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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – UNIRIO
 
 
 
NELSON ALFREDO SALOMÃO NETO
 
 
 
PROJETO MEMÓRIAS REVELADAS: O ARQUIVO NACIONAL, O
CONARQ E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ARQUIVO NO BRASIL
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro
2011
NELSON ALFREDO SALOMÃO NETO
 
 
 
 
 
 
 
 
S173 SALOMÃO NETO, Nelson Alfredo.
Projeto Memórias Reveladas: O Arquivo Nacional, O CONARQ e as
políticas públicas de arquivo no Brasil / Nelson Alfredo Salomão Neto, 2011.
36f.
   
Monografia apresentada ao Curso de Arquivologia da Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro para obtenção do grau parcial de
Bacharel em Arquivologia. Orientador: José Maria Jardim.
 
1. Memórias Reveladas 2. Arquivo Nacional. 3. CONARQ. 4. Políticas públicas
arquivísticas.
              CDD: 350.7146
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO
Este trabalho resulta da persistência em busca do que se acredita ser de suma importância para
a sociedade e para a classe dos profissionais arquivistas que luta por um governo cada vez
mais transparente. A pesquisa teve como objetivo analisar o Projeto Memórias Reveladas,
buscando apresentar uma visão panorâmica que identificasse ou não o mesmo em um quadro
de políticas públicas arquivísticas de caráter nacional. A importância do diálogo Estado-
sociedade bem como a notoriedade do Centro de Referência motivou e despertou o interesse
pelo tema. Usou-se de consultas ao Portal Memórias Reveladas e ao site do Arquivo Nacional,
bem como a análise de todas as atas do Conselho Nacional de Arquivos, responsável por
estabelecer diretrizes e implantar a Política Nacional de Arquivos. Além disso, trabalhos
divulgados no Brasil e no exterior que pudessem sustentar a pesquisa. 
Palavras-chave: Memórias Reveladas, políticas públicas arquivísticas, Arquivo Nacional,
CONARQ.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.......................................................................................................10
2. POLÍTICAS PÚBLICAS........................................................................................13
2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS:
CONCEITUAÇÃO GERAL E HISTÓRICA...............................................................13
2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS DE INFORMAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS
ARQUIVÍSTICAS........................................................................................................16
3. O ARQUIVO NACIONAL, O CONARQ E O PROJETO MEMÓRIAS
REVELADAS..............................................................................................................20
3.1 O PROJETO MEMÓRIAS REVELADAS............................................................20
3.1.1 HISTÓRICO, ESTRUTURA E MECENATO....................................................20
3.1.2 OBJETIVOS E RESULTADOS ALCANÇADOS.............................................22
3.2 O ARQUIVO NACIONAL: HISTORICO............................................................26
3.3 O CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVOS....................................................27
3.3.1 O CONARQ, O MEMÓRIAS REVELADAS E AS POLÍTICAS PÚBLICAS
ARQUIVÍSTICAS NO BRASIL.................................................................................29
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................33
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................35
10
INTRODUÇÃO
O tema “políticas públicas” hoje em dia, conquista cada vez mais espaço na
sociedade e vem reforçando os canais de comunicação entre os governantes e seus
governados. Não obstante, o meio acadêmico tem participado desse fenômeno com as
crescentes monografias, teses de mestrado e doutorado que tratam do tema. Ao longo
das últimas décadas temos observado uma tentativa de verticalização teórica das
“políticas públicas”, em especial do denominado “análise de políticas públicas”,
expressão mais comumente encontrada na literatura das Ciências Políticas, Sociais e da
Informação. Estudar as políticas públicas de informação no Brasil é vital para
compreendermos o avanço (ou a falta de) nas questões pertinentes à gestão, ao acesso e
à preservação da informação arquivística governamental. Diante desse panorama, um
projeto específico do Arquivo Nacional foi alvo desse estudo.
O objetivo da pesquisa foi analisar o Projeto Memórias Reveladas, buscando
entender sua importância ou não em um quadro de políticas públicas arquivísticas de
caráter nacional. A importância do diálogo Estado-sociedade bem como a notoriedade
do Centro de Referência motivou e despertou o interesse pelo tema. Para tanto, foi
levantada a bibliografia pertinente bem como foram estudadas todas as atas de reunião
divulgadas pelo Conselho Nacional de Arquivos no período estudado (1994-2010).
Assim, procurou-se identificar de que forma o Memórias Reveladas foi abordado pelo
órgão responsável por ditar as diretrizes da Política Nacional de Arquivos.
É significativo dizer que a maioria das atas não possui as referidas ocorrências
em um contexto que indique ações do órgão que possam convergir para a materialização
de uma política pública de arquivos de âmbito nacional. Muitas delas apenas se
remetem à Lei nº 8159, lembrando as competências do CONARQ.
Nesse contexto, a pesquisa sobre o Centro de Referência e o estudo das
cinquenta e oito atas de reuniões nos leva diretamente a duas questões: 1) por que o
Memórias Reveladas não cumpre integralmente sua função de garantir o pleno e
irrestrito acesso aos seus documentos? 2) por que um projeto com sua dimensão não
esteve em pautas do CONARQ nenhuma vez desde o momento de sua idealização
(2005) até sua criação, em 2009 ? 3) por que uma política pública para os arquivos
ainda não se materializou ?
O projeto Memórias Reveladas, de iniciativa da Casa Civil da Presidência da
República, nasceu no decreto que regulamenta a transferência dos acervos dos extintos
11
Conselho de Segurança Nacional, Comissão Geral de Investigações e Serviço Nacional
de Informações, para o Arquivo Nacional. De acordo com o portal oficial do projeto, o
Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil (Memórias Reveladas), tem como
objetivo geral “tornar-se um pólo difusor de informações contidas nos registros
documentais sobre as lutas políticas no Brasil nas décadas de 1960 a 1980”. O projeto
consiste em integrar uma rede nacional de arquivos, instituições públicas e privadas
tendo como prerrogativa a cooperação entre a União e os Estados brasileiros. Em seu
momento inicial foram identificados acervos organizados em treze estados além do
Distrito Federal e, digitalizados, passaram a fazer parte da rede.
Em 13 de maio de 2009, data de assinatura da Portaria n.204, a ex-Ministra
Chefe da Casa Civil Dilma Roussef, assinalou :
Essa iniciativa inédita está possibilitando a articulação entre os entes
federados com vistas a uma política de reconstituição da memória
nacional do período da ditadura militar. Os acordos firmados entre a
União e os Estados detentores de arquivos viabilizam o cumprimento
do requisito constitucional de acesso à informação a serviço da
cidadania. Estamos abrindo as cortinas do passado, criando as
condições para aprimorarmos a democratização do Estado e da
sociedade. Possibilitando o acesso às informações sobre os fatos
políticos do País reencontramos nossa história, formamos nossa
identidade e damos mais um passo para construir a nação que
sonhamos: democrática, plural, mais justa e livre. (ROUSSEF, 2009)
O entusiasmo da ex-Ministra parece compartilhado por praticamente todos os
segmentos da imprensa, em suas diversas orientações ideológicas. Em 12 de novembro
de 2008, a Carta Capital destina uma matéria ao tema e descreve o Memórias Reveladas
como um projeto que irá catalogar e colocar à disposição do público pela internet os
registros preservados das lutas políticas durante o regime militar. Ao fim da matéria,
sentencia: “Revelar memórias faz muito bem à saúde do País.”
