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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
NÚCLEO DE ESTUDOS DO SEMI-ÁRIDO - NESA
MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE- PRODEMA
Ofidismo em Sergipe: epidemiologia e
plantas da caatinga utilizadas popularmente como antiofídicas
Jeane Carvalho Vilar
Orientadores: Dr. Angelo Roberto Antoniolli
Dra. Maria de Fátima Domingues Furtado
2004
ii
Ofidismo em Sergipe: epidemiologia e
plantas da caatinga utilizadas popularmente como antiofídicas
Jeane Carvalho Vilar
Dissertação apresentada ao curso de
Mestrado em Desenvolvimento e Meio
Ambiente– Prodema – Nesa, Universidade
Federal de Sergipe, como parte dos
requisitos para obtenção do título de mestre
em Desenvolvimento e Meio Ambiente.
2004
iii
Ofidismo em Sergipe: epidemiologia e
plantas da caatinga utilizadas popularmente como antiofídicas
Jeane Carvalho Vilar
Banca Examinadora
Dr. Celso Morato de Carvalho
Universidade Federal de Sergipe -
Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia
Dra. Maria de Fátima Domingues Furtado
Instituto Butantan- Secretaria da Saúde de São Paulo
Dr. Angelo Roberto Antoniolli
Universidade Federal de Sergipe
27.ii.2004
iv
Dedico este trabalho aos meus
queridos pais: Joel e Hélia
v
Agradecimentos
Ao Dr. Celso Morato de Carvalho, Universidade Federal de Sergipe, pelo constante
apoio, auxílio na bibliografia e, principalmente, pela agradável companhia durante a
execução do trabalho.
A Dra. Maria de Fátima Domingues Furtado, Instituto Butantan, São Paulo, que
orientou e incentivou a pesquisa em todas as fases, auxiliou na bibliografia e pela gentil
acolhida que tive no Instituto Butantan.
Ao Dr. Paulo Emílio Vanzolini, Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo,
pelas sugestões, auxílio na bibliografia e, principalmente, pela amizade.
A Dra. Vera Lúcia Gomes Klein, Universidade Federal de Goiás e Dra. Lúcia Rossi,
Instituto de Botânica, São Paulo, que identificaram as plantas das famílias Cucurbitaceae e
Euphorbiaceae.
A médica veterinária Gina Maria Freire Brandão Linofi, Vigilância Epidemiológica,
Secretaria Estadual de Saúde de Sergipe, pelas informações dos acidentes ofídicos.
Ao Dr. José Wellington Carvalho Vilar, Centro Federal de Educação Tecnológica de
Sergipe, pelas valiosas sugestões.
Ao MSc. Clóvis Roberto Pereira Franco, que auxiliou nas edições de fotografias; Dr.
Carlos Dias da Silva Júnior e Dr. Angelo Roberto Antoniolli, professores da Universidade
Federal de Sergipe, que deram suporte durante as fases experimentais do trabalho.
vi
Sumário
Resumo............................................................................................................................ xiii
Abstract........................................................................................................................... xiv
Introdução....................................................................................................................... 01
Literatura........................................................................................................................ 04
A origem e evolução do estudo dos venenos ofídicos............................................. 04
Plantas medicinais e ofidismo................................................................................... 09
Materiais e Métodos...................................................................................................... 14
1. Epidemiologia......................................................................................................... 14
2. Parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca.................................. 15
3. Verificação da eficácia das plantas..................................................................... 18
Resultados....................................................................................................................... 22
1. Epidemiologia dos acidentes ofídicos.................................................................. 22
2. Parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca.................................. 33
Dose letal (DL50) ................................................................................................... 33
Dose mínima hemorrágica (DMH)...................................................................... 36
3. Eficácia das plantas............................................................................................... 37
Dose letal (DL50) ................................................................................................... 37
Inibição da letalidade........................................................................................... 38
Inibição da hemorragia local............................................................................... 44
Discussão......................................................................................................................... 60
1. Epidemiologia dos acidentes ofídicos.................................................................. 60
2. Parâmetros biológicos do veneno botrópico....................................................... 70
3. Eficácia das plantas em inibir os efeitos do veneno de Bothrops jararaca..... 79
Conclusões....................................................................................................................... 87
Referências...................................................................................................................... 89
Apêndices........................................................................................................................ 98
vii
Lista de tabelas
Tabela 1. Distribuições de freqüências do número de ampolas de soros antiofídicos
utilizados em Sergipe................................................................................... 26
Tabela 2. Coeficientes de incidência anuais dos acidentes ofídicos em Sergipe (1999-
2002)............................................................................................................. 27
Tabela 3. Distribuição anual dos acidentes ofídicos por gênero de serpente.................. 27
Tabela 4. Distribuições de freqüências dos acidentes ofídicos por idade, sexo............... 27
Tabela 5. Sazonalidade dos acidentes ofídicos: proporção entre períodos seco (verão)
e chuva (inverno)........................................................................................... 28
Tabela 6. Acidentes ofídicos: associações entre sexo dos acidentados, período
analisado e sazonalidade............................................................................... 28
Tabela 7. Proporções dos acidentes ofídicos por região.................................................. 29
Tabela 8. Distribuições de freqüências dos acidentes ofídicos por regiões (1999-
2002).............................................................................................................. 29
Tabela 9. Acidentes ofídicos, Sergipe (1999-2002): sintomas locais mais freqüentes
nas três horas do acidente e após este período.............................................. 31
Tabela 10. Envenenamentos ofídicos, Sergipe: alterações locais e sistêmicas................ 32
Tabela 11. Classificação de acidentes ofídicos de Sergipe quanto à gravidade dos
casos.............................................................................................................. 32
Tabela 12. Bothrops jararaca, proporção entre camundongos mortos e inoculados
após 24 horas de observação......................................................................... 34
Tabela 13. Bothrops jararaca, DL50 do veneno: programa probítico da OMS............... 34
Tabela 14. Bothrops jararaca, valores probíticos do número de camundongos mortos
(y) sobre a concentração de veneno (x): programa probítico da OMS......... 34
Tabela 15. Bothrops jararaca, estatística da regressão do número de camundongos
mortos (y) sobre a concentração de veneno (x): comparações entre retas.... 34
Tabela 16. Bothrops jararaca, DL50 do veneno: comparações entre retas e programa
probítico da OMS.......................................................................................... 35
Tabela 17. Bothrops jararaca, diâmetro da área hemorrágica........................................ 36
viii
Tabela 18. Bothrops jararaca, estatística da regressão do diâmetro da área
hemorrágica (mm) sobre a concentração de veneno.................................... 36
Tabela 19. Dose letal 50% (DL50) dos extratos das plantas............................................. 37
Tabela 20. Bothrops jararaca, homogeneidade entre os grupos controles: estatística
da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................... 38
Tabela 21. Bothrops jararaca, homogeneidade entre grupos controles: Anova do
tempo de sobrevida dos camundongos (h)....................................................................... 38
Tabela 22. Apodanthera villosa, estudo piloto: estatística da distribuição de
freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................................................ 39
Tabela 23. Apodanthera villosa, estudo piloto: Anova do tempo de sobrevida dos
camundongos (h)........................................................................................ 40
Tabela 24. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h). 40
Tabela 25. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: Anova do tempo
de sobrevida dos camundongos (h).................................................................................. 40
Tabela 26. Apodanthera villosa, estatística da distribuição de freqüência do tempo de
sobrevida dos camundongos (h)................................................................... 40
Tabela 27. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h).... 41
Tabela 28. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre experimentos: Anova do
tempo de sobrevida dos camundongos (h)................................................... 41
Tabela 29. Apodanthera glaziovii, estatística da distribuição de freqüência do tempo
de sobrevida dos camundongos (h).............................................................. 41
Tabela 30. Apodanthera glaziovii, Anova do tempo de sobrevida dos camundongos
(h).................................................................................................................. 42
Tabela 31. Jatropha mollissima, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h). 42
Tabela 32. Jatropha mollissima: estatística da distribuição de freqüência do tempo de
sobrevida dos camundongos (h)................................................................... 42
Tabela 33. Jatropha elliptica, estatística da distribuição de freqüência do tempo de
sobrevida dos camundongos (h)................................................................. 43
Tabela 34. Jatropha elliptica, Anova do tempo de sobrevida dos camundongos (h)..... 43
ix
Tabela 35. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 44
Tabela 36. Apodanthera villosa, homogeneidade entre grupos controles: Anova,
diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 44
Tabela 37. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 45
Tabela 38. Apodanthera villosa, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro
da área hemorrágica (mm)......................................................................... 45
Tabela 39. Apodanthera villosa, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).............. 45
Tabela 40. Apodanthera villosa, teste de Tukey , diâmetro da área hemorrágica
(mm)........................................................................................................... 45
Tabela 41. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre os grupos controles:
estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área
hemorrágica (mm)...................................................................................... 47
Tabela 42. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 48
Tabela 43. Apodanthera glaziovii, estatística da distribuição de freqüência do
diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 48
Tabela 44. Apodanthera glaziovii, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 48
Tabela 45. Apodanthera glaziovii, teste de Tukey, diâmetro da área hemorrágica
(mm)........................................................................................................... 49
Tabela 46. Jatropha mollissima, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro
da área hemorrágica (mm), homogeneidade entre os grupos controles..... 51
Tabela 47. Jatropha mollissima, homogeneidade entre grupos controles: Anova,
diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 51
Tabela 48. Jatropha mollissima, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 52
Tabela 49. Jatropha mollissima, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro
da área hemorrágica (mm)......................................................................... 52
Tabela 50. Jatropha mollissima, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).............. 52
Tabela 51. Jatropha mollissima, teste de Tukey, diâmetro da área hemorrágica (mm). 52
x
Tabela 52. Jatropha elliptica, homogeneidade entre os grupos controles: estatística
da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)...... 54
Tabela 53. Jatropha elliptica, Anova, homogeneidade entre os grupos controles:
diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 54
Tabela 54. Jatropha elliptica, homogeneidade entre experimentos: estatística da
distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 55
Tabela 55. Jatropha elliptica, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da
área hemorrágica (mm).............................................................................. 55
Tabela 56. Jatropha elliptica, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).................. 55
Tabela 57. Jatropha elliptica, teste de Tukey (q), diâmetro da área hemorrágica
(mm)........................................................................................................... 56
xi
Lista de figuras
Figura 1. Localização da região de Curituba, Sergipe..................................................... 18
Figura 2. Localização das regionais de saúde e os domínios morfoclimáticos das
regiões de Sergipe............................................................................................ 25
Figura 3. Regressão dos valores probíticos sobre as dosagens: comparações entre as
retas.................................................................................................................. 35
Figura 4. Apodanthera villosa, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato e
veneno) e controle (veneno).......................................................................... 46
Figura 5. Apodanthera glaziovii, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato
e veneno) e controle (veneno)......................................................................... 50
Figura 6. Jatropha mollissima, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato e
veneno) e controle (veneno)............................................................................ 53
Figura 7. Jatropha elliptica, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato e
veneno) e controle (veneno)............................................................................ 57
Figura 8. Manchas hemorrágicas dos extratos das plantas: Apodanthera villosa e
Apodanthera glaziovii...................................................................................... 58
Figura 9. Manchas hemorrágicas dos extratos das plantas: Jatropha mollissima e
Jatropha elliptica............................................................................................. 59
xii
Apêndices
Apêndice 1. Proporção de camundongos mortos/inoculados com relação à
concentração de extrato............................................................................ 99
Apêndice 2. Homogeneidade entre grupos controles: tempo de sobrevida (h)................ 100
Apêndice 3. Apodanthera villosa, estudo piloto: tempo de sobrevida (h)....................... 100
Apêndice 4. Apodanthera villosa: tempo de sobrevida (h).............................................. 101
Apêndice 5. Apodanthera glaziovii: tempo de sobrevida (h)........................................... 101
Apêndice 6. Jatropha mollissima: tempo de sobrevida (h).............................................. 102
Apêndice 7. Jatropha elliptica: tempo de sobrevida (h).................................................. 102
Apêndice 8. Apodanthera villosa: diâmetro da área hemorrágica (mm)......................... 103
Apêndice 9. Apodanthera glaziovii: diâmetro da área hemorrágica (mm)...................... 103
Apêndice 10. Jatropha mollissima: diâmetro da área hemorrágica (mm)....................... 103
Apêndice 11. Jatropha elliptica: diâmetro da área hemorrágica (mm)........................... 103
Apêndice 12. Diâmetro da área hemorrágica com relação à concentração de extrato..... 104
Apêndice 13. Espécies de plantas citadas como antiofídicas na literatura...................... 105
xiii
Resumo
Foram analisados os aspectos epidemiológicos dos acidentes ofídicos que ocorreram
em Sergipe no período 1999-2002 e verificado as ações de plantas indicadas popularmente
como antiofídicas na catinga, utilizando o veneno de Bothrops jararaca (Viperidae) como
modelo experimental.
No período analisado ocorreram 95 casos de acidentes ofídicos notificados; os
coeficientes de incidência anual variaram entre 0,16 a 0,88 casos por 10000 habitantes da
zona rural. Os homens foram mais atingidos; a maior ocorrência dos acidentes foi na faixa
etária até 20 anos; no período anual seco (setembro a abril) ocorreram mais acidentes.
Acidentes causados por Bothrops foram mais freqüentes (93%), seguidos por Crotalus
(5%) e Micrurus (1%). Dois acidentes notificados como tendo sido causado por Lachesis
provavelmente estão em erro. A soroterapia foi aplicada em pelo menos 65% dos casos, os
demais não constam nas notificações.
Para verificar as ações antiofídicas das plantas, primeiro foram determinados os
parâmetros biológicos das ações letais e hemorrágicas do veneno de B. jararaca, através de
comparações entre retas das regressões e análises probíticas. A DL50 do veneno foi 37.1g,
a DMH foi 0.24g; as doses-desafio utilizadas nos experimentos foram 2DL50(74.2g) e
5DMH (1.2g).
Três plantas da caatinga foram analisadas para verificar a inibição das ações
hemorrágicas e letais do veneno: Apodanthera villosa, batata-de-teiú (Cucurbitaceae);
Apodanthera glaziovii, cabeça-de-negro (Cucurbitaceae) e Jatropha mollissima, pinhão-
bravo (Euphorbiaceae). A planta Jatropha elliptica, batata-de-teiú (Euphorbiaceae),
coletada no cerrado do rio Tocantins (Peixe, To), também foi analisada. O extrato aquoso
da A. villosa (1mg) aumentou o tempo de sobrevida dos animais experimentais quando
comparado com os animais controles inoculados apenas com o veneno de B. jararaca. As
manchas hemorrágicas dos animais experimentais, inoculados com veneno mais os
extratos aquosos de A. villosa (1.0, 3.0 e 6.0mg), A. glaziovii (1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg), J.
mollissima (1.0, 3.0 e 6.0mg) e J. elliptica (1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg), foram
significantemente menores do que os controles.
xiv
Abstract
Epidemiological aspects of the ophidic accidents ocurred in Sergipe in the period of
1999-2002 were analysed and verified the actions of the “caatinga” plants popularly
indicated as antiophidic, using the venom of Bothrops jararaca as experimental model.
It was notified 95 cases of ophidic accidents in the analysed period; the annual
cofficient of incidence varied from 0.16 to 0.88 cases per10000 habitants in the rural zone.
Man were most hited; the major ocurrence of the accidents was in the age class up to 20
years; in the dry period (September to April) ocurred more accidents. Accidents caused by
Bothrops were the most frequent (93%); followed by Crotalus (5%) and Micrurus (1%).
Two accidents notified as beeing caused by Lachesis are probably in error. The
sorotherapy was applied in at least 65% of the cases, the others are not in the
notifications.
In order to verify the antiophidic actions of the plants, first it were determined the
biological parameters of the lethal and hemorragic actions of the venom of B. jararaca, by
comparisons between the regression lines and probitic analysis. The LD50 of the venom
was 37.1g, the MHD was 0.24g; the limit dose (dose-desafio) used in the experiments
were 2 LD50 (71.2g) and 5MDH (1.2g).
Three “caatinga” plants were analysed in order to verify the inhibiton of the
haemorragic and lethal actions of the venom: Apodanthera villosa, batata-de-teiú
(Cucurbitaceae); Apodanthera glaziovii, cabeça-de-negro (Cucurbitaceae) and Jatropha
mollissima, pinhão-bravo (Euphorbiaceae). The plant Jatropha elliptica, batata-de-teiú
(Euphorbiaceae), collected in the “cerrado” area of rio Tocantins (Peixe, To), was also
analysed. The aqueous extract of A. villosa (1mg) increased the survivorsip time in the
experimental animals when compared to control animals inoculated only with the venom
of B. jararaca. The hemorragic marks of the experimental animals, inoculated with venom
plus the aqueous extract of A. villosa (1.0, 3.0 e 6.0mg), A. glaziovii (1.0, 3.0, 6.0 e
10.0mg), J. mollissima (1.0, 3.0 e 6.0mg) and J. elliptica (1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg) were
significantly smaller then controls.
1
Introdução
Ofidismo é o estudo do veneno de serpentes, cujo entendimento inclui não só os
aspectos relacionados à composição e ações destes, mas deve também englobar os demais
fatores diretamente relacionados aos envenenamentos, tais como, avaliações
epidemiológicas regionais dos acidentes ofídicos, análise dos parâmetros biológicos dos
venenos e aplicação da soroterapia (Vital Brazil, 1987; Raw et al., 1991; Furtado et al,
1991a, 1991b; Pinho & Pereira, 2001). Neste contexto, situam-se também as diversas
práticas populares utilizadas nos casos de envenenamentos por serpentes, dentre as quais,
a mais importante é a utilização das plantas medicinais regionais, como coadjuvantes à
soroterapia ou como medicamento alternativo aplicado na falta de recursos soroterápicos
(Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000; Mors et al, 2000; Cardoso, 2003).
Cerca de 300 espécies de serpentes estão distribuídas nas várias formações vegetais
da América do Sul; destas, aproximadamente 90 espécies são venenosas, pertencentes à
família Viperidae, repesentada por várias espécies dos gêneros Atropoides, Bothriechis,
Bothriopsis, Bothrocophias, Bothrops, Crotalus, Lachesis e Porthridium e família
Elapidae, com apenas um gênero sul americano, Micrurus, composto por diversas espécies
(Campbel & Lamar, 1989; Peters & Orejas-Miranda, 1986)
No Brasil, distribuídas em todos os domínios morfoclimáticos, ocorrem
aproximadamente 70 espécies de serpentes venenosas, pertencentes aos gêneros
Bothriopsis, encontradas na amazônia; Bothrops e Crotalus, na amazônia, caatinga,
cerrado e mata atlântica; Lachesis, na amazônia e mata atlântica e Micrurus, na amazônia,
caatinga, cerrado e mata atlântica (Peters & Orejas-Miranda, Vanzolini et al., 1980;
Vanzolini & Caleffo, 2002; Cunha & Nascimento, 1993). Estas espécies causam cerca de
vinte mil acidentes ofídicos por ano, com incidências que variam entre sete a vinte e quatro
casos anuais em cada cem mil habitantes, dependendo da região (Brasil, 1991,1999). Cerca
de noventa por cento dos acidentes são provocados por várias espécies do gênero Bothrops,
oito por cento dos envenenamentos são causados por Crotalus e, menos freqüentes, dois
por cento são causados por Micrurus e Lachesis (Brazil, 1901; Brasil, 1999; Amaral et al.,
2
1986). Nas regiões mais carentes, com dificuldades de assistência à saúde, os índices de
acidentes ofídicos podem estar subestimados (Brasil, 1991,1999).
Apesar das estratégias do Ministério da Saúde em distribuir imunobiológicos, como
os soros antiofídicos, para as Secretarias Estaduais de Saúde, frequentemente os casos de
envenenamentos por serpentes (e outros animais) são tratados com preparados populares
feitos com plantas medicinais regionais. Muitas destas plantas estão identificadas, porém a
maioria nunca foi estudada para verificar suas ações e validar os usos, as quais são
indicadas por rezadores e raizeiros somente pelos nomes populares. Um problema sobre o
reconhecimento das plantas pelos nomes populares é que estes variam de região para
região, dificultando ainda mais os estudos. Por exemplo, as plantas cabeça-de-negro e a
batata-de-teiú são citadas na literatura como tendo propriedades antiofídicas, mas existem
pelo menos dez espécies com estes nomes, distribuídas em todas as regiões brasileiras
(Mors et al., 2000; Martz, 1992). Em 1998 foi criada a Subcomissão Nacional de
Assessoramento em Fitoterápicos (Conafit) pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária
do Ministério da Saúde. A Conafit recomenda que sejam realizados estudos sobre as
plantas medicinais regionais utilizadas popularmente, como forma de validar o uso das
plantas e proteger o patrimônio genético deste recurso natural (Brasil, 1999).
O presente estudo é sobre ofidismo, analisado sob três aspectos. O primeiro é uma
análise epidemiológica dos acidentes ofídicos que ocorrem na região de Sergipe, relatando
os índices de incidência por envenenamentos crotálico, botrópico, laquético e elapídico
ocorridos na região, bem como analisa as variáveis epidemiológicas associadas (Bochner
& Struchiner, 2003; Rouquayrol & Almeida Filho, 1999). O segundo é relacionado aos
parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca (Wied, 1824), cujos ensaios são
necessários para servirem como modelo (controle) na verificação da eficácia das plantas
estudadas. O veneno de B. jararaca foi escolhido como modelo porque não existe
disponível para estudo venenos das espécies de Bothrops da região e o veneno de
B.jararaca se ajusta perfeitamente para os objetivos do trabalho. O terceiro é com relação à
verificação da eficácia de plantas utilizadas popularmente como antiofídicas na caatinga de
Sergipe.
As metodologias da parte experimental são adequadas às questões para verificar se
os extratos das plantas inibem a hemorragia local causada pelo veneno botrópico e se
3
diminuem o tempo de letalidade do veneno. Os aspectos bioquímicos, farmacológicos e
fisiológicos dos fenômenos observados são discutidos com base na literatura considerada
relevante no contexto das questões delimitadas no estudo. A epidemiologia dos acidentes
ofídicos da região de Sergipe é analisada entre 1999 a 2002, cujos dados estão
informatizados no Setor de Vigilância Epidemiológica da Secretaria da Saúde do Estado de
Sergipe. Os dados anteriores a 1999 não estavam disponíveis. O estudo como um todo –
plantas medicinais, veneno de B. jararaca e epidemiologia dos acidentes ofídicos –,
apresenta informações e discute resultados que, somados a outros, poderão contribuir com
as pesquisas da mesma linha que são realizadas por instituições acadêmicas, bem como
poderão contribuir com informações que possam ser utilizadas pelos órgãos
governamentais locais da área da saúde e meio ambiente.
A apresentação do trabalho está na seguinte seqüência: i) breve abordagem da
literatura sobre os aspectos populares e científicos do ofidismo e das plantas medicinais
utilizadas como antiofídicas. A literatura sobre ofidismo abrange a origem e a evolução do
estudo sobre os venenos de serpentes, até os estudos de Vital Brazil, porque após esta fase
os trabalhos tratam principalmente da bioquímica e da farmacologia, cuja literatura,
embora vasta, traz poucas informações gerais no contexto das questões da dissertação. A
literatura sobre plantas segue a mesma estratégia: uma abordagem sobre o conhecimento
popular das plantas, com base nas representações, até a década de 80, porque após este
período predominam os trabalhos sobre bioquímica e síntese dos produtos naturais das
plantas. Esta literatura é vasta e será melhor aproveitada nas discussões, ii) metodologia
do trabalho, descrevendo os métodos utilizados para a análise epidemiológica dos
acidentes ofídicos de Sergipe, mostrando a área de coleta das plantas, os protocolos
experimentais para os parâmetros biológicos do veneno e verificação da eficácia das
plantas; as estatísticas utilizadas são descritas em todas as análises, iii) resultados,
apresentados na seguinte ordem: 1. epidemiologia dos acidentes ofídicos; 2. parâmetros
biológicos do veneno de Bothrops jararaca – dose mínima hemorrágica (DMH) e DL50; 3.
eficácia das plantas – DL50, inibição da letalidade do veneno e inibição da hemorragia
local; iv) discussão dos resultados, v) conclusões gerais e vi) referências.
