O documento relata as dificuldades enfrentadas por pessoas transgênero no mercado de trabalho no Brasil, apesar de muitas terem formação universitária. Ele descreve histórias de indivíduos trans que sofreram preconceito na família e na escola, o que os levou a abandonar os estudos ou a trabalhar em profissões pouco qualificadas. Também critica a falta de apoio e dados concretos de órgãos públicos sobre a inclusão de transgêneros.
Jornal-laboratório produzido por alunos de Jornalismo da Universidade Cruzeiro do Sul
1. Jornal-laboratório produzido pelos alunos de Jornalismo da Universidade Cruzeiro do Sul -Ano X - Número 34 -Agosto de 2009
Arquivo
Nacional/Correio
da
Manhã
Brasil sofre
reflexos da
ditadura
Nos 30 anos da Lei de Anistia, marco do pro-
cesso de redemocratização do Brasil, em agosto
de 1979, o jornal Cidadão reúne histórias de so-
breviventes da ditadura militar (1964-1985). Gen-
te como o advogado Alcídio Boano, de 81 anos,
que vive em São Paulo e se diz o “orgulho” dos
filhos e netos. Ou o aposentado Michéas Almeida,
o “Zezinho do Araguaia”, de 71 anos, morador de
Goiás que roda o país relatando como ele e outras
centenas de brasileiros resistiram ao regime. Foram
perseguidos, censurados, torturados. Organizações
de direitos humanos estimam 426 mortos e desa-
parecidos, mas ainda não se sabe o total de vítimas
porque os arquivos militares permanecem inacessí-
veis. O alijamento político-ideológico inspira esta
edição a reportar outras formas de exclusão na so-
ciedade contemporânea. Páginas 6 e 7
Teatro desperta
o senso crítico
Uma obra de arte permite muitas
leituras. Estudantes de Jornalismo da
Universidade Cruzeiro do Sul assis-
tem ao espetáculo teatral “Eldorado”
e desenvolvem variados pontos de
vistas sobre ele. O trabalho solo con-
cebido e interpretado por Eduardo
Okamoto narra a travessia de um
sertanejo cego em busca de sen-
tidos para a vida. A musa que
o acompanha na aventura
é uma rabeca. A música
o levará ao longe em
sua jornada inte-
rior. Páginas
10 e 11
Alexandre
Caetano/Divulgação
Aceitar o diferente é uma das
principais condições para se vi-
ver em comunidade. Conheça
histórias de pessoas que são dis-
criminadas por causa da opção
sexual, por não saber ler ou por
saber demais, os “superdota-
dos”. A auxiliar bancária Nedi-
Habilidosos, analfabetos,
transgêneros e excluídos
na Silva vive situação semelhan-
te. Ela é cega e usuária de um
programa público que escreve
cartas e recebe ajuda dos volun-
tários para estudar exercícios de
matemática. “O problema não
é não enxergar, mas sim não
ver”, diz. Páginas 2, 3 e 4
Índios, caboclos e ribeirinhos
fazem parte do povo da Ama-
zônia. Apesar de comporem
uma população de cerca de 23
milhões, eles vivemà margemem
termos de cidadania. Fala-se
muito da região brasileira sob a
ótica ambiental, mas poucosefaz
Povo da floresta fica à
margem na Amazônia
pelos que a habitam. As pessoas
estão sujeitas a duas violências: a
humana, dos grileiros e muitos
religiosos que manipulam situa-
ções a seu favor, e a natural, pois
a floresta também lhes é hostil.
Há variedade de malárias, jaca-
rés e piranhas. Página 12
Joel
Hayashi
2.
3. Transgêneros usam talento contra estigma
COMPORTAMENTO
PÁGINA 2 - AGOSTO DE 2009
O mercadode trabalhoestá difícil
para qualquer cidadão. Imagine para
as pessoas “transgênero”. Elas são
transexuais, drag queens e travestis em
busca de uma oportunidade digna na
sua área de formação.
Na maioria dos casos o precon-
ceito começa na infância quando são
descobertos os primeiros indícios de
que algo diferente acontece. Diferen-
te, sim, porém nada a ver com aber-
ração ou doença como muitos pen-
sam ou dizem.
A drag queen, estilista e maquia-
dora Robytt Moon, faculdade incom-
pleta de educação física, largou os es-
tudos em Presidente Prudente (SP)
porque estava descontente. “O pre-
conceito está inserido nas pessoas e
nos próprios gays. Não tenho inte-
resse de voltar a estudar. Ganho mais
como drag queen e pretendo abrir mi-
nha loja”, diz. Ela vive afastada da
família que não aceita seu trabalho e
seu estilo de vida.
Em geral, a falta de apoio fami-
liar é outro fator decisivo para o aban-
dono dos estudos. A travesti Thara
Wells – entrevistadora e escritora bis-
sexta em Sorocaba (SP) – sobrevive
da prostituição. Ela temsegundo grau
completo, profissionalizante técnico
em contabilidade, fala três idiomas e
fez alguns cursos, como edição emví-
deo, técnico em escritório e adminis-
tração de empresas. Poderia estar em
qualqueruniversidadee,inclusive,con-
seguir bolsa integral.
“Quando estudava eu era muito
feminina, mas ainda não era travesti
fisicamente. Mesmo assim, o precon-
ceito vinha de todos os lados. Tinha
trabalho em gru-
po e ninguém me
queria por moti-
vosde queimação
de filme [vergo-
nha]. Na hora do
intervalo vinham
agressões verbais
e morais. O pre-
conceito talvez
seja um defeito de fábrica do ser hu-
mano”, afirma Thara.
“Todos os gays aspiram ao res-
peito e à aceitação hetero, mas, se nós
mesmos não nos suportamos no
sentido de que gay não gosta de tran-
sex, que não gosta de sapata [lésbi-
ca], que não gosta de drag queen, que
não gosta da pintosa. Como quere-
mos que os heteros nos aceitem e
respeitem, se internamente não nos
suportamos?”, questiona Thara.
Algunsórgãospúblicosesclarecem
aspessoas“transgêneros”,comoaCo-
ordenadoria de Assuntos da Diversi-
dade Sexual (Cads) e o Centro de Re-
ferência da Diversidade (CRD).
A Cads tem o objetivo de pro-
mover, estimular e divulgar toda
ação que combata a homofobia, as-
sim como criar um espaço de comu-
nicação com a sociedade como um
todo. O CRD oferece oficinasprofis-
sionalizantes,
atendimento psi-
cológico e social,
espaço de conve-
niência, orienta-
ção sobre saúde e
aconselhamento
jurídico.
Ambos são
ligadosàPrefeitu-
ra de São Paulo e estão localizados na
zona central da cidade. Apesar de re-
cém criados, cumprem um papel im-
portante. Entretanto, ao serem ques-
tionados sobre dados reais quanto ao
mercado de trabalho, esquivam-se por
meio de gerúndios com um “estarei
te enviando ou conversando sobre o
assunto após o feriado”. A reporta-
gem procurou as duas entidades du-
rante duas semanas, mas não obteve
mais informações.
A maior parte das transgêneros
trabalha como profissionais da noite.
DeacordocomaArticulaçãoNacional
das Travestis e Transexuais (Antra),
cerca de 90% delas estão inseridas na
prostituição.
A drag queen e maquiadora Llady
Metteora, de Tatuí, na região de Soro-
caba,nível técnicoemnutrição e dieté-
tica, trabalhou por algum tempo nes-
sa área e não gostou.
“Desde criança eu já era diferen-
te dos meus amiguinhos na escola.
Era um menino afeminado, mas
creio que fui privilegiado aqui no
interior, pois as pessoas são mais
tolerantes. Atualmente como ma-
quiadora tenho mais destaque e é o
que amo fazer. No Brasil não existe
graduação nessa área, como na Eu-
ropa e nos EUA, mas se tivesse que
escolher outra área eu faria Letras”,
diz Llady.
Entre os brasileiros, as transgê-
neros compõem a categoria que mais
sofre preconceito na própria comu-
nidade LGBTT (lésbicas, gays, bisse-
xuais, travestis e transgêneros). For-
mam-se poucas profissionais nas
universidades e, mesmo com o di-
ploma nas mãos, não conseguem
atuar no mercado de trabalho para o
qual estudaram.
Para elas, nem a universidade é garantia de boa colocação no mercado de trabalho
Acácio Brindo
EDITORIAL
Exclusão
pelo avesso
A ditadura militar que calou e san-
grou o Brasil entre 1964 e 1985 legou
um dos períodos mais tristes da histó-
ria de um país que já carrega sequelas
dos períodos de colonização e de escravi-
dão, para citar duas manchas indelé-
veis. Ao retratar aqueles 21 anos de
prisão, tortura e censura, aproveitamos
para expor outras formas de exclusão
nos dias de hoje.
No dicionário, a palavra exclusão
ganha definições como: ato de ser incom-
patível com, pôr de lado, eliminar, aban-
donar. Em uma análise mais apurada
identificamos uma referência aos seres
de uma comunidade, a relação com o ou-
tro. Afinal, o incluído é incompatível
com quem? Eliminado de onde? Quem o
abandona? Os excluídos, portanto, são
parte da sociedade e não um grupo isola-
do como imaginamos em um primeiro
momento.
Identificar esse fato e como ele se dá
é um dos passos para compreender o qua-
dro social contemporâneo. Nesta edição
do jornal-laboratório Cidadão, uma
produção dos estudantes de Jornalismo
da Universidade Cruzeiro do Sul, tra-
balharemos o tema da exclusão por ân-
gulos em que ela geralmente não é reco-
nhecida. Esse olhar passa, por exemplo,
pelos marginalizados por meio da pala-
vra, os chamados analfabetos ou semia-
nalfabetos, ou pelo policial militar que
não pode voltar para a casa fardado.