Já em maio de 2009 foi a vez do jornal O Globo registrar a ótica do Presidente
Lula sobre o projeto à época do lançamento do portal: “- Estou convencido que nós
12
vamos prestar um serviço à democracia brasileira na hora que a gente conseguir
desvendar alguns mistérios que ainda persistem na nossa história.”
O Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil ainda foi destaque em
vários outros jornais e revistas do Brasil, aparecendo até em sites filiados a partidos
políticos como o Portal Vermelho, do Partido Comunista do Brasil
(http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=52574&id_secao=1 ).
Nesse contexto, a iniciativa governamental pode ser vista como um marco no
que tange o acesso à informação. A integração entre os arquivos públicos brasileiros, a
inovação na forma de acesso aos documentos e a resposta da sociedade ao projeto,
verificada pela repercussão midiática; faz com que o Memórias Reveladas se projete
como referência. Como este trabalho visa abordar a crescente discussão a respeito de
políticas públicas arquivísticas e paralelamente o Projeto Memórias Reveladas,
questiona-se: O Memórias Reveladas configura-se como uma política pública
arquivística de caráter nacional ?
Em artigo publicado na Revista Arquivo & Administração, Jardim (2006)
sintetiza o conceito de políticas públicas arquivísticas:
Conjunto de premissas, decisões e ações – produzidas pelo Estado e
inseridas nas agendas governamentais em nome do interesse social –
que contemplam os diversos aspectos (administrativos, legal, científico,
cultural, tecnológico etc.) relativos à produção, uso e preservação da
informação arquivística de natureza pública e privada. (JARDIM,
2006, p. 10)
Diante desse cenário, serão debatidos diversos autores pertinentes que
possibilitem uma análise do projeto Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional, dentro
da perspectiva de políticas públicas de informação no Brasil. Para tanto, serão
trabalhados tanto conceitos específicos (políticas públicas arquivísticas e políticas
públicas de informação) quanto conceitos gerais (políticas sociais, políticas públicas e
memória social).
13
2. POLÍTICAS PÚBLICAS
As políticas públicas são elementos-chave para o entendimento das relações
entre o Estado e os diversos grupos sociais que atuam para que seus interesses sejam
atendidos. A compreensão destas em determinada sociedade, entretanto, implica em
uma análise intensa da história, do regime vigente, da conscientização política da
população e é claro, das condições estruturais e financeiras do Estado. Para que o estudo
das políticas públicas de informação no Brasil seja realizado de forma eficiente, é
necessário uma breve conceituação geral e histórica de políticas públicas.
2.1 Políticas Públicas e Análise de Políticas Públicas: Conceituação geral e
histórica
Ao abordar o conceito de política, Dagnino (2002, p.3) lembra que o termo pode
ser empregado em pelo menos dez formas:
1. Campo de atividade ou envolvimento governamental (social,
econômica), embora com limites nem sempre definidos
2. Objetivo ou situação desejada (estabilidade econômica)
3. Propósito específico (inflação zero) em geral relacionado a
outros de menor ou maior ordem
4. Decisões do governo frente a situações emergenciais
5. Autorização formal (diploma legal), ainda que sem
viabilidade de implementação
6. Programa (“pacote” envolvendo leis, organizações, recursos)
7. Resultado (o que é obtido na realidade e não os propósitos
anunciados ou legalmente autorizados)
8. Impacto (diferente de resultado esperado)
9. Teoria ou modelo que busca explicar a relação entre ações e
resultados
10. Processo (os nove acima são “fotos” é necessário um
“filme”: enfoque processual).
14
E tenta sintetizá-lo em três elementos-chave, que são:
1. Uma teia de decisões e ações que alocam (implementam)
valores;
2. Uma instância que, uma vez articulada, vai conformando o
contexto no qual uma sucessão de decisões futuras serão
tomadas;
3. Algo que envolve uma teia de decisões ou o
desenvolvimento de ações no tempo, mais do que uma
decisão única localizada no tempo.
Heclo (1972, p. 84-85 apud DAGNINO, 2002, p. 2) por sua vez alerta para o
curso das inações (ou não-ações), que seriam também formas de política. Wildavsky
(1979, p. 387 apud DAGNINO, 2002, p. 2) nota que o termo “política” atende tanto
para um processo de tomada de decisões quanto para o produto resultante desse
processo. Já Jenkins (1978, p. 15 apud DAGNINO, 2002, p. 2) define um ”conjunto
de decisões interrelacionadas, concernindo à seleção de metas e aos meios para
alcançá-las, dentro de uma situação especificada”. Desta forma, percebemos alguns
pontos de convergência entre os autores, notadamente a visão de política como um
“conjunto de decisões” ou “teia de decisões”, excluindo do conceito ações ou inações
isoladas.
Em uma das definições de “política”, Gobert, Muller (1987 apud HOFLING,
2001, p. 31) a entende como o “Estado em ação”. Definição que Hofling (2001) adota e
aprofunda como a implantação de projetos de governo, ou seja, sua intervenção junto a
setores da sociedade. No entanto, Hofling (2001) alerta para o fato de que políticas
públicas não podem ser concebidas como sinônimos de políticas estatais, uma vez que
são compreendidas em um processo que envolve a participação de “diferentes
organismos e agentes da sociedade relacionados à política implementada”. Faz também
a distinção de políticas sociais, vistas como:
[...]ações que determinam o padrão de proteção social implementado
pelo Estado, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos
benefícios sociais visando a diminuição das desigualdades estruturais
15
produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico (HOFLING, 2001,
p. 31).
Já para Muller e Surel ( 2004 apud SILVA, 2008 p. 47) esta “ação do Estado” pode
ser considerada:
[...] o lugar privilegiado em que as sociedades modernas, enquanto
sociedades complexas, vão colocar o problema crucial de sua relação
com o mundo através da construção de paradigmas ou de referenciais,
sendo que este conjunto de matrizes cognitivas e normativas
intelectuais determina, ao mesmo tempo, os instrumentos graças aos
quais as sociedades agem sobre elas mesmas e os espaços de sentido no
interior das quais os grupos sociais vão interagir.
Vários autores do campo das Ciências Sociais e Políticas entretanto, debruçam-
se sobre a expressão “análise de políticas públicas”. Dagnino (2002), adota como
conceito “o conjunto de conhecimentos proporcionado por diversas disciplinas das
ciências humanas utilizados para buscar resolver ou analisar problemas concretos em
política (policy) pública”. O autor sugere que o objeto da Análise de Políticas Públicas
seriam os problemas enfrentados pelos chamados policy makers (ou fazedores de
políticas) e o objetivo seria o auxílio aos mesmos.