4
Literatura
A origem e evolução do estudo dos venenos ofídicos
O conhecimento que os povos antigos tinham sobre ofidismo era fundamentado
principalmente nas representações, carregadas de simbolismos e em grande parte
religiosas. Dentre estas, destacava-se o mito de que as serpentes possuíam “espíritos
ruins”, os quais eram responsáveis pelos sintomas do envenenamento. Estes mitos não
impediram, entretanto, que Athanasius Kirsher, em 1675, incluísse várias espécies de
cobras na Arca de Noé idealizada por ele. Os escritos de Aristóteles (384 – 322 a.C.),
reunidos em nove volumes na sua “Historia animalium” e as descrições um tanto
fantasiosas de Plínio (23 – 79 d.C), reunidas em 37 volumes na sua “História Natural”,
foram os primeiros relatos sobre a história natural das serpentes, principalmente as
descrições de Aristóteles, que foi um grande zoólogo, o primeiro a classificar os
organismos com base nas características morfológicas (Goin, Goin & Zug, 1978; Medawar
& Medawar, 1977).
Os primeiros relatos sobre experimentos com venenos de serpentes foram publicados
em 1664 pelo italiano Francesco Redi (1626-1696). Ele relatou que o veneno das serpentes
se encontrava em um líquido amarelo, o qual fluía por sulcos através dos dentes. Redi
observou que alguns animais sobreviviam sem tratamento ao envenenamento por serpentes
e descreveu diferenças entre as venenosas e não-venenosas, utilizando os dentes como
principal caráter definidor. Estas diferenças foram também relatadas pelos naturalistas
ingleses John Ray em 1693 e Patrick Russel em 1787. Ray escreveu a clássica obra
“Synopsis methodica animalium quadrupedum et serpentini”, na qual diferencia as
serpentes peçonhentas das não peçonhentas (Goin, Goin & Zug, 1978; Habermehl, 1994;
Hawgood, 1999).
O primeiro experimento in vitro com venenos de serpentes foi realizado pelo inglês
Richard Mead, em 1708. Ele caracterizou o veneno de cobras no grupo dos ácidos, porque
associou algumas propriedades do veneno com compostos ácidos conhecidos na época. A
partir daí surgiu a idéia de que um álcali volátil, como o amoníaco, seria o antídoto para
venenos ofídicos.
5
Um século após os experimentos de Francesco Redi, Ablé Felice Fontana (1730-
1805), também italiano, escreveu “Traité sur le vénin de la vipère”, um texto clássico de
toxinologia, traduzido do italiano e publicado em 1781. Ao lado dos trabalhos de Redi e
Mead, embora com muitos anos de diferença, os trabalhos de Fontana foram pioneiros em
utilizar a experimentação nos estudos sobre venenos de cobras. Felice Fontana descreveu a
glândula e o ducto de veneno, o sulco dos dentes e o mecanismo pelo qual as serpentes
articulam a boca e inoculam o veneno na presa. Ele descreveu também algumas ações
biológicas do veneno de Vipera berus (Viperidae), como a hemorragia e miotoxicidade,
além de ter demonstrado que o veneno de serpentes não era um ácido. Desse modo,
Fontana mostrou que o amoníaco utilizado nos envenenamentos ofídicos também não era
eficaz para neutralizar as ações do veneno de serpentes. Apesar disso, o uso do amoníaco
continuou a ser utilizado nos casos de envenenamentos durante os 100 anos seguintes
(Hawgood, 1995; Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000).
Um dos pioneiros nas pesquisas sobre os efeitos sistêmicos dos envenenamentos
ofídicos foi o médico inglês Joseph Fayrer (1824-1907). Ele trabalhou no Serviço Médico
da India e, em 1872, escreveu um tratado tão longo quanto o título “The thanatophidia of
India being a description of the venomous snakes of the Indian Peninsula with an account
of the influence of their poison on life and a series of experiments”. Fayrer relacionou com
o curare os efeitos do envenenamento por Naja naja (Elapidae) – bloqueio da junção
neuro-muscular. Em 1875 uma comissão médica da India apoiou definitivamente os
estudos de Fontana, Russel e Fayrer sobre a ineficácia do amoníaco em inibir o veneno de
serpentes e, em 1878, Brunton e Fayrer relataram que o permanganato de potássio destruía
in vitro a atividade letal do veneno de N. naja, mas não protegia completamente o
organismo quando submetido a altas doses de veneno (Hawgood, 1996, Otero, Fonnegra &
Jiménez, 2000).
Os estudos sobre a toxinologia de venenos ofídicos avançaram bastante durante a
segunda metade do século XIX. Em 1860, Silas Weir Mitchell descreveu a natureza
proteica do veneno de Crotalus horridus; em 1873, Brunton Fayrer relataram que a parada
respiratória era a causa da morte pelo envenenamento de C. horridus; em 1890, Victor
Razotzi mostrou experimentalmente que a parada respiratória causada pelo veneno de C.
6
horridus era devido ao bloqueio da junção neuro-muscular, e que este veneno tinha ação
miotóxica sobre o músculo cardíaco e esquelético (Hawgood, 1996).
No Museu Nacional do Rio de Janeiro, em 1881, o fisiologista João Batista de
Lacerda relatou sobre a eficácia do permanganato de potássio (1%) em neutralizar in vitro
a ação letal do veneno botrópico. O estudo de Lacerda foi realizado independentemente
das pesquisas de Brunton e Fayrer de 1878, os quais também relataram o uso do
permanganato nos envenenamentos ofídicos. Embora ineficaz, o uso do permanganato foi
utilizado até o desenvolvimento da soroterapia (Brazil, 1911; Hawgood, 1996; Otero,
Fonnegra & Jiménez, 2000; Cardoso, 2003).
Quando o médico francês Albert Calmette (1863-1933) iniciou em 1891 seus
estudos sobre o veneno de Naja naja, no laboratório de Roux no Instituto Pasteur, nenhum
método era eficiente para neutralizar venenos de cobras. Fundamentado nas descobertas de
Behring e Kitassato sobre a imunidade contra as toxinas da difteria e tétano, publicadas
em 1890, Calmette verificou que doses repetidas do veneno de N. naja (recebido da
Indochina) injetadas em cavalos, conferiam imunidade aos animais. Estimulado pelos
resultados, Calmette aperfeiçoou o método para neutralizar o veneno de várias espécies de
serpentes e o seu eu protocolo foi adotado por Vital Brazil no Brasil em 1898, por
MacFarland nos Estados Unidos em 1899, por Tidswell na Austrália em 1901, por Lamb
na India em 1904 e por Ishizaka no Japão em 1907.
As pesquisas realizadas após a descoberta de Calmette apontaram para as
especificidades bioquímicas dos venenos, porque o soro elaborado com o veneno de Naja
não neutralizava o veneno de outras serpentes, nem mesmo as espécies da família
Elapidae. Calmette então formulou a hipótese de que os venenos de serpentes possuíam
dois tipos de proteínas (Hawgood, 1992, 1999; Vital Brazil, 1987): uma predominante nos
viperíneos, que era destruída pelo calor a 75-85o
C, de alto peso molecular; outra
predominante nos elapídeos, mais resistente ao calor e de baixo peso molecular. Calmette
não testou a sua hipótese.
Coube ao médico brasileiro Vital Brazil Mineiro da Campanha dar continuidade aos
estudos de Calmette. Os experimentos de Vital Brazil sobre imunização de animais contra
o veneno de cobras foram iniciados em 1897, em São Paulo, num anexo do Instituto
Bacteriológico (posteriormente Instituto Serumterápico e atualmente Instituto Butantan,
7
vinculado à Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo). Vital Brazil foi quem
demostrou a especificidade do soro antiveneno e desenvolveu o soro monovalente contra o
veneno de Bothrops jararaca e Crotalus durissus terrificus (Hawgood, 1992; Vital Brazil,
1987; Raw & Sant´Anna, 2002).
Vital Brazil realizou vários estudos; no presente contexto destacam-se as suas
pesquisas sobre a catalogação das serpentes venenosas brasileiras, descrições da
morfologia dos dentes e glândulas de veneno, estudos sobre a toxicidade do veneno de
Crotalus durissus terrificus, Bothrops jararaca, B. alternatus e B. jararacussu para
determinar a dose letal (em microgramas) dos venenos e descrever os efeitos
fisiopatológicos dos envenenamentos (Brazil, 1901, 1901a). Num dos experimentos, ele
inoculou os venenos pelas vias gástrica (oral), hipodérmica, venosa, intramuscular e
intraserosa (intraperitoneal), utilizando pombos, cobaias, coelhos e cães. Ele distinguiu
dois fenômenos distintos das ações dos venenos sobre o organismo, os quais denominou
fenômenos locais e fenômenos gerais (sistêmicos), descrevendo também alguns sintomas
específicos.
Com relação à composição química dos venenos, Vital Brazil relatou a presença de
água, sais, materiais corantes e substâncias albuminóides, as quais considerou como partes
tóxicas do veneno. Após imunizar cães contra o veneno de cascavel e jararacas,
separadamente, ele verificou que o soro do animal imunizado contra o veneno da jararaca
não tinha ação sobre o veneno da cascavel, bem como o soro ativo contra o veneno
crotálico se mostrou inócuo sobre o veneno botrópico (Brazil, 1901b).
Atualmente o soro antiveneno ofídico é obtido de cavalos hiperimunizados contra o
antígeno correspondente – o veneno. Depois de aplicadas algumas doses, a concentração
de anticorpos é grande e o animal é sangrado. As hemácias são colocadas para decantar, o
soro é retirado e as hemácias devolvidas ao cavalo, para o animal não ficar anêmico. A
fração de imunoglobulinas é precipitada com sulfato de amônia e depois tratada com
pepsina para digerir as proteínas e remover o segmento Fc das moléculas de anticorpo;
estas neutralizam o veneno (Raw & Sant’Anna, 2002).
Vital Brazil abriu o caminho para os estudos sobre a toxinologia de venenos
ofídicos. A partir dos seus trabalhos no Instituto Butantan inicia-se uma nova fase (revisão
em Gutiérrez, 2002) na toxinologia de venenos de serpentes, com trabalhos cada vez mais
8
voltados para estudos sobre a farmacologia e bioquímica dos venenos. Um dos trabalhos
pioneiros nesta área foi realizado por Slotta & Fraenkel-Conrat (1939), que purificaram e
cristalizaram a crotoxina, principal componente tóxico de várias espécies de Crotalus,
responsável pelas ações miotóxica e neutóxica do veneno crotálico. A descoberta da
bradicinina por Rocha e Silva, Beraldo & Rosenfeld (1949) inaugurou uma fase muito
importante na toxinologia de venenos ofídicos. A bradicinina, polipeptídeo isolado do
veneno de Bothrops jararaca, é liberada no plasma através da ação enzimática do veneno
botrópico e estimula a musculatura lisa, causando principalmente vasodilatação e aumento
da permeabilidade capilar.
Os trabalhos de Kondo et al. (1960) e Villarroel (1977) estabeleceram novos critérios
metodológicos das pesquisas sobre venenos de serpentes e soroneutralização cruzada. A
descrição da botroxina do veneno de Bothrops atrox, em 1976, por Stoker e Barlow, e os
trabalhos de Lomonte e Gutiérrez e colaboradores, nas décadas de 1980-2000, têm
contribuído com novas informações sobre os efeitos hemorrágicos causados pelo veneno
das viperíneas e crotalíneas, principalmente com relação ao estudo das miotoxinas
(proteínas com fosfolipase A2 da classe II) e metaloproteínas. Os trabalhos de Furtado e
colaboradores, realizados no Instituto Butantan nas décadas de 1980-90, estudaram vários
aspectos relacionados à variabilidade dos venenos de serpentes e propuseram
padronizações de métodos para verificar atividades indutoras de hemorragia, necrose,
edema e atividades caseinolíticas, bem como as atividades promotoras da coagulação do
fibrinogênio e do plasma.
A revisão mais recente sobre a toxinologia do veneno de serpentes foi realizada por
Gutiérrez (2002), a qual traz excelentes descrições dos principais estudos sobre a
composição química e mecanismo da ação das toxinas dos venenos de serpentes da
América do Sul. Gutiérrez descreveu as neurotoxinas dos venenos, as proteínas que afetam
a coagulação sanguínea, as inflamações e necroses musculares induzidas por toxinas dos
venenos, as metaloproteínas e fosfolipases. Além disso, ele analisou criteriosamente os
estudos sobre as novas terapias antiofídicas e estudos clínicos para compreensão da
fisiopatologia dos envenenamentos ofídicos, analisando também o desenvolvimento de
novas tecnologias para a melhoria da qualidade dos antivenenos produzidos nas
instituições sul-americanas.
9
Plantas medicinais e ofidismo
O conhecimento sobre as plantas medicinais foi adquirido com base nas experiências
individuais e repassados pelas gerações através das representações populares. Os textos dos
babilônios, assírios e hebreus já traziam as utilizações terapêuticas de preparados com
plantas, mas foram os gregos quem sistematizaram o uso de plantas medicinais, através de
relatos contidos nas obras de Aristóteles (384-322 a.C.), Hipócrates (460-377a.C.) e
Teofrasto (370-285 a.C.).
Dentre os relatos importantes sobre fitoterapia, são relevantes as descrições de
Pedanius Dioscórides (século I d.C.), contidas no tratado “Matéria Médica” com cerca de
600 plantas medicinais conhecidas na época; as descrições do alquimista Celsius na obra
“De Medicina” que relata usos de plantas e demais preparados, inclusive algumas
prescritas como antídotos contra venenos de serpentes, e as descrições dos romanos Plínio
(61-113 d.C.) e Galeno (130-200 d.C.), as quais contêm diversos preparados de plantas
para tratamento de doenças, traumatismos e outras indicações, mais ou menos como
elaborados atualmente (Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000).
Durante a Idade Média houve uma sensível redução nos relatos sobre fitoterapia. Na
segunda metade do século XV e no final do século XVIII ressurgiram as obras sobre
plantas medicinais, com destaque para as idéias de Paracelso, explicadas na Teoria das
Assinaturas. De acordo com esta teoria, os deuses teriam colocado indicadores nas plantas,
como sinais para orientar os humanos a descobrir o valor curativo destas, os quais seriam
revelados por intuições e antropomorfias, através de tentativas e erros. Por exemplo,
poderiam servir como antiofídicas as plantas que apresentassem algum caráter que
lembrasse o zig-zag da locomoção de serpentes ou qualquer aspecto da planta ou dos
frutos e sementes que sugerissem alguma semelhança com cobras; as plantas que
apresentassem coloração avermelhada nos frutos, flores ou folhas serviriam como anti-
hemorrágicas, devido à semelhança com a cor do sangue (Otero, Fonnegra & Jiménez,
2000).
No Brasil, um dos primeiros relatos sobre o uso de plantas para inibir os efeitos de
envenenamentos por serpentes foi feito no século XIX, através das descrições das viagens
que os dois naturalistas bávaros Johann Baptist von Spix (1781-1826) e Carl Friedrich
10
Phillip von Martius (1794-1868) empreenderam por diversas regiões brasileiras entre
1817-1820, a convite da arquiduquesa Leopoldina, no contexto cultural da vinda de vários
naturalistas ao Brasil em meados do século XVIII (Vanzolini, 1996). Em 1818, Spix e
Martius relataram que no arraial do Rio Verde, Minas Gerais, usava-se uma planta
genericamente conhecida como cainca nos envenenamentos por Bothrops urutu
(Viperidae) (Sommer, 1953). Na caatinga e no cerrado a cainca é o nome comum que se dá
a várias espécies de plantas da família Rubiaceae, também conhecida como cipó-cruz e
caninana; na Amazônia é conhecida popularmente como raiz-preta (Chiococca anguifuga
Mart.) (= C. brachiata Ruiz & Pav.). Com a morte de Spix, seu fiel amigo Martius
prosseguiu o trabalho de catalogar os exemplares dele e descrever a flora brasileira em uma
coleção de 15 volumes, reunidos na “Flora Brasiliensis”, obra clássica publicada em 1882
por Martius, em Munique (Sommer, 1953; Vanzolini, 1996).
Os primeiros livros que descreveram as propriedades curativas das plantas
medicinais brasileiras foram “Ensaio sobre o cinchoeiro e sua influência nas virtudes da
quina”, escrito pelo português Bernardino Antonio Gomes em 1812, e o livro “Systema de
Matéria Medica Vegetal Brasileira”, escrito por Henrique Velloso D’Oliveira, em 1854
(Cardoso, 2003; D’Oliveira, 1854). Gomes cita a planta Aristolochia sp como antiofídica.
D’Oliveira comenta sobre o uso das plantas conhecidas pelas propriedades medicinais,
citando os nomes populares e científicos. Para acidentes ofídicos, ele relatou o uso da raiz
tuberosa da jararaca ou erva-de-santa-maria (Dracontium polyphyllum L., Araceae) (= D.
asperum C.Koch). Interessante é que o uso antiofídico desta planta era recomendado
devido à semelhança com a cor “sarapintada” das serpentes, de acordo com a Teoria das
Assinaturas, de Paracelso. As demais plantas citadas por D’Oliveira como tendo
propriedades antiofídicas foram: a raiz da Arisaema phythonium (= Zomicarpa phytonium
(Mart.) Schott, Araceae), planta da caatinga que os índios empregavam no local da picada
quando envenenados por cobras; a raiz de cipó-de-jarrinha ou milome (Aristolochia
antihysterica) (= A. triangularis, Aristolochiaceae); o alecrim-bravo (Hypericum
laxiusculum, Hypericineae); Eupatorium crenatum (= Mikania cordifolia, Asteraceae);
orelha-de-onça (Cissampelos ovalifolia Chodat & Hassl., Menispermaceae); a fruta-de-
pombo (Erythroxylon anguifugum, Erythroxylaceae); a erva-mular ou curraleira (Croton
sp, Euphorbiaceae) e o tuiuiá ou abobrinha-do-mato (Bryonia bonariensis ficifolio) (=
11
Cayaponia bonariensis (Mill.) Mart. Crav., Cucurbitaceae). D’Oliveira cita no seu livro a
análise que Thomé Rodrigues Sobral fez da planta Aristolochia sp (citada Aristolochia
antihysterica), em Coimbra. Sobral encontrou “um princípio volátil aromático solúvel em
álcool, um princípio oleoso resinoso, um amargo análogo ao gentianino, uma porção
pequena de mucilagem, cal, potassa e ferro”, combinação que teria ação antiofídica
(D’Oliveira, 1854).
Ainda no final do século XIX, o botânico Schindler publicou no Rio de Janeiro um
catálogo das plantas medicinais brasileiras, com descrições das propriedades terapêuticas,
usos e doses administradas (Schindler, 1884). Ele relatou o uso de seis espécies de plantas
antiofídicas: i) a raiz do cipó-de-cobra (Cissampelos glaberrima St.Hill.,
Menispermaceae), ii) a raiz da orelha-de-onça (C. ebracteata, Menispermaceae), iii) o suco
do guaco (Mikania guaco Humb. & Bonpl., Asteraceae), iv) o suco da erva-de-cobra (M.
opifera) (= M. cordifolia Wild., Asteraceae), v) a raiz do para-tudo (Gomphrena officinalis,
Amaranthaceae), vi) o paracari ou hortelã-branco (Peltodon radicans Pohl, Labiatae).
Em 1888, Theodoro Peckolt e Gustavo Peckolt, pai e filho, escreveram um livro
sobre a história das plantas medicinais no Brasil, no qual constam descrições botânicas e
etnobotânicas, partes da planta utilizadas, composição química, usos industriais e
fitoterápicos e as doses utilizadas (Peckolt & Peckolt, 1888). Oito espécies de plantas,
pertencentes a 5 famílias, foram por eles descritas como antiofídicas: i) família Isoetaceae,
representada por Isoetes martii A. Braum, conhecida popularmente como batatinha-
d’água; ii) família Ophioglossaceae, representada por Ophioglossum palmatum Plum, cujo
nome popular é língua-de-víbora, é citada principalmente contra a mordida de “víboras”
(lagartos do gênero Diploglossus, que no imaginário popular vira cobra), e por Botrichium
virginicum Swartz, a língua-de-víbora-do-campo, iii) família Zamiaceae, representada por
Zamia brongniartii Wedd, popularmente conhecida como salgueiro-da-terra, da qual se
utiliza a goma do tronco contra mordidas de cobras, iv) famíia Commelinaceae,
representada por Tradescantia geniculata Velloso (= Gibasis geniculata (Jacq. Rohweder),
conhecida como trapoeiraba-efêmera, v) família Araceae, representada por Dracontium
polyphyllum L. (= D. asperum C. Kock, Araceae), popularmente conhecida como jararaca-
mirim; e Staurostigma luschnathianum C. Kock, popularmente conhecida como jararaca-
do-rio. Na maioria das preparações citadas por Peckolt & Peckolt (1888) eles
12
recomendaram também o uso de cachaça com as plantas, cujas infusões deveriam ser
bebidas ou aplicadas no local da mordida da cobra. Em 1914, Gustavo Peckolt continuou o
estudo sobre a história das plantas medicinais e úteis do Brasil, que ele iniciou com seu pai
em 1888. Gustavo descreveu o uso das sementes do araticum (Annona furfuracea St.-Hill,
Anonaceae), cuja mistura com cachaça era indicada como um bom antídoto nos casos de
envenenamento por cascavel (Peckolt, 1914).
O brasileiro Manuel Pio Corrêa (1874-1934) foi naturalista do Jardim Botânico do
Rio de Janeiro e um dos pioneiros nos estudos sobre plantas medicinais. Todas as
informações relatadas por Pio Corrêa sobre a utilização das plantas foram reunidas em seis
volumes na clássica obra “Dicionário das plantas úteis do Brasil”, com a colaboração de
Leonam de Azeredo Penna. Cada espécie relatada apresenta uma diagnose, nomes
populares e informações sobre a utilização como alimento, aplicações industriais e
terapêuticas. As plantas citadas no dicionário como antiofídicas são (ver também Pio
Corrêa, 1909): a raiz do cipó-de-cobra (Cissampelus glaberrima St. Hil, Menispermaceae),
citada também por Shindler (1884); a erva-de-jararaca (Dracontium asperum C. Kock,
Araceae); as folhas de contra-cobra (Aegiphila salutaris H.B.K., Verbenaceae); a abutua-
miúda (Cocculus filipendula M., Menispermaceae); a contra-erva, calunga ou jarrinha
(Aristolochia trilobata, Aristolochiaceae); a batatinha-d’água (Isoetes martii, Isoetaceaea)
e o alecrim-bravo (Hypericum laxiusculum, Hypericineae). Estas duas últimas foram
também citadas por Peckolt & Peckolt (1888) e D’Oliveira (1854).
Silveira (1921) descreveu o uso do agrião-do-brejo, Eclypta alba (= E. prostrata (L.)
L. Asteraceae) contra picadas de serpentes, planta citada na literatura como antiofídica
desde 1882, quando Martius publicou a “Flora Brasiliensis”. Renato Braga escreveu um
também clássico trabalho sobre etnobotânica, “Plantas do Nordeste, especialmente do
Ceará” (Braga, 1960). Neste livro, ele relatou o uso de plantas indicadas nos casos de
envenenamentos por serpentes, como a raiz-preta (Chiococca anguifuga, Rubiaceae),
citada também por Martius em 1818; a milho-de-cobra (Dracontium asperum, Araceae),
também relatada como antiofídica por Pio Corrêa (1909); a língua-de-tiú (Casearia
sylvestris Swartz, Flacurtiaceae); a erva-de-cobra (Mikania cordifolia Willd, Asteraceae) e
o paracari ou hortelã-bravo (Peltodon radicans Pohl, Labiatae).
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Na década de 1980, houve um expressivo avanço nos estudos sul-americanos sobre
plantas medicinais, principalmente as antiofídicas: em vez de citar os usos das plantas
apenas com base nas representações populares, como ainda hoje ocorre na maioria das
publicações, os efeitos das plantas começaram a ser verificados biológica, bioquímica e
farmacologicamente, através de experimentos controlados (e.g. Pio Corrêa, 1909; Vieira,
1992; Caribé & Campos, 1997; Simões et al., 1998; Agra, 1996). Inicia-se então uma nova
fase, com trabalhos cada vez mais voltados para estudos sobre a bioquímica e síntese de
produtos naturais das plantas, como, por exemplo, a descoberta das cabenegrinas I e II,
substâncias isoladas de uma planta supostamente amazônica, que inativaram o veneno de
Bothrops atrox (Nakagawa et al.,1982).
