Este documento apresenta uma monografia sobre educação e pós-modernidade a partir das ideias de Zygmunt Bauman e Boaventura de Sousa Santos. O trabalho foi apresentado para conclusão de curso de especialização em educação da Universidade Federal do Espírito Santo e discute as problemáticas efêmeras da educação na pós-modernidade.
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolares
Educação e Pós-modernidade
1. UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PÓSGRADUAÇÃO “LATO SENSU”
FORMAÇÃO DE ESPECIALISTA EM EDUCAÇÃO
ALEX SANDRO C. SANT’ANA
EDUCAÇÃO E PÓSMODERNIDADE: PROBLEMATIZAÇÕES
EFÊMERAS A PARTIR DAS IDÉIAS DE ZYGMUNT BAUMAN E
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS
VITÓRIA
2006
2. ALEX SANDRO C. SANT’ANA
EDUCAÇÃO E PÓSMODERNIDADE: PROBLEMATIZAÇÕES
EFÊMERAS A PARTIR DAS IDÉIAS DE ZYGMUNT BAUMAN E
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS
Monografia apresentada ao curso de Especialização
em Formação de Especialistas em Educação, do
Centro de Educação, da Universidade Federal do
Espírito Santo, como parte dos requisitos para a
conclusão do Curso de Formação de Especialista em
Educação, na área de concentração em Gestão
Escolar, Supervisão Escolar, Orientação Educacional
e Inspeção Escolar.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo Ferraço.
VITÓRIA
2006
2
3. S231 Sant’Ana, Alex Sandro C.
Educação e Pósmodernidade: Problematizações efêmeras a partir das idéias de
Zygmunt Bauman e Boaventura de Sousa Santos / Alex Sandro C. Sant’Ana. – 2006.
73 f.
Orientador: Carlos Eduardo Ferraço
Monografia (especialização) – Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de
Educação.
1. Educação. 2. Pósmodernidade. 3. Bauman. 4. Boaventura. I. Ferraço, Carlos
Eduardo. II. Universidade Federal do Espírito Santo. Centro de Educação. III. Título.
CDU 37
3
4. UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PÓSGRADUAÇÃO “LATO SENSU”
FORMAÇÃO DE ESPECIALISTA EM EDUCAÇÃO
ALEX SANDRO C. SANT’ANA
EDUCAÇÃO E PÓSMODERNIDADE: PROBLEMATIZAÇÕES EFÊMERAS A
PARTIR DAS IDÉIAS DE ZYGMUNT BAUMAN E BOAVENTURA DE SOUSA
SANTOS
Monografia apresentada ao curso de Pósgraduação lato sensu em Formação de Especialistas em
Educação, do Centro de Educação, da Universidade Federal do Espírito Santo, como parte dos
requisitos para obtenção do Grau de Especialista em Educação, na área de concentração em Gestão
Escolar, Supervisão Escolar, Orientação Educacional e Inspeção Escolar.
Aprovada em 17 de julho de 2006.
COMISSÃO EXAMINADORA
_____________________________________________
Prof. Dr. Carlos Eduardo Ferraço
Universidade Federal do Espírito Santo
Orientador
_____________________________________________
Prof. Dr. Hiran Pinel
Universidade Federal do Espírito Santo
Av. Fernando Ferrari s/n – Campus Goiabeiras
29060900 – Vitória – Espírito Santo
TEL.: (27) 33352548 FAX: (27) 3335 2531
4
6. AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu (co)orientador, Prof. Dr. Hiran Pinel, por todos os seus
comentários (pós)críticos (im)pertinentes acerca dos meus modos idiossincráticos de
sersendo pesquisadoreducadorpedagogoprofessor. Agradeço ainda ao meu
orientador, Prof. Dr. Carlos Eduardo Ferraço, por seu tecimento significativo de
comentários (pós)críticos à monografia, e que em muito contribuíram para o
desenvolvimento desta obra. De forma alguma poderia deixar de prestar
agradecimentos a Profª. Dra. Janete Magalhães Carvalho, que me incentivou neste
desafio de abordar a temática “pósmodernidade e educação”. Fazse necessário
lembrar ainda de agradecer aos eternos colegas do curso de especialização, que de
1
forma subjetivamente inclusiva “acolheram” este autor, aceitando as múltiplas
formas do mesmo sersendo (pós)universitário. Há ainda os funcionários do Centro
de Educação, que sustentam e fazem manutenção de todo o aparato físico da
universidade e que não são de forma alguma figurantes, mas atores/atrizes
importantes do/no/com o cotidiano universitário.
Ilustração 1 – Apesar da incompletude de meus agradecimentos, sinto que o mesmo se torna um
discurso local e total na medida em que me é perpassado pelos múltiplos e diferentes agentes que
me coabitaram e ainda coabitam em meu devirpesquisador.
1
SANT’ANA, Alex Sandro C. et al. Dora e Josué: (Pró)curando uma “subjetividade inclusiva” em
contextos não escolares informais a partir dos escolares, na fílmica de Valter Salles, “Central do
Brasil”. In: Seminário Capixaba de Educação Inclusiva, 9., 2005, Vitória. Anais Ressignificando
conceitos e práticas: a contribuição da produção científica. Vitória: Fórum Permanente de
Educação Inclusiva/ES, 2005. v. 1, p. 304306.
6
7. Finalmente, agradeço especialmente e principalmente a minha mãe, Santa de Jesus,
que tanto me sustentou psicologicamente, eticamente, moralmente e também, não
poderia deixar de mencionar, financeiramente, acreditando e crendo em meus ideais
quando decidi migrar para Vitória e me matricular no curso de pósgraduação lato
2
sensu da UFES. Esses ideais são, tal como afirmou José Arthur Giannotti , os de
que “o importante da educação não é apenas formar um mercado de trabalho, mas
formar uma nação, com gente capaz de pensar”. Nesse sentido, sinto que o curso de
Especialização em Educação em muito contribuiu para o delineamento de um plano
de vida acadêmicocientífica, no qual percebo que alcançarei, panoramicamente e
superficialmente, a maior parte desses meus objetivos socialmente efêmeros.
A vida é um carrossel,
dá muitas voltas sobre si mesma
Subindo e descendo num movimento
ondulante, conforme as circunstancias
Precisamente como os cavalos,
carrinhos e outros bonecos em madeira
como há nos carrosséis por esse mundo fora
Girando sempre no sentido do destino,
como gira, gira a nossa vida
num estontear,
de sobe e desce permanente
Seguindo sempre o rumo
por Deus traçado, desde o inicio
Que só termina quando faz um clique,
porque a respiração ali findou,
acabando a vida nesse preciso momento,
como se o empregado do carrossel
desligase a corrente elétrica,
chegando ali o seu final de viagem
A vida é um carrossel,
que irá perpetuar sempre,
e sempre através dos tempos
3
Nós só temos de seguir o seu percurso (Ramos , 2005)
2
BRAGA, Rosana (Coord.). Recados da Razão. São Paulo: Escala, [19??]. ISBN 8575560786.
3
RAMOS, Fernando. A vida no seu carrossel. Disponível em:
<http://meuslivros.weblog.com.pt/arquivo/2005/10/>. Acesso em: 14 jul. 2006.
7
8. Ilustração 2 O Alfaiate: O desejo do ser humano de transcender o plano de imanência sempre
excede as capacidades de adaptação dos mesmos e talvez seja isso que potencialize a sua
evolução.
“Papai e mamãe, me desculpem por ser
um filho ingrato.
Não há pior desgraça que um filho morrer
antes dos pais, isso foge a ordem
natural das coisas.
No meu silêncio já refleti muito sobre
o sentido e a finalidade desta guerra.
Mas estar aí junto a vocês seria
uma grande humilhação...”
([Kamikase] Kato Matsuda, 19271945)
... confortame aquele velho ditado japonês:
“A morte é mais leve do que uma pluma.
A responsabilidade de viver é
tão pesada quanto uma montanha.”
