TRIBUTÁRIO. SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA E COLETA DE
ESGOTO. TAXA. NATUREZA TRIBUTÁRIA. PRECEDENTES. 1. O serviço de fornecimento de água e coleta de esgoto é cobrado do usuário pela entidade fornecedora como sendo taxa, quando tem compulsoriedade.
Tributário. serviço de fornecimento de água e coleta de
1. Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 818.649 - MS (2006/0028656-0)
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (RELATOR): Cuida-se de recurso especial interposto
pela COMPANHIA DE SANEAMENTO ÁGUAS GUARIROBA S/A E OUTRO com fulcro no
art. 105, III, “a”, da Carta Magna, contra acórdão segundo o qual a contraprestação devida pelo
usuário do serviço de fornecimento de água e coleta de esgoto é realizada mediante o pagamento de
taxa.
Alega-se violação dos arts. 9º e 13 da Lei nº 8.987/95, ao argumento de que os referidos serviços
são cobrados do usuário pela entidade fornecedora como sendo “tarifa”.
Oferecimento de contra-razões pela manutenção do decisum a quo.
Admitido o apelo extremo, subiram os autos a esta Casa de Justiça, com sua inclusão em pauta
para julgamento, o que faço agora.
É o relatório.
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2. Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 818.649 - MS (2006/0028656-0)
EMENTA
TRIBUTÁRIO. SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA E COLETA DE
ESGOTO. TAXA. NATUREZA TRIBUTÁRIA. PRECEDENTES.
1. O serviço de fornecimento de água e coleta de esgoto é cobrado do usuário pela
entidade fornecedora como sendo taxa, quando tem compulsoriedade.
2. Trata-se, no caso em exame, de serviço público concedido, de natureza compulsória,
visando atender necessidades coletivas ou públicas.
3. Não há amparo jurídico a tese de que a diferença entre taxa e preço público decorre
da natureza da relação estabelecida entre o consumidor ou usuário e a entidade
prestadora ou fornecedora do bem ou do serviço, pelo que, se a entidade que presta o
serviço é de direito público, o valor cobrado caracterizar-se-ia como taxa, por ser a
relação entre ambos de direito público; ao contrário, sendo o prestador do serviço
público pessoa jurídica de direito privado, o valor cobrado é preço público/tarifa.
4. Prevalência no ordenamento jurídico das conclusões do X Simpósio Nacional de
Direito Tributário, no sentido de que “a natureza jurídica da remuneração decorre da
essência da atividade realizadora, não sendo afetada pela existência da concessão. O
concessionário recebe remuneração da mesma natureza daquela que o Poder
Concedente receberia, se prestasse diretamente o serviço ”. (RF, julho a setembro,
1987, ano 1987, v. 299, pág. 40).
5. O art. 11 da Lei nº 2.312/94 (Código Nacional de Saúde) determina: “É obrigatória a
ligação de toda construção considerada habitável à rede de canalização de esgoto,
cujo afluente terá destino fixado pela autoridade competente ”.
6. Obrigatoriedade do serviço de água e esgoto. Atividade pública (serviço) essencial
posta à disposição da coletividade para o seu bem-estar e proteção à saúde.
7. “A remuneração dos serviços de água e esgoto normalmente é feita por taxa, em face
da obrigatoriedade da ligação domiciliar à rede pública” (Helly Lopes Meirelles, in
“Direito Municipal Brasileiro”, 3ª ed., RT – 1977, pág. 492).
8. “Se a ordem jurídica obriga a utilização de determinado serviço, não permitindo o
atendimento da respectiva necessidade por outro meio, então é justo que a
remuneração correspondente, cobrada pelo Poder Público, sofra as limitações
próprias de tributo ”. (Hugo de Brito Machado, in “Regime Tributário da Venda de
Água”, Rev. Juríd. da Procuradoria-Geral da Fazenda Estadual/Minas Gerais, nº 05,
pág. 11).
9. Adoção da tese, na situação específica examinada, de que a contribuição pelo
fornecimento de água e coleta de esgoto é taxa.
10. Precedentes das egrégias 1ª e 2ª Turmas desta Corte Superior.
11. Recurso especial não-provido.
VOTO
O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (RELATOR): A matéria em tela não é novidade, já
tendo sido apreciada em inúmeras ocasiões pelas Turmas que compõem a 1ª Seção deste Tribunal.
A respeito, já tive a oportunidade de me pronunciar sobre o tema, quando do julgamento
proferido no REsp nº 167489/SP, julgado, à unanimidade, em 02/06/1998, DJ de 24/08/1998, pela
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3. Superior Tribunal de Justiça
egrégia Primeira Turma, cujos fundamentos reproduzo, verbis:
“O caso em tela retrata controvérsia relativa à natureza da contraprestação do
usuário pelo fornecimento de água por entidade concessionária desse serviço para,
posteriormente, isso delimitado, se aferir qual o prazo prescricional aplicável à espécie.
Inicialmente, lembro os fundamentos da recorrente, que defende ser tal prestação
um preço público. Registro as palavras do ilustre doutrinador Atabalipa José Pereira Filho
(in Revista Jurídica, fev/80, em artigo sob o título “Natureza Jurídica da Contribuição
Paga pelo Usuário dos Serviços de Água e Esgoto: Taxa e Tarifa”), que brilhantemente
expôs sobre o assunto:
“O Estado, concedendo ao particular o desempenho de certos serviços de
utilidade pública, autoriza-o a dispor de certa margem de lucros para estimar o seu
empreendimento. Aí se caracteriza a tarifa, pois o Estado pode deixar de exercer o
serviço em regime de monopólio.
Substituindo o Estado, o particular em hipótese alguma se sub-roga nos seus
privilégios. A taxa, como tributo, tem a sua natureza na soberania do Estado,
quando este age revestido de sua força soberana e incontrastável (Jus Imperii).
