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A VIDA COMO REDE FRACTAL
D E S ER ES I NT ER D EP EN DE NT ES




  Lynn Margulis (5 de março de 1938 – 22 de novembro de 2011)


Artigo publicado originalmente por AUGUSTO DE
FRANCO na Escola-de-Redes em 30 de março de
2009 e republicado em 30 de novembro de 2011

A bióloga Lynn Margulis faleceu no dia 22 de novembro de
2011. Uma grande perda, como se diz. Mas perda maior é
desconhecer o seu trabalho. Presto aqui a minha singela
homenagem divulgando um artigo que publiquei em 2009
na Escola-de-Redes, onde também abri um grupo para
reunir, comentar e estudar a sua obra:

 http://escoladeredes.ning.com/group/biblioteca-lynn-margulis


                              1
Já indiquei - no meu Itinerário de Leituras Fundamentais -
um livro importantíssimo da bióloga Lynn Margulis (1998):
“O Planeta Simbiótico: uma nova perspectiva da evolução”.
Rio de Janeiro: Rocco, 2001. Mas agora quero falar de
outro texto, também indicado no mesmo itinerário, que
estou relendo: Margulis, Lynn & Sagan, Dorion (1998). “O
que é a vida?”. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002:




Simplesmente fantástico! E muito interessante para quem
está dedicado a estudar as relações entre sustentabilidade
e o padrão de rede. Uma coisa que chama a atenção são as
misteriosas redes de fungos (um dos cinco reinos de
organismos vivos: os Mychota; os outros quatro são
Monera (bactéria), Protoctista, Animalia e Plantae).
"Durante mais de 400 milhões de anos - escrevem Margulis
e [seu filho] Sagan - seus esporos [dos fungos] têm-se
assentado e espalhado redes micelianas por um vasto
sortimento global de alimentos".

O mais interessante disso tudo, porém, é - a meu ver - o
processo em rede.




                            2
Como Margulis observou, "os fungos são organismos
realmente fractais", que fazem sexo por conexão ou
conjugação de hifas (que são tubos que se assemelham aos
cabos de rede que utilizamos hoje em dia para conectar
nossos computadores) e existem "em extensas redes
inacessíveis à visão, situadas abaixo do solo. Grandes
micélios de hifas que saem em busca de alimentos
prosperam sob as árvores das florestas. Os filamentos vivos
chamados hifas tendem a se fundir. Depois de "praticar o
sexo", acabam formando cogumelos ou tecidos bolorentos
que, por sua vez, sofrem meiose e formam esporos... Toda
rede miceliana é um clone fúngico, o filho distante de uma
única linhagem genética. Acima do solo, os fungos
produzem esporos que flutuam no ar, alguns dos quais
você por certo está inalando neste momento. Quando
pousam, os esporos crescem onde quer que seja possível.
Fazendo brotar redes tubulares, as hifas, no substrato
úmido, novamente os fungos produzem quantidades
copiosas de esporos, os quais se disseminam, espalhando
sua estranha carne pelo solo que ajudam a criar".

Fiquei pensando nesse processo pelo qual as conexões
produzem esporos, que geram mais conexões, criando por
replicação novos ambientes. Taí uma boa imagem para as
relações entre rede distribuída e sustentabilidade. Não se
trata de crescimento de um indivíduo ou mera replicação e
sim, em alguns casos, de simbioses que aliam reinos
distintos, dando origem a novos seres, como as 25 mil
espécies diferentes de líquens, resultados da união entre
fungos e algas verdes ou entre fungos e cianobactérias.

Margulis e Sagan escrevem que "o resultado [dessa]
simbiose, longe de ser previsível pela simples adição, é
uma surpresa não-cumulativa. Com tantos líquens


                            3
diferentes, cada qual representando um encontro
permanente entre um fungo e uma forma biológica
fotossintética, a expressão "relacionamento de longo prazo"
assume um novo significado... De algum modo, as algas e
os fungos sentem a presença do corpo inteiro um do outro,
formando uma parceria empreendedora e complexa que
depende da história da relação. Como as células dos
animais, as células de algas e fungos de um líquen
comunicam-se metabolicamente. Diversamente da maioria
dos animais, entretanto, o tamanho e a forma de qualquer
variedade de líquen não são fixados com precisão, e a
extensão da complexidade de seus tecidos restringe-se a
uma ou poucas camadas de tecido. Todavia, os líquens
ultrapassam os animais em longevidade: um dado líquen
pode ter quatro mil anos de idade".