Poucos fazem questão de abrir os
olhos para enxergá-los, mas o fato é que
esses brasileiros existem. Grande parte
da população não usufrui seus direitos
de cidadania e essa problemática se refle-
te na sociedade como um todo. É um
ciclo do qual quem se considera integra-
do, hoje, amanhã será parte dos excluí-
dos de cabelos brancos.
Nosso objetivo é revelar as outras
facetas da exclusão. Afinal, reconhecer
é o primeiro passo para mudar, para
transformar algo. Do contrário, paira a
inércia, o comodismo. Com a palavra, a
consciência de cada um.
Jornal-laboratório do
Curso de Comunicação Social
(Jornalismo)
da Universidade Cruzeiro do Sul
Ano X - Número 34
Agosto de 2009
Tiragem: 3 mil exemplares
Telefone para contato:
(11) 2037-5706
Impressão:
Jornal Última Hora do ABC
(11) 4226-7272
Reitora
Sueli Cristina Marquesi
Pró-reitor de Graduação
Carlos Augusto Baptista de Andrade
Pró-reitor de Pós-graduação e
Pesquisa
Luiz Henrique Amaral
Pró-reitor de Extensão e
Assuntos Comunitários
Renato Padovese
Coordenador do Curso de
Comunicação Social
Carlos Barros Monteiro
Professores-orientadores
Dirceu Roque de Sousa
e Valmir Santos
Participaram desta edição
André Atti, André Polone,
David Santana,
Dayse Estevam, Felipe Gueller e
Natalia Bittencourt.
Robytt Moon Thara Wells Llady Metteora
Fotos Divulgação
Muita gente rejeita ser atendida
por uma médica transexual, mas ado-
raver namadrugadadeCarnaval obai-
le Scala Gay, que acontece no Rio de
Janeiro. A sociedade costuma rir da
diferençae não aaceita com respeitoe
dignidade. Ao exibir programas des-
se tipo, a televisão também colabora
para a situação de exclusão e não de
aceitação,como deveria ser.
Não existem documentários ou
filmes na programação aberta, e os
poucos, feitos geralmente no exte-
rior, como Transamerica (2005) – Glo-
bo de Ouro de melhor atriz para Feli-
city Huffman – não passam na “Tela
Quente” da Rede Globo. Transamerica
ficou pouquíssimo tempo em cartaz
nos cinemas de São Paulo.
Recentemente, o filme Brokeback
Mountain (2005), do diretor Ang Lee,
foi outro marco ao conseguir romper
O circo midiático faz a sua parte
as barreiras de Hollywood.
Na televisão, desde os anos 70, os
programas de auditório como Chacri-
nha, Silvio Santos ou Bolinha tenta-
vam de alguma forma dar visibilidade
ao grupo e traziam travestis e transe-
xuais em quadros de dublagem.
“A luz no fim do túnel poderia
ser as leis mais rígidas de inclusão so-
cial, porém vejamos o exemplo das
cotas para negros que geram polêmi-
cas e controvérsias”, diz Llady Met-
teora. “O que concluímos disso é que
antes de tudo o nosso pensamento
deve mudar. Devemos parar com a
exclusão velada e compreendermos
que, independentemente de usar
saias, passar batom ou vestir unifor-
me militar, as transgêneros são seres
humanos e têm direitos que não es-
tão sendo assegurados pela Consti-
tuição”, afirma Thara Wells. (A.B.)
Transgênero – Pessoa cuja expres-
são de gênero não corresponde ao
papel social atribuído ao gênero de
nascimento. O termo também tem
sidoutilizadopara definirpessoaque
está constantemente em trânsito en-
tre um gênero e outro.
Transexual –Pessoaque nasce com
um sexo, mas tem identificação ex-
cessiva com o sexo oposto. Nasce
homem, mas tem cabeça de mulher
ese sentemulher,evice-versa.Otran-
sexual rejeita o próprio corpo e seu
sexo biológico.Necessita de uma ci-
rurgia de redesignação sexual.
Travesti – Pessoa que tem as duas
identidades de gênero: masculina e
feminina. Não há desejo de mudan-
ça de sexo biológico.
Drag queen ou transformista –
Pessoa que se apresentae fazperfor-
mances com fantasias e maquiagens
exageradas.Não éassim24 horaspor
dia, encarando isso mais como tra-
balho ou diversão.
Cads – Coordenadoria de Assun-
tos da Diversidade Sexual.
CRD –Centrode Referência daDi-
versidade.
LGBTT – Lésbicas, gays, bis-
sexuais, travestis e transgêneros.
APOGLBT-A AssociaçãodaPara-
da do Orgulho de Gays, Lésbicas,
Bissexuais e Travestis e Transexuais
foi fundada em 1999, como uma
organização em defesa da diversida-
de sexual. Sua missão é lutar por
uma sociedade mais justa e inclusi-
va,quereconheça direitosiguaispara
todos. Para garantir o cumprimento
do estatuto, há um conselho de só-
ciosfundadores;um conselhode éti-
ca norteia as decisões da diretoria e
outro, fiscal, examina suas ações.
“As transgêneros são
seres humanos e têm
direitos que não estão
sendo assegurados
pela Constituição”
Thara Wells
Quem é quem
4.
5. AGOSTO DE 2009 - PÁGINA 3
VOLUNTARIADO
A cega, a prova de matemática,
o gravador e a voz da voluntária
Lidiana Dourado
Você tem uma caneta?
INCLUSÃO - Simone auxilia a bancária Nedina, deficiente visual
“Acho que estou no caminho cer-
to”, diz Nedina Silva, 45 anos, auxi-
liarbancária, ao iniciar seu atendimen-
to no postodoEscreve Cartas emIta-
quera, Zona Leste. Ela, deficiente vi-
sual,chega com um sorriso no rosto e
logo demonstra desenvoltura ao falar
com as voluntárias. Gravador numa
mão e muitas folhas na outra, explica
que precisa daleiturados exercíciosde
matemáticaparaestudar paraumapro-
va docurso de qualificação fornecido
porumauniversidade parceiradoban-
co em que trabalha e que decidirá seu
futuro profissional: seu contrato é re-
novável deacordocomodesempenho
conquistadono curso e no dia a dia.
Logo, nota-se a mobilização dos
voluntários e do gerente da unidade,
Marcelo Ribeiro Pedrosa, em dispo-
nibilizar uma sala reservada para o
melhor atendimento de Nedina. As
voluntárias se preocupam em ler as
equações e seus enunciados de forma
clarapara ofácil entendimento da goi-
ana simpática que não perde a opor-
tunidade de agradecer pelo serviço.
Às 11 horas o expediente das vo-
luntárias se encerra e uma nova cola-
boradora inicia seu turno. A repórter
divide a tarefacoma voluntária Simo-
ne Santiago, que demonstramuitaale-
gria em colaborar. Nedina sinaliza se
o ritmo de leitura está adequado às
suas necessidades. Manuseia o grava-
dor com uma concentração invejável.
Ela, que mora em uma casa assisten-
cial, conta que já precisou pedir ajuda
na rua para uma pessoa desconhecida
ler seu material de estudo.
Muito ativa e focada em seu de-
senvolvimento profissional, a estu-
dante conta que após a gravação do
conteúdo ainda terá de passar os da-
dos para o braile, um sistema de leitu-
ra desenvolvido para deficientes vi-
suais e cujas letras e números são in-
dicados por pontos em relevo identi-
ficados por meio do tato. Seus dedos
são cortados devido à atividade que é
feita com o uso de reglete, material
específicopara aescritabraile. É cons-
tituído essencialmente de duas placas
de metal e plástico, fixas em um lado
com dobradiças, de modo a permitir
a introdução do papel. Ponto por
ponto, as pessoas cegas, com punção,
formam o braile. “O problema não é
não enxergar, mas sim não ver”, diz.
Ao final brinda a repórter e a vo-
luntária com um abraço apertado e
emociona com sua força de vontade
em superar dificuldades que, para ela,
parecem nada. “Coloca aí: obrigada
Simone,agradeçoao programaEscre-
ve Cartas e semana que vem eu volto
porque ainda tenho muito trabalho
pelafrente.” (A.P.M.)
Um senhor se aproxima, pede
uma caneta e senta-se à mesa. Como
se esperasse por uma resposta, levan-
ta a cabeça e observa o horizonte. A
mulher sentada a sua frente oferece
ajuda.Ele, sem pestanejar, entregaca-
neta e papel com um sorriso estam-
pado no rosto.
Essa tem sido a rotina de alguns
voluntáriosdoprojeto Escreve Cartas.
O programa foi criado pelo governo
paulista em 2001, inspirado em uma
personagemdofilme “Central doBra-
sil”. Dora, interpretada por Fernanda
Montenegro, era uma mulher que es-
creviacartasparaanalfabetosnaCentral
doBrasil,estaçãoferroviáriacarioca.Na
ficção,oserviçoeracobrado.Aqui,não,
o atendimento é gratuito.
Atualmente 284 voluntários de-
dicam duas horas semanais do seu
tempo para escrever cartas para cida-
dãos que têm dificuldades em ler ou
escrever. Nunca foi difícil atrair cola-
boradores para a proposta de ajudar o
outro. No entanto,o usuário tem pro-
curado o serviço mais para preencher
formulários justamente do próprio
Poupatempo. A natureza original do
trabalho, explícita no próprio nome
do programa, tem ficado em segun-
do plano.
