões organizado por co- mentar dos moradores do enge- encontrei a minha hospedaria e
lonos portugueses e formado nho, e, por extensão, em maior decidi começar a visitar as la-
por negros, índios e soldados ou menor quantidade, também, vouras no dia seguinte.
a serviço da coroa Portuguesa dos escravos. Carne de galinha
e Espanhola. A guerra lenta era era comida, principalmente, por No dia seguinte, a primei-
uma guerra feita por embosca- doentes. Havia muitos escravos ra coisa que notei foi o grande
das e assaltos. viciados em cachaça e pango, numero de escravos trabalhan-
uma erva contrabandeada da do. Eles se vestiam muito mal
No inicio, esta guerra no África. e com poucas roupas. Quando
mato era uma coisa estranha perguntei ao responsável bran-
para os homens por causa das As roupas, por sua vez, eram co porque eles se vestiam as-
emboscadas (e isto eu ouvi da muito raras. Eles, os escravos, sim, ele me respondeu: “por
boca de um mercenário inglês à cobriam-se, geralmente, com causa do forno de lenha”, que
serviço dos holandeses), os na- muito pouco. As mulheres ves- funcionava nos engenhos. O ca-
tivos preferiam esperar as tro- tiam saia e blusa feitas com lor nas caldeiras era vulcânico
pas mercenárias holandesas nas panos de Surrate ou baeta, e os e por isso usavam os escravos
matas, onde conheciam o ter- homens usavam apenas calça, “mais fortes” para a função de
reno melhor para enfrentar os assim, ficando sem camisa. cuidar do forno.
bem treinados mercenários em
campo aberto. Uma tática que Rodrigo, 8° manhã O mais interessante que vi
demonstrou ser uma invenção foi nas áreas rurais, havia mui-
assassina que matava muitos tos escravos fazendo trabalho
soldados - do lado holandês. sem parar. Quando o açúcar
A Viagem de era embalado ele era levado em
Encontrei muitos escravos
de origem indígena e depois Bruce caixas por transportes fluviais
ou em carros de boi, chegavam
africana; era comum os homens até os portos de embarque.
trabalharem em engenhos de
açúcar, um produto muito va- A condição de vida dos es-
lorizado na Europa. Nas áreas Ano: 1642 cravos era muito ruim, pois os
rurais, as plantações de cana lugares onde descansam tam-
drenavam escravos sem cessar. Meu nome é Bruce, moro na bém era muito ruim. O trabalho
Submetidos a senhores e admi- Inglaterra minha família é no- dos escravos é tão ruim que os
nistradores, os cativos tinham bre, moro com minha família, escravos comem terra para mor-
que se integrar a uma divisão sou aventureiro e escrevo para a rer, pois é muito dificil fugir.
de trabalho bem sofisticada. Os corte, tenho 28 anos. Hoje estou
escravos tinham que aprender a caminho do novo mundo para Guilherme P., 8° manhã
variadas funções, por exemplo, escrever sobre a vida dos escra-
de oficias da casa de caldeira. E, vos para meu príncipe Jimmy
no geral, aprendiam o serviço Page.
da enxada, o serviço de moen-
Após a longa viagem pelo
da ou da horta, como carreiros,
oceano, cheguei ao continente.
carapinas, pedreiros, conduto-
No barco tinha muito pouca hi-
res de saveiros. As escravas do-
giene e todos se preocupavam
mésticas tinham que aprender a
e tinham medo de pegar doen-
costurar, bordar e cuidar da casa
ças, havia muita gente no barco
9
11. “merece”. É claro que o senhor dos e mesmo assim, encolhidos.
tem todo direito, mas o resto O barulho do chicote batendo
Diário de viagem do povo pode vê-lo com maus na carne nua e os gritos de dor
de Charlotte Felton olhos. ecoam pela casa mais que suas
vozes.
Os homens escravizados fa-
zem o trabalho pesado, todos os O sino toca e neste momento
É uma mudança drástica no dias em baixo do sol escaldante, eu me despeço. Está na hora do
ambiente. Como uma senhora cortando canas-de-açúcar e mo- jantar.
inglesa sofisticada, o ar, matas endo o que colhe nos engenhos.
e animas deste novo mundo são O ar seco e clima sem chuva pa- Charlotte Felton, dia 15 de
algo surpreendente e, ao mes- recem perturbá-los muito. abril de 1771 – Brasil.
mo tempo, assustador. Graças
ao fato de ter que acompanhar As mulheres negras ama-
meu marido nesta viajem, estou mentam as crianças brancas, Petra, 8° manhã
presa aqui. É tudo tão estranho. enquanto as senhoras claras
Tão diferente. Tão anormal. A enfeitam os cabelos ou alfabeti-
principal característica deste zam os filhos mais velhos.
mundo tão estranho são os es-
cravos mal vestidos.
Os pés descalços dos homens A Viagem de
negros lá fora andam cada vez
Vandervart
Eles são tratados como infe- mais sofridos, parecendo doer
riores. Sentados ao chão como mais e mais. As costas de al-
um bando de animais. Carre- guns desobedientes sangram ao
gando coisas para lá e para cá, sol e suas faces cansadas mos-
com medo que se pararem por tram dor. Caro leitor, sou Vandervart
alguns segundos serão bru- As árvores belas fazendo da Inglaterra, estou escrevendo
talmente punidos. Pedaços de sombra e produzindo frutos em nome do príncipe Carlos da
paus e galhos estão sempre ao deliciosos tornam a paisagem Inglaterra. Depois de 49 dias no
alcance das mãos nas cadeiras deslumbrante. Pássaros estra- mar finalmente cheguei à colô-
e cestos na sala de jantar, espe- nhos voam e cantam pelo céu.nia portuguesa chamada Brasil,
rando serem usados para punir e Alguns são tão grandes que pa-mal comecei a explorar a região
disciplinar. recem enormes cavalos. e dei de cara com alguns enge-
nhos de açúcar, acompanhados
Surpreendentemente, aqui é Os escravos nunca falam ou de uma igreja com vários es-
mau visto aquele que maltra- olham nos olhos. Com medo nas cravos indígenas e africanos,
ta seu escravo mais do que ele faces, só falam quando invoca- fiquei chocado com a nudez dos
11
12. indígenas, mas, o que parece es- agora tenho visto tipos exóticos sendo negros, ainda são homens
tranho para gente, é normal para de animais e homens, nos quais e irmãos. Eles merecem os mes-
eles. nunca vi antes. mos direitos que nós.