Dagnino (2002) aponta que o surgimento da Análise de Políticas Públicas como
campo acadêmico ocorre na década de sessenta, influenciado basicamente por dois
fatores: a crescente dificuldade dos formuladores de políticas em lidar com os
problemas que surgiam; e o desvio de atenção dos acadêmicos de Ciências Humanas
para as questões relacionadas às políticas públicas, tentando solucionar os problemas
existentes através da metodologia e do conhecimento. Em sua gênese, os cursos
orientavam mais para uma área de pesquisa do que propriamente para a administração
pública deixando de lado alguns elementos práticos de grande valia como os valores
(DAGNINO, 2002).
Os anos setenta trouxeram uma intensificação das pesquisas e diversas
contribuições para a área. Surge então, nova abordagem que procurava solucionar os
problemas concernentes aos cursos de ciências políticas. Cursos que, por sua vez,
tomaram por ideal áreas da administração e falharam na importância excessiva de
16
elementos práticos. Na década seguinte, técnicas de administração do setor privado são
trazidas à luz principalmente pela incapacidade do Estado de resolver problemas sociais,
pela privatização e pela intensificação do debate Estado x mercado. (DAGNINO, 2002
p. 5).
No que diz respeito aos estudos de Análise de Política, Dagnino (2002)
apresenta uma classificação elaborada por Ham e Hill (1993) que os divide em duas
categorias:
 a análise que tem como objetivo desenvolver conhecimentos sobre o processo
de elaboração políticas (formulação, implementação e avaliação) em si
mesmo - estudos sobre as características das políticas e o processo de
elaboração de políticas – que revelam, portanto, uma orientação
predominantemente descritiva; e
 a análise voltada a apoiar os fazedores de política, agregando conhecimento ao
processo de elaboração de políticas, envolvendo-se diretamente na tomada de
decisões, revelando assim um caráter mais prescritivo ou propositivo.
Entretanto, a tensão visualizada por entre o descritivo e o prescritivo e sua
distinção não é unanimidade entre os pensadores da área. Autores como Dye (1976),
Lasswell (1951) e Dror (1971), citados por Dagnino (2002) entendem que a análise
política possui simultaneamente as características prescritivas e descritivas.
2.2 Políticas públicas de informação e políticas públicas arquivisticas
Políticas públicas arquivísticas é um tema ainda pouco explorado não só nos
países periféricos, mas também nos centrais. A literatura da área ainda é incipiente e não
se encontram muitos estudos publicados a respeito. De forma geral podemos entendê-la
como uma das vertentes das políticas públicas de informação, que começa a se tornar
um tema freqüente na segunda metade do século XX.
Durante as décadas de sessenta e setenta, intensifica-se o debate acerca de
“sistemas de informação”. Em uma proposta da UNESCO (Organização das Nações
Unidas para Educação, Ciência e Cultura) e do ICSU (Conselho Internacional de
Associações Científicas) para a idealização do UNISIST (Sistema Mundial de
Informação Científica e Tecnológica) e na Conferência Intergovernamental realizada
17
pela mesma em 1974, encontramos a preocupação em estabelecer diretrizes para
políticas relacionadas à documentação, bibliotecas e arquivos:
com vistas a analisar os conceitos gerais, resultantes das conclusões
de conferências regionais sobre planejamento na América Latina, Ásia,
África, Estados Árabes e definir diretrizes gerais da política e a
metodologia do planejamento para aplicá-las aos serviços de
documentação, bibliotecas e arquivos. (UNESCO, 1975 apud JARDIM,
1995 p.37)
Na citada conferência, o UNISIST daria espaço ao conceito de NATIS (Sistemas
Nacionais de Informação), que:
implica que a administração central ou local de um Estado deve
perseguir uma disponibilidade máxima de toda informação pertinente,
mediante os serviços de documentação, bibliotecas e arquivos (...)
eliminando toda a duplicação de atividades entre certas classes de
serviços através de uma ação planejada (...) provavelmente isto será
mais fácil para os novos países em desenvolvimento (grifo nosso) que
para os antigos, nos quais há interesses criados (acadêmicos,
associações científicas, grupos industriais) muito fortes”. (UNESCO,
1975 apud JARDIM, 1995 p.37)
Ainda que os objetivos e as prerrogativas do NATIS não tenham sido
plenamente alcançados, Jardim (1995) ressalta a importância do conceito que tornou-se
um marco na literatura e de seus princípios, que ainda servem de referência em debates
e ações que envolvem políticas públicas de informação nos países periféricos.
Hernon e Relyea (1991), citados por Silva (2008), apontam para o termo
“política de informação” através de uma definição objetiva, mas que deixa clara a
complexidade e por vezes contraditória natureza do conceito:
Política de informação tem sido definida como um conjunto de
princípios, leis, diretrizes, regras, regulamentos e procedimentos inter-
relacionados que orientam a supervisão e gestão do ciclo vital da
informação: a produção, coleção, organização,
18
distribuição/disseminação, recuperação, uso e preservação da
informação. (HERNON; RELYEA apud SILVA, 2008, p. 71)
Jardim (2006), um dos poucos autores brasileiros a tratar do assunto, afirma que:
A noção de "política de informação" tende a ser naturalizada e a
designar diversas ações e processos do campo informacional: arquivos,
bibliotecas, internet, tecnologia da informação, governo eletrônico,
sociedade da informação, informação científica e tecnológica, etc.
(JARDIM, 2006, p. 10)
Por esse prisma podemos concluir que o próprio termo “política de informação”
carece de verticalização teórica e sua aplicação ainda é bem extensiva. Jardim (2006)
tenta, nesse sentido, uma aproximação com os aspectos teóricos da análise de políticas
públicas e destaca cinco elementos que normalmente estão presentes nas políticas
públicas de informação:
a) O alcance e o conceito de informação identificam a política de
informação.
b) O alcance de ações da política de informação:
- Ações no Estado
- Ações na Sociedade
- Ações Estado-Sociedade
- Ações Sociedade – Estado
c) O equilíbrio entre atividades normativas e operacionais na sua
execução;
d) A relação da política da informação com as demais políticas
públicas, ou seja, a sua transversalidade:
- Políticas de cultura
- Políticas de saúde
- Políticas de educação
- Políticas de transportes
- Políticas de meio ambiente
- Políticas econômicas, etc.
e) A participação dos diversos atores sociais que são contemplados por
essas políticas de informação. (JARDIM, 2006, p. 10),
19
Uma política pública de arquivo pode ser considerada parte de uma política
pública de informação. Ambas são intimamente relacionadas e se completam. São
entendidas por Jardim (2006) como:
[...]conjunto de premissas, decisões e ações – produzidas pelo Estado
e inseridas nas agendas governamentais em nome do interesse social
– que contemplam os diversos aspectos (administrativos, legal,
científico, cultural, tecnológico etc.) relativos à produção, uso e
preservação da informação arquivística de natureza pública e
privada. (JARDIM, 2006, p. 10)
Além da relação com políticas de informação, Jardim (2006) nota a importância
de um “alto grau de transversatilidade” e intersecção com outras políticas públicas como
saúde, ciência e habitação, pois o sucesso das mesmas sofre influência dos impactos das
políticas arquivísticas nas respectivas áreas.