Há algumas décadas ser alfabeti-
zado definia que tipo de pessoa você
era. Para votar era preciso saber ler e
escrever. Segundo o jurista e escritor
Rui Barbosa (nascido em novembro
de 1849 –falecidoemmarço de 1923),
por exemplo, essaexigência era justae
libertadora. E em seu entendimento
seria coerente excluir os analfabetos
umavez que eles deveriam sereduca-
dos para usufruir de seus direitos.
Atualmente, qualquer pessoa
maior de 16 anos tem direito ao voto.
Porém, em 2007, o Instituto Brasilei-
ro de Geografia e Estatística (IBGE)
revelou a existência de 14 milhões de
analfabetos no país.
Saber ler e escrever pode não ser
mais um critério para definir votos,
masainda é umdetalhe relevante.Pois
uma pessoa incapaz de escrever uma
carta não sofre apenascom a exclusão
do dia a dia, como pegar ônibus, pa-
gar contas, ler uma placa. Sofre tam-
bémpor nãopoder exercer seus direi-
tos como gostaria.
Programa público ajuda
analfabetos a enviar cartas
No serviço do Poupatempo, pedidos vão de juras de
amor a palavras esperançosas de participação na TV
Ana Paula Monteiro
Patrícia, Simone, Izabel, Cinthia...
Sabe o que essas pessoas têm em co-
mum? A vontade de ser útil à socie-
dade e a coragem de agir para realizar
esse objetivo. Todas elas dedicam
duas horas de seu tempo, uma vez
por semana, para ser voluntárias no
projeto Escreve Cartas, voltado aos
cidadãos com dificuldades em ler e
escrever, em comunicar-se por meio
de cartas.
A cada dia uma nova surpresa.
Nos postos de atendimento do Pou-
patempo, nas Zonas Leste e Sul da
cidade,além de Guarulhos e São Ber-
nardo do Campo, os voluntários con-
vivem com os mais diferentes pedi-
dos: correspondências comerciais, re-
clamações e pedidos ao presidente
Lula, cartas afetivas a parentes distan-
tes, filhos presos etc. Mas as campeãs
são as missivas destinadas a progra-
mas de televisão, como os dos apre-
sentadores Gugu Liberato, Netinho
de Paula e Silvio Santos.
Uma das voluntárias conta que foi
procuradaparaescrever umacartades-
SOLIDARIEDADE - Voluntárias do programa Escreve Cartas na unidade Poupatempo de Itaquera
Ajudar ou ser ajudado? Infor-
mar ou ser informado? Será que de-
veríamos assumir a responsabilida-
de de dar aquilo que todas as pes-
soas devem ter, já que, por lei, todo
cidadão tem direito à educação?
O programa Escreve Cartas dá
assistência a pessoas que tenham di-
ficuldades para ler ou escrever. Se-
tenta e oito voluntários do Poupa-
tempo de Itaquera dedicam-se a um
propósito: dar aos cidadãos a opor-
tunidade de se expressar.
Porém, o projeto tem perdido
suas características, sendo procura-
do na maioria das vezes somente
Paradoxo das boas intenções
para o preenchimento de formulá-
rios do próprio Poupatempo. De
acordo com a assessoria do progra-
ma, o projeto é divulgado em todos
os grandes veículos de comunicação
e jornais de bairro da Capital e da
Grande São Paulo. No entanto, essa
difusão do serviço não tem atingido
o público desejado.
Surge então um questionamento:
se o projeto é de fato divulgado e
ampliado,chegandoinclusive aoutras
regiões da Grande São Paulo, como
Guarulhos e São Bernardo do Cam-
po, por que a procura da população
tem sido para outros fins que não o
deescrevercartas?
O Cidadão pôde constatar que
o projeto em sua essência é valido
e gratificante para aqueles que o fa-
zem, mas isso não tem sido o su-
ficiente para tornar melhor a vida
daqueles que o recebem. Afinal de
contas, como um analfabeto po-
deria ler no jornal, revista ou inter-
net umareportagem que oferece as-
sistência a pessoas com dificulda-
de para redigir? Ou, quantas pes-
soas com baixo grau de escolarida-
de têm acesso a programas educa-
tivos? Que tal inovar e usar um
veículo de comunicação simples e
direto como o rádio ou estimular
oimbatível boca aboca? (L.D.)
tinada a Gugu, na qual uma dona de
casa de baixarendapede umareforma
de sua casa devido a problemas de
mofo que afetam sua saúde. A volun-
tária escreve a carta e em seguida lê o
teor para que a senhora confirme se o
conteúdo está exatamente como soli-
citado. Enquanto as palavras são li-
das, lágrimas rolam pelo rosto da
mulher que, por
meio do texto, vê
sua situação ser
retratada como
um filme e se co-
move com a pró-
pria história.
Muitos enre-
dos são contados
a esses voluntá-
rios preparados para se manter neu-
trosdurante a redação da carta e prati-
car sigilo absoluto quanto à identida-
de dos cidadãos que procuram o ser-
viço. Além de redigir e ler, eles tam-
bém preenchem formulários e elabo-
ram currículos. O trabalho exige boa
caligrafiaededicação.Porisso,recebem
treinamento de oito horas, são orien-
tados inclusive a não interferir no re-
gionalismo, acolher expressões como
“painho” ou “padinho”, comuns no
Nordeste. A ideia é profissionalizar o
voluntariado e conscientizá-lo quan-
to à importância da atividade para a
sociedade.
O programa Escreve Cartas foi
criado pelo Governo do Estado de
São Paulo em novembro de 2001,
inspirado em
um personagem
do filme “Cen-
tral do Brasil”
(1998), dirigido
por Walter Salles.
Oanalfabetis-
mo no Brasil atin-
ge hoje 7,5% da
população, uma
herança do passado de escravidão que
marca a história do país. Quem não
sabe ler, escrevere interpretar as pala-
vras e textos faz parte de um grande
grupode pessoas,asexcluídaspelafalta
de compreensão da palavra. Existem
diferentes iniciativas com o objetivo
de incluiresse contingente àsociedade
e a divulgação desses serviços contri-
bui para mantê-lo ativo.
Os voluntários recebem
treinamento específico
e são orientados a não
interferir no regionalismo
das pessoas.
Lidiana Dourado
Ana
Paula
Monteiro
6.
7. PÁGINA 4 - AGOSTO DE 2009 SOCIEDADE
Eles são excluídos porque sabem demais
Conheça histórias de “superdotados” vítimas de discriminação justamente porque são demasiado habilidosos
Cibele Sugano
Thiago Batista
Vanessa Lira
Ele é formado em administração,
fala inglês, alemão e espanhol com
fluência.Nãoteve dificuldadesparaar-
ranjar empregos, geralmente em em-
presas multinacionais. Possui imóvel
e carro próprio, mas, apesar do currí-
culo, M.L.D.L., 34 anos, morador da
Zona Norte de São Paulo, é hoje um
homem frustrado. “Sinto-me deslo-
cado.Parece que nãome encontro,que
não sou daqui.”
O que deveria ser um dom torna-
se um fardo para muitos alto habili-
dosos, popularmente conhecidos
como “superdotados”. Como eles
aprendem muito rápido, as atividades
que nãolhes sãosuficientemente desa-
fiadorastornam-se monótonas.Resul-
tado: acabam sendo apáticos a tudo.
Ou, ao contrário, muito ativos, ansio-
sos e, por vezes, até nervosos com as
pessoascom as quais convivem.
A gestora administrativa da As-
sociação para Altos Habilidosos e
Superdotados
em São Paulo
(Apahsd), Ga-
briela Toscanini,
28 anos, diz que
muitas escolas
ainda não sabem
lidar com isso.
“Os professores
achamque acrian-
ça é hiperativa, possui Transtorno de
Déficit de Atenção, é rebelde. Muitas
inclusive acabam sendo medicadas
quando na verdade a causa é outra”,
afirma.
Foi o que aconteceu com o estu-
dante Rafael So-
linsk, 21 anos,
morador de Vali-
nhos, no interior
paulista, que teve
diversos proble-
mas emocionais.
Desde os 5 anos
elecomeçou ade-
monstrar altas habilidades em mate-
mática, física e química,desenvolven-
do-as melhor do que as demais áreas.
“Tive vários problemas de caráter
emocional e psicológico, mas todos
ligados à convivência social. Sempre
fui excluído de jogos esportivos, nun-
ca fui bom nisso, digamos assim. Já
fui deixado de lado em formaturas e
convite de festas só por ser alto habi-
lidoso”, afirma.
O estudante, que hoje diz saber
lidar melhor consigo mesmo, afirma
que osrelacionamentos afetivoso aju-
daram de forma significativa. “Minha
namorada, a Caroline, teve um papel
insubstituível. Fez-me enxergar atra-
vés dos algoritmos e ver o coração.”
A psicóloga do Programa Objeti-
vo de Incentivo ao Talento (Poit),
Christianne Vita, diz que o desenvol-
vimento racional
deve vir sempre
acompanhado de
saúde emocional.
Os dois se com-
pletameo altoha-
bilidoso precisa
conviver num
ambiente que es-
DESLOCADO - Mesmo formado em administração e empregado, M.L.D.L. sente-se um adulto frustrado
Cibele Sugano
timule a ambos equilibradamente. O
Poit é um curso extracurricular para
alunos com habilidades especiais que
buscavencera barreiradopreconceito
com a sociedade. Para a psicóloga é
importante que não haja a segregação
do alto habilidoso. “Já trabalhamos
comaulasseparadas dasoutrasturmas,
mas não obtivemos sucesso. O aluno
comaltahabilidade necessitadaintera-
ção com os demais.” Por esse motivo,
o curso não substitui a escola.
