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UM




N          o dia em que Claire entrou na Casa Glass, alguém roubou
           suas roupas.
           Quando ela se aproximou da medonha e enferrujada máquina
de lavar roupa, encontrou nada mais do que os molhados e escorregadios
tambores da máquina, e – como numa piada de mau gosto – a pior
calcinha que ela tinha e um pé de meia. Ela estava com pressa, claro,
havia apenas duas máquinas daquelas no último piso do Howard Hall,
o menos valorizado e mais negligenciado local do menos valorizado e
mais negligenciado alojamento. Duas máquinas de lavar roupas, duas
secadoras e, com muita sorte, elas estariam funcionando durante os
dias da semana em vez de apenas engolirem suas moedas. Esqueça o
compartimento para colocar as cédulas. Aquilo nunca tinha funcionado,
pelo menos não desde quando ela chegara à faculdade, seis semanas antes.
       – Não – ela disse em voz alta enquanto se equilibrava na beirada
da máquina e olhava para o interior escuro e enferrujado da máquina.
Cheirava a mofo e a detergente barato. Olhar mais de perto não
ajudaria em nada.
       Uma calcinha horrível, já meio descosturada. Um pé de meia.
       Ela percebeu então que todas as peças de roupa que ela havia
usado nas últimas duas semanas tinham desaparecido. As únicas que
ela realmente gostava de vestir.
        – Não! – ela gritou novamente dentro da máquina, e recebeu
como resposta o eco da sua própria voz.

                                                                           9
Em seguida, chutou a lavadora violentamente, da mesma maneira
     que outros estudantes desapontados haviam feito antes dela. Não conseguia
     respirar. Ela tinha algumas outras peças de roupas – poucas – mas que
     eram literalmente suas últimas opções, do tipo: “Ai-meu-Deus-não-me-
     encontrem-nem-morta-vestindo-isso”. Calças muito curtas que a faziam ficar
     parecida com uma caipira, camisetas grandes demais e bastante idiotas,
     que pareciam ter sido escolhidas pela mãe dela. E que, na verdade,
     tinham sido mesmo.
             Claire tinha ainda cerca de trezentos dólares, que teriam que
     durar por, pelo menos, mais alguns meses, depois do último pedido no
     disk-pizza e da compra de outro livro para o Professor “Sem-Noção” Euliss,
     que parecia não ter descoberto ainda qual matéria estava ensinando.
             Ela pensou que talvez pudesse encontrar algumas roupas, se
     procurasse na cidade, que não iriam estourar completamente o seu
     orçamento. Afinal de contas, o centro de Morganville, Texas, era a
     capital mundial da economia. Supondo, claro, que ela pudesse achar
     alguma coisa que suportasse vestir para ir até lá.
            Mamãe disse que isso iria acontecer, ela pensou. Eu só tenho que pensar.
     Só tenho que esfriar a cabeça.
            Claire se jogou em uma cadeira de plástico laranja, despejou sua mo-
     chila sobre o piso de linóleo arranhado, e colocou sua cabeça entre as mãos.
     Seu rosto estava quente, ela estava tremendo, e sabia, simplesmente
     sabia, que estava prestes a chorar. Chorar como um bebê, que todos
     diziam que ela era, muito nova para estar aqui, muito nova para ficar
     longe da “mamãe”.
            É um saco ser inteligente, porque este era o motivo que a havia
     levado a essa situação.
            Ela engoliu sua respiração profunda e úmida e se sentou de volta,
     desejando não gritar (porque eles iriam ouvir), e imaginando se deveria
     ligar para a mãe e o pai para pedir um adiantamento, ou quem sabe usar
     o cartão de crédito que era “só para emergências”.
            Foi então que ela viu o bilhete. Não era bem um “bilhete”, mas
     pichações, endereçadas a ela, pintadas na parede em cima das máquinas.

     CARA OTÁRIA, ela leu, NÓS ACHAMOS LIXO NA MÁQUINA
     E JOGAMOS CANO ABAIXO. SE VOCÊ QUISER DE VOLTA,
     MERGULHE NELE.

10
– Merda – ela sussurrou, tentando conter algumas lágrimas
novamente, dessa vez por uma razão completamente diferente. Uma
raiva estúpida e sem motivo. Mônica. Bem, Mônica e as “moniquetes”.
Porque será que as garotas lindas e malvadas sempre andam em bandos,
como hienas? E por que, com todos aqueles cabelos sedosos e pernas
longas e bronzeadas, além da grana do papai, elas resolveram implicar
justo com ela?
        Não, ela sabia a resposta.
        Ela fez com que Mônica parecesse burra na frente de suas amigas, e
dos caras gatos da turma mais velha. Não que isso tivesse sido muito difícil;
ela estava apenas passando quando ouviu Mônica dizendo algo sobre a
Segunda Guerra Mundial, algo como “aquela guerra chinesa ridícula”.
        E, por simples reflexo, ela disse:
        – Não é isso.
        Todos eles, que estavam espalhados pelos sofás do alojamento,
olharam para ela com surpresa, como se uma máquina de Coca-Cola
tivesse falado. Mônica, suas amigas e três dos garotos populares mais velhos.
         – A Segunda Guerra Mundial – Claire tinha começado a falar,
em pânico, e não muito certa de como sair da situação em que tinha
se metido. – Eu só quis dizer, bem, não era a Guerra Coreana. Isso foi
depois. A Segunda Guerra Mundial foi contra os alemães e os japoneses.
Lembra, Pearl Harbor?

