Conferência SC 24 | Data Analytics e IA: o futuro do e-commerce?
Organizações Rurais e o Cooperativismo em São Paulo
1. Casa da ISSN 0100-6541
Ano 14 - Nº 1
Agricultura
Jan./fev./mar. 2011
ORGANIZAÇÃO
RURAL
Evolução do Associativismo e do
Cooperativismo e a Contribuição
da CATI
Breve Panorama sobre o
Cooperativismo
Cooperativismo Mais Perto do
Cidadão
Associação se Fortalece e Surge
um Novo Modelo de Cooperativa
em Artur Nogueira
Dracena Revigora Associações
para Participar de Programas
Governamentais
2. Editorial
A Força da União
Governador do Estado
Geraldo Alckmin
Secretário de Agricultura e Abastecimento
João Sampaio
Secretário-Adjunto
Antônio Junqueira
E sta edição da Revista Casa da Agricultura se propõe a convidar nossos leitores a se debruçarem sobre as discussões de um
tema primordial para a sobrevivência e inserção dos pequenos e médios produtores rurais no competitivo mercado da oferta
de produtos agropecuários. São abordadas nesta edição, com entrevistas e artigos, as opiniões dos principais envolvidos, nas últimas
décadas, no fortalecimento da agricultura paulista, especialmente no associativismo e cooperativismo.
Chefe de Gabinete
É, também, a forma de a CATI colocar a público o seu novo e desafiador compromisso com a agricultura paulista, o da inserção dos
Omar Cassim Neto
pequenos e médios produtores rurais nesse mercado. Desafio que começa a tocar neste início de ano com a assinatura do Projeto de
Desenvolvimento Rural Sustentável (Microbacias II – Acesso ao Mercado), mas que já vinha se desenhando e consolidando nos últimos
Coordenador/Assistência Técnica Integral
anos com o fortalecimento das associações dos produtores rurais das microbacias hidrográficas do Estado de São Paulo. Um trabalho
José Luiz Fontes
que rendeu a formação e/ou fortalecimento de 520 novas associações de produtores rurais e se firmou com a criação da Federação das
Associações das Microbacias Hidrográficas do Estado de São Paulo (Famhesp), em outubro de 2005.
Diretor/Departamento de Comunicação e Treinamento
Ypujucan Caramuru Pinto A CATI, por mais de quatro décadas, vem investindo naqueles que, com o seu trabalho, promovem a alimentação rica e diversificada,
produzida, com qualidade e eficiência reconhecidas, pelos produtores rurais do Estado de São Paulo e que chega não só à mesa dos
Diretor/Departamento de Sementes, Mudas e Matrizes brasileiros, mas também a vários cantos do mundo. Ao trabalhar com produtores, tem fortalecido as parcerias, o trabalho conjunto com
Edson Luiz Coutinho instituições como a Famhesp, o Instituto de Cooperativismo e Associativismo (ICA), a Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios
(Apta). Ainda, coloca-se à disposição de instituições, como a Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo e, por intermédio
Diretor/Divisão de Extensão Rural desta, com todas as cooperativas espalhadas pelo Estado.
José Alberto Martins Com esta edição da Revista Casa da Agricultura, esperamos fortalecer os vínculos criados ao longo do tempo e, com este tema
específico, Cooperativismo e Associativismo, compartilhar com os leitores a atual discussão sobre os rumos da produção e comercialização
de produtos agrícolas para o mundo. Então, eu o convido a se associar e a cooperar conosco em mais esta empreitada e no desafio que
temos pela frente.
Boa Leitura!