Para Margulis, tudo isso é evidência de que "a vida pode
surgir repentinamente, de um salto, quando partes
separadas se unem" (a simbiogênese). Isso significa que a
vida - ou a propriedade autopoiética - nasce por conexão.
Como metáfora, para nós, interessados em descobrir no
"subsolo" disso que chamamos de sociedade aquelas
"conexões de hifas" que ocorrem no invisível espaço-tempo
dos fluxos, tudo isso não é nada menos do que excelente!

Bem, mas o livro "Que é vida?" também é importante para
detonar    os    nossos   modelos    antropocêntricos     ou
"zoocêntricos" (do reino Animalia) ou, ainda, "fotossíntese-
cêntricos" (da turma da preservação do verde, quer dizer,
do reino Plantae) que se imaginam salvando o planeta por
meio do proselitismo ambientalista.

É... Esse pessoal não presta muita atenção às grandes
linhagens vivas que estão aí há 4 milhões de anos (como as


                             4
bactérias), que não são - ao contrário do que se propaga -
"menos evoluídas" do que nós, os animais e do que as
plantas (que, aliás, são mais recentes do que nós). E
também não presta atenção aos protoctistas e aos fungos.
Margulis ataca: "todas as espécies existentes são
igualmente evoluídas. Todos os seres vivos, desde a
minúscula bactéria até o membro de um comitê do
Congresso, evoluíram do antigo ancestral comum que
desenvolveu a autopoese e que, com isso, tornou-se a
primeira célula viva". Não há superioridade de uns em
relação aos outros. E duvido muito que nossa forma de
reprodução por formação de embriões (dos animais e das
plantas) seja melhor - em termos de sustentabilidade - do
que a conexão fúngica que ocorre na escuridão e solta
esporos na claridade...

Vamos tomar um exemplo. A poluição. A maior catástrofe
ambiental já ocorrida no planeta, que ameaçou quase todas
as formas de vida então existentes, foi a liberação e a
concentração do Oxigênio na atmosfera. Trata-se, como
sabemos, de um gás instável (comburente), corrosivo e
extremamente venenoso que chegou a alcançar a
impressionante concentração de 20%. Todas as formas de
vida existentes (à época do reino Monera) tiveram que se
adaptar a essa terrível poluição. Se não fosse tal adaptação
não existiríamos. Certamente outros seres (capazes de
"respirar" metano, por exemplo) ocupariam hoje o nosso
lugar. Não seriam seres inferiores, nem superiores, a nós.
Seriam outros.

Margulis argumenta que "é um desejo compreensível, mas
impossível, preservar o planeta em seu estado "original". A
natureza prístina a que alguns gostariam de voltar não é
eterna, mas o mundo verde sustentou tão esplendidamente


                             5
nossos ancestrais que eles o superpovoaram. Além disso, o
estrago humano dos meios ambientes exuberantes que nos
nutriam não constitui prova de qualquer capacidade
singular de pôr em risco toda a vida na Terra. No passado,
nenhuma espécie isolada jamais ameaçou todas as outras.
Qualquer tendência de uma espécie a crescer em demasia e
causar devastação era contida por todas as demais. A
essência da "seleção natural" está em que as tendências
irrefreáveis de uma população a crescer, a ponto de causar
degradação ambiental, são contidas pelo crescimento das
outras. A expansão da população humana segue as
mesmas regras: o ambiente degradado gera doenças, altos
índices de mortalidade e, em última instância, até mesmo a
extinção".

A vida existe na terra há 4 bilhões de anos. Mas não durará
para sempre. Nada dura para sempre. A atmosfera do
nosso planeta deixará de ser favorável à biosfera - a capa
viva de 30 km que o envolve - em meros 100 milhões de
anos (em virtude do aumento do calor do sol). E nem nosso
sol, do qual toda vida depende, continuará produzindo a
vida indefinidamente (ele deixará de fazer isso quando
deixar   de    ser    uma    estrela   amarela,   daqui   a
aproximadamente 5 bilhões de anos). E nem nossa galáxia
(em rota de colisão, inevitável, com a galáxia de
Andrômeda, a 125 km por segundo: o desastre ocorrerá
nos próximos 10 bilhões de anos) sobreviverá como tal.
Não devemos achar que essas durações astronômicas estão
em outra ordem de grandeza: em relação à vida na terra,
já estamos no fim; e em relação ao sol estamos quase no
meio do caminho.