Os caras olharam para Mônica e começaram a rir, e nesse momento
Mônica ficou vermelha, não muito, mas o suficiente para começar a
arruinar sua maquiagem perfeita.
      – Me lembre de nunca pegar cola de História com você – o cara
mais gato dos três disse. – Que tipo de idiota não sabe isso?
      Embora Claire soubesse, ela tinha certeza que nenhum deles ali
sabia na verdade.
      – Chinesa. Ceeerrrtttooo.
      Claire tinha visto a fúria nos olhos de Mônica, rapidamente
encoberta com sorrisos e gargalhadas e charminho. Claire tinha deixado
de existir de novo, para os rapazes.
      Para as meninas, ela era apenas mais uma novata, e indesejável
como uma praga. Claire tinha lidado com isso durante toda a sua vida.

                                                                                11
Inteligente, pequena, nem bonita nem feia, não era exatamente a ven-
     cedora da loteria da vida; tinha que lutar sempre para ganhar, em tudo.
     Alguém estava sempre rindo, ou batendo ou ignorando pessoas assim,
     ou a combinação das duas primeiras. Ela pensava, quando era criança,
     que ter alguém rindo dela era a pior coisa e, em seguida – depois dos
     primeiros anos de escola –, apanhar passou a ser o número 1 da lista.
     Mas, para a maior parte de sua (breve, dois anos) experiência no ensino
     médio, ser ignorada era muito pior. Ela entrou um ano na frente de
     todos, e deixou a escola um ano à frente deles. Ninguém gostou disso.
             Ninguém além dos professores, obviamente.
            O problema era que Claire realmente amava a escola. Amava livros
     e leitura, e aprender coisas – ok, não geometria, mas praticamente todo
     o resto. Física. Que garota normal ama Física? Só as anormais. Aquelas
     que nunca seriam as gostosas.
            E, verdade seja dita, ser gostosa? Isso era o que importava na vida,
     e Mônica tinha acabado de prová-lo, quando o mundo saiu do seu eixo
     por alguns segundos para notarem Claire, e logo voltou a girar em torno
     das garotas lindas novamente.
             Não era justo. Ela tinha mergulhado nos estudos durante o ensino
     médio. Terminou com um perfeito 4,0, pontuação alta o suficiente
     para satisfazer aos critérios de admissão das grandes universidades, as
     lendárias universidades, aquelas onde ser uma menina “nerd-mutante”
     não era necessariamente uma desvantagem. (Exceto se, evidentemente,
     nessas escolas, houvesse alguma menina “nerd-mutante” gostosa e alta).
             Não importava. A mãe e o pai olharam com pouco entusiasmo
     as pilhas de respostas das Universidades Yale, Caltech e do MIT. De
     jeito nenhum eles deixariam sua filha de 16 anos (quase 17, ela insistia
     nisso, apesar de não ser inteiramente verdade) ir para alguma faculdade
     a quilômetros de distância deles. Pelo menos, não por enquanto. (Claire
     tinha tentado, sem sucesso, explicar que, se alguma coisa poderia
     matar sua carreira acadêmica não seria ser uma aluna transferida em
     algum desses lugares, mas ser transferida da Universidade Texas Prairie,
     conhecida como TPU.)
            Então aqui estava ela, presa no último andar de uma droga de
     alojamento dentro de uma droga de faculdade onde oitenta por cento
     dos estudantes eram transferidos antes dos dois primeiros anos – ou

12
abandonavam os estudos – e as moniquetes estavam roubando suas roupas
molhadas da lavanderia e jogando-as no lixo, tudo isso porque Mônica
não sabia nada sobre uma das duas guerras mundiais, suficientemente
importante para ganhar este nome.
       Mas isso não é justo! Algo nela uivava. Eu tinha um plano! Um plano
de verdade! Mônica dormia tarde, e Claire tinha levantado cedo só para
lavar roupa enquanto os alunos festeiros ainda estavam bêbados e os
alunos estudiosos já estavam nas aulas. Ela pensou que poderia deixar suas
roupas por alguns minutos para tomar um banho – outra experiência
assustadora – e nunca sequer passou por sua cabeça que alguém pudesse
fazer algo tão baixo assim.

Enquanto engolia seus soluços, ela notou – novamente – como estava
quieto lá em cima. Assustador e deserto, com metade das garotas
dormindo e a outra metade fora. Mesmo quando o local estava cheio
e barulhento, o alojamento era assustador. Velho, decrépito, cheio de
sombras, cantos e lugares onde garotas com más intenções poderiam
se esconder. Na verdade, era assim em toda a cidade. Morganville era
pequena, velha e empoeirada, cheia de pequenas curiosidades assusta-
doras. Como o fato de os postes de luz funcionarem apenas em metade
do tempo e, quando estavam acesos, a distância entre eles era muito
grande. Como o jeito em que as pessoas nas lojas do campus pareciam
muito felizes. Desesperadamente felizes. Como o fato de toda a cidade,
apesar da poeira, ser limpa – sem lixo, sem pichações, ninguém pedindo
esmolas pelas ruas.
      Estranho.