Adeus Kato
(Imagem e pensamentos capturados do filme “Nós que aqui estamos por vós
esperamos”, Direção de Marcelo Masagão, 1998)
8
9. RESUMO
Apresenta problematizações sobre relações possíveis entre a educação e a pós
modernidade, mediante uma pesquisa bibliográfica do/com o atual malestar
(Bauman) e desassossego (Santos) contemporâneo e suas respectivas influências
no campo da educação. Utiliza uma perspectiva de pesquisa bibliográfica
inter(in)ventiva sobre/com o cotidiano pósmoderno, que é uma pesquisa
simultaneamente inventiva e interventiva de problematizações. Problematiza
efemeramente a pósmodernidade e suas possíveis influências na sociedade
contemporânea, intentandose implodir sentidos e fazer saltar o que estava ainda
nãosignificado, o que era asignificante, a partir dos seguintes questionamentos: A
pósmodernidade é uma mudança paradigmática? Uma revolução? Uma renovação?
Uma ruptura? Uma crise da modernidade? Uma saída da modernidade? Um período
de transição? E o que está sucedendo com a educação no mundo atual, da forma
como ela é interrogada por todos os seus agentes, sejam pais, professores, alunos e
intelectuais? Qual é a interrogação que implícita ou explicitamente é formulada a
partir das vivências individuais de seus atores, dos ambientes institucionais, das
sociedades como um todo? Quais os novos desafios que se colocam para a
educação no contexto contemporâneo? E, enfim, que humano educar? Assim,
(In)tentase apresentar algumas inferências acerca do que seria, especificamente e
objetivamente, a pósmodernidade e ainda a influência contemporânea do
positivismo de Comte, mas fazendo, a posteriori, algumas considerações efêmeras
sobre a temática extremamente (im)pertinente do malestar e desassossego dos
tempos atuais e sua interrelação com a educação, a partir das idéias de Zygmunt
Bauman e Boaventura de Sousa Santos.
Descritores: Educação. Pósmodernidade. Bauman. Boaventura.
Contemporaneidade.
9
10. ABSTRACT
It presents problematizations on possible relations between the education, the
knowledge and the culture in postmodernity, by means of a postcritical bibliographical
research of inter(in)vention of the current quot;malaisequot; of the contemporarilly and its
respective influences in the field of the education. Uses a postcritical perspective of
research the daily postmodern, that is a research of quot;inventionquot; and not of
quot;evidencequot; of that already it was systemize. Problematizate ephemerally
postmodernity and its possible influences in the society contemporary, intending to
blow up felt and to make to jump what still notit was meant, what was unsignificant,
from the following questionings: Postmodernity is a paradigmatical change? A
revolution? A renewal? A rupture? A crisis of modernity? An exit of modernity? A
period of transition? And what is it occurring with the education in the current world,
of the form as is interrogated by all its agents, like parents, teachers, pupils and
intellectuals? Which is the interrogation that implicit or explicitly is formulated from
the individual experiences of its actors, of institucional environments, the societies as
a whole? Which the new challenges that place for the education in the context
contemporary? And, at last, what human to educate? Of this form, it was not
objectified to define and to objective effect permanent conclusions concerning what
would be, specifically and objectively, postmodernity, but to make only some
ephemeral considerations on thematic extremely (im)pertinent in the quot;malaisequot; of the
current times and its interrelation with the education, from the ideas of Zygmunt
Bauman and Boaventura de Sousa Santos.
Keywords: Education. Postmodernity. Bauman. Santos. Contemporarilly.
10
13. SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO................................................................................................14
2. (Re)Iniciando Percursos Sobre A Modernidade E (Per)Correndo As
Origens Da PósModernidade .....................................................................19
3. Considerações Iniciais Sobre O Positivismo de Comte Na Atual
(Anti)Contemporaneidade.............................................................................29
4. A Modernidade Líquida de Zygmunt Bauman: Problematizações Acerca
Do Atual MalEstar Contemporâneo............................................................37
5. Problematizações Acerca Do Paradigma Da Ciência Moderna, Para Se
Pensar a Ciência Pósmoderna, A Partir De Boaventura De Sousa
Santos.............................................................................................................51
6. PÓSESCRITO................................................................................................64
REFERÊNCIAS...............................................................................................70
13
14. 1. INTRODUÇÃO
Problematizase, neste breve momento efêmero, a educação e a pósmodernidade
mediante uma panorâmica pesquisa bibliográfica numa incursão delirante em
algumas das obras de Bauman e Santos, com alguns recortes de imagens com ex
4 5
post problematização, ressaltando que, segundo Viotti (1995 , Disponível na
Internet), vivemos numa “atual ‘Era História’ [que] não afirma que seu ideal (se é que
se pode falar em ideal) é melhor do que os outros, mas que tudo é uma ilusão, não
existindo nem verdade e nem erro”.
Ilustração 3 – Cada vez mais a mídia perpassa os indivíduos com sua publicidade alucinante e
alienante mas também significante, bem como os indivíduos produzem um discurso de resistência
com a mídia, vivendoa com todo o seu corpo de desejos e sensações.
4
Baseado em conhecimento, observação, análise, sendo fundamentalmente objetivo e factual.
(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, Disponível na Internet, Acesso em 1 jan. 2006)
5
Importante explicação acerca das citações de artigos disponíveis na Internet, no âmbito desta
monografia: toda vez que for citado apenas o ano do artigo, significa que efetivamente ele foi
produzido no ano mencionado [de acordo com a fonte acessada]; mas quando for citado apenas
“Acesso em 2005”, por exemplo, significa que ele foi acessado no ano mencionado, mas que o ano
em que ele foi produzido não constava na fonte original e, por isso, não pôde ser mencionado ou
citado.
14
15. O leitor ou a leitora não encontrará nesta monografia “soluções” para o malestar
(Bauman) ou desassossego (Santos) que tem (in)surgido na (pós)modernidade, mas
apenas problematizações efêmeras acerca dessa temática interrelacionandoa com
a educação. O que isso (a)significa? (A)Significa que, tal como é feito na
cartografia, foram tecidas algumas considerações efêmeras sobre a modernidade e
pósmodernidade, sendo que tal paisagem contemporânea está em permanente
estado de mutação e, portanto, será o leitor ou leitora que, caso queira, deverá
pensar em “soluções” para as malezas e desassossegos deste contexto sócio
histórico nãodeterminado, que invade e insurge no cotidiano dos indivíduos, seja no
6
campo da educação, do conhecimento ou da cultura, isso quando tal próparadigma
processual não os excluem de tal possibilidade, resignandoos e, portanto deixando
os as margens do que se passa na sociedade contemporânea.
7
Sendo assim, esta proposta de inter(in)venção bibliográfica propôsse a traçar
alguns paralelos com a lógica positivista que ainda impregna malestarmente e
desassossegadamente a escola, a geração de conhecimento e a cultura das
comunidades. É nesse contexto que será abordada, de maneira também efêmera, a
influência do positivismo de Comte na atual conjectura da pósmodernidade, a partir
principalmente das idéias de João Ribeiro Jr.
Foram tecidas algumas considerações sobre a denominada modernidade líquida
aproximações (divergências e
(BAUMAN, 1998), buscandose algumas
convergências) com a educação contemporânea.
Abordouse também a modernidade e uma possível transição paradigmática para
uma (pós)modernidade mais solidária, mediante uma maior ênfase no conhecimento
6
Chamo de “próparadigma” (termo que inter(in)ventei) porque tal contexto contemporâneo ainda
está em processo de cristalização ou mutação.
7
A inter(in)venção (termo que também inter(in)ventei) é simultaneamente intervenção e invenção,
com base em uma filosofia póscrítica que “rejeita a noção de consciência e de subjetividade, porque
não acredita em nenhum processo de libertação que torne possível o surgimento de um Eu livre e
autônomo, e olha com desconfiança para os conceitos de alienação, emancipação, libertação,
conceitos que supõem uma subjetividade que precise ser restaurada.