Quando o Estado se despe de sua roupagem soberana, equiparando-se com o
particular e concedendo a este a concessão dos serviços de utilidade pública, fica
caracterizada a natureza jurídica de preços e não de taxas, mesmo quando as
tarifas por uma particularidade especial se tornem obrigatórias.
O usuário, apesar de pagar pelo serviço de água uma tarifa (que geralmente
é facultativa), não pode dispensar esse serviço onde existem as respectivas redes.
A lei federal nº 2.312 de 03 de setembro de 1954, dispôs no seu artigo 11:
“é obrigatória ligação de toda construção habitável à rede de
canalização de esgotos, cujo afluente terá destino fixado pela
autoridade competente”.
Uma rede de esgoto de utilização facultativa, seria um contrasenso, pois que
não passaria de um conjunto de tubos, e nunca um serviço de abastecimento,
ficando à mercê da vontade caprichosa dos particulares que poderiam optar pelo
uso de sua fossa particular, pondo em risco toda a coletividade.
A obrigatoriedade do uso de água e esgoto resulta mais de uma imposição de
ordem sanitária. O pagamento realizado pelo usuário resulta, não da
obrigatoriedade do uso, mas da obrigatoriedade de equipar o imóvel com esse
serviço que acarreta despesas pelo concessionário.
Havendo facultatividade, não pairam dúvidas de que se trata de tarifa ou
preço público. O problema realmente surge se da obrigatoriedade do uso dos
serviços de água e esgoto transforma a tarifa em taxa, conforme já se pronunciou o
Supremo Tribunal Federal.
Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo:
“Não tem o particular o arbítrio de dispensar os serviços de água e
esgotos, onde existam as respectivas redes. Havendo obrigatoriedade
ou coação, quando à utilização do serviço, inexiste preço público”.
Ora, torna-se realmente esdrúxulo, o simples fato de um serviço remunerado
por tarifa transformar-se em taxa apenas pela compulsoriedade de seu pagamento.
É importante salientar que essa compulsoriedade resulta de uma medida profilática,
qual seja, impedir que os cidadãos tenham fossa em suas casas, ou que se utilizem
da água poluída de suas cisternas.
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O interesse do legislador em compelir o particular a curvar-se às exigências
de interesse público, está claramente configurado no seguinte decreto:
“Decreto federal nº 49.974 A de 21 de janeiro de 1961 (Código
Nacional de Saúde), regulamentando a lei nº 2.312 de .....
Art. 32
“Dada a natureza e importância do saneamento como medida
fundamental de proteção à saúde individual e coletiva, o Ministro da
Saúde estabelece normas e padrões ajustáveis às condições sociais”.
Parágrafo único: a promoção das medidas de saneamento constitui
obrigação do Estado e do indivíduo”.
Tratando-se, pois, de saneamento, o próprio particular está compelido a
aderir aos serviços que são um “munus” público, uma obrigação do indivíduo como
membro de uma sociedade organizada.
A compulsoriedade do uso dos serviços de água e esgoto não pode ser
fundamento para retirar-lhe a natureza de tarifa. Se assim não fosse, criar-se-ia no
país um verdadeiro estado de calamidade pública, com a falência em massa de
todas as concessionárias desses serviços.
Além do mais, a ninguém é dado impedir ou criar obstáculos ao progresso
social de um país. Assim, essa pretensa faculdade do indivíduo em dispor ou não
dos serviços de abastecimento de água e esgotos, não pode ir a ponto de impedir
que as cidades sejam saneadas por seu mero e injustificado capricho”.
Na esteira desse entendimento, entendendo tratar-se de tarifa, a 2ª Turma desta
Colenda Casa já se pronunciou em questão semelhante no Recurso Especial 20.741/DF,
relatado pelo eminente Ministro Ari Pargendler, in DJ de 03/06/96:
“O exato dimensionamento da lide depende do estabelecimento de duas
distinções: primeiro, entre taxa e preço público; segundo, entre a utilização
obrigatória dos serviços de água e esgoto e o consumo de água.
A taxa é um tributo, e, na forma do artigo 77 do Código Tributário
Nacional, tem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou
a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível,
prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.
Há, portanto, taxas de polícia e taxas de serviço.
Não há qualquer dificuldade para extremar os preços públicos das taxas de
polícia; só pode ocorrer em relação às taxas de serviços, à vista de que os
serviços públicos também são remunerados por preços públicos.
Se o serviço é daqueles que só o Estado pode prestar, a respectiva
remuneração se dá através de taxas (v.g., taxa judiciária pela prestação de
serviços judiciários).
Se o Estado pode delegar a terceiros a execução dos serviços, a
remuneração é feita por tarifas ou preços públicos, hipótese em que se
enquadram os serviços de água e esgoto.
Evidentemente, a diferença entre taxa de serviço e preço público não se
esgota aí; a taxa de serviço é devida pela utilização efetiva ou potencial,
enquanto o preço público é sempre contraprestação; o regime jurídico de
ambos também difere, naquela tributário, neste contratual.
A utilização obrigatória dos serviços de água e esgoto não implica que a
respectiva remuneração tenha a natureza de taxa; aliás, os últimos
precedentes do Colendo Supremo Tribunal Federal a reconheceram como
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preço público (fl. 87/88).
É bem verdade que, na forma do artigo 5º do Decreto nº 5.554, de 1980, no
Distrito Federal, as ligações dos prédios à rede pública de distribuição de
água e esgoto são obrigatórias. Nenhuma edificação é licenciada sem o
atendimento dessa exigência, que todos compreendem ser inerente ao
processo de urbanização.
O consumo de água, no entanto, não é obrigatório. A respectiva tarifa é
cobrada pelo consumo, e não pelo serviço posto à disposição, hipótese em
que seria taxa.
Na espécie, o consumo é admitido; a resistência ao pagamento da tarifa só
resulta do fato de que o volume de água consumido é menor do que aquele
autorizado pela tarifa mínima.
