Este artigo discute a falta de identidade clara dos vendedores e como isso afeta negativamente o atendimento aos clientes. A formação deficiente de vendedores é um problema, e os departamentos de recursos humanos deveriam ajudar a requalificar vendedores e elevar seu status. As habilidades essenciais para vendedores incluem visão abrangente dos processos de negócios e foco no cliente.
1. Recrutamento, seleção e formação do vendedor: habilidades e
competências de um profissional sem uma clara identidade
Abel Sidney de Souza
Graduado em Ciências Sociais (UFRJ) e Administração de Empresas (UFF)
Especialista em Metodologia do Ensino Superior (UNIR)
Mestrando em Ciências da Educação (ULHT)
RESUMO
Este artigo discute os procedimentos necessários para se ampliar o escopo do
trabalho dos Recursos Humanos, baseado no recrutamento e seleção de pessoal,
incluindo-se um terceiro elemento, a formação, que existente em termos retóricos
encontra-se ausente na prática das organizações. A eleição da categoria de
vendedor como base desta discussão demonstra como a ausência de uma
identidade funcional clara pode trazer sérios percalços no relacionamento com
este profissional.
Palavras-chave: recursos humanos, formação de pessoal, competência,
habilidade, identidade funcional.
Introdução
A idéia de que estamos numa era de “fim do emprego”, constatada e alardeada
por Jeremy Rifkin (Piolia, 2001), tem causado profundas transformações nos
ambientes de trabalho e afeta notadamente o trabalho dos departamentos de
Recursos Humanos. Em síntese, o “fim do emprego” refere-se ao corte brutal de
vagas no mercado de trabalho, principalmente nas áreas meio, por conta da: 1)
intensa competitividade das empresas e 2) da busca pelo lucro por quaisquer
meios, o que tem causado a deterioração das relações humanas nos ambientes
de trabalho e gerado um acentuado descompromisso entre empregado e
empregador.
Muitas categorias profissionais deixaram de existir nas últimas décadas; outras
ganharam um outro perfil; outras surgiram da combinação de categorias já
existentes ou das novas exigências, inéditas, dos novos processos de trabalho.
Entre mudanças e permanências, no entanto, entre todas as categorias
profissionais, uma delas permanece, resiste e dá sinais de vitalidade, embora as
profundas mudanças no seu perfil, entre outras causas, a tenha colocado em uma
crise de identidade sem precedentes. Estamos tratando do vendedor.
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Neste trabalho procuraremos discutir como a crise de identidade deste secular
profissional traz sérios prejuízos às atividades fins das empresas, que é a
prestação de serviços aos clientes. Situaremos também o papel do departamento
de Recursos Humanos como instância formadora de profissionais por excelência.
Contexto geral das empresas brasileiras hoje
Antes de definirmos e discutirmos os conceitos básicos dos temas que estamos
tratando, torna-se necessário situá-los no contexto sócio-político e econômico no
qual as empresas brasileiras estão inseridas.
A última década foi marcada no cenário internacional e nacional por mudanças
rápidas e intensas, caracterizadas, segundo Guedes (2002), por:
a) Competição crescente das empresas transnacionais em escala
mundial;
b) Grande concentração do capital graças aos movimentos de fusão e
aquisição entre estas empresas;
c) Diminuição das barreiras comerciais;
d) Freqüentes e incessantes mudanças e avanços da tecnologia.
Houve concomitantemente um deslocamento da ênfase na produção para o
reinado do consumo e por conseqüência do cliente; ou mais propriamente
deslocou-se as preocupações de como melhor produzir para como atender
melhor o cliente. Isto ocorreu por uma série de fatores, entre outros: a) aumento
da oferta em relação à procura; b) aumento da capacidade de escolha do cliente;
c) exigências de qualidade; d) preocupações ambientais; d) aparecimento de
movimentos de defesa do consumidor; e) crises petrolíferas, e as preocupações
energéticas daí resultantes (SANTOS, 2003).
Neste reinado do cliente as empresas se viram às voltas com a comoditização
dos seus produtos e serviços. Para alcançar, desta forma, qualquer forma de
vantagem competitiva sustentável tornou-se necessário conquistar este cliente
mais exigente e inclinado a fazer suas escolhas com base em outros quesitos.
Daí a importância de se ter como vendedores atendentes deste novo cliente um
profissional com habilidades e competências mais adaptadas ao cenário atual.
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Definindo conceitos
O caráter multiforme das áreas de comércio, indústria e prestação de serviços
amplia a dificuldade de se tipificar os postos de trabalho e os seus conseqüentes
profissionais (MEC, 2000), tornando em especial o vendedor um profissional sem
uma clara identidade. Daí, possivelmente, os poucos cursos técnicos para esta
área, em decorrência da ausência de clientela. De certa forma, não se escolhe ser
vendedor, como aspiração, como desejo de se fazer carreira; mas as pessoas
fazem-se vendedores por motivos os mais variados, o que raramente inclui a
formação específica e muito menos o planejamento de uma carreira nesta área.