No Brasil, o trabalho de Calixto e colegas, realizado em 1985, foi um dos pioneiros
nesta linha de experimentos controlados com plantas medicinais antiofídicas (ver Martz,
1992). Eles trabalharam com o extrato bruto de Mandevilla velutina (Apocynaceae) e o
veneno de B. jararaca, utilizando útero isolado de rato e verificaram que o extrato teve
ação sobre a bradicinina, um peptídeo hipotensor liberado pelo veneno de B.jararaca,
descoberto por Rocha e Silva e colaboradores em 1949. Assim foram os estudos com a
atropina, extraída de Atropa belladonna L. (Solanaceae), que protege o organismo contra
as ações sinérgicas da toxina F7 do veneno da mamba Dendroaspis polylepis polylepis
(Elapidae) e os trabalhos do químico de produtos naturais Walter Mors, cuja equipe de
colaboradores isolou os compostos wedelolactona, sitosterol e stigmasterol da planta
Eclipta prostrata L. (Asteraceae), mostrando que o extrato protegeu as ações miotóxicas
do veneno de Crotalus durissus, inibindo as ações das cininas. O estudo de Mors e
colaboradores utilizou preparações de músculo esquelético (Mors et al., 1989).
As melhores revisões sobre plantas antiofídicas são as de Martz (1992), sobre os
extratos de plantas com potencial em neutralizar as toxinas dos venenos de cobras, na qual
ele relata o uso de compostos isolados de plantas com ação antiofídica; Pereira et al.
(1994), sobre compostos isolados de plantas e descreve alguns prováveis mecanismos de
ação, e os estudos realizados por Castro et al. (1999) e Otero, Fonnegra & Jiménez (2000),
os quais verificaram a neutralização das ações dos venenos por alguns extratos de plantas
da Costa Rica e da Colombia, além de citarem cerca de 85 espécies de plantas utilizadas
como antiofídicas com base nos relatos populares.
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Materiais e Métodos
1. Epidemiologia
i) Coleta de Dados: Os dados para as análises epidemiológicas dos acidentes ofídicos
ocorridos em Sergipe foram obtidos nas fichas de notificação de acidente por animais
peçonhentos do Sinam Windows – versão 4.0DocumentaçãoDicionário de
DadosDICANIMAIS-DELPHI.doc 07/03/2002, os quais foram cedidos pela vigilância
epidemiológica da Secretaria da Saúde do Estado de Sergipe.
ii) Variáveis: Para as análises utilizei as seguintes variáveis: número de acidentes ofídicos
por ano, idade, sexo dos acidentados, tempo decorrido entre o acidente e o atendimento,
número de ampolas de soros antiofídicos (botrópico, crotálico, laquético e elapídico)
utilizadas durante o período e classificação quanto a gravidade do caso, segundo critérios
estabelecidos pela Fundação Nacional da Saúde (Brasil, 1999).
iii) Análise dos Dados: Para compor o quadro epidemiológico, inicialmente foram feitas as
distribuições de freqüências destas variáveis com relação ao município e mês de ocorrência
do acidente, tempo decorrido entre o acidente e o atendimento, partes do corpo atingidas e
às alterações locais e sistêmicas decorrentes dos envenenamentos ofídicos. Após verificar a
distribuição de cada variável, as seguintes análises foram feitas: i) a incidência dos
acidentes ofídicos (Rouquayrol & Almeida Filho, 1999) através do quociente entre o
número de casos ocorridos nas áreas rurais de Sergipe durante o período 1999-2002 e o
número de pessoas expostas, multiplicado pela população de referência, neste caso 10000
indivíduos, ii) as proporcões dos acidentes ofídicos com relação às diferentes regiões
ecológicas de Sergipe, idade e sexo dos acidentados e a sazonalidade dos acidentes, iii) os
sintomas (locais e sistêmicos) com relação ao tempo decorrido entre o acidente e a
soroterapia, iv) partes do corpo atingidas e gravidade dos casos. A estatística qui-quadrado
foi utilizada para verificar as hipóteses nulas de proporções iguais ou desiguais, conforme
o caso, e de homogeneidade entre as variáveis.
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2. Parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca
Os seguintes testes foram realizados para analisar os parâmetros biológicos do
veneno: dose letal 50% (DL50) e dose mínima hemorrágica (DMH). Estes testes são
importantes para verificar as doses-desafios e a eficácia das plantas em inibir o veneno.
i) Veneno: Mistura de veneno liofilizado de B. jararaca, procedente da Seção de Venenos
do Instituto Butantan. A mistura foi estocada e mantida a -20ºC até o momento de uso.
ii) Animais: Camundongos Swiss, não-isogênicos, de ambos os sexos, pesando entre 18 e
22 g. Os animais foram fornecidos pelo Biotério Central da Universidade Federal de
Sergipe.
iii) Dose Letal 50% (DL50): A DL50 é a unidade tóxica do veneno, definida como a
quantidade de veneno capaz de em 48 horas provocar a morte de 50% dos animais
inoculados por via intraperitoneal (Vilarroel, 1977). Com base na DL50 foi determinado a
concentração da dose-desafio dos experimentos de inibição da letalidade do veneno pelos
extratos.
iv) Experimentos e concentrações DL50: Fiz seis experimentos em dias diferentes para a
determinação da dose letal do veneno de B. jararaca; destes, quatro foram utilizados para
análises porque apresentaram relação mortos/nº de animais inoculados proporcional ao
aumento das concentrações do veneno. Os dois primeiros foram descartados porque as
doses não estavam bem determinadas e ficaram muito baixas (sobreviveram todos os
animais) ou muito altas (morriam todos os animais). As concentrações do veneno em todos
os experimentos foram: 23.0, 27.6, 33.1, 39.7 e 47.6 µg. O intervalo entre as doses foi
estabelecido com base na DL50 do veneno de B. jararaca já determinado no Instituto
Butantan, por isso a menor dose de 23.0µg, menor do que a DL50 do veneno, foi
estabelecida como um dos extremos; a partir desta foram determinadas as demais doses
utilizando um fator de diluição de 1.2 (padronizado para estudos com veneno). Para cada
concentração foram utilizados seis camundongos, inoculados via intraperitonial (i.p.) com
0,5 ml de veneno dissolvido em NaCl 0,9%.
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v) Análise dos dados DL50: A dose letal 50% do veneno foi determinada com base na razão
entre os camundongos mortos e o número total de animais inoculados com o veneno,
valores que expressam a freqüência com que uma observação está acima do valor esperado
na distribuição normal, conhecida como valores probíticos (Fisher, 1949). Foram
utilizados dois métodos para encontrar os valores probíticos: o primeiro foi através do
programa de computador elaborado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para
determinar a regressão linear e a dose letal 50%; o segundo foi através de regressões
lineares, utilizando a variável dependente (y) como probit e a variável independente (x)
como log da dose, o ‘b’ é o aumento dos valores probíticos de acordo com o aumento do
log da dose. Nos ensaios biológicos com venenos de serpentes, geralmente a distribuição
de freqüência da dose letal individual não é normal, quando a dose de veneno é colocada
na abscissa; para torná-la normal ou aproximadamente normal a dose foi transformada em
unidades logaritmizadas. Estas doses transformadas são freqüentemente chamadas
dosagens (Sokal & Rholf, 1995). As comparações entre os dois métodos foram feitas para
verificar se os resultados eram iguais. A seqüência de análise dos dados foi: i) para cada
experimento determinei a regressão linear e a DL50 no programa, ii) depois as doses foram
logaritimizadas e substituídas nas respectivas equações da regressão (x), para encontrar o
valor probítico de cada dose (y), iii) para cada experimento fiz uma regressão para verificar
correlações entre as doses e os valores probíticos, iv) após determinar a regressão para
cada experimento, fiz uma comparação simultânea entre as 4 retas das regressões
(Vanzolini, 1993), v) por último fiz uma análise probítica conjunta para encontrar a DL50
de todos os ensaios. O resultado da análise probítica conjunta foi comparado com a
equação geral das 4 retas para verificar e confirmar as análises (Fisher, 1949; Fisher &
Yates, 1953; Zar, 1996).
vi) Dose Mínima Hemorrágica (DMH): A dose mínima hemorrágica é definida como a
menor quantidade de veneno (g) capaz de produzir uma área hemorrágica de 10 mm de
diâmetro em animais experimentais (Castro et. al., 1999; Furtado et. al., 1991, Bolaños,
1984). Com base na DMH foi determinada a dose-desafio utilizada para testes de inibição
da hemorragia local do veneno pelos extratos.
17
vii) Experimentos e concentrações DMH: Fiz cinco experimentos para determinar a DMH
do veneno de B.jararaca. Apenas dois experimentos foram utilizados para análise por
apresentarem resultados mais coerentes, com diâmetros da hemorragia cerca de 10mm e
proporcionais às concentrações do veneno. Os demais foram descartados, porque as doses
utilizadas eram muito baixas (os animais não apresentaram hemorragia) ou muito altas
(hemorragia maior do que 10mm). Experimento 1: concentrações 0.10, 0.14, 0.18, 0.22 e
0.26 µg. Experimento 2: concentrações 0.14, 0.18, 0.22, 0.26 e 0.30 µg. Para cada
concentração foram utilizados 4 camundongos. Os camundongos receberam injeções
intradérmicas no abdome com doses crescentes de veneno (0,1ml/animal) dissolvido em
NaCl 0,9%.
viii) Análise dos dados DMH: Duas horas após injetados, os camundongos foram
sacrificados, a pele removida e esticada em placa de vidro, sobre a qual a mancha
hemorrágica foi copiada em papel milimetrado. Ao redor da mancha hemorrágica forma-se
um edema, não copiado no papel. O número de quadrículas contidas na mancha é a área
hemorrágica, inferida através da área da circunferência a = ð r², transformada para
diâmetro = 2 √a/ð (Bolaños, 1984). A determinação da dose mínima hemorrágica foi feita
da seguinte maneira: i) análise de regressão, tendo sido encontrado duas equações, uma
para cada experimento, cujas variáveis dependentes são os diâmetros das áreas
hemorrágicas (y) e as independentes são as concentrações do veneno (x), ii) substituição da
variável dependente (y) por 10mm (diâmetro padrão da DMH), que constitui a dose
mínima hemorrágica, iii) as doses mínimas hemorrágicas foram praticamente idênticas
(0.23g e 0.24g), por isso os experimentos foram somado e feita uma análise conjunta
dos experimentos para encontrar a dose mínima hemorrágica do veneno. As análises
estatísticas seguiram os protocolos e algoritmos usuais (Vanzolini, 1993; Zar, 1996).
18
3. Verificação da eficácia das plantas
Os seguintes ensaios foram realizados para verificar a toxicidade das plantas e testar
a eficácia destas sobre o veneno de B. jararaca: DL50, análise da letalidade e testes de
inibição da hemorragia comparados com grupos de controle.
i) Material botânico: As plantas utilizadas para verificar as ações antiofídicas foram
coletadas na região de caatinga de Curituba, Sergipe (09o
41’
S, 37o
53’W) (Figura 1) durante
2002/2003, com base nas informações de benzedores e moradores locais. Adicionalmente,
foi incluída nas análises uma amostra de plantas da região do cerrado de Peixe, rio
Tocantins, no Estado homônimo, indicada popularmente na região como antiofídica e
conhecida como batata-de-teiú.
Curituba, Se: batata-de-teiú (Apodanthera villosa C. Jeffrey, Cucurbitaceae).
cabeça-de-negro (Apodanthera glaziovii Glaziou ex Cogniaux,
Cucurbitaceae).
pinhão-bravo (Jatropha mollissima (Pohl) Baill, Euphorbiaceae).
Peixe, To: batata-de-teiú (Jatropha elliptica (Pohl) Muell. Arg., Euphorbiaceae).
As plantas foram coletadas e herborizadas com material fértil para identificação. O
restante do material foi coletado em quantidades suficientes para preparar os extratos
aquosos. As cucurbitáceas foram identificadas no Departamento de Botânica da
Universidade Federal de Goiás; as euforbiáceas foram identificadas no Instituto de
Botânica da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.
Figura 1. Localização da região de Curituba, Sergipe.
Curituba
Rio São Francisco
Oceano Atlântico
19
ii) Preparação do extrato aquoso: As raízes tuberosas de A. villosa , A. glaziovii, J.
elliptica e o caule de J. mollissima tiveram o seguinte tratamento para preparar os extratos:
1. secagem a 40o
C em estufa, 2. trituração em moinho até a obtenção do polvilho, 3.
preparação dos extratos brutos por decocção, durante 10 minutos, de 200 gramas do
polvilho, 4. filtragem do extrato bruto, 5. liofilização do extrato filtrado. O pó liofilizado,
pesado para cada concentração e diluídos em salina, foi utilizado nos experimentos.
iii) Animais: Camundongos Swiss, não-isogênicos, de ambos os sexos (18-22g). Os
animais foram fornecidos pelo Biotério Central da Universidade Federal de Sergipe.
iv) Dose letal 50% (DL50): A DL50 de cada extrato também foi determinada com base na
razão entre os camundongos mortos e número total de animais inoculados com o extrato,
após 48 horas de observação, como realizado para o veneno. A dose letal 50% de cada
planta foi encontrada para selecionar as doses de extrato utilizadas nos ensaios biológicos
de inibição da hemorragia e da letalidade. As concentrações dos extratos foram
determinadas por tentativa e erro até encontrar a relação entre animais mortos e inoculados
proporcional às concentrações dos extratos. Foram realizados dez ensaios com as plantas,
com os seguintes intervalos de doses:
3 ensaios com A. villosa; concentrações 0.008-0.04g,
3 ensaios com A. glaziovii; concentrações 0.001-0.011g,
3 ensaios com J.mollissima; concentrações 0.0003-0.04g,
1 ensaio com J. elliptica; concentrações 0.01-0.03g.
v) Análise dos dados DL50 das plantas: Para cada concentração foram utilizados seis
camundongos. A estatística utilizada para verificação da DL50 foi a análise probítica
(Fisher, 1949; Fisher & Yates, 1953). Em cada ensaio, a variação entre animais mortos
com relação à concentração do extrato foi muito grande, dificultando encontrar a DL50. Por
isso somei os 3 experimentos de cada planta para encontrar um valor probítico mais
ajustado. Isto foi feito para A. villosa, A. glaziovii e J. mollissima. Para J. elliptica fiz só
um experimento, cujo resultado foi proporcional às concentrações e não julguei necessário
fazer repetições.
20
vi) Inibição da letalidade: Para verificar a neutralização do veneno pelas plantas (ou
antivenenos) há a necessidade de ser selecionada uma dose-desafio, definida como a dose
suficiente para apresentar o efeito subliminar e máximo do veneno (Gutiérrez et al, 1990).
A dose-desafio do veneno de B. jararaca utilizada para verificar a inibição da letalidade
pelos extratos das plantas foi de 2DL50 (74.2g). Foram utilizados dois grupos nas
comparações: i) grupo controle - animais inoculados com 74.2g de veneno dissolvido em
NaCl 0.9%, ii) grupo experimental - animais receberam a mesma dose-desafio de veneno
do grupo controle incubado a 37o
C com diluições diferentes de extrato em NaCl 0.9%,
durante 30 minutos. Cada camundongo foi inoculado via intraperitonial (i.p.) com 0,5 ml
da solução. Os animais foram observados durante 48 horas, com intervalos de 1hora para
registro do tempo de sobrevida (em minutos). As concentrações de cada extrato foram
determinadas após encontrar as DL50 correspondentes:
Apodanthera villosa: concentrações 0.74, 1.00 e 1.48mg,
Apodanthera glaziovii: concentrações 1.00, 1.48, 3.0 e 5.0mg,
Jatropha mollissima: concentração1.0mg,
Jatropha elliptica: concentrações 0.74, 1.00, 1.48, 5.0 e 10.0mg.
vii) Análise dos dados da letalidade: No caso dos experimentos de padronização das ações
biológicas do veneno havia um resultado esperado. Nos testes de letalidade, que avaliam o
tempo de sobrevida, o que se esperava era que durante as repetições os resultados fossem
próximos, para poder confiar no ensaio. A análise foi feita da seguinte forma: i) os
experimentos com as plantas foram repetidos 2-4 vezes, ii) cada repetição foi considerada
uma amostra, iii) cada amostra teve um grupo controle, iv) verifiquei a homogeneidade
entre os controles, para confirmar os experimentos, v) os controles de cada planta foram
agrupados para análise estatística, vi) verifiquei também a homogeneidade entre as
amostras dos grupos experimentais, para cada dose de extrato – consideradas homogêneas,
os dados eram agrupados, vii) nas análises finais ficaram para cada planta um grupo
experimental com 1-5 doses (dependendo da planta) e um grupo controle. As estatísticas
utilizadas foram análise de variância com um fator e teste t (de Student) para verificar a
significância entre duas amostras (Vanzolini, 1993; Zar, 1996).
21
viii) Inibição da hemorragia local: Para verificar se os extratos neutralizavam a
hemorragia local do veneno de B. jararaca a dose desafio foi de 5DMH (1.2g). Foram
utilizados dois grupos nas comparações: i) grupo controle – animais inoculados com 1.2g
de veneno, ii) grupo experimental – animais injetados com quantidade constante de veneno
(1.2g), o qual foi incubado com diluições diferentes de extrato, durante 30 minutos a
37o
C. Os camundongos receberam injeções intradérmicas no abdome com doses de extrato
e veneno ou só de veneno (0,1ml/animal), dissolvidos em NaCl 0,9%. Duas horas, após
injetados, os camundongos foram sacrificados, a pele removida e determinado a área
hemorrágica como na metodologia descrita para determinar a dose mínima hemorrágica.
As concentrações dos extratos foram as seguintes:
Apodanthera villosa: concentrações 1.0, 3.0 e 6.0mg,
Apodanthera glaziovii: concentrações 1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg,
Jatropha mollissima: concentração1.0, 3.0 e 6.0mg,
Jatropha elliptica: concentrações 1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg.
ix) Análise dos dados da inibição da hemorragia: O extrato de cada planta foi testado 2-4
vezes, com 3-4 concentrações diferentes. Foram realizados 8 experimentos com as quatro
plantas, com duas repetições por dose de extrato. Cada experimento teve um grupo
controle para comparação. Para análise segui os seguintes passos: i) como havia duas
repetições por dose, fiz para cada planta teste de homogeneidade entre as doses –
consideradas homogêneas, os dados eram agrupados nas análises seguintes, ii) cada
repetição do grupo experimental teve um grupo controle, então verifiquei também a
homogeneidade entre os controles de cada grupo experimental – se homogêneos, os dados
eram agrupados, iii) nas análises finais ficaram para cada planta: um grupo experimental
com 3-4doses (dependendo da planta) e um grupo controle. As estatísticas utilizadas foram
análise de variância com um fator e teste t (de Student) para verificar a significância entre
duas amostras (Vanzolini, 1993; Zar, 1996).
Para verificar se as próprias plantas não estavam também contribuindo para as
hemorragias, fiz alguns ensaios com os extratos isolados (sem o veneno), utilizando as
mesmas concentrações e três animais em cada dose: os extratos não causaram hemorragia.
22
Resultados
1. Epidemiologia dos acidentes ofídicos
A maioria dos acidentes ofídicos em Sergipe ocorreu na zona rural. Até a década de
1980 as notificações eram feitas através de prontuários nas unidades de saúde; após esta
época, o Ministério da Saúde recomendou o registro em prontuários próprios – as
notificações de acidentes por animais venenosos. A partir de 1999 estas notificações estão
informatizadas no setor de vigilância epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde.
Além da soroterapia, os tratamentos ocasionados por envenenamentos ofídicos em
Sergipe incluem as rezas e benzeduras, preparados de contra-venenos e os preparados com
plantas, principalmente nas formas de infusão e decocção. A combinação destes
tratamentos é comum em Sergipe, não só com relação aos envenenamentos por serpentes,
mas todas as afecções são de alguma forma tratadas com combinações de métodos.
Preparados Populares
Os preparados populares para tratar envenenamentos ofídicos na região de Sergipe
são misturas elaboradas principalmente a base de plantas e materiais orgânicos diversos,
conforme informado pelas pessoas que comercializam estes produtos. Os componentes dos
preparados são mantidos em segredo e os produtos podem ser encontrados nas barracas
que vendem plantas medicinais nas feiras livres, nas casas de produtos agropecuários ou
comercializados por vendedores que anunciam produtos milagrosos específicos, como a
pomada da gordura de sucuri (Eunectes murinus L., 1758) e choque de poraquê
(Electrophorus electricus L., 1758), ambas para dores e reumatismos.
Os produtos e preparados recomendados para envenenamentos de cobras são
encontrados sob diversas formas: infusões de plantas com cachaça, onde as partes das
plantas, secas ou verdes, são colocadas no líquido sem serem processadas – as doses
variam de acordo com a gravidade do caso; infusões mistas, a base de plantas e outros
materiais orgânicos mantidos em segredo; misturas feitas por decocção de partes das
plantas; dose pó-de-caboclo, um contraveneno para cobras (e insetos também), elaborado a
base de plantas e fabricado em Feira de Santana, Bahia; permanganato de potássio em
23
concentrações desconhecidas, que é vendido em pequenos frascos, cujas doses dependem
da gravidade do caso.
É comum também encontrar no comércio cobras conservadas na cachaça, cujo
conteúdo é indicado contra acidentes ofídicos. As espécies identificadas conservadas no
álcool são: as colubrídeas Oxyrhopus trigeminus Duméril, Bibron & Duméril, 1854;
Leptodeira annulata L., 1758, Liophis poecilogyrus (Wied, 1825) a leptototiflopídea
Leptotyphlops sp e a elapídea Micrurus ibiboboca (Merrem, 1820). O “Específico
Pessoa”, fabricado em Sobral, Ceará, com propaladas atividades antiofídicas, não é
comercializado na região de Sergipe.
As rezas e benzeduras também fazem parte dos tratamentos populares alternativos,
cujos ritos são praticados por benzedores locais, homens e mulheres. Fazem parte dos
rituais benzer as pessoas e partes vegetais que servem de amuleto contra picadas de cobras,
como a semente do cajú; rezar sobre a parte do corpo atingida pela serpente, benzer
líquidos (geralmente água) que devem ser bebidos de acordo com as prescrições, as quais
incluem doses certas e horários pré-estabelecidos que variam conforme o caso e o
benzedor. Humanos e animais, mais comumente eqüinos e bovinos, quando sofrem
acidentes ofídicos são tratados da mesma forma pelos benzedores.
Fitoterapia
Três plantas do semi-árido de Curituba e arredores são indicadas por benzedores e
moradores locais como tendo ações antiofídicas: batata-de-teiú (Apodanthera villosa
C.Jeffrey, Cucurbitaceae), cabeça-de-negro (Apodanthera glaziovii Glaziou ex Cogniaux,
Cucurbitaceae) e pinhão-bravo (Jatropha mollissima (Pohl) Baill., Euphorbiaceae). As
duas cucurbitáceas são muito semelhantes, ambas são trepadeiras, mas podem ser
encontradas também no chão, as flores são bem pequenas e têm raízes tuberosas, a da
batata-de-teiú é mais compridada. O preparado antiofídico com as cucurbitáceas é
elaborado com base na fécula da raíz, formando uma papa com a recomendação de ser
utilizada em doses baixas. O pinhão-bravo é um arbusto de 1- 3 metros de altura, bem
ramificado, casca do caule adulto acinzentado. Esta planta tem um látex muito branco, o
qual é indicado para beber direto da planta em caso de acidente ofídico.
24
Estas foram as plantas da caatinga coletadas para verificação das atividades
antiofídicas. Em todas as feiras percorridas na região da caatinga de Sergipe e parte da
Bahia, até Feira de Santana, as plantas cabeça-de-negro e batata-de-teiú são conhecidas
como antiofídicas, mas várias espécies são confundidas sob estes nomes. Infelizmente não
foi possível coletar estas plantas para identificar, além do que o material fornecido pelos
feirantes estava preparado na forma de pó ou partes cortadas. Na região de Peixe, no rio
Tocantins, Estado homônimo, uma planta conhecida como batata-de-teiú (Jatropha
elliptica (Pohl) Muell. Arg., Euphorbiaceae) é indicada como antiofídica e foi também
testada a sua eficácia, juntamente com as plantas coletadas na região de Curituba.