Daí o argumento de que, sob o nome de tarifa mínima, está sendo cobrada
verdadeira taxa.
Sem razão.
O preço público tem natureza diversa do preço privado, podendo servir
para a implementação de políticas governamentais no âmbito social.
Foi o que fez o artigo 18, caput, do Decreto nº 5.552, de 1980, in verbis:
"As tarifas mensais de utilização de água no Distrito Federal,
para qualquer categoria de serviço e tipo de consumo, seja
medido ou estimado, serão baseadas no princípio da tarifa
diferencial crescente, compreendendo sempre um consumo
básico e consumos excedentes, a serem fixadas de maneira a
permitir a viabilidade econômico-financeira da CAESB".
Nesse regime, a tarifa mínima, a um tempo, favorece os usuários mais
pobres, que podem consumir expressivo volume de água a preços menores, e
garante a viabilidade econômico-financeira do sistema, pelo ingresso
indiscriminado dessa receita prefixada, independentemente de o consumo
ter, ou não, atingido o limite autorizado.
Nada a ver com a taxa de serviço, e sim estabelecimento de preço público,
para que todos tenham acesso ao serviço de distribuição de água.
Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial”.
Na mesma linha, merece conferência o Recurso Extraordinário 77.162/SP, cujo
Relator foi o eminente Ministro Leitão de Abreu, in DJ de 09/08/77:
“PREÇO PÚBLICO. ESSA A NATUREZA JURÍDICA DA TARIFA
COBRADA PELO FORNECIMENTO DE ÁGUA. Não incidência, na
hipótese, da Lei 4.591/64, art. 11, porquanto aí se estabelece regra a
observar para efeito tributário, não para efeito de preço público.
Recurso extraordinário não conhecido”.
Tendo como pressuposto, pois, que a contrapartida do serviço público delegado a
terceiros é feita através de tarifas ou preços públicos, entendeu o acórdão recorrido que o
regime jurídico aplicável à espécie deve ser o contratual, submetido à égide civilista do
nosso ordenamento jurídico, e não tributário, como quando a contraprestação se faz por
meio de taxa.
Assim sendo, fixou o aresto hostilizado que, a prescrição de crédito tributário
(qüinqüenal) não se aplica ao caso presente porque neste é o regime contratual privado que
rege a relação jurídica, sujeitando as obrigações (preços públicos) ao prazo prescricional
vintenário disposto no art. 177, caput, do CC.
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6. Superior Tribunal de Justiça
Confira-se parte do voto condutor:
“No fornecimento não há a compulsoriedade que caracteriza a taxa,
figurando, por outro lado, no pólo oposto ao do usuário um concessionário
de serviços públicos, com o qual se estabelece um liame de natureza
contratual e não institucional.
A tudo se acrescente que as portarias federais que regulam
quantitativamente os preços públicos determinam seja levado em conta o
custo desses serviços ou da obtenção desses bens distribuídos ao consumidor
para o estabelecimento dos preços.
A prescrição da ação para cobrança de crédito tributário não se aplica,
pois, aos preços públicos, que seguem o regime contratual privado em que
incide o disposto no artigo 177, caput, do Código Civil pátrio.
Afastada a prescrição, quanto ao mais, ou seja, a improcedência da parte
não abrangida pelo qüinqüênio liberatório, deixou a r. decisão de primeiro
grau de fundamentar a solução que elegeu”.
Ouso divergir de tal entendimento. A respeito do tema tenho me posicionado em
seguir a corrente doutrinária e jurisprudencial que entende ser taxa a natureza jurídica da
cobrança dos serviços pelo fornecimento de água e esgoto.
Adoto, revendo compreensão anterior, os fundamentos postos nas razões de
fls.442/448, do teor que transcrevo:
“No que diz respeito à natureza jurídica do valor cobrado pelo serviço de
coleta de esgoto e o fornecimento de água (um necessariamente dependente
do outro), além do que são serviços públicos que se integram na função do
Estado de assegurar o saneamento das cidades, defende o Apelante que o
mesmo assume característica de tarifa, e assim, a prescrição de seus valores
dar-se-ia aos vinte (20) anos e não em cinco (05) como entendeu a r.
sentença “a quo”, com supedâneo nas seguintes razões:
a) em razão do fato de ser nomeada como tarifa pela legislação de Santo
André;
b) que o regime é de tarifa, tanto que a legislação local permite o corte de
fornecimento de água para o caso de atraso dos respectivos pagamentos;
c) que é prerrogativa do Poder Público prestador do serviço definir se
mencionada remuneração poderá caracterizar-se como tarifa ou taxa;
d) menciona que o Prof. Hely Lopes Meirelles afirma “que os serviços de
distribuição domiciliar de água e coleta de esgotos são mais
convenientemente remunerados através de tarifas”, (grifos nossos);
e) menciona antiga Jurisprudência que teve em mira decidir sobre a
legalidade ou não supressão do fornecimento de água e não da natureza
jurídica do valor cobrado pelo mesmo;
f) menciona e anexa a sua apelação parecer da lavra do Prof. Miguel Reale
a respeito da possibilidade do corte do corte de fornecimento de energia
elétrica onde aquele ilustre Jurista afirma que o pagamento da conta de
energia elétrica se constitui em preço público e, como base nisso, tenta fazer
analogia com fornecimento de água.
Todavia, esse prol de critérios essencialmente fluídos não são suficientes
para, cabalmente, caracterizar como tarifa (preço) os valores cobrados pelo
Apelante.