Umaspecto essencial é que ospais
saibam identificar se o filho é um alto
habilidoso. A partir daí, deve-se enca-
minhá-lo a espa-
çosque lidarãode
maneira correta
para que seu po-
tencial seja desen-
volvido. Gabriela
diz que muitos
pais não aguen-
tam o filho que
Einstein e Leonardo da Vinci
também foram discriminados
Jorge Gomes
Atravésdos séculos
algumas pessoas se
destacam por causa de
sua alta capacidade in-
telectual. Esses indiví-
duos diferenciados são
denominados alto ha-
bilidosos. A história da
humanidade reserva al-
guns bons exemplos a
serem citados.
Um deles é Leonardo, nascido em
1452 na localidade de Vinci, Itália.
Ele foi um dos maiores pintores do
Renascimento e possivelmente seu
maior gênio, por ser também anato-
mista, engenheiro, matemático, mú-
sico, naturalista, arquiteto e escultor.
Em 1506 trabalhou principalmente
em Florença, onde possivelmente te-
nha pintado sua obra
mais famosa: Mona
Lisa.Mas,apesar de ser
genial em várias áreas,
Da Vinci não teve edu-
cação formal e nem sa-
bia latim, sendo consi-
derado por muitos um
iletrado e até inculto.
Morreu em 1519.
Outra pessoa de
múltiplas habilidades
foi Albert Einstein
(1879-1955). Este ale-
mão foi físico e mate-
mático e até hoje é co-
nhecido por sua ge-
nialidade. Desde a in-
fância, Einstein mos-
trou-se diferenciado
em relação às outras
crianças. Em vez de
praticar jogos infantis,
preferiaconstruircom-
plicadas estruturas
com cubos de madei-
rae grandes casteloscomcartas de ba-
ralho, alguns de até 14 andares. Aos 7
anos ele demonstrou o Teorema de
Pitágoras, para surpresade seu tio,que
dias antes lhe ensinara os fundamen-
tos da geometria.
Porém, Einstein era um fracasso
paradisciplinasque exigiamcapacida-
de de memorização, como geografiae
história. Em conse-
quênciadessas dificul-
dades, ele se desinte-
ressava por tais aulas
–oque provocavarea-
ções violentas de seus
professores. Um deles
chegou inclusive a di-
zer que Einstein era
um péssimo exemplo
para os outros estu-
dantese que nunca se-
ria alguém na vida.
Internet
Internet
O físico Albert Einstein
O pintor Da Vinci
Núcleos do
MEC atuam
desde 2005
Muitos casos de alta habilida-
de só são descobertos quando a
criançaentra na escola. Odescom-
passo com o resto da turma torna-
se latente. O Ministério da Educa-
ção (MEC) diz que os alto habili-
dosos são um foco específico da
SecretariadeEducaçãoEspecialque
tem realizado cursos para profes-
sores e gestores. Além disso, há os
Núcleos de Atividades para Altas
Habilidades/Superdotação,instala-
dos a partir de 2005 em todas as
capitais, segundo a pasta, com o
fim de oferecer atividades para o
aluno, além de capacitar responsá-
veis e professores. Todas essas ini-
ciativasvisama educaçãoinclusiva.
Aliás, não se usa mais o termo
“superdotado” justamente por car-
regar em si essa conotação exclu-
dente. Quem é “super” não é nor-
mal. Já o “alto habilidoso” sabe
fazer algo muito bem e não tem
demérito algum em ser o que mui-
tos gostariam: um talento nato.
fala, entende e questiona demais. Há
casosde criançasque se tornamagres-
sivas a ponto de se mutilarem ou até
cometerem suicídio.
A adolescente L.B.B., 16 anos,
moradora da Zona Oeste, teve uma
vida estudantil complicada. Foi “con-
vidada” a sair da escola por sua extre-
ma agitação: aos 6 anos liderou um
movimento na classe; aos 8, negou-se
afazer umaprova,alegandoque apro-
fessora sabia que ela já tinha entendi-
do tudo. A mãe, Rosemary, trocou a
menina de escolas dez vezes. Como
resultado, L.B.B. isolava-se. Foi só por
meio de terapia com profissionais es-
pecializadosemalta habilidade quesua
inteligênciapassou a caminhar aolado
de uma vida emocional equilibrada.
Mitos e verdades na vida do alto habilidoso
intelecto. A psicóloga diz que o adul-
to alto habilidoso pode tornar-se
frustrado se não conseguir identifi-
car e usar todo o seu potencial.
Existe também o mito de que
as pessoas que tem alta habilidade
na área intelectual são antissociais.
Porém, a gestora da Apahsd, Ga-
Christianne: espaço desafiador
Thiago
Dias
Gabriela: “Habilidosos têm direitos”
Cibele
Sugano
Acredita-se que o alto
habilidoso seja bom em
tudo, o que não é verdade.
Ele pode se destacar em al-
gumas áreas e ser completa-
mente normal ou fraco
mesmo em outras. É co-
mum casos de pessoas que
se destacam na intelectuali-
dade, mas, enquanto prati-
cante de esportes, não acer-
tam um movimento. A psi-
cóloga Christianne Vita diz
que são oito as áreas de ha-
bilidade: intelectual; verbal
ou linguística; lógico-mate-
mática e científica;criativida-
de; motivacional; liderança;
psicomotora e musical. No
caso de crianças, essas habi-
lidades podem ser identificadas com
testes específicos.
Mas a genialidade nem sempre
será identificada e exercida com todo
vigor. No caso de adultos, não há
testes que identifiquem essas habili-
dades, com exceção do de quociente
de inteligência (Q.I.) que só atinge o
briela Toscanini, relata que há alu-
nos comunicativos e sem diferenças
de sociabilidade com outras pes-
soas. Mas a maioria dos casos é de
pessoas que se isolam pelo próprio
fato de serem consideradas diferen-
tes e não, necessariamente, por se-
rem introvertidas. (C.S.)
Há casos de crianças
que se tornam
agressivas a ponto de
se mutilarem ou até
cometerem suicídio
“Tive problemas de
caráter emocional e
psicológico, mas
todos ligados à
convivência social”
Rafael Solinsk
8.
9. Com apenas 2 anos de idade, a
família de Gabriel Vitoir, 8 anos, úni-
co filho, residente em São Paulo, já
notava que havia algo errado com o
menino. “Ele não falava e demorou
muito para começar a andar”, declara
Debora Vitoir, mãe de Gabriel.
O grau de autismo de Gabriel é
leve.Mesmoassim,suafamíliaenfren-
ta o preconceito diariamente. “Muitas
vezes, no ônibus, as pessoas olham
estranhamente e perguntam o moti-
vo de ele descer pela porta da frente.
Ou, quando ele chora e faz algum ba-
rulho diferente, as pessoas ficam in-
comodadas”, comenta Débora, que
confessa ficar indignada com as pes-
soas que não têm respeito pelascrian-
ças com necessidades especiaise com
os adolescentes que parecem não co-
nhecer os princípios da cidadania.
Débora diz que, no início, foi
muito difícil para todos aceitarem a
ideiade que Gabriel precisaria de cui-
dadosespeciais e convivercom opro-
blema.“Primeiramente,rejeitei aideia,
pois é muito difícil saber que um fi-
lho está doente. Procurei fazer mais
exames, mas tudo levava ao mesmo
diagnóstico. Aceitar o problema foi o
mais difícil, e depois ir atrás de solu-
ções. Pesquisei muito sobre o assunto,
novidades a respeito de tratamentos,
medicações,especialistas”, recorda.
Gabriel é saudável e hoje prati-
Autismo é exercício contínuo de superação
SOLIDARIEDADE - Gabriel, de 8 anos, tem o apoio integral da família
AGOSTO DE 2009 - PÁGINA 5
SAÚDE
ca atividades de uma criança normal,
frequenta escola, está em tratamento
psicoterápico, fazterapia ocupacional
e recebe acompanhamento fonoau-
diológico. Todos os tratamentos e a
escola são custeados pela família, que
tem um gasto mensal de R$ 3.470,00.
Débora lamenta o descaso do go-
verno, porque os autistas com trata-
mentosespecializados podem progre-
dir no aprendizado. “Gabriel, por
exemplo,cadadia descobre uma nova
habilidade, como mascar chiclete, di-
zer ‘oi’ e ‘tchau’ aos familiares e pro-
fessores e ir ao banheiro sozinho, o
que não conseguia antes”, declara sua
mãe. Apenas por intermédio de uma
políticapública de saúde a maioriados
autistas pode receber o tratamento
adequado.
A Prefeitura de São Paulo, por in-
termédio da Secretaria Municipal de
Educação,afirmaque existeminstitui-
ções conveniadas especialmente para
criançascomtranstornos globaismen-
tais, além de serviços com o Centro
de Formação e Acompanhamento à
Inclusão (Cefai), Atuação do Profes-
sor e Acompanhamento à Inclusão
(Paai),Salas de Apoioà Inclusão(Saai)
e Escolas Municipais de Educação
Especial (EMEE).
Outras informações pelo site:
www.portalsme.prefeitura.sp.gov.br.
Arquivo Pessoal
Sexualidade, um tema tabu
Família de Gabriel relata dificuldades com o desrespeito diante das necessidades especiais do outro
Mônica Garcia de Almeida
Talita Dario
Com a dificuldade de estabelecer
relacionamento e até mesmo decifrar
odesejopormeiodefeiçõesedemons-
trar afeto, o autista não perde sua
libido, precisa aprender a controlar
seus instintos e se reeducar para a se-
xualidade.