Reparei que havia poucos As condições de vida dos es- Juliana Ketzer, 8° ma-
escravos índios, mas muito es- cravos são péssimas. As mulhe- nhã
cravos negros (da África). Os res negras geralmente cuidam do
portugueses preferiam os es- trabalho doméstico, mais leve,
cravos africanos, pois eles não porém ainda difícil. Cuidam das Viagem maluca
conheciam o lugar tanto quanto crianças, dão leite, cozinham,
os índios, assim não teriam tanta limpam e arrumam.
facilidade para escapar.
Os homens cuidam do traba- Eu viajei no tempo em busca
Fiquei na casa de um senhor lho duro, muitas vezes expostos da espada laser do Skywalker,
branco, vi as escravas no traba- ao sol quente do dia. A má ali- mas eu caá no Brasil do século
lho doméstico, elas costuram e mentação é muito frequente, os XVI.
servem a mesa de manhã e de senhores de engenho se alimen-
noite, durante as refeições. tam de carne seca e raramente Quem colonizou o Brasil
comem frutos ou verduras, por foram os portugueses e quem
Percebi, também, que a eco- isso, doenças por falta de ali- trabalha para eles são os escra-
nômia da colônia é movida mentos são muito comuns nos vos que vieram da África, eles
pelos escravos. Eles colhem a engenhos. Os escravos comem são maltratados e os seus donos
cana-de-açúcar, a trituram no as sobras da comida dos senho- dão varadas neles. As escravas
moinho do engenho e colocam o res de engenho e muitas vezes usam saia e blusa e os escravos
caldo em uma fornalha. Depois, não têm o que comer. calças.
quando ela seca, batem o caldo
petrificado para deixa-los grãos Os escravos usam calças Vinícius Boró, 8° tarde
e assim poderem ser embalados compridas e não usam camisas,
e enviados aos navios nos por- as mulheres usam saias curtas,
tos. e, para minha surpresa, às vezes
nada sobre os seios. O abuso se-
Lucas P., 8° manhã xual de mulheres negras é fre-
quente. Muitas vezes elas têm Os escravos na
filhos com os senhores de enge-
nho. Raramente, o filho herda a Colônia
fazenda, mas em alguns casos,
ele se torna um escravo como
Diário de sua mãe.
Os escravos eram tratados
como inferiores, como escravos
Viagem Os escravos são vendidos
mesmo. Comiam ração, aquês,
como mercadorias, eles são tra-
tados como animais e objetos. feijões e hortaliças. E se fizes-
Os senhores de engenho os pu- sem coisas que seu dono não
Meu nome é Drika Verho- nem quando tentam fugir, ou gostassem levavam chicotadas.
even e viajei porque o Rei me fazem coisas erradas, mas não Alguns escravos trabalhavam
mandou para relatar as condi- fazem questão de matar, se não, com a produção de cana-de-
ções dos escravos nos engenhos teriam menos mão de obra para açúcar, alguns trabalhavam nas
da colônia portuguesa chamada trabalhar em sua fazenda. casas fazendo comida e arru-
Brasil, estamos no ano de 1725. mando a casa e outros em vez de
Essa era minha missão, e eu a cortar a cana-de-açúcar moíam a
Sou holandesa e tenho 19 anos.
cumpri, relatei tudo o que vi por cana. Eles dormiam em senzalas
Há poucas mulheres viajando,
aqui, provando que os escravos e quando se machucavam mo-
porque as condições nas em-
são mal tratados e a escravidão endo a cana, perdendo a mão ou
barcações são péssimas. Até
tem de acabar, porque, mesmo perdendo uma parte do corpo, o
12
13. seu dono fazia um curativo no No tempo que estive lá, per- que se não cumprissem, leva-
escravo machucado e o obriga- cebia que havia uma ordem e vam varadas, chicotadas e mui-
va a continuar trabalhando que um complicado processo para se to raramente pauladas.
nem um condenado. produzir o açúcar. tudo começa-
va com os escravos colhendo a Eles usavam de tudo para
Arthur Pedroso, 8° canas com facões e foices. Após ficarem trabalhando o máximo
tarde terem feito isso, eles transpor- que podiam aguentar, para isso,
tavam a cana para os moinhos, era muito comum escravos uti-
que se localizavam nos próprios lizarem o pango – uma erva que
engenhos. Existiam dois tipos traziam da África e era fumada
de moinhos no engenho em que – e a cachaça, feita do próprio
Companhia das eu estava, um moinho de água e caldo da cana-de-açúcar. Isso
diminuia o sofrimento dos es-
Índias Ocidentais outro movido por escravos.
cravos por um tempo, mas logo
Quando a cana era moída, o escravo adoecia e morria.
extraia-se dele um caldo, que
Ao meu senhor Nassau era transportado para a fornalha Então meu senhor, foi isso
onde se solidificava. Depois que que consegui coletar de infor-
Caro senhor, viajei no ano de
saía da fornalha ele era empaco- mações durante minha estadia
1602 para o Novo Mundo. Saí
tado e transportado por escravos no Novo Mundo.
dos portos da Europa no mês de
até o porto.
maio e cheguei no mês de ju-
lho. O engenho se localizava per- Hugor Borba, 8°
to da selva, mas não muito longe manhã
Quando cheguei lá, logo fui
do porto para que se facilitasse
para um dos primeiros enge-
o transporte e para que não fal-
nhos, onde fui trabalhar como
tasse madeira para a fornalha e
carpinteiro.
para as peças que eu esculpia.
