O documento discute a extração ilegal de palmito de matas nativas e apresenta o cultivo sustentável de pupunha como alternativa. O produtor rural Manuel Ferraz planta pupunha ecologicamente em 235 hectares no Vale do Ribeira e vende o produto em duas lojas para conscientizar as pessoas sobre a importância de se obter palmito de forma sustentável.
Nematoides são responsaveis por perdas de até 30% dos canaviais
Cultivo de pupunha alternativa sustentável ao palmito extraído ilegalmente de matas
1. A8 CORREIO POPULAR
Campinas, quinta-feira, 5 de abril de 2012
Elcio Alves/CEDOC
Estação Ecológica
da Juréia, que
protege área de
Mata Atlântica,
no Litoral Sul
paulista: extrair
palmito é crime
ambiental
NEGÓCIO ||| GASTRONOMIA CONSCIENTE
Cultivo de
pupunha é
alternativa Sabor no prato sem Lei de 92 proíbe
a extração em
matas nativas
para manter o
consumo de
palmito sem
tirar o verde da mata A
proibição da extração
do palmito de matas
nativas no Brasil, a
partir do Código Florestal de
danos ao meio
Fotos: Dominique Torquato/AAN
1992, criou quadrilhas
especializadas na retirada de
ambiente palmeiras das áreas nativas.
Só no ano passado, de
acordo com a Polícia
Fabiano Ormaneze Ambiental, foram
DA AGÊNCIA ANHANGUERA apreendidas 50 toneladas de
fabiano.ormaneze@rac.com.br palmito beneficiado e in
natura. O volume
O brasileiro corresponde a cerca de 40
é o maior mil palmeiras retiradas da
consumidor natureza. A maior parte vem
de palmito de reservas de Mata Atlântica
do mundo: do Vale do Ribeira e do Vale
come, em do Paraíba. Por cerca de R$
média, 900 1,00 pago pelas indústrias, as
gramas da quadrilhas cortam uma
iguaria a cada ano. Em salada, palmeira e retiram o seu
pratos quentes, pizzas e até miolo. Cada caule derrubado
na alta gastronomia, em que é consegue produzir, no
utilizado, principalmente, no máximo, dois vidros de 300
formato in natura, o produto gramas, comercializados por
pode esconder uma sentença cerca de R$ 9,00 nos
de destruição ambiental a ca- supermercados. (FO/AAN)
da garfada, já que muito pal-
mito que chega à mesa é reti-
rado ilegalmente de matas bra-
sileiras. O advogado aposenta-
SAIBA MAIS
do e produtor rural Manuel
Pereira Ferraz descobriu no As lojas Papua, que
cultivo ecologicamente corre- comercializam o palmito
to uma maneira de contribuir ecologicamente correto, ficam
para a sustentabilidade e a di- na Rua Leonardo da Vinci,
vulgação de práticas menos 850, e na Avenida Dr.
agressivas ao meio ambiente. Armando Sales de Oliveira,
ambas no Taquaral, em
Retirada da natureza Campinas.
O advogado aposentado e produtor Manuel Pereira Ferraz em uma das lojas onde vende o palmito pupunha plantado no Vale do Ribeira
destrói florestas e
degrada o ambiente palmeiras são inviáveis de se- perfilhamento, ou seja, quan- sistência Técnica Integral (Ca- ção ambiental que provocou jas pelo Estado de São Paulo.