Andou muito bem o MM. Juiz “a quo” quando em sua r. decisão recorrida
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7. Superior Tribunal de Justiça
ao adentrar o exame do tema colocou:
“De fato, como muito bem argumenta o próprio autor, a distinção a
respeito da incidência da taxa ou tarifa sobre um dado serviço
público se orienta pela análise de ser ou não obrigatória para o
administrado a utilização do serviço. É o que se depreende da
orientação cristalizada na Súmula 545 STF, com o seguinte
enunciado: “Preços de serviços públicos e taxas não se confundem,
porque essas, diferentemente daquelas, são compulsórias...”.
Pois bem, o art. 11, da Lei nº 2.312, de 03.09.1954, Código Nacional de
Saúde, é taxativo: “É obrigatória a ligação de toda construção considerada
habitável à rede de canalização de esgoto, cujo efluente terá destino fixado
pela autoridade competente”.
Tendo-se em conta, portanto, a obrigatoriedade de ligação de toda a
construção habitável à rede de coleta de esgotos e tendo-se ainda em conta
que, dos valores cobrados pelo Apelante, por metro cúbico de água
fornecida, 50% (cinqüenta por cento), refere-se ao serviço de coleta de
esgotos, parece-nos óbvio que em hipótese alguma esses valores por ele
cobrados podem ser caracterizados como tarifa (preço), além do que o
legislador do Município de Santo André, não tinha, como não tem, liberdade
para estabelecer o que vai cobrar, até mesmo porque a definição do serviço
público quem estabelece é a Constituição Federal e não o legislador
ordinário.
Os critérios distintivos entre taxa e preço anotam que preço é a
contrapartida de prestação contratual, livremente constituída e taxa, como
ensina Geraldo Ataliba, “é o tributo vinculado cuja hipótese de incidência
consiste numa atuação estatal direta e imediatamente referida ao obrigado”
(Hipótese de Incidência Tributária, 5a ed., Malheiros Editores, pág. 345).
Sacha Calmon Navarro Coelho resumiu a grande discussão sobre os
fundamentos das taxas e preços da seguinte forma: “a) O preço decorreria
do livre encontro das vontades (contrato). A taxa – espécie tributária –
proviria da “vontade da lei” (tributo). O primeiro é autonômico, a segunda
heterônoma. b) No preço predominaria a “facultatividade”, na taxa – tributo
– a “compulsoriedade”. c) No preço, de origem sempre contratual, haveria a
possibilidade do “desfazimento do pactuado” e, ainda, antes disso, a recusa
da cobrança, só possível após a acordância do usuário. Na taxa, ao revés,
predominaria a vontade da lei e a obrigação às vezes existindo apenas a
simples disponibilidade do serviço, só seria elidível pela revogação da
norma legal, e irrelevante ou querer do obrigado. d) O preço seria “ex
contratu”, por suposto, e a taxa – tributo – “ex lege”. e) Em conseqüência, o
preço reger-se-ia pelos preceitos do direito privado, com influxos, aqui, e
acolá, do Direito Administrativo (preços públicos), e a taxa reger-se-á pelas
regras do direito público e, portanto, estava sujeitada aos princípios
constitucionais da legalidade, anterioridade e anualidade. f) Os preços
seriam do “jus gestionis” e as taxas, “jus imperu”. g) Os preços, por isso
que contratuais, sinalagmáticos, não comportariam “extrafiscalidade”, esta
típica da ação governamental, via tributos (inclusive taxas), tese, de resto,
polêmica no respeitante às taxas, nos contrafortes do próprio Direito
Tributário, em razão da natureza “contraprestacional” desta.
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8. Superior Tribunal de Justiça
Os preços seriam adequados para remunerar atividades estatais delegáveis,
impróprias, ao passo que as taxas seriam utilizáveis para remunerar
serviços estatais “próprios”, indelegáveis, tipo “polícia”, “justiça”,
“Fisco”, etc. Os preços estariam livres do controle congressual, possuindo
maior elasticidade. As taxas, ao contrário, porque seriam tributos, estariam
sujeitas ao controle do Legislativo, daí a maior rigidez do seu regime. “(in
Taxa e Preço Público” – Caderno de Pesquisas Tributárias 10. Resenha
Tributária – 1985, pág. 55/56).
Assim, como pondera Geraldo Ataliba “separando, como o faz a
Constituição de 1988, tão nitidamente, o campo do serviço público – e
atribuindo-o ao Estado (art. 175) – do campo da iniciativa privada (art.
173), deixa claro que a este atribui regime contratual de direito privado (a
que corresponde preço) e àquele (serviço público) o regime público, “ex
lege” (a que corresponde taxa)”. (in SABESP – Revista de Direito Público
RDP – 92, pág. 93).
Paralelamente à distinção referida, necessário se faz verifique também a
noção do que é que se entende por serviços públicos.
Com bem assinala Celso Antônio Bandeira de Mello, “como toda e qualquer
noção jurídica, esta – serviço público – só tem préstimo e utilidade se
corresponder a um dado sistema de princípios e regras; isto é, a um regime,
a uma disciplina peculiar. Daí que só merece ser designado como serviço
público aquele concernente à prestação de atividade e comodidade fruível
diretamente pelo administrado, desde que tal prestação se conforme a um
determinado e específico regime: regime de direito público”. (Prestação de
serviços públicos e administração indireta, 1973, Ed. Revista dos Tribunais,
p. 18).
Decorre do afirmado que toda remuneração a um serviço público, tal como
conceituado por Celso Antônio Bandeira de Mello é uma taxa. E, como tal
está inserida no rol dos tributos e deve obedecer todos os princípios que
informam esse ramo de direito.
A Constituição Federal qualifica como serviço público a atividade que é
“originariamente pública, que se apresenta como conteúdo de uma
prestação da qual advém uma utilidade ao destinatário” (Marco A. Grecco e
H. Dias de Souza, A Natureza Jurídica dos Custos Judiciais, Resenha
Tributária, 1983, p. 54).