As casas da família dona do
Os escravos por si eram uma
engenho tinham poucos mó-
parte importante do engenho em
veis, além de sua mobília feita
que eu estava, eles é que faziam
por mim, que seriam as camas,
todo o trabalho manual e pesa-
baús, móveis, cabides, etc.
do. Eles tinha metas a cumprir,
13
15. um mar de arvores. Atravessa- Anotei tudo em meu caderno,
mos a selva e depois avistamos nos mínimos detalhes. Essa se-
Uma Viagem algumas pessoas que já estavam ria a primeira e a última vez que
Estranha habitando a região: já havia vi- fiz isso.
las, igrejas e edifícios maiores.
Não eram nativos, lógico. Mas No últimos dias da viagem, a
alguns nativos estavam entre tarefa era explorar uma casa do
Para começar: meu nome é eles, mesmo que vivessem mais novo mundo, para saber como é
Kathryn Camsey e vivo na Fran- nas florestas. Os nativos usavam a convivência e os costumes dos
ça sobre a coroa francesa há 6 a tintura de algumas plantas- escravos com os outros.
anos, mas sou britânica nata. Es- como urucum- para fazer pin- Os escravos vindos da África
tamos no ano de 1780. turas corporais; caçavam com faziam os trabalhos mais duros,
enquanto os outros – os que ha-
Vamos onde tudo começou: arco e flechas. viam nascido na colônia - fica-
recentemente, a pedido do prín- Em menos de três dias os vam com trabalhos mais leves
cipe, temos que nos voluntariar comandantes da viagem já ha- e de confiança do senhor. Em
para uma viajem cujo objetivo viam arranjado casa para nós. relação aos escravos africanos,
é recolher informações sobre Enquanto isso, passávamos as nunca tinha visto gente com o
terras exóticas, que segundo ele noites na caravela, em nossos tom da pele mais escura, mas
poderia ser útil para o conhe- aposentos. Era programado para eu acho errado classificarem
cimento cientifico e engrande- ficarmos um mês lá, mas tínha- as pessoas desse jeito. Eles até
cimento da nossa nação. Achei mos a opção de escolher apenas agrediam os pobres negros caso
interessante e embarquei como duas semanas. Foi a que esco- não fizessem o trabalho como
voluntaria, sou a única mulher lhi. Não iria ficar com aqueles desejado; mas, mesmo em rela-
num bando de homens, aalém animais por mais de sete dias. ção a punição, havia restrições:
de Ema Faure, uma loura que segundo algumas ideias dos se-
veio junto com seu marido. Deram-nos as instruções nhores, não era bem visto matar
quando fomos para nossa hos- o próprio escravo, sem contar
II. A Viagem pedagem em terra firme. Cada que isso causaria ao proprietário
Bem, agora estou dentro da uma tinha dois ou quatro escra- um enorme prejuízo. Eu odiei
caravela, sentindo o vento em vos- dependendo do tempo que tudo que vi na relação entre se-
meu rosto, tranquilamente, en- iria ficar. nhores e escravos. Os meus es-
quanto eles não param de falar Nos primeiros dias fomos cravos temporários foram bem
lá em baixo. Estou no mastro. até os engenhos para conhecê- simpáticos, até.
É o único lugar em que não sou los: ficavam perto dos rios, e do No último dia de nossa hos-
incomodada; não sabia que terí- litoral. O engenho trabalhava pedagem na colônia, encon-
amos tantos idiotas como volun- incessantemente moendo cana trei um francês que havia visto
tários. por meses. As casas, ao redor quando visitei o engenho e que
ficou olhando para mim. Não
É o primeiro dia de viajem, do engenho pertenciam ao se-
pude evitar em reparar nele tam-
e por enquanto está tudo bem. nhor do engenho, eram bonitas.
bém: loiro, com uma barba notá-
Não sei quanto tempo falta para Sua esposa, incrivelmente mais
nova do que ele, servia apenas vel, da mesma e exata cor de seu
chegarmos em terra firme.
para gerar filhos e ficar dentro cabelo e brilhantes olhos azuis.
III. A Chegada de casa. Gostava de ficar isolado no na-
vio, como eu, mesmo que agora
Acordei com as ondas ba- Nos moinhos, trabalhavam o navio estava menos apinhado
tendo no navio pensando que mais gente, além dos senhores e de gente. Nos conhecemos e nos
poderia ser aquele pesadelo de escravos, também existiam mui- tornamos próximos.
novo. Mas não. Logo percebi tas outras pessoas que serviam Ele ajeitava meu cabelo atrás
o continente no horizonte. E é ao senhor, das mais variadas da orelha sempre que estava
bem diferente da França. Uma profissões. O engenho era real- me incomodando. Ele estava
praia que acaba bruscamente em mente enorme. apaixonado por mim e por mi-
15
16. nha destreza. Era possível notar molhada, pois, com isso a pro-
isso em seu rosto. É estranho teína que fica na terra é mais Dia 06/04/1656
ver como eu consegui viver um concentrada.
romance tão estranho, em uma Descobri que os habitantes
viagem tão estranha como essa. Os engenhos eram tocados locais alimentavam-se mal, com
Mas um pouco de amor de pelos escravos rodando a ma- duras carnes secas. E comiam
nunca afeta ninguém. Ainda não nivela que formavam as engre- poucas frutas e legumes, em
sei ao certo o que farei quando nagens dos engenhos. Os enge- compensação comiam muitos
chegar na França de novo. Tal- nhos são construídos no interior doces, como: goiabada, marme-
vez devesse entregar os meus de casas feitas de adobe e tai- lada, mel de engenho, cocada e
registros para o príncipe, e de- po. doce de caju.
pois ir para casa e nunca mais A maior parte dos engenhos O senhor de engenho sofria
sair de lá. localizava-se à beira dos rios de doenças de estômago, não
como o do Paraguaçu, Jagua- por causa da má alimentação,
Giovana, 8° manhã ribe e o Sergipe, na Bahia, e o mas pelo sol e umidade em ex-
Beberibe o Jaboatão, o Uma e cesso.
Berimbau, em Pernambuco. Além disso, a formiga saúva,
a enchente ou a seca atrapalha-
Vinicius Paiva Souza, 8° vam no plantio e na colheita dos
Relato de Johan tarde alimentos e produtos agrícolas.