Soroterapia
O soro antiofídico é, em Sergipe, aplicado na unidade regional de saúde mais
próxima de onde o acidente ocorreu. O caso é notificado e encaminhado para o setor de
vigilância epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde; posteriormente é arquivado no
setor de vigilância ambiental da saúde. No setor estadual de vigilância epidemiológica as
notificações dos acidentes ofídicos estão informatizadas de 1999 a 2002, de acordo com o
programa implantado em 2003 pelo Centro Nacional de Epidemiologia da Fundação
Nacional da Saúde – Sistema de Informação de Agravo de Notificação, Dicionário de
Dados – SINAN, Animais Peçonhentos. As informações anteriores a 1999 encontram-se
dispersas e de difícil acesso.
Em Sergipe funcionam seis regionais de saúde e uma metropolitana, com as
seguintes sedes: Regional Metropolitana – Aracaju, Hospital João Alves Filho; 1a
Regional
– Estância, Hospital Regional Amparo de Maria; 2a
– Itabaiana, Hospital Pedro Garcia
Moreno Filho; 3a
– Maruim, Hospital de Maruim; 4a
– Nossa Senhora da Glória, Hospital
João Alves Filho; 5a
– Neópolis, Hospital de Neópolis; 6a
– Lagarto, Hospital Nossa
Senhora Conceição (Figura 2). São estes hospitais regionais que recebem os soros
antiofídicos da Central Nacional de Armazenamento e Distribuição de Imunobiológicos
(Cenadi/Ministério da Saúde) através da Secretaria Estadual da Saúde de Sergipe, a qual os
repassa para as regionais de saúde onde os casos de acidentes ofídicos são encaminhados.
25
Figura 2. Localização das regionais de saúde e os domínios
morfoclimáticos das regiões de Sergipe (segundo Ab’Saber, 1977). M =
Regional Metropolitana, Aracaju; I = 1a
Regional, Estância; II = 2a
Regional, Itabaiana; III = 3a
Regional, Maruim; IV = 4a
Regional, Nossa
Senhora da Glória; V = 5a
Regional, Neópolis; VI = 6a
Regional, Lagarto.
De oeste para leste: caatinga (áreas hachuradas), agreste e mata atlântica.
Dentre os 95 casos de envenenamentos ofídicos registrados em Sergipe durante 1999
a 2002, observamos que: i) 61 dos acidentados (64%) receberam soroterapia, ii) foram
utilizadas 319 ampolas de soro antibotrópico, 46 de antibotrópico-crotálico, 6 de
anticrotálico e 10 de antielapídico, iii) 34 casos (36%) não estão notificados se receberam
ou não antivenenos, embora os sintomas estejam registrados, iv) em 6 casos a soroterapia
foi aplicada sem constar o gênero da serpente que causou o acidente, v) cinco registros de
acidentes ofídicos nas notificações não indicam se a soroterapia foi ou não utilizada. Nas
notificações também constam que em alguns casos de envenamentos por Crotalus foi
utilizado soro antibotrópico (4 ampolas) e antibotrópico-crotálico (3 ampolas); em outros
constam os registros de envenenamento crotálico, mas não informam a soroterapia
utilizada. Nas notificações dos dois casos de acidentes por Lachesis não constam se os
acidentados receberam ou não soroterapia. A Tabela 1 mostra a distribuição de freqüência
dos soros utilizados em Sergipe.
W
Oceano Atlântico
Rio São Francisco
26
Tabela 1. Distribuições de freqüências do número de ampolas de soros
antiofídicos utilizados em Sergipe.
1999 2000 2001 2002
ampolas f ampolas f ampolas f ampolas f
1 1 1 1 4 2 5 2
2 1 2 1 6 3 6 2
3 1 3 1 8 2 8 3
4 8 4 2 10 2
5 2
6 12
7 1
8 5
Antibotrópico
10 3
Soma 197 14 62 46
3 1 3 3 1 1
4 1 4 1
5 1 5 1
7 1 12
8 1
Antibotrópico-
crotálico
Soma 27 18 1
2 1 4 1
Anticrotálico
Soma 2 4
Antiela-
pídico
10 1
Soma
10
Incidência dos acidentes ofídicos
Foram notificados 95 acidentes ofídicos em Sergipe entre 1999-2002; os
coeficientes de incidência anual variaram de 0,16 a 0,88 caso por 10000 habitantes da zona
rural (Tabela 2).
Dentre os casos registrados, em apenas 55 (58%) constam os gêneros das serpentes
nas notificações: 48 casos foram causados por Bothrops, 4 por Crotalus, 2 por Lachesis e
1 caso por Micrurus; quatro casos foram notificados como tendo sido causados por
serpentes não peçonhentas (Tabelas 3)
27
Tabela 2. Coeficientes de incidência anuais dos acidentes ofídicos
em Sergipe (1999-2002).
1999 2000 2001 2002 Soma
43 8 23 21 95
(0,88) (0,16) (0,46) (0,42)
( ) coeficiente de incidência/10000 habitantes da zona rural.
Média da população rural no período foi 493549 habitantes (IBGE, 2000).
Tabela 3. Distribuição anual dos acidentes ofídicos por gênero
de serpente.
1999 2000 2001 2002 Soma
Bothrops 26 4 7 11 48
Crotalus 1 0 3 0 4
Micrurus 0 0 0 1 1
Lachesis 0 0 2 0 2
Soma 27 4 12 12 55
Não-peçonhenta 2 0 1 1 4
Idade e sexo
A proporção dos acidentes ofídicos variou significativamente com relação à idade
dos acidentados; pessoas de ambos os sexos foram mais atingidas na faixa etária até os 20
anos (2
= 34.07; p<0.001). A proporção dos acidentados também foi diferente entre os
sexos; (2
= 20.59; p<0.001); os homens foram duas vezes mais acidentados do que as
mulheres (Tabela 4).
Tabela 4. Distribuições dos acidentes ofídicos por idade, sexo. (f
freqüência observada; (fi) freqüência esperada).
Intervalos de Idade
1-20 21-40 41-60 >60 Soma
f 45 25 18 6 94
(fi) (23.5) (23.5) (23.5) (23.5)
Hipótese nula: proporções 1:1:1:1
2
= 34.07; p<0.001
Sexo
♀ ♂ n
f 25 69 94
f(i) (47) (47)
Hipótese nula: proporção 1:1
2
= 20.59; p<0.001
28
Sazonalidade
A proporção dos acidentes ofídicos entre os períodos seco e chuvoso foi
significantemente diferente (2
=13.78; p<0.001); o predomínio dos casos foi durante os
meses secos (Tabela 5).
Com relação a uma possível associação entre sexo, período analisado (1999-2002) e
sazonalidade, as freqüências anuais de acidentes foram proporcionalmente iguais entre
homens e mulheres (2
= 1.15; p>0.05); a proporção de acidentes entre os sexos dos
acidentados e os períodos chuvoso e seco também não foi significantemente diferente (2
=
1.33; p>0.05; Tabela 6).
Tabela 5. Sazonalidade dos acidentes ofídicos: proporção entre períodos
seco (verão) e chuva (inverno). (fi, freqüência observada; (fi) freqüência
esperada).
Período
Verão Inverno Soma
f 65 29 94
(fi) (47) (47)
Hipótese nula: proporção 1:1
2
= 13.78; p<0.001
Tabela 6. Acidentes ofídicos: associações entre sexo dos acidentados,
período analisado e sazonalidade.
Ano
Sexo 1999 2000 2001 2001 Soma
♂ 30 7 16 16 69
♀ 12 1 7 5 25
Soma 42 8 23 21 94
2
= 1.15; p>0.05
Sazonalidade
Sexo Verão Inverno Soma
♂ 50 19 69
♀ 15 10 25
Soma 65 29 94
2
= 1.33; p>0.05
29
Regiões de ocorrência
A região de Sergipe, está situada nos domínios morfoclimáticos da Mata Atlântica e
da caatinga, separados por uma faixa de agreste, a qual é uma caatinga mitigada paralela à
costa (Vanzolini, 1972, ver Figura 2). Os acidentes ofídicos são atendidos nas regionais de
saúde mais próximas onde ocorrem. Os três ecossistemas foram comparados com relação
ao ofidismo; a freqüência de acidentes foi bem menor na caatinga (2
= 34.77; p<0.001);
no agreste e áreas de mata as freqüências de acidentes foram praticamente iguais. As
regiões de agreste que apresentaram mais casos durante o período analisado foram Nossa
Senhora das Dores (11 casos) e Lagarto (7 casos), na Mata Atlântica as regiões que
apresentaram maior freqüência de acidentes ofídicos foram Estância (10 casos) e Aracaju
(8 casos). As Tabelas 7 e 8 mostram as freqüências de acidentes ofídicos nos ecossistemas
Tabela 7. Proporção de acidentes ofídicos por região.
(f, freqüência observada; (fi) freqüência esperada).
Caatinga Agreste Mata Atl. Soma
f 5 49 41 95
(fi) (31.6) (31.6) (31.6)
Hipótese nula: proporções 1:1:1
2
= 34.77; p<0.001
Tabela 8. Distribuições de freqüências dos acidentes ofídicos (1999-2002) por regiões. As populações são
citadas no Censo Demográfico, 2000, IBGE.
Caatinga Pop. rural f Agreste Pop. rural f Mata Atlântica Pop. rural f
Carira 8327 2 Areia Branca 8015 1 Aracaju* 461534 8
Frei Paulo 5643 1 Arauá 5745 1 Brejo Grande 3155 2
Monte A. de Sergipe 5119 1 Cristinápolis 7823 1 Carmópolis 1746 1
Porto da Folha 16952 1 Canhoba 2370 1 Estância 8148 10
Cumbe 1516 1 Indiaroba 8471 1
Gararu 8375 1 Itaporanga d’Ajuda 16323 2
Itabaianinha 19895 3 Neópolis 8092 5
Itabaiana 21341 5 Propriá 3818 3
Laranjeiras 2347 4 Rosário do Catete 1445 3
Lagarto 42807 7 S. Amaro das Brotas 2588 1
Moita Bonita 7125 3 Santa Luzia do Itanhi 11363 1
N. Senhora das Dores 8671 11 São Cristóvão 1531 3
Pedrinhas 2531 2 N. Senhora do Socorro 400 1
Riachão do Dantas 14932 3
Riachuelo 1630 1
São Miguel do Aleixo 1968 1
Telha 1575 2
Umbaúba 8279 1
Soma 5 49 41
* Em Aracaju consta a população total.
f = freqüência
30
Sintomas e tempo decorrido entre o acidente e a soroterapia
A dor local foi um dos sintomas mais freqüentes. Quando o atendimento foi feito nas
3 primeiras horas após a picada, a proporção de indivíduos que relataram dor
(envenenamento botrópico) foi de 3:1 em relação aos que não relataram (2
= 0.03;
p>0.05). A proporção aumentou de 7:1 ocorreu nos casos em que o atendimento foi feito
após três horas de o acidentado ter sido picado pela cobra (2
= 0.22; p>0.05).
O edema (envenenamento botrópico) também foi um dos sintomas mais freqüentes
relatado nas notificações. Até 3 horas do acidente, a proporção de indivíduos que
apresentaram edema foi de 1:1 em relação aos que não apresentaram este sintoma (2
=
0.13; p>0.05); após este período, a proporção de indivíduos que apresentaram edema
aumentou de 7:1 em relação aos que não apresentaram este sintoma (2
= 0.22; p>0.05),
indicando persistência e aumento do edema após as 3 primeiras horas.
Com relação ao eritema e sangramento local (características do envenenamento
botrópico), nas 3 primeiras horas entre a picada e o atendimento a proporção de
acidentados que apresentaram e não apresentaram eritema foi de 1:3 (2
= 0.34; p>0.05); a
mesma proporção de 1:3 ocorreu entre os acidentados que apresentaram e não
apresentaram sangramento local (2
= 0.01; p>0.05). Após três horas do acidente, a
proporção aumentou de 1:4 entre aqueles acidentados que apresentaram e não
apresentaram eritema (2
= 0.88; p>0.05) e aumentou de 1:6 entre os que apresentaram e
não apresentaram sangramento local (2
= 0.1; p>0.05). As distribuições dos sintomas
locais mais freqüentes nas notificações dos acidentes ofídicos de Sergipe podem ser
observados na Tabela 9.
A Tabela 10 mostra os demais sintomas relatados nas notificações: necrose,
equimose, abcesso e bolha, gengivorragia e tempo de coagulação alterado, oligúria e anúria
(envenenamento botrópico); mialgia, urina escura, ptose palpebral e diplopia
(envenenamentos crotálicos e elapídico) e urina escura (envenenamento crotálico).
Com relação à letalidade, não houve notificação de óbito durante o período
analisado.
31
Tabela 9. Acidentes ofídicos, Sergipe (1999-2002): sintomas locais mais freqüentes nas três horas
do acidente e após este período. (f freqüência observada; (fi) freqüência esperada).
Até 3 horas Soma Após 3 horas Soma
Dor Dor
Sim Não Sim Não
f 50 16 66 16 3 19
(fi) (44) (22) (12.66) (6.33)
Ho: a proporção é 3:1 Ho: a proporção é 7:1
2
= 0.03; p>0.05 2
= 0.22; p>0.05
Edema Edema
Sim Não Sim Não
f 34 31 65 16 3 19
(fi) (32.5) (32.5) (12.66) (6.33)
Ho: a proporção é 1:1 Ho: a proporção é 7:1
2
= 0.13; p>0.05 2
= 0.22; p>0.05
Eritema Eritema
Sim Não Sim Não
f 14 50 64 4 14 18
(fi) (21.33) (42.66) (6) (12)
Ho: a proporção é 1:3 Ho: a proporção é 1:4
2
= 0.34; p>0.05 2
= 0.08; p>0.05
Sangramento local Sangramento local
Sim Não Sim Não
f 17 50 67 2 10 12
(fi) (22.33) (44.66) (4) (8)
Ho: a proporção é 1:3 Ho: a proporção é 1:6
2
= 0.01; p>0.05 2
= 0.1; p>0.05
32
Tabela 10. Envenenamentos ofídicos, Sergipe: alterações locais e sistêmicas.
1999 2000 2001 2002 1999 2000 2001 2002
Abcesso Bolha
Sim 1 0 1 1 1 1 4 0
Não 38 8 22 17 38 7 19 19
Soma 39 8 23 18 39 8 23 19
Necrose Gengivorragia
Sim 0 0 1 0 1 0 0 1
Não 40 8 22 18 37 6 19 14
Soma 40 8 23 18 38 6 19 15
Tempo de coagulação alterado Diplopia
Sim 2 0 3 1 2 1 1 0
Não 37 6 13 15 37 6 18 20
Soma 39 6 16 16 39 7 19 20
Ptose palpebral Mialgia
Sim 0 0 1 0 5 0 5 2
Não 40 7 20 19 35 7 15 16
Soma 40 7 21 19 40 7 20 18
Urina escura Oligúria
Sim 0 0 2 1 0 0 0 3
Não 38 7 18 17 39 7 20 15
Soma 38 7 20 18 39 7 20 18
Anúria
Sim 0 0 0 1
Não 39 7 20 17
Soma 39 7 20 18
Partes do corpo atingidas e gravidade dos casos
As partes mais atingidas foram os pés e pernas (66 casos, aproximadamente 70%),
seguida das mãos e braços (15 casos), cabeça (2 casos) e tórax (1 caso). As proporções
entre as partes do corpo atingidas foi de 12:3:1:1; respectivamente, pés e pernas, mãos e
braços, cabeça e tórax (2
= 5.66; p>0.05).
De acordo com a Secretaria Estadual da Saúde de Sergipe, os acidentes ofídicos
ocorridos na região foram classificados em três categorias: leves, moderados e graves; a
maioria dos casos foi classificada como leve (Tabela 11).
Tabela 11. Classificação de acidentes ofídicos de Sergipe quanto
à gravidade dos casos .
1999 2000 2001 2002 Soma
Leves 34 3 13 16 66
Moderados 7 0 3 3 13
Graves 1 0 2 1 4
Soma 42 3 18 20 83
33
2. Parâmetros biológicos do veneno de B. jararaca
i) Dose letal 50% (DL50)
Dados brutos experimentais: Os quatro experimentos realizados variaram com
relação à proporção de animais mortos e inoculados; no geral apresentaram proporção de
acordo com o aumento das doses, mas com variações extremas. Para diminuir as variações
os experimentos foram agrupados (Tabela 12).
Regressão linear e DL50: As análises mostraram valores diferentes para os
coeficientes das regressões (b), bem como para as constantes das regressões (a), devido às
variações nas proporções entre animais mortos e inoculados para as mesmas doses. As
DL50 de cada experimento variaram entre 32.8 a 44.1g e a análise conjunta entre os
quatro experimentos mostrou valores intermediários para os parâmetros da regressão e da
DL50, quando comparado com os valores dos experimentos (Tabela 13).
Valores probíticos das doses: As doses dos quatro experimentos foram
logaritmizadas e substituídas nas respectivas equações de regressões (uma para cada
experimento) para encontrar o valor probítico de cada dose (Tabela 14). As análises de
regressões dos valores probíticos (y) sobre as dosagens (x) também apresentaram variações
entre os coeficientes das regressões. Por isso foi necessário fazer uma comparação entre as
quatro retas, para encontrar uma equação geral que descrevesse os valores probíticos para a
dose letal 50% que representasse todos os experimentos, permitindo assim o
aproveitamento de todos os dados (Tabela 15).
As retas diferiram quanto ao paralelismo (F0.05(1)3;12=16.927; p<0.001) e afastamento
(F0.05(1)3;12=47.684; p<0.001) (Figura 3). A dose letal 50% da equação geral obtida através
da comparação entre as 4 retas dos experimentos foi 37.1g, valor próximo da DL50 da
análise probítica conjunta utilizando o método da OMS, que foi 37.09g. Os coeficientes e
constantes das regressões foram também semelhantes entre os dois métodos. Assumi então
que as doses letais 50% não são diferentes quando determinadas utilizando as comparações
entre as retas e o método probítico da OMS (Tabela 16).
34
Tabela 12. Bothrops jararaca, proporção entre camundongos
mortos e inoculados, após 48 horas de observação.
Dose de veneno (µg)
Experimentos
I II III IV Soma
23.0 0/6 1/6 1/6 0/6 2/24
27.6 0/6 0/6 2/6 0/6 2/24
32.1 1/6 4/6 2/6 0/6 7/24
39.7 0/6 5/6 5/6 3/6 13/24
47.6 5/6 5/6 5/6 6/6 21/24
Tabela 13. Bothrops jararaca, DL50 do veneno: programa probítico da OMS.
b a y=a+bx Iy DL50 (µg)
Experimento I 9.0153 - 9.8323 - 9.8323+9.0153x 38.1272±67.9041 44.1810
Experimento II 8.076 - 7.2535 - 7.2535+8.076x 26.6044±39.5182 32.9051
Experimento III 6.6686 - 5.1133 - 5.1133+6.6686x 25.5320±41.6518 32.852
Experimento IV 13.0515 - 15.7375 - 15.7375+13.0515x 34.8539±45.1052 38.8054
Análise conjunta 8.283 - 7.9989 - 7.9989+8.283x 34.4318±40.4588 37.0962
b = coeficiente de regressão
a = constante de regressão
Iy = limite de confiança inferior e superior
DL50 = dose letal 50 %, y=5
Tabela 14. Bothrops jararaca, valores probíticos do número de camundongos mortos (y) sobre a
concentração de veneno (x): programa probítico da OMS.
Dose de veneno (g) Experimento I Experimento II Experimento III Experimento IV
x y x y x y x y
23.0 1.36 3.44 1.36 3.74 1.36 3.96 1.36 2.03
27.6 1.44 3.15 1.44 4.38 1.44 4.49 1.44 3.06
33.1 1.51 3.86 1.51 5.02 1.51 5.02 1.51 4.09
39.7 1.59 4.58 1.59 5.65 1.59 5.54 1.59 5.12
47.6 1.67 5.29 1.67 6.29 1.67 6.07 1.67 6.15
x = log da dose
y = probit
.
Tabela 15. Bothrops jararaca, estatística da regressão do número de camundongos mortos (y) sobre a
concentração de veneno (x): comparação entre retas
N b a y=a+bx F r2
DL50 (µg)
Experimento I 5 6.4809 -5.7809 -5.7809+6.4809 19.6354* 0.86 44.1810
Experimento II 5 8.2687 -7.5028 -7.5028+8.2687 5875.226*** 0.99 32.5091
Experimento III 5 6.8408 -5.3409 -5.3409+6.8408 5688.69*** 0.99 32.8520
Experimento IV 5 13.0594 -15.7445 -15.7445+13.0594 367020.3*** 0.99 38.8054
Comparação das 4 retas 20 8.5801 -8.4705 -8.4705+8.5801 16.9279* - 37.1509
N = amostras
b = coeficiente de regressão
a = constante de regressão
F = Variância maior/variância menor
r2
= coeficiente de determinação
DL50 = dose letal 50%, y = 5
35
Tabela 16. Bothrops jararaca, DL50 do veneno, comparação entre retas e programa probítico da
OMS.
Método b x y a Reta Probit (y=5) DL50
m retas,
4 experimentos
8.5801 1.5174 4.5489 -8.4705 y=-84705+8.5801x 1.5699 37.1509
análise conjunta,
4 experimentos
8.2830 - - 7.9989 y=-7.9989+8.2830x - 37.0962
b = coeficiente de regressão
a = constante de regressão
x = média do log da dose
y = média dos probits
DL50 = dose letal 50%, y=5
1.36
Figura 3. Regressão dos valores probíticos sobre as dosagens: comparações
entre as retas. Experimentos I, II, III, IV.
1.671.591.511.44
3.0
2.0
4.0
5.0
6.0
II y= -7.5+8.26x
III y= -5.34+6.84x
IV y= -15.74+13.05x
I y= -5.78+6.48x
log dose
probit
36
ii) Dose mínima hemorrágica (DMH)
Dados brutos experimentais: Os diâmetros das áreas hemorrágicas dos dois
experimentos variaram entre 5.0mm a 13.2mm (Tabela 17). A dose mínima hemorrágica
para uma área exata de 10mm de diâmetro foi determinada através de regressão linear do
diâmetro da área hemorrágica (y) sobre a concentração do veneno (x), cujos coeficientes e
constantes das duas regressões foram próximos. Apesar destes valores próximos, optei por
fazer uma análise conjunta, cujo resultado da DMH foi 0.24g, praticamente igual às doses
mínimas hemorrágicas de cada experimento, que foram 0.23g e 0.24g (Tabela 18).
Tabela 17. Bothrops jararaca, diâmetro da área hemorrágica.
Dose de veneno (µg) Diâmetro da área hemorrágica (mm)
Experimento I
0.10 - - - -
0.14 5.75 6.28 9.30 11.05
0.18 5.17 6.58 6.86 7.57
0.22 9.44 9.51 10.34 11.56
0.26 10.09 10.34 10.40 12.86
Experimento II
0.14 4.78 5.75 6.28 6.77
0.18 6.38 8.05 8.44 9.44
0.22 8.95 9.09 10.34 10.58
0.26 9.23 10.02 10.02 10.02
0.30 11.05 11.78 12.15 13.25
Tabela 18. Bothrops jararaca, estatística da regressão do diâmetro da área hemorrágica (mm) sobre a
concentração de veneno.
N R (x) R (y) b a F r2
DMH (µg)
Experimento I 16 0.10 - 0.26 5.75 - 12.86 30.375 2.869 8.527 * 0.3785 0.23
Experimento II 20 0.14 - 0.30 4.78 - 13.25 35.175 1.380 84.131*** 0.8238 0.24
Experimento I e II 36 0.14 - 0.30 5.75 - 13.25 32.688 2.140 53.170 *** 0.610 0.24
N = amostras
R = intervalos de x e y
b = coeficiente de regressão
a = constante de regressão
r2
= coeficiente de determinação
DMH = dose mínima hemorrágica, y = 10mm
37
3. Eficácia das plantas
i) Dose letal 50% (DL50)
Foram feitos nove experimentos (três para cada planta) com os extratos da raiz de
Apodanthera villosa, Apodanthera glaziovii e Jatropha mollisima. A DL50 destas plantas
foi obtida através da análise conjunta de todos os experimentos, utilizando probites. As
doses dos extratos variaram de 0.008-0.004g; 0.001-0.011g, 0.0003-0.04g,
respectivamente. Para a análise da dose letal 50% da Jatropha elliptica utilizei apenas um
experimento, porque o resultado foi coerente com a relação entre os animais
mortos/inoculados, proporcional ao aumento da concentração do extrato, cujas doses
variaram de 0.01-0.03g. A tabela 19 mostra a dose letal 50% de todas as plantas utilizadas;
o Apêndice 1 mostra os dados brutos da proporção de animais mortos/inoculados com
relação à concentração de extrato.