Ela quase podia ouvir sua mãe dizendo, Querida, é apenas porque você está
em um lugar diferente. Tudo vai melhorar. Você só tem que se esforçar mais.
       Sua mãe sempre dizia coisas como essa, e Claire sempre tinha
tentado esconder como era difícil seguir o conselho.
       Bem. Nada a fazer a não ser tentar pegar suas coisas de volta.
       Claire engoliu em seco algumas vezes, limpou os olhos e pegou a
pesada mochila, jogando-a em seu ombro. Ela olhou por alguns segundos
para a calcinha molhada e o pé de meia que estavam em sua mão direita,
então abriu o bolso da frente da mochila e jogou tudo dentro. Cara,

                                                                              13
ser vista pelos corredores com essas coisas na mão mataria qualquer
     possibilidade dela um dia se tornar popular.
            – Bem... – disse uma voz baixa, uma voz satisfeita que vinha da
     porta aberta do lado oposto às escadas – olha só quem é: a mergulhadora.
            Claire parou, uma das suas mãos estava na grade de ferro enferru-
     jada. Algo lhe dizia que ela deveria correr, mas ela sempre tinha ouvido
     a expressão: “é lutar ou fugir”. E ela estava cansada de fugir. Virou-se
     lentamente, enquanto Mônica Morrell parava do lado de fora de um
     dos quartos – não era o quarto dela, o que significava que ela havia
     pegado o cadeado de Érica novamente. As amigas de briga de Mônica
     – Jennifer e Gina – se posicionaram lado a lado. Eram como soldados
     em sandálias, calças jeans e unhas com francesinha.
             Mônica manteve a pose. Isso era algo em que ela era boa, Claire
     teve que admitir. Quase 1,80 metro de altura, Mônica tinha presença, um
     cabelo preto brilhante e grandes olhos azuis acentuados pela quantidade
     certa de delineador e rímel. Pele perfeita. Um rosto típico de modelo,
     bochechas perfeitas e lábios cheios. E, se ela pudesse paragonar o corpo
     de Mônica ao de uma modelo, com certeza, seria com as modelos da
     Victoria’s Secret, cheia de curvas, mas sem ângulos.
             Ela era rica, linda, e pelo que Claire pôde deduzir, isso não a fazia
     nem um pouco feliz. O que fazia, ela pensou – o que fez aqueles grandes
     olhos azuis brilharem naquele momento – era a ideia de atormentar
     Claire um pouquinho mais.
            – Você não deveria estar começando sua primeira aula agora?
     Perguntou Mônica. – Ou, pelo menos, não deveria estar dentro da sala?
             – Talvez ela esteja procurando as roupas que deixou esquecidas
     por aí – Gina gracejou, e riu. Jennifer riu com ela.
            Claire olhou em seus olhos, naqueles lindos olhos cor de joia, que
     brilhavam de alegria por estarem fazendo ela se sentir um lixo.
            – Sua mosca morta!
            – Roupas? – Mônica dobrou os braços e fingiu pensar. – Quer dizer,
     aqueles trapos que jogamos fora? Aquilo que estava na máquina de lavar?
            – Sim, aquelas roupas.
                      – Eu não usaria aquelas roupas nem morta.
            – Eu não usaria aquelas roupas nem para limpar o chão do
     banheiro masculino – Jennifer bufou.

14
Mônica, com ar de tédio, virou-se e a provocou:
       – Ahh, você sabe tudo sobre o banheiro masculino, não é Jen?
Não foi onde você esteve com Steve Gillespie no último ano da escola?
– Ela fez um barulho estranho, lembrando sons de sucção, e todas elas
riram novamente; Jennifer, no entanto, parecia desconfortável. Claire
sentiu suas bochechas ficarem vermelhas, mesmo que não fosse dela
que estivessem falando.
       – Jesus, Jen, Steve Gillespie? Mantenha sua boca fechada se você
não consegue pensar em algo que não vai te envergonhar.
       Jennifer – é claro – transferiu sua raiva para um alvo mais seguro:
Claire. Ela avançou e Claire deu um passo para trás, na direção da escada.
       – Vá buscar suas roupas idiotas! Estou cansada de olhar para você,
com essa sua cara pálida.
        – Sim, caloura, nunca ouviu falar de sol? – Gina disse girando
os olhos.
       – Veja isso – Mônica rebateu, o que soou muito estranho, porque
todas as três exibiam o melhor bronzeamento artificial que o dinheiro
poderia comprar.
       Claire estava desconfortável. A mochila pesada a deixava sem
equilíbrio, e ela se agarrou no balaustre. Jen riu para ela novamente e
apertou dolorosamente a clavícula de Claire com a mão.
       – Não! – gritou Claire, batendo com força na mão de Jen.
       Houve um segundo de silêncio e, então, Mônica disse, muito
calmamente:
       – Você acabou de bater na minha amiga, sua vadia? Onde você
pensa que está para fazer esse tipo de coisas por aqui?
        Ela caminhou para frente e deu um tapa no rosto de Claire, forte
o suficiente para fazer seu nariz sangrar, forte o suficiente para fazer com
que Claire visse luzes e riscos, forte o suficiente para fazer tudo ficar
vermelho e fervendo.
       Claire largou o balaustre e devolveu um tapa no rosto de Mônica,
com toda a força, que acertou em cheio os seus lábios, e que, por apenas
um momento, uns poucos segundos, fez com que ela se sentisse bem;
mas então Mônica começou a miar como um gato, e Claire nem teve
tempo para pensar: Oh droga, eu realmente não devia ter feito isso.