Dia 06/05/1656
Meu nome é Johan, estou
partindo da Bavária com desti- No outro mês fiquei saben-
no ao Brasil. Hoje é dia vinte e Vandor e as do que os engenhos, a maioria
dois de maio de 1649, sou um deles, eram feitos perto de rios
espião e vou me infiltrar na co-
descobertas do como: Paraguaçu, Jaguaribe,
Sergipe, Beberibe, Jaboatão,
lônia portuguesa. engenho Uma e o Serinhaém e outra
Já se passaram dias desde grande parte se localizava na
minha partida e agora acabo de mata, pois senão o transporte
desembarcar no porto de Reci- Outubro de 1655.
até o porto ficaria muito caro.
fe, no Brasil, estou indo para Era também necessário ficar
uma hospedagem aqui perto, Faz três meses que eu, es-
na mata porque tinha grande
amanhã partirei para a minha pião holandês, Vandor Hoge-
fertilidade e bastante lenha.
pesquisa sobre a estrutura eco- ensen concluí minha missão no
Muitos ficavam à beira do
nômica da colônia dos portu- Brasil.
rio, pois o gado e as pessoas
gueses na América: o comércio Viajei por três dias em um
precisavam d’água doce e os
de açúcar. navio a pedido da coroa holan-
engenhos precisam de grande
desa, o objetivo era descobrir
mão-de-obra e grandes planta-
A principal ferramenta para como funcionava o engenho, o
ções. A mão-de-obra que eles
fazer o açúcar é o engenho. O melhor lugar para construir, a
utilizam era de escravos.
açúcar é feito da cana-de-açú- mão-de-obra etc.. Assim a corte
car. É o engenho que usa mais poderia ter idéias para influen-
Dia 06/06/1656
a cana para fazer o açúcar, os ciar e melhorar a economia nas
escravos extraem o caldo da colonias do meu próprio país.
No mês seguinte coletei mais
cana, que se denomina garapa, Assim que cheguei tive um
informações. É que muitos bati-
e é desse líquido que se faz o pouco de dificuldade para en-
zavam seu engenho com nome
açúcar. tender o idioma, mas depois
de santos protetores: São Fran-
logo me acostumei. Irei lhes
Os engenhos são construídos cisco, São Cosme e Damião,
contar dede o meu primeiro mês
perto dos portos, pois a terra é Santo Antonio. Outros tinham
até o ultimo.
mais fértil por causa da terra nomes africanos e até de frutos
16
17. de árvores. Desde que eu cheguei ao Bra-
Na família senhorial é pa- sil, tenho prestado atenção na
triarca que manda, exige respei- vida dos escravos e como fun- Diário de
to e autoridade. Suas esposas são cionam os engenhos. Estes pre-
na maioria das vezes jovens e
só servem para cuidar do servi-
cisam de grandes plantações de
cana-de -çúcar e grande mão de
Mituhan
ço doméstico e gerar filhos, mas obra escrava, pois eles plantam
na ausência do marido é ela que a cana, colhem, moem a cana e,
toma conta dos negócios. O se- acondicionam e transportam o
nhor também procurava as mu- açúcar.
lheres escravas para satisfazer Eu saí da Bavária no dia
seu prazer. Nestes últimos dias estive 11/11/1625, em direção ao Bra-
mais atenta ao jeito que as outras sil, tinha que observar os enge-
Bruna Sthefanie, 8° tarde pessoas tratam e enxergam os es- nhos dos portugueses no Brasil.
cravos. E descobri que estes são Essa missão foi concedida a mais
tratados como “coisas”, o que é cinco pessoas, pelo rei.
considerado normal e uma regra
seguida pela igreja Católica. Finalmente chegamos ao
Brasil, fingimos ser navegadores
Novo mundo, Mas quem dá muito casti- portugueses, agora que começa
go físico é condenado. Não se minha missão.
pedaços de um deve dar “couces” (pauladas),
diário principalmente na barriga das Eu percebi que a mão-de-obra
mulheres grávidas, nem é per- era formada por negros africa-
mitido aleijá-los, pois com isso nos, eles trabalhavam sem cessar
10 de dezembro de 1650 não trabalharão mais com tanta e dava pra perceber que trabalha-
eficiência. Ao invés disso, os se- vam por medo, havia um senhor
Eu sou Emma, e hoje saí da nhores preferem dar varada com que ficava olhando com um chi-
França de navio, com destino ao cipó nas costas para punir os es- cote e os escravos faziam tudo,
novo mundo, a colônia portu- cravos. cortavam a cana, plantavam e
guesa Brasil, em serviço da Co- colocavam para moer, eles eram
Os escravos comem ração de tratados como coisa, objetos e,
roa Francesa. farinha de mandioca ou milhos, pelo que eu percebi, era possível
E aqui começa a minha aven- coquinhos chamados aquês, fei- ao escravo comprar sua liberda-
tura! jões de hortaliças. E os doentes, de, mas poucos conseguiam.
Hoje, 45 dias depois da mi- carne de galinha.
nha partida, cheguei ao Brasil, Hoje um senhor me convidou
em Pernambuco. As escravas vestem saia e para ir a sua casa, eu vi que os
Aqui o porto é bem agita- blusa feitas com pano de surrate senhores tem uma alimentação
do por causa da exportação de ou baeta e os escravos só usam muito ruim eles raramente co-
açúcar. Além disso, muitos en- calças. mem frutas, e as frutas que vem
genhos se encontram próximos
Para aliviar o sofrimento do de Portugal chegam mal conser-
do porto, pois seus donos podem
cativeiro, usam cachaça e ma- vadas, mas eles abusam muito
economizar no transporte de
conha, aqui chamada de pango, nos doces, que são, normalmen-
açúcar até os navios. Também te, feitos a partir do caldo de
que são trazidas pelos navios.
ficam nas matas porque as terras cana-de-açúcar.
são férteis e têm bastante lenha. Catarina Rodrigues
As terras são tão boas que nem A base dos engenhos são os
precisam de irrigação, mas como Sampaio, 8° tarde escravos, pois sem eles nada
o gado e os escravos precisam de funcionaria. Os engenhos ficam
água doce, muitos engenhos fi- próximos de rios e do litoral,
cam à beira dos rios. porque barateava o transporte
dos sacos de açúcar até o porto.
