Este documento apresenta o programa e conteúdo de um curso de extensão sobre o processo de morrer. O curso abordará tópicos como cuidados paliativos, conversas sobre morte com pacientes terminais e espiritualidade no luto. Os critérios de avaliação incluem participação mínima de 80% e a elaboração de um trabalho sobre um dos assuntos do curso. A primeira aula discute o processo do morrer, doenças malignas, definições de morte no Ocidente e Oriente e as fases do processo segundo Kübler-
1. Curso de extensão:
Até que a morte nos separe
Adriana Soczek Sampaio
soczeksampaio@yahoo.com.br
2. Programa do curso
Aula 1: O processo do morrer
Aula 2: Cuidados Paliativos
Aula 3:Falando sobre a morte e o paciente
terminal
Aula 4: Espiritualidade, morte e luto
3. Critérios de Avaliação do Curso
Participação mínima de 80% do curso
Elaboração de um paper de 3 a 5 páginas
sobre um dos assuntos trabalhados no
curso
5. O Processo do Morrer
1. as doenças malignas, o mau prognóstico e a morte;
2. definição do conceito de morte e sua visão no Ocidente
(segundo Phillip Ariès) e no Oriente;
3. a ars moriendi e o desejo de boa morte;
4. as fases do processo de morrer - segundo Kübler-Ross
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7. 1. Doenças malignas, mau
prognóstico e morte
Doenças: estigmas ao longo dos séculos
Lepra, peste negra, gripe espanhola, tuberculose
HIV/AIDS
Câncer
Outras: cardíacas, renais, Alzheimer, AVC
Desejo: morte rápida, sem dor e sem sofrimento
8. Isquemia cardíaca:
Próprio indivíduo trai seu organismo
Últimas horas: afogamento, sedação
circuito que se fecha
Exames cardíacos, história familiar, padrão de alimentação
e fumo, tipo de personalidade e potencial para mudança,
possibilidade de seguir conselho médico, planos e
esperanças para futuro, sistema de apoio
9. Velhice:
Não se pode! Mas...
Acúmulo de perdas e falhas nos mecanismos do corpo
Independe de uma enfermidade
Debilidade dos anos: incapacidade para se sobrepor
VIDA DE ÊXITOS & REALIZAÇÕES: compensa em
qualidade o que não se pode ampliar em quantidade
A utilidade de viver não está na duração e sim
em seu uso. Viver bastante depende de nossa
vontade e não do número de anos vividos.
(Montaigne)
10. Alzheimer:
Degeneração progressiva das células e perda de qualidade
das células nervosas nas porções cerebrais associadas a
funções superiores
Avança devagar, mas sem paradas
Entorno afetado: cuidados e vigilância
Alterações também de personalidade
Não há dignidade neste tipo de morte. É um
ato arbitrário da natureza, atropelamento da
humanidade das suas vítimas.
(Nulland)
11. HIV/AIDS:
Crime da natureza, com alcance mundial pelos avanços da
mobilidade humana
Devasta sistema imunológico que torna-se vulnerável à ação
de infecções e certos tipos de tumores
12. Morte trágica, traumática, acidental:
Não serve a objetivo algum posto que a natureza não
necessita de ajuda para manter a ordem
Suicídio consciente: forma mais brutal de violência
Outras formas de suicídio: comportamento
autodestrutivo (álcool, drogas, direção perigosa, fumo,
hábitos sexuais não seguros, participação de brigas,
torcidas organizadas, quadrilhas...)
Afogamento, sufocamentos, acidentes nos meios de
transporte, violência
13. Câncer:
Parasita cujas extremidades se ampliam aumentando seu
domínio maligno
Processo silencioso
Mais de 150 tipos de CA
Afeta células em seu processo inicial de maturação – divide
ao acaso e tem capacidade de reprodução infinita
Energia: reprodução e não na função do órgão invadido
Não morrem quando deveriam
Também mata à distância
Indiretamente mata pela caquexia: utiliza proteína e não
gordura.
...não há vitória, pois mata a sua vítima, mas morre com
ela
15. “A morte não é algo que nos
espera no fim. É companheira
silenciosa que nos fala com voz
branda, sem querer aterrorizar,
dizendo sempre a verdade,
convidando à sabedoria”
(Alves, 2002)
2. Definição do conceito de morte e
sua visão no Ocidente e no Oriente
16. MORTE
Perda, ruptura, desintegração, degeneração, fascínio,
sedução, grande viagem, entrega, descanso, alívio
Processo, não confrontação, evento na sequencia de ritmos
da natureza
Necessária para a ordem do sistema do universo
Inimigo a ser combatido: doença e não a morte. Esta é
apenas o ponto final quando a batalha está perdida
Verdade metafísica
Alves, 2002: menor poder, maior escuta. Maior poder e
técnica, fracasso
Processo evolutivo, complexa sequencia de eventos
terminativos
Ayer (2005): dificuldade de determinar quando a vida se
encerra – não reação a estímulos, ausência de movimentos
respiratórios e reflexos, EEG plano
17. “Mentira vital” (Becker)
“Se estivéssemos conscientes o
tempo todo de nossa morte e do
nosso terror, seríamos incapazes
de agir normalmente, ficaríamos
paralisados”.