José Luiz Fontes
Coordenador da CATI
3. Espaço do Leitor Sumário
Agradecimentos 4 Entrevista
Agradezo a usted por el envio de la publicación Casa da Agricultura, 7 As Organizações de Produtores Rurais e o Microbacias II - Acesso ao
material que contiene temas de interés y hemos dado difusión. Mercado
Ing. Pablo Ângulo
Director de Relaciones Institucionales
Escuela Politécnica Nacional 9 Evolução do Associativismo e do Cooperativismo no Estado de São Paulo
Quito – Ecuador e a Contribuição da CATI na Organização Rural
13
Recebemos exemplar da Revista Casa da Agricultura, a qual teve
boa avaliação por parte da área de agronegócios do BDMG. Marcos Legais e Boas Práticas para o Desenvolvimento de Associações
Rodrigo Marques Quintas
Departamento de Planejamento e Estudos Econômicos
Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais S.A. (BDMG) 15 Famhesp: na Defesa do Pequeno Agricultor
Belo Horizonte (MG)
Recebemos e agradecemos o envio da Revista Casa da Agricultura. 16 Breve Panorama sobre o Cooperativismo
19
Bibliotecária Vanessa Christiane Alves de Souza
Universidade Federal Rural do Semi-Árido Instituto de Cooperativismo e Associativismo
Mossoró (RN)
Não deixe de nos escrever, por carta, ou e-mail
Nosso endereço: CATI – Centro de Comunicação Rural
20 Casa da Agricultura de São Miguel Arcanjo
22
Av. Brasil, 2.340 – CEP 13070-178 – C.P.960 – CEP 13001-970 – Campinas, SP
Tel.: (19) 3743-3858
espacoleitor@cati.sp.gov.br
Cooperativismo Mais Perto do Cidadão
www.cati.sp.gov.br
24 Cooperativas de Crédito: o Sucesso da Sicoob Credicitrus
25 Compras Públicas - Políticas de Incentivo à Organização de Agricultores
Familiares
Expediente 27 Associações de Botucatu Recebem Apoio para Desenvolver Projetos
Edição e Publicação - CECOR/CATI 28 Coopermota: uma Empresa com Vários Sócios
Departamento de Comunicação e Treinamento - DCT Supervisão Técnica dos Textos: Engenheiros Agrônomos Carlos 30 Associação se Fortalece Enquanto Surge um Novo Modelo de Cooperativa
Diretor: Ypujucan Caramuru Pinto Eduardo Knippel Galletta e Diogenes Kassaoka em Artur Nogueira
Centro de Comunicação Rural - CECOR Designer Gráfico: Lilian Cerveira
Diretora: Maria Rita Pizol G. Godoy Distribuição: Carmen Ivani Garcez
Impressão e acabamento: Contgraf Impressos Gráficos Ltda.
32 A Região de Votuporanga Respira Cooperativismo
Editora-chefe: Jorn. Maria Rita Pizol G. Godoy (MTB 24.675-SP)
Revisora: Marlene M. Almeida Rabello 34 Dracena Revigora Associações para Participar de Programas
Fotografias: Banco de Imagens CATI Governamentais
Reportagens: Jornalistas Cleusa Pinheiro (MTB 28.487-SP), Graça
36
Os artigos técnicos são de inteira responsabilidade dos autores.
D’Auria (MTB 18.760-RJ), Nathália Vulto Sena (MTB 58.934-SP), É permitida a reprodução parcial, desde que citada a fonte. Organização Rural em São Paulo: um Pouco da História do Trabalho da
Roberta Lage (MTB 43.382-SP) e Suzete Rodrigues (MTB 57.378-SP). A reprodução total depende de autorização expressa da CATI
Secretaria de Agricultura e Abastecimento
40 Aconteceu
4. 6 ׀Casa da Agricultura Casa da Agricultura 7׀
Montamos 16 cooperativas em um espaço as eleições) de divulgação da nossa causa e tem uma história de grande contribuição
Entrevista
de pouco mais de três anos, o que chamou sensibilização de parlamentares e assessores, acadêmica com o cooperativismo, porque
Organização Rural: Fundamental a atenção do presidente da OCB na época,
José Pereira Campos, que a partir da
experiência paulista criou uma comissão
tínhamos 217 deputados comprometidos.
RCA – Podemos dizer que todo esse
o ICA teve uma relação muito estreita com
a USP, onde havia uma luminar, a dr.ª Diva
Benevides Pinho, que deu a linha doutrinária
para o Avanço do Produtor Rural
trabalho foi fundamental para o avanço
nacional, presidida por mim e orientada pelo do cooperativismo paulista, juntamente
do cooperativismo no Brasil?
Mário Kruell, para montar cooperativas de com Valdir Bulgarelli e Maria Henriqueta
crédito por todo o País. RR – Com certeza. Acabamos inserindo Magalhães, e outras pessoas notáveis que
Por Cleusa Pinheiro – Jornalista – CECOR/CATI quatro dos cinco artigos, só não entrou o formaram os ideais cooperativistas do
RCA – Como foi o trabalho para a inclusão de educação. Além desses, entraram mais Estado, e que o Brasil inteiro adotou. Então,
de artigos sobre o sistema cooperativista dois relacionados à questão de saúde e às o ICA tem realmente uma contribuição
na Constituição Brasileira de 1988? cooperativas de garimpeiros, indicados relevante na história cooperativista e
O movimento cooperativista tem origem simbólica, em 1844, com a fundação da
RR – No período da Assembleia Nacional por outros segmentos. Portanto, hoje, a continua a ter com publicações, apostilas,
Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale, bairro de Manchester, Inglaterra, por
Constituinte, entre 1987 e 1988, vivíamos Constituição Brasileira tem seis artigos que cartilhas e livros, fomentando a criação de
um grupo de tecelões. O cooperativismo evoluiu e conquistou um espaço próprio, cooperativas e associações em todas as
um momento crucial da história do apoiam o cooperativismo, o que transformou
definido por uma nova forma de conciliar o homem e as relações de trabalho, visando o Brasil numa referência mundial, razão regiões do Estado.