17
18. Os engenhos também precisa- tipo de terreno e fortunas ou
vam de muita lenha, então os podiam ser vendidos. Eram vis-
senhores preferem construí-lo tos como mercadorias e se ali- A vida dos
próximo de rios. mentavam de sobras de comi-
da. Para aliviar toda a pressão escravos
No interior dos engenhos e sofrimento, eles inventaram
existem vários mecanismos, a alguns tipos de jogos e danças
“máquina” para moer a cana é como, por exemplo, a capoeira. 04/02/1700
basicamente vários rolos bem
perto uns dos outros e dois es- Em minha opinião, sem dú- Acabei de chegar na
cravos que fazem força para vidas, os escravos não eram tra- Bahia pelo Rio Sergipe, numa
girar uma manivela de madeira tados como seres humanos. Não viagem de 45 dias, estou ali-
presa aos rolos, que fazem com tinham nenhum tipo de liberda- viado por finalmente chegar em
que eles rodem e esmaguem a de, muito menos poder político. terra firme, já estava ficando
cana. Não faziam parte da sociedade. enjoado com balanço do navio.
Eram condenados a trabalhar. Estou me dirigindo para uma
Gregório P. Hirama, Eram proibidos de praticar sua
hospedagem onde ficarei duran-
8° tarde religião de origem africana ou te a minha missão. Fui manda-
de realizar suas festas e rituais do pelo rei da França Luís XIV
africanos. Tinham que seguir para mandar um relatório sobre
uma única religião: a católica. a vida dos escravos nos enge-
As condições de Quem sofria com a escravi-
nhos.
dão, não eram apenas os adul- 05/02/1700
vida dos tos. As crianças negras também.
Hoje consegui me infiltrar
escravos Elas eram completamente ex-
em um engenho e iniciei as mi-
cluídas da riqueza e do conheci-
mento, quando estavam na casa nhas observações.
dos senhores deviam sentar-se Os escravos podem ocupar
Meu nome é Scarllet, sou no chão e vestiam roupas extre- as seguintes posições: oficial
uma jovem peregrina, vivo via- mamente simples ao contrário da casa de caldeira, purgadores,
jando em busca de novas des- de outras crianças brancas, que no serviço de enxada, como tra-
cobertas. Parti da França para o tinham uma qualidade de vida balhadores da casa de caldeira,
Brasil, a mando de meu senhor, infinitamente melhor. carreiros, carapinas, pedreiros,
para poder conhecer e observar condutores de saveiros, costu-
a cultura de outros povos. Escrevi esse relato, para abrir
os olhos das pessoas. Quem reiras, bordadeiras e lavadeiras.
Participei de várias guer- sabe, se batalharmos muito, du- Eles trabalham mais de 14 horas
ras, tive várias experiências de rante algum tempo e se todos por dia.
habitar lugares novos e conhe- nós ficarmos unidos consegui- Os escravos dormem em lu-
cer o que os povos cultivavam. remos lutar pela liberdade dos gares chamados senzalas que
Muitos deles cultivavam vários homens escravizados. são lugares sem iluminação fei-
tipos de alimentos, como frutas, ta de madeira e telhas de barro
mandioca, milho e batata. Mas Aguarde, ainda vamos con-
e sem assoalhos. As punições
o que mais me chamou atenção seguir o fim da escravidão. E aplicadas são dolorosas, porém,
em minha viagem foi o modo escreverei novamente assim leves, pois se um escravo mor-
de vida dos escravos. O que vou que puder. rer ou ficar aleijado, isso pode
relatar, agora. Deixo a minha palavra. Se as significar um prejuízo ao senhor
Quase todos eles eram ne- pessoas ficarem unidas conse- de engenho.
gros. Serviam seus senhores e guiremos! 06/02/1700
patrões da maneira mais sofrida Fabiana, 8° tarde
possível, como por exemplo, Hoje fiz as seguintes obser-
podiam ser trocados por algum vações:
18
19. Os escravos se alimentam Vim pra cá, na 47ª caravela e dormem acorrentados para não
de farinha de mandioca, milho, como já é de vosso conheci- fugirem. Também são castiga-
coquinhos, feijões e hortaliças; mento muitos homens e escra- dos e açoitados constantemente.
os doentes comem carne de ga- vos morrem na viagem, vitimas Não podem praticar sua religião
linha, porém, esses alimentos de doenças, fome e falta de con- e são obrigados a seguir a reli-
geralmente são de má qualida- dições de higiene. gião católica imposta pelos se-
de ou estragados. Eles bebem nhores de engenho.
aguardente e consomem pango Vos envio esta carta para
que é uma erva trazida clandes- pedir que enviem uma nova Isaac Campos, 8° tarde
tinamente nos navios negreiros, remessa de escravos, pois qua-
eles as usam para aliviar o sofri- se todos de meu navio ficaram
mento do cativeiro. doentes.
Obrigado.
Os escravos são divididos O destino de
em três grupos: os boçais, que Nêmeses
são os recém chegados da Áfri-
1/4/1648 Aristha
ca, os ladinos que já entendem o
português, pois já estão no Bra- Senhor, vivo no Brasil há
sil há algum tempo e os criou- exatos oito anos e como a mis- Olá, meu nome é Aristha,
los que são os que nasceram no são que me foi dada estou re- tenho 17 anos e sou inglesa,
Brasil. Os grupos estrangeiros portando minha estada aqui. meu pai é mercador de peixe
não gostam muito dos crioulos.