Ao analisar a relação entre legislação e políticas públicas de arquivo, Jardim
(2006) lembra que é freqüente a confusão de ambas. E afirma que a legislação
arquivística fornece elementos normalizadores à política de arquivos, mas não
corresponde a uma. Ainda sob essa ótica, Jardim (2006) desconstrói a imagem comum
de que uma legislação arquivística seria o marco zero para uma mudança significativa e
faz a distinção entre legislação e ações concretas na execução de políticas de arquivo.
Deve ser simultaneamente instrumento e objeto de uma política arquivística, segundo o
autor, que corrobora com Couture (1998), “a existência da lei não garante a sua
aplicação... A legislação não pode ser confundida com a ação concreta”.
20
3. O ARQUIVO NACIONAL, O CONARQ E O PROJETO MEMÓRIAS
REVELADAS
Visando uma análise de qualidade e uma ótica que privilegie as políticas
públicas arquivísticas no Brasil, é imprescindível o conhecimento do Arquivo Nacional
(administrador do Centro de Referências das Lutas Políticas no Brasil) e do Conselho
Nacional de Arquivos (CONARQ). Nesse sentido, estruturas, organogramas, parceiros e
orçamentos entre outros aspectos serão discutidos ao longo do capítulo.
3.1 O Projeto Memórias Reveladas
3.1.1 Histórico, estrutura e mecenato
O Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil ou “Memórias Reveladas”,
foi idealizado em 2005 pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da
República. Em fevereiro, foi criado um Grupo de Trabalho cujo objetivo era elaborar
um projeto de implantação de um centro de referência que abrigasse “informações,
documentos, arquivos, objetos artísticos com valor simbólico, sobre as violações dos
Direitos Humanos durante o período da ditadura militar no Brasil"1
.
Ainda neste ano, inicia-se a transferência para o Arquivo Nacional de
documentos produzidos e recebidos por instituições extintas e que estavam sob custódia
da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) como CSN (Conselho de Segurança
Nacional), CGI (Comissão Geral de Investigações) e SNI (Serviço Nacional de
Informações). Dois anos depois, a captação de recursos pelo Arquivo Nacional é
permitida por intermédio da Lei Rouanet (Lei nº 8.313/91), com vista ao tratamento dos
acervos dos extintos DEOPS (Departamento Estadual de Ordem Política e Social) e
DOPS (Departamento de Ordem Política e Social); entre outros de interesse do Arquivo
Nacional. Finalmente, em 2009 o Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil é
criado por intermédio da Portaria n. 204, de 13 de maio, pela Casa Civil da Presidência
da República.
Hoje, 55 entidades e instituições do Brasil e do exterior fazem parte da rede
denominada “ Rede Nacional de Cooperação e Informações Arquivísticas – Memórias
Reveladas”. De acordo com Stampa (2011), Coordenadora do Centro de Referência
1
(http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=3&sid=2 )
21
Memórias Reveladas, somente o acervo referente ao período da ditadura militar sob
guarda do Arquivo Nacional é constituído por cerca de 17 milhões e 400 mil páginas de
documentos textuais, 1363 mil metros lineares de outros tipos documentais (como
fotografias), além de 220 mil microfichas e 110 rolos de microfilmes. Também vale
ressaltar que campanhas institucionais como a “Doe seu Acervo” fizeram com que em
menos de 2 anos fossem doadas mais de 200 mil páginas de documentos textuais,
dezenas de livros e documentos sonoros em suportes variados.
A estrutura do Centro de Referência é composta por:
1. Coordenação-Geral: responsabilidade do Diretor-Geral do Arquivo Nacional
Jaime Antunes da Silva, é o órgão de gestão e de representação do Centro de
Referência.
2. Assessoria de coordenação: equipe de servidores do Arquivo Nacional que
tem como função a assessoria da Coordenação-Geral em sua atuação e
planejamento, acompanhamento e avaliação das atividades técnico-
administrativas do Memórias Reveladas.
3. Assessoria de Sistemas de Informação: equipe de especialistas do Arquivo
Nacional que tem por função assessorar a Coordenação-Geral na sua atuação,
criação, gestão e aperfeiçoamento dos sistemas de informação relacionados ao
Memórias Reveladas.
4. Assessoria de Conteúdo do Portal: equipe de especialistas do Arquivo
Nacional que tem por atribuição alimentar o portal e suas seções com matérias
de interesse do Centro, bem como supervisionar as atividades de manutenção no
que se refere ao design.
5. Conselho Consultivo: integrado por 19 membros, indicados por órgãos
governamentais, associações e entidades parceiras, com o objetivo de subsidiar a
gestão do Centro de Referência, acompanhando a implantação e o
desenvolvimento de suas ações.
6. Comissão de Altos Estudos: formada por 21 pesquisadores e especialistas de
instituições de ensino e pesquisa, tem por objetivo aproximar o Centro de
Referência da comunidade acadêmica, promovendo a produção de artigos
acadêmicos e de difusão científica, pesquisas e concursos monográficos.
7. Rede de Parceiros do Centro: formadas por instituições, entidades e pessoas
físicas parceiras da Rede Nacional de Cooperação e Informações Arquivísticas,
que tem o Memórias Reveladas como seu projeto piloto.
22
(http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.
htm?infoid=6&sid=2 )
Para facilitar a captação de recursos, o Centro de Referência conta com a
parceria de cinco entidades que agem patrocinando projetos integrantes do Memórias
Reveladas em várias partes do Brasil. O Banco do Brasil atua junto aos arquivos
públicos estaduais de Minas Gerais, Alagoas, Ceará, Sergipe e Rio Grande do Norte. O
BNDES atua em parceria com o Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, Arquivo
Público Estadual João Emerenciano e Universidade Federal de Goiás. Já a Caixa investe
em projetos desenvolvidos nos arquivos públicos estaduais do Rio de Janeiro e
Maranhão, além da Associação de Arquivistas do Estado de São Paulo. A APERJ conta
também, com o patrocínio da Eletrobrás. A Petrobrás, por fim, é parceira do arquivo
público dos estados do Espírito Santo, São Paulo e Paraná.
Além do Memórias Reveladas, o governo responde às demandas dos diversos
setores sociais com um projeto de lei. No mesmo mês, o então presidente Luiz Inácio
Lula da Silva envia ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 5228/2009, de cinco de
maio de 2009, que regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º,
inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal de 1988.