cooperativismo no Brasil. Nessa época,
ao bem-estar socioeconômico dos envolvidos. Por seus princípios democráticos, o eu era presidente da OCB e montei pela qual a OCB foi aceita como membro
RCA – Em relação ao associativismo, no
cooperativismo é aceito por todos os governos. lobby consistente. Solicitei ao nosso da Aliança Cooperativa Internacional (ACI),
âmbito do Programa de Microbacias,
consultor jurídico, José de Campos Mello, em 1989. No ano seguinte, 1990, fui eleito
Desse momento histórico até os dias atuais, o movimento cooperativista ganha executado pela CATI, foram criadas e/
um advogado muito competente, que presidente do Comitê Agrícola da ACI, em
ou fortalecidas mais de 500 associações
força a cada dia. No Brasil, segundo a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), escrevesse uma cartilha sobre o que 1992 fui eleito presidente do Conselho da
e formada uma Federação para
são mais de oito milhões de cooperados em quase oito mil cooperativas. O leque de era Assembleia Constituinte e o que era ACI para o Continente Americano e, em
que os produtores tenham maior
atividades econômicas abrangidas por esse ramo é muito grande, envolvendo toda a Constituição. A partir dessa publicação, 1997, fui eleito presidente da ACI mundial.
representatividade. Como o senhor vê
solicitamos às cooperativas brasileiras que Quando saí da presidência, em 2001, deixei
cadeia produtiva. essa iniciativa?
apontassem temas que desejariam ver o Américo Utumi (que atua na Ocesp) como
Para falar sobre o assunto e também sobre a organização de produtores rurais em inseridos na Constituição. Foram meses de membro do Conselho Mundial. RR – Acho importantíssimo esse trabalho
associações entrevistamos o engenheiro agrônomo Roberto Rodrigues – ex-ministro trabalho intenso, recebemos as propostas de da CATI. Aliás, a CATI sempre foi um braço
Portanto, por termos feito essa mobilização
da Agricultura, ex-secretário de Agricultura de São Paulo, ex-presidente da Aliança cada Estado, para então redigir as demandas fundamental do associativismo em São
intensa, criando uma visão integrada
do cooperativismo brasileiro. Isso que estou Paulo. Na minha visão, o que diferencia um
Cooperativa Internacional e atual coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação do cooperativismo, que culminou com
contando não está escrito em lugar nenhum país desenvolvido de um não desenvolvido
Getúlio Vargas e presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Federação das a inserção dos artigos na Constituinte,
e é fundamental para entender a história é o grau de organização da sua sociedade.
Indústrias do Estado de São Paulo — que tem sua trajetória permeada pelos princípios conseguimos mudar a história do
do cooperativismo brasileiro. As propostas A organização da sociedade é fundamental
cooperativismo brasileiro, consolidando a
cooperativistas. foram analisadas por um comitê de juristas, para desenvolver um país. No campo, o
OCB e o sistema cooperativista integrado
que eliminou 90% dos temas, por serem associativismo é a base da organização
nacionalmente e com acesso ao movimento
inadequados para a visão constitucionalista e aqui é preciso entender a gênese do
internacional.
