SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 6
Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! Primeiramente dum grande
monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com
grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs nome – o Monte Pascoal e à terra – a
Terra da Vera Cruz. Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças; e ao sol
posto, obra de seis léguas da terra, surgimos âncoras, em dezenove braças -- ancoragem
limpa. Ali permanecemos toda aquela noite. E à quinta-feira, pela manhã, fizemos vela
e seguimos em direitos à terra, indo os navios pequenos diante, por dezessete,
dezesseis, quinze, catorze, treze, doze, dez e nove braças, até meia légua da terra, onde
todos lançamos âncoras em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem
às dez horas pouco mais ou menos. Dali avistamos homens que andavam pela praia,
obra de sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos, por chegarem primeiro.
(Carta de Pero Vaz de Caminha)
A cada canto um grande conselheiro,
Que nos quer governar cabana, e vinha,
Não sabem governar sua cozinha,
E podem governar o mundo inteiro.
Em cada porta um frequentado olheiro,
Que a vida do vizinho, e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha
Para a levar à Praça, e ao Terreiro.
Muitos Mulatos desavergonhados,
Trazidos pelos pés os homens nobres,
Posta nas palmas toda a picardia.
Estupendas usuras nos mercados,
Todos, os que não furtam, muito pobres,
E eis aqui a cidade da Bahia.
(Gregório de Matos)
Agora, Doroteu, ninguém passeia,
todos em casa estão, e todos buscam
divertir a tristeza que nos peitos
infunde a tarde, mais que a noite feia."
Pretende, Doroteu, o nosso chefe
erguer uma cadeia majestosa
que passa escurecer a velha fama
da torre da Babel e mais dos grandes,
custosos edifícios que fizeram,
para sepulcros seus, os reis do Egito.
(Cartas Chilenas)
A CANÇÃO DO AFRICANO
Castro Alves
Lá na úmida senzala,
Sentado na estreita sala,
junto ao braseiro, no chão,
Entoa o escravo o seu canto,
E ao cantar correm-lhe em pranto
Saudades do seu torrão ...
De um lado, uma negra escrava
Os olhos no filho crava,
Que tem no colo a embalar...
E à meia voz lá responde
Ao canto, e o filhinho esconde,
Talvez pra não o escutar!
Língua portuguesa
Olavo Bilac
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
em que da voz materna ouvi: "meu filho!",
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
Ok

Weitere ähnliche Inhalte

Andere mochten auch

Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...
Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...
Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...gogo6
 
Fundamentals of Recruitment Analytics Outline
Fundamentals of Recruitment Analytics OutlineFundamentals of Recruitment Analytics Outline
Fundamentals of Recruitment Analytics OutlineDan Meyer
 
The memex presentation
The memex presentationThe memex presentation
The memex presentationDavid Lavenda
 

Andere mochten auch (8)

3H Company Profile
3H Company Profile3H Company Profile
3H Company Profile
 
As cinco maravilhas
As cinco maravilhasAs cinco maravilhas
As cinco maravilhas
 
Sherlock 3
Sherlock 3Sherlock 3
Sherlock 3
 
UNIDADES DE MEDIDA
UNIDADES DE MEDIDAUNIDADES DE MEDIDA
UNIDADES DE MEDIDA
 
Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...
Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...
Predictive Analytics and the Industrial Internet of Manufacturing Things with...
 
Fundamentals of Recruitment Analytics Outline
Fundamentals of Recruitment Analytics OutlineFundamentals of Recruitment Analytics Outline
Fundamentals of Recruitment Analytics Outline
 
The memex presentation
The memex presentationThe memex presentation
The memex presentation
 
20151221 public
20151221 public20151221 public
20151221 public
 

Ähnlich wie Ok (20)

Pero Vaz De Caminha A Carta
Pero Vaz De Caminha A CartaPero Vaz De Caminha A Carta
Pero Vaz De Caminha A Carta
 
A carta pero vaz de caminha
A carta pero vaz de caminhaA carta pero vaz de caminha
A carta pero vaz de caminha
 
Cartacaminha
CartacaminhaCartacaminha
Cartacaminha
 
Material de apoio 1º ano
Material de apoio 1º anoMaterial de apoio 1º ano
Material de apoio 1º ano
 
A carta
A cartaA carta
A carta
 
A carta de pero vaz de caminha
A carta de pero vaz de caminhaA carta de pero vaz de caminha
A carta de pero vaz de caminha
 
Carta de Pero Vaz de Caminha
Carta de Pero Vaz de CaminhaCarta de Pero Vaz de Caminha
Carta de Pero Vaz de Caminha
 