Agimos como se fossemos
imortais.
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24. A Morte no Ocidente
1. MORTE DOMADA (Idade Medieval)
sabe que vai morrer
Trajetória conhecida
Esperada no leito = atitude próxima e familiar/pública
Temor: morte repentina
Sepulturas na Igrejas
Churchyards = menos favorecidos / pátio
Tb lugar de passeio, descanso e oração
Grande mortalidade = valas coletivas
25. Cerimonial do moribundo
1. Lamento da vida, evocação triste, mas discreta dos
seres e coisas amadas
2. Perdão dos companheiros que rodeiam o leito
3. Absolvição sacramental
26. 2. MORTE EM SI MESMO
O que acontecerá depois da morte?
Temor: julgamento da alma
ARS MORIENDI: tratados sobre a preparação e a arte de
morrer e renascer
Testamento: 2 partes
Fórmulas piedosas: profissão de fé, confissão dos pecados,
recomendações da alma, escolha da sepultura, transmissão dos
desejos em relação aos sobreviventes
Transmissão de bens
Uso do preto: horror aos mortos, disfarce; noite, ausência de
cor expressando abandono e tristeza. Indica aos outros que
devem ter respeito
Medo de ser enterrado vivo (séc. XVII e XVIII) – atrasar os
enterros – velórios de até 48h – pena sobre nariz
28. 3. MORTE DO OUTRO
Séc XIX: morte romântica
Bela, sublime repouso, eternidade
Possibilidade de reunião com ser amado
desejada
Forte prevalência crença na vida futura
Surgimento do espiritismo
Temor: almas do outro mundo – abrir porta ou janela,
parar relógio, cobrir espelhos
Preocupação com insalubridade e decretos firmando
espaços e profundidade das covas
29. 4. MORTE INVERTIDA
Séc. XX – que se esconde, vergonhosa
Sociedade: expulsa morte para proteger a vida
Boa morte – repentina – temida
Morte: não mais fenômeno natural
Fracasso, impotência, imperícia = ocultada
Inconveniente = decomposição antes mesmo da morte
No hospital
Supressão do luto
Tempo da morte: cerebral, biológica, celular
A morte de Ivan Illitch – Tostói
30. Condições econômicas, sociais e políticas:
atrasam ou adiantam a morte
Morrer tornou-se caro – sem igualdade
Funeral director: empresários que cuidam
dos serviços funerários- família???
Morte: questão de fato e não de direito –
médico é quem atesta
31. Medicalização da morte: pretexto de
respeitar a vida, prolongam-se os dias ao preço de
desnecessário sofrimento
32. Morte séc. XXI – Moritz (2005)
Ato prolongado
Evento científico
Passividade X onipotência
Pode se tornar um ato profano
Evento isolado e solitário
UTI: maior possibilidade de tratamento fútil
33. A Morte no Oriente – visão pelo
budismo
Morte: nem deprimente nem excitante. Apenas um fato da
vida.
Se queremos morrer bem, devemos aprender a viver bem.
Morrer não é tranquilo se a vida foi cheia de violência ou a
mente foi agitada por emoções como ódio, apego e medo.
“Na abordagem budista, a vida e a morte são vistas como
um todo, onde a morte é o começo de um novo capítulo da
vida. A morte é um espelho no qual o inteiro significado da
vida é refletido.” (RINPOCHE, p. 29)
“Para quem se preparou e praticou, a morte não chega
como uma derrota, mas como um triunfo, um coroamento
da vida e o seu mais glorioso instante.’ (RINPOCHE, p. 33)
34. “Amanhã ou a próxima vida, o que vem primeiro, nunca se
sabe” – ditado tibetano
MORTE = mistério. Duas verdades: 1. é absolutamente
certo que um dia morreremos; 2. incerto quando e onde
essa hora irá chegar
Lei IMUTÁVEL no universo – todas as coisas MUDAM!!!