RCA – Por favor, fale um pouco sobre a cooperativas, sob liderança da Monte Pio da OCB e também da Organização das que tínhamos. Elencamos, após muitos processo organizacional. Normalmente um
história da organização cooperativista no Cooperativista, estavam organizando outra Cooperativas do Estado de São Paulo (Ocesp). debates, cinco artigos que representariam RCA – Qual o papel do poder público grupo de pessoas se organiza a partir de um
Brasil e em São Paulo. entidade. Esses dois movimentos foram A história do movimento, institucionalmente a desiderata do cooperativismo brasileiro. na expansão do cooperativismo e do interesse comum: cria-se uma associação
crescendo separadamente e, até em certo falando, tem essa caminhada. associativismo? para defender os interesses da comunidade,
RR – Vou falar pela ótica política e econômica. O primeiro tema era relacionado com a
momento de forma antagônica, disputando e já temos uma organização política,
O cooperativismo tem uma história muito RCA – Como tiveram início as cooperativas autogestão, para acabar com a dependência RR – Muito importante. Em nível nacional
espaço político na conquista da filiação de que pode acabar convergindo para o
de crédito em São Paulo e no Brasil? do Estado, pois, até então, uma cooperativa existe o Departamento Nacional do
interessante em São Paulo, porque o cooperativas até que, durante o regime sindicalismo (braço constitucional e legal da
para ser constituída precisava de autorização Cooperativismo (Denacoop) do Ministério
grande start, o alavancar do processo foi militar, entre o final da década de 1960 e RR – Eu já era presidente de uma cooperativa representação), de modo que a relação entre
do Ministério da Agricultura e podia sofrer da Agricultura com a função de acompanhar
a imigração japonesa, exatamente há 102 início de 1970, teve início um trabalho para associação e sindicato é muito próxima e
em Guariba (região de Barretos), quando, intervenção a qualquer momento. O
anos. Quando os japoneses vieram para o a unificação. O então ministro da Agricultura, e estimular o cooperativismo nos moldes
em 1974, montei uma cooperativa de segundo estava relacionado à necessidade positiva. O cooperativismo é o outro degrau
Brasil, trouxeram duas coisas importantes: Luis Fernando Cirne Lima, conhecia o da Constituição Brasileira, o que é feito por
crédito rural, época em que o movimento de o Estado estimular e fomentar o da escala da organização, porque é a versão
uma foi a ideia de abastecimento integrado cooperativismo no Rio Grande do Sul, meio de convênios com a OCB, sobretudo na
ainda era incipiente, com apenas duas ou cooperativismo, ou seja, autogestão de um econômica, pois permite que os cooperados
inclusive o de crédito, portanto, decidiu área de treinamentos, formação de recursos
de hortifrutigranjeiros, incluindo variedades três unidades no Estado. Tive a sorte de passem a comprar e vender em comum,
trabalhar pela unificação do movimento lado e apoio do outro lado. O terceiro era humanos, e que depois ganhou a dimensão
que não tínhamos, daí montaram cinturões montar essa cooperativa com uma equipe ligado ao cooperativismo de crédito que, sob o mecanismo de proteção econômica
cooperativista e criou um grupo de trabalho maior com a criação do Setor Produtivo
verdes nas cidades, abastecendo de hortifruti; liderado por um agrônomo de São Paulo, de bancários experientes, que tornou o naquela época, era marginalizado com da doutrina cooperativista, cujo objetivo
das Cooperativas Agropecuárias do Estado
e fizeram isso a partir de cooperativas, Antônio José Rodrigues Filho que, ao lado trabalho profissional, o que garantiu o é corrigir o social por meio do econômico.
regras do Banco Central. Queríamos uma de São Paulo (Sescoop). Em nível estadual,
porque eram pequenos produtores. Duas de uma equipe muito interessante, da qual sucesso. Nessa época, o presidente da Por isso, a constituição de associações
isonomia com o sistema nacional. O quarto alguns estados têm institutos ou organismos
grandes cooperativas, Cotia e Sul Brasil, faziam parte dois técnicos da Secretaria Ocesp, Américo Utumi, conheceu a nossa é fundamental para que a sociedade se
reivindicava que a educação cooperativista que cumprem a Constituição Nacional,
tiveram origem na imigração japonesa. cooperativa e entusiasmado pediu para que organize, de modo que esse trabalho da
da Agricultura, Mário Decourt Homem de fosse uma disciplina obrigatória no ensino apoiando as cooperativas. Em São Paulo é o
Desde então, esse processo se estendeu, eu coordenasse um programa de criação de CATI tem um papel essencial na inserção do
Mello, diretor do PDV, e Victor Argollo Ferrão de 1.º grau, e o quinto tinha a ver com a Instituto de Cooperativismo e Associativismo
e o interessante é que não houve um cooperativas agrícolas de crédito em todo pequeno produtor no mercado.
Neto (ex-coordenador da CATI), trabalharam isenção tributária sobre o Ato Cooperativo. (ICA), órgão da Secretaria de Agricultura
sentido organizacional do movimento a legislação e a base para a montagem do o Estado. Para realizar o trabalho me fiei no e Abastecimento, [antigo Departamento RCA – Então podemos dizer que a
cooperativista desde o começo. A partir sistema de cooperativismo brasileiro. A exemplo de um grande líder cooperativista, Com essas definições, criamos uma de Assistência ao Cooperativismo-DAC], organização viabiliza a produção familiar?
de um certo momento, sob importante partir desse trabalho surgiu a Organização Mário Kruell Guimarães, que havia montado frente parlamentar do cooperativismo. que presta esse apoio ao cooperativismo,
liderança da cooperativa Cotia, algumas das Cooperativas Brasileiras (OCB) e também o sistema de crédito cooperativo no Rio Conseguimos eleger 47 deputados fazendo um trabalho articulado com a RR – Na economia globalizada, os pequenos
cooperativas começaram a estruturar uma da que congrega 27 organizações estaduais. Grande do Sul e, também, contei com uma comprometidos com os cinco artigos. Ocesp e os movimentos cooperativistas. e médios produtores vivem uma situação
entidade nacional. De outro lado, outras Antônio Rodrigues foi o primeiro presidente equipe experiente. Depois de um mês de trabalho intenso (após É importante ressaltar que São Paulo complicada, tendo em vista o fato de que
5. 8 ׀Casa da Agricultura Casa da Agricultura 9׀
a margem unitária de renda rural é muito progresso recente do cooperativismo sistema se mostrou forte diante das crises
pequena e tende a diminuir mais ainda.