Apesar de algumas lacunas ainda discutidas como a manutenção ou não do sigilo
eterno de documentos ultra-secretos e de expressões que primam pela falta de
objetividade como “local de fácil acesso” e “informações de interesse coletivo e geral”,
o referido projeto de lei proporcionará significativos avanços no que se refere ao acesso
dos documentos públicos. Entre as providências, caso aprovado o projeto, diminuirão as
restrições de acesso e seus respectivos prazos. Estão previstas também
responsabilidades para pessoa física ou entidade privada e suas respectivas sanções no
art. 33º.2
3.1.2 Objetivos e resultados alcançados
Administrado pelo Arquivo Nacional, o Memórias Reveladas tem como objetivo
geral “tornar-se um pólo difusor de informações contidas nos registros documentais
2
O Projeto de Lei nº 5228/2009 sofreu alterações em seu bojo antes de sua aprovação na Câmara dos
Deputados. Após, seguiu para o Senado Federal onde atualmente discute-se a manutenção ou não do
sigilo eterno de documentos ultra-secretos.
23
sobre as lutas políticas no Brasil nas décadas de 1960 a 1980”. Entre os objetivos
secundários, destacam-se:
Estimular pesquisas, na perspectiva da história, da sociologia, da
antropologia, da ciência política e do direito, mediante:
•Controle das fontes primárias e da produção bibliográfica disponíveis;
•Busca de novas fontes documentais;
•Gerenciamento de instrumentos de pesquisa disponíveis e elaboração
de novos instrumentos com caráter coletivo.
.Promover amplo acesso às fontes de informação e de conhecimento
assim sistematizadas, mediante:
•Criação de uma rede virtual de amplo espectro;
•Montagem de exposições;
•Edição (em suporte-papel ou em meio digital) de obras de referência,
estudos monográficos e periódicos, em parceria com outras
instituições;
•Confecção, em parceria, de material didático.
Contribuir para o debate de natureza acadêmica e política sobre o
período, mediante:
•Organização de seminários e eventos de caráter interdisciplinar;
•Promoção de concursos monográficos;
•Intercâmbio com instituições congêneres, nacionais e estrangeiras.
(http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilu
a.exe/sys/start.htm?infoid=4&sid=2)
Até o presente momento, percebemos o êxito em alguns objetivos específicos
enquanto outros deixam a desejar e ainda não podem ser vistos como atingidos. A
criação de uma rede virtual pode ser verificada no “Banco de Dados Memórias
Reveladas”, que reúne documentos digitalizados de mais de duzentos fundos de trinta e
nove instituições participantes, inclusive o próprio Arquivo Nacional. Pesquisas podem
ser feitas de três formas (multinível, livre e avançada) e o banco conta também com um
manual de instruções para o usuário, o que é de grande utilidade para os pesquisadores
não-usuais.
24
A montagem de exposições também deixou o campo dos objetivos e tem sido
realizada com regularidade. As primeiras exposições inclusive (“A ditadura por sua
agência” e “Na teia do regime militar: o SNI e os órgãos de informação e repressão no
Brasil 1964-1985”), já estão disponíveis no portal com alguns textos e fotos
reproduzidos digitalmente. Também vale ressaltar que a mais recente, “Registros de
uma Guerra Surda”, está tendo cobertura de jornais de grande circulação do Rio de
Janeiro. A promoçao de concursos monográficos também se verifica pelo Prêmio de
Pesquisa Memórias Reveladas, onde uma comissão designada julga as monografias
inscritas no projeto.
Segundo Stampa (2011), o Centro vem atuando também na promoção e no apoio
a eventos relativos à direitos humanos e acesso à informação pública. Em novembro de
2009, o Arquivo Nacional foi convidado ao III Seminário Latino-Americano de Anistia
e Direitos Humanos - Manoel da Conceição (realizado em Brasília-DF) e participou da
gravação de depoimentos dos camponeses que moram na região da Guerrilha do
Araguaia. Em 2010, mais dois eventos: Seminário Nacional Arquivos da Ditadura e
Democracia e o Seminário Internacional sobre Acesso à Informação.
Infelizmente, esses avanços contrastam com denúncias graves que cercam o
projeto. Em 2010 o historiador Carlos Fico, então presidente substituto da Comissão de
Altos Estudos do Memórias Reveladas, entregou uma carta de demissão ao
Coordenador-Geral Jaime Antunes da Silva expondo graves problemas Centro de
Referência. À época, a notícia teve destaque e foi publicada juntamente à carta de
demissão no jornal O Globo de 3 de novembro de 2010 em um artigo de Chico Otávio:
Não obstante o Brasil possua um grande acervo documental sobre a
ditadura militar já transferido para o Arquivo Nacional e arquivos
estaduais – em tese disponível à consulta pública – sua pesquisa,
muitas vezes, tem sido bastante dificultada. (FICO, 2010)
Uma das razões da demissão do historiador é relatada na matéria, onde o acesso
à documentos é negado a uma aluna de doutorado, Adriana Setemy. A própria relata o
episódio:
Comecei a pesquisa em janeiro, mas quando voltei em setembro, o
funcionário disse que era para desconsiderar tudo o que eu já havia
25
levantado, porque a consulta direta aos instrumentos de pesquisa (lista
que contém os documentos contidos em cada acervo) já não estava
mais disponível.
O historiador Carlos Fico traz à luz interferências políticas que afetam diretamente a
credibilidade do projeto ao dificultarem e criarem barreiras para a consulta pública de
documentos. À época eleitoral, as interferências foram constatadas com mais freqüência
coincidindo inclusive a data do final das eleições com a data de liberação de alguns
documentos que deveriam estar acessíveis à qualquer dia e hora como é a premissa de
um ”pólo difusor de informações”:
Nas últimas semanas, pesquisadores foram impedidos de consultar os
documentos do Conselho de Segurança Nacional e da Divisão de
Segurança e Informações do Ministério das Relações Exteriores sob a
alegação que jornalistas estariam fazendo uso indevido da
documentação buscando dados sobre candidatos envolvidos na
campanha eleitoral. Decidi, naquele momento, afastar-me do Memórias
Reveladas porque, evidentemente, não concordo com este procedimento
ilegítimo. (FICO, 2010)
Em outro trecho, Fico (2010) relata a proibição de consulta até de instrumentos
de pesquisa:
Tampouco pode perdurar o entendimento improcedente que insiste em
tratar como “sigiloso” o documento já desclassificado pela lei. Os
documentos que outrora foram classificados como secretos,
confidenciais etc. e cujos prazos de classificação se esgotaram são
documentos ostensivos e todos podem ter acesso a eles. Essas
percepções restritivas levaram ao absurdo de proibir-se a consulta até
mesmo dos instrumentos de pesquisa. (FICO, 2010)
Adiante, Fico (2010) denuncia uma “distinção” por parte do Arquivo Nacional
entre os consulentes, privilegiando pesquisadores renomados e dificultando o acesso de
jornalistas e estudantes:
26
Não é cabível que os arquivos façam distinções entre jornalistas,
pesquisadores, estudantes, associações de vítimas do regime militar etc.