Entretanto, a filosofia póscrítica permite novas proposições, outras composições. Desde Foucault e o
conceito de biopoder, o poder sobre a vida, sabese que a esse poder se voltaria uma resistência de
mesma força e tipo: o poder da vida. A filosofia póscrítica confia na revolução molecular, numa
reversão e numa reinvenção que pode instaurar uma democracia biopolítica, baseada numa
economia imaterial.” (POUGY, 2006, Disponível na Internet)
15
16. emancipação (SANTOS, 2002) e suas respectivas influências na educação, no
sentido de se estabelecer um conhecimento prudente para uma vida decente.
Intentouse também, a priori, considerar algumas perspectivas efêmeras acerca da
história de (in)surgimento do próparadigma da pósmodernidade: há autores como
Lombardi (2003) que percebem tal paradigma como vinculado a ideologia do modo
de produção capitalista e, portanto, relacionado ao caráter imperialista da
globalização. Já há autores como Lampert (2005) que abordam a pósmodernidade
a partir da perspectiva das implicações que esse conceito engendra em níveis
sociológico, psicológico e os enfoques que emergem dos processos educacionais.
Já Calloni (2005) faz considerações demasiadamente construtivas acerca da origem
e significados da modernidade, moderno, pósmodernidade e pósmodernismo no
cotidiano do ser humano ao longo da história da civilização ocidental.
A pesquisa bibliográfica mereceu utilização sistemática e destacada, tendo por base
Santos, A. R. (2002, p. 81), que afirma que tal método “estará presente em qualquer
processo de pesquisa. Com efeito, a respeito de quase tudo que se deseje
pesquisar, algo já foi pesquisado de forma mais básica, ou idêntica ou correlata”.
A opção pela temática da pósmodernidade e sua influência contemporânea na
educação devese ao fato de que tal nomenclatura e seus respectivos
entendimentos podem oportunizar novas formas de problematização e auto
8
conhecimento no/do/com o cotidiano de aprendência contemporâneo.
A questão crucial, suscitada para o desenvolvimento desta monografia, foi a
seguinte: Quais são as interrelações da educação com o próparadigma
contemporâneo que tem sido usualmente denominado de “pósmodernidade”, a
partir das idéias de Zygmunt Bauman e Boaventura de Sousa Santos? E ainda,
quais alguns dos novos desafios que se colocam para a educação neste contexto
contemporâneo?
8
Todo tipo de participação ativa em processos cognitivos, desde a célula viva até os processos sócio
culturais. (ASSMANN, 2004, p. 129)
16
17. Foram inseridas diversas ilustrações ao longo do texto e capturados,
cartograficamente, alguns pensamentos que as mesmas suscitavam. Mediante uma
9
fotolinguagem que, a priori, é uma técnica de dinâmica de integração e
comunicação de grupos, mas que nesta monografia será concebida como um
10
método pósmoderno de pesquisa com o cotidiano, gerouse uma expost
11
problematização numa perspectiva póscrítica . A partir dessas ilustrações
emergiram algumas indagações, tais como: que realidades são reveladas nessas
imagens? Qual a ligação entre elas? E, até mesmo, por que me identifiquei com
elas?
Ilustração 4 – Mapamúndi: EUA e Europa “em cima”; América do Sul e África “em baixo”; não há
nada de normal nisso: a opção de dispor os países nesse ângulo de visão é uma opção
eminentemente política – o que está “acima” costuma ser percebido socialmente como “superior e
melhor”; o que está “abaixo” costuma ser percebido como “inferior e ruim”, dentre outros juízos de
valor.
9
Olhando para as fotos sobre a realidade que se vive, aprendese a ligar dois ou mais fatos e ter uma
opinião sobre eles. Seria como um passeio sobre um mundo, no qual, fazendo observações
sistemáticas das imagens do cotidiano pudéssemos “escolher” fotos que tenham ligação entre si e, a
partir disso, cartograficamente, tecer problematizações acerca das redes de conhecimentos que
perpassam essas imagens.
10
Baseado em conhecimento, observação, análise, sendo fundamentalmente objetivo e factual.
(Dicionário HOUAISS da língua portuguesa, Disponível na Internet)
11
A pesquisa póscrítica é uma pesquisa de “invenção”, não de “comprovação” do que já foi
sistematizado. Sua principal contribuição é apenas a de ser aproveitável por outros/as
pesquisadores(as) como uma “sementeira” de sentidos imprevistos. Ela implode o sistema
consensual das formas em que habitualmente compreendemos, falamos e escutamos uma linguagem
curricular. Implosão de sentidos que, no mínimo, faz “saltar” o que estava ainda nãosignificado, o que
era asignificante. (CORAZZA, 2004)
As teorias póscríticas rejeitam a hipótese de uma consciência coerente, centrada, unitária. [...] Para
as teorias póscríticas, a subjetividade é já e sempre social. (SILVA, T. T., 2003, p. 149)
17
18. Ferraço questionoume, recentemente, de forma instigante mas simultaneamente
(im)pertinente, sobre “onde é que eu estaria nessa monografia”, no sentido “do que
ela me toca ou representa”. Eu diria que, em grande parte, esta obra expressa uma
alergia efêmera ao que há de anacrônico no século XXI e, superficialmente, ela
suscita alguns pensamentos delirantes em relação aos prazeres, desejos e
possibilidades de sersendo um agente vivo, participativo e colaborativo com um
cotidiano inventivo que a pósmodernidade (in)tenta (des)construir e enredar na
12
autopoiese da teia da vida.
É de acordo com um dos pensamentos instigantes de Santos (2003, p. 23), que
defino o principal objetivo desta monografia, que é o de “descrever, ainda que
sucintamente, os principais traços do novo paradigma científico. [...] os protagonistas
do novo paradigma conduzem uma luta apaixonada contra todas as formas de
dogmatismo e de autoridade”.
12
Produção de si mesmo, autofazimento. Os processos autopoiéticos devem ser imaginados como
multiplicidade de níveis interligados e emaranhados. (Assmann, 2004, p. 136)
18
19. 2. (Re)Iniciando Percursos Sobre A Modernidade E (Per)Correndo As Origens
Da PósModernidade
Fazse importante, inicialmente, apresentar efemeramente algumas questões acerca
da origem da pósmodernidade, seja conceitualmente seja filosoficamente, a partir
de pensamentos de diferentes autores, mas que possuem algo em comum: a
correlação de idéias acerca do malestar e desassossego contemporâneo e da
insurgência de um tempo frenético, cujas relações sociais e intersubjetivas dos
indivíduos são projetadas em discursos de poder com o cotidiano, num mundo
multipolarizado.
Santos afirma que
Quando em meados da década de 1980, comecei a usar as expressões pós
moderno e pósmodernidade, filo no contexto de um debate epistemológico.
Tinha chegado a conclusão que a ciência geral e não apenas as ciências
sociais se pautavam um paradigma epistemológico e um modelo de
racionalidade que davam sinais de exaustão, sinais tão evidentes que
podíamos falar de uma crise paradigmática. Esse paradigma, cuja melhor
formulação tinha sido o positivismo em suas várias vertentes, assentava nas
seguintes idéias fundamentais: distinção entre sujeito e objeto e entre
natureza e sociedade ou cultura; redução da complexidade do mundo a leis
simples susceptíveis a formulação matemática; uma concepção de realidade
dominada pelo mecanicismo determinista e da verdade como representação
transparente da realidade; uma separação absoluta entre conhecimento
científico – considerado o único válido e rigoroso – e outras formas de
conhecimento como senso comum e estudos humanísticos; privilegiamento
da causalidade funcional, hostil a investigação das “causas últimas”,
consideradas metafísicas, e centrada na manipulação e transformação da
realidade estudada pela ciência. (SANTOS, Acesso em 2005, Disponível na
Internet)
Segundo Anderson (1999, p. 9), o “’pósmodernismo’, como termo e idéia, supõe o
uso corrente de ‘modernismo’. Ao contrário da expectativa convencional, ambos
nasceram numa periferia distante e não no centro do sistema cultural da época: não
vêm da Europa ou dos Estados Unidos, mas da América hispânica”.