A competição leva à redução da margem
unitária, de tal forma que só é possível
foi exatamente o conjunto de vitórias da
Constituinte, sobretudo a autogestão,
que fez com que se investisse em gestão,
da economia globalizada. Com os aspectos
de defesa estabelecidos na Constituição
Brasileira, o cenário futuro evidencia uma
As Organizações de Produtores Rurais
acabando com o amadorismo que quebrou
e o Microbacias II – Acesso ao Mercado
ser competitivo na escala. Por isso, eu não presença mais forte do cooperativismo na
vejo outra forma de inserção do pequeno grandes cooperativas. E a OCB, sob moderna economia nacional. E todo esse processo
produtor familiar no mercado, incluindo o liderança, vem construindo esse movimento tem sido muito bem conduzido pela direção
global, que não seja de forma associativa, sério. Hoje é preciso investir no profissional, da OCB.
especialmente em cooperativas, por razões na gestão, nas áreas de administração e
essenciais: as cooperativas proporcionam a marketing, em tecnologia para aumentar RCA – Como o senhor analisa a formação
escala no conjunto, permitem industrializar a produtividade dos cooperados. As dos profissionais que atuarão no meio João Brunelli Junior - Assessor Técnico da CATI
cooperativas ganharam dimensão rural, como articuladores do processo de brunelli@cati.sp.gov.br
o produto e trabalhar com o valor agregado
mais alto. Além disso, as cooperativas diferenciada e destaque contemporâneo, organização dos produtores?
favorecem acesso às tecnologias e ao crédito por causa de recursos humanos treinados.
para que os pequenos possam crescer na RR – Na vida temos que ter princípios,
RCA – As cooperativas têm um importante valores, conceitos e filosofias. Decidi
mesma condição dos grandes. Sendo assim,
papel no crescimento econômico do País.
D
as cooperativas têm representado uma construir a história da minha como se fosse
Qual o seu papel social? urante o período recente de preparação do agricultores conhecem o preço de mercado do que produzem?
solução viável para todos. um trem correndo sobre dois trilhos, o
Microbacias II – Acesso ao Mercado, uma equipe de Quantos sabem o custo para produzir? Quantos decidem o que
RR – Esse papel está explicitado pelo sétimo amor e a justiça. Esse trem é movido pelo
RCA – Qual o impacto da crise econômica combustível da esperança para fazer que técnicos da CATI, de diversas regiões do Estado, coletou e avaliou plantar, levando em consideração as informações de cenários de
princípio do cooperativismo: a preocupação informações para elaborar um diagnóstico da agricultura familiar. demanda do mercado? Quantos têm a segurança de um contrato
mundial nas cooperativas e no a vida tenha sentido, agindo de forma a
com a comunidade. O cooperativismo tem
agronegócio brasileiro? contribuir para um mundo melhor. De que Entre outras constatações, esse diagnóstico apontou para a baixa de venda? Quantos direcionam sua produção para atender ao
um papel que transcende o atendimento a
maneira? Um ensinando ao outro tudo que competitividade mercadológica da agricultura familiar paulista gosto do consumidor?
seu cooperado para se inserir na comunidade
RR– Nós tivemos uma crise asiática no final da sabe, pois assim o conhecimento cresce. como entrave para o crescimento do setor.
de maneira mais abrangente, seja por conta Quando tiverem respostas a essas questões poderão usufruir
década de 1980. Na época observamos que Portanto, educar é o caminho para construir
de seus princípios, seja por interesse de um A falta de competitividade é devida a um conjunto de fatores de melhores resultados econômicos, com o direcionamento
os bancos cooperativos asiáticos sofreram um mundo melhor coletivamente, por meio
governo democrático em todas as esferas. complexos que passam pelo baixo nível de escolaridade na área de sua produção para atender à demanda do mercado para
menos do que os convencionais. No banco do cooperativismo e associativismo. E esse
Então, cabe aos governos se aproximarem rural, pela falta de comunicação, infraestrutura de transporte e obtenção de preços mais compensadores para seus produtos.