A carta pero vaz de caminha
A carta   pero vaz de caminhaA carta   pero vaz de caminha
A carta pero vaz de caminha
 
Carta de pero vaz de caminha
Carta de pero vaz de caminhaCarta de pero vaz de caminha
Carta de pero vaz de caminha
 
Intertextualidade lusiadas mensagem
Intertextualidade lusiadas mensagemIntertextualidade lusiadas mensagem
Intertextualidade lusiadas mensagem
 
Tétis e a ilha dos amores
Tétis e a ilha dos amoresTétis e a ilha dos amores
Tétis e a ilha dos amores
 
ua000283.pdf
ua000283.pdfua000283.pdf
ua000283.pdf
 
Os Lusíadas
Os LusíadasOs Lusíadas
Os Lusíadas
 
Luís vaz de camões (1524 – 1580
Luís vaz de camões (1524 – 1580Luís vaz de camões (1524 – 1580
Luís vaz de camões (1524 – 1580
 
10ºano Luís de Camões parte B
10ºano Luís de Camões parte B10ºano Luís de Camões parte B
10ºano Luís de Camões parte B
 
cavaleiro-dinamarca.pdf
cavaleiro-dinamarca.pdfcavaleiro-dinamarca.pdf
cavaleiro-dinamarca.pdf
 
D. Dinis - A Mensagem (Fernando Pessoa)
D. Dinis - A Mensagem (Fernando Pessoa)D. Dinis - A Mensagem (Fernando Pessoa)
D. Dinis - A Mensagem (Fernando Pessoa)
 
Descobrimento do brasil
Descobrimento do brasilDescobrimento do brasil
Descobrimento do brasil
 
ARES DA MINHA SERRA
ARES DA MINHA SERRAARES DA MINHA SERRA
ARES DA MINHA SERRA
 
Lusiadas
LusiadasLusiadas
Lusiadas
 

Ok

  • 1. Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! Primeiramente dum grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs nome – o Monte Pascoal e à terra – a Terra da Vera Cruz. Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças; e ao sol posto, obra de seis léguas da terra, surgimos âncoras, em dezenove braças -- ancoragem limpa. Ali permanecemos toda aquela noite. E à quinta-feira, pela manhã, fizemos vela e seguimos em direitos à terra, indo os navios pequenos diante, por dezessete, dezesseis, quinze, catorze, treze, doze, dez e nove braças, até meia légua da terra, onde todos lançamos âncoras em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem às dez horas pouco mais ou menos. Dali avistamos homens que andavam pela praia, obra de sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos, por chegarem primeiro. (Carta de Pero Vaz de Caminha)
  • 2. A cada canto um grande conselheiro, Que nos quer governar cabana, e vinha, Não sabem governar sua cozinha, E podem governar o mundo inteiro. Em cada porta um frequentado olheiro, Que a vida do vizinho, e da vizinha Pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha Para a levar à Praça, e ao Terreiro. Muitos Mulatos desavergonhados, Trazidos pelos pés os homens nobres, Posta nas palmas toda a picardia. Estupendas usuras nos mercados, Todos, os que não furtam, muito pobres, E eis aqui a cidade da Bahia. (Gregório de Matos)
  • 3. Agora, Doroteu, ninguém passeia, todos em casa estão, e todos buscam divertir a tristeza que nos peitos infunde a tarde, mais que a noite feia." Pretende, Doroteu, o nosso chefe erguer uma cadeia majestosa que passa escurecer a velha fama da torre da Babel e mais dos grandes, custosos edifícios que fizeram, para sepulcros seus, os reis do Egito. (Cartas Chilenas)
  • 4. A CANÇÃO DO AFRICANO Castro Alves Lá na úmida senzala, Sentado na estreita sala, junto ao braseiro, no chão, Entoa o escravo o seu canto, E ao cantar correm-lhe em pranto Saudades do seu torrão ... De um lado, uma negra escrava Os olhos no filho crava, Que tem no colo a embalar... E à meia voz lá responde Ao canto, e o filhinho esconde, Talvez pra não o escutar!
  • 5. Língua portuguesa Olavo Bilac Última flor do Lácio, inculta e bela, És, a um tempo, esplendor e sepultura: Ouro nativo, que na ganga impura A bruta mina entre os cascalhos vela... Amo-te assim, desconhecida e obscura. Tuba de alto clangor, lira singela, Que tens o trom e o silvo da procela, E o arrolo da saudade e da ternura! Amo o teu viço agreste e o teu aroma De virgens selvas e de oceano largo! Amo-te, ó rude e doloroso idioma, em que da voz materna ouvi: "meu filho!", E em que Camões chorou, no exílio amargo, O gênio sem ventura e o amor sem brilho!