Tabela 19. Dose letal 50% (DL50) dos extratos das plantas.
Planta b a y=a+bx Iy DL50 (g)
Apodanthera villosa 3.358 10.797 10.797+3.358x 0.0150.023 0.018
Apodanthera glaziovii 3.596 12.722 12.722+3.596x 0.00590.0089 0.007
Jatropha mollissima 1.831 9.910 9.910+1.831x 0.00130.003 0.002
Jatropha elliptica 6.193 15.691 15.691+6.193x 0.0130.023 0.018
b = coeficiente de regressão
a = constante de regressão
Iy = limite de confiança inferior e superior
DL50 = dose letal 50 %, y=5
04  ofidismo em sergipe- epidemiologia
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  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE NÚCLEO DE ESTUDOS DO SEMI-ÁRIDO - NESA MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE- PRODEMA Ofidismo em Sergipe: epidemiologia e plantas da caatinga utilizadas popularmente como antiofídicas Jeane Carvalho Vilar Orientadores: Dr. Angelo Roberto Antoniolli Dra. Maria de Fátima Domingues Furtado 2004
  • 2. ii Ofidismo em Sergipe: epidemiologia e plantas da caatinga utilizadas popularmente como antiofídicas Jeane Carvalho Vilar Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente– Prodema – Nesa, Universidade Federal de Sergipe, como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. 2004
  • 3. iii Ofidismo em Sergipe: epidemiologia e plantas da caatinga utilizadas popularmente como antiofídicas Jeane Carvalho Vilar Banca Examinadora Dr. Celso Morato de Carvalho Universidade Federal de Sergipe - Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia Dra. Maria de Fátima Domingues Furtado Instituto Butantan- Secretaria da Saúde de São Paulo Dr. Angelo Roberto Antoniolli Universidade Federal de Sergipe 27.ii.2004
  • 4. iv Dedico este trabalho aos meus queridos pais: Joel e Hélia
  • 5. v Agradecimentos Ao Dr. Celso Morato de Carvalho, Universidade Federal de Sergipe, pelo constante apoio, auxílio na bibliografia e, principalmente, pela agradável companhia durante a execução do trabalho. A Dra. Maria de Fátima Domingues Furtado, Instituto Butantan, São Paulo, que orientou e incentivou a pesquisa em todas as fases, auxiliou na bibliografia e pela gentil acolhida que tive no Instituto Butantan. Ao Dr. Paulo Emílio Vanzolini, Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, pelas sugestões, auxílio na bibliografia e, principalmente, pela amizade. A Dra. Vera Lúcia Gomes Klein, Universidade Federal de Goiás e Dra. Lúcia Rossi, Instituto de Botânica, São Paulo, que identificaram as plantas das famílias Cucurbitaceae e Euphorbiaceae. A médica veterinária Gina Maria Freire Brandão Linofi, Vigilância Epidemiológica, Secretaria Estadual de Saúde de Sergipe, pelas informações dos acidentes ofídicos. Ao Dr. José Wellington Carvalho Vilar, Centro Federal de Educação Tecnológica de Sergipe, pelas valiosas sugestões. Ao MSc. Clóvis Roberto Pereira Franco, que auxiliou nas edições de fotografias; Dr. Carlos Dias da Silva Júnior e Dr. Angelo Roberto Antoniolli, professores da Universidade Federal de Sergipe, que deram suporte durante as fases experimentais do trabalho.
  • 6. vi Sumário Resumo............................................................................................................................ xiii Abstract........................................................................................................................... xiv Introdução....................................................................................................................... 01 Literatura........................................................................................................................ 04 A origem e evolução do estudo dos venenos ofídicos............................................. 04 Plantas medicinais e ofidismo................................................................................... 09 Materiais e Métodos...................................................................................................... 14 1. Epidemiologia......................................................................................................... 14 2. Parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca.................................. 15 3. Verificação da eficácia das plantas..................................................................... 18 Resultados....................................................................................................................... 22 1. Epidemiologia dos acidentes ofídicos.................................................................. 22 2. Parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca.................................. 33 Dose letal (DL50) ................................................................................................... 33 Dose mínima hemorrágica (DMH)...................................................................... 36 3. Eficácia das plantas............................................................................................... 37 Dose letal (DL50) ................................................................................................... 37 Inibição da letalidade........................................................................................... 38 Inibição da hemorragia local............................................................................... 44 Discussão......................................................................................................................... 60 1. Epidemiologia dos acidentes ofídicos.................................................................. 60 2. Parâmetros biológicos do veneno botrópico....................................................... 70 3. Eficácia das plantas em inibir os efeitos do veneno de Bothrops jararaca..... 79 Conclusões....................................................................................................................... 87 Referências...................................................................................................................... 89 Apêndices........................................................................................................................ 98
  • 7. vii Lista de tabelas Tabela 1. Distribuições de freqüências do número de ampolas de soros antiofídicos utilizados em Sergipe................................................................................... 26 Tabela 2. Coeficientes de incidência anuais dos acidentes ofídicos em Sergipe (1999- 2002)............................................................................................................. 27 Tabela 3. Distribuição anual dos acidentes ofídicos por gênero de serpente.................. 27 Tabela 4. Distribuições de freqüências dos acidentes ofídicos por idade, sexo............... 27 Tabela 5. Sazonalidade dos acidentes ofídicos: proporção entre períodos seco (verão) e chuva (inverno)........................................................................................... 28 Tabela 6. Acidentes ofídicos: associações entre sexo dos acidentados, período analisado e sazonalidade............................................................................... 28 Tabela 7. Proporções dos acidentes ofídicos por região.................................................. 29 Tabela 8. Distribuições de freqüências dos acidentes ofídicos por regiões (1999- 2002).............................................................................................................. 29 Tabela 9. Acidentes ofídicos, Sergipe (1999-2002): sintomas locais mais freqüentes nas três horas do acidente e após este período.............................................. 31 Tabela 10. Envenenamentos ofídicos, Sergipe: alterações locais e sistêmicas................ 32 Tabela 11. Classificação de acidentes ofídicos de Sergipe quanto à gravidade dos casos.............................................................................................................. 32 Tabela 12. Bothrops jararaca, proporção entre camundongos mortos e inoculados após 24 horas de observação......................................................................... 34 Tabela 13. Bothrops jararaca, DL50 do veneno: programa probítico da OMS............... 34 Tabela 14. Bothrops jararaca, valores probíticos do número de camundongos mortos (y) sobre a concentração de veneno (x): programa probítico da OMS......... 34 Tabela 15. Bothrops jararaca, estatística da regressão do número de camundongos mortos (y) sobre a concentração de veneno (x): comparações entre retas.... 34 Tabela 16. Bothrops jararaca, DL50 do veneno: comparações entre retas e programa probítico da OMS.......................................................................................... 35 Tabela 17. Bothrops jararaca, diâmetro da área hemorrágica........................................ 36
  • 8. viii Tabela 18. Bothrops jararaca, estatística da regressão do diâmetro da área hemorrágica (mm) sobre a concentração de veneno.................................... 36 Tabela 19. Dose letal 50% (DL50) dos extratos das plantas............................................. 37 Tabela 20. Bothrops jararaca, homogeneidade entre os grupos controles: estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................... 38 Tabela 21. Bothrops jararaca, homogeneidade entre grupos controles: Anova do tempo de sobrevida dos camundongos (h)....................................................................... 38 Tabela 22. Apodanthera villosa, estudo piloto: estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................................................ 39 Tabela 23. Apodanthera villosa, estudo piloto: Anova do tempo de sobrevida dos camundongos (h)........................................................................................ 40 Tabela 24. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h). 40 Tabela 25. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: Anova do tempo de sobrevida dos camundongos (h).................................................................................. 40 Tabela 26. Apodanthera villosa, estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................................................................... 40 Tabela 27. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h).... 41 Tabela 28. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre experimentos: Anova do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................................................... 41 Tabela 29. Apodanthera glaziovii, estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h).............................................................. 41 Tabela 30. Apodanthera glaziovii, Anova do tempo de sobrevida dos camundongos (h).................................................................................................................. 42 Tabela 31. Jatropha mollissima, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h). 42 Tabela 32. Jatropha mollissima: estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................................................................... 42 Tabela 33. Jatropha elliptica, estatística da distribuição de freqüência do tempo de sobrevida dos camundongos (h)................................................................. 43 Tabela 34. Jatropha elliptica, Anova do tempo de sobrevida dos camundongos (h)..... 43
  • 9. ix Tabela 35. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 44 Tabela 36. Apodanthera villosa, homogeneidade entre grupos controles: Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 44 Tabela 37. Apodanthera villosa, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 45 Tabela 38. Apodanthera villosa, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)......................................................................... 45 Tabela 39. Apodanthera villosa, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).............. 45 Tabela 40. Apodanthera villosa, teste de Tukey , diâmetro da área hemorrágica (mm)........................................................................................................... 45 Tabela 41. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre os grupos controles: estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)...................................................................................... 47 Tabela 42. Apodanthera glaziovii, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 48 Tabela 43. Apodanthera glaziovii, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 48 Tabela 44. Apodanthera glaziovii, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 48 Tabela 45. Apodanthera glaziovii, teste de Tukey, diâmetro da área hemorrágica (mm)........................................................................................................... 49 Tabela 46. Jatropha mollissima, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm), homogeneidade entre os grupos controles..... 51 Tabela 47. Jatropha mollissima, homogeneidade entre grupos controles: Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 51 Tabela 48. Jatropha mollissima, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 52 Tabela 49. Jatropha mollissima, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)......................................................................... 52 Tabela 50. Jatropha mollissima, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).............. 52 Tabela 51. Jatropha mollissima, teste de Tukey, diâmetro da área hemorrágica (mm). 52
  • 10. x Tabela 52. Jatropha elliptica, homogeneidade entre os grupos controles: estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)...... 54 Tabela 53. Jatropha elliptica, Anova, homogeneidade entre os grupos controles: diâmetro da área hemorrágica (mm).......................................................... 54 Tabela 54. Jatropha elliptica, homogeneidade entre experimentos: estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm)........... 55 Tabela 55. Jatropha elliptica, estatística da distribuição de freqüência do diâmetro da área hemorrágica (mm).............................................................................. 55 Tabela 56. Jatropha elliptica, Anova, diâmetro da área hemorrágica (mm).................. 55 Tabela 57. Jatropha elliptica, teste de Tukey (q), diâmetro da área hemorrágica (mm)........................................................................................................... 56
  • 11. xi Lista de figuras Figura 1. Localização da região de Curituba, Sergipe..................................................... 18 Figura 2. Localização das regionais de saúde e os domínios morfoclimáticos das regiões de Sergipe............................................................................................ 25 Figura 3. Regressão dos valores probíticos sobre as dosagens: comparações entre as retas.................................................................................................................. 35 Figura 4. Apodanthera villosa, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato e veneno) e controle (veneno).......................................................................... 46 Figura 5. Apodanthera glaziovii, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato e veneno) e controle (veneno)......................................................................... 50 Figura 6. Jatropha mollissima, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato e veneno) e controle (veneno)............................................................................ 53 Figura 7. Jatropha elliptica, manchas hemorrágicas: grupo experimental (extrato e veneno) e controle (veneno)............................................................................ 57 Figura 8. Manchas hemorrágicas dos extratos das plantas: Apodanthera villosa e Apodanthera glaziovii...................................................................................... 58 Figura 9. Manchas hemorrágicas dos extratos das plantas: Jatropha mollissima e Jatropha elliptica............................................................................................. 59
  • 12. xii Apêndices Apêndice 1. Proporção de camundongos mortos/inoculados com relação à concentração de extrato............................................................................ 99 Apêndice 2. Homogeneidade entre grupos controles: tempo de sobrevida (h)................ 100 Apêndice 3. Apodanthera villosa, estudo piloto: tempo de sobrevida (h)....................... 100 Apêndice 4. Apodanthera villosa: tempo de sobrevida (h).............................................. 101 Apêndice 5. Apodanthera glaziovii: tempo de sobrevida (h)........................................... 101 Apêndice 6. Jatropha mollissima: tempo de sobrevida (h).............................................. 102 Apêndice 7. Jatropha elliptica: tempo de sobrevida (h).................................................. 102 Apêndice 8. Apodanthera villosa: diâmetro da área hemorrágica (mm)......................... 103 Apêndice 9. Apodanthera glaziovii: diâmetro da área hemorrágica (mm)...................... 103 Apêndice 10. Jatropha mollissima: diâmetro da área hemorrágica (mm)....................... 103 Apêndice 11. Jatropha elliptica: diâmetro da área hemorrágica (mm)........................... 103 Apêndice 12. Diâmetro da área hemorrágica com relação à concentração de extrato..... 104 Apêndice 13. Espécies de plantas citadas como antiofídicas na literatura...................... 105
  • 13. xiii Resumo Foram analisados os aspectos epidemiológicos dos acidentes ofídicos que ocorreram em Sergipe no período 1999-2002 e verificado as ações de plantas indicadas popularmente como antiofídicas na catinga, utilizando o veneno de Bothrops jararaca (Viperidae) como modelo experimental. No período analisado ocorreram 95 casos de acidentes ofídicos notificados; os coeficientes de incidência anual variaram entre 0,16 a 0,88 casos por 10000 habitantes da zona rural. Os homens foram mais atingidos; a maior ocorrência dos acidentes foi na faixa etária até 20 anos; no período anual seco (setembro a abril) ocorreram mais acidentes. Acidentes causados por Bothrops foram mais freqüentes (93%), seguidos por Crotalus (5%) e Micrurus (1%). Dois acidentes notificados como tendo sido causado por Lachesis provavelmente estão em erro. A soroterapia foi aplicada em pelo menos 65% dos casos, os demais não constam nas notificações. Para verificar as ações antiofídicas das plantas, primeiro foram determinados os parâmetros biológicos das ações letais e hemorrágicas do veneno de B. jararaca, através de comparações entre retas das regressões e análises probíticas. A DL50 do veneno foi 37.1g, a DMH foi 0.24g; as doses-desafio utilizadas nos experimentos foram 2DL50(74.2g) e 5DMH (1.2g). Três plantas da caatinga foram analisadas para verificar a inibição das ações hemorrágicas e letais do veneno: Apodanthera villosa, batata-de-teiú (Cucurbitaceae); Apodanthera glaziovii, cabeça-de-negro (Cucurbitaceae) e Jatropha mollissima, pinhão- bravo (Euphorbiaceae). A planta Jatropha elliptica, batata-de-teiú (Euphorbiaceae), coletada no cerrado do rio Tocantins (Peixe, To), também foi analisada. O extrato aquoso da A. villosa (1mg) aumentou o tempo de sobrevida dos animais experimentais quando comparado com os animais controles inoculados apenas com o veneno de B. jararaca. As manchas hemorrágicas dos animais experimentais, inoculados com veneno mais os extratos aquosos de A. villosa (1.0, 3.0 e 6.0mg), A. glaziovii (1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg), J. mollissima (1.0, 3.0 e 6.0mg) e J. elliptica (1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg), foram significantemente menores do que os controles.
  • 14. xiv Abstract Epidemiological aspects of the ophidic accidents ocurred in Sergipe in the period of 1999-2002 were analysed and verified the actions of the “caatinga” plants popularly indicated as antiophidic, using the venom of Bothrops jararaca as experimental model. It was notified 95 cases of ophidic accidents in the analysed period; the annual cofficient of incidence varied from 0.16 to 0.88 cases per10000 habitants in the rural zone. Man were most hited; the major ocurrence of the accidents was in the age class up to 20 years; in the dry period (September to April) ocurred more accidents. Accidents caused by Bothrops were the most frequent (93%); followed by Crotalus (5%) and Micrurus (1%). Two accidents notified as beeing caused by Lachesis are probably in error. The sorotherapy was applied in at least 65% of the cases, the others are not in the notifications. In order to verify the antiophidic actions of the plants, first it were determined the biological parameters of the lethal and hemorragic actions of the venom of B. jararaca, by comparisons between the regression lines and probitic analysis. The LD50 of the venom was 37.1g, the MHD was 0.24g; the limit dose (dose-desafio) used in the experiments were 2 LD50 (71.2g) and 5MDH (1.2g). Three “caatinga” plants were analysed in order to verify the inhibiton of the haemorragic and lethal actions of the venom: Apodanthera villosa, batata-de-teiú (Cucurbitaceae); Apodanthera glaziovii, cabeça-de-negro (Cucurbitaceae) and Jatropha mollissima, pinhão-bravo (Euphorbiaceae). The plant Jatropha elliptica, batata-de-teiú (Euphorbiaceae), collected in the “cerrado” area of rio Tocantins (Peixe, To), was also analysed. The aqueous extract of A. villosa (1mg) increased the survivorsip time in the experimental animals when compared to control animals inoculated only with the venom of B. jararaca. The hemorragic marks of the experimental animals, inoculated with venom plus the aqueous extract of A. villosa (1.0, 3.0 e 6.0mg), A. glaziovii (1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg), J. mollissima (1.0, 3.0 e 6.0mg) and J. elliptica (1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg) were significantly smaller then controls.
  • 15. 1 Introdução Ofidismo é o estudo do veneno de serpentes, cujo entendimento inclui não só os aspectos relacionados à composição e ações destes, mas deve também englobar os demais fatores diretamente relacionados aos envenenamentos, tais como, avaliações epidemiológicas regionais dos acidentes ofídicos, análise dos parâmetros biológicos dos venenos e aplicação da soroterapia (Vital Brazil, 1987; Raw et al., 1991; Furtado et al, 1991a, 1991b; Pinho & Pereira, 2001). Neste contexto, situam-se também as diversas práticas populares utilizadas nos casos de envenenamentos por serpentes, dentre as quais, a mais importante é a utilização das plantas medicinais regionais, como coadjuvantes à soroterapia ou como medicamento alternativo aplicado na falta de recursos soroterápicos (Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000; Mors et al, 2000; Cardoso, 2003). Cerca de 300 espécies de serpentes estão distribuídas nas várias formações vegetais da América do Sul; destas, aproximadamente 90 espécies são venenosas, pertencentes à família Viperidae, repesentada por várias espécies dos gêneros Atropoides, Bothriechis, Bothriopsis, Bothrocophias, Bothrops, Crotalus, Lachesis e Porthridium e família Elapidae, com apenas um gênero sul americano, Micrurus, composto por diversas espécies (Campbel & Lamar, 1989; Peters & Orejas-Miranda, 1986) No Brasil, distribuídas em todos os domínios morfoclimáticos, ocorrem aproximadamente 70 espécies de serpentes venenosas, pertencentes aos gêneros Bothriopsis, encontradas na amazônia; Bothrops e Crotalus, na amazônia, caatinga, cerrado e mata atlântica; Lachesis, na amazônia e mata atlântica e Micrurus, na amazônia, caatinga, cerrado e mata atlântica (Peters & Orejas-Miranda, Vanzolini et al., 1980; Vanzolini & Caleffo, 2002; Cunha & Nascimento, 1993). Estas espécies causam cerca de vinte mil acidentes ofídicos por ano, com incidências que variam entre sete a vinte e quatro casos anuais em cada cem mil habitantes, dependendo da região (Brasil, 1991,1999). Cerca de noventa por cento dos acidentes são provocados por várias espécies do gênero Bothrops, oito por cento dos envenenamentos são causados por Crotalus e, menos freqüentes, dois por cento são causados por Micrurus e Lachesis (Brazil, 1901; Brasil, 1999; Amaral et al.,
  • 16. 2 1986). Nas regiões mais carentes, com dificuldades de assistência à saúde, os índices de acidentes ofídicos podem estar subestimados (Brasil, 1991,1999). Apesar das estratégias do Ministério da Saúde em distribuir imunobiológicos, como os soros antiofídicos, para as Secretarias Estaduais de Saúde, frequentemente os casos de envenenamentos por serpentes (e outros animais) são tratados com preparados populares feitos com plantas medicinais regionais. Muitas destas plantas estão identificadas, porém a maioria nunca foi estudada para verificar suas ações e validar os usos, as quais são indicadas por rezadores e raizeiros somente pelos nomes populares. Um problema sobre o reconhecimento das plantas pelos nomes populares é que estes variam de região para região, dificultando ainda mais os estudos. Por exemplo, as plantas cabeça-de-negro e a batata-de-teiú são citadas na literatura como tendo propriedades antiofídicas, mas existem pelo menos dez espécies com estes nomes, distribuídas em todas as regiões brasileiras (Mors et al., 2000; Martz, 1992). Em 1998 foi criada a Subcomissão Nacional de Assessoramento em Fitoterápicos (Conafit) pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde. A Conafit recomenda que sejam realizados estudos sobre as plantas medicinais regionais utilizadas popularmente, como forma de validar o uso das plantas e proteger o patrimônio genético deste recurso natural (Brasil, 1999). O presente estudo é sobre ofidismo, analisado sob três aspectos. O primeiro é uma análise epidemiológica dos acidentes ofídicos que ocorrem na região de Sergipe, relatando os índices de incidência por envenenamentos crotálico, botrópico, laquético e elapídico ocorridos na região, bem como analisa as variáveis epidemiológicas associadas (Bochner & Struchiner, 2003; Rouquayrol & Almeida Filho, 1999). O segundo é relacionado aos parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca (Wied, 1824), cujos ensaios são necessários para servirem como modelo (controle) na verificação da eficácia das plantas estudadas. O veneno de B. jararaca foi escolhido como modelo porque não existe disponível para estudo venenos das espécies de Bothrops da região e o veneno de B.jararaca se ajusta perfeitamente para os objetivos do trabalho. O terceiro é com relação à verificação da eficácia de plantas utilizadas popularmente como antiofídicas na caatinga de Sergipe. As metodologias da parte experimental são adequadas às questões para verificar se os extratos das plantas inibem a hemorragia local causada pelo veneno botrópico e se
  • 17. 3 diminuem o tempo de letalidade do veneno. Os aspectos bioquímicos, farmacológicos e fisiológicos dos fenômenos observados são discutidos com base na literatura considerada relevante no contexto das questões delimitadas no estudo. A epidemiologia dos acidentes ofídicos da região de Sergipe é analisada entre 1999 a 2002, cujos dados estão informatizados no Setor de Vigilância Epidemiológica da Secretaria da Saúde do Estado de Sergipe. Os dados anteriores a 1999 não estavam disponíveis. O estudo como um todo – plantas medicinais, veneno de B. jararaca e epidemiologia dos acidentes ofídicos –, apresenta informações e discute resultados que, somados a outros, poderão contribuir com as pesquisas da mesma linha que são realizadas por instituições acadêmicas, bem como poderão contribuir com informações que possam ser utilizadas pelos órgãos governamentais locais da área da saúde e meio ambiente. A apresentação do trabalho está na seguinte seqüência: i) breve abordagem da literatura sobre os aspectos populares e científicos do ofidismo e das plantas medicinais utilizadas como antiofídicas. A literatura sobre ofidismo abrange a origem e a evolução do estudo sobre os venenos de serpentes, até os estudos de Vital Brazil, porque após esta fase os trabalhos tratam principalmente da bioquímica e da farmacologia, cuja literatura, embora vasta, traz poucas informações gerais no contexto das questões da dissertação. A literatura sobre plantas segue a mesma estratégia: uma abordagem sobre o conhecimento popular das plantas, com base nas representações, até a década de 80, porque após este período predominam os trabalhos sobre bioquímica e síntese dos produtos naturais das plantas. Esta literatura é vasta e será melhor aproveitada nas discussões, ii) metodologia do trabalho, descrevendo os métodos utilizados para a análise epidemiológica dos acidentes ofídicos de Sergipe, mostrando a área de coleta das plantas, os protocolos experimentais para os parâmetros biológicos do veneno e verificação da eficácia das plantas; as estatísticas utilizadas são descritas em todas as análises, iii) resultados, apresentados na seguinte ordem: 1. epidemiologia dos acidentes ofídicos; 2. parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca – dose mínima hemorrágica (DMH) e DL50; 3. eficácia das plantas – DL50, inibição da letalidade do veneno e inibição da hemorragia local; iv) discussão dos resultados, v) conclusões gerais e vi) referências.