cooperativo, o cooperado é investidor, é o papel dos técnicos. É preciso que os
do cooperativismo para que o País seja armazenamento de produtos que se somam ao acesso limitado Além dessas questões, os produtores rurais necessitam, cada vez
dono e usuário, então o banco tem que ter articuladores da organização em qualquer
social, economica e ambientalmente melhor.
uma outra condição de responsabilidade. atividade econômica, social e política ao crédito. Juntos, esses fatores acarretam fraca organização mais, se adequar para atender às exigências dos mercados no
Na crise de 2008/2009, não foi diferente. O RCA – Qual o papel das políticas públicas tenham esse conceito. comunitária e capacidade gerencial dos produtores, incipiente que se refere aos aspectos de produção de alimentos seguros e
sistema financeiro global sofreu um grande para as organizações de produtores? conhecimento sobre as demandas de mercado, levando ao baixo com respeito às normas ambientais e sociais. A percepção dessas
abalo, principalmente nos Estados Unidos RCA – Por favor, deixe uma mensagem poder de negociação com grandes empresas de agronegócios. novas exigências é essencial para os produtores acessarem
e na Europa, e o cooperativismo de crédito para os produtores rurais. O processo de degradação ambiental ainda agrava as barreiras ou permanecerem nos mercados que atuam ou terem a
RR – Na economia globalizada, o comércio
sofreu pouco e ficou fortalecido. Essa é uma agrícola é muito prejudicado pelo socioeconômicas enfrentadas pelo pequeno agricultor, possibilidade de alcançar novos mercados.
RR – A cada dia cresce a demanda de
história importante para ressaltar como o protecionismo agrícola que os países ricos contribuindo para a dificuldade de inserção e sustentabilidade
produtos agrícolas: alimentos, fibras, A diversificação de explorações apresentada pela agricultura
cooperativismo é resistente às crises. E isso oferecem a seus agricultores com subsídios das pequenas propriedades nas cadeias produtivas.
energia, pois a população e a renda têm familiar é determinante para a sustentabilidade socioeconômica,
não aconteceu só com as cooperativas de
em três níveis: apoio direto, subsídio às crescido nos países emergentes. A oferta
créditos, mas também com as dos segmentos Um dos desafios enfrentados por grande parcela da ambiental, política e cultural da região em que está estruturada.
exportações e barreiras que impedem o não tem acompanhado essa demanda, por
agrícola e industrial. agricultura familiar é o desconhecimento do agronegócio De forma semelhante, o gerenciamento do empreendimento
acesso ao mercado. Esses mecanismos isso os preços subiram, o que gera crise e além do processo produtivo, ou seja, nos outros segmentos rural familiar, com a visão de cadeia produtiva, favorece a
RCA – Qual o cenário atual do cooperati- não favorecem o comércio livre e exigem inflação. O mundo todo deposita no Brasil localizados a jusante e a montante da propriedade. Quantos quebra do paradigma do processo de tomada de decisão por
vismo brasileiro? dos países que não oferecem subsídios, a esperança de resolver isso no longo prazo, parte desses produtores. Alguns agricultores familiares já estão
como é o caso do Brasil, compensações na pois o País tem terra disponível, tecnologia modernizando sua agricultura em relação aos aspectos técnicos
RR – Às vezes me pergunto: como está o forma de políticas públicas que estimulem tropical excelente e agricultores muito bons
cooperativismo no Brasil? Mas existe um a organização dos produtores, que levem e sérios. Então, minha mensagem é: há um
Brasil só? Existem vários Brasis, determinados assistência técnica, ofereçam crédito rural cenário muito favorável para os produtores
por comissões étnicas, culturais, climáticas, adequado e que permitam a produção brasileiros, mas para que isso se transforme
tecnológicas, fundiárias. Não se pode de insumos agrícolas selecionados e em realidade é preciso que existam políticas
comparar uma agricultura fundiária na fiscalizados. As políticas públicas são públicas que os apoiem para que possam
Serra Gaúcha com um agricultor do Ceará. essenciais em qualquer país do mundo avançar. É necessário que o produtor faça a
São mundos diferentes, não há só uma para mitigar a perturbação do mercado lição de casa, que passa pela organização para
agricultura brasileira, como não há só um global determinada pelo protecionismo que possa ter tecnologia, gestão de recursos
cooperativismo. A cooperativa é um reflexo
dos países desenvolvidos. É absolutamente humanos, bem como gestão ambiental,
da realidade regional onde está inserida;
inviável competir sem políticas públicas sanitária, tributária fiscal. Também, porque
onde existe cultura associativa, visão de
compensatórias. por meio das cooperativas, das associações
integração e conhecimento do papel
solidário, as cooperativas vão bem; onde e dos sindicatos, os produtores se colocam
RCA – Quais as perspectivas para o
não há, vão mal e sem paternalismo estatal na discussão para a formulação de políticas
cooperativismo brasileiro?
não funciona. Se a realidade regional se essenciais. Estamos recebendo da história
reflete na cooperativa, é evidente que uma RR – As perspectivas são crescentes uma chance notável e não podemos mais
diversificação também acabe refletindo. e favoráveis. Na medida em que as uma vez desperdiçá-la. É preciso assumi-la, No Projeto Microbacias II - Acesso ao mercado, a CATI tem como foco as cadeias produtivas e atuará por intermédio das associações e cooperativas, visando melhorar a
cooperativas investiram em gestão, o vencê-la e construir um mundo melhor. renda do produtor rural.