Devemos a criação do termo “modernismo” para designar um movimento
estético a um poeta nicaragüense que escrevia num periódico guatemalteco
sobre um embate literário no Peru. O início por Rubén Darío, em 1890, de
uma tímida corrente que levou o nome de modernismo inspirouse em várias
escolas francesas – romântica, parnasiana, simbolista – para fazer uma
“declaração de independência cultural” face à Espanha, que desencadeou
naquela década um movimento de emancipação das próprias letras
espanholas em relação ao passado. Enquanto em inglês a noção de
19
20. “modernismo” só passou ao uso geral meio século depois, em espanhol já
integrava o cânone da geração anterior. (ANDERSON, 1999, p. 9, grifo do
autor)
Ilustração 5 – Trote na internet (Amazônia internacionalizada em livro didático americano): a produção
de sentidos na contemporânea sociedade imagética se dá por meio da produção de simulacros que
forjam o pensar (pós)crítico acerca de problemáticas globais que, simultaneamente, se cristalizam em
questões extremamente (im)pertinentes de nível local.
Assim, segundo Anderson (1999, p. 9), “também a idéia de um ‘pósmodernismo’
surgiu pela primeira vez no mundo hispânico, na década de 1930, uma geração
antes do seu aparecimento na Inglaterra ou nos Estados Unidos”.
20
21. Foi um amigo de Unamuno e Ortega, Federico de Onís, quem imprimiu o
termo postmodernismo. Usouo para descrever um refluxo conservador
dentro do próprio modernismo: a busca de refúgio contra o seu formidável
desafio lírico num perfeccionismo do detalhe e do humor irônico, em surdina,
cuja principal característica foi a nova expressão autêntica que concedeu as
mulheres. Onís contrastava esse modelo – de vida curta, pensava – com sua
seqüela, um ultramodernismo que levou os impulsos radicais do modernismo
a uma nova intensidade numa série de vanguardas que criaram então uma
“poesia rigorosamente contemporânea” de alcance universal. A famosa
antologia de poetas de língua espanhola organizado por Onís segundo esse
esquema foi publicada em Madri em 1934, quando a esquerda assumiu o
comando da república na contagem regressiva para a Guerra Civil. Dedicada
a Antonio Machado, seu panorama do “ultramodernismo” terminava em
Llorca, Vallejo, Borges e Neruda.
Criada por Onís, a idéia de um estilo “pósmoderno” entrou para o vocabulário
da crítica hispanófona, embora raramente usada por escritores subseqüentes
com a precisão que ele lhe dava; mas não teve maior ressonância. Só uns
vinte anos depois o termo surgiu no mundo anglófono, num contexto bem
diferente – como categoria de época e não estética. (ANDERSON, 1999, p.
10, grifo do autor)
Atualmente, há autores como Calloni (apud LAMPERT, 2005, p. 89), que entendem
o pósmodernismo
[...] como uma realidade que se apresenta não como um paradigma, mas
como uma manifestação cultural situada concretamente nas novas
orientações do capitalismo e a partir do aparato tecnocientífico que se
retroalimenta a uma velocidade espantosa, ocasionando formas de ser, estar
e sentir do indivíduo/sujeito enquanto fragmentado, vazio,
dessubstancializado, sem um referente real de sua identidade e de seus
projetos. O autor acredita que a educação, como instância sociocultural, sofre
das ambivalências (para o bem e para o mal) da característica pósmoderna,
mas também entende que a educação pode e deve ser um espaço
privilegiado para a reflexão de novos projetos de vida e de sociedade.
(LAMPERT, 2005, p. 89)
Ainda segundo Lampert (2005, p. 12), “o paradigma moderno, enquanto momento
histórico, referese à etapa suscitada pela Revolução Industrial na Inglaterra, pela
Revolução Francesa e pela influência exercida pelo raciocínio científico, que emergiu
do iluminismo, intencionando organizar racionalmente a vida social”. Mas tal
paradigma moderno não cumpriu seus objetivos utópicos de sanar grande parte dos
problemas da humanidade e por isso tem sido alvo de críticas de autores que
afirmam o (in)surgimento de um possível paradigma pósmoderno.
O paradigma moderno, muito criticado na era contemporânea por não ter
cumprido com as suas grandes promessas, foi um marco da história da
humanidade, pois além de se opor aos dogmas e às regras rígidas da Igreja,
introduziu, de forma sistemática, estudos científicos. Na educação, o
21
22. ambicioso programa de Comenius de ensinar tudo a todos de todas as
formas – bem como o pensamento de Rousseau , constituemse em
alicerces da educação contemporânea. (LAMPERT, 2005, p. 12)
Como ruptura e/ou continuidade do período moderno, surge então o próparadigma
da pósmodernidade.
No parecer de Lyotard, a pósmodernidade “designa o estado de cultura após
as transformações que afetaram as regras dos jogos da ciência, da literatura
e das artes a partir do final do século XIX” (1998: XV). Eagleton (1998), que
explorou os primórdios, as ambivalências, as histórias, os sujeitos, as falácias
e as contradições do pósmodernismo, assinala que o termo pós
modernidade alude a um período histórico específico, que questiona as
noções clássicas da verdade, da razão, da identidade e da objetividade, da
idéia de progresso ou emancipação universal, dos sistemas únicos, das
grandes narrativas ou dos fundamentos definitivos de explicação. (LAMPERT,
2005, p. 1213)
Afirma Lampert (2005, p. 13), que “conceituar pósmodernidade não é algo fácil”.
[...] não se sabe com exatidão se esse fenômeno, relativamente recente,
representa um novo período na civilização; se é uma mudança paradigmática,
um movimento cultural ou se pode ser considerado como uma reavaliação
crítica dos modos modernos de pensamento, pois questiona as dicotomias
rígidas criadas pela modernidade entre realidade objetiva/subjetiva,
fato/imaginação, secular/sagrado, público/privado, científico/vulgar. Para
Terrén (1999), a análise do que vem depois da modernidade é complexa. O
discurso da pósmodernidade oferece uma série de dificuldades específicas
que obrigam a aceitálo como algo fragmentado, contraditório e incompatível.
(LAMPERT, 2005, p. 13)
Segundo Lampert (2005, p. 14), “a partir dos anos 1970, a noção de pósmoderno
ganhou difusão mais ampla e se espalhou por diferentes países”.
Em 1972, a publicação da Revista de Literatura e Cultura Pósmodernas, foi
um momento decisivo para que o termo fosse fixado e utilizado por diferentes
atores sociais, porém com conotações distintas. Em 1979, a obra A condição
pósmoderna, do filósofo JeanFrançois Lyotard, abordou a pósmodernidade
como uma mudança geral na condição humana. Em 1980, Harbermas [sic],
um dos opositores da pósmodernidade, proferiu a conferência Modernidade
– um projeto incompleto, em Frankfurt, na qual relacionou drasticamente o
pósmodernismo e neoconservantismo. Atacou ao mesmo tempo o
neoconservantismo social e o pósmodernismo artístico. Esse trabalho ocupa
posição peculiar no discurso da pósmodernidade. Em 1982, Jameson, o
maior crítico literário marxista do mundo na época, proferiu conferência sobre
o pósmodernismo, enfatizando o conflito estético entre o realismo e o
modernismo. Esse discurso provocou debates subseqüentes. Em 1989,
Callinicos, em sua obra Contra o pósmodernismo, fez uma análise do
background político. Harvey, em 1990, na obra Condição da pós
modernidade, ofereceu uma teoria mais completa de suas pressuposições
22
23. econômicas e, em 1996, na obra As ilusões do pósmoderno, Eagleton
abordou o impacto ideológico. (LAMPERT, 2005, p. 14, grifo do autor)
Ainda segundo Lampert (2005, p. 14), “em face da complexidade, abrangência,
ambivalências, contradições, indefinições, pouco consenso, muitos questionamentos
são suscitados em relação a pósmodernidade”, tais como:
Qual o significado real do termo? – a pósmodernidade é uma mudança
paradigmática? – uma revolução? – uma renovação? – uma ruptura? – uma
ideologia? – uma crise da modernidade? – uma saída da modernidade? – um
período de transição? – a pósmodernidade acabou com os dogmas do
progresso e do desenvolvimento? – o pósmoderno é mais moderno que o
moderno? – é antimoderno ou prémoderno? – é conservador? – a pós
modernidade existe? – ela tem legitimidade? – onde e como a pós
modernidade se situa na história? Afinal, por que tanto se fala, discursa e se
escreve sobre esse fenômeno? (LAMPERT, 2005, p. 1415)
Ilustração 6 – Quadro negro, escrivaninhas, giz e o professor... o que há de novo na educação
escolar contemporânea que difira da educação do século XIX ou XX? Como criar um ambiente de
aprendizagem mais significativo no ambiente escolar?