tratando de maneira diferente cada uma dessas pessoas ou órgãos,
criando maiores obstáculos, por exemplo, para os jornalistas e para os
estudantes de graduação ou, ao contrário, privilegiando pesquisadores
renomados. Todos devem ter acesso indiscriminadamente, aos acervos
documentais. (FICO, 2010)
Ao final, o historiador e ex-presidente substituto da Comissão de Altos Estudos
do Memórias Reveladas, não tem dúvidas ao sentenciar o fracasso do Centro de
Referência: “Lamento que o Memórias Reveladas não tenha se constituído em um
grande portal de acesso aos documentos do regime militar como era seu objetivo
inicial.” (FICO, 2010)
Logo após a demissão de Carlos Fico, a historiadora Jesse Jane também se
desliga do projeto alegando os motivos semelhantes, também registrados pelo jornal O
Globo no dia 3 de novembro de 2010:
Da ideia inicial de oferecer o acesso aos documentos da ditadura, o
Memórias Reveladas virou um projeto burocrático do Arquivo
Nacional. Documentos que deveriam ser públicos, porque já foram
desclassificados, continuam submetidos à cultura do segredo. (JANE,
2010)
3.2 O Arquivo Nacional: Histórico
O Arquivo Nacional, com sede no Rio de Janeiro, é a mais importante e antiga
instituição arquivística do Brasil. Tem como finalidade recolher e gerir os documentos
produzidos e recebidos pelo Poder Executivo Federal bem como implementar e
acompanhar a Política Nacional de Arquivos.
Sua criação remete ao antigo Arquivo Público do Império, que em 2 de janeiro
de 1838 foi idealizado para cumprir o previsto na legislação de 1824. É estabelecido,
provisoriamente, na Secretaria de Estado dos Negócios do Império. Tinha por objetivo
guardar os documentos públicos e era organizado em três seções: Administrativa,
27
responsável pelos documentos dos poderes Executivo e Moderador; Legislativa,
incumbida da guarda dos documentos produzidos pelo Poder Legislativo e Histórica.
Sua primeira sede situava-se no edifício do Ministério do Império.
Em 1893 o Arquivo Público do Império passa a denominar-se Arquivo Público
Nacional e em 1911 adota o nome atual, Arquivo Nacional.
Em 1978 o Decreto nº 82.308, de 25 de setembro, institui o Sistema Nacional de
Arquivos – SINAR, que tem no AN o Órgão Central e o CONARQ, para entre outras
medidas acessorar o Órgão Central e propor modificações aprimoradas ao Sistema.
Em 1991 é promulgada a Lei nº 8159, ou Lei de Arquivos, que dispõe sobre a
política nacional de arquivos públicos e privados. Através dela, ficaram estabelecidos os
deveres do Poder Público e a gestão documental como instrumento de apoio à
administração, à cultura e ao desenvolvimento científico. Em 1994 é criado o Conselho
Nacional de Arquivos, órgão colegiado e vinculado ao AN. Uma de suas competências
é definir e estabelecer diretrizes para o funcionamento do Sistema Nacional de Arquivos
– SINAR.
O Arquivo Nacional foi subordinado ao Ministério da Justiça, transferido em
2000 à estrutura da Casa Civil da Presidência da República e no ano de 2011 retornou
ao antigo ministério.
3.3 O Conselho Nacional de Arquivos
O Conselho Nacional de Arquivos - CONARQ é um órgão vinculado ao
Arquivo Nacional do Ministério da Justiça, que tem por finalidade definir a política
nacional de arquivos públicos e privados e como órgão central do Sistema Nacional de
Arquivos, exercer orientação normativa visando à gestão documental e à proteção
especial aos documentos de arquivo. Ao Arquivo Nacional, cabe dar suporte técnico e
administrativo ao CONARQ.
O CONARQ foi criado pelo art. 26 da Lei nº 8.159/91 e regulamentado pelo
Decreto nº 4.073, de três de janeiro de 2002. Entre as principais competências definidas
pelo seu regimento, temos:
28
I. estabelecer diretrizes para o funcionamento do Sistema
Nacional de Arquivos - SINAR, visando à gestão, à preservação
e ao acesso aos documentos de arquivos;
II. propor ao Ministro de Estado da Justiça normas legais
necessárias ao aperfeiçoamento e à implementação da política
nacional de arquivos públicos e privados;
III. subsidiar a elaboração de planos nacionais de desenvolvimento,
sugerindo metas e prioridades da política nacional de arquivos
públicos e privados;
IV. estimular a implantação de sistemas de arquivos nos Poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário da União, dos Estados, do
Distrito Federal e nos Poderes Executivo e Legislativo dos
Municípios;
V. estimular a integração e modernização dos arquivos públicos e
privados;
identificar os arquivos privados de interesse público e social,
nos termos do art. 12 da Lei no 8.159, de 1991;
VI. articular-se com outros órgãos do Poder Público formuladores
de políticas nacionais nas áreas de educação, cultura, ciência,
tecnologia, informação e informática.
(http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/s
tart.htm)
O CONARQ é formado por dezessete membros conselheiros: o Diretor-Geral do
Arquivo Nacional, representantes dos poderes Executivo Federal, Judiciário Federal,
Legislativo Federal, do Arquivo Nacional, dos arquivos públicos estaduais e do Distrito
Federal, dos arquivos públicos municipais, das instituições mantenedoras de curso
superior de Arquivologia, de associações de arquivistas e de instituições que
congreguem profissionais que atuem nas áreas de ensino, pesquisa, preservação ou
acesso a fontes documentais.
Essa deveria ser uma forma de dar voz aos diversos atores políticos da sociedade
e tentar uma convergência entre seus interesses. Entretanto, a composição indica uma
predominância significativa do Estado em relação ao resto. Ao Arquivo Nacional, cabe
dar suporte técnico e administrativo ao CONARQ.
29
3.3.1 O CONARQ, o Memórias Reveladas e as políticas públicas arquivísticas no
Brasil
Para elaborar uma análise cuja ótica são as políticas públicas arquivísticas, é
necessário investigar a ação do CONARQ, órgão responsável por estabelecer as
diretrizes e estimular a implantação da Política Nacional de Arquivos, na janela de
tempo entre o fim de 1994 (primeiro ano de funcionamento) até o fim de 2010. Para
tanto, foram consultadas todas as 58 atas de reunião do CONARQ disponíveis em seu
portal na web (http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm),
de onde foram destacadas as que faziam menção à uma política nacional de arquivos, à
políticas arquivísticas ou ao Memórias Reveladas, direta ou indiretamente.
A primeira ata disponível data de 15 de dezembro de 1994 e a última, 19 de
agosto de 2010. Uma vez que o órgão foi criado com a finalidade de implantar uma
política nacional de arquivos, entendemos que até então não haviam políticas públicas
arquivísticas definidas. Essa visão é compartilhada pelos próprios conselheiros como
podemos ver na ata da 4ª Reunião, de 14 de dezembro de 1995, onde o conselheiro
Milton Seligman é mencionado:
“Concluiu sua exposição, desejando ao Arquivo Nacional, por
intermédio do CONARQ, sucesso na definição e delineamento de uma
política nacional de arquivos a ser desenvolvida em parceria com a
sociedade. Colocou-se, pessoalmente, e o Ministério da Justiça à
disposição para colaborar nessa missão.”
