1) O documento discute os conceitos de poder, disciplina e panóptico segundo Michel Foucault.
2) Foucault define poder como uma relação de forças disseminadas na sociedade através de micropoderes.
3) O poder disciplinar se exerce sobre os corpos individuais por meio de técnicas de vigilância e punição para docilizá-los.
3. A Força e a Justiça
“É justo que o que é justo seja seguido e é necessário que o
que é mais forte seja seguido. A justiça sem a força é
impotente; a força sem a justiça é tirânica. A justiça sem a
força é contestada, porque há sempre maus; a força sem a
justiça é acusada. É preciso portanto pôr em conjunto a
justiça e a força, e, por isso, fazer com que o que é justo seja
forte, e o que é forte seja justo.
A justiça está sujeita à disputa, a força é muito reconhecível
e sem disputa. Assim não se pode dar a força à justiça,
porque a força contradisse a justiça e disse que era injusta,
e disse que era ela que era justa. E assim, não podendo
fazer com que o que é justo fosse forte, fez-se com que o
que é forte fosse justo.”
Blaise Pascal, in "Pensamentos"
4. SUPLÍCIO
CAPÍTULO I
O CORPO DOS CONDENADOS
[Damiens fora condenado, a 2 de março de 1757], a pedir perdão publicamente diante
da poria principal da Igreja de Paris [aonde devia ser] levado e acompanhado numa
carroça, nu, de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; [em
seguida], na dita carroça, na praça de Greve, e sobre um patíbulo que aí será erguido,
atenazado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das pernas, sua mão direita
segurando a faca com que cometeu o dito parricídio, queimada com fogo de enxofre, e
às partes em que será atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente, piche
em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo será puxado e
desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos ao fogo,
reduzidos a cinzas, e suas cinzas lançadas ao vento.
(...) Este executor, ainda que forte e robusto, teve grande dificuldade em arrancar os
pedaços de carne que tirava em suas tenazes duas ou três vezes do mesmo lado ao
torcer, e o que ele arrancava formava em cada parte uma chaga do tamanho de um
escudo de seis libras.(...)
(...)Achegaram-se vários confessores e lhe falaram demoradamente; beijava
conformado o crucifixo que lhe apresentavam; estendia os lábios e dizia sempre:
“Perdão, Senhor”.(...)
5. “(...) A pena de morte natural compreende todos os
tipos de morte: uns podem ser condenados à forca,
outros a ter a mão ou a língua cortada ou furada e
ser enforcados em seguida; outros, por crimes mais
graves, a ser arrebentados vivos e expirar na roda
depois de ter os membros arrebentados; outros a
ser arrebentados até a morte natural, outros a ser
estrangulados e em seguida arrebentados, outros a
ser queimados vivos, outros a ser queimados depois
de estrangulados(...)”
Foucault Vigiar e Punir pg35
6. “(...) a justiça não mais assume
publicamente a parte de
violência que está ligada a seu
exercício. O fato de ela matar ou
ferir já não é mais a glorificação
de sua força, mas um elemento
intrínseco a ela que ela é
obrigada a tolerar e muito lhe
custa ter que impor.(...)”
Foucault Vigiar e Punir pg 13
7. A NOÇÃO DE PODER EM
MICHEL FOUCAULT
“(...) há quatro tipos de poder disseminados nas distintas instituições: o poder
econômico; o poder político; o poder judiciário; o poder epistemológico(...)”
GODINHO, 1995, p.67
“(...) o poder deve ser estudado a partir das técnicas e táticas de dominação,
pois, para Foucault (2005) o poder não existe, o que existe são as práticas
ou relações de poder que se estabelecem na sociedade. Dessa forma, ele é
próprio do funcionamento da sociedade(...)”
Na concepção foucaultiana de poder, existem poderes disseminados em
toda a estrutura social por intermédio de uma rede de dispositivos da qual
ninguém, nada escapa. O poder único não existe, mas, sim, práticas de
poder, (...) o poder não é algo que se possui, mas algo que se exerce, (...).
GODINHO, 1995, p.67
8. DEFINIÇÃO DE PODER
O PODER É UMA RELAÇÃO DE
FORÇAS,OU MELHOR, TODA RELAÇÃO
DE FORÇAS É UMA “RELAÇÃO DE
PODER” (P. 78).
A FORÇA NÃO TEM
OBJETO NEM SUJEITO A
NÃO SER A FORÇA (P.78).
10. O poder disciplinar é fruto de transformações da
sociedade burguesa, do deslocamento do
poder soberano para o corpo social. A partir de
então, o poder se exerceria, na forma de
micropoderes ou de uma micropolítica. Tal poder se
exerce sobre os corpos individuais por
meio de exercícios especialmente direcionados
para a ampliação de suas forças. Estes
exercícios tinham como objetivo, o adestramento e
a docilização dos corpos. “É dócil um
corpo que pode ser submetido, que pode ser
utilizado, que pode ser transformado e
aperfeiçoado” (FOUCAULT, 2005, p.118).
11.
12. Para Foucault (2005), a punição e a vigilância
são mecanismos de poder utilizados para
docilizar e adestrar as pessoas para que essas
se adéquem às normas estabelecidas nas
instituições. A vigilância é uma tecnologia de
poder que incide sobre os corpos dos
indivíduos, controlando seus gestos, suas
atividades, sua aprendizagem, sua vida
cotidiana.