Os escravos africanos são man- Desde que vim para cá ini- e minha mãe é uma cozinheira
dados para os trabalhos pesados ciei o cultivo de cana-de-açúcar de uma família muito rica e po-
e os mulatos e crioulos são de- e, apesar dos impostos, tem me derosa de Londres. Eu sou uma
signados para tarefas mais le- trazido um bom lucro, além da peregrina, por isso não vejo
ves. possibilidade de participar ati- muito meus pais, faço muitas
vamente da estrutura do poder missões e protejo meu reino do
Gabriel, 8° tarde colonial. mal. Hoje primeiro de janeiro
de 1700 voltava para casa para
Agora, a pedido do rei, te- visitar meus pais, o vento esta-
nho algumas informações sobre va forte e balançava meus cabe-
a vida dos escravos na colônia. los vermelhos, eu andava pelas
Cartas de O transporte dos escravos da ruas vazias de Londres, as ruas
África ao Novo Mundo é feito podiam estar vazias, mas as ca-
nos porões dos navios negrei- sas estavam cheias de pessoas
Nêmeses ros, os escravos ficam amontoa- que dançavam e cantavam co-
dos e em péssimas condições. memorando o ano novo, dobrei
a esquina e logo vi a casa de
12/3/1637 Muitos morrem antes de che- meus pais, mas estranhei ao ver
gar ao Brasil e seus corpos são uma carruagem da realeza, sen-
Meu senhor, em breve serei lançados ao mar. ti um aperto no coração andei
enviado para a colônia, peço a
vosso rei que melhore as condi- Nas fazendas de cana, os es- mais um pouco e entrei.
ções das Naus. cravos são muito maltratados, Ao me ver, minha mãe me
trabalham de sol a sol e, em abraçou, meu pai franziu a tes-
Como sabes, fui instruído a troca recebem trapos de roupas ta, os guardas e o príncipe sorri-
lhes reportar a cada 8 anos, tudo e alimentação de péssima qua- ram, eles eram três.
o que eu vir, portanto, adeus. lidade.
- O que você aprontou desta
1/4/1640 Passam a noite nas senzalas, vez Aristha? Perguntou meu pai
que são galpões escuros, úmi- confuso
Cheguei a nova terra, a qual
dos e de péssima higiene. Todos
tem um clima muito agradável.
19
20. - Que eu saiba nada. migo, mas se morrer morrerei um grande campo bem aberto
de glória. Mas mãe, pai sempre onde havia vários cavalos, eu
- Aristha ouvi falar muito irei amar vocês lembrem-se fiquei perto de uma linda égua
bem de você! Disse o príncipe disso. marrom com a cara branca. O
- Vamos direto ao ponto. príncipe logo apareceu:
Uma lágrima escorreu em - Bom dia guerreiros e guer-
Disse eu meu rosto, mas eu a sequei rapi- reiras hoje irão iniciar o trei-
damente e entrei na carruagem,
- Gostaria que se unisse a ou- namento de campo, primeiro
tras 17 mulheres e 45 homens o príncipe me ajudou, os guar- escolham um cavalo, depois
para irmos até Portugal aonde das começaram a movimentar a pratiquem o manuseio da espa-
embarcaremos para o Novo carruagem, acenei para os meus da e por ultimo montem no ca-
Mundo. pais que choravam e logo eles valo e pratique o manuseio da
desapareceram no horizonte. espada com um colega.
- E eu serei paga por isso? Minha mente estava vazia, eu Nós treinamos durante dois
- Muito bem paga,no míni- estava mais pálida do que nun- dias, no dia 5 acordamos bem
mo 10000 moedas em ouro e ca. cedo as 5h00 horas, arrumamos
então? Logo o príncipe falou: nossas coisas e os suprimentos,
saímos as 7h00 e fomos até o
- Eu aceito desde que tudo o - Aristha já te falaram que... porto onde um veleiro de três
que receber seja dado aos meus Você é muito bonita?
velas nos aguardava, foram 4
pais.
- Já sim. dias de viajem até San Sebas-
Neste momento minha mãe tian na Espanha, e de lá foram
arregalou os olhos, meu pai co- - Você viaja muito? Mata 2 dias a cavalo até Cascais em
çou a cabeça e agora os guardas monstros? Quais? Portugal.
estavam confusos. Chegando lá fomos ao en-
- Sim já viajei para vários lu-
contro do príncipe Camafeu e
- Tudo bem. Disse o prínci- gares como Grinford, Damboor, sua tropa, nós conhecemos to-
pe, contente. Gratasgrove, Pastos de Swerdi-
dos e eles eram muito adorá-
field, Kingshil, Floreasta Sel-
Eu fui ao meu quarto, peguei vagem, Slimfor, Santuário de veis, escolhemos um lugar para
uma bolsa de ombro marrom, Werian, matei vários monstros acampar(gramado) e compra-
alguns vestidos, armas e sapa- como; gremilins, bruxas, guer- mos os suprimentos para longa
tos. Ao sair do meu quarto mi- reiros mortos vivos, monstros viajem; biscoitos, carne salga-
nha mãe me abraçou, meu pai do lodo, cães farejadores, espi- da, peixe seco,banha, lentilhas,
também me abraçou só que ele ões wildress, javalis da selva, arroz, favas, cebolas, alhos, sal,
estava meio sem graça e eu sa- trolls. vinagres, mel, passas e trigo. A
bia o que ele pensava. tardezinha fomos caçar para o
- Ao contrário de você eu jantar, caçamos alguns javalis e
‘’Minha filha está indo em nunca matei nenhum monstro o assamos na fogueira, enquan-
uma missão no meu lugar’’. nenhuma pessoa, meu pai e to ele não ficava pronto can-
Eu sai de casa, uma carruagem minha futura esposa são muito távamos e dançávamos várias
branca com cavalos brancos a exigentes nessa parte eles que- musicas e danças de culturas
nossa espera, despedi-me e co- rem que eu não me machuque e diferentes: um pouco de russo,
mecei a andar até a carruagem, deixam isso para os mais insen- belga, italiano, dinamarquês,
mas antes de entrar minha mãe síveis. Disse ele muito triste. sueco e varias outras culturas.
disse: Nós cavalgamos até o pa- No dia seguinte zarpamos
de Cascais, eram quatro na-
- Mas filha e se você morrer? lácio tranquilamente, conheci
vios, e em cada navio estavam
Logo senti um arrepio, o vento o Rei, e os 62 guerreiros, nós
cerca de 30 pessoas e mais os
ficou mais forte e os cavalos se descansamos e dormimos com
muita nobreza. No outro dia cavalos de cada uma. Foram 3
assustaram.