                                                                               15
Ela nem viu o soco vindo. Sequer sentiu o impacto, exceto como
     uma sensação de vazio e confusão, mas então o peso de sua mochila no
     ombro a puxou para um dos lados e ela se desequilibrou.
            Estava quase se recuperando, quando Gina, com um sorriso
     estúpido, chegou por trás e a empurrou escada abaixo; e não havia nada
     além de ar atrás dela.
            Ela bateu na ponta de cada degrau, por todo o caminho até o final.
     O fecho de sua mochila arrebentou, abrindo-a e espalhando todos os
     seus livros pelo caminho, e, no topo da escada, Mônica e as moniquetes
     riam e vaiavam e batiam as mãos, mas tudo o que ela viu foram imagens
     desconectadas, congeladas, sem sentido.
            Pareceu a ela uma eternidade até que parasse de quicar e chegasse
     ao fim da escada, e então sua cabeça bateu na parede fazendo um som
     metálico, e tudo ficou preto.
            A última coisa de que ela se lembrou, depois de tudo ficar escuro,
     foi a voz de Mônica, baixa e maligna como um suspiro: “Hoje à noite.
     Você vai ver o que te espera, sua aberração. Eu vou cuidar disso.”
             Parecia segundos, mas quando ela acordou novamente havia
     alguém ajoelhado ao lado dela, e não era Mônica ou sua máfia de unhas
     perfeitas; era Érica, que ocupava um quarto no topo da escada, quatro
     portas depois do de Claire. Érica parecia pálida, tensa e assustada, e
     Claire tentou sorrir, porque era isso que ela fazia quando alguém estava
     assustado. Ela não percebeu que estava machucada até o momento em
     que se mexeu e sua cabeça parecia que ia explodir. Ela estava com um
     galo vermelho, e, quando o tocou, sentiu uma enorme dor. Sem sangue,
     apesar de tudo. Doía mais quando ela apertava o local, mas não era nada
     do tipo “Ai-meu-Deus-estou-com-uma-fratura-no-crânio”, ou pelo menos era
     o que ela esperava.
            – Você está bem? – Érica perguntou, acenando com as mãos como
     uma espécie de ajuda para que Claire pudesse se sentar com as costas
     contra a parede. Claire se arriscou a olhar para cima das escadas e depois
     para baixo. Mônica não estava lá. Ninguém saiu para ver o que tinha
     acontecido, também – a maioria deles tinha medo de arranjar problemas,
     e o resto simplesmente não se importava.
            – Sim – disse ela, forçando um sorriso. – Acho que tropecei.

16
– Você precisa ir ao barracão? – esse era o código para a Clínica
Universitária. – Ou, Deus, uma ambulância, ou qualquer coisa assim?
       – Não. Não, estou bem. – Pensamento positivo; embora basicamente
tudo no seu corpo estivesse doendo como se ela estivesse no inferno,
ela não sentia nada quebrado. Claire ficou de pé, embora estivesse com
um tornozelo dolorido, e pegou sua mochila. Todos os cadernos caíram.
Érica agarrou alguns deles e os colocou de volta, e depois correu alguns
poucos passos para reunir mais livros dispersos.
       – Droga, Claire, você realmente precisa de toda essa porcaria?
Quantas aulas você tem por dia?
       – Seis.
       – Você é louca. – Érica, com sua boa ação feita, voltou para a
neutralidade que todas as meninas “sem-graça” do dormitório tinham
mostrado em relação a ela. – É melhor ir ao barracão, é sério. Você
está um lixo.
       Claire deu um sorriso e o manteve até Érica subir as escadas e
começar a reclamar sobre a fechadura quebrada da porta do seu quarto.

Esta noite, Mônica tinha sussurrado em seus ouvidos. Você vai ver o que
te espera, sua aberração. Ela não tinha chamado ninguém, nem tentou
descobrir se Claire tinha quebrado o pescoço. Ela não ia se importar
se Claire morresse.
        Não, isso era errado. O problema era que ela se importava.
         Claire estava sangrando. Seus lábios estavam rachados, e sangravam.
Ela limpou o sangue com as costas das mãos, e, em seguida, com a borda
da camiseta, antes de se lembrar que esta era, literalmente, a única coisa
que ela tinha para vestir. Eu preciso ir até o porão e pegar minhas roupas na
lixeira. A ideia de ir até lá – ir a qualquer lugar sozinha no alojamento –
soava terrível para ela. Mônica estaria esperando. E as outras meninas
não fariam nada. Até mesmo Érica, que era provavelmente uma das
mais legais, tinha medo de ser vista do seu lado. Inferno, Érica também
era maltratada, mas ela deveria estar se sentindo aliviada pelo fato de
que agora Claire estava ali para receber o pior de tudo. Agora não era
apenas tão ruim quanto no ensino médio, onde ela tinha sido tratada
com desprezo e com uma casual crueldade – era pior, muito pior. E ela
nem sequer tinha amigos aqui. Érica era o mais perto de uma amiga

                                                                                17
que ela tinha, mas estava mais preocupada com a porta quebrada do
     que com a sua cabeça.
            Ela estava sozinha. E, se ainda não tinha ficado antes, agora ela
     estava assustada. Realmente, realmente assustada. O que ela havia visto
     nos olhos de Mônica hoje não era uma ameaça habitual de meninas legais
     contra as meninas estranhas; era pior. Ela já tinha recebido esbarrões
     casuais ou outras implicâncias antes, trotes, alguns comentários maldosos,
     mas, isto, foi mais como leões vindo para matar.
            Elas estão vindo para me matar.