  • 18. 4 Literatura A origem e evolução do estudo dos venenos ofídicos O conhecimento que os povos antigos tinham sobre ofidismo era fundamentado principalmente nas representações, carregadas de simbolismos e em grande parte religiosas. Dentre estas, destacava-se o mito de que as serpentes possuíam “espíritos ruins”, os quais eram responsáveis pelos sintomas do envenenamento. Estes mitos não impediram, entretanto, que Athanasius Kirsher, em 1675, incluísse várias espécies de cobras na Arca de Noé idealizada por ele. Os escritos de Aristóteles (384 – 322 a.C.), reunidos em nove volumes na sua “Historia animalium” e as descrições um tanto fantasiosas de Plínio (23 – 79 d.C), reunidas em 37 volumes na sua “História Natural”, foram os primeiros relatos sobre a história natural das serpentes, principalmente as descrições de Aristóteles, que foi um grande zoólogo, o primeiro a classificar os organismos com base nas características morfológicas (Goin, Goin & Zug, 1978; Medawar & Medawar, 1977). Os primeiros relatos sobre experimentos com venenos de serpentes foram publicados em 1664 pelo italiano Francesco Redi (1626-1696). Ele relatou que o veneno das serpentes se encontrava em um líquido amarelo, o qual fluía por sulcos através dos dentes. Redi observou que alguns animais sobreviviam sem tratamento ao envenenamento por serpentes e descreveu diferenças entre as venenosas e não-venenosas, utilizando os dentes como principal caráter definidor. Estas diferenças foram também relatadas pelos naturalistas ingleses John Ray em 1693 e Patrick Russel em 1787. Ray escreveu a clássica obra “Synopsis methodica animalium quadrupedum et serpentini”, na qual diferencia as serpentes peçonhentas das não peçonhentas (Goin, Goin & Zug, 1978; Habermehl, 1994; Hawgood, 1999). O primeiro experimento in vitro com venenos de serpentes foi realizado pelo inglês Richard Mead, em 1708. Ele caracterizou o veneno de cobras no grupo dos ácidos, porque associou algumas propriedades do veneno com compostos ácidos conhecidos na época. A partir daí surgiu a idéia de que um álcali volátil, como o amoníaco, seria o antídoto para venenos ofídicos.
  • 19. 5 Um século após os experimentos de Francesco Redi, Ablé Felice Fontana (1730- 1805), também italiano, escreveu “Traité sur le vénin de la vipère”, um texto clássico de toxinologia, traduzido do italiano e publicado em 1781. Ao lado dos trabalhos de Redi e Mead, embora com muitos anos de diferença, os trabalhos de Fontana foram pioneiros em utilizar a experimentação nos estudos sobre venenos de cobras. Felice Fontana descreveu a glândula e o ducto de veneno, o sulco dos dentes e o mecanismo pelo qual as serpentes articulam a boca e inoculam o veneno na presa. Ele descreveu também algumas ações biológicas do veneno de Vipera berus (Viperidae), como a hemorragia e miotoxicidade, além de ter demonstrado que o veneno de serpentes não era um ácido. Desse modo, Fontana mostrou que o amoníaco utilizado nos envenenamentos ofídicos também não era eficaz para neutralizar as ações do veneno de serpentes. Apesar disso, o uso do amoníaco continuou a ser utilizado nos casos de envenenamentos durante os 100 anos seguintes (Hawgood, 1995; Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000). Um dos pioneiros nas pesquisas sobre os efeitos sistêmicos dos envenenamentos ofídicos foi o médico inglês Joseph Fayrer (1824-1907). Ele trabalhou no Serviço Médico da India e, em 1872, escreveu um tratado tão longo quanto o título “The thanatophidia of India being a description of the venomous snakes of the Indian Peninsula with an account of the influence of their poison on life and a series of experiments”. Fayrer relacionou com o curare os efeitos do envenenamento por Naja naja (Elapidae) – bloqueio da junção neuro-muscular. Em 1875 uma comissão médica da India apoiou definitivamente os estudos de Fontana, Russel e Fayrer sobre a ineficácia do amoníaco em inibir o veneno de serpentes e, em 1878, Brunton e Fayrer relataram que o permanganato de potássio destruía in vitro a atividade letal do veneno de N. naja, mas não protegia completamente o organismo quando submetido a altas doses de veneno (Hawgood, 1996, Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000). Os estudos sobre a toxinologia de venenos ofídicos avançaram bastante durante a segunda metade do século XIX. Em 1860, Silas Weir Mitchell descreveu a natureza proteica do veneno de Crotalus horridus; em 1873, Brunton Fayrer relataram que a parada respiratória era a causa da morte pelo envenenamento de C. horridus; em 1890, Victor Razotzi mostrou experimentalmente que a parada respiratória causada pelo veneno de C.
  • 20. 6 horridus era devido ao bloqueio da junção neuro-muscular, e que este veneno tinha ação miotóxica sobre o músculo cardíaco e esquelético (Hawgood, 1996). No Museu Nacional do Rio de Janeiro, em 1881, o fisiologista João Batista de Lacerda relatou sobre a eficácia do permanganato de potássio (1%) em neutralizar in vitro a ação letal do veneno botrópico. O estudo de Lacerda foi realizado independentemente das pesquisas de Brunton e Fayrer de 1878, os quais também relataram o uso do permanganato nos envenenamentos ofídicos. Embora ineficaz, o uso do permanganato foi utilizado até o desenvolvimento da soroterapia (Brazil, 1911; Hawgood, 1996; Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000; Cardoso, 2003). Quando o médico francês Albert Calmette (1863-1933) iniciou em 1891 seus estudos sobre o veneno de Naja naja, no laboratório de Roux no Instituto Pasteur, nenhum método era eficiente para neutralizar venenos de cobras. Fundamentado nas descobertas de Behring e Kitassato sobre a imunidade contra as toxinas da difteria e tétano, publicadas em 1890, Calmette verificou que doses repetidas do veneno de N. naja (recebido da Indochina) injetadas em cavalos, conferiam imunidade aos animais. Estimulado pelos resultados, Calmette aperfeiçoou o método para neutralizar o veneno de várias espécies de serpentes e o seu eu protocolo foi adotado por Vital Brazil no Brasil em 1898, por MacFarland nos Estados Unidos em 1899, por Tidswell na Austrália em 1901, por Lamb na India em 1904 e por Ishizaka no Japão em 1907. As pesquisas realizadas após a descoberta de Calmette apontaram para as especificidades bioquímicas dos venenos, porque o soro elaborado com o veneno de Naja não neutralizava o veneno de outras serpentes, nem mesmo as espécies da família Elapidae. Calmette então formulou a hipótese de que os venenos de serpentes possuíam dois tipos de proteínas (Hawgood, 1992, 1999; Vital Brazil, 1987): uma predominante nos viperíneos, que era destruída pelo calor a 75-85o C, de alto peso molecular; outra predominante nos elapídeos, mais resistente ao calor e de baixo peso molecular. Calmette não testou a sua hipótese. Coube ao médico brasileiro Vital Brazil Mineiro da Campanha dar continuidade aos estudos de Calmette. Os experimentos de Vital Brazil sobre imunização de animais contra o veneno de cobras foram iniciados em 1897, em São Paulo, num anexo do Instituto Bacteriológico (posteriormente Instituto Serumterápico e atualmente Instituto Butantan,
  • 21. 7 vinculado à Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo). Vital Brazil foi quem demostrou a especificidade do soro antiveneno e desenvolveu o soro monovalente contra o veneno de Bothrops jararaca e Crotalus durissus terrificus (Hawgood, 1992; Vital Brazil, 1987; Raw & Sant´Anna, 2002). Vital Brazil realizou vários estudos; no presente contexto destacam-se as suas pesquisas sobre a catalogação das serpentes venenosas brasileiras, descrições da morfologia dos dentes e glândulas de veneno, estudos sobre a toxicidade do veneno de Crotalus durissus terrificus, Bothrops jararaca, B. alternatus e B. jararacussu para determinar a dose letal (em microgramas) dos venenos e descrever os efeitos fisiopatológicos dos envenenamentos (Brazil, 1901, 1901a). Num dos experimentos, ele inoculou os venenos pelas vias gástrica (oral), hipodérmica, venosa, intramuscular e intraserosa (intraperitoneal), utilizando pombos, cobaias, coelhos e cães. Ele distinguiu dois fenômenos distintos das ações dos venenos sobre o organismo, os quais denominou fenômenos locais e fenômenos gerais (sistêmicos), descrevendo também alguns sintomas específicos. Com relação à composição química dos venenos, Vital Brazil relatou a presença de água, sais, materiais corantes e substâncias albuminóides, as quais considerou como partes tóxicas do veneno. Após imunizar cães contra o veneno de cascavel e jararacas, separadamente, ele verificou que o soro do animal imunizado contra o veneno da jararaca não tinha ação sobre o veneno da cascavel, bem como o soro ativo contra o veneno crotálico se mostrou inócuo sobre o veneno botrópico (Brazil, 1901b). Atualmente o soro antiveneno ofídico é obtido de cavalos hiperimunizados contra o antígeno correspondente – o veneno. Depois de aplicadas algumas doses, a concentração de anticorpos é grande e o animal é sangrado. As hemácias são colocadas para decantar, o soro é retirado e as hemácias devolvidas ao cavalo, para o animal não ficar anêmico. A fração de imunoglobulinas é precipitada com sulfato de amônia e depois tratada com pepsina para digerir as proteínas e remover o segmento Fc das moléculas de anticorpo; estas neutralizam o veneno (Raw & Sant’Anna, 2002). Vital Brazil abriu o caminho para os estudos sobre a toxinologia de venenos ofídicos. A partir dos seus trabalhos no Instituto Butantan inicia-se uma nova fase (revisão em Gutiérrez, 2002) na toxinologia de venenos de serpentes, com trabalhos cada vez mais
  • 22. 8 voltados para estudos sobre a farmacologia e bioquímica dos venenos. Um dos trabalhos pioneiros nesta área foi realizado por Slotta & Fraenkel-Conrat (1939), que purificaram e cristalizaram a crotoxina, principal componente tóxico de várias espécies de Crotalus, responsável pelas ações miotóxica e neutóxica do veneno crotálico. A descoberta da bradicinina por Rocha e Silva, Beraldo & Rosenfeld (1949) inaugurou uma fase muito importante na toxinologia de venenos ofídicos. A bradicinina, polipeptídeo isolado do veneno de Bothrops jararaca, é liberada no plasma através da ação enzimática do veneno botrópico e estimula a musculatura lisa, causando principalmente vasodilatação e aumento da permeabilidade capilar. Os trabalhos de Kondo et al. (1960) e Villarroel (1977) estabeleceram novos critérios metodológicos das pesquisas sobre venenos de serpentes e soroneutralização cruzada. A descrição da botroxina do veneno de Bothrops atrox, em 1976, por Stoker e Barlow, e os trabalhos de Lomonte e Gutiérrez e colaboradores, nas décadas de 1980-2000, têm contribuído com novas informações sobre os efeitos hemorrágicos causados pelo veneno das viperíneas e crotalíneas, principalmente com relação ao estudo das miotoxinas (proteínas com fosfolipase A2 da classe II) e metaloproteínas. Os trabalhos de Furtado e colaboradores, realizados no Instituto Butantan nas décadas de 1980-90, estudaram vários aspectos relacionados à variabilidade dos venenos de serpentes e propuseram padronizações de métodos para verificar atividades indutoras de hemorragia, necrose, edema e atividades caseinolíticas, bem como as atividades promotoras da coagulação do fibrinogênio e do plasma. A revisão mais recente sobre a toxinologia do veneno de serpentes foi realizada por Gutiérrez (2002), a qual traz excelentes descrições dos principais estudos sobre a composição química e mecanismo da ação das toxinas dos venenos de serpentes da América do Sul. Gutiérrez descreveu as neurotoxinas dos venenos, as proteínas que afetam a coagulação sanguínea, as inflamações e necroses musculares induzidas por toxinas dos venenos, as metaloproteínas e fosfolipases. Além disso, ele analisou criteriosamente os estudos sobre as novas terapias antiofídicas e estudos clínicos para compreensão da fisiopatologia dos envenenamentos ofídicos, analisando também o desenvolvimento de novas tecnologias para a melhoria da qualidade dos antivenenos produzidos nas instituições sul-americanas.
  • 23. 9 Plantas medicinais e ofidismo O conhecimento sobre as plantas medicinais foi adquirido com base nas experiências individuais e repassados pelas gerações através das representações populares. Os textos dos babilônios, assírios e hebreus já traziam as utilizações terapêuticas de preparados com plantas, mas foram os gregos quem sistematizaram o uso de plantas medicinais, através de relatos contidos nas obras de Aristóteles (384-322 a.C.), Hipócrates (460-377a.C.) e Teofrasto (370-285 a.C.). Dentre os relatos importantes sobre fitoterapia, são relevantes as descrições de Pedanius Dioscórides (século I d.C.), contidas no tratado “Matéria Médica” com cerca de 600 plantas medicinais conhecidas na época; as descrições do alquimista Celsius na obra “De Medicina” que relata usos de plantas e demais preparados, inclusive algumas prescritas como antídotos contra venenos de serpentes, e as descrições dos romanos Plínio (61-113 d.C.) e Galeno (130-200 d.C.), as quais contêm diversos preparados de plantas para tratamento de doenças, traumatismos e outras indicações, mais ou menos como elaborados atualmente (Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000). Durante a Idade Média houve uma sensível redução nos relatos sobre fitoterapia. Na segunda metade do século XV e no final do século XVIII ressurgiram as obras sobre plantas medicinais, com destaque para as idéias de Paracelso, explicadas na Teoria das Assinaturas. De acordo com esta teoria, os deuses teriam colocado indicadores nas plantas, como sinais para orientar os humanos a descobrir o valor curativo destas, os quais seriam revelados por intuições e antropomorfias, através de tentativas e erros. Por exemplo, poderiam servir como antiofídicas as plantas que apresentassem algum caráter que lembrasse o zig-zag da locomoção de serpentes ou qualquer aspecto da planta ou dos frutos e sementes que sugerissem alguma semelhança com cobras; as plantas que apresentassem coloração avermelhada nos frutos, flores ou folhas serviriam como anti- hemorrágicas, devido à semelhança com a cor do sangue (Otero, Fonnegra & Jiménez, 2000). No Brasil, um dos primeiros relatos sobre o uso de plantas para inibir os efeitos de envenenamentos por serpentes foi feito no século XIX, através das descrições das viagens que os dois naturalistas bávaros Johann Baptist von Spix (1781-1826) e Carl Friedrich
  • 24. 10 Phillip von Martius (1794-1868) empreenderam por diversas regiões brasileiras entre 1817-1820, a convite da arquiduquesa Leopoldina, no contexto cultural da vinda de vários naturalistas ao Brasil em meados do século XVIII (Vanzolini, 1996). Em 1818, Spix e Martius relataram que no arraial do Rio Verde, Minas Gerais, usava-se uma planta genericamente conhecida como cainca nos envenenamentos por Bothrops urutu (Viperidae) (Sommer, 1953). Na caatinga e no cerrado a cainca é o nome comum que se dá a várias espécies de plantas da família Rubiaceae, também conhecida como cipó-cruz e caninana; na Amazônia é conhecida popularmente como raiz-preta (Chiococca anguifuga Mart.) (= C. brachiata Ruiz & Pav.). Com a morte de Spix, seu fiel amigo Martius prosseguiu o trabalho de catalogar os exemplares dele e descrever a flora brasileira em uma coleção de 15 volumes, reunidos na “Flora Brasiliensis”, obra clássica publicada em 1882 por Martius, em Munique (Sommer, 1953; Vanzolini, 1996). Os primeiros livros que descreveram as propriedades curativas das plantas medicinais brasileiras foram “Ensaio sobre o cinchoeiro e sua influência nas virtudes da quina”, escrito pelo português Bernardino Antonio Gomes em 1812, e o livro “Systema de Matéria Medica Vegetal Brasileira”, escrito por Henrique Velloso D’Oliveira, em 1854 (Cardoso, 2003; D’Oliveira, 1854). Gomes cita a planta Aristolochia sp como antiofídica. D’Oliveira comenta sobre o uso das plantas conhecidas pelas propriedades medicinais, citando os nomes populares e científicos. Para acidentes ofídicos, ele relatou o uso da raiz tuberosa da jararaca ou erva-de-santa-maria (Dracontium polyphyllum L., Araceae) (= D. asperum C.Koch). Interessante é que o uso antiofídico desta planta era recomendado devido à semelhança com a cor “sarapintada” das serpentes, de acordo com a Teoria das Assinaturas, de Paracelso. As demais plantas citadas por D’Oliveira como tendo propriedades antiofídicas foram: a raiz da Arisaema phythonium (= Zomicarpa phytonium (Mart.) Schott, Araceae), planta da caatinga que os índios empregavam no local da picada quando envenenados por cobras; a raiz de cipó-de-jarrinha ou milome (Aristolochia antihysterica) (= A. triangularis, Aristolochiaceae); o alecrim-bravo (Hypericum laxiusculum, Hypericineae); Eupatorium crenatum (= Mikania cordifolia, Asteraceae); orelha-de-onça (Cissampelos ovalifolia Chodat & Hassl., Menispermaceae); a fruta-de- pombo (Erythroxylon anguifugum, Erythroxylaceae); a erva-mular ou curraleira (Croton sp, Euphorbiaceae) e o tuiuiá ou abobrinha-do-mato (Bryonia bonariensis ficifolio) (=
  • 25. 11 Cayaponia bonariensis (Mill.) Mart. Crav., Cucurbitaceae). D’Oliveira cita no seu livro a análise que Thomé Rodrigues Sobral fez da planta Aristolochia sp (citada Aristolochia antihysterica), em Coimbra. Sobral encontrou “um princípio volátil aromático solúvel em álcool, um princípio oleoso resinoso, um amargo análogo ao gentianino, uma porção pequena de mucilagem, cal, potassa e ferro”, combinação que teria ação antiofídica (D’Oliveira, 1854). Ainda no final do século XIX, o botânico Schindler publicou no Rio de Janeiro um catálogo das plantas medicinais brasileiras, com descrições das propriedades terapêuticas, usos e doses administradas (Schindler, 1884). Ele relatou o uso de seis espécies de plantas antiofídicas: i) a raiz do cipó-de-cobra (Cissampelos glaberrima St.Hill., Menispermaceae), ii) a raiz da orelha-de-onça (C. ebracteata, Menispermaceae), iii) o suco do guaco (Mikania guaco Humb. & Bonpl., Asteraceae), iv) o suco da erva-de-cobra (M. opifera) (= M. cordifolia Wild., Asteraceae), v) a raiz do para-tudo (Gomphrena officinalis, Amaranthaceae), vi) o paracari ou hortelã-branco (Peltodon radicans Pohl, Labiatae). Em 1888, Theodoro Peckolt e Gustavo Peckolt, pai e filho, escreveram um livro sobre a história das plantas medicinais no Brasil, no qual constam descrições botânicas e etnobotânicas, partes da planta utilizadas, composição química, usos industriais e fitoterápicos e as doses utilizadas (Peckolt & Peckolt, 1888). Oito espécies de plantas, pertencentes a 5 famílias, foram por eles descritas como antiofídicas: i) família Isoetaceae, representada por Isoetes martii A. Braum, conhecida popularmente como batatinha- d’água; ii) família Ophioglossaceae, representada por Ophioglossum palmatum Plum, cujo nome popular é língua-de-víbora, é citada principalmente contra a mordida de “víboras” (lagartos do gênero Diploglossus, que no imaginário popular vira cobra), e por Botrichium virginicum Swartz, a língua-de-víbora-do-campo, iii) família Zamiaceae, representada por Zamia brongniartii Wedd, popularmente conhecida como salgueiro-da-terra, da qual se utiliza a goma do tronco contra mordidas de cobras, iv) famíia Commelinaceae, representada por Tradescantia geniculata Velloso (= Gibasis geniculata (Jacq. Rohweder), conhecida como trapoeiraba-efêmera, v) família Araceae, representada por Dracontium polyphyllum L. (= D. asperum C. Kock, Araceae), popularmente conhecida como jararaca- mirim; e Staurostigma luschnathianum C. Kock, popularmente conhecida como jararaca- do-rio. Na maioria das preparações citadas por Peckolt & Peckolt (1888) eles
  • 26. 12 recomendaram também o uso de cachaça com as plantas, cujas infusões deveriam ser bebidas ou aplicadas no local da mordida da cobra. Em 1914, Gustavo Peckolt continuou o estudo sobre a história das plantas medicinais e úteis do Brasil, que ele iniciou com seu pai em 1888. Gustavo descreveu o uso das sementes do araticum (Annona furfuracea St.-Hill, Anonaceae), cuja mistura com cachaça era indicada como um bom antídoto nos casos de envenenamento por cascavel (Peckolt, 1914). O brasileiro Manuel Pio Corrêa (1874-1934) foi naturalista do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e um dos pioneiros nos estudos sobre plantas medicinais. Todas as informações relatadas por Pio Corrêa sobre a utilização das plantas foram reunidas em seis volumes na clássica obra “Dicionário das plantas úteis do Brasil”, com a colaboração de Leonam de Azeredo Penna. Cada espécie relatada apresenta uma diagnose, nomes populares e informações sobre a utilização como alimento, aplicações industriais e terapêuticas. As plantas citadas no dicionário como antiofídicas são (ver também Pio Corrêa, 1909): a raiz do cipó-de-cobra (Cissampelus glaberrima St. Hil, Menispermaceae), citada também por Shindler (1884); a erva-de-jararaca (Dracontium asperum C. Kock, Araceae); as folhas de contra-cobra (Aegiphila salutaris H.B.K., Verbenaceae); a abutua- miúda (Cocculus filipendula M., Menispermaceae); a contra-erva, calunga ou jarrinha (Aristolochia trilobata, Aristolochiaceae); a batatinha-d’água (Isoetes martii, Isoetaceaea) e o alecrim-bravo (Hypericum laxiusculum, Hypericineae). Estas duas últimas foram também citadas por Peckolt & Peckolt (1888) e D’Oliveira (1854). Silveira (1921) descreveu o uso do agrião-do-brejo, Eclypta alba (= E. prostrata (L.) L. Asteraceae) contra picadas de serpentes, planta citada na literatura como antiofídica desde 1882, quando Martius publicou a “Flora Brasiliensis”. Renato Braga escreveu um também clássico trabalho sobre etnobotânica, “Plantas do Nordeste, especialmente do Ceará” (Braga, 1960). Neste livro, ele relatou o uso de plantas indicadas nos casos de envenenamentos por serpentes, como a raiz-preta (Chiococca anguifuga, Rubiaceae), citada também por Martius em 1818; a milho-de-cobra (Dracontium asperum, Araceae), também relatada como antiofídica por Pio Corrêa (1909); a língua-de-tiú (Casearia sylvestris Swartz, Flacurtiaceae); a erva-de-cobra (Mikania cordifolia Willd, Asteraceae) e o paracari ou hortelã-bravo (Peltodon radicans Pohl, Labiatae).