rem produzidas em larga esca- do a planta é cortada, a ramifi- ti) e do IAC que, desde 1974, ao comprar um vidro de pal-
Com 235 hectares de área la na lavoura por causa da de- cação das raízes faz surgir um pesquisa o aprimoramento mito que pode ter sido extraí- Incentivo
plantada (o equivalente a mora para atingirem o ponto novo caule e, em 18 meses, do cultivo do palmito de pu- do de forma ilegal”, explica o Como a região do Vale do Ri-
aproximadamente 220 cam- de corte. Além disso, a extra- uma nova extração de palmi- punha. “Decidi plantar por- produtor. beira, principalmente no mu-
pos de futebol) e duas lojas ção destrói as matas, muitas to poderá ser feita. Essa forma que sabia que era uma forma Para divulgar o plantio e o nicípio de Eldorado, tem con-
próprias para a comercializa- vezes próximas aos rios, que de reprodução gera verdadei- também de recuperar áreas. consumo consciente, Ferraz dições favoráveis de solo e cli-
ção do seu produto em Cam- elas teriam também a função ras touceiras, que lembram Fizemos um estudo e desco- decidiu abrir as lojas para ven- ma para a produção do palmi-
pinas, o agricultor detectou, de proteger do assoreamento. moitas de bananeira, planta bri que a minha propriedade der o produto. Até 2008, ele to e é a mais carente do Esta-
além de um negócio rentável, O palmito do tipo pupu- que também se reproduz da rural, no Vale do Ribeira, era apenas fornecia para a indús- do, o governo federal criou vá-
um caminho para ajudar na nha, produzido por Ferraz, é mesma forma. A terceira van- uma área devastada de Mata tria. A partir de então, o agri- rios programas, entre eles, li-
recuperação de áreas degra- uma das alternativas divulga- tagem do pupunha Atlântica. Com a cultor entrou em contato com nhas de crédito especiais para
dadas. das por institutos de pesqui- é o sabor: tem plantação, tudo várias empresas especializa- quem quer plantar pupunha
Ferraz nasceu na zona ru- sa, como o Agronômico (IAC), paladar mais está verde, pois o das na conserva de palmitos na área, com vantagens para
ral no Ceará e por lá viveu até de Campinas, para resolver acentuado e é pupunha forma do Vale do Ribeira e se tornou quem tem propriedades de
os 10 anos de idade. Depois, a vários impasses. A primeira o tipo preferi- uma verdadeira revendedor, com lojas no Ta- até dois hectares. “A região es-
família se mudou para o Vale vantagem é que o pupunha é do dos che- mata. Além quaral, em Campinas, cidade tá sendo redescoberta e de for-
do Ribeira, na região Sul do Es- apropriado para o cultivo na fes de cozi- disso, decidi onde mora. A venda ocorre no ma ecologicamente correta. O
tado de São Paulo, onde hoje lavoura. Enquanto um exem- nha. Em plantar juça- atacado e no varejo. Os preços progresso está chegando ver-
está a área de cultivo do palmi- plar de açaí ou de juçara leva termos nu- ra na área são competitivos aos pratica- de na região”, conta Ferraz. O
to. Embora tenha seguido o até uma década para atingir o tricionais, próxima aos dos em supermercados. palmito pupunha é uma boa
caminho do Direito e se torna- ponto de corte para extração é fonte de rios para aju- “Cada vez mais, as pessoas alternativa também para pe-
do funcionário público da Re- do palmito, o pupunha adqui- proteínas, dar a formar com um nível de informação quenos produtores. Como ele
ceita Federal até se aposentar, re o tamanho adequado em fibras, fós- a mata ci- maior estão preocupadas em não escurece após o corte, ao
ele diz que o tempo que viveu apenas 18 meses. “Ninguém foro, ferro liar”, conta. conhecer a origem daquilo contrário de outras varieda-
na roça foi suficiente “para consegue, pelos custos e pela e cálcio. A extra- que levam para casa e conso- des, pode ser vendido in natu-
deixar, no sangue, marcas de pouca rentabilidade que te- O inte- ção de juça- mem. É o caso do palmito. Te- ra ou passar apenas por pro-
interesse pelo cultivo da ter- ria, manter uma lavoura de resse de ra e de açaí é nho recebido nas lojas pes- cessos simplificados de con-
ra”. Aos 77 anos, já teve planta- açaí ou de juçara. A pessoa te- Ferraz pe- proibida no soas preocupadas em saber servação.
ções de banana e hortaliças e, ria de plantar, esperar dez la planta- Brasil. “Mas se, ao comer, estão ou não co- Cada hectare de terra pode
desde 1998, se especializou, anos, cortar a palmeira, ex- ção ecolo- falta muita laborando com a devastação servir de solo para 5 mil mu-
com pesquisas e cursos, ao trair o palmito e começar tu- gicamente conscientiza- de matas”, diz. Nas lojas, tam- das de pupunha. Esse valor
cultivo do palmito. do de novo. Não compensa”, correta sur- ção. O palmi- bém estão disponíveis, sob en- pode variar, de acordo com o
Até o início da década de explica Ferraz. giu a par- to é valoriza- comenda, o palmito in natu- tamanho de palmito que se
1990, a iguaria era extraída de Outra vantagem do pupu- tir de pa- do na cozi- ra, demanda principalmente pretende atingir. Um produto
palmeiras como a juçara e o nha é que, ao contrário dos lestras e nha, mas de restaurantes e chefes de al- final mais grosso exige espaça-
açaí, respectivamente, nativas outros tipos, que só se repro- cursos fei- muita gente ta gastronomia, e ainda mu- mento maior entre as plantas
da Amazônia e da Mata Atlân- duzem por meio de sementes, tos na Coor- não tem no- das da planta. A ideia é expan- para que o caule possa ser ex-
tica. O problema é que essas ele se prolifera por meio do denadoria de As- ção da destrui- dir a rede e instalar outras lo- pandir.