     Ela começou a descer os lances de escadas, a cada passo uma terrível dor
     transpassava seu corpo, e ela se lembrou que havia batido em Mônica
     com tanta força que também havia deixado uma marca.
            É. Elas estão vindo para me matar.

     Se Mônica acabasse ficando com um hematoma naquele rosto perfeito,
     não havia qualquer dúvida sobre isso.




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Instintos crueis capitulo 1

  • 1. UM N o dia em que Claire entrou na Casa Glass, alguém roubou suas roupas. Quando ela se aproximou da medonha e enferrujada máquina de lavar roupa, encontrou nada mais do que os molhados e escorregadios tambores da máquina, e – como numa piada de mau gosto – a pior calcinha que ela tinha e um pé de meia. Ela estava com pressa, claro, havia apenas duas máquinas daquelas no último piso do Howard Hall, o menos valorizado e mais negligenciado local do menos valorizado e mais negligenciado alojamento. Duas máquinas de lavar roupas, duas secadoras e, com muita sorte, elas estariam funcionando durante os dias da semana em vez de apenas engolirem suas moedas. Esqueça o compartimento para colocar as cédulas. Aquilo nunca tinha funcionado, pelo menos não desde quando ela chegara à faculdade, seis semanas antes. – Não – ela disse em voz alta enquanto se equilibrava na beirada da máquina e olhava para o interior escuro e enferrujado da máquina. Cheirava a mofo e a detergente barato. Olhar mais de perto não ajudaria em nada. Uma calcinha horrível, já meio descosturada. Um pé de meia. Ela percebeu então que todas as peças de roupa que ela havia usado nas últimas duas semanas tinham desaparecido. As únicas que ela realmente gostava de vestir. – Não! – ela gritou novamente dentro da máquina, e recebeu como resposta o eco da sua própria voz. 9
  • 2. Em seguida, chutou a lavadora violentamente, da mesma maneira que outros estudantes desapontados haviam feito antes dela. Não conseguia respirar. Ela tinha algumas outras peças de roupas – poucas – mas que eram literalmente suas últimas opções, do tipo: “Ai-meu-Deus-não-me- encontrem-nem-morta-vestindo-isso”. Calças muito curtas que a faziam ficar parecida com uma caipira, camisetas grandes demais e bastante idiotas, que pareciam ter sido escolhidas pela mãe dela. E que, na verdade, tinham sido mesmo. Claire tinha ainda cerca de trezentos dólares, que teriam que durar por, pelo menos, mais alguns meses, depois do último pedido no disk-pizza e da compra de outro livro para o Professor “Sem-Noção” Euliss, que parecia não ter descoberto ainda qual matéria estava ensinando. Ela pensou que talvez pudesse encontrar algumas roupas, se procurasse na cidade, que não iriam estourar completamente o seu orçamento. Afinal de contas, o centro de Morganville, Texas, era a capital mundial da economia. Supondo, claro, que ela pudesse achar alguma coisa que suportasse vestir para ir até lá. Mamãe disse que isso iria acontecer, ela pensou. Eu só tenho que pensar. Só tenho que esfriar a cabeça. Claire se jogou em uma cadeira de plástico laranja, despejou sua mo- chila sobre o piso de linóleo arranhado, e colocou sua cabeça entre as mãos. Seu rosto estava quente, ela estava tremendo, e sabia, simplesmente sabia, que estava prestes a chorar. Chorar como um bebê, que todos diziam que ela era, muito nova para estar aqui, muito nova para ficar longe da “mamãe”. É um saco ser inteligente, porque este era o motivo que a havia levado a essa situação. Ela engoliu sua respiração profunda e úmida e se sentou de volta, desejando não gritar (porque eles iriam ouvir), e imaginando se deveria ligar para a mãe e o pai para pedir um adiantamento, ou quem sabe usar o cartão de crédito que era “só para emergências”. Foi então que ela viu o bilhete. Não era bem um “bilhete”, mas pichações, endereçadas a ela, pintadas na parede em cima das máquinas. CARA OTÁRIA, ela leu, NÓS ACHAMOS LIXO NA MÁQUINA E JOGAMOS CANO ABAIXO. SE VOCÊ QUISER DE VOLTA, MERGULHE NELE. 10
  • 3. – Merda – ela sussurrou, tentando conter algumas lágrimas novamente, dessa vez por uma razão completamente diferente. Uma raiva estúpida e sem motivo. Mônica. Bem, Mônica e as “moniquetes”. Porque será que as garotas lindas e malvadas sempre andam em bandos, como hienas? E por que, com todos aqueles cabelos sedosos e pernas longas e bronzeadas, além da grana do papai, elas resolveram implicar justo com ela? Não, ela sabia a resposta. Ela fez com que Mônica parecesse burra na frente de suas amigas, e dos caras gatos da turma mais velha. Não que isso tivesse sido muito difícil; ela estava apenas passando quando ouviu Mônica dizendo algo sobre a Segunda Guerra Mundial, algo como “aquela guerra chinesa ridícula”. E, por simples reflexo, ela disse: – Não é isso. Todos eles, que estavam espalhados pelos sofás do alojamento, olharam para ela com surpresa, como se uma máquina de Coca-Cola tivesse falado. Mônica, suas amigas e três dos garotos populares mais velhos. – A Segunda