Lampert (2005, p. 15) afirma que, “grosso modo, podem auferir duas teses em
relação ao surgimento da pósmodernidade”.
A primeira consideraa um movimento que iniciou nos anos 1960, com o
esgotamento da modernidade mais especificamente com o movimento
estudantil, com o avanço da tecnologia, com a nova visão de consumo e do
capital internacional. Esta primeira concepção, constituiuse na face crítica da
sociedade moderna. No segundo argumento, a pósmodernidade representa
uma nova época histórica posterior à modernidade. (LAMPERT, 2005, p. 15)
23
24. Segundo Lampert (2005, p. 15), “Garboggini Di Giorgi (1993) percebeu o pós
modernismo como uma sensação e uma aposta”.
Uma sensação de que a modernidade está falida; de que a racionalização da
vida é inaceitável e desumana; de que a promessa de progresso é uma ilusão
e de que o universal é perigoso. Aposta porque os pósmodernos confiam na
heterogeneidade e na diferença; afirmam a fragmentação de experiências;
enfatizam a existência de micropoderes capilares no interior da sociedade e
consideram ilusórios o poderio do Estado e a dominação de classe. Já para
Gomes, ‘O mundo pósmoderno é descentralizado, dinâmico e pluralista. Nele
obsolesceram as regras da maioria absoluta, e cada vez mais há menos lugar
para a tirania da sociedade de massas... O sistema internacional passou a
ser multipolar, as minorias alcançaram o seu direito de expressão’ (1994:78).
(LAMPERT, 2005, p. 1516)
Lampert (2005, p. 18) afirma que “a história do pensamento ocidental passou por
diferentes megaparadigmas: o prémoderno, o moderno e o pósmoderno”. Após a
prémodernidade e modernidade, Filho (2000, p. 42, grifo do autor), afirma que “a
pósmodernidade é a terceira grande mudança paradigmática que, segundo alguns
pensadores contemporâneos (Lyotard, 1986; Rorty, 1979; Baudrillard, 1998;
Jameson, 1991), estamos vivendo a partir da segundo metade do século XX”.
A pósmodernidade, a terceira grande mudança paradigmática, que a partir
da segunda metade do século XX está vigorando, segundo Santos Filho
(1998) apresenta as seguintes características: a presença ou necessidade de
sistemas abertos; o princípio de indeterminação na ciência; a descrença nas
metanarrativas; o foco no universo; a denúncia da mídia na representação do
mundo; a explosão da informação e o concomitante crescimento das
tecnologias de informação; o capitalismo global; a humanização do mundo
em todas as dimensões; a integração entre Estado e economia ou mercado e
tendências à hegemonia do mercado; o indivíduo humano como irônico,
cínico, fragmentado, esquizofrênico. A queda do sujeito e a nova concepção
do tempo e da história; a complementaridade entre alta e baixa cultura.
(LAMPERT, 2005, p. 18)
Nesse sentido, Lampert (2005, p. 19), conclui que “o positivismo, como forma
hegemônica de gestar conhecimentos, perdeu seu monopólio e credibilidade, pois já
não é mais capaz de explicar a complexidade e a grande gama de fenômenos”.
A pósmodernidade, que não tornou obsoleta a modernidade, que questiona a
teoria cartesiana e que perdeu a âncora das metanarrativas, considera que
há multicamadas de interpretar a realidade e que a dúvida é condição
indispensável para a reflexão. Esse movimento cultural representa uma
abertura para novas possibilidades e, consciente dos limites da modernidade,
busca transformar o moderno em vez de rejeitálo totalmente. (LAMPERT,
2005, p. 21)
24
25. Em relação a uma das promessas da modernidade, que é ou foi a igualdade, pode
se afirmar que, segundo Lampert (2005, p. 24), nos “países capitalistas avançados,
com 21% da população mundial, controlam 78% da produção mundial de bens e
serviços e consomem 75% de toda a energia produzida”.
Essa situação, conseqüência do paradigma ocidental adotado na
modernidade, que priorizava o desenvolvimento, sem necessariamente,
considerar o meio ambiente, destruiu a vida comunitária, as solidariedades
locais e o sentimento de humanidade. Toda essa preocupação exagerada
com o progresso afetou muito a mãe Terra. A pobreza e a exclusão se
espalharam por todos os continentes, atingindo mais a população com menos
escolaridade. (LAMPERT, 2005, p. 2425)
Segundo Calloni (2005, p. 5455), “a questão relativa à crise da educação tem a ver
com a crise da Razão moderna, do projeto de sociedade planejado no âmbito das
transformações socioculturais do ‘século das luzes’ precedido pelo século XVII, o
‘século científico’, e chega aos nossos dias como uma razão fragmentada,
emasculada das noções de totalidade, universalidade; enfim, fatigada por tanta
responsabilidade em tornar a nossa finitude e efemeridade terrenas em discurso
privilegiado da eternidade”.
Segundo Calloni (2005, p. 55), “os autores como David Harvey, Steven Connor,
Perry Anderson, Terry Eagleton, Anthony Giddens, Krishan Kumar, dentre muitos
outros, preocupamse fundamentalmente em debater as grandes questões da
contemporaneidade, valendose de reflexões, teorias e registros históricos que nos
incitam a repensar a educação hodierna a partir de novos elementos e de novas
abordagens”. Mas, tal como afirmou Calloni, esta monografia não se deterá
[...] demasiadamente em discorrer o histórico das noções de modernidade,
pósmodernidade, modernismo e pósmodernismo, uma vez que esses
autores o fazem de maneira magistral, cada qual ao seu estilo e com sua
intensidade.
Como registra Krishan Kumar, é conveniente distinguirmos os sentidos a que
os temos modernidade e modernismo aludem. O primeiro, modernidade, é
mais afeto à política e ideologia, enquanto o segundo, modernismo, situase
mais na inspiração cultural e estética. “O mesmo, porém, não se aplica à
idéias de pósmodernidade. Não há uma tradição de uso a que possamos
recorrer para diferenciar de forma coerente ‘pósmodernidade’ e ‘pós
modernismo’. Ambos são usados mais ou menos um pelo outro” (Kumar,
1997:112). (CALLONI, 2005, p. 55, grifo do autor)
25
26. O questionamento de Harvey, numa epígrafe intitulada Como avaliar o pós
modernismo em geral?, segundo Calloni (2005, p. 5556, grifo do autor), “nos
permite justamente transitar da noção de pósmodernismo para a de pós
modernidade e viceversa, percebendo em ambos os conceitos um propósito
comum, colorações semelhantes, ainda que com tonalidades e nuanças
diferenciadas”.
Ilustração 7 – Como criar uma ecologia cognitiva em que os alunos e as alunas sejam efetivamente
agentes de sua aprendizagem?
Segundo Calloni (2005, p. 56), “o pósmoderno, por outro lado, enfatiza a
‘fragmentação, a indeterminação e a intensa desconfiança de todos os discursos
universais, ‘totalizantes’’ que, no dizer de Harvey, leva à emergência de uma nova
subjetividade”.