  • 27. 13 Na década de 1980, houve um expressivo avanço nos estudos sul-americanos sobre plantas medicinais, principalmente as antiofídicas: em vez de citar os usos das plantas apenas com base nas representações populares, como ainda hoje ocorre na maioria das publicações, os efeitos das plantas começaram a ser verificados biológica, bioquímica e farmacologicamente, através de experimentos controlados (e.g. Pio Corrêa, 1909; Vieira, 1992; Caribé & Campos, 1997; Simões et al., 1998; Agra, 1996). Inicia-se então uma nova fase, com trabalhos cada vez mais voltados para estudos sobre a bioquímica e síntese de produtos naturais das plantas, como, por exemplo, a descoberta das cabenegrinas I e II, substâncias isoladas de uma planta supostamente amazônica, que inativaram o veneno de Bothrops atrox (Nakagawa et al.,1982). No Brasil, o trabalho de Calixto e colegas, realizado em 1985, foi um dos pioneiros nesta linha de experimentos controlados com plantas medicinais antiofídicas (ver Martz, 1992). Eles trabalharam com o extrato bruto de Mandevilla velutina (Apocynaceae) e o veneno de B. jararaca, utilizando útero isolado de rato e verificaram que o extrato teve ação sobre a bradicinina, um peptídeo hipotensor liberado pelo veneno de B.jararaca, descoberto por Rocha e Silva e colaboradores em 1949. Assim foram os estudos com a atropina, extraída de Atropa belladonna L. (Solanaceae), que protege o organismo contra as ações sinérgicas da toxina F7 do veneno da mamba Dendroaspis polylepis polylepis (Elapidae) e os trabalhos do químico de produtos naturais Walter Mors, cuja equipe de colaboradores isolou os compostos wedelolactona, sitosterol e stigmasterol da planta Eclipta prostrata L. (Asteraceae), mostrando que o extrato protegeu as ações miotóxicas do veneno de Crotalus durissus, inibindo as ações das cininas. O estudo de Mors e colaboradores utilizou preparações de músculo esquelético (Mors et al., 1989). As melhores revisões sobre plantas antiofídicas são as de Martz (1992), sobre os extratos de plantas com potencial em neutralizar as toxinas dos venenos de cobras, na qual ele relata o uso de compostos isolados de plantas com ação antiofídica; Pereira et al. (1994), sobre compostos isolados de plantas e descreve alguns prováveis mecanismos de ação, e os estudos realizados por Castro et al. (1999) e Otero, Fonnegra & Jiménez (2000), os quais verificaram a neutralização das ações dos venenos por alguns extratos de plantas da Costa Rica e da Colombia, além de citarem cerca de 85 espécies de plantas utilizadas como antiofídicas com base nos relatos populares.
  • 28. 14 Materiais e Métodos 1. Epidemiologia i) Coleta de Dados: Os dados para as análises epidemiológicas dos acidentes ofídicos ocorridos em Sergipe foram obtidos nas fichas de notificação de acidente por animais peçonhentos do Sinam Windows – versão 4.0DocumentaçãoDicionário de DadosDICANIMAIS-DELPHI.doc 07/03/2002, os quais foram cedidos pela vigilância epidemiológica da Secretaria da Saúde do Estado de Sergipe. ii) Variáveis: Para as análises utilizei as seguintes variáveis: número de acidentes ofídicos por ano, idade, sexo dos acidentados, tempo decorrido entre o acidente e o atendimento, número de ampolas de soros antiofídicos (botrópico, crotálico, laquético e elapídico) utilizadas durante o período e classificação quanto a gravidade do caso, segundo critérios estabelecidos pela Fundação Nacional da Saúde (Brasil, 1999). iii) Análise dos Dados: Para compor o quadro epidemiológico, inicialmente foram feitas as distribuições de freqüências destas variáveis com relação ao município e mês de ocorrência do acidente, tempo decorrido entre o acidente e o atendimento, partes do corpo atingidas e às alterações locais e sistêmicas decorrentes dos envenenamentos ofídicos. Após verificar a distribuição de cada variável, as seguintes análises foram feitas: i) a incidência dos acidentes ofídicos (Rouquayrol & Almeida Filho, 1999) através do quociente entre o número de casos ocorridos nas áreas rurais de Sergipe durante o período 1999-2002 e o número de pessoas expostas, multiplicado pela população de referência, neste caso 10000 indivíduos, ii) as proporcões dos acidentes ofídicos com relação às diferentes regiões ecológicas de Sergipe, idade e sexo dos acidentados e a sazonalidade dos acidentes, iii) os sintomas (locais e sistêmicos) com relação ao tempo decorrido entre o acidente e a soroterapia, iv) partes do corpo atingidas e gravidade dos casos. A estatística qui-quadrado foi utilizada para verificar as hipóteses nulas de proporções iguais ou desiguais, conforme o caso, e de homogeneidade entre as variáveis.
  • 29. 15 2. Parâmetros biológicos do veneno de Bothrops jararaca Os seguintes testes foram realizados para analisar os parâmetros biológicos do veneno: dose letal 50% (DL50) e dose mínima hemorrágica (DMH). Estes testes são importantes para verificar as doses-desafios e a eficácia das plantas em inibir o veneno. i) Veneno: Mistura de veneno liofilizado de B. jararaca, procedente da Seção de Venenos do Instituto Butantan. A mistura foi estocada e mantida a -20ºC até o momento de uso. ii) Animais: Camundongos Swiss, não-isogênicos, de ambos os sexos, pesando entre 18 e 22 g. Os animais foram fornecidos pelo Biotério Central da Universidade Federal de Sergipe. iii) Dose Letal 50% (DL50): A DL50 é a unidade tóxica do veneno, definida como a quantidade de veneno capaz de em 48 horas provocar a morte de 50% dos animais inoculados por via intraperitoneal (Vilarroel, 1977). Com base na DL50 foi determinado a concentração da dose-desafio dos experimentos de inibição da letalidade do veneno pelos extratos. iv) Experimentos e concentrações DL50: Fiz seis experimentos em dias diferentes para a determinação da dose letal do veneno de B. jararaca; destes, quatro foram utilizados para análises porque apresentaram relação mortos/nº de animais inoculados proporcional ao aumento das concentrações do veneno. Os dois primeiros foram descartados porque as doses não estavam bem determinadas e ficaram muito baixas (sobreviveram todos os animais) ou muito altas (morriam todos os animais). As concentrações do veneno em todos os experimentos foram: 23.0, 27.6, 33.1, 39.7 e 47.6 µg. O intervalo entre as doses foi estabelecido com base na DL50 do veneno de B. jararaca já determinado no Instituto Butantan, por isso a menor dose de 23.0µg, menor do que a DL50 do veneno, foi estabelecida como um dos extremos; a partir desta foram determinadas as demais doses utilizando um fator de diluição de 1.2 (padronizado para estudos com veneno). Para cada concentração foram utilizados seis camundongos, inoculados via intraperitonial (i.p.) com 0,5 ml de veneno dissolvido em NaCl 0,9%.
  • 30. 16 v) Análise dos dados DL50: A dose letal 50% do veneno foi determinada com base na razão entre os camundongos mortos e o número total de animais inoculados com o veneno, valores que expressam a freqüência com que uma observação está acima do valor esperado na distribuição normal, conhecida como valores probíticos (Fisher, 1949). Foram utilizados dois métodos para encontrar os valores probíticos: o primeiro foi através do programa de computador elaborado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para determinar a regressão linear e a dose letal 50%; o segundo foi através de regressões lineares, utilizando a variável dependente (y) como probit e a variável independente (x) como log da dose, o ‘b’ é o aumento dos valores probíticos de acordo com o aumento do log da dose. Nos ensaios biológicos com venenos de serpentes, geralmente a distribuição de freqüência da dose letal individual não é normal, quando a dose de veneno é colocada na abscissa; para torná-la normal ou aproximadamente normal a dose foi transformada em unidades logaritmizadas. Estas doses transformadas são freqüentemente chamadas dosagens (Sokal & Rholf, 1995). As comparações entre os dois métodos foram feitas para verificar se os resultados eram iguais. A seqüência de análise dos dados foi: i) para cada experimento determinei a regressão linear e a DL50 no programa, ii) depois as doses foram logaritimizadas e substituídas nas respectivas equações da regressão (x), para encontrar o valor probítico de cada dose (y), iii) para cada experimento fiz uma regressão para verificar correlações entre as doses e os valores probíticos, iv) após determinar a regressão para cada experimento, fiz uma comparação simultânea entre as 4 retas das regressões (Vanzolini, 1993), v) por último fiz uma análise probítica conjunta para encontrar a DL50 de todos os ensaios. O resultado da análise probítica conjunta foi comparado com a equação geral das 4 retas para verificar e confirmar as análises (Fisher, 1949; Fisher & Yates, 1953; Zar, 1996). vi) Dose Mínima Hemorrágica (DMH): A dose mínima hemorrágica é definida como a menor quantidade de veneno (g) capaz de produzir uma área hemorrágica de 10 mm de diâmetro em animais experimentais (Castro et. al., 1999; Furtado et. al., 1991, Bolaños, 1984). Com base na DMH foi determinada a dose-desafio utilizada para testes de inibição da hemorragia local do veneno pelos extratos.
  • 31. 17 vii) Experimentos e concentrações DMH: Fiz cinco experimentos para determinar a DMH do veneno de B.jararaca. Apenas dois experimentos foram utilizados para análise por apresentarem resultados mais coerentes, com diâmetros da hemorragia cerca de 10mm e proporcionais às concentrações do veneno. Os demais foram descartados, porque as doses utilizadas eram muito baixas (os animais não apresentaram hemorragia) ou muito altas (hemorragia maior do que 10mm). Experimento 1: concentrações 0.10, 0.14, 0.18, 0.22 e 0.26 µg. Experimento 2: concentrações 0.14, 0.18, 0.22, 0.26 e 0.30 µg. Para cada concentração foram utilizados 4 camundongos. Os camundongos receberam injeções intradérmicas no abdome com doses crescentes de veneno (0,1ml/animal) dissolvido em NaCl 0,9%. viii) Análise dos dados DMH: Duas horas após injetados, os camundongos foram sacrificados, a pele removida e esticada em placa de vidro, sobre a qual a mancha hemorrágica foi copiada em papel milimetrado. Ao redor da mancha hemorrágica forma-se um edema, não copiado no papel. O número de quadrículas contidas na mancha é a área hemorrágica, inferida através da área da circunferência a = ð r², transformada para diâmetro = 2 √a/ð (Bolaños, 1984). A determinação da dose mínima hemorrágica foi feita da seguinte maneira: i) análise de regressão, tendo sido encontrado duas equações, uma para cada experimento, cujas variáveis dependentes são os diâmetros das áreas hemorrágicas (y) e as independentes são as concentrações do veneno (x), ii) substituição da variável dependente (y) por 10mm (diâmetro padrão da DMH), que constitui a dose mínima hemorrágica, iii) as doses mínimas hemorrágicas foram praticamente idênticas (0.23g e 0.24g), por isso os experimentos foram somado e feita uma análise conjunta dos experimentos para encontrar a dose mínima hemorrágica do veneno. As análises estatísticas seguiram os protocolos e algoritmos usuais (Vanzolini, 1993; Zar, 1996).
  • 32. 18 3. Verificação da eficácia das plantas Os seguintes ensaios foram realizados para verificar a toxicidade das plantas e testar a eficácia destas sobre o veneno de B. jararaca: DL50, análise da letalidade e testes de inibição da hemorragia comparados com grupos de controle. i) Material botânico: As plantas utilizadas para verificar as ações antiofídicas foram coletadas na região de caatinga de Curituba, Sergipe (09o 41’ S, 37o 53’W) (Figura 1) durante 2002/2003, com base nas informações de benzedores e moradores locais. Adicionalmente, foi incluída nas análises uma amostra de plantas da região do cerrado de Peixe, rio Tocantins, no Estado homônimo, indicada popularmente na região como antiofídica e conhecida como batata-de-teiú. Curituba, Se: batata-de-teiú (Apodanthera villosa C. Jeffrey, Cucurbitaceae). cabeça-de-negro (Apodanthera glaziovii Glaziou ex Cogniaux, Cucurbitaceae). pinhão-bravo (Jatropha mollissima (Pohl) Baill, Euphorbiaceae). Peixe, To: batata-de-teiú (Jatropha elliptica (Pohl) Muell. Arg., Euphorbiaceae). As plantas foram coletadas e herborizadas com material fértil para identificação. O restante do material foi coletado em quantidades suficientes para preparar os extratos aquosos. As cucurbitáceas foram identificadas no Departamento de Botânica da Universidade Federal de Goiás; as euforbiáceas foram identificadas no Instituto de Botânica da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Figura 1. Localização da região de Curituba, Sergipe. Curituba Rio São Francisco Oceano Atlântico
  • 33. 19 ii) Preparação do extrato aquoso: As raízes tuberosas de A. villosa , A. glaziovii, J. elliptica e o caule de J. mollissima tiveram o seguinte tratamento para preparar os extratos: 1. secagem a 40o C em estufa, 2. trituração em moinho até a obtenção do polvilho, 3. preparação dos extratos brutos por decocção, durante 10 minutos, de 200 gramas do polvilho, 4. filtragem do extrato bruto, 5. liofilização do extrato filtrado. O pó liofilizado, pesado para cada concentração e diluídos em salina, foi utilizado nos experimentos. iii) Animais: Camundongos Swiss, não-isogênicos, de ambos os sexos (18-22g). Os animais foram fornecidos pelo Biotério Central da Universidade Federal de Sergipe. iv) Dose letal 50% (DL50): A DL50 de cada extrato também foi determinada com base na razão entre os camundongos mortos e número total de animais inoculados com o extrato, após 48 horas de observação, como realizado para o veneno. A dose letal 50% de cada planta foi encontrada para selecionar as doses de extrato utilizadas nos ensaios biológicos de inibição da hemorragia e da letalidade. As concentrações dos extratos foram determinadas por tentativa e erro até encontrar a relação entre animais mortos e inoculados proporcional às concentrações dos extratos. Foram realizados dez ensaios com as plantas, com os seguintes intervalos de doses: 3 ensaios com A. villosa; concentrações 0.008-0.04g, 3 ensaios com A. glaziovii; concentrações 0.001-0.011g, 3 ensaios com J.mollissima; concentrações 0.0003-0.04g, 1 ensaio com J. elliptica; concentrações 0.01-0.03g. v) Análise dos dados DL50 das plantas: Para cada concentração foram utilizados seis camundongos. A estatística utilizada para verificação da DL50 foi a análise probítica (Fisher, 1949; Fisher & Yates, 1953). Em cada ensaio, a variação entre animais mortos com relação à concentração do extrato foi muito grande, dificultando encontrar a DL50. Por isso somei os 3 experimentos de cada planta para encontrar um valor probítico mais ajustado. Isto foi feito para A. villosa, A. glaziovii e J. mollissima. Para J. elliptica fiz só um experimento, cujo resultado foi proporcional às concentrações e não julguei necessário fazer repetições.
  • 34. 20 vi) Inibição da letalidade: Para verificar a neutralização do veneno pelas plantas (ou antivenenos) há a necessidade de ser selecionada uma dose-desafio, definida como a dose suficiente para apresentar o efeito subliminar e máximo do veneno (Gutiérrez et al, 1990). A dose-desafio do veneno de B. jararaca utilizada para verificar a inibição da letalidade pelos extratos das plantas foi de 2DL50 (74.2g). Foram utilizados dois grupos nas comparações: i) grupo controle - animais inoculados com 74.2g de veneno dissolvido em NaCl 0.9%, ii) grupo experimental - animais receberam a mesma dose-desafio de veneno do grupo controle incubado a 37o C com diluições diferentes de extrato em NaCl 0.9%, durante 30 minutos. Cada camundongo foi inoculado via intraperitonial (i.p.) com 0,5 ml da solução. Os animais foram observados durante 48 horas, com intervalos de 1hora para registro do tempo de sobrevida (em minutos). As concentrações de cada extrato foram determinadas após encontrar as DL50 correspondentes: Apodanthera villosa: concentrações 0.74, 1.00 e 1.48mg, Apodanthera glaziovii: concentrações 1.00, 1.48, 3.0 e 5.0mg, Jatropha mollissima: concentração1.0mg, Jatropha elliptica: concentrações 0.74, 1.00, 1.48, 5.0 e 10.0mg. vii) Análise dos dados da letalidade: No caso dos experimentos de padronização das ações biológicas do veneno havia um resultado esperado. Nos testes de letalidade, que avaliam o tempo de sobrevida, o que se esperava era que durante as repetições os resultados fossem próximos, para poder confiar no ensaio. A análise foi feita da seguinte forma: i) os experimentos com as plantas foram repetidos 2-4 vezes, ii) cada repetição foi considerada uma amostra, iii) cada amostra teve um grupo controle, iv) verifiquei a homogeneidade entre os controles, para confirmar os experimentos, v) os controles de cada planta foram agrupados para análise estatística, vi) verifiquei também a homogeneidade entre as amostras dos grupos experimentais, para cada dose de extrato – consideradas homogêneas, os dados eram agrupados, vii) nas análises finais ficaram para cada planta um grupo experimental com 1-5 doses (dependendo da planta) e um grupo controle. As estatísticas utilizadas foram análise de variância com um fator e teste t (de Student) para verificar a significância entre duas amostras (Vanzolini, 1993; Zar, 1996).
  • 35. 21 viii) Inibição da hemorragia local: Para verificar se os extratos neutralizavam a hemorragia local do veneno de B. jararaca a dose desafio foi de 5DMH (1.2g). Foram utilizados dois grupos nas comparações: i) grupo controle – animais inoculados com 1.2g de veneno, ii) grupo experimental – animais injetados com quantidade constante de veneno (1.2g), o qual foi incubado com diluições diferentes de extrato, durante 30 minutos a 37o C. Os camundongos receberam injeções intradérmicas no abdome com doses de extrato e veneno ou só de veneno (0,1ml/animal), dissolvidos em NaCl 0,9%. Duas horas, após injetados, os camundongos foram sacrificados, a pele removida e determinado a área hemorrágica como na metodologia descrita para determinar a dose mínima hemorrágica. As concentrações dos extratos foram as seguintes: Apodanthera villosa: concentrações 1.0, 3.0 e 6.0mg, Apodanthera glaziovii: concentrações 1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg, Jatropha mollissima: concentração1.0, 3.0 e 6.0mg, Jatropha elliptica: concentrações 1.0, 3.0, 6.0 e 10.0mg. ix) Análise dos dados da inibição da hemorragia: O extrato de cada planta foi testado 2-4 vezes, com 3-4 concentrações diferentes. Foram realizados 8 experimentos com as quatro plantas, com duas repetições por dose de extrato. Cada experimento teve um grupo controle para comparação. Para análise segui os seguintes passos: i) como havia duas repetições por dose, fiz para cada planta teste de homogeneidade entre as doses – consideradas homogêneas, os dados eram agrupados nas análises seguintes, ii) cada repetição do grupo experimental teve um grupo controle, então verifiquei também a homogeneidade entre os controles de cada grupo experimental – se homogêneos, os dados eram agrupados, iii) nas análises finais ficaram para cada planta: um grupo experimental com 3-4doses (dependendo da planta) e um grupo controle. As estatísticas utilizadas foram análise de variância com um fator e teste t (de Student) para verificar a significância entre duas amostras (Vanzolini, 1993; Zar, 1996). Para verificar se as próprias plantas não estavam também contribuindo para as hemorragias, fiz alguns ensaios com os extratos isolados (sem o veneno), utilizando as mesmas concentrações e três animais em cada dose: os extratos não causaram hemorragia.
  • 36. 22 Resultados 1. Epidemiologia dos acidentes ofídicos A maioria dos acidentes ofídicos em Sergipe ocorreu na zona rural. Até a década de 1980 as notificações eram feitas através de prontuários nas unidades de saúde; após esta época, o Ministério da Saúde recomendou o registro em prontuários próprios – as notificações de acidentes por animais venenosos. A partir de 1999 estas notificações estão informatizadas no setor de vigilância epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde. Além da soroterapia, os tratamentos ocasionados por envenenamentos ofídicos em Sergipe incluem as rezas e benzeduras, preparados de contra-venenos e os preparados com plantas, principalmente nas formas de infusão e decocção. A combinação destes tratamentos é comum em Sergipe, não só com relação aos envenenamentos por serpentes, mas todas as afecções são de alguma forma tratadas com combinações de métodos. Preparados Populares Os preparados populares para tratar envenenamentos ofídicos na região de Sergipe são misturas elaboradas principalmente a base de plantas e materiais orgânicos diversos, conforme informado pelas pessoas que comercializam estes produtos. Os componentes dos preparados são mantidos em segredo e os produtos podem ser encontrados nas barracas que vendem plantas medicinais nas feiras livres, nas casas de produtos agropecuários ou comercializados por vendedores que anunciam produtos milagrosos específicos, como a pomada da gordura de sucuri (Eunectes murinus L., 1758) e choque de poraquê (Electrophorus electricus L., 1758), ambas para dores e reumatismos. Os produtos e preparados recomendados para envenenamentos de cobras são encontrados sob diversas formas: infusões de plantas com cachaça, onde as partes das plantas, secas ou verdes, são colocadas no líquido sem serem processadas – as doses variam de acordo com a gravidade do caso; infusões mistas, a base de plantas e outros materiais orgânicos mantidos em segredo; misturas feitas por decocção de partes das plantas; dose pó-de-caboclo, um contraveneno para cobras (e insetos também), elaborado a base de plantas e fabricado em Feira de Santana, Bahia; permanganato de potássio em
  • 37. 23 concentrações desconhecidas, que é vendido em pequenos frascos, cujas doses dependem da gravidade do caso. É comum também encontrar no comércio cobras conservadas na cachaça, cujo conteúdo é indicado contra acidentes ofídicos. As espécies identificadas conservadas no álcool são: as colubrídeas Oxyrhopus trigeminus Duméril, Bibron & Duméril, 1854; Leptodeira annulata L., 1758, Liophis poecilogyrus (Wied, 1825) a leptototiflopídea Leptotyphlops sp e a elapídea Micrurus ibiboboca (Merrem, 1820). O “Específico Pessoa”, fabricado em Sobral, Ceará, com propaladas atividades antiofídicas, não é comercializado na região de Sergipe. As rezas e benzeduras também fazem parte dos tratamentos populares alternativos, cujos ritos são praticados por benzedores locais, homens e mulheres. Fazem parte dos rituais benzer as pessoas e partes vegetais que servem de amuleto contra picadas de cobras, como a semente do cajú; rezar sobre a parte do corpo atingida pela serpente, benzer líquidos (geralmente água) que devem ser bebidos de acordo com as prescrições, as quais incluem doses certas e horários pré-estabelecidos que variam conforme o caso e o benzedor. Humanos e animais, mais comumente eqüinos e bovinos, quando sofrem acidentes ofídicos são tratados da mesma forma pelos benzedores. Fitoterapia Três plantas do semi-árido de Curituba e arredores são indicadas por benzedores e moradores locais como tendo ações antiofídicas: batata-de-teiú (Apodanthera villosa C.Jeffrey, Cucurbitaceae), cabeça-de-negro (Apodanthera glaziovii Glaziou ex Cogniaux, Cucurbitaceae) e pinhão-bravo (Jatropha mollissima (Pohl) Baill., Euphorbiaceae). As duas cucurbitáceas são muito semelhantes, ambas são trepadeiras, mas podem ser encontradas também no chão, as flores são bem pequenas e têm raízes tuberosas, a da batata-de-teiú é mais compridada. O preparado antiofídico com as cucurbitáceas é elaborado com base na fécula da raíz, formando uma papa com a recomendação de ser utilizada em doses baixas. O pinhão-bravo é um arbusto de 1- 3 metros de altura, bem ramificado, casca do caule adulto acinzentado. Esta planta tem um látex muito branco, o qual é indicado para beber direto da planta em caso de acidente ofídico.
  • 38. 24 Estas foram as plantas da caatinga coletadas para verificação das atividades antiofídicas. Em todas as feiras percorridas na região da caatinga de Sergipe e parte da Bahia, até Feira de Santana, as plantas cabeça-de-negro e batata-de-teiú são conhecidas como antiofídicas, mas várias espécies são confundidas sob estes nomes. Infelizmente não foi possível coletar estas plantas para identificar, além do que o material fornecido pelos feirantes estava preparado na forma de pó ou partes cortadas. Na região de Peixe, no rio Tocantins, Estado homônimo, uma planta conhecida como batata-de-teiú (Jatropha elliptica (Pohl) Muell. Arg., Euphorbiaceae) é indicada como antiofídica e foi também testada a sua eficácia, juntamente com as plantas coletadas na região de Curituba. Soroterapia O soro antiofídico é, em Sergipe, aplicado na unidade regional de saúde mais próxima de onde o acidente ocorreu. O caso é notificado e encaminhado para o setor de vigilância epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde; posteriormente é arquivado no setor de vigilância ambiental da saúde. No setor estadual de vigilância epidemiológica as notificações dos acidentes ofídicos estão informatizadas de 1999 a 2002, de acordo com o programa implantado em 2003 pelo Centro Nacional de Epidemiologia da Fundação Nacional da Saúde – Sistema de Informação de Agravo de Notificação, Dicionário de Dados – SINAN, Animais Peçonhentos. As informações anteriores a 1999 encontram-se dispersas e de difícil acesso. Em Sergipe funcionam seis regionais de saúde e uma metropolitana, com as seguintes sedes: Regional Metropolitana – Aracaju, Hospital João Alves Filho; 1a Regional – Estância, Hospital Regional Amparo de Maria; 2a – Itabaiana, Hospital Pedro Garcia Moreno Filho; 3a – Maruim, Hospital de Maruim; 4a – Nossa Senhora da Glória, Hospital João Alves Filho; 5a – Neópolis, Hospital de Neópolis; 6a – Lagarto, Hospital Nossa Senhora Conceição (Figura 2). São estes hospitais regionais que recebem os soros antiofídicos da Central Nacional de Armazenamento e Distribuição de Imunobiológicos (Cenadi/Ministério da Saúde) através da Secretaria Estadual da Saúde de Sergipe, a qual os repassa para as regionais de saúde onde os casos de acidentes ofídicos são encaminhados.