Guerra Mundial – Claire tinha começado a falar, em pânico, e não muito certa de como sair da situação em que tinha se metido. – Eu só quis dizer, bem, não era a Guerra Coreana. Isso foi depois. A Segunda Guerra Mundial foi contra os alemães e os japoneses. Lembra, Pearl Harbor? Os caras olharam para Mônica e começaram a rir, e nesse momento Mônica ficou vermelha, não muito, mas o suficiente para começar a arruinar sua maquiagem perfeita. – Me lembre de nunca pegar cola de História com você – o cara mais gato dos três disse. – Que tipo de idiota não sabe isso? Embora Claire soubesse, ela tinha certeza que nenhum deles ali sabia na verdade. – Chinesa. Ceeerrrtttooo. Claire tinha visto a fúria nos olhos de Mônica, rapidamente encoberta com sorrisos e gargalhadas e charminho. Claire tinha deixado de existir de novo, para os rapazes. Para as meninas, ela era apenas mais uma novata, e indesejável como uma praga. Claire tinha lidado com isso durante toda a sua vida. 11
  • 4. Inteligente, pequena, nem bonita nem feia, não era exatamente a ven- cedora da loteria da vida; tinha que lutar sempre para ganhar, em tudo. Alguém estava sempre rindo, ou batendo ou ignorando pessoas assim, ou a combinação das duas primeiras. Ela pensava, quando era criança, que ter alguém rindo dela era a pior coisa e, em seguida – depois dos primeiros anos de escola –, apanhar passou a ser o número 1 da lista. Mas, para a maior parte de sua (breve, dois anos) experiência no ensino médio, ser ignorada era muito pior. Ela entrou um ano na frente de todos, e deixou a escola um ano à frente deles. Ninguém gostou disso. Ninguém além dos professores, obviamente. O problema era que Claire realmente amava a escola. Amava livros e leitura, e aprender coisas – ok, não geometria, mas praticamente todo o resto. Física. Que garota normal ama Física? Só as anormais. Aquelas que nunca seriam as gostosas. E, verdade seja dita, ser gostosa? Isso era o que importava na vida, e Mônica tinha acabado de prová-lo, quando o mundo saiu do seu eixo por alguns segundos para notarem Claire, e logo voltou a girar em torno das garotas lindas novamente. Não era justo. Ela tinha mergulhado nos estudos durante o ensino médio. Terminou com um perfeito 4,0, pontuação alta o suficiente para satisfazer aos critérios de admissão das grandes universidades, as lendárias universidades, aquelas onde ser uma menina “nerd-mutante” não era necessariamente uma desvantagem. (Exceto se, evidentemente, nessas escolas, houvesse alguma menina “nerd-mutante” gostosa e alta). Não importava. A mãe e o pai olharam com pouco entusiasmo as pilhas de respostas das Universidades Yale, Caltech e do MIT. De jeito nenhum eles deixariam sua filha de 16 anos (quase 17, ela insistia nisso, apesar de não ser inteiramente verdade) ir para alguma faculdade a quilômetros de distância deles. Pelo menos, não por enquanto. (Claire tinha tentado, sem sucesso, explicar que, se alguma coisa poderia matar sua carreira acadêmica não seria ser uma aluna transferida em algum desses lugares, mas ser transferida da Universidade Texas Prairie, conhecida como TPU.) Então aqui estava ela, presa no último andar de uma droga de alojamento dentro de uma droga de faculdade onde oitenta por cento dos estudantes eram transferidos antes dos dois primeiros anos – ou 12
  • 5. abandonavam os estudos – e as moniquetes estavam roubando suas roupas molhadas da lavanderia e jogando-as no lixo, tudo isso porque Mônica não sabia nada sobre uma das duas guerras mundiais, suficientemente importante para ganhar este nome. Mas isso não é justo! Algo nela uivava. Eu tinha um plano! Um plano de verdade! Mônica dormia tarde, e Claire tinha levantado cedo só para lavar roupa enquanto os alunos festeiros ainda estavam bêbados e os alunos estudiosos já estavam nas aulas. Ela pensou que poderia deixar suas roupas por alguns minutos para tomar um banho – outra experiência assustadora – e nunca sequer passou por sua cabeça que alguém pudesse fazer algo tão baixo assim. Enquanto engolia seus soluços, ela notou – novamente – como estava quieto lá em cima. Assustador e deserto, com metade das garotas dormindo e a outra metade fora. Mesmo quando o local estava cheio e barulhento, o alojamento era assustador. Velho, decrépito, cheio de sombras, cantos e lugares onde garotas com más intenções poderiam se esconder. Na verdade, era assim em toda a cidade. Morganville era pequena, velha e empoeirada, cheia de pequenas curiosidades assusta- doras. Como o fato de os postes de luz funcionarem apenas em metade do tempo e, quando estavam acesos, a distância entre eles era muito grande. Como o jeito em que as pessoas nas lojas do campus pareciam muito felizes. Desesperadamente felizes. Como o fato de toda a cidade, apesar da poeira, ser limpa – sem lixo, sem pichações, ninguém pedindo esmolas pelas ruas. Estranho. Ela quase podia ouvir sua mãe dizendo, Querida, é apenas porque você está em um lugar diferente. Tudo vai melhorar. Você só tem que se esforçar mais. Sua mãe sempre dizia coisas como essa, e Claire sempre tinha tentado esconder como era difícil seguir o conselho. Bem. Nada a fazer a não ser tentar pegar suas coisas de volta. Claire engoliu em seco algumas vezes, limpou os olhos e pegou a pesada mochila, jogando-a em seu ombro. Ela olhou por alguns segundos para a calcinha molhada e o pé de meia que estavam em sua mão direita, então abriu o bolso da frente da mochila e jogou tudo dentro. Cara, 13