Sete anos mais tarde, a ata da 26ª Reunião, de 3 de julho de 2002 registrou uma
discussão entre conselheiros, mediada pelo presidente Jaime Antunes da Silva. A
proposta em questão era a mudança da estrutura e funcionamento do CONARQ,
tranformando-o num órgão político e colocando o próprio Diretor-Geral do Arquivo
Nacional Jaime Antunes como secretário da vislumbrada Executiva do Conselho. Desta
forma, segundo o mesmo, fortaleceria o CONARQ na definição e implementação da
Política Nacional de Arquivos:
30
“Por considerar que o Conselho deverá ser transformado em um órgão
político, o Presidente colocou em discussão proposta no sentido de
passar a vinculação do CONARQ para a Casa Civil da Presidência da
República, a quem caberá a sua presidência, e criar uma Secretaria
Executiva do Conselho, cujo secretário será o Diretor-Geral do
Arquivo Nacional, membro nato do Conselho, fortalecendo, desta
forma, o Conselho como órgão político e não técnico, na definição e
implementação da política nacional de arquivos.”
Argumentando contrariamente, a Conselheira Maria Odila Fonseca adotou uma
visão restrita da Política Nacional de Arquivos e sugeriu que:
“(...) no momento, não ocorresse a alteração proposta, uma vez que o
Conselho cumpre sua finalidade na definição da política nacional de
arquivos, demonstrada pela edição de vários decretos e resoluções e
que, qualquer alteração, na atual conjuntura, poderá acarretar
descontinuidade nos trabalhos do Conselho.”
O Presidente nesse momento pede para que o Plenário estude a questão e volte a
ela posteriormente o que, pelos registros de atas, não se realiza. A discussão evidencia
uma falta de clareza do CONARQ em suas funções visto que a Lei nº 8159/1991 já o
define como um órgão político.
Anos mais tarde, na 41ª ata de Reunião de 31 de julho de 2006, encontramos
mais um indício de que os próprios membros do CONARQ ainda não reconhecem uma
política pública de arquivos de caráter nacional e que esta ainda está sendo esboçada.
Na ocasião o Presidente Jaime Antunes da Silva, após dar boas vindas aos novos
Conselheiros (que passaram a integrar o CONARQ após término do mandato de outros
membros):
“Disse que os trabalhos desenvolvidos pelo Plenário, subsidiando o
delineamento da Política Nacional de Arquivos, tem sido de grande
valor, não só para os órgãos federais, mas também, para os órgãos
estaduais e municipais porventura já criados, e que a troca de
experiências entre os diversos profissionais e seguimentos da sociedade
31
tem sido extremamente gratificante para o Conselho, e que isso
enriquece os produtos que daqui saem, com uma visão que atende não
só às especificidades e necessidades da administração pública, como
do seguimento dos arquivos privados de interesse público e social.”
(grifo nosso)
Na 53ª ata de Reunião, de 20 de maio de 2009, o Memórias Reveladas (MR)
entra em pauta pela primeira vez. Sete dias após sua criação, o Presidente do CONARQ,
Jaime Antunes da Silva, também Diretor-Geral do Arquivo Nacional e Coordenador-
Geral do Centro de Referência, informou a respeito da cerimônia de lançamento do MR
ocorrida no Palácio do Itamaraty e exibiu um vídeo aos conselheiros sobre o mesmo.
Logo em seguida, prosseguiu ao próximo assunto da pauta sem levantar nenhuma
consideração.
A ata da Reunião seguinte, a 54ª de 21 de maio de 2009, apresenta uma
discussão significativa a respeito das ponderações do Conselheiro Alexandre Libonati,
que indagara na reunião anterior se o CONARQ tem competência para deliberar sobre
os Arquivos do Judiciário. Iniciada a sessão o Presidente Jaime Antunes lembra que de
acordo com a Lei nº 8159, de 1991, cabe ao CONARQ:
“(...) definir as diretrizes da política nacional de arquivos públicos e
privados independente da esfera de Poderes. O que a Lei citada
prescreve, em seu art. 20 é que "competem aos arquivos do Poder
Judiciário Federal a gestão e o recolhimento dos documentos
produzidos e recebidos pelo Poder Judiciário Federal no exercício de
suas funções, tramitadas em juízo e oriundos de cartórios e
secretariais, bem como preservar e facultar o acesso aos documentos
sob sua guarda". Assim, entende que o CONARQ não pode abrir mão
de definir as diretrizes das políticas arquivísticas.”
Diante do impasse, o próprio Conselheiro Alexandre Libonati propõe uma
resolução conjunta em que se pudessem contemplar ações de cooperação técnica entre
CONARQ e Conselho Nacional de Justiça. Também sugeriu que esta fosse o mais
generalizante possível para possibilitar os desdobramentos necessários da área técnica
visando uma maior apreciação dos ministros do Plenário do Conselho Nacional de
Justiça.
32
Durante a mesma reunião, o Presidente da Câmara Setorial de Arquivos Médicos
Paulo Elian, defende a articulação do CONARQ com os órgãos responsáveis pelas
políticas na área de saúde como o Conselho Nacional de Saúde e as enxerga como
possíveis parceiras. A iniciativa é fundamental para que se perceba a característica de
transversatilidade das políticas públicas de informação, relacionando-se com as demais
políticas. Entretanto, até a presente reunião percebemos apenas um esboço da mesma:
Paulo Elian “enfatiza a importância de se iniciar uma conversa com o CFM, e destaca a
necessidade de que haja um acordo político entre CONARQ e CFM para que seja
possível um avanço na discussão sobre gestão documental em instituições de saúde”.
Por fim as duas últimas atas de reunião disponíveis, 57ª e 58º correspondentes
aos dias 18 e 19 de agosto de 2010, têm em pauta uma proposta de decreto elaborado
pela Conselheira e Diretora do Arquivo Público do Paraná Deysi Lucia Ramos de
Andrade. A proposta visa à adoção de políticas de acesso universal e comum aos
arquivos integrantes da Rede Nacional de Cooperação e Informações Arquivísticas –
Memórias Reveladas. Após debates nas duas reuniões, o Decreto é enviado aos
Governadores, aos Secretários de Estado e aos Diretores de Arquivos Públicos.
33
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa teve como objetivo analisar o Projeto Memórias Reveladas,
buscando apresentar à classe arquivística uma visão panorâmica que identificasse ou
não o mesmo em um quadro de políticas públicas arquivísticas de caráter nacional. A
importância do diálogo Estado-sociedade bem como a notoriedade do Centro de
Referência motivou e despertou o interesse pelo tema.
Infelizmente a pesquisa e a bibliografia da área arquivística apontam para a não-
materialização da Política Nacional de Arquivos, prevista na Lei nº 8159/91. Política
essa, que supriria a carência da área por reconhecimento, fomentaria a modernização
das práticas arquivísticas e protegeria o patrimônio documental dando suporte e
diretrizes a todos os arquivos públicos e privados do Brasil. Auxiliaria também nas
dificuldades encontradas pelos arquivos brasileiros que vão desde a escassez de pessoal
qualificado à falta de estrutura e instrumentos básicos necessários à gestão e
preservação de documentos. Faria, inclusive, com que projetos como o próprio
Memórias Reveladas fossem beneficiados e cumprissem plenamente seus objetivos de
promover acesso irrestrito às fontes de informação.