Eu penso que o grande responsável pelo
6. 10 ׀Casa da Agricultura Casa da Agricultura 11 ׀
e econômicos por meio de uma maior eficiência produtiva, O Projeto de Desenvolvimento Rural Sustentável –
gerencial e organizacional, mas é preciso que muitos mais o
façam.
Microbacias II – Acesso ao Mercado pretende atuar de maneira
incisiva na formação e capacitação dessas organizações, na busca
Evolução do Associativismo e do
Mesmo com a criação de algumas políticas públicas, que
têm oferecido às organizações de agricultores familiares
dessa profissionalização. Aquelas associações ou cooperativas
de produtores rurais devidamente regularizadas que tenham
o objetivo de vender melhor sua produção agropecuária,
Cooperativismo no Estado de São Paulo e a
oportunidades de acesso ao mercado, a exemplo do Programa
Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e do Programa de
Aquisição de Alimentos (PAA), as dificuldades de acesso a essas
introduzindo inovações mercadológicas que agreguem valor à
sua matéria-prima, terão apoio técnico, gerencial e financeiro do
Projeto para implantar seus empreendimentos.
Contribuição da CATI na Organização Rural
políticas são evidentes e somente uma minoria tem sucesso.
Para tanto, as organizações de produtores rurais que têm Carlos Eduardo Knippel Galletta – engenheiro agrônomo – Divisão de Extensão Rural (Dextru) - CATI
A organização dos pequenos e médios produtores rurais é o
claramente definida alguma ação voltada ao mercado, seja galletta@cati.sp.gov.br
caminho para buscar a resposta para a maioria dessas questões.
para começar um empreendimento, seja para ampliar o que já
Esse é um mecanismo viável e, em muitos casos, a única saída para
existe, poderão expressar essa proposta de iniciativa de negócio,
se inserirem no processo contínuo e acelerado de globalização
consolidada em um Plano de Negócio a ser apresentado ao
O
pelo qual o mundo passa.
Projeto. associativismo rural, apesar de Da década de 1940 a 1960, proliferaram alguns casos, a corrupção interna, levaram
A união de produtores, formando as associações e/ possuir uma longa trajetória no as chamadas associações rurais¹. Em o cooperativismo ao descrédito em muitas
O processo começa quando essas organizações de
ou cooperativas, permite enfrentar os problemas e garantir Brasil e especificamente no Estado de São geral lideradas por grandes fazendeiros, regiões do Brasil e do Estado de São Paulo.
produtores atendem à chamada do Projeto para apresentação de
a sobrevivência da propriedade familiar. Além do mais, Paulo, só recentemente assumiu maior congregavam todos os segmentos de
Manifestação de Interesse, identificando a iniciativa de negócio Todo esse quadro reforçou, principal-
proporciona o desenvolvimento da região onde estão inseridas. importância no cenário da representação agricultores, incluindo os pequenos
pretendida e definindo claramente o grupo de produtores mente entre os agricultores familiares, a
Os agricultores, quando organizados, adquirem condições de política dos agricultores familiares. proprietários rurais.
envolvido na proposta. As organizações de produtores, busca de outras alternativas de organiza-
participar do contínuo processo de transformação pelo qual Excetuando-se situações particulares
cujas manifestações de interesse atendam aos critérios de Nos 20 anos do período autoritário ção, representação perante as autoridades
passa a agricultura e de acompanhar cada mudança, ficando elegibilidade, serão autorizadas a elaborar a proposta de iniciativa e localizadas, no geral a organização
(1964-1984), a liberdade de organização e luta por melhor renda e condições de
em condição de igualdade quanto aos outros sistemas agrícolas de negócio. Para tanto, as organizações de produtores deverão rural entre pequenos produtores é um
era bastante restrita e os sindicatos e as vida. Isso se constituiu em outro fator fa-
mais organizados. buscar uma consultoria para elaboração do Plano de Negócio, fenômeno que adquire maior visibilidade
cooperativas sofriam muitas vezes inter- vorável ao crescimento do número de as-
o qual deve detalhar tecnicamente a iniciativa. Posteriormente, apenas na segunda metade do século XX.