  • 6. ser vista pelos corredores com essas coisas na mão mataria qualquer possibilidade dela um dia se tornar popular. – Bem... – disse uma voz baixa, uma voz satisfeita que vinha da porta aberta do lado oposto às escadas – olha só quem é: a mergulhadora. Claire parou, uma das suas mãos estava na grade de ferro enferru- jada. Algo lhe dizia que ela deveria correr, mas ela sempre tinha ouvido a expressão: “é lutar ou fugir”. E ela estava cansada de fugir. Virou-se lentamente, enquanto Mônica Morrell parava do lado de fora de um dos quartos – não era o quarto dela, o que significava que ela havia pegado o cadeado de Érica novamente. As amigas de briga de Mônica – Jennifer e Gina – se posicionaram lado a lado. Eram como soldados em sandálias, calças jeans e unhas com francesinha. Mônica manteve a pose. Isso era algo em que ela era boa, Claire teve que admitir. Quase 1,80 metro de altura, Mônica tinha presença, um cabelo preto brilhante e grandes olhos azuis acentuados pela quantidade certa de delineador e rímel. Pele perfeita. Um rosto típico de modelo, bochechas perfeitas e lábios cheios. E, se ela pudesse paragonar o corpo de Mônica ao de uma modelo, com certeza, seria com as modelos da Victoria’s Secret, cheia de curvas, mas sem ângulos. Ela era rica, linda, e pelo que Claire pôde deduzir, isso não a fazia nem um pouco feliz. O que fazia, ela pensou – o que fez aqueles grandes olhos azuis brilharem naquele momento – era a ideia de atormentar Claire um pouquinho mais. – Você não deveria estar começando sua primeira aula agora? Perguntou Mônica. – Ou, pelo menos, não deveria estar dentro da sala? – Talvez ela esteja procurando as roupas que deixou esquecidas por aí – Gina gracejou, e riu. Jennifer riu com ela. Claire olhou em seus olhos, naqueles lindos olhos cor de joia, que brilhavam de alegria por estarem fazendo ela se sentir um lixo. – Sua mosca morta! – Roupas? – Mônica dobrou os braços e fingiu pensar. – Quer dizer, aqueles trapos que jogamos fora? Aquilo que estava na máquina de lavar? – Sim, aquelas roupas. – Eu não usaria aquelas roupas nem morta. – Eu não usaria aquelas roupas nem para limpar o chão do banheiro masculino – Jennifer bufou. 14
  • 7. Mônica, com ar de tédio, virou-se e a provocou: – Ahh, você sabe tudo sobre o banheiro masculino, não é Jen? Não foi onde você esteve com Steve Gillespie no último ano da escola? – Ela fez um barulho estranho, lembrando sons de sucção, e todas elas riram novamente; Jennifer, no entanto, parecia desconfortável. Claire sentiu suas bochechas ficarem vermelhas, mesmo que não fosse dela que estivessem falando. – Jesus, Jen, Steve Gillespie? Mantenha sua boca fechada se você não consegue pensar em algo que não vai te envergonhar. Jennifer – é claro – transferiu sua raiva para um alvo mais seguro: Claire. Ela avançou e Claire deu um passo para trás, na direção da escada. – Vá buscar suas roupas idiotas! Estou cansada de olhar para você, com essa sua cara pálida. – Sim, caloura, nunca ouviu falar de sol? – Gina disse girando os olhos. – Veja isso – Mônica rebateu, o que soou muito estranho, porque todas as três exibiam o melhor bronzeamento artificial que o dinheiro poderia comprar. Claire estava desconfortável. A mochila pesada a deixava sem equilíbrio, e ela se agarrou no balaustre. Jen riu para ela novamente e apertou dolorosamente a clavícula de Claire com a mão. – Não! – gritou Claire, batendo com força na mão de Jen. Houve um segundo de silêncio e, então, Mônica disse, muito calmamente: – Você acabou de bater na minha amiga, sua vadia? Onde você pensa que está para fazer esse tipo de coisas por aqui? Ela caminhou para frente e deu um tapa no rosto de Claire, forte o suficiente para fazer seu nariz sangrar, forte o suficiente para fazer com que Claire visse luzes e riscos, forte o suficiente para fazer tudo ficar vermelho e fervendo. Claire largou o balaustre e devolveu um tapa no rosto de Mônica, com toda a força, que acertou em cheio os seus lábios, e que, por apenas um momento, uns poucos segundos, fez com que ela se sentisse bem; mas então Mônica começou a miar como um gato, e Claire nem teve tempo para pensar: Oh droga, eu realmente não devia ter feito isso. 15