Continuando, aqueles dois autores afirmam que “exatamente por isso é que
entendemos que a eventual contraprestação pecuniária que o usuário do
serviço for obrigado a desembolsar não pode ter natureza de preço, pois esta
é figura nitidamente decorrente de relações de disponibilidade e liberdade
estipulativa, o que não ocorre no serviço público que é por determinação
constitucional, uma das entidades fora de mercado”. (op. cit. p. 56).
Geraldo Ataliba, categórico como sempre, põe um basta na discussão entre
taxa e preço, em manifestação que até parece ter sido elaborada
especialmente para demonstrar que o rol de pressupostos nos quais o
Apelante embasa seu apelo, relacionados no item 4 desta, resistem a um
superficial exame.
Examinando o art. 150, § 3º da Constituição Federal aquele ilustre professor
afirma: “Isoladamente considerada, a regra parece, à primeira vista, estar
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9. Superior Tribunal de Justiça
dando liberdade ao legislador de optar por taxa ou tarifa (preço). A
interpretação sistemática, porém, do sistema constitucional, como um todo,
mostrará que não é correta essa primeira e superficial impressão.
Se considerarmos essa regra em harmonia com os princípios e regras do art.
173, vamos ver que, na exploração da atividade econômica, as empresas
estatais – submetidas às leis de mercado, plenamente, sem restrição –
somente poderão receber preços, pela venda de bens e serviços. Outro
regime que não o expressivo de liberdade de contratar e contratual, ínsito na
autonomia da vontade, não pode reger suas relações com terceiros, “ex vi”
do preceituado nos §§ 1º e 2º, do art. 173.
Preço é a contrapartida de uma prestação contratual, livremente pactuada,
em regime de igualdade entre as partes. Sob o império do direito privado. É
rigoroso sinônimo de tarifa. Tarifa e preço são a mesma coisa juridicamente.
Tarifa é preço. Demonstrar-se-á neste estudo que não cabe tarifa para
retribuir o custo de serviço público.
Para a cobertura de custo de serviço público, por parte dos usuários, a
Constituição previu a figura típica: a taxa, espécie de tributo”. (in op. cit.
pág. 89).
Continuando, ensina ainda o Prof. Geraldo Ataliba, que é absurdo afirmar-se
que o legislador é livre para escolher o regime a que se submeterá a
remuneração dos serviços públicos concluindo que “Serviço público não se
vende. Não se compra. Presta-o o Estado, porque a lei o determina. Utiliza-o o
administrado porque dele necessita, ou porque a lei o constrange (esgoto,
identificação, licença para construir, etc.)... Todas essas considerações
conduzem inexoravelmente a reconhecer que os serviços públicos somente
podem ser remunerados por taxa”. (op. cit. pág. 91).
Inúmeros outros autores entendem que o serviço de água, como serviço
típico, deve ser remunerado por taxa, tais como (Alfredo Augusto Becker –
Teoria Geral do Direito Tributário, 1972, pág. 348; Themístocles Brandão
Cavalcanti – Tratado de Direito Administrativo, v. II/207, ed. Freitas Bastos;
e todos aqueles outros mencionados no excelente acórdão constante da RT
435/150, relator o Desembargador Carlos Ortiz).
O jovem e culto desembargador Régis Fernandes de Oliveira, em decisão
publicada na RDT – 5/285 em 1978, já sustentava que no serviço de água
apenas cabe a exigência tributária, não se podendo falar em preço, decisão
essa que mereceu comentários do Prof. Ataliba endossando a tese.
Reiterando sua opinião, com maior abrangência e mais recentemente o
Desembargador Regis Fernandes de Oliveira voltou a examinar o assunto
em obra intitulada “Receitas Públicas Originárias”, inédita, São Paulo –
1993.
A jurisprudência mais abalizada e recente sobre o assunto não discrepa
dessa orientação da melhor doutrina como se vê das decisões estampadas na
RT 444/199, RT 310/461, RT 435/150, RT 646/216, onde consta decisão no
mesmo sentido do Supremo Tribunal Federal, rel. Min. Sydney Sanches, que
entendeu que: “a conservação das redes de água e esgoto não é obra
pública, mas, sim, um serviço público. Cabível, portanto, a cobrança através
de taxa”.
Acresço que o D.J. de 28.11.63 revela ementa de Recurso Extraordinário relatado
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10. Superior Tribunal de Justiça
pelo Exmo. Sr. Ministro Luís Gallotti que traça, com absoluta fidelidade aos princípios
jurídicos tributários adotados pelo nosso ordenamento jurídico, a diferenciação entre taxa
e preço público, especialmente, tomando por base o fornecimento de água, entendendo-o
como serviço público delegado. Eis o inteiro teor da referida ementa:
“TAXA DE ÁGUA E ESGOTO. É UMA TAXA TÍPICA, COMO ESTÁ
APONTADA PELA GENERALIDADE DOS MESTRES DE DIREITO
FINANCEIRO E DIREITO TRIBUTÁRIO, ASSIM, SUA MAJORAÇÃO
DEPENDE DE LEI.
Delegações legislativas admitem-se em matéria econômica (tabelamento de
preços, etc), não em matéria tributária. A possibilidade de delegações
legislativas na órbita tributária esta excluída não só pela regra contida no
art. 36, parágrafo 2º, da Constituição, mas de modo especial e enfático pelo
parágrafo 34, do art. 141, o qual, no tocante aos tributos (impostos,
contribuições e taxas), dispõe que nenhum será exigido ou aumentado sem
que a lei o estabeleça e nenhum será cobrado em cada exercício sem prévia
autorização orçamentária, ressalvados apenas o imposto por motivo de
guerra e a tarifa aduaneira. Nem houve, no caso, delegação ao poder
executivo, pois o Dec.-Lei Estadual 1.413 de 13.7.46, invocado pelo
recorrido, e anterior à Constituição de 1.946 é da competência ao chefe do
governo, mas isso a um tempo em que o chefe do governo acumulava as
funções executivas e legislativas.