Krishan Kumar, enfatiza que, “qualquer que seja o significado que a pós
modernidade possa assumir, tem que derivar, de alguma maneira, de um
entendimento do que é modernidade” (Kumar, 1997:182). Para esse
pensador, modernidade referese a criações econômicas, tecnológicas,
políticas e, em muitos aspectos, intelectuais, das sociedades modernas no
período transcorrido desde o século XVIII (ibidem:182). Distinguese do
termo “moderno” no sentido de que “ser moderno” transcende a noção de
época ou período histórico com elemento explicativo das transformações
26
27. sociais. Ser moderno era, para o homem medieval, uma ameaça à estrutura
dos valores perenes, quando evocava alguma inovação ou modo de pensar
ousado para médium tempus, para o qual Petrarca, considerado o “pai do
humanismo”, cria o termo “Idade das Trevas”. Para esse período histórico e
até mesmo para a Renascença, os termos moderni e modernitas tornamse
conceitos depreciativos. Depreciativos, porque podem abalar a ordem, a
estabilidade, a manutenção do poder da Igreja e de seus dogmas. (CALLONI,
2005, p. 57, grifo do autor)
Segundo Calloni (2005, p. 58), “o termo ‘moderno’ está presente para o próprio
medievo e para a Renascença significando ‘qualquer novidade’ nãoconvencional,
fora dos costumes, por vezes ameaçadora dos valores, das normas sociais, da
cultura”.
Portanto, moderno não é um conceito que pode ser usado como sinônimo de
modernidade, como se pode observar. A noção de moderno transcende os
aspectos pontuais, epocais de cada período histórico, isto é, parece
independer das fases ou culturas históricas, uma vez que a idéia de moderno
– que empregamos para designar uma inovação, por exemplo – tem a
mesma gênese evocativa que havia para o homem medieval, isto é, referese
sempre à ‘época atual’, ao presente imediato, ainda que com inflexões de
sentidos por vezes distintos. É interessante constatar que, a partir do século
X, o adjetivo modernos muda de inflexão. Ou seja, “começa a tomar caráter
negativo. Assim, é usado o adjetivo moderni pelos padres de Igreja e pela
inquisição, a perseguir os defensores de heresias como divulgadores de
idéias ‘modernas’. Para eles tal fenômeno envolvia algo de satânico” (Mello e
Souza, 1994:24). (CALLONI, 2005, p. 58, grifo do autor)
Já o termo modernidade, segundo Calloni (2005, p. 58), “surgiu em meados do
século XIX, sendo que ‘um dos primeiros, senão o primeiro a usálo, foi Baudelaire’
(Mello e Souza, 1994:19). Baudelaire, talvez, usou o termo apressadamente em
relação aos tempos vindouros, talvez ‘por ser poeta e sentir a fluidez da transição do
século XIX’ ou, pelo menos, usouo de forma imprecisa em face de seu próprio
tempo de existência”.
Vejamos o que Terry Eagleton, professor da Universidade de Oxford, tem a nos dizer
sobre a pósmodernidade:
A palavra pósmodernismo referese em geral a uma forma de cultura
contemporânea, enquanto o termo pósmodernidade alude a um período
histórico específico. Pósmodernidade é uma linha de pensamento que
questiona as noções clássicas de verdade, razão, identidade e objetividade,
as idéias de progresso ou emancipação universal, os sistemas únicos, as
grandes narrativas ou os fundamentos definitivos de explicação. Contrariando
essas normas do iluminismo, vê o mundo como contingente, gratuito, diverso,
instável, imprevisível, um conjunto de culturas ou interpretações
desunificadas gerando um certo grau de ceticismo em relação à objetividade
27
28. da verdade, da história e das normas, em relação a idiossincrasias e à
coerência de identidades. Essa maneira de ver, como sustentam alguns,
baseiase em circunstâncias concretas: ela emerge da mudança histórica
ocorrida no Ocidente para uma nova forma de capitalismo – para o mundo
efêmero e descentralizado da tecnologia, do consumismo e da indústria
cultural, no qual as indústrias e serviços, finanças e informações triunfam
sobre a produção tradicional, e a política clássica de classes cede terreno a
uma série difusa de “políticas de identidade” (Eagleton, 1998: 7). (CALLONI,
2005, p. 60)
De fato, segundo Calloni (2005, p. 60), “a pósmodernidade pode ser considerada
um novo tipo de capitalismo (Harvey) ou um novo tipo de industrialismo (Jencks),
registra Kumar (1997:131)”.
É verdade que podemos notar uma superposição entre o antigo e o novo
regime industrial, mas tal se passa somente em nível estético e não mais
operacional, porque “por mais que as sociedades modernas possam reter
seus antigos princípios – e os próprios termos pósmoderno e pósindustrial
indicam uma certa continuidade – esses princípios funcionam em um novo
ambiente” (Kumar, 1997:132).
O próprio conceito de pósindustrialismo não pode ser interpretado em seu
sentido ontológico, porque nunca houve, na história do capitalismo recente,
um grau tão elevado de industrialização e de modo tão generalizado. O
processo industrial recente aumentou substancialmente a produção de bens
a partir das novas tecnologias associadas. É por isso que o conceito de pós
industrial, no sentido dado por Kumar, opera em um ambiente pósfordista,
ou seja, “uma reindustrialização pósindustrial baseada em alta tecnologia,
em empresas que preferem novas localizações em áreas suburbanas ou ex
urbanas (...). Empregos e pessoas deixam as grandes cidades. Pequenas
cidades e aldeias são repovoadas. A ênfase agora é em projetos em
pequena escala, ligando pessoas a bairros e objetivando cultivar o ethos de
determinados lugares e culturas locais” (ibidem; 133). (CALLONI, 2005, p. 61,
grifo do autor)
Conclui efemeramente Calloni (2005, p. 6263), que “a pósmodernidade, como um
conceito situado na subjetividade das práticas humanas, traduz ao mesmo tempo a
racionalização do processo produtivo industrial em escala mundial e a crise instalada
no âmago da filosofia e das ciências”.
28
29. 3. Algumas Considerações Sobre O Positivismo de Comte Na Atual
(Anti)Contemporaneidade
Intentase, neste breve momento efêmero, apresentar algumas considerações
acerca do positivismo, sistema filosófico fundado por isodoreAugusteMarieXavier
Comte, mais conhecido por Augusto Comte.
Augusto Comte, segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 7), era “filho de uma família pequeno
burguesa, católica e monarquista”; ele nasceu em “Montpellier em 19 de janeiro de
1789, e faleceu a 5 de setembro de 1857, em Paris”. Ele freqüentou alguns cursos
da Faculdade de Medicina e tornouse amigo e secretário do socialista Saint
13
Simon , que exerce grande influência sobre sua formação intelectual. Foi, segundo
Ribeiro Jr. (1991, p. 8), “a partir da morte de Clotilde de Vaux, sua musa inspiradora,
e com quem manteve um intenso relacionamento amoroso, que Comte atribuise um
papel messiânico: supunha realizar uma missão de regeneração da humanidade”.
Assim, em 1847 é proclamada a religião da humanidade: o positivismo, que tanto
exerceu (e ainda exerce) influência nas redes cotidianas tecidas na escola moderna.
Ainda segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 10), toda a obra de Comte “é uma tentativa de
síntese geral dos conhecimentos de seu tempo, cujo programa fundamental era
unificar as duas culturas – a humanística e a científica – num novo humanismo,
fundado na ciência; uma ciência capaz de reavaliar a exigência humana, conferindo
lhe um significado de valor universal”. Um desses “valores universais” é o
conhecimento erudito, tão difundido e propagado nas escolas em detrimento do
conhecimento popular ou de “senso comum”, e que a universidade “pública e
14
gratuita” brasileira, baseada num modelo de racionalismo cartesiano cuja base
prioritária tem sido extremamente as ciências naturais, tanto se utiliza para se
diferenciar epistemologicamente e, principalmente, sócioeconomicamente dos
13
A SaintSimon é convencionalmente atribuída a paternidade da teoria da modernização e da idéia
de converter a ciência e a tecnologia no grande motor do progresso que iria gradualmente
substituindo a política pela administração das coisas. (SANTOS, 2002, p. 116)
14
O uso de tal termo é questionável, visto que a universidade está sofrendo um processo de
privatização mediante a criação de autarquias federais que se (auto)inserem no âmbito acadêmico se
intitulando como “fundações sem fins lucrativos”, mas que inclusive têm passados por processos de
investigação sigilosos cujas acusações são desconhecidas pela sociedade.