  • 8. Ela nem viu o soco vindo. Sequer sentiu o impacto, exceto como uma sensação de vazio e confusão, mas então o peso de sua mochila no ombro a puxou para um dos lados e ela se desequilibrou. Estava quase se recuperando, quando Gina, com um sorriso estúpido, chegou por trás e a empurrou escada abaixo; e não havia nada além de ar atrás dela. Ela bateu na ponta de cada degrau, por todo o caminho até o final. O fecho de sua mochila arrebentou, abrindo-a e espalhando todos os seus livros pelo caminho, e, no topo da escada, Mônica e as moniquetes riam e vaiavam e batiam as mãos, mas tudo o que ela viu foram imagens desconectadas, congeladas, sem sentido. Pareceu a ela uma eternidade até que parasse de quicar e chegasse ao fim da escada, e então sua cabeça bateu na parede fazendo um som metálico, e tudo ficou preto. A última coisa de que ela se lembrou, depois de tudo ficar escuro, foi a voz de Mônica, baixa e maligna como um suspiro: “Hoje à noite. Você vai ver o que te espera, sua aberração. Eu vou cuidar disso.” Parecia segundos, mas quando ela acordou novamente havia alguém ajoelhado ao lado dela, e não era Mônica ou sua máfia de unhas perfeitas; era Érica, que ocupava um quarto no topo da escada, quatro portas depois do de Claire. Érica parecia pálida, tensa e assustada, e Claire tentou sorrir, porque era isso que ela fazia quando alguém estava assustado. Ela não percebeu que estava machucada até o momento em que se mexeu e sua cabeça parecia que ia explodir. Ela estava com um galo vermelho, e, quando o tocou, sentiu uma enorme dor. Sem sangue, apesar de tudo. Doía mais quando ela apertava o local, mas não era nada do tipo “Ai-meu-Deus-estou-com-uma-fratura-no-crânio”, ou pelo menos era o que ela esperava. – Você está bem? – Érica perguntou, acenando com as mãos como uma espécie de ajuda para que Claire pudesse se sentar com as costas contra a parede. Claire se arriscou a olhar para cima das escadas e depois para baixo. Mônica não estava lá. Ninguém saiu para ver o que tinha acontecido, também – a maioria deles tinha medo de arranjar problemas, e o resto simplesmente não se importava. – Sim – disse ela, forçando um sorriso. – Acho que tropecei. 16
  • 9. – Você precisa ir ao barracão? – esse era o código para a Clínica Universitária. – Ou, Deus, uma ambulância, ou qualquer coisa assim? – Não. Não, estou bem. – Pensamento positivo; embora basicamente tudo no seu corpo estivesse doendo como se ela estivesse no inferno, ela não sentia nada quebrado. Claire ficou de pé, embora estivesse com um tornozelo dolorido, e pegou sua mochila. Todos os cadernos caíram. Érica agarrou alguns deles e os colocou de volta, e depois correu alguns poucos passos para reunir mais livros dispersos. – Droga, Claire, você realmente precisa de toda essa porcaria? Quantas aulas você tem por dia? – Seis. – Você é louca. – Érica, com sua boa ação feita, voltou para a neutralidade que todas as meninas “sem-graça” do dormitório tinham mostrado em relação a ela. – É melhor ir ao barracão, é sério. Você está um lixo. Claire deu um sorriso e o manteve até Érica subir as escadas e começar a reclamar sobre a fechadura quebrada da porta do seu quarto. Esta noite, Mônica tinha sussurrado em seus ouvidos. Você vai ver o que te espera, sua aberração. Ela não tinha chamado ninguém, nem tentou descobrir se Claire tinha quebrado o pescoço. Ela não ia se importar se Claire morresse. Não, isso era errado. O problema era que ela se importava. Claire estava sangrando. Seus lábios estavam rachados, e sangravam. Ela limpou o sangue com as costas das mãos, e, em seguida, com a borda da camiseta, antes de se lembrar que esta era, literalmente, a única coisa que ela tinha para vestir. Eu preciso ir até o porão e pegar minhas roupas na lixeira. A ideia de ir até lá – ir a qualquer lugar sozinha no alojamento – soava terrível para ela. Mônica estaria esperando. E as outras meninas não fariam nada. Até mesmo Érica, que era provavelmente uma das mais legais, tinha medo de ser vista do seu lado. Inferno, Érica também era maltratada, mas ela deveria estar se sentindo aliviada pelo fato de que agora Claire estava ali para receber o pior de tudo. Agora não era apenas tão ruim quanto no ensino médio, onde ela tinha sido tratada com desprezo e com uma casual crueldade – era pior, muito pior. E ela nem sequer tinha amigos aqui. Érica era o mais perto de uma amiga 17
  • 10. que ela tinha, mas estava mais preocupada com a porta quebrada do que com a sua cabeça. Ela estava sozinha. E, se ainda não tinha ficado antes, agora ela estava assustada. Realmente, realmente assustada. O que ela havia visto nos olhos de Mônica hoje não era uma ameaça habitual de meninas legais contra as meninas estranhas; era pior. Ela já tinha recebido esbarrões casuais ou outras implicâncias antes, trotes, alguns comentários maldosos, mas, isto, foi mais como leões vindo para matar. Elas estão vindo para me matar. Ela começou a descer os lances de escadas, a cada passo uma terrível dor transpassava seu corpo, e ela se lembrou que havia batido em Mônica com tanta força que também havia deixado uma marca. É. Elas estão vindo para me matar. Se Mônica acabasse ficando com um hematoma naquele rosto perfeito, não havia qualquer dúvida sobre isso. 18