DIFERENÇA ENTRE TAXAS E PREÇOS CONTRATUAIS DE SERVIÇOS
PÚBLICOS (TARIFAS).
O problema não se modifica por se tratar de uma autarquia, porque, ao
constituí-la o estado personificou esse órgão da administração local, houve
uma descentralização, mas com isso não se alienou o caráter público do
serviço trata-se de órgão paraestatal, a quem o estado cede uma parte do seu
imperium.
A destinação especial, não descaracteriza os tributos tornam-se então
tributos ligados, conforme e terminologia alemã. O fato de ser delegado o
tributo a um serviço descentralizado, a uma autarquia, não lhe altera a
natureza.
Se a taxa não deixa de o ser pelo fato de só se tornar devida quando
voluntariamente utilizado o serviço, força a concordar que, quando imposta
por motivos de interesse público (Saúde, higiene, etc.). Independentemente
daquela utilização, o seu caráter tributário se torna indiscutível.
Na taxa há um benefício especial mensurável e um interesse predominante.
No preço público, o pagamento e feito por um serviço ou mercadoria do
governo, em primeiro lugar para um benefício especial do indivíduo e
secundariamente no interesse da comunidade. Não há como equiparar a taxa
de água e esgoto às chamadas taxas correspondentes a utilização de
aeroporto (Decreto-lei nº 9.792 de 1.946), que o Supremo Tribunal
considerou preços públicos (tarifas), conforme as denomina o próprio
Dec.-Lei em vários dos seus preceitos”. (Recurso Extraordinário nº
54194/GO, Rel. Min. Luis Gallotti, DJ 28.11.63).
Hugo de Brito Machado, enfrentando a questão, assim se pronunciou 13/14:
“Todo serviço tem por objetivo o atendimento de necessidades. Diz-se
público o serviço quando destinado a atender necessidades coletivas, ou
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11. Superior Tribunal de Justiça
públicas.
Mesmo coletiva, ou pública a necessidade, é possível que a ordem jurídica
não proíba seu atendimento por outros meios. Em outras palavras, é possível
que a ordem jurídica não imponha a utilização do serviço público,
permitindo que a necessidade, a cujo atendimento se destina, seja satisfeita
por outros meios. Neste caso, entendemos que se trate de uma necessidade
pública secundária, cujo atendimento não consubstancia um serviço público
em sentido estrito.
Podem ser classificadas, portanto, as necessidades públicas, em primárias e
secundárias. As primeiras somente podem ser satisfeitas pelo serviço público
em sentido estrito. As últimas são atendidas pelo serviço público em sentido
amplo, e podem, também, ser atendidas por outros meios, a critério e
segundo as conveniências de cada um.
No exame dessa distinção é relevante a natureza jurídica da remuneração
cobrada pelo Estado do usuário dos serviços públicos. A este propósito já
escrevemos:
“O que caracteriza a remuneração de um serviço público
como taxa, ou como preço público, é a compulsoriedade, para
a taxa, e a facultatividade, para o preço, conforme já decidiu
o Supremo Tribunal Federal. Importante, porém, é a
compreensão adequada, que se há de ter, do que seja essa
compulsoriedade, e essa facultatividade.
A título de exemplo, imaginemos a necessidade que se tem de
energia elétrica. Se o ordenamento jurídico nos permite
atender essa necessidade com a instalação de um grupo
gerador em nossa residência, ou estabelecimento industrial,
ou comercial, então a remuneração que o Estado nos cobra
pelo fornecimento de energia é um preço público, pois não
somos juridicamente obrigados a utilizar o serviço público
para a satisfação de nossa necessidade. Embora nos seja mais
conveniente a utilização do serviço público, do ponto de vista
econômico, ou por outra razão qualquer, do pondo de vista
rigorosamente jurídico, nada nos impede de, por outro meio,
atender a necessidade de energia elétrica. A remuneração que
pagamos pelo serviço de fornecimento de energia elétrica,
portanto, não é compulsória. Por outro lado, se há norma
jurídica proibindo a instalação de grupo gerador, ou unidade
de captação de energia solar, em residências, ou
estabelecimentos comerciais, ou industriais de sorte que o
atendimento da necessidade de energia elétrica, por qualquer
outro meio que não seja o serviço público, torna-se impossível
sem violação da ordem jurídica, tem-se que a utilização do
serviço, e por isto mesmo o pagamento da remuneração
correspondente, é compulsória. Neste caso, essa remuneração
correspondente é taxa.
O mesmo pode ser dito do serviço de água e esgoto. Se há
norma proibindo o atendimento da necessidade de água e
esgoto por outro meio que não seja o serviço público, a
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12. Superior Tribunal de Justiça
remuneração correspondente é taxa. Se a ordem jurídica não
proíbe o fornecimento de água em pipas, nem o uso de fossas,
nem o transporte de dejetos em veículos de empresas
especializadas, nem o depósito destes em locais para esse fim
destinados pelo Poder Público, ou adequadamente
construídos pela iniciativa privada, então a remuneração
cobrada pelo serviço público de fornecimento de água e
esgoto é preço público. Se, pelo contrário, existem tais
proibições, de sorte a tornar o serviço público o único meio de
que se dispõe para o atendimento da necessidade de água, e
de esgoto, então a remuneração respectiva será taxa.
Essa é a conclusão a que se chega da análise de memorável
acórdão do Supremo Tribunal Federal, que apreciou questão
relativa à cobrança de remuneração pela coleta de lixo do
então Estado da Guanabara. Como a legislação daquele
Estado proibia o uso de todo e qualquer meio para o
atendimento da necessidade de livrarem-se as pessoas do lixo
produzido em suas residências, ou em suas atividades
profissionais, tornando obrigatório, assim, o uso do serviço
prestado pela empresa estatal criada para esse fim, a
remuneração que vinha sendo cobrada como preço público foi
considerada como taxa pela Corte Maior.