fomos acordados bem cedo, to- meses de viajem, no primeiro
- Se retornar trarei a paz co- mamos café e nos reunimos em mês enfrentamos um Kraken,
os alimentos começaram a apo-
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21. drecer, no segundo mês pulei Os engenhos eram bem per-
no mar para pescar mas apenas tinho do litoral, caso contrário
pesquei um bacalhau velho e os escravos fugiam para selva,
desgastado, alguns alimentos fi- naquela época uma guerra en-
caram meio apodrecidos e só as tre os índios e os estrangeiros
carnes extremamente salgadas, estava prestes a começar, mas Uma certa
os peixes e o arroz sobrevive- alguns dias antes vários grupos
ram, no terceiro mês matamos de guerreiros entraram na mata
“basilo*-fobia”
uma espécie de serpente mari- para espionar as aldeias indíge-
nha, os alimentos apodreceram nas, mas eu não achei uma boa
por inteiro. ideia, pois os índios conheciam
Querido diário hoje tudo
Finalmente chegamos. As melhor a mata do que nós, no
parecia calmo, quando de re-
montanhas eram grandes e altas, caminho encontramos várias
pente, encontrei um índio que
os campos verdes de plantações plantas e bichos estranhos. A
estava com “basilo-fobia” e ele
e casarões enormes a vista, nós aldeia era bem estranha, tinha
precisava de ajuda, então nós
desembarcamos e com os cava- umas tocas e um rio, ao chegar-
continuamos andando até nos
los cavalgamos até o vilarejo mos mais perto da aldeia fomos
darmos de cara com um mis-
que era bem simples, os escra- surpreendidos por índios que
sionário, nós três estávamos na
vos quase sempre eram negros nos torturaram muito, mas por
selva quando repentinamente o
alguns eram índios, eles usavam sorte eu e Catarine conseguimos
missionário teve uma ideia em
roupas desgastadas e imundas, fugir.
relação ao índio.
eles eram alimentados por res- Nós voltamos até o vilarejo
- vou catequizá-lo -, disse
tos de comida, trabalhavam em e fomos até um casarão onde os
ele.
pequenos grupos, nos engenhos príncipes estavam hospedados,
E, durante a catequização do
, onde cultivavam legumes, fru- contamos o que havia aconteci-
índio, eu estava preparando as
tas e animais de criação. Os es- do, e indicamos o local, eles jun-
armadilhas.
cravos eram sofridos, eles mo- taram uns soldados que tinham
- para que todas essas arma-
ravam nos engenhos que eram sobrado e fizeram um ataque
dilhas? Perguntou o índio.
bem rústicos era iluminado por surpresa na aldeia, mas muitas
- para a Coroa portuguesa -
frestas na parede. crianças morreram, eu fiquei
respondi.
Cada família acolheu dois muito triste e decidi ir embora,
guerreiros em sua casa, a fa- antes de partir, porém, o prínci-
* basilo: rei em grego
mília que me acolheu também pe tentou me impedir e eu disse
uma jovem chamada Catarine, a que voltaria, também disse uma
família nos deu comida deixou ultima palavra:
Ian, 8° tarde
nós tomarmos banho, estáva- - Fique de olhos no horizon-
mos cheias de pulgas, mas nos te, que eu retornarei quanto tu
livramos delas. Algumas escra- menos esperas.
vas trabalhavam lá na casa, eu Fim.
estranhei ao ver que elas eram
bem vestidas usavam colares de Bibliografia
pedras preciosas. As jovens da Baseado no jogo me-
família liam e aprendiam com dieval Drakensang Online
professores particulares para se E no livro Uma Breve Histó-
tornarem boas esposa, uma de- ria do Brasil de Mary del Priori
las chorava muito, pois não que-
ria se casar com o pretendente Fernanda, 8° tarde
que a família tinha escolhido,
mas ela não tinha escolha pois
se não casasse com ele ela seria
expulsa da família.
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22. estômago, por causa dos maus acorrentados dentro das senza-
ares do trópico. Pois na Colônia las para evitar as fugas.
é comum as enchentes e secas
Costumam ser rústicas, aba-
Relatos de um que além de fazerem mal difi-
fadas (possuíam poucas janelas)
cultam muito a plantação e co-
viajante e desconfortáveis. Eram cons-
lheita de alimentos frescos.
truções muito simples feitas
Julia, 8° tarde geralmente de madeira e barro
e não possuíam divisórias. Os
escravos dormiam no chão duro
Hoje, eu estou no Brasil para de terra batida ou sobre palha.
saber um pouco sobre como são Na frente das senzalas é comum
seus costumes e como é sua eco- a existência de um pelourinho -
nômia. Estou um tanto cansado
depois de minha longa viagem Viagem ao Brasil, tronco usado para amarrar o es-
cravo onde ele será punido com
até aqui, pois peguei uma cara- Vida dos escravos uma vara ou chicote por algum
vela e depois uma carruagem. crime cometido.
Meu senhor, o também ho-
landês, Vandeer que me man- Fiquei sabendo que os escra-
Caro leitor.
dou aqui para descobrir mais vos vivem a maior parte de seu
sobre esse povo. Bem, o que Chamo-me Celemina sou fi- tempo nos engenho trabalhan-
descobri até agora se resume a lha do Belizário um homem de do, colhendo e moendo cana.
sua economia. sabedoria, julgamento correto, Esse trabalho era exaltante,
Os nativos do Brasil cons- sagacidade, bom senso, habili- pois poderia ocupar dia e noi-
truíram engenhos, que se loca- dade para ensinar, ignorância, te. Trabalhavam de sol a sol e
lizam na mata, perto do porto, egoísmo, presunção, preguiça, eram castigados com violência
pois o transporte até os navios imaginação em excesso e uns quando não cumpriam ordens,
é mais barato. Alguns também dos homens mais rico da cidade erravam no trabalho ou tenta-
ficam próximo aos rios, como o em que eu moro na França. Sou vam fugir. Tinham que executar
Paraguaçu, Jaguaribe, Sergipe, uma pessoa que adora viajar todos os trabalhos solicitados
Beberibe, Jabotão, Una e Seri- para fora do país em busca de por seu “dono”.
nhaém. conhecimento e diversão.
