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JANEIRO DE 2011
                  AUTOMÁTICO
O velho homem vivia enclausurado. Não
tinha amigos nem parentes. Pouco saía, a
não ser para o essencial, e quando o fazia,
tinha medo de tudo e de todos.
A aparência era de tristeza, o dorso
encurvado, as faces encarquilhadas, os
cabelos em desalinho, as roupas surradas,
mal postas. Nada fazia lembrar daquele
poderoso empresário de outrora, dono de
colégios, de postos de combustíveis, de
vendas de motos...
Os jornais noticiaram em primeira página.
A debacle viera de chofre. Empregados e
credores se abateram sobre ele como urubus
na carniça.
Triste fim de quem lutou a vida inteira, no
exato momento em que merecia o tranquilo
repouso dos aposentados...
 Era só o que sentia: medo e angústia.
A esposa, companheira fiel de
tantos anos, fora
embora, tangida pela penúria
e pelas incertezas de cada dia.
Os dois filhos se
distanciaram, cada um a
cuidar de sua própria vida.
Era o que se poderia esperar
de quem fora marido e pai
ausente.
O velho estremece ao soar da campainha. O que de pior viria agora?
Ele vai abrir, os dentes crispados...
À porta entreaberta, deparou-se com a imagem de um homem idoso
como ele, de expressão familiar, embora não o reconhecesse de pronto.
Ao topar com seu olhar e vê-lo sorrir, identificou o vizinho do mesmo
andar.
Jamais se haviam falado, apenas de quando em
quando se cruzavam nos corredores. Nem mesmo
se cumprimentavam. Agora ele estava ali,
sorridente, a lhe estender uma pequena cesta.
Senhor, desculpe o incômodo! Há pouco ganhei esta cesta de frutas.
Eu não poderia comer toda sozinho e venho perguntar se o senhor
aceitaria dividir comigo? São belas estas frutas e estão no
ponto, infelizmente algumas um pouco machucadas, foi o
transporte.
O homem quis agradecer, mas o visitante esboçando um gesto de
defesa, se retira rapidamente.
Lentamente o homem fecha a porta, e resta imóvel
a pequena cesta em suas mãos. Ele a segura como a
um tesouro, enquanto escuta os passos do vizinho
a se afastar no corredor.
A seguir, com o coração aos pulos, ele a coloca
sobre a mesa, acende a luz. As peras verdejantes, as
maçãs vermelhas, os pêssegos amarelos estavam
meticulosamente arranjados em duas fileiras sobre
um guardanapo de linho branco.
.
O velho homem nem mesmo pensava nas
frutas suculentas. Sentado diante do
inesperado presente, a contemplá-lo, ele
emocionou-se ao lembrar da mão
estendida, do sorriso amigo.
Ele se levanta num repente: Vou esvaziar
a cesta para devolvê-la!
O dia se abriu claro. Um céu azul afastou
por momentos as nuvens negras de seus
pensamentos.
FORMATAÇÃO : Jane B. T. da Costa
IMAGENS : INTERNET
TEXTO : Alberto Bittencourt
MÚSICA : ARTHUR’S THEME
PEQUENOS GESTOS




         GRANDES MUDANÇAS

Jane B. T. da Costa

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Pequenos gestos de bondade podem trazer grandes mudanças

  • 1. JANEIRO DE 2011 AUTOMÁTICO
  • 2. O velho homem vivia enclausurado. Não tinha amigos nem parentes. Pouco saía, a não ser para o essencial, e quando o fazia, tinha medo de tudo e de todos. A aparência era de tristeza, o dorso encurvado, as faces encarquilhadas, os cabelos em desalinho, as roupas surradas, mal postas. Nada fazia lembrar daquele poderoso empresário de outrora, dono de colégios, de postos de combustíveis, de vendas de motos...
  • 3. Os jornais noticiaram em primeira página. A debacle viera de chofre. Empregados e credores se abateram sobre ele como urubus na carniça. Triste fim de quem lutou a vida inteira, no exato momento em que merecia o tranquilo repouso dos aposentados... Era só o que sentia: medo e angústia.
  • 4. A esposa, companheira fiel de tantos anos, fora embora, tangida pela penúria e pelas incertezas de cada dia. Os dois filhos se distanciaram, cada um a cuidar de sua própria vida. Era o que se poderia esperar de quem fora marido e pai ausente.
  • 5. O velho estremece ao soar da campainha. O que de pior viria agora? Ele vai abrir, os dentes crispados... À porta entreaberta, deparou-se com a imagem de um homem idoso como ele, de expressão familiar, embora não o reconhecesse de pronto. Ao topar com seu olhar e vê-lo sorrir, identificou o vizinho do mesmo andar.
  • 6. Jamais se haviam falado, apenas de quando em quando se cruzavam nos corredores. Nem mesmo se cumprimentavam. Agora ele estava ali, sorridente, a lhe estender uma pequena cesta.
  • 7. Senhor, desculpe o incômodo! Há pouco ganhei esta cesta de frutas. Eu não poderia comer toda sozinho e venho perguntar se o senhor aceitaria dividir comigo? São belas estas frutas e estão no ponto, infelizmente algumas um pouco machucadas, foi o transporte. O homem quis agradecer, mas o visitante esboçando um gesto de defesa, se retira rapidamente.
  • 8. Lentamente o homem fecha a porta, e resta imóvel a pequena cesta em suas mãos. Ele a segura como a um tesouro, enquanto escuta os passos do vizinho a se afastar no corredor. A seguir, com o coração aos pulos, ele a coloca sobre a mesa, acende a luz. As peras verdejantes, as maçãs vermelhas, os pêssegos amarelos estavam meticulosamente arranjados em duas fileiras sobre um guardanapo de linho branco.
  • 9. . O velho homem nem mesmo pensava nas frutas suculentas. Sentado diante do inesperado presente, a contemplá-lo, ele emocionou-se ao lembrar da mão estendida, do sorriso amigo. Ele se levanta num repente: Vou esvaziar a cesta para devolvê-la! O dia se abriu claro. Um céu azul afastou por momentos as nuvens negras de seus pensamentos.
  • 10. FORMATAÇÃO : Jane B. T. da Costa IMAGENS : INTERNET TEXTO : Alberto Bittencourt MÚSICA : ARTHUR’S THEME
  • 11. PEQUENOS GESTOS GRANDES MUDANÇAS Jane B. T. da Costa