Diante destas indefinições e do papel pouco visível da área de vendas,
suplantada pela de marketing, simbolicamente investida de maior status, estes
profissionais são relegados a ter a sua formação ou requalificação nos cursos
rápidos do SEBRAE e outras entidades congêneres; o tratamento dos temas que
se referem especificamente a vendas, restringe-se às publicações não-
acadêmicas e a abordagem está centrado no gênero auto-ajuda, de duvidosa
qualidade editorial, conceitual e técnica; e por fim, o senso comum e a experiência
prática, que andam de mãos dadas, acabam por definir as características do que
seria um vendedor competente.
Percalços na formação e crise de identidade
Dois processos concorrem para definir a identidade de um profissional ou de sua
categoria: o processo das identidades virtuais e das trajetórias vividas (DUBAR,
1997, p. 106 apud TEODORO, 2003). A intercessão entre estes dois processos
culmina na criação das identidades reais. Estes dois processos são descritos por
Teodoro (op. cit) do seguinte modo:
O primeiro processo identitário, o das identidades
virtuais, diz respeito à atribuição de identidades pelos
agentes e instituições que interagem directamente com o
indivíduo e no qual ele próprio está implicado. O segundo
processo, o das trajectórias vividas, designa a forma como
os indivíduos reconstróem os acontecimentos da sua
biografia social que julgam particularmente significativos e
relevantes.
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O valor atribuído por si e pelos outros, de um lado; e a forma como se reconstrói
os principais momentos da carreira, por outro, dão formato à identidade real do
profissional. NO caso em tela, os vendedores têm dois problemas ao definir sua
identidade: 1) o valor atribuído pelos outros não é elevado, pois a profissão
carece de status social; praticamente ninguém se forma para ser vendedor; torna-
se vendedor por conta das circunstâncias da vida, inclusa aí a vida profissional; 2)
a trajetória não linear, não planejada, sem planos de carreira, torna o vendedor
um profissional marcado pelo contingenciamento; não à toa ainda hoje no
imaginário popular a imagem do vendedor ainda é remetida à figura do mascate,
do caixeiro-viajante, de alguém sem rumo definido; um judeu errante.
Teodoro (2003) afirma, no entanto, que no contexto teórico do processo identitário
criado por Dubar “a identidade nunca é atribuída, é sempre construída, através de
uma verdadeira negociação entre os que procuram uma identidade e os que
oferecem ou têm uma identidade virtual a propor.” É possível, neste sentido, a
reconfiguração da identidade deste profissional, podendo-se mesmo colocar o seu
valor simbólico em um patamar mais elevado. Ao departamento de Recursos
Humanos cabe este papel, o de revalorizar o vendedor, inserindo-o, via formação
e/ou requalificação, nos parâmetros novos que o mercado exige1
.
Competências e habilidades do vendedor
No documento que trata dos referenciais curriculares nacionais da educação
profissional de nível técnico, anteriormente citado (MEC, 2000) temos como
competências e habilidades requeridas de um profissional do comércio:
a) Visão abrangente de todos os processos que acontecem antes,
durante e depois da atividade comercial, seja ela grande ou
pequena.
b) Ênfase numa visão integradora de todos os processos da atividade
comercial, a que se pode chamar, também, de visão de negócios,
pelo desenvolvimento de competências de planejamento.
c) Empenho no aprendizado de métodos e técnicas modernas de
gestão e de controle da atividade comercial.
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Conclusão
Por tratar-se da retomada de um tema que se tornou marginal no decorrer das
últimas décadas, seria necessária se percorrer outras trilhas ainda não
exploradas, como a investigação da relação entre o perfil do vendedor e a
ascensão profissional deste profissional aos níveis mais elevados das
organizações.
Notas
1. O mercado, como é por natureza mutável, não estabelece critérios rígidos para
os perfis profissionais. É necessário, pois, uma constante reavaliação do que
sejam estas exigências do mercado.
REFERÊNCIAS
MEC. Educação profissional: referenciais curriculares nacionais da
educação profissional de nível técnico / Ministério da Educação. Brasília :
MEC, 2000. 44 p. Disponível em
<http://www.mec.gov.br/semtec/educprof/ftp/Referenciais%20Curriculares/comerci
o.pdf>. Acesso em 26 jul. 2003.
PIOLIA, G. O fim do emprego com carteira de trabalho assinada. Disponível
em <http://www.uol.com.br/aprendiz/n_colunas/g piolla/idi40900.htmL>. Acesso
em 26 jul. 2003.
TEODORO, António. Crise de identidade nos papéis e na formação de
professores. Quatro tópicos a partir de uma leitura sociológica. Disponível
em <http://www.ulusofona.pt>. Acesso em 26 jun. 2003.