29
30. demais setores da sociedade considerados marginais, despolitizados e inerudito
(desprovido de sabedoria).
A consciência filosófica da ciência moderna, que tivera no racionalismo
cartesiano e no empirismo baconiano as suas primeiras formulações, veio a
condensarse no positivismo oitocentista. Dado que, segundo este, só há
duas formas de conhecimento científico – as disciplinas formais da lógica e
da matemática e as ciências empíricas segundo o modelo mecanicista das
ciências naturais – as ciências sociais nasceram para ser empíricas.
(SANTOS, 2002, p. 65)
Continua Ribeiro Jr. (1991, p. 11) afirmando que “o século XIX marca não só o
triunfo do liberalismo europeu, ligado ao direito natural, que considera a natureza
humana como base da própria lei natural, cuja única realidade é a liberdade do
homem; [mas] marca também o triunfo do cientificismo, que reconhece uma só
natureza material, que engloba e explica o mundo dos valores e o mundo dos fatos”.
O modelo de racionalidade que preside à ciência moderna constituiuse a
partir da revolução científica do século XVI e foi desenvolvido nos séculos
seguintes basicamente no domínio das ciências naturais. Ainda que com
alguns prenúncios no século XVIII, é só no século XIX que este modelo de
racionalidade se estende às ciências sociais emergentes. A partir de então
pode falarse de um modelo global (isto é, ocidental) de racionalidade
científica que admite variedade interna, mas que se defende ostensivamente
de duas formas de conhecimento não científico (e, portanto, potencialmente
perturbadoras): o senso comum e as chamadas humanidades ou estudos
humanísticos (em que se incluiriam, entre outros, os estudos históricos,
filológicos, jurídicos, literários, filosóficos e teológicos). (SANTOS, 2002, p.
6061)
Segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 14),
Passa então o positivismo a dominar o pensamento típico do século XIX,
como método e como doutrina. Como método, embasado na certeza rigorosa
dos fatos de experiência como fundamento da construção teórica; como
doutrina, apresentandose como revelação da própria ciência, ou seja, não
apenas regra por meio da qual a ciência chega a descobrir e prever (isto é,
saber para prever e agir), mas conteúdo natural de ordem geral que ela
mostra junto com os fatos particulares, como caráter universal da realidade,
como significado geral da mecânica e da dinâmica do universo. (RIBEIRO
JR., 1991, p. 14)
Segundo Santos (2002, p. 61), “sendo um modelo global, a nova racionalidade
científica é também um modelo totalitário, na medida em que nega o carácter [sic]
racional a todas as formas de conhecimento que se não pautarem pelos seus
princípios epistemológicos e pelas suas regras metodológicas”. É nesse momento
30
31. sóciohistórico que os métodos positivistas, que são adotados como uma doutrina a
ser seguida pelos pesquisados das diversas ciências, ganha notoriedade.
Em todos os domínios, cuidavase de não procurar o porquê das coisas, de
não indagarlhes a essência. A palavra de ordem era desprezar a inacessível
determinação das causas, dando preferência à procura das leis, isto é, das
relações constantes que existem entre os fenômenos. Substituise o método
a priori pelo método a posteriori. Em suma, observase por toda parte o
mecanismo do mundo, ao invés de inventálo. (RIBEIRO JR., 1991, p. 1415,
grifo do autor)
Percebese aí um caráter mecânico de funcionamento de um mundo que não pode
ser (re)inventado mas apenas procurarlhes as suas leis.
O positivismo ainda afirma que há “leis naturais” nos quais os indivíduos teriam que
se submeterem como meros espectadores.
As leis naturais, assim descobertas, constituem a formulação geral de um fato
particular, rigorosamente observado; e daí resulta que a ciência, segundo
Comte, não é mais do que a sistematização do bom senso, que acaba por
nos convencer de que somos simples espectadores dos fenômenos
exteriores, independentes de nós, e que não podemos modificar a ação
destes sobre nós, senão submetendonos às leis que o regem. (RIBEIRO JR.,
1991, p. 15)
Não se pode fazer concebível tal afirmação visto que o ser humano, mediante sua
inteligência e desenvolvimento contínuo, tem a capacidade de projetar sua
imaginação na concretividade e modificála, compreendendoa mas,
simultaneamente, não se submetendo passivamente a ela. Prova disso são os
avanços de pesquisas científicas nas áreas de biotecnologia, nanotecnologia e
genoma humano que se apresentam como perspectivas de modificação das
características essenciais dos seres humanos, promovendo a geração de indivíduos
“póshumanos”.
Ainda segundo Santos (2003, p. 28), ao tecer críticas acerca do paradigma
positivista, observa que segundo essa lógica moderna “o que não é quantificável é
cientificamente irrelevante. Em segundo lugar, o método científico assenta na
redução da complexidade. O mundo é complicado e a mente humana não o pode
compreender completamente. Conhecer significa dividir e classificar para depois
poder determinar relações sistemáticas entre o que se separou”.
31
32. Ilustração 8 – Alunos com déficit de atenção? Ás vezes, a única coisa que faltam às crianças é uma
alimentação que supra suas necessidades corporais básicas, acesso a bons serviços de saúde, uma
residência decente e, principalmente, um ambiente familiar acolhedor.
Sendo assim, Santos (2002, Disponível na Internet) postula, como um dos objetivos
de sua obra, “mostrar que o positivismo científico estava em crise à medida que a
história, a contingência, a incerteza, a irreversibilidade e a complexidade faziam a
sua entrada na ciência, não como corpo estranho, mas como produtos do próprio
desenvolvimento científico”. E não seria exatamente nessa perspectiva, a da
imprevisibilidade, que sempre perpassou a escola e que somente agora os sujeitos
contemporâneos se vêem instigados a (con)vivêla?
Segundo Santos (2002, p. 64, grifo do autor), “as leis da ciência moderna são um
tipo de causa formal que privilegia o como funciona das coisas em detrimento de
qual o agente ou qual o fim das coisas”. Sendo assim,
É por esta via que o conhecimento científico rompe com o conhecimento do
senso comum. É que enquanto no senso comum, e portanto no
conhecimento prático em que ele se traduz, a causa e intenção convivem
sem problemas, na ciência, a determinação da causa formal obtémse
ignorando a intenção. É este tipo de causa formal que permite prever e,
portanto, intervir no real e que, em última instância, permite à ciência
moderna responder à pergunta sobre os fundamentos do seu rigor e da sua
verdade com o elenco dos seus êxitos na manipulação e na transformação
do real. (SANTOS, 2002, p. 64)
32
33. Ainda segundo Santos (2002, p. 64), “um conhecimento baseado na formulação de
leis tem como pressuposto metateórico a ideia [sic] de ordem e de estabilidade do
mundo, a ideia [sic] de que o passado se repete no futuro”.
Mas a verdade é que a ordem e a estabilidade do mundo são a précondição
da transformação tecnológica do real. O determinismo mecanicista é o
horizonte certo de uma forma de conhecimento que se pretende utilitário e
funcional, reconhecido menos pela capacidade de compreender
profundamente o real do que pela capacidade de o dominar e transformar.
No plano social, é esse também o horizonte cognitivo mais adequado aos
interesses da burguesia ascendente, que via na sociedade, em que
começava a dominar, o estádio [sic] final da evolução da humanidade (o
estado positivo de Comte; a sociedade industrial de Spencer; a solidariedade
orgânica de Durkheim). Daí que o prestígio de Newton e das leis simples a
que reduzia toda a complexidade da ordem cósmica tenham convertido a
ciência moderna no modelo de racionalidade hegemônica que a pouco e
pouco [sic] transbordou do estudo da natureza para o estudo da sociedade.