13. Na concepção foucaultiana, os dispositivos do
poder disciplinar caracterizam-se pela
minúcia e pelo detalhe. Nesse sentido, o corpo
será submetido a uma forma de poder que irá
desarticulá-lo e corrigi-lo através de uma nova
mecânica do poder.
14. 1°) Dividir a duração em segmentos,
sucessivos ou paralelos,[...];
2°) Organizar essas sequências segundo um
esquema analítico [...];
3°) Finalizar esses segmentos temporais, fixar-
lhes um termo marcado por uma prova,[...];
4°) Estabelecer séries de séries; prescrever a
cada um, os exercícios que lhe convêm; [...]
(FOUCAULT, 2005, p.133-134).
15. A Clausura
A “clausura” consiste em estabelecer a organização no
espaço físico. Na escola, por exemplo, há salas
determinadas para cada tipo de atividade, uma ficha
com a matrícula do aluno, que indicará sua entrada na
escola, seu desempenho escolar. Uma série de
detalhes que localiza o indivíduo e toda sua trajetória
no espaço escolar, fazendo-se uma forma de
vigilância sem se olhar diretamente o indivíduo.
16. O CONTROLE DA ATIVIDADE
Para Michel Foucault, o controle da atividade implica em saber utilizar
corretamente o tempo, estabelecendo horários rígidos de trabalho,
sempre repetitivos e constantes. Trata-se de construir um tempo
integralmente útil, sem desperdícios. Sendo assim, o horário constitui-se
um importante mecanismo do poder disciplinar.
Foucault (2005) explica que o horário teve inicio em comunidades
monásticas, e que se disseminou rapidamente. Os processos de
regularização temporal, herdados das práticas religiosas, passaram a
especificar e dividir o tempo, contando os quartos de hora, os minutos
e segundos. Assim, associados à organização do espaço, é possível
observar o controle do tempo que além de determinar atividades,
regulamenta a rotina.
17. “[...] um edifício em forma de anel, no meio do qual havia um pátio
com uma torre no centro. O anel se dividia em pequenas celas que
davam tanto para o interior quanto para o exterior. Em cada uma
dessas pequenas celas, havia segundo o objetivo da instituição,
uma
criança aprendendo a escrever, um operário trabalhando, um
prisioneiro se corrigindo, um louco atualizando sua loucura, etc. Na
torre central havia um vigilante. Como cada cela dava ao mesmo
tempo para o interior e para o exterior, o olhar do vigilante podia
atravessar toda a cela; não havia nela nenhum ponto de sombra e,
por conseguinte, tudo o que fazia o indivíduo estava exposto ao
olhar de um vigilante que observava através de venezianas, de
postigos semicerrados de modo a poder ver sem que ninguém ao
contrário pudesse vê-lo” (Idem: 87).
18.
PANOPTICO
[O PANOPTICO É DEFINIDO] PELA PURA FUNÇÃO DE IMPOR UMA TAREFA OU UM
COMPORTAMENTO QUALQUER A UMA MULTIPLICIDADE QUALQUER DE
INDIVÍDUOS, SOB A ÚNICA CONDIÇÃO DE QUE A MULTIPLICIDADE SEJA POUCO
NUMEROSA E O ESPAÇO LIMITADO, POUCO EXTENSO (P. 80).
19. A loucura, porém, não está somente ligada às assombrações e
aos mistérios do mundo, mas ao próprio homem, às suas
fraquezas, às suas ilusões e a seus sonhos, representando um
sutil relacionamento que o homem mantém consigo mesmo.
Aqui, portanto, a loucura não diz respeito à verdade do mundo,
mas ao homem e à verdade que ele distingue de si mesmo.
Foucault. in A História da Loucura
A loucura
(...) ao poder do médico em tomar decisões fundamentais
sobre a vida do outro. É através do corpo que o poder em
estado de força age sobre as mentes. (...) corpo submetido a
um sistema de coerção moral onde o sujeitado revela um
sentido ontológico nulo e vazio (...).
Foucault.
21.
Até o século XVII, a imagem que se tinha da
loucura era sua representação medieval de algo
místico, desconhecido, considerado o lugar
imaginário da passagem da vida à morte. Ao
mesmo tempo, convivia-se com o chamado “nau
dos loucos”, navios que carregavam loucos para
outras cidades em busca da razão.
22. Michel Foucault tenta demonstrar a criação do panoptismo como
sistema de vigilância e controle exercido sobre os presos, os
operários das fábricas, e também, nas escolas e nos conventos.
“O panoptismo é o princípio geral de uma nova ‘anatomia política’
cujo objeto e fim não são a relação de soberania, mas as relações
de disciplina” (FOUCAULT, 2005, p.172).
“o panoptismo constitui-se uma forma de poder que vai produzir o
exame, um saber de vigilância que regula a vida dos indivíduos e se
constitui a base do poder-saber que produzirá as ciências humanas.
Assim sendo, este dispositivo tornou-se o protótipo dos sistemas
sociais de controle e vigilância total presentes na atualidade.”
Godinho (1995)