Quandoalcançama puberdade,os
jovens devem ser orientados, princi-
palmente no que se refere à masturba-
ção, pois os adolescentes portadores
Pais devem ajudar no tratamento
Guilhermo Romero
Jansen Asses
O Cidadão entrevistou a sexólo-
ga e psicóloga Daniela Formiga de
Sousa, especialista em terapia ocupa-
cional, que esclareceu algumas dasdú-
vidas mais frequentes sobre o autis-
mo. Segue abaixo a entrevista.
Cidadão - O que é o autismo?
Daniela - O autismo é um transtorno
congênito que compromete o desenvolvimen-
to do indivíduo. Afeta suas relações sociais
e sua capacidade de comunicação. O autista
possui comportamentos estereotipados e re-
petitivos, seu interesse por atividades é res-
trito e existe uma tendência ao isolamento.
Cidadão - Como o psicólogo pode
ajudar?
Daniela - O psicólogo pode ajudar a mini-
mizar os sintomas e fazer com que a criança
consiga lidar com mais tolerância às ativida-
des que antes lhe pareciam confusas.
Cidadão - Quais são os métodos uti-
lizados no tratamento?
Daniela - É preciso um plano terapêutico
individual, embora o diagnóstico seja o mes-
mo, as dificuldades podem ser diferentes de
acordo com o ambiente que a criança convi-
ve.É definidauma programação diáriapara
estimular estas crianças, visando adquirir
habilidades que tenham funções práticas
(contato social, verbalizações e autonomia).
Cidadão - Os pais normalmente pas-
sam pelo tratamento com os filhos?
Daniela - Sim, é de fundamental impor-
tância a participação dos pais. Eles preci-
sam aprender comportamentos mais adapta-
tivos para lidarem com os seus filhos e são
eles que colocam em prática as mudanças
necessárias no ambiente que a criança convi-
ve, para atingir os objetivos propostos e dis-
cutidos em terapia.
Cidadão - Qual o problema mais co-
mum que encontramos nas crianças?
E nos pais?
Daniela - Na psicoterapia a maior difi-
culdade que encontramos é em relação à co-
municação, visto que nem sempre é possível
compreender a linguagem utilizada por elas.
Com os pais, éprecisoantesde qualquer coisa
trabalhar a aceitação. Só após eles elabora-
rem o luto do filho ideal e perfeito é possível
reconhecer as potencialidades da criança e as-
sim serem aliados no tratamento.
Conheça os principais sintomas
Segundo a consultora
epsicóloga, especialistaem
terapiaocupacional, Rena-
taSaradeOliveira,quepres-
ta atendimento em clínica
privada, em São Paulo, o
tratamento mais comum
empregado para os autis-
tas consiste em análises
comportamentais, segui-
das de atividades práticas
que reforcem asalterações
positivas de comporta-
mento do paciente, de-
monstradas na interação
com o terapeuta.
Os sintomas mais re-
levantes de autismo são
baixo contato visual, fixa-
ção em objetos, hiperati-
vidade ou apatia total,
movimentos repetidos, ir-
ritabilidade, humor instá-
vel e uma frequência expressiva de
posturas bizarras, entre outros.
De acordo com Renata, a aceita-
ção pelos pais do transtorno do fi-
lho é um grande problema para os
profissionais que tratam de autistas.
A psicóloga afirma ainda que, inicial-
mente, procura munir os pais de
muitas informações sobre a doença,
para que possam agir com calma e
tranquilidade diante das ações “dife-
rentes” dos filhos.
Os portadores de autismo neces-
sitam de acompanhamento espe-
cializado de pediatras, neurologistas,
psiquiatras, psicólogos, fonoaudiólo-
gos, pedagogose fisioterapeutas, para
que possam ampliar suas capacidades
e habilidades. Com auxílio adequado,
é possível a um autista, dependendo
do grau da doença,frequentar escolas
convencionais.
AOS PAIS - Renata sugere se informar mais
de autismo geralmente se assustam
aose depararcomsensações novasco-
mo, por exemplo, a de que seu pênis
cairá quandoficarereto.
Existem algumas organizações
não governamentais (ONGs) que
realizamesse papel, masa famíliadeve
conversar sobre o assunto, buscar a
melhor forma de ajudar o autista a
conviver de modo tranquilo com sua
sexualidade.
Pessoa com deficiência tem direito à vida sexual
Hevlyn Celso*
As pessoas com deficiências, as-
sim como qualquer cidadão, têm di-
reito a exercer sua sexualidade. No
entanto, no cotidiano, esse assunto é
cercadoporpreconceitos dasociedade
e até das famílias que acreditam que
seus filhos não possuem essa necessi-
dade humana.
Em março passado, durante o
simpósio “Síndrome de Down - In-
clusão para a Autonomia”, realizado
noMemorial daAméricaLatina,apes-
quisadoraMarta Gil, representante do
Amankay Instituto de Estudos e Pes-
quisas, tratou dessa questão: “Ainda
permanecemtabus. Ou é um anjoino-
cente, então você nega todo o desejo,
todo o tesão, toda a vontade de ter
uma escolha amorosa, de viver uma
afetividade. Ou você vai para o outro
ladoda gangorra,falade erotismoexa-
cerbado”, explica.
Segundoela,a maioriadas famílias
tenta se esquivar da questão para não
“despertá-la” junto aos adolescentes,
porexemplo.“Como vai despertar? A
sociedade está falando disso o tempo
todo; nesse assunto eles já estão liga-
dos.”A pesquisadora relataque, na ci-
dade, os 24 postos especializados em
controlededoençassexualmentetrans-
missíveise Aidsnuncareceberam avi-
sitade umapessoacom deficiênciaem
buscade informaçõesoupreservativos.
A reportagem conversou com al-
gumas pessoas com síndrome de
Down para saber o que pensam sobre
o assunto. A atriz Beatriz Paiva, 32
anos, relações públicas da Federação
Nacional das Associações de Síndro-
me de Down, frequenta a Associação
Carpe Diem e abordaa dificuldade de
estar ao lado do namorado. “Olha,
tenho e não tenho, porque o encon-
tromuito pouco.Ele é um cliente aqui
do Carpe, o nome dele é Jean, mas,
assim,a famílianãodeixa,eu vivomais
na teoria do que na prática”, afirma
Beatriz. Ela diz que só o vê na asso-
ciação, nunca saíram juntos. “Asfamí-
lias não dão o suporte necessário para
que o relacionamento aconteça.”
João Alberto Simões, 23 anos, e
sua namorada Juliana Pontes de Ca-
margo Diegues, 29 anos, são colegas
de Beatriz no Grupo ADID de Tea-
tro. Eles se encontravam durante os
ensaios e às vezes iam juntos ao cine-
ma e ao shopping. O namoro come-
çou com um beijo durante uma caro-
naparaa associação.Agora,enfrentam
a distância: ela se mudou para Bocai-
na, no interior paulista, o que torna
os encontros mais difíceis.
Muitas vezes as fa-
mílias temem o mo-
mento em que seus fi-
lhoscom deficiênciade-
cidem namorar, pois
querem protegê-los de
pessoas mal intenciona-
das e de decepções. De
fato, conforme Marta
Gil, estudos internacio-
nais demonstram que
os casos de abuso tripli-
cam em relação a ho-
mens e mulheres com
deficiênciaintelectual.
A saída não está na
proibição, mas no diá-
logo e orientação – fun-
damentais para que eles
próprios tenham auto-
nomia e consciência das responsabili-
dadese cuidados ao relacionar-se afe-
tivamente. “A pessoa com deficiência
temo mesmodireitoàsexualidadeque
as pessoas normais, e isso é uma for-
made exclusão.Seelespodem viverna
prática, porque a gente não pode? É
possível, sim, eles terem a sua própria
sexualidade”,argumenta Beatriz.
* A estudante elege a história de vida de
pessoas com síndrome de Down como tema
do trabalho de conclusão de curso (TCC)
no final do ano.
Arquivo Pessoal
Hevlyn Celso
NAMORO-SimõeseJuliana,juntosdesde2008
Saiba mais sobre o assunto nos
sites da Associação para Valoriza-
ção e Promoção de Excepcionais
(www.avape.org.br), da Associação
para o Desenvolvimento Inte-
gral do Down (www.adid.org.br)
e da Associação Carpe Diem
(www.carpediem.org.br).
10.
11. PÁGINA 6 - AGOSTO DE 2009
No último dia 25 de abril foi lan-
çada a segunda edição do livro “Dos-
siê Ditadura: Mortos e Desaparecidos
Políticos no Brasil (1964-1985)”, or-
ganizado por Crimeia de Almeida, Ja-
naína de Almeida Teles, Suzana K.
Lisboa e Maria Amélia Teles. A obra
atualiza os números de mortos e de-
saparecidos durante esse período.
Estima-se o total de 426 mortos e
desaparecidos. O número de vítimas
não é definitivo, pois não foi possível
o acesso aos arquivos militares. Mes-
mo assim, as investigações conti-
nuam e espera-se em breve ter o nú-
mero oficial de pessoas que sofreram
as penas do regime militar.
Janaína Teles é filha de César e
Maria Amélia, militantes do Partido
Comunista do Brasil (PC do B) na
ditadura militar. Aos 5 anos, ela pre-
senciou a bárbara tortura de seus pais
e hoje, aos 42 anos, é historiadora e
uma das autoras, ao lado de familia-
res, de uma ação na Justiça contra o
ex-coronel Carlos Alberto Brilhante
Ustra, apontado como responsável
por sequestros, mortes e torturas no
Departamento de Operações de In-
formações e Centro de Operações de
Defesa Interna, o
DOI-Codi de São
Paulo, entre 1970
e 1974, à época o
órgão de inteli-
gênciae repressão
do governo.