É importante compreender o fundamento dessa idéia.
Se a ordem jurídica obriga a utilização de determinado
serviço, não permitindo o atendimento da respectiva
necessidade por outro meio, então é justo que a remuneração
correspondente, cobrada pelo Poder Público, sofra as
limitações próprias dos tributos. O contribuinte estará seguro
de que o valor dessa remuneração há de ser fixado por
critérios definidos em lei. Terá, em síntese, as garantias
estabelecidas na Constituição.
Por outro lado, se a ordem jurídica não obriga a utilização do
serviço público, posto que não proíbe o atendimento da
correspondente necessidade por outro meio, então a cobrança
da remuneração correspondente não ficará sujeita às
restrições do sistema tributário. Pode ser fixada livremente
pelo Poder Público, pois o seu pagamento resulta de simples
conveniência do usuário do serviço.
A liberdade, que tem o Poder Público, na fixação do preço
público, corresponde à liberdade do cidadão de utilizar, ou
não, o serviço correspondente. Se o cidadão não tem essa
liberdade, o Poder Público deve estar igualmente limitado
pela ordem jurídica, no que pertine aos critérios para fixação
do valor a ser cobrado, que será um tributo”.
Sendo primária a necessidade pública, ou coletiva, a ser atendida mediante o
serviço público, qualifica-se este como atividade especificamente estatal.
Trata-se de serviço público em sentido estrito. Sua prestação é gratuita, ou
remunerada em regime de Direito Público, vale dizer, mediante taxa”.
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13. Superior Tribunal de Justiça
Alinho, ainda, complementando as informações depositadas nas razões recursais, a
pesquisa doutrinária que me foi apresentada e reveladora do entendimento majoritário da
doutrina de que tal serviço é cobrado mediante taxa.
Em tal sentido:
a) Geraldo Ataliba, in “Abastecimento de Água - Serviço Público Delegado –
Taxa”; (Rev. Dir. Adm. vol. 186, out/dez. 1991, págs. 315/333);
b) Aurélio Pitanga Seixas Filho, in “Caracteres Distintos da Taxa e do Preço
Público”. (Ver. Forense, vol. 323, Ano 89, julho/setembro, págs. 49-54);
c) Marco Aurélio Greco, in “Distinção Jurídica entre Taxa e Preço (Tarifa)”, in,
RT, Ano 62, out. 1973, vol. 456, pgs. 39-44).
d) Hugo de Brito Machado, in “Taxa e Preço Público”, in Caderno de Pesquisas
Tributárias nº 10, pgs. 133-151;
e) Carlos da Rocha Guimarães, in “Taxa e Preço Público (Caderno de Pesquisas
Tributárias nº 10, pgs. 39-45);
f) Ives Gandra da Silva Martins, in “Taxas e Serviço Público”, (Caderno de
Pesquisas Tributárias” nº 10, pgs. 154-186);
g) Toshio Mukai, in “Taxa e Preço Público”, in “Caderno de Pesquisas Tributárias
nº 10, pgs. 239-250);
h) Zelmo Delari, in “Taxas e Preços”, in Caderno de Pesquisas Tributárias nº 10,
pgs. 232-348.
Quanto ao aspecto da nulidade da sentença, o acórdão não prospera. Há
fundamentação suficiente para mantê-la.”
O caso acima registrado, guardadas as suas peculiaridades, amolda-se, como uma luva, à
presente demanda.
A jurisprudência das Primeira e Segunda Turmas deste Sodalício, a respeito do tema debatido,
vem enveredando na linha suso registrada, conforme atestam as seguintes ementas:
“RECURSO ESPECIAL - ALÍNEAS "A" E "C" - SERVIÇO DE FORNECIMENTO
DE ÁGUA E ESGOTO - COBRANÇA DE TAXA - NATUREZA TRIBUTÁRIA –
OBEDIÊNCIA REGIME JURÍDICO TRIBUTÁRIO - AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO DOS ARTS. 1º, 2º E 4º DA LEI N. 6.528/78 E 9º E 13 DA
LEI N. 8.987/95 - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA.
- Do acurado exame dos autos verifica-se que a Corte de origem limitou-se a reiterar, no v.
acórdão recorrido, a orientação esposada na decisão monocrática do relator da remessa
oficial no sentido de que "se o serviço de rede e esgoto é cobrado compulsoriamente dos
administrados, sem possibilitar-lhes rejeitar o seu pagamento mediante a não utilização,
torna-se evidente sua natureza Tributária. O valor exigido do contribuinte, portanto, só
pode ser visto como taxa e não como tarifa".
- (...)
- Ausência de demonstração analítica da divergência. Ainda que assim não fosse, melhor
sorte não assistiria à irresignação, visto que é firme o entendimento deste Sodalício no
sentido de que a prestação de serviços de esgoto sujeita-se à cobrança de taxa, tendo,
portanto, natureza tributária. Dessa forma, "sua instituição está adstrita ao Princípio da
Estrita Legalidade, no sentido de que somente por meio de “lei em sentido estrito” pode
exsurgir a exação e seus consectários. A natureza jurídica da remuneração percebida pelas
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14. Superior Tribunal de Justiça
concessionárias pelos serviços públicos prestados possui a mesma natureza daquela que o
Poder Concedente receberia, se os prestasse diretamente" (REsp n. 480.692/MS, Rel. Min.
Luiz Fux, DJU 30/06/2003).
- Recurso especial não conhecido.”