Tal como foi possível descobrir as leis da natureza, seria igualmente possível
descobrir as leis da sociedade. (SANTOS, 2002, p. 6465)
Assim, na perspectiva positivista de Comte, a revolução social só se faz possível
descobrindo as “leis dos fatos sociais”, como se as idiossincrasias de diferentes
agrupamentos humanos não fossem legítimas o suficiente para reivindicarem um
status de cidadão. Assim relata Ribeiro Jr. (1991, p. 16) que
[...] para se reformar a sociedade fazse mister antes de tudo descobrir as leis
que regem os fatos sociais, cuidandose de afastar as concepções abstratas
e as especulações metafísicas, que são estéreis, segundo Comte. (RIBEIRO
JR., 1991, p. 16)
É, pois, segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 16), que o positivismo acredita que é “no
desenvolvimento das ciências naturais que se encontra o caminho a seguir”.
Obviamente que há muitos pesquisadores que se intitulam pósmodernos e que
criticam tal afirmação, mas cabe aqui uma observação extremamente (im)pertinente
teorizadas por Lopes e Macedo (Acesso em 2005, Disponível na Internet)
A despeito das inúmeras críticas ao positivismo construídas no campo das
ciências sociais neste século, sob enfoques os mais diversos, ainda hoje
podemos constatar a utilização de modelos e de conceitos das ciências
naturais nos processos de argumentação das ciência [sic] sociais. Tanto mais
facilmente essa apropriação de modelos ocorre, quanto mais estes se
apresentam como críticos do positivismo no âmbito das próprias ciências
naturais, como é o caso, por exemplo, da mecânica quântica e suas teses
indeterministas. Parece mesmo haver o entendimento de que a incorporação
de modelos das ciências naturais do século XIX caracterizarseia por uma
perspectiva positivista, enquanto a incorporação de modelos das ciências
naturais do século XX, especialmente no limiar do século XXI, caracterizarse
33
34. ia, necessariamente, por uma ruptura com perspectivas positivistas. (LOPES;
MACEDO, Acesso em 2005, Disponível na Internet)
Sendo assim, de acordo ainda com Lopes e Macedo (Acesso em 2005, Disponível
na Internet) “a incorporação de modelos das ciências naturais às ciências sociais
não pode deixar de ser positivista apenas porque os modelos incorporados são, em
seu contexto de produção, críticos ao positivismo mecanicista do século XIX. Ao
contrário, revelam a mesma perspectiva de pretender uma ciência unitária, cara ao
positivismo”.
Ilustração 9 – Um malestar “no ar”: Quais os caminhos percorridos pela educação escolar e não
escolar que nos ajudariam a pensar e problematizar as formas de educar na pósmodernidade?
Mas, segundo Cunha (Acesso em 2005, Disponível na Internet), “a razão
instrumental, que sempre esteve presente na esfera econômica, via ciência, através
do positivismo e do neopositivismo, penetrou também na esfera cultural, adquirindo
um discurso altamente sedutor, alterando a forma do seu canto de sereia, mas não
deixando de o ser. Em suma, o positivismo se sofisticou”. E lança a seguinte
questão: “O que significa isso, concretamente, para o campo do currículo?”.
E ainda afirma Ribeiro Jr. (1991, p. 16) sobre o positivismo que
O positivismo é portanto uma filosofia determinista que professa, de uma
lado, o experimentalismo sistemático e, de outro, considera anticientífico todo
34
35. o estudo das causas finais. Assim, admite que o espírito humano é capaz de
atingir verdades positivas ou da ordem experimental, mas não resolve as
questões metafísicas, não verificadas pela observação e pela experiência.
(RIBEIRO JR., 1991, p. 16)
Como sistema filosófico, segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 16), o positivismo “[...] busca
estabelecer a máxima unidade na explicação de todos os fenômenos universais,
estudados sem preocupação alguma das noções metafísicas, consideradas
inacessíveis, e pelo emprego exclusivo do método empírico, ou da verificação
experimental”.
A matemática fornece à ciência moderna, não só o instrumento privilegiado
de análise, como também a lógica da investigação, e ainda o modelo de
representação da própria estrutura da matéria. Para Galileu, o livro da
natureza está inscrito em caracteres geométricos e Einstein não pensa de
modo diferente. Deste lugar central da matemática na ciência moderna
derivam duas conseqüências principais. Em primeiro lugar, conhecer significa
quantificar. O rigor científico aferese pelo rigor das medições. As qualidades
intrínsecas do objecto [sic] são, por assim dizer, desqualificadas e em seu
lugar passam a imperar as quantidades em que eventualmente se podem
traduzir. O que não é quantificável é cientificamente irrelevante. Em segundo
lugar, o método científico assenta na redução da complexidade. O mundo é
complicado e a mente humana não o pode compreender completamente.
Conhecer significa dividir e classificar para depois poder determinar relações
sistemáticas entre o que se separou. Já em Descartes uma das regras do
Método consiste precisamente em “dividir cada uma das dificuldades... em
tantas parcelas quanto for possível e requerido para melhor as resolver”
(Descartes, 1984: 17). A divisão primordial é a que distingue entre “condições
iniciais” e “leis da natureza”. As condições iniciais são o reino da
complicação, do acidente e onde é necessário seleccionar [sic] as que
estabelecem as condições relevantes dos factos [sic] a observar; as leis da
natureza são o reino da simplicidade e da regularidade, onde é possível
observar e medir com rigor. Esta distinção entre condições iniciais e leis da
natureza nada tem de “natural”. Como bem observa Eugene Wigner, é
mesmo completamente arbitrária (Wigner, 1970: 3). No entanto, é nela que
assenta toda a ciência moderna. (SANTOS, 2002, p. 63, grifo do autor)
Donde se conclui que, segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 17)
[...] o método positivo não assinala à ciência mais do que o estudo dos fatos e
suas relações, fatos esses somente percebidos pelos sentidos exteriores. Por
isso, podese dizer que o positivismo é um dogmatismo físico e um ceticismo
metafísico. É um dogmatismo físico, pois que afirma a objetividade do mundo
físico; e é um ceticismo metafísico, porque não quer pronunciarse acerca da
existência da natureza dos objetivos metafísicos. (RIBEIRO JR., 1991, p. 17)
Segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 18, grifo do autor), “Augusto Comte usa o termo
filosofia na acepção geral que lhe davam os antigos filósofos, particularmente
Aristóteles, como definição do sistema geral do conhecimento humano; e o termo
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36. positiva designa, segundo ele, o real frente ao quimérico, o útil frente ao inútil, a
segurança frente à insegurança, o preciso frente ao vago, o relativo frente ao
absoluto”. Será que nas ciências humanas tudo é real, útil e seguro? Que precisão e
relatividade é essa que seria aplicável a todas as ciências, sem “contraindicações”?
Ilustração 10 – Que outras atividades poderiam ser desenvolvidas para além do ler e escrever, para
além da “educação na cabeça” e em função de uma educação com o corpo, ou seja, com todos os
sentidos, sentimentos, desejos e prazeres que o corpo pode proporcionar?
A primeira manifestação do positivismo no Brasil, segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 65,
grifo do autor), “verificouse em 1844, quando o dr. [sic] Justiniano da Silva Gomes
apresentou à Faculdade de Medicina da Bahia uma tese: Plano e Método de um
Curso de Filosofia. Contudo, a primeira manifestação social do positivismo data de
1865, com a publicação da obra de Francisco Antonio Brandão Júnior sobre a
escravidão no Brasil, A Escravatura no Brasil, precedida de um artigo sobre a
agricultura e colonização no Maranhão”.
Ainda segundo Ribeiro Jr. (1991, p. 68, grifo do autor), “a nossa bandeira, com seu
Ordem e Progresso, mostra quanto a doutrina positivista teve aceitação mesmo
entre nossos republicanos históricos. Ribeiro Jr. afirma que, “desse modo,
dominando as consciências das classes privilegiadas, o positivismo irá repercutir
intensamente nas escolas, influenciando a mocidade, cuja cultura intelectual era
mais literária do que científica”.
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