Quem tam-
bém sofreu sob o
governo militar
foi Ivo Herzog,filhode VladimirHer-
zog, jornalista da TV Cultura de São
Pauloque, em25 de outubro de 1975,
apareceu morto nas dependências do
DOI-Codi,do 2ºExércitode SãoPau-
lo. Ivo engajou-se na criação do Insti-
tuto Vladimir Herzog, lançado em
junho, na Sala Cinemateca(Zona Sul).
“Não gosto de saber que tem pessoas
que foram criminosas e ainda estão aí
vivendo em cima da máquina do Es-
tado, usando os impostos que a gen-
te pagou”, comenta sobre o ex-coro-
nel. “Eu prefiro olhar para frente a
olhar para trás”, completa.
Diante de todo esse cenário que
envolveu milhares de pessoas, entre
mortos, desaparecidos, torturados,
perseguidos, presos e seus familiares,
o Cidadão entrevistou duas vítimas
da ditadura militar. São pessoas que
sofrerame sofremcom as tristes mar-
casdo regime mi-
litare tentam, ain-
da hoje, recons-
truir suas vidas,
sempre com a
sombra do passa-
do. Um deles é o
advogadoAlcídio
Boano, hoje com
81 anos, que vive
em São Paulo e se diz o “orgulho”
dos dois filhos e quatro netos. O se-
gundo entrevistado é o aposentado
Michéas Almeida, o Zezinho do Ara-
guaia, 71 anos. Ele mora atualmente
em Goiás e ministra palestras no Ins-
tituto Araguaia.
Em 1974, Alcídio Boano era pre-
sidente do Sindicato dos Condutores
de Veículos de SãoPaulo.Trinta e cin-
coanos depois,ele relata asrepressões
que sofreu durante aquele momento
histórico tão difí-
cil vivido porinú-
meros brasileiros.
O sindicalista as-
sumiu o cargo
por meio de um
mandado de se-
gurança, e lutou
por algum tem-
po para que as
empresas de ônibus regularizassem o
registro dos trabalhadores. Por essa
iniciativa, foi considerado comunista
e enviado para o Departamento de
Ordem Política e Social (Dops).
Eleito, pela terceira vez, para a di-
retoriageral dosindicato,teve suascre-
dencias negadas e ainda foi entregue
novamente ao Dops, que chegou a
exigir do sindicalista a Ata do Dissí-
dio, porque nela havia o registro dos
Vítimas do regime que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985 narram perseguições, censura e tortura
trabalhadores que se manifestavam
contra a ditadura.
Boano recusou-se a oferecer odo-
cumento e, no início de 1975, foi o
primeiroda diretoria a ser preso e tor-
turado. Logo depois, outros dez dire-
toresforam paraa cadeia. “Elesamar-
ravam o pé e os braços, e aí era fionas
pernas, fio nos braços e no pescoço.
Cheguei a ter 32 perfurações dos fios
descascados.Levei chutes nos testícu-
los. O primeiro e
o segundo doíam
muito; no tercei-
ro, desmaiei”,
lembra Boano,
que pensou que ia
morrer.
O processo
parasualibertação
durou seis meses.
O DOI-Codi queria que o sindicalista
confessasse 12 reuniões consideradas
“subversivas”. No entanto, para ele,
eram “365 reuniões por ano”, relata.
O então delegado do Dops, Alcides
Sigilus, ameaçou devol-vê-lo aoDOI-
Codi por causadessarecusa,oque não
aconteceu.
Os breves relatos de Boano dão
umaideia doque significa ter sido um
preso político e encarcerado na dita-
dura. Por isso, encaixa-se no perfil de
um excluído pelo regime militar. Ele
diz ter sido vizinho de cela de Vladi-
mir Herzog, jornalista que se tornou
um mártir. Seu assassinato pelos mi-
litares retratou seu compromissocom
o ideal libertário.
REAÇÃONO CAMPO
A Guerrilha do Araguaia aconte-
ceu no campo, na região do Bico do
Papagaio, às margens do rio Araguaia,
entre cidades do Pará, Goiás e Tocan-
tins. É considerado o mais sério con-
fronto armado no campo entre as es-
querdas e o regime militar. Começou
a se organizarem1966,tendo à frente
ativistas do PC do Bque se instalaram
na região, mas o embate só iniciou de
fato em abril de 1972.
O paraense Zezinho do Araguaia
é um dos poucos sobreviventes da
guerrilha.Ementrevista, ele conta um
pouco de seus difíceis e trágicos dias
de militância política.
Zezinho começou a atuar na Ju-
ventude Operária Católica. Foi para
Goiânia em 1959 e em 1962 filiou-se
ao PC do B de Goiás. Ali, começou
sua trajetória em defesa da condição
de camponês, visando a sua integra-
çãoe oreconhecimentoda região.“Es-
sas iniciativas faziam parte do treina-
mento militar e reconhecimento dos
possíveis campos de batalhas, como
preparaçãoparauma ofensiva de milí-
cia”,afirma.
Sua adesão ao movimento era
clandestina, e em todo o país aconte-
ciammovimentossociais que encabe-
çavam a investida na mata, reunindo
os militantes mais expressivos, entre
REALIZAÇÃO - Hoje, com 81 anos, Alcídio Boano é advogado atuante
Arquivo Pessoal
POLÍTICA
Antonia Romano
Denisa Silva
Retrato de presos políticos na ditadura militar
OEA julga Brasil por
Guerrilha do Araguaia
Wagner Luis Solà
No último dia 9 de abril, a Orga-
nização dos Estados Americanos
(OEA) abriu ação contra o Brasil no
caso da Guerrilha do Araguaia. Pela
primeira vez na história, o país irá à
corte para prestar contas da detenção
ilegal,torturae desaparecimentode 70
pessoas ligadas à guerrilha e campo-
neses daquela região durante a dita-
dura militar.
Desde a criação dessas instâncias,
o Brasil era o único país da América
do Sul imune a este tipo de ação. Seus
vizinhos, Argentina, Uruguai e Chile,
já prestaram contas para o mundo das
barbáries ocorridas no regime militar.
Isso está tirando o sono das autori-
dadesbrasileiras, que estão preocupa-
das com a imagem do país no cenário
mundial e com os valores que terão
de desembolsar em caso de indeniza-
ções. Oministro Paulo Vannuchi (Di-
reitos Humanos) propôs aos Minis-
térios da Justiça, da Defesa e dos Di-
reitos Humanos uma diligência ao
Araguaiacomaparticipaçãodaimpren-
sa e familiares de desaparecidos para
localizarcorpos.
OGrupoTortura NuncaMaistem
como objetivo defender os direitos
humanos, por meio da luta contra a
violação a tais direitos e do apoio à
causa, e também mostrara história do
Brasil durante a ditadura.
O site do Grupo, sediado no Rio
de Janeiro, é www.tortura-nuncamais-
rj.org.br. Há filiais nos Estados do
Paraná, Pernambuco e São Paulo.
eles José Genoíno, hoje deputado fe-
deral pelo Partido dos Trabalhadores.
“Tenho 47 anos de militância po-
lítica,33 anos de clandestinidade, mais
de 80 nomes usados neste período.
De 1975 a 1996 [21 anos], sofri um
bloqueio psicológico e estahistóriafi-
cou ausente da minha vida e, hoje,
volta e meia, lembro-me de pedaços
desse passado.Aprendi umalição: não
me afasto dos meus companheiros de
sofrimento para não esquecer nunca
mais do meu passado”, diz Zezinho.
Ele estimaque restaramapenas12
sobreviventes da guerrilha.Atualmen-
te, planeja fundar um memorial em
homenagem aos mortos e desapare-
cidos do Araguaia, na cidade de Xam-
bioá (GO). Em sua opinião, a guerri-
lha foi uma investida contra a ditadu-
ra, a partir do campo.
Arquivo Pessoal
HISTÓRIA - Durante a ditadura militar, Zezinho do Araguaia foi obrigado a trocar de nome mais de 80 vezes
“Levei chutes nos
testículos. O primeiro
e o segundo doíam
muito; no terceiro,
desmaiei”
Alcídio Boano
“Não me afasto dos
meus companheiros
de sofrimento para não
esquecer nunca mais
do meu passado”
Zezinho do Araguaia
12.
13. AGOSTO DE 2009 - PÁGINA 7
POLÍTICA
A ditadura militar no Brasil
(1964-1985) não foi um movi-
mento isolado. Foi instituída, as-
sim como em outros países da
América Latina, para reforçar o
papel dos Estados Unidos, país
hegemônico do bloco capitalista,
que buscava nesses “mini-impé-
rios” da região o apoio para lutar
contra a liderança da então União
das Repúblicas Socialistas Sovié-
ticas (URSS, que nos anos 90 se
tornaria somente União Soviéti-
ca) no embate conhecido como
Guerra Fria.
Em outras palavras, muitos
países vizinhos ao Brasil também
vivenciaram suas respectivas di-
taduras, que, num contexto in-
ternacional, objetivavam reforçar
a prática do capitalismo sob o po-
derio dos EUA.
O Brasil não ficou fora disso.
Para reagir aos desmandos do re-
gime, as manifestações de esquer-
da afloraram. Destacam-se a
Guerrilha do Araguaia, um mo-
vimento que surgiu no campo, na
região do Bico do Papagaio, no
norte do país, sob a coordenação
de militantes do PC do B; a Tro-
picália, que tentou seguir os mol-
des da contracultura norte-ame-
ricana, além de protestos estu-
dantis e a atuação da imprensa
alternativa e dos sindicatos.
(D.S. e M.L.R.)