  • 39. 25 Figura 2. Localização das regionais de saúde e os domínios morfoclimáticos das regiões de Sergipe (segundo Ab’Saber, 1977). M = Regional Metropolitana, Aracaju; I = 1a Regional, Estância; II = 2a Regional, Itabaiana; III = 3a Regional, Maruim; IV = 4a Regional, Nossa Senhora da Glória; V = 5a Regional, Neópolis; VI = 6a Regional, Lagarto. De oeste para leste: caatinga (áreas hachuradas), agreste e mata atlântica. Dentre os 95 casos de envenenamentos ofídicos registrados em Sergipe durante 1999 a 2002, observamos que: i) 61 dos acidentados (64%) receberam soroterapia, ii) foram utilizadas 319 ampolas de soro antibotrópico, 46 de antibotrópico-crotálico, 6 de anticrotálico e 10 de antielapídico, iii) 34 casos (36%) não estão notificados se receberam ou não antivenenos, embora os sintomas estejam registrados, iv) em 6 casos a soroterapia foi aplicada sem constar o gênero da serpente que causou o acidente, v) cinco registros de acidentes ofídicos nas notificações não indicam se a soroterapia foi ou não utilizada. Nas notificações também constam que em alguns casos de envenamentos por Crotalus foi utilizado soro antibotrópico (4 ampolas) e antibotrópico-crotálico (3 ampolas); em outros constam os registros de envenenamento crotálico, mas não informam a soroterapia utilizada. Nas notificações dos dois casos de acidentes por Lachesis não constam se os acidentados receberam ou não soroterapia. A Tabela 1 mostra a distribuição de freqüência dos soros utilizados em Sergipe. W Oceano Atlântico Rio São Francisco
  • 40. 26 Tabela 1. Distribuições de freqüências do número de ampolas de soros antiofídicos utilizados em Sergipe. 1999 2000 2001 2002 ampolas f ampolas f ampolas f ampolas f 1 1 1 1 4 2 5 2 2 1 2 1 6 3 6 2 3 1 3 1 8 2 8 3 4 8 4 2 10 2 5 2 6 12 7 1 8 5 Antibotrópico 10 3 Soma 197 14 62 46 3 1 3 3 1 1 4 1 4 1 5 1 5 1 7 1 12 8 1 Antibotrópico- crotálico Soma 27 18 1 2 1 4 1 Anticrotálico Soma 2 4 Antiela- pídico 10 1 Soma 10 Incidência dos acidentes ofídicos Foram notificados 95 acidentes ofídicos em Sergipe entre 1999-2002; os coeficientes de incidência anual variaram de 0,16 a 0,88 caso por 10000 habitantes da zona rural (Tabela 2). Dentre os casos registrados, em apenas 55 (58%) constam os gêneros das serpentes nas notificações: 48 casos foram causados por Bothrops, 4 por Crotalus, 2 por Lachesis e 1 caso por Micrurus; quatro casos foram notificados como tendo sido causados por serpentes não peçonhentas (Tabelas 3)
  • 41. 27 Tabela 2. Coeficientes de incidência anuais dos acidentes ofídicos em Sergipe (1999-2002). 1999 2000 2001 2002 Soma 43 8 23 21 95 (0,88) (0,16) (0,46) (0,42) ( ) coeficiente de incidência/10000 habitantes da zona rural. Média da população rural no período foi 493549 habitantes (IBGE, 2000). Tabela 3. Distribuição anual dos acidentes ofídicos por gênero de serpente. 1999 2000 2001 2002 Soma Bothrops 26 4 7 11 48 Crotalus 1 0 3 0 4 Micrurus 0 0 0 1 1 Lachesis 0 0 2 0 2 Soma 27 4 12 12 55 Não-peçonhenta 2 0 1 1 4 Idade e sexo A proporção dos acidentes ofídicos variou significativamente com relação à idade dos acidentados; pessoas de ambos os sexos foram mais atingidas na faixa etária até os 20 anos (2 = 34.07; p<0.001). A proporção dos acidentados também foi diferente entre os sexos; (2 = 20.59; p<0.001); os homens foram duas vezes mais acidentados do que as mulheres (Tabela 4). Tabela 4. Distribuições dos acidentes ofídicos por idade, sexo. (f freqüência observada; (fi) freqüência esperada). Intervalos de Idade 1-20 21-40 41-60 >60 Soma f 45 25 18 6 94 (fi) (23.5) (23.5) (23.5) (23.5) Hipótese nula: proporções 1:1:1:1 2 = 34.07; p<0.001 Sexo ♀ ♂ n f 25 69 94 f(i) (47) (47) Hipótese nula: proporção 1:1 2 = 20.59; p<0.001
  • 42. 28 Sazonalidade A proporção dos acidentes ofídicos entre os períodos seco e chuvoso foi significantemente diferente (2 =13.78; p<0.001); o predomínio dos casos foi durante os meses secos (Tabela 5). Com relação a uma possível associação entre sexo, período analisado (1999-2002) e sazonalidade, as freqüências anuais de acidentes foram proporcionalmente iguais entre homens e mulheres (2 = 1.15; p>0.05); a proporção de acidentes entre os sexos dos acidentados e os períodos chuvoso e seco também não foi significantemente diferente (2 = 1.33; p>0.05; Tabela 6). Tabela 5. Sazonalidade dos acidentes ofídicos: proporção entre períodos seco (verão) e chuva (inverno). (fi, freqüência observada; (fi) freqüência esperada). Período Verão Inverno Soma f 65 29 94 (fi) (47) (47) Hipótese nula: proporção 1:1 2 = 13.78; p<0.001 Tabela 6. Acidentes ofídicos: associações entre sexo dos acidentados, período analisado e sazonalidade. Ano Sexo 1999 2000 2001 2001 Soma ♂ 30 7 16 16 69 ♀ 12 1 7 5 25 Soma 42 8 23 21 94 2 = 1.15; p>0.05 Sazonalidade Sexo Verão Inverno Soma ♂ 50 19 69 ♀ 15 10 25 Soma 65 29 94 2 = 1.33; p>0.05
  • 43. 29 Regiões de ocorrência A região de Sergipe, está situada nos domínios morfoclimáticos da Mata Atlântica e da caatinga, separados por uma faixa de agreste, a qual é uma caatinga mitigada paralela à costa (Vanzolini, 1972, ver Figura 2). Os acidentes ofídicos são atendidos nas regionais de saúde mais próximas onde ocorrem. Os três ecossistemas foram comparados com relação ao ofidismo; a freqüência de acidentes foi bem menor na caatinga (2 = 34.77; p<0.001); no agreste e áreas de mata as freqüências de acidentes foram praticamente iguais. As regiões de agreste que apresentaram mais casos durante o período analisado foram Nossa Senhora das Dores (11 casos) e Lagarto (7 casos), na Mata Atlântica as regiões que apresentaram maior freqüência de acidentes ofídicos foram Estância (10 casos) e Aracaju (8 casos). As Tabelas 7 e 8 mostram as freqüências de acidentes ofídicos nos ecossistemas Tabela 7. Proporção de acidentes ofídicos por região. (f, freqüência observada; (fi) freqüência esperada). Caatinga Agreste Mata Atl. Soma f 5 49 41 95 (fi) (31.6) (31.6) (31.6) Hipótese nula: proporções 1:1:1 2 = 34.77; p<0.001 Tabela 8. Distribuições de freqüências dos acidentes ofídicos (1999-2002) por regiões. As populações são citadas no Censo Demográfico, 2000, IBGE. Caatinga Pop. rural f Agreste Pop. rural f Mata Atlântica Pop. rural f Carira 8327 2 Areia Branca 8015 1 Aracaju* 461534 8 Frei Paulo 5643 1 Arauá 5745 1 Brejo Grande 3155 2 Monte A. de Sergipe 5119 1 Cristinápolis 7823 1 Carmópolis 1746 1 Porto da Folha 16952 1 Canhoba 2370 1 Estância 8148 10 Cumbe 1516 1 Indiaroba 8471 1 Gararu 8375 1 Itaporanga d’Ajuda 16323 2 Itabaianinha 19895 3 Neópolis 8092 5 Itabaiana 21341 5 Propriá 3818 3 Laranjeiras 2347 4 Rosário do Catete 1445 3 Lagarto 42807 7 S. Amaro das Brotas 2588 1 Moita Bonita 7125 3 Santa Luzia do Itanhi 11363 1 N. Senhora das Dores 8671 11 São Cristóvão 1531 3 Pedrinhas 2531 2 N. Senhora do Socorro 400 1 Riachão do Dantas 14932 3 Riachuelo 1630 1 São Miguel do Aleixo 1968 1 Telha 1575 2 Umbaúba 8279 1 Soma 5 49 41 * Em Aracaju consta a população total. f = freqüência
  • 44. 30 Sintomas e tempo decorrido entre o acidente e a soroterapia A dor local foi um dos sintomas mais freqüentes. Quando o atendimento foi feito nas 3 primeiras horas após a picada, a proporção de indivíduos que relataram dor (envenenamento botrópico) foi de 3:1 em relação aos que não relataram (2 = 0.03; p>0.05). A proporção aumentou de 7:1 ocorreu nos casos em que o atendimento foi feito após três horas de o acidentado ter sido picado pela cobra (2 = 0.22; p>0.05). O edema (envenenamento botrópico) também foi um dos sintomas mais freqüentes relatado nas notificações. Até 3 horas do acidente, a proporção de indivíduos que apresentaram edema foi de 1:1 em relação aos que não apresentaram este sintoma (2 = 0.13; p>0.05); após este período, a proporção de indivíduos que apresentaram edema aumentou de 7:1 em relação aos que não apresentaram este sintoma (2 = 0.22; p>0.05), indicando persistência e aumento do edema após as 3 primeiras horas. Com relação ao eritema e sangramento local (características do envenenamento botrópico), nas 3 primeiras horas entre a picada e o atendimento a proporção de acidentados que apresentaram e não apresentaram eritema foi de 1:3 (2 = 0.34; p>0.05); a mesma proporção de 1:3 ocorreu entre os acidentados que apresentaram e não apresentaram sangramento local (2 = 0.01; p>0.05). Após três horas do acidente, a proporção aumentou de 1:4 entre aqueles acidentados que apresentaram e não apresentaram eritema (2 = 0.88; p>0.05) e aumentou de 1:6 entre os que apresentaram e não apresentaram sangramento local (2 = 0.1; p>0.05). As distribuições dos sintomas locais mais freqüentes nas notificações dos acidentes ofídicos de Sergipe podem ser observados na Tabela 9. A Tabela 10 mostra os demais sintomas relatados nas notificações: necrose, equimose, abcesso e bolha, gengivorragia e tempo de coagulação alterado, oligúria e anúria (envenenamento botrópico); mialgia, urina escura, ptose palpebral e diplopia (envenenamentos crotálicos e elapídico) e urina escura (envenenamento crotálico). Com relação à letalidade, não houve notificação de óbito durante o período analisado.
  • 45. 31 Tabela 9. Acidentes ofídicos, Sergipe (1999-2002): sintomas locais mais freqüentes nas três horas do acidente e após este período. (f freqüência observada; (fi) freqüência esperada). Até 3 horas Soma Após 3 horas Soma Dor Dor Sim Não Sim Não f 50 16 66 16 3 19 (fi) (44) (22) (12.66) (6.33) Ho: a proporção é 3:1 Ho: a proporção é 7:1 2 = 0.03; p>0.05 2 = 0.22; p>0.05 Edema Edema Sim Não Sim Não f 34 31 65 16 3 19 (fi) (32.5) (32.5) (12.66) (6.33) Ho: a proporção é 1:1 Ho: a proporção é 7:1 2 = 0.13; p>0.05 2 = 0.22; p>0.05 Eritema Eritema Sim Não Sim Não f 14 50 64 4 14 18 (fi) (21.33) (42.66) (6) (12) Ho: a proporção é 1:3 Ho: a proporção é 1:4 2 = 0.34; p>0.05 2 = 0.08; p>0.05 Sangramento local Sangramento local Sim Não Sim Não f 17 50 67 2 10 12 (fi) (22.33) (44.66) (4) (8) Ho: a proporção é 1:3 Ho: a proporção é 1:6 2 = 0.01; p>0.05 2 = 0.1; p>0.05
  • 46. 32 Tabela 10. Envenenamentos ofídicos, Sergipe: alterações locais e sistêmicas. 1999 2000 2001 2002 1999 2000 2001 2002 Abcesso Bolha Sim 1 0 1 1 1 1 4 0 Não 38 8 22 17 38 7 19 19 Soma 39 8 23 18 39 8 23 19 Necrose Gengivorragia Sim 0 0 1 0 1 0 0 1 Não 40 8 22 18 37 6 19 14 Soma 40 8 23 18 38 6 19 15 Tempo de coagulação alterado Diplopia Sim 2 0 3 1 2 1 1 0 Não 37 6 13 15 37 6 18 20 Soma 39 6 16 16 39 7 19 20 Ptose palpebral Mialgia Sim 0 0 1 0 5 0 5 2 Não 40 7 20 19 35 7 15 16 Soma 40 7 21 19 40 7 20 18 Urina escura Oligúria Sim 0 0 2 1 0 0 0 3 Não 38 7 18 17 39 7 20 15 Soma 38 7 20 18 39 7 20 18 Anúria Sim 0 0 0 1 Não 39 7 20 17 Soma 39 7 20 18 Partes do corpo atingidas e gravidade dos casos As partes mais atingidas foram os pés e pernas (66 casos, aproximadamente 70%), seguida das mãos e braços (15 casos), cabeça (2 casos) e tórax (1 caso). As proporções entre as partes do corpo atingidas foi de 12:3:1:1; respectivamente, pés e pernas, mãos e braços, cabeça e tórax (2 = 5.66; p>0.05). De acordo com a Secretaria Estadual da Saúde de Sergipe, os acidentes ofídicos ocorridos na região foram classificados em três categorias: leves, moderados e graves; a maioria dos casos foi classificada como leve (Tabela 11). Tabela 11. Classificação de acidentes ofídicos de Sergipe quanto à gravidade dos casos . 1999 2000 2001 2002 Soma Leves 34 3 13 16 66 Moderados 7 0 3 3 13 Graves 1 0 2 1 4 Soma 42 3 18 20 83
  • 47. 33 2. Parâmetros biológicos do veneno de B. jararaca i) Dose letal 50% (DL50) Dados brutos experimentais: Os quatro experimentos realizados variaram com relação à proporção de animais mortos e inoculados; no geral apresentaram proporção de acordo com o aumento das doses, mas com variações extremas. Para diminuir as variações os experimentos foram agrupados (Tabela 12). Regressão linear e DL50: As análises mostraram valores diferentes para os coeficientes das regressões (b), bem como para as constantes das regressões (a), devido às variações nas proporções entre animais mortos e inoculados para as mesmas doses. As DL50 de cada experimento variaram entre 32.8 a 44.1g e a análise conjunta entre os quatro experimentos mostrou valores intermediários para os parâmetros da regressão e da DL50, quando comparado com os valores dos experimentos (Tabela 13). Valores probíticos das doses: As doses dos quatro experimentos foram logaritmizadas e substituídas nas respectivas equações de regressões (uma para cada experimento) para encontrar o valor probítico de cada dose (Tabela 14). As análises de regressões dos valores probíticos (y) sobre as dosagens (x) também apresentaram variações entre os coeficientes das regressões. Por isso foi necessário fazer uma comparação entre as quatro retas, para encontrar uma equação geral que descrevesse os valores probíticos para a dose letal 50% que representasse todos os experimentos, permitindo assim o aproveitamento de todos os dados (Tabela 15). As retas diferiram quanto ao paralelismo (F0.05(1)3;12=16.927; p<0.001) e afastamento (F0.05(1)3;12=47.684; p<0.001) (Figura 3). A dose letal 50% da equação geral obtida através da comparação entre as 4 retas dos experimentos foi 37.1g, valor próximo da DL50 da análise probítica conjunta utilizando o método da OMS, que foi 37.09g. Os coeficientes e constantes das regressões foram também semelhantes entre os dois métodos. Assumi então que as doses letais 50% não são diferentes quando determinadas utilizando as comparações entre as retas e o método probítico da OMS (Tabela 16).
  • 48. 34 Tabela 12. Bothrops jararaca, proporção entre camundongos mortos e inoculados, após 48 horas de observação. Dose de veneno (µg) Experimentos I II III IV Soma 23.0 0/6 1/6 1/6 0/6 2/24 27.6 0/6 0/6 2/6 0/6 2/24 32.1 1/6 4/6 2/6 0/6 7/24 39.7 0/6 5/6 5/6 3/6 13/24 47.6 5/6 5/6 5/6 6/6 21/24 Tabela 13. Bothrops jararaca, DL50 do veneno: programa probítico da OMS. b a y=a+bx Iy DL50 (µg) Experimento I 9.0153 - 9.8323 - 9.8323+9.0153x 38.1272±67.9041 44.1810 Experimento II 8.076 - 7.2535 - 7.2535+8.076x 26.6044±39.5182 32.9051 Experimento III 6.6686 - 5.1133 - 5.1133+6.6686x 25.5320±41.6518 32.852 Experimento IV 13.0515 - 15.7375 - 15.7375+13.0515x 34.8539±45.1052 38.8054 Análise conjunta 8.283 - 7.9989 - 7.9989+8.283x 34.4318±40.4588 37.0962 b = coeficiente de regressão a = constante de regressão Iy = limite de confiança inferior e superior DL50 = dose letal 50 %, y=5 Tabela 14. Bothrops jararaca, valores probíticos do número de camundongos mortos (y) sobre a concentração de veneno (x): programa probítico da OMS. Dose de veneno (g) Experimento I Experimento II Experimento III Experimento IV x y x y x y x y 23.0 1.36 3.44 1.36 3.74 1.36 3.96 1.36 2.03 27.6 1.44 3.15 1.44 4.38 1.44 4.49 1.44 3.06 33.1 1.51 3.86 1.51 5.02 1.51 5.02 1.51 4.09 39.7 1.59 4.58 1.59 5.65 1.59 5.54 1.59 5.12 47.6 1.67 5.29 1.67 6.29 1.67 6.07 1.67 6.15 x = log da dose y = probit . Tabela 15. Bothrops jararaca, estatística da regressão do número de camundongos mortos (y) sobre a concentração de veneno (x): comparação entre retas N b a y=a+bx F r2 DL50 (µg) Experimento I 5 6.4809 -5.7809 -5.7809+6.4809 19.6354* 0.86 44.1810 Experimento II 5 8.2687 -7.5028 -7.5028+8.2687 5875.226*** 0.99 32.5091 Experimento III 5 6.8408 -5.3409 -5.3409+6.8408 5688.69*** 0.99 32.8520 Experimento IV 5 13.0594 -15.7445 -15.7445+13.0594 367020.3*** 0.99 38.8054 Comparação das 4 retas 20 8.5801 -8.4705 -8.4705+8.5801 16.9279* - 37.1509 N = amostras b = coeficiente de regressão a = constante de regressão F = Variância maior/variância menor r2 = coeficiente de determinação DL50 = dose letal 50%, y = 5
  • 49. 35 Tabela 16. Bothrops jararaca, DL50 do veneno, comparação entre retas e programa probítico da OMS. Método b x y a Reta Probit (y=5) DL50 m retas, 4 experimentos 8.5801 1.5174 4.5489 -8.4705 y=-84705+8.5801x 1.5699 37.1509 análise conjunta, 4 experimentos 8.2830 - - 7.9989 y=-7.9989+8.2830x - 37.0962 b = coeficiente de regressão a = constante de regressão x = média do log da dose y = média dos probits DL50 = dose letal 50%, y=5 1.36 Figura 3. Regressão dos valores probíticos sobre as dosagens: comparações entre as retas. Experimentos I, II, III, IV. 1.671.591.511.44 3.0 2.0 4.0 5.0 6.0 II y= -7.5+8.26x III y= -5.34+6.84x IV y= -15.74+13.05x I y= -5.78+6.48x log dose probit
  • 50. 36 ii) Dose mínima hemorrágica (DMH) Dados brutos experimentais: Os diâmetros das áreas hemorrágicas dos dois experimentos variaram entre 5.0mm a 13.2mm (Tabela 17). A dose mínima hemorrágica para uma área exata de 10mm de diâmetro foi determinada através de regressão linear do diâmetro da área hemorrágica (y) sobre a concentração do veneno (x), cujos coeficientes e constantes das duas regressões foram próximos. Apesar destes valores próximos, optei por fazer uma análise conjunta, cujo resultado da DMH foi 0.24g, praticamente igual às doses mínimas hemorrágicas de cada experimento, que foram 0.23g e 0.24g (Tabela 18). Tabela 17. Bothrops jararaca, diâmetro da área hemorrágica. Dose de veneno (µg) Diâmetro da área hemorrágica (mm) Experimento I 0.10 - - - - 0.14 5.75 6.28 9.30 11.05 0.18 5.17 6.58 6.86 7.57 0.22 9.44 9.51 10.34 11.56 0.26 10.09 10.34 10.40 12.86 Experimento II 0.14 4.78 5.75 6.28 6.77 0.18 6.38 8.05 8.44 9.44 0.22 8.95 9.09 10.34 10.58 0.26 9.23 10.02 10.02 10.02 0.30 11.05 11.78 12.15 13.25 Tabela 18. Bothrops jararaca, estatística da regressão do diâmetro da área hemorrágica (mm) sobre a concentração de veneno. N R (x) R (y) b a F r2 DMH (µg) Experimento I 16 0.10 - 0.26 5.75 - 12.86 30.375 2.869 8.527 * 0.3785 0.23 Experimento II 20 0.14 - 0.30 4.78 - 13.25 35.175 1.380 84.131*** 0.8238 0.24 Experimento I e II 36 0.14 - 0.30 5.75 - 13.25 32.688 2.140 53.170 *** 0.610 0.24 N = amostras R = intervalos de x e y b = coeficiente de regressão a = constante de regressão r2 = coeficiente de determinação DMH = dose mínima hemorrágica, y = 10mm
  • 51. 37 3. Eficácia das plantas i) Dose letal 50% (DL50) Foram feitos nove experimentos (três para cada planta) com os extratos da raiz de Apodanthera villosa, Apodanthera glaziovii e Jatropha mollisima. A DL50 destas plantas foi obtida através da análise conjunta de todos os experimentos, utilizando probites. As doses dos extratos variaram de 0.008-0.004g; 0.001-0.011g, 0.0003-0.04g, respectivamente. Para a análise da dose letal 50% da Jatropha elliptica utilizei apenas um experimento, porque o resultado foi coerente com a relação entre os animais mortos/inoculados, proporcional ao aumento da concentração do extrato, cujas doses variaram de 0.01-0.03g. A tabela 19 mostra a dose letal 50% de todas as plantas utilizadas; o Apêndice 1 mostra os dados brutos da proporção de animais mortos/inoculados com relação à concentração de extrato. Tabela 19. Dose letal 50% (DL50) dos extratos das plantas. Planta b a y=a+bx Iy DL50 (g) Apodanthera villosa 3.358 10.797 10.797+3.358x 0.0150.023 0.018 Apodanthera glaziovii 3.596 12.722 12.722+3.596x 0.00590.0089 0.007 Jatropha mollissima 1.831 9.910 9.910+1.831x 0.00130.003 0.002 Jatropha elliptica 6.193 15.691 15.691+6.193x 0.0130.023 0.018 b = coeficiente de regressão a = constante de regressão Iy = limite de confiança inferior e superior DL50 = dose letal 50 %, y=5