A maioria dos engenhos se
Além de ser mais barato para
Também sou uma pessoa localizava na mata, não muito
transportar até os portos, a van-
aventureira e vou contar sobre distante do centro portuário, o
tagem de ser localizar perto do
uma das minhas viagens da qual que se explica pela fertilidade
mar ou do rio se da porque os
viajei para o Brasil em 1602, dos terrenos e pela a abundân-
engenhos precisam de muita
pois gostaria de conhecer mais cia de lenha que se utilizava
água para o cultivo de cana-
sobre os escravos que existem para alimentar as fornalhas fa-
de-açúcar, além disso, as terras
por lá. Passei alguns messes em mintas.
nesses locais são mais fertéis.
senzalas pelo Brasil onde habi-
Sobre a alimentação dos na- O número de escravos neces-
tava varias pessoas sofridas.
tivos, eu descobri que os senho- sários para operar um engenho
res de engenho comem muito A senzala era uma espécie variava muito de acordo com o
mal, comem carne dura e secas de alojamento dos escravos tamanho da propriedade e com
e quase nunca comem frutos ou brasileiros. Elas quase sempre os altos e baixos da exportação
legumes. No entanto, eles co- ficavam próximo da unidade de açúcar.
mem muitos doces, como goia- de produção (engenho, mina
badas, doces de caju, marmela- A maioria dos engenhos, no
de ouro e fazenda de café). As
das, cocadas e mel de engenho. nordeste do Brasil, possuía entre
senzalas eram galpões de por-
Fiquei sabendo, também, sessenta e oitenta escravos, mas
te médio ou grande em que
que o senhor do engenho sofria havia propriedades operando
os escravos passavam a noite.
de muitas dores e problemas no com mais de duzentos cativos.
Muitas vezes, os escravos eram
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23. Em Pernambuco, instalavam- e, bem do lado, escondido, uma
se engenhos ao longo dos rios mala com as roupas do peixei-
que se concentram próximo do ro; na mesma hora, peguei al-
Atlântico, como no Planalto da A vida de uma gumas roupas “emprestadas”,
Borborema e na Zona da Mata me vesti e entrei no navio sem
em que predominavam arredon- dinamarquesa que ninguém percebesse, a úni-
dados morros e colinas. ca coisa que notaram foi o meu
mau cheiro.
Os engenhos usavam água
doce e trapiches na prensas e No dia 7 de Abril de 1714, Dias se passaram, Parecia
moinho que trituram a cana. meu pai, Pierry Pinheiro II, re- uma eternidade até que ouvi o
Não é a toa, também, que a cebeu ordens do rei da França, barulho da movimentação, dei
maior parte dos engenhos loca- Luiz XIV, com o dever de arre- uma espiadela: estavam prepa-
lizava-se a beira de rios como o cadar mais escravos indígenas rando para descer do navio, já
do Paraguaçu. A força da mo- no Brasil, nem que para isso estávamos em terra firme!
enda determinava a produtivi- seja necessário matar uma al-
dade na extração do caldo. Para deia inteira. Ele embarcaria em Esperei que todos desembar-
fazê-la girar havia água, bois, um navio, junto a outros fran- cassem antes. E, ainda disfarça-
cavalos e, claro, homens, que se ceses. da com as roupas do peixeiro, sai
alternavam, na preferência ou do navio como se fosse comum
Mas naquela época, não entre os homens. Espantei-me
necessidade dos senhores dos havia quem cuidasse de mim, quando percebi que estávamos
engenhos. As moendas sempre minha mãe Eliza I, uma dina- em um lugar praticamente co-
na vertical tinha o diâmetro de marquesa, tinha morrido, dei- berto de matas. Perdi-me logo
aproximadamente sete metros. xando-me com o meu pai. Esta- quando entrei nela.
Acoplada ao eixos da roda va para fazer dez anos.
d’água havia outra roda menos Aproveitei para tirar aquelas
dentada, chamada rodete, que Eu, Violett II já tinha com- roupas horríveis e fedorentas
transmitia movimento a uma pletado 16 anos, o que me dava do peixeiro. Comecei a andar e
roda maior, esta horizontal e a liberdade de escolher o rumo observar, só via árvores e mais
com o mesmo diâmetro da roda da minha vida. Mas meu pai não árvores. De repente ouvi uma
d’água que se chamava bolan- queria me deixar na França, era música, linda e suave como o
deira. Os portugueses traziam muito perigoso. Então resolveu vento. Resolvi procurar para sa-
os negros africanos de suas co- mandar um primo da Espanha ber de onde vinha aquela músi-
lônias na África para utilizar vir cuidar de mim. ca. Avistei então um garoto em
como mão de obra escrava nos
No dia 15 de abril de 1715, cima de uma pedra, estava nu,
engenhos de açúcar .
recebi uma carta do primo de cheio de pinturas e com um co-
Maria Stella, 8° tarde meu pai, dizendo que não pode- lar de penas; nas mãos, levava
ria chegar a tempo e nem viria, uma flauta, era dele que vinha
pois não tinha como pagar nem a música.
mesmo um barco, desculpou-se. Deixei me levar pelo som, e
Só que naquele momento meu quando abri os olhos, a músi-
pai estava embarcando para o ca sumiu e o garoto não estava
Brasil. Não pensei duas vezes, mais lá; fui até a pedra, como
arrumei as minhas malas o mais ele poderia evaporar desse
rápido possível e corri, corri jeito?Procurei pelos cantos da
tanto que chegava até voar. Pa-pedra, até que desisti. Quando
rei quando vi o navio. olhei pra traz, me espantei, lá
Parecia impossível, como estava ele olhava para mim com
eu entraria lá? Era o que me os olhos cheios de raiva e ao
perguntava. Até que vi do meu mesmo tempo mostrava estar
lado uma barraquinha de peixe, com medo. Tentei me aproxi-
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