Os 21 anos que
abalaram o país e
mudaram a história
Expressão “ditabranda” gera polêmica
Antonia Romano
Wagner Luis Solà
Em editorial de 17 de fevereiro
passado, o jornal “Folha de S.Paulo”
usou a terminologia “ditabranda” ao
associarcríticasaopresidente venezue-
lano Hugo Chávez a um comentário
sobre o governo militar no Brasil.
Ao analisar os regimes autoritá-
rios vividos pelos países da América
Latinano séculopassado,o jornal clas-
sificou a experiência brasileira como
“ditabranda”, entendendo que, aqui,
ela foi menos violenta do que em ou-
tros países.
Na Argentina, o regime militar
durou de 1976 a1983 ecercade 30mil
civis foram mortos, o maior número
daAmérica Latina.Nogoverno doge-
neral chilenoAugusto Pinochet, entre
1973 e 1990, estima-se que 3,2 mil
pessoas morreram. A ditadura uru-
guaiacomeçou em1973 e ocorreu até
1985. Lá, os mortos chegaram a 300.
Nodia 20 de fevereiro surgiramas
primeiras críticas ao jornal por meio
de acadêmicos,entre eles FábioKon-
derComparatoe MariaVictoriaBene-
vides, ambos professores da Univer-
sidade de São Paulo (USP). Uma nota
da redação interpretava a reação dos
intelectuais como “cínica e mentiro-
sa”, uma vez que são “figuras públi-
cas” que até hoje não expressaram re-
púdio a ditaduras de esquerda, numa
referênciaclaraao governoChávez.
Tanto Comparato quanto Maria
Benevides já haviam criticado o regi-
me cubano, inclusive o primeiro che-
gou a fazer ressalvas a Cuba no Painel
doLeitor,espaçoreservadoàscartasque
chegam à redação.A resposta aosinte-
lectuais expôs a imagem do jornal. A
partir de 21 de fevereiro circulou na
Internet o manifesto Repúdio e solida-
riedade, que consistia em abaixo-assi-
nado eletrônico que condenava o uso
do termo “ditabranda”.
O documento teve ampla reper-
cussão na rede mundial de computa-
dores, conclamou a uma manifesta-
ção do Movimento dos Sem-Mídia
em frente ao prédio do jornal, ocorri-
daem 7 de março. Houve participação
de cerca de 500 pessoas, segundo os
organizadores. O protesto ocorreu
espontaneamente, contando com o
apoio de entidades de direitos huma-
nos e de ex-presos políticos, partidos
políticos, jornalistas independentes e
sites. Já o abaixo-assinado virtual co-
lheu mais de 8 mil assinaturas.
No dia seguinte, o diretor de re-
dação da “Folha”, Otavio Frias Filho,
admitiu que o termo “ditabranda” foi
usado erradamente, pois “tem uma
conotação leviana que não se presta à
gravidade do assunto”, mas classifi-
cou Comparato e Maria Benevides
como “democratas de fachada”.
Em 14 de março, os dois pro-
fessores conseguiram um direito de
resposta no jornal, falando que “le-
var mais de duas semanas para reco-
nhecer um desatino editorial não
parece um comportamento compa-
tível com a ética do jornalismo”. A
“Folha” manteve a postura agressi-
va: “imaginava-se encerrado o epi-
sódio, mas os professores estão em-
penhados em extrair dele o máximo
rendimento possível”.
REPÚDIO - Militantesprotestam contra editorial na entrada da “Folha” em 7 de março passado, no centro
Em 1964, exatamente no dia 1º
de abril, o Brasil passou a viver um
dos momentos mais tristes de sua
história: a ditadura militar. Durante
21 anos, o país sofreu conflitos que
geraram censura,terrorismo, torturae
guerrilha (luta armada realizada por
meio de pequenos grupos constituí-
dos irregularmente,sem obediência às
normas estabelecidas nas convenções
internacionais), causando a perda de
426 brasileiros, segundo estimativa
oficial. Compositores, escritores, mi-
litares, camponeses e muitos outros
foram exilados, torturados e mortos
numa tentativa de se ocultar fatos e
excluir pessoas que buscavam, por
meio de protestos e manifestações,
mudar o curso da história do Brasil.
O governo de Emílio Médici
(1969/1974), por volta de 1973, em
um dos momentos mais críticos da
ditadura, subsequente ao AI-5, numa
tentativa de melhorar a sua imagem
junto ao povo, gastou milhões com
campanha publicitária. E um dos slo-
gans dessa propaganda foi Brasil, ame-
o ou deixe-o, que sugeria diretamente a
MANIFESTAÇÕES - Aditadura não foi movimento isolado, marcando os governos entre 1964 e 1985
retiradavoluntáriados insatisfeitos do
país, só permanecendo os que eram a
favor do regime militar.
Como os direitos fundamentais
do cidadão estavam suspensos, qual-
quer um podia ser preso se fosse de-
sejo do governo. Nas escolas, nas fá-
bricas, na imprensa, nos teatros, a so-
ciedade brasileira sentiaamão de ferro
da ditadura. Foram tempos difíceis
para os brasileiros que, mesmo com o
“milagre econômico”, tiveram suas
vidas roubadas e perdidas por duas
décadas. (A.R.eM.L.R.)
Ato Institucional Número 5
endurece o regime em 1968
PORTAS FECHADAS - Reunião entre ministros e presidente aprova o AI-5
O Ato Institucional Número 5
(AI-5) foi criado em 13 de dezembro
de 1968, numa reuniãono PalácioLa-
ranjeiras, composta por membros do
alto escalão do governo militar. Foi
o 5º decreto emitido pelo regime mi-
litar, um instrumento que dava aos
militares poderes absolutos, cujas
consequências foram: decretar o re-
cesso do Congresso Nacional; inter-
vir nos Estados e municípios; cassar
mandatos parlamentares; suspender,
por dez anos, os direitos políticos de
qualquercidadão; decretar o confisco
de bens considerados ilícitos; e sus-
pender a garantia do habeas-corpus,
entre outras.
O que provocou a promulgação
do AI-5 foi um discurso do depu-
tado Márcio Moreira Alves, do
MDB, na Câmara, no início de se-
tembro, lançando um apelo para que
o povo não participasse dos desfiles
militares do 7 de Setembro. Ao fim
do mês de dezembro, 11 deputados
federais foram cassados, entre eles
Márcio Moreira Alves e Hermano
Alves. A lista de cassação aumentou
no mês de janeiro do ano seguinte,
atingindo não só os parlamentares,
mas também ministros do Supre-
mo Tribunal Federal.
O ano de 1968 ficou conhecido
como “o ano que não acabou”, em
todo o país multiplicavam-se os pro-
testos e manifestações por parte dos
estudantes.
Saiba o que foi a ditadura militar no Brasil
Denisa Silva
Marcos Leandro Redondo
Memória
Estudantil/O
Globo
Brasil
Autogestionário/Pablo
Simpson
Reprodução/Folha
Imagem/11.jul.68
14.
15. PÁGINA 8 - AGOSTO DE 2009 SOCIEDADE
Fora do batente, militar sente-se excluído ao ocultar profissão na hora de voltar para casa
Daniele De Curtis
Igor Savani
Serumpolicial militarrequer mui-
tas habilidades e competências, por-
tanto, não seria justo compararmos
com outras profissões. Mesmo assim,
de acordo com as leis trabalhistas, o
policial militar é comparado com ou-
tros tipos de trabalho. O fato é que,
na prática, sabemos que não é assim
que funciona. Muitas vezes, sem hora
para dormir, os policiais perdem noi-
tes de sono e consequentemente não
descansamo necessário para aguentar
o tranco do trabalho. Além disso, por
medidas de segurança, a maioria dos
policiais militares nãousa a farda após
o horário do expediente. Em suas ca-
sas, nem mesmo no varal estendem a
farda para evitar que os vizinhos sai-
bam que são policiais.
O PM F.L.P. revela que “quando
trabalhava todos os dias com a farda,
sim. Voltava para casa sem ela, para
poder me proteger e à minha famí-
lia”. Inúmeros policiais que voltavam
para suas casas fardados já sofreram
agressões, enquanto que outros per-
deram suas vidas.
A sociedade de um modo geral
costuma dizer que os policiais não
prestam e que são corruptos. O fato é
que, assim como em todas as outras
profissões, existem aqueles que são e
os que não são honestos. No caso da
polícia,existea corregedoria,órgãores-
ponsável por fiscalizar e punir os po-
liciaisquenão agemcorretamente.Para
o PM, “a sociedade vê a polícia como
Isadora Lins/Centro de Mídia Independente-SP
Policial evita farda por segurança
Diante da globalização, houve
umaevolução na violênciaurbana. As
organizaçõescriminosas buscaramnas
tecnologias de ponta existentes e dis-
poníveis osmeios de aperfeiçoarem e
de perpetuarem seus atos de ilicitu-
des. Entretanto, não vemos medidas
eficientes que visem a segurança pú-
blicasendo colocadas emprática pelo
governo.
O presidente do Sindicato dos
Delegados de Polícia Federal (Sinde-
pol), Joel Zarpelon Mazo, ironiza: “A
violência se manifesta quando as ‘ne-
cessidades’ do ser humano não satis-
fazem,assim este usada violênciapara
sanar essa lacuna.”
É relevante que o Estado man-
tenha os policiais valorizados, isto
é, investir em sua capacitação para
que possam executar o seu ofício de
maneira satisfatória, o que também
trará benefícios na área pessoal e so-
cial deles.
Joel Zarpelon Mazo faz uma ana-
logia relacionada ao meio social. Ele
caracterizaoscidadãos comosendoos
cordeiros. Esses são bons, trabalha-
dores e não pensam em violência; são
os vulneráveis. Nesse mesmo meio
social, existem osque roubam, os que
matam; esses são os lobos. E para
proteger os cordeiros dos lobos há os
cães pastores, que são os policiais.