“A sociedade moderna é em larga escala um deserto
espiritual em que a maioria imagina que esta vida é tudo o
que existe. Sem qualquer fé autêntica numa vida futura, a
maioria das pessoas vive toda a sua existência destituída
de um sentido supremo” (RINPOCHE, p. 25)
QUESTÃO:
Lembro a cada instante que estou morrendo, e todos e tudo ao
meu redor também, e desse modo trato todos os seres a todo
momento de forma compassiva?
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37. 3. Ars moriendi e o desejo de boa morte
AGONIA = grego agon = luta severa
Suposto protesto do ICS contra partida do espírito
Dias, semanas, horas = sofrimento moral e perturbação
física
Endorfina = morfina do organismo = pelo estresse do
avanço da doença – aumento do limiar a dor e reações
emocionais – proteção perigos físicos e emocionais
Dec. 70: endorfina encontrada nos casos de choque por
grande perda de sangue ou sepse
38. UTI = sedação = privação
Deixa de ser humano e torna-se desafio
Destituição de autonomia
Dependência de estranhos – ausência dos entes queridos
Família: preocupação – desespero - desesperança
Doença
Aviso benigno de Deus – parar e pensar no abandono de vida
de pecado
Hoje: oportunidade única na agitada vida atual para reflexão
interior???
39. Estudo SUPPORT (1995) – study to understand
prognosis and preferences for outcomes and risk of
treatment
Coletar informações: pacientes terminais e familiares
4 anos – 9 mil pacientes – 5 hospitais de ensino EUA
O que mais causa sofrimento na situação de morte?
40% dores insuportáveis
80% fadiga extrema
55% conscientes até 3 dias antes da morte
63% dificuldade em tolerar grande sofrimento físico e
emocional referente ao agravamento da doença e ao
estágio final de vida
40. 20% morreu na UTI – dos que foram e saíram
76% desconforto
72% muita sede
68% sono
63% ansiedade
56% dor
52% raiva
41. 4. Fases do processo de morrer
Elizabeth Kübler-Ross
42. 1. NEGAÇÃO
“Não, eu não, não pode ser verdade”
Todo paciente usa negação/parcial
A maior frequência é no paciente não preparado para a
notícia
Ideia de morte: considera/abandona
CHOQUE – NEGAÇÃO – ACEITAÇÃO PARCIAL
“Como somos todos imortais em nosso inconsciente, é
quase inconcebível reconhecermos que também temos
de enfrentar a morte” (p.47)
Verificar necessidades do paciente em manter-se assim
e estratégias de enfrentamento
Deixar negar quanto precise
43. 2. RAIVA
Revolta, inveja, ressentimento
Período de mais difícil manejo tanto para família quanto
para a equipe
Propaga-se em todas as direções
POR QUE???
“Um paciente que é respeitado e compreendido, a quem
são dispensados tempo e atenção, logo abaixará a voz e
diminuirá suas exigências irascíveis” (p.57)
Tolerar a raiva – não é pessoal
44. 3. BARGANHA
Igualmente útil, tempo curto
Se Deus não atende aos apelos de ira, deve-se apelar
com calma (?)
Tentativa de adiamento
Almejado = prolongamento da vida ou alguns dias sem
dor
Maioria com Deus e mantidas em segredo
45. 4. DEPRESSÃO
Novos sintomas, novas hospitalizações, cirurgias – não tem
mais como negar
Sentimento de grande perda
Depressão reativa: pode ser encorajado a ver o lado bom
Depressão preparatória: “quando a depressão é um
instrumento na preparação da perda iminente de todos os
objetos amados, para facilitar o estado de aceitação, o
encorajamento e a confiança não tem razão de ser” (p.93)
Prestes a perder tudo e todos = exteriorizar seu pesar
“E não é só o mundo que eu perco, não
é só tudo e todos que amo. Eu me
perco a mim mesmo. Zás – e eis que eu
sumi.” (p.129)
46. 5. ACEITAÇÃO
Tempo + ajuda = tranquila expectativa
Cansado e fraco, necessidade de cochilar e dormir com
frequência. Não é sono de fuga, necessidade gradual e
crescente de mais horas de sono
Aceitação NÃO É felicidade
Família: carece de apoio e compreensão
Círculo de interesse diminui
Visitantes: indesejados, não quer conversar
“Para quem não se perturba diante de quem está
prestes a morrer, estes momentos de silêncio podem
encerrar as comunicações mais significativas” (p.118)
47. “Quando um homem está morrendo, as
paredes do seu quarto guardam uma
capela e o correto é adentrá-la com
veneração silenciosa, que soa e
reverbera como eco de que aquele que
morre deve ser atendido com reverência,
guardando devido respeito pela vida que
se vai e cuidando de todo possível para
que passe com menor dor e com maior
qualidade possível”.
Nulland