Temos dificuldade de aceitar essas coisas porque nossa
consciência de predador foi formada como uma recusa em


                            6
aceitar a morte (tanto a morte do indivíduo, quanto a da
espécie). É uma conseqüência evolutiva da nossa forma
sexuada de reprodução, que não preocupa, por exemplo, as
bactérias - de longe os seres vivos mais expressivos. Como
a própria Margulis nos mostrou, a morte é a primeira
doença sexualmente transmissível (DST). Seres que não
têm reprodução sexuada (e aqui entra todo o imenso reino
Monera, sem o qual não conseguimos existir, até hoje) não
têm morte programada (só podem morrer por acidente ou
em virtude de uma catástrofe ambiental - como, por
exemplo, aquela poluição pelo Oxigênio). "As bactérias - ela
reconhece - tomaram conta do mundo e ainda o dirigem,
usando seu metabolismo planetário descentralizado [ela
queria falar, na verdade, distribuído] e sua capacidade de
transferência genética mundial intra-específica... A vida na
Terra é uma holarquia, uma rede fractal aninhada de seres
interdependentes".

Imaginando-nos seres superiores, mais evoluídos e vivendo
em uma cultura microfóbica, não aceitamos pensar a nós
mesmos "como uma permutação simbiótica de bactérias".
Sim, somos - nós e o ambiente em que vivemos - redes de
seres microscópicos, comunidades de microorganismos. "Os
seres humanos são colônias integradas de seres
ameboides, assim como os seres amebóides - os
protoctistas - são colônias integradas de bactérias.
Queiramos ou não, viemos do lodo".

Mas tem muito mais coisa no livro, como, por exemplo, a
evidência de que não há vida sem poluição (como estrutura
dissipativa,    um       organismo       vivo     deteriora
termodinamicamente o ambiente em que vive). Ou o
processo pelo qual predadores se tornam simbiontes (no
caso dos primeiros protistas isso fica mais ou menos claro,


                             7
quando uma infecção mortífera transforma-se numa parte
do corpo, as bactérias passam de patógenos virulentos a
organelas necessárias). E por aí vai.