Ser um policial militar é uma das
profissões maisdifíceis existentes,tan-
to que, de acordo com a Organização
das Nações Unidas (ONU), é consi-
deradacomoa segundaprofissãomais
insalubre, perdendo somente para os
mineiros das minas de carvão.
Daniele De Curtis
Cordeiros, lobos
e cães pastores
um mal necessário”.
Embora muitos ainda não te-
nham se dado conta, hoje em dia o
policial não possui uma função espe-
cífica.Ele é chamadopara separaruma
briga de casal, realizar um parto etc.
Atualmente, o salário mensal de um
policial militar é R$ 450,00; porém,
com as premiações, pode chegar a R$
1.500,00. No momento, o PM F.L.P.
trabalha na Assessoria Militar do Fó-
rum e recebe R$ 2.550,00 por mês.
Esse departamentoé responsável por
cuidar de autoridades ameaçadas.
Após receberem um chamado,di-
versos policiais não vão de imediato
atendê-lo, usam como justificativa a
baixa remuneração. No entanto, se é
uma ocorrência de uma pessoa rica,
logo a situação é resolvida.
Fora isso, os criminosos de diver-
sas regiões impõem suas leis nos bair-
ros e estão se tornando “heróis” dos
moradores. Esses são um dos moti-
vosque causam insegurança na popu-
laçãocomrelação aospoliciais.
Para um policial honesto sobrevi-
ver com dignidade, isto é, ter condi-
ções de sustentar sua família, pagar
suas contas, não basta ter apenas uma
profissão, é necessário fazer bico.
Napolíciamilitarexistedesde2002
umprogramade assistênciasocial,que
é uma ferramenta de reestruturação
emocional e psicológica do policial.
Duranteoprocessoderecuperação,ele
é afastado pelo tempo que for neces-
sário. Estatísticas comprovam que no
ano de 2001 ocorreram 250 casos de
suicídio de policiais e em 2008 esse
número caiu para 52.
Quanto à violência, o PM F.L.P.
relata a sua indignação: “A injustiça é
muito grande, o homem que mata
outrapessoa, nãodeu a menor chance
para que ela pudesse se defender. No
entanto, quando ele é preso, tem di-
reito a muitas coisas. Se o presidiário
vai lá e queima o colchão, outro será
comprado. Ele tem direito a tomar
banho de sol, etc. Se tiver bom com-
portamento, logo será solto.Acho que
o pior tipo de crime que existe é o
homicídio, ninguém tem o direito de
tirar a vida do outro, isso inflige os
direitoshumanos. Para esse crime de-
veria ser dada aprisão perpétua. Claro
que o estupro também é muito grave,
mas é o que eu disse sobre tirar a vida
do outro.”
Para o PM F.L.P., deveria existir
somente um tipo de polícia, a esta-
dual, porque há muitos conflitos en-
tre policiais civis, militares e federais.
A polícia civil cuida da parte judiciá-
ria, ou seja, é o lado investigativo. A
polícia militar cuida da parte repreen-
siva. Porém, ocorre a intervenção de
um no trabalho do outro. Se hou-
vesse apenas um tipo de polícia, ele
acredita que a criminalidade diminui-
ria. É relevante que ocorra uma alte-
ração no código penal. Para realmen-
te haver uma mudança, tem que co-
meçar lá do topo, ou seja, do gover-
no. Esse é o ponto chave para a me-
lhora da atual situação de violência a
qual convivemos diariamente.
PRECAUÇÃO - Para não correr riscos, farda só durante o trabalho
CIDADANIA
Lei federal estipula 10% de assentos nos transportes coletivos para os idosos
Velho é o seu preconceito
Graziele Magaton
Milene Rolan
Renata Cinci
A aposentada Deolinda Alves, 72
anos, utiliza o transporte público para
ir aomédico, visitar parentes, comprar
remédios. Ela mora no Tatuapé,Zona
Leste, e já foi destratada no ônibus.
“Além de algumasvezester que pagar
acondução,jáfuiagredidaverbalmente
por um jovem que estava sentado no
banco destinado a idosos. Isso é o
cúmulo”, afirma.
O Instituto Brasileiro de Geogra-
fia e Estatística (IBGE)considera ido-
so a pessoa com 60 anos ou mais –
mesmo limite de idade definido pela
OrganizaçãoMundialdaSaúde (OMS)
nos países em desenvolvimento.
Apesar da população de idosos
representar um contingente de quase
15 milhões de pessoas (8,6% dos bra-
sileiros),envelhecer nopaísnão é fácil.
Acada diatorna-se maisdifícil odirei-
to de ir e virnos transportescoletivos.
Somam-se os problemas relativos à
própriaidade,as solicitações nas para-
das que não são atendidas, a recusa da
carteira de identidade como compro-
vação da idade – na falta do Bilhete
ÚnicoEspecial –,e o pouco caso com
o direito de sentar em bancos espe-
ciais – identificados com a cor cinza
no metrô e amarela nos ônibus –, de
acordo com a lei 10.012, de 13 de de-
zembro de 1985.
Gestantes,deficientese criançasde
colo também deixam de ser respeita-
dos. Devido a estas questões, algu-
mas denúncias foram registradas no
Conselho dos Direitos do Idoso de
SãoPaulo. De acordocomalei 11.487,
de 11 de março de 1994, as empresas
de ônibus cujos motoristas desrespei-
tarem os direitos dos idosos estão
sujeitas à aplicação de multas.
SegundoaSecretaria Municipal de
Transportes de São Paulo, é crime im-
pedir maiores de 65 anos de utilizar
gratuitamente os transportes públicos
coletivos. “Não é justo pagar
um valor que eu não tenho
obrigação. Tenho os meus di-
reitos”, diz a aposentada
Deolinda.
Alguns motoristas têm se
recusado a transportar usuá-
rios idosos que não possuem
acarteirade identidade como
registro: “maior de 65 anos”.
Em contrapartida, o motoris-
ta de ônibus José Lima – li-
nha Guarulhos (Jardim Pal-
mira/Parque Continental),
comfinal no metrô Tucuruvi,
Zona Norte – diz que aceita
qualquer tipo de documento,
desde que possua foto. Na lei
11.381, de 17 de junho de
1993,fica instituídaaisenção dopaga-
mento de tarifa de ônibus às mulhe-
res maiores de 60 anos e aos homens
maiores de 65 anos.
Com a implantação da
bilhetagem eletrônica
em 2003, os idosos não
têmde apresentardocu-
mento e passam pela
catraca como os demais
usuários. Contudo, al-
guns motoristas conti-
nuam a exigir o docu-
mento.
A falta de respeito
para com o idoso, em
grande parte, é dos jovens que não
cedem seus lugares. Não se levantam,
discutem e alguns até se exaltam a
ponto de partir para a agressão.
O estudante de direito Rodrigo
Schezzari, 24 anos, que prefere não
identificar sua faculdade, diz que não
é confortável atenderaopedido de um
idoso sempre que ele quer. “Eu sei
que um dia ficarei assim, mas às vezes
estou cansado e quero dormir. Inde-
pendente da idade, se o banco nãofor
destinado para eles, tenho o mesmo
direito de ficar sentado”, diz.
“Acho que eles poderiam evitar o
horário de pico,poismesmo semque-
rer, eles atrapalham, ocupando luga-
resque poderiamserusados poraque-
lesque trabalharamo dia inteiro”,afir-
ma Schezzari. Nos veículos de trans-
porte coletivo é obrigatória a reserva
de 10% dos assentos para os idosos,
conforme aviso legível.
O envelhecimento
da população brasilei-
ra é reflexo do aumen-
to da expectativa de
vida,devido aoavanço
no campo da saúde e a
redução da taxa de na-
talidade. Estima-se
que em2020 a popula-
ção com mais de 60
anos deva chegar a 30
milhões de pessoas,
O Estatuto do Idoso foi apro-
vado em setembro de 2003 e san-
cionado em outubro, ampliando
os direitos dos cidadãos com ida-
de acima de 60 anos. Mais abran-
gente que a Política Nacional do
Idoso, lei de 1994 que dava garan-
tias à terceira idade, o estatuto ins-
titui penas severas para quem des-
respeitar ou abandonar cidadãosda
terceiraidade.
Seis anos depois
cerca de 13% dototal.
OaposentadoJoaquim Prizon, 78
anos, utiliza mais o metrô. Diz prefe-
rir assim porque a aerodinâmica dos
ônibus não condiz com seu tipo físi-
co.“Fica muitodifícil de subir edescer
as escadas dos ônibus”. Em relação
aos bancos, o metrô ganha em sua
comparação: “Os assentos estão qua-
se sempre cheios, mas são idosos, ce-
gos ou gestantes que se acomodam”,
afirma Prizon. “Acho que deveriam
existir mais bancos destinados ao uso
preferencial.”
Um funcionário do IBGE, uni-
dade do ItaimBibi,que prefere não se
identificar,afirmaque “nunca foi feita
uma pesquisa sobre os maus tratos a
idosos em transportes coletivos pú-
blicos; quem sabe futuramente eles
venham a fazer.”
Desde 2002, o dia 15 de junho é
considerado o Dia Mundial de Cons-
cientizaçãoda Violência àPessoaIdo-
sa. Não é a toa que a data é pouco
conhecida entre os brasileiros.
O idoso tem direito:
À vida;
Ao respeito;
Ao atendimento de
suas necessidades
básicas;
À saúde;
À educação;
À moradia;
À justiça;
Ao transporte.
RESPEITO - Deolinda: “Tenho meus direitos”
Graziele Magaton