(REsp nº 453855/MS, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 03/11/2003)
“RECURSO ESPECIAL - ALÍNEAS "A" E "C" - ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL
PÚBLICA - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - LIMINAR DEFERIDA
EM PRIMEIRO GRAU IMPEDIU O CORTE DO FORNECIMENTO DE ÁGUA DE
CONSUMIDORES INADIMPLENTES E DETERMINOU A SUSPENSÃO DA
COBRANÇA DE TAXA SOBRE O FORNECIMENTO DE ESGOTO PELA MÁ
QUALIDADE DO SERVIÇO - AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO PELO
TRIBUNAL - RECURSO ESPECIAL - ALEGADA OFENSA AOS ARTIGOS 6º,
INCISO X, 22 E 42 DO CDC - INOCORRÊNCIA - DIVERGÊNCIA
JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA.
- (...)
- A prestação do serviço de esgoto caracteriza-se por ser onerosa, de modo que seu
fornecimento, em princípio, deve ser prestigiado pelo respectivo pagamento, na forma da
lei.
- Ausência de similitude fática entre os acórdãos confrontados.
- Recurso especial não conhecido pela alínea 'c', e conhecido, porém não provido, pela
alínea 'a'.”
(REsp nº 495387/PR, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 28/10/2003)
“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. TARIFA DE ÁGUA E ESGOTO.
NATUREZA JURÍDICA TRIBUTÁRIA. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA
ESTRITA LEGALIDADE.
1. (...)
2. (...)
3. A natureza jurídica do valor cobrado pelas concessionárias de serviço público de água e
esgoto é tributária, motivo pelo qual a sua instituição está adstrita ao Princípio da Estrita
Legalidade, no sentido de que somente por meio de 'lei em sentido estrito' pode exsurgir a
exação e seus consectários. A natureza jurídica da remuneração percebida pelas
concessionárias pelos serviços públicos prestados possui a mesma natureza daquela que o
Poder Concedente receberia, se os prestasse diretamente.
4. 'O serviço de fornecimento de água e esgoto é cobrado do usuário pela entidade
fornecedora como sendo taxa, quando revela compulsoriedade. 2. Trata-se no caso em
exame, de serviço público concedido, de natureza compulsória, visando atender
necessidades coletivas ou públicas. 3. Não tem amparo jurídico a tese de que a diferença
entre taxa e preço público decorre da natureza da relação estabelecida entre o consumidor
ou usuário e a entidade prestadora ou fornecedora do bem do serviço, pelo que, se a
entidade que presta o serviço é de direito público, o valor cobrado caracterizar-se-ia como
taxa, por ser a relação entre ambos de direito público; ao contrário, sendo o prestador do
serviço público pessoa jurídica de direito privado, o valor cobrado é preço público/tarifa.
4. Prevalência no ordenamento jurídico das conclusões do X Simpósio Nacional de Direito
Tributário, no sentido de que "a natureza jurídica da remuneração decorre da essência da
atividade realizadora, não é afetada pela existência da concessão. O concessionário recebe
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15. Superior Tribunal de Justiça
remuneração da mesma natureza daquela que o Poder Concedente receberia, se prestasse
diretamente o serviço". (RF, julho a setembro. 1987, ano 1897, v.299, p.40). 5. O art. 11, da
Lei nº 2312, de 3.09.94 ( Código Nacional de Saúde) determina: "É obrigatória a ligação
de toda construção considerada habitável à rede de canalização de esgoto, cujo afluente
terá destino fixado pela autoridade competente". (...) 7. Obrigatoriedade do serviço de
água e esgoto. Atividade pública (serviço) essencial posta à disposição da coletividade
para o seu bem estar e proteção à saúde, (...)' .(RESP 167489/SP, Rel. Min. José Delgado,
DJ 24/08/1998)
5. A fonte primária do direito tributário é a 'lei' porquanto dominado esse ramo pelo
'princípio da legalidade' segundo o qual não há tributo sem lei que o estabeleça, como
consectário de que ninguém deve ser coativamente instado a fazer ou deixar de fazer algo
senão em virtude de lei.
6. Recurso especial parcialmente conhecido, porém, improvido.”
(REsp nº 480692/MS, 1ª Turma, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 30/06/2003)
“PROCESSUAL CIVIL - TARIFA DE ESGOTO - NATUREZA JURÍDICA DA
RELAÇÃO ENTRE CONCESSIONÁRIA E EMPRESA - PRESCRIÇÃO - SERVIÇO
PÚBLICO - COMPULSORIEDADE DO SERVIÇO - CONTRAPRESTAÇÃO
INEXISTENTE – RELAÇÃO CONTRATUAL - TAXA - SUBMISSÃO AOS
PRINCÍPIOS JURÍDICOS TRIBUTÁRIOS - INOCORRÊNCIA IN CASU - ATO
UNILATERAL DA CONCESSIONÁRIA QUE SUSPENDEU A COBRANÇA DA
TARIFA CONSIDERADA ILEGAL - REPETIÇÃO DO INDÉBITO - RELAÇÃO DE
DIREITO PRIVADO - PRAZO PRESCRICIONAL VINTENÁRIO.
1. A controvérsia acerca da natureza jurídica do preço de um serviço público, sobre ser
taxa, preço público ou tarifa, pressupõe a existência da atividade 'em ato' ou 'em potência'.
2. Engendrada a cobrança em local onde o serviço sequer existia, o que assoma é a figura
da apropriação indevida pelo concessionário, recebendo torpe locupletamento. Nessas
hipóteses, ausente o fato gerador, o que ocorreu foi enriquecimento ilícito passível de ser
coibido por ação de repetição de prescrição vintenária na forma da Súmula 39 do STJ.
3. Recurso especial parcialmente conhecido, e, nessa parte, provido.”
(REsp nº 439570/DF, 1ª Turma, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 07/04/2003)
Esse é o posicionamento que continuo a seguir, por entender ser o mais coerente com a
legislação vigente e a jurisprudência deste Sodalício.
Por tais razões, NEGO provimento ao recurso por considerar com natureza jurídica de taxa, por
se tratar de serviço público concedido e com cunho obrigatório, a prestação exigida do contribuinte
pelo serviço de fornecimento de água e coleta de esgoto.
É como voto.
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