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A VIDA COMO REDE FRACTAL DE SERES INTERDEPENDENTES

  • 1. A VIDA COMO REDE FRACTAL D E S ER ES I NT ER D EP EN DE NT ES Lynn Margulis (5 de março de 1938 – 22 de novembro de 2011) Artigo publicado originalmente por AUGUSTO DE FRANCO na Escola-de-Redes em 30 de março de 2009 e republicado em 30 de novembro de 2011 A bióloga Lynn Margulis faleceu no dia 22 de novembro de 2011. Uma grande perda, como se diz. Mas perda maior é desconhecer o seu trabalho. Presto aqui a minha singela homenagem divulgando um artigo que publiquei em 2009 na Escola-de-Redes, onde também abri um grupo para reunir, comentar e estudar a sua obra: http://escoladeredes.ning.com/group/biblioteca-lynn-margulis 1
  • 2. Já indiquei - no meu Itinerário de Leituras Fundamentais - um livro importantíssimo da bióloga Lynn Margulis (1998): “O Planeta Simbiótico: uma nova perspectiva da evolução”. Rio de Janeiro: Rocco, 2001. Mas agora quero falar de outro texto, também indicado no mesmo itinerário, que estou relendo: Margulis, Lynn & Sagan, Dorion (1998). “O que é a vida?”. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002: Simplesmente fantástico! E muito interessante para quem está dedicado a estudar as relações entre sustentabilidade e o padrão de rede. Uma coisa que chama a atenção são as misteriosas redes de fungos (um dos cinco reinos de organismos vivos: os Mychota; os outros quatro são Monera (bactéria), Protoctista, Animalia e Plantae). "Durante mais de 400 milhões de anos - escrevem Margulis e [seu filho] Sagan - seus esporos [dos fungos] têm-se assentado e espalhado redes micelianas por um vasto sortimento global de alimentos". O mais interessante disso tudo, porém, é - a meu ver - o processo em rede. 2
  • 3. Como Margulis observou, "os fungos são organismos realmente fractais", que fazem sexo por conexão ou conjugação de hifas (que são tubos que se assemelham aos cabos de rede que utilizamos hoje em dia para conectar nossos computadores) e existem "em extensas redes inacessíveis à visão, situadas abaixo do solo. Grandes micélios de hifas que saem em busca de alimentos prosperam sob as árvores das florestas. Os filamentos vivos chamados hifas tendem a se fundir. Depois de "praticar o sexo", acabam formando cogumelos ou tecidos bolorentos que, por sua vez, sofrem meiose e formam esporos... Toda rede miceliana é um clone fúngico, o filho distante de uma única linhagem genética. Acima do solo, os fungos produzem esporos que flutuam no ar, alguns dos quais você por certo está inalando neste momento. Quando pousam, os esporos crescem onde quer que seja possível. Fazendo brotar redes tubulares, as hifas, no substrato úmido, novamente os fungos produzem quantidades copiosas de esporos, os quais se disseminam, espalhando sua estranha carne pelo solo que ajudam a criar". Fiquei pensando nesse processo pelo qual as conexões produzem esporos, que geram mais conexões, criando por replicação novos ambientes. Taí uma boa imagem para as relações entre rede distribuída e sustentabilidade. Não se trata de crescimento de um indivíduo ou mera replicação e sim, em alguns casos, de simbioses que aliam reinos distintos, dando origem a novos seres, como as 25 mil espécies diferentes de líquens, resultados da união entre fungos e algas verdes ou entre fungos e cianobactérias. Margulis e Sagan escrevem que "o resultado [dessa] simbiose, longe de ser previsível pela simples adição, é uma surpresa não-cumulativa. Com tantos líquens 3
  • 4. diferentes, cada qual representando um encontro permanente entre um fungo e uma forma biológica fotossintética, a expressão "relacionamento de longo prazo" assume um novo significado... De algum modo, as algas e os fungos sentem a presença do corpo inteiro um do outro, formando uma parceria empreendedora e complexa que depende da história da relação. Como as células dos animais, as células de algas e fungos de um líquen comunicam-se metabolicamente. Diversamente da maioria dos animais, entretanto, o tamanho e a forma de qualquer variedade de líquen não são fixados com precisão, e a extensão da complexidade de seus tecidos restringe-se a uma ou poucas camadas de tecido. Todavia, os líquens ultrapassam os animais em longevidade: um dado líquen pode ter quatro mil anos de idade". Para Margulis, tudo isso é evidência de que "a vida pode surgir repentinamente, de um salto, quando partes separadas se unem" (a simbiogênese). Isso significa que a vida - ou a propriedade autopoiética - nasce por conexão. Como metáfora, para nós, interessados em descobrir no "subsolo" disso que chamamos de sociedade aquelas "conexões de hifas" que ocorrem no invisível espaço-tempo dos fluxos, tudo isso não é nada menos do que excelente! Bem, mas o livro "Que é vida?" também é importante para detonar os nossos modelos antropocêntricos ou "zoocêntricos" (do reino Animalia) ou, ainda, "fotossíntese- cêntricos" (da turma da preservação do verde, quer dizer, do reino Plantae) que se imaginam salvando o planeta por meio do proselitismo ambientalista. É... Esse pessoal não presta muita atenção às grandes linhagens vivas que estão aí há 4 milhões de anos (como as 4