Entretanto, falamos de organizações que tenham de venções do Governo em suas direções, pois
essas propostas de iniciativas de negócio serão avaliadas e serão sociações.
fato o espírito comunitário e que seus participantes estejam As primeiras iniciativas de a legislação vigente subordinava essas or-
conscientizados de que unidos poderão resolver seus problemas, apoiadas financeiramente aquelas que demonstrarem maior associativismo rural em nosso país, ganizações a terem seus funcionamentos Com o processo de redemocratização
principalmente pelo fato de estes serem comuns, que sejam viabilidade mercadológica, técnica e ambiental. do País, no início da década de 1980, e com
partiram de grandes produtores que controlados.² Paralelamente, o associati-
despojados do individualismo e que tenham clareza de objetivos Assim, antes que se proceda à Manifestação de Interesse, é se mobilizavam para fazer valer seus vismo rural também ficou bastante tolhido as eleições diretas de governadores em
e foco nas suas ações, caracterizadas pelo apelo à participação e à fundamental que as organizações de produtores tenham como interesses, influenciando na determinação pela conjuntura política vigente, inclusive 1982, em muitos estados brasileiros passa a
cogestão. Não há espaco para aquelas organizações oportunistas, estratégia a identificação e definição de quais negócios pretendem das políticas agrícolas. Assim, tem-se em termos de representação dos interesses ocorrer um movimento inverso ao período
que se formam apenas para pedir algo que está sendo oferecido implementar. Para a equipe de gestão do Projeto, ou seja, para a notícia do primeiro Congresso Agrícola, dos pequenos produtores. anterior, com muitos estímulos à participa-
por alguma política pública, normalmente para beneficiar uma CATI fica o grande desafio de assegurar a efetiva participação das ainda no período colonial, em 1878, no ção da sociedade civil, incluindo todas as
minoria de seus membros, o que serve apenas para denegrir os organizações de produtores rurais e a emancipação econômica e Nessa época de grande expansão
Rio de Janeiro. No entanto, apenas a partir formas de organizações sociais: associa-
propósitos do associativismo e do cooperativismo. social desses novos empreendimentos. econômica, principalmente na década
da década de 1940 é que as organizações ções, sindicatos, cooperativas, entidades
de 1970, ocorreu um grande crescimento
rurais passam a ter maior significado. profissionais, movimentos populares. No
das cooperativas, seja em número, seja
No período do Governo Vargas, quando na dimensão de suas estruturas. Visando bojo dessa revitalização política, os seg-
o Estado passa a regulamentar (e também enfrentar o poderio das grandes empresas mentos rurais também começam a buscar
a controlar) os sindicatos de trabalhadores industriais e comerciais, atuantes no novas formas de participação.
urbanos, é que as associações e agribusiness, estimulou-se o gigantismo de
cooperativas agrícolas começam a algumas cooperativas.
Dificuldades e contradições do estímulo
ganhar corpo. Percebemos, por meio do Os ideais do cooperativismo foram associativista
cadastramento de organizações rurais desvirtuados em muitas situações, nas
realizado recentemente pela CATI, que as Nesse processo cometeram-se alguns
quais o comando de administradores
primeiras associações e cooperativas em e técnicos subjugou a vontade e a equívocos. O Estado, por intermédio de
nosso Estado datam do início da década de participação dos cooperados, passando a seus agentes, muitas vezes favoreceram
1930 e estão localizadas, principalmente, cooperativa a atuar na mesma lógica das condições de manipulação política
nas Regionais de Mogi das Cruzes, grandes empresas capitalistas, tornando- dos pequenos produtores, retomando
Guaratinguetá, Pindamonhangaba, São se corriqueiro o comentário de seus procedimentos clientelistas entre o poder
Paulo, Piracicaba e Tupã. Nota-se que tais associados de que “a cooperativa vai bem, local e as associações. Dessa forma criaram-
organizações estão vinculadas, sobretudo, mas o cooperado vai mal”. O distanciamento se diversos programas de incentivos que
à colonização de imigrantes japoneses e às das direções em relação aos seus sócios, a exigiam a formalização de associações para
produções de leite, cana, café e olerícolas. falta de transparência, a má gestão e, em acesso aos benefícios.
¹ No Estado de São Paulo, a FARESP - Federação das Associações Rurais do Estado de São Paulo, fundada após a crise do café em 1929 e precursora da atual FAESP, representava em âmbito estadual essa
forma de organização do meio rural..
² Os sindicatos tinham suas autorizações de funcionamento obtidas junto ao Ministério do Trabalho e as Cooperativas junto ao INCRA