  • 5. bactérias), que não são - ao contrário do que se propaga - "menos evoluídas" do que nós, os animais e do que as plantas (que, aliás, são mais recentes do que nós). E também não presta atenção aos protoctistas e aos fungos. Margulis ataca: "todas as espécies existentes são igualmente evoluídas. Todos os seres vivos, desde a minúscula bactéria até o membro de um comitê do Congresso, evoluíram do antigo ancestral comum que desenvolveu a autopoese e que, com isso, tornou-se a primeira célula viva". Não há superioridade de uns em relação aos outros. E duvido muito que nossa forma de reprodução por formação de embriões (dos animais e das plantas) seja melhor - em termos de sustentabilidade - do que a conexão fúngica que ocorre na escuridão e solta esporos na claridade... Vamos tomar um exemplo. A poluição. A maior catástrofe ambiental já ocorrida no planeta, que ameaçou quase todas as formas de vida então existentes, foi a liberação e a concentração do Oxigênio na atmosfera. Trata-se, como sabemos, de um gás instável (comburente), corrosivo e extremamente venenoso que chegou a alcançar a impressionante concentração de 20%. Todas as formas de vida existentes (à época do reino Monera) tiveram que se adaptar a essa terrível poluição. Se não fosse tal adaptação não existiríamos. Certamente outros seres (capazes de "respirar" metano, por exemplo) ocupariam hoje o nosso lugar. Não seriam seres inferiores, nem superiores, a nós. Seriam outros. Margulis argumenta que "é um desejo compreensível, mas impossível, preservar o planeta em seu estado "original". A natureza prístina a que alguns gostariam de voltar não é eterna, mas o mundo verde sustentou tão esplendidamente 5
  • 6. nossos ancestrais que eles o superpovoaram. Além disso, o estrago humano dos meios ambientes exuberantes que nos nutriam não constitui prova de qualquer capacidade singular de pôr em risco toda a vida na Terra. No passado, nenhuma espécie isolada jamais ameaçou todas as outras. Qualquer tendência de uma espécie a crescer em demasia e causar devastação era contida por todas as demais. A essência da "seleção natural" está em que as tendências irrefreáveis de uma população a crescer, a ponto de causar degradação ambiental, são contidas pelo crescimento das outras. A expansão da população humana segue as mesmas regras: o ambiente degradado gera doenças, altos índices de mortalidade e, em última instância, até mesmo a extinção". A vida existe na terra há 4 bilhões de anos. Mas não durará para sempre. Nada dura para sempre. A atmosfera do nosso planeta deixará de ser favorável à biosfera - a capa viva de 30 km que o envolve - em meros 100 milhões de anos (em virtude do aumento do calor do sol). E nem nosso sol, do qual toda vida depende, continuará produzindo a vida indefinidamente (ele deixará de fazer isso quando deixar de ser uma estrela amarela, daqui a aproximadamente 5 bilhões de anos). E nem nossa galáxia (em rota de colisão, inevitável, com a galáxia de Andrômeda, a 125 km por segundo: o desastre ocorrerá nos próximos 10 bilhões de anos) sobreviverá como tal. Não devemos achar que essas durações astronômicas estão em outra ordem de grandeza: em relação à vida na terra, já estamos no fim; e em relação ao sol estamos quase no meio do caminho. Temos dificuldade de aceitar essas coisas porque nossa consciência de predador foi formada como uma recusa em 6
  • 7. aceitar a morte (tanto a morte do indivíduo, quanto a da espécie). É uma conseqüência evolutiva da nossa forma sexuada de reprodução, que não preocupa, por exemplo, as bactérias - de longe os seres vivos mais expressivos. Como a própria Margulis nos mostrou, a morte é a primeira doença sexualmente transmissível (DST). Seres que não têm reprodução sexuada (e aqui entra todo o imenso reino Monera, sem o qual não conseguimos existir, até hoje) não têm morte programada (só podem morrer por acidente ou em virtude de uma catástrofe ambiental - como, por exemplo, aquela poluição pelo Oxigênio). "As bactérias - ela reconhece - tomaram conta do mundo e ainda o dirigem, usando seu metabolismo planetário descentralizado [ela queria falar, na verdade, distribuído] e sua capacidade de transferência genética mundial intra-específica... A vida na Terra é uma holarquia, uma rede fractal aninhada de seres interdependentes". Imaginando-nos seres superiores, mais evoluídos e vivendo em uma cultura microfóbica, não aceitamos pensar a nós mesmos "como uma permutação simbiótica de bactérias". Sim, somos - nós e o ambiente em que vivemos - redes de seres microscópicos, comunidades de microorganismos. "Os seres humanos são colônias integradas de seres ameboides, assim como os seres amebóides - os protoctistas - são colônias integradas de bactérias. Queiramos ou não, viemos do lodo". Mas tem muito mais coisa no livro, como, por exemplo, a evidência de que não há vida sem poluição (como estrutura dissipativa, um organismo vivo deteriora termodinamicamente o ambiente em que vive). Ou o processo pelo qual predadores se tornam simbiontes (no caso dos primeiros protistas isso fica mais ou menos claro, 7
  • 8. quando uma infecção mortífera transforma-se numa parte do corpo, as bactérias passam de patógenos virulentos a organelas necessárias). E por aí vai. 8