O Memórias Reveladas, além da óbvia ligação com o Arquivo Nacional, deveria
estar intimamente ligado ao CONARQ por seu alcance e para que os diversos atores
sociais presentes no Conselho pudessem expressar os anseios da sociedade. Em um
contexto de políticas públicas nacional, não se pode privar da voz de representantes
sociais e se pautar apenas em decisões do Estado. Os dados indicam que toda a
concepção e implementação do Memórias Reveladas deu-se basicamente à margem da
pauta do CONARQ. Essa ausência torna-se ainda mais intrigante se considerarmos que
o Presidente do CONARQ é também Diretor-Geral do Arquivo Nacional e
Coordenador-Geral do Centro de Referência.
Estando à margem das decisões do CONARQ, o projeto põe-se como uma ação
descontinuada que não tem participação em uma política pública de arquivos de âmbito
nacional. E ainda que paralelamente ao Conselho Nacional de Arquivos, o Centro de
Referência não apresenta os elementos característicos de uma política arquivística e por
consequência, de uma política de informação. Sua não-relação com outras políticas
públicas denuncia a falta de transversatilidade, enquanto a não-participação de atores
sociais no direcionamento do projeto evidencia outra lacuna. A pesquisa nos leva a crer
que o Memórias Reveladas trata-se apenas de uma política de memória.
34
Apesar da dificuldade de ler e analisar tamanha documentação, e do desafio que
este trabalho representou, acreditamos que o mesmo cumpriu seus objetivos e possui
relevância devido à uma abordagem inédita do projeto. Ao mesmo tempo, procurou
fomentar o debate sobre políticas públicas na classe arquivística brasileira e na
sociedade brasileira em geral.
Por mais que hajam indícios de crescimento do interesse pela área, contamos
ainda com poucas publicações a respeito e isso fará diferença na velocidade com que as
ações governamentais serão tomadas. Somente através do envolvimento da classe e da
sociedade representada em seus diversos segmentos, uma política pública é formulada e
implementada.
35
REFERÊNCIAS
BURKE, Peter. História como memória social. In: Variedades de história cultural.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2000, p. 67-89
DAGNINO, Renato et al. Metodologia de análise de políticas públicas. In: ____.
Gestão estratégica da inovação: metodologias para análise e implementação.
Taubaté: Editora Cabral Universitária, 2002.
GOIS, Chico de. ; FRACOULA, Bernardo Mello. Lula diz que abertura de arquivos da
ditadura não é questão de revanchismo. 13 de maio de 2009. O Globo. Rio de Janeiro.
http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/05/13/lula-diz-que-abertura-de-arquivos-da-
ditadura-nao-questao-de-revanchismo-755846269.asp . Acesso em 13 de outubro 2010,
18:39.
GONDAR, J., DODEBEI, V. O que é memória social?. Rio de Janeiro: Contra Capa,
2005.
HOFLING, Eloisa de Mattos. Estado e políticas (públicas) sociais. Caderno Cedes, V.
21, n. 55, nov./2001
JARDIM, J. M. ; SILVA, Sérgio Conde de Albite ; NHARRELUGA, R. S. Análise de
Políticas Públicas: uma abordagem em direção às políticas públicas de informação.
Perspectivas em Ciência da Informação , v. 14, p. 2-22, 2009.
______. O inferno das boas intenções: legislação e políticas arquivísticas. In.
MATTAR, Eliana (org.). Acesso à informação e política de arquivos. Rio de Janeiro:
Arquivo Nacional, 2003.
______. Políticas públicas arquivísticas: princípios, atores e processos. Arquivo &
Administração. Rio de Janeiro: Associação dos Arquivistas Brasileiros, 2006. v. 5, n. 2,
p. 5-16.
______. Sistemas e políticas públicas de arquivos no Brasil. Niterói : EDUFF,.
1995. Cap 13 - p. 165-176.
LE GOFF, Jacques. Memória. In: ______. História e memória. 5ª ed. Campinas, SP:
Editora UNICAMP, 2003. p. 419-476.
MARCONDES, CELSO. Memórias Reveladas. CARTA CAPITAL, São Paulo, nov.
2008. Disponível em http://www.cartacapital.com.br/politica/memorias-reveladas.
Acesso em: 01 jan. 2010, 05:57.
NORA, Pierre. “Entre Memória e História: a problemática dos lugares”, In: Projeto
História. São Paulo: PUC, n. 10, pp. 07-28, dezembro de 1993.
36
OTAVIO, CHICO. Historiador se demite em protesto contra sigilo de acervos da
ditadura no período eleitoral. O Globo, Rio de Janeiro, 03 de novembro de 2010.
Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/eleicoes2010/mat/2010/11/03/historiador-
se-demite-em-protesto-contra-sigilo-de-acervos-da-ditadura-no-periodo-eleitoral-
922934844.asp. Acesso em 05 de junho de 2011, 11:32.
ROUSSEFF, Dilma Vana.CENTRO DE REFERENCIAS DAS LUTAS POLÍTICAS
NO BRASIL.2009.
http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?info
id=1&sid=2 . Acesso em 13 de outubro de 2010, 19:15.
SILVA, Sérgio Conde de Albite. A preservação da informação arquivística
governamental nas políticas públicas do Brasil. 1. ed. Rio de Janeiro: Associação dos
Arquivistas Brasileiros, 2008. p. 284
STAMPA, Inez. Memórias Reveladas e os arquivos do período da ditadura militar.
Revista Com Ciência. 2011.
http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=65&id=825&tipo=1. Acesso
em 05 de junho de 2011, 11:11.

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Políticas públicas arquivísticas e o Projeto Memórias Reveladas

  • 1.   UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – UNIRIO       NELSON ALFREDO SALOMÃO NETO       PROJETO MEMÓRIAS REVELADAS: O ARQUIVO NACIONAL, O CONARQ E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ARQUIVO NO BRASIL                                 Rio de Janeiro 2011 NELSON ALFREDO SALOMÃO NETO  
  • 2.               S173 SALOMÃO NETO, Nelson Alfredo. Projeto Memórias Reveladas: O Arquivo Nacional, O CONARQ e as políticas públicas de arquivo no Brasil / Nelson Alfredo Salomão Neto, 2011. 36f.     Monografia apresentada ao Curso de Arquivologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro para obtenção do grau parcial de Bacharel em Arquivologia. Orientador: José Maria Jardim.   1. Memórias Reveladas 2. Arquivo Nacional. 3. CONARQ. 4. Políticas públicas arquivísticas.               CDD: 350.7146                                
  • 3. RESUMO Este trabalho resulta da persistência em busca do que se acredita ser de suma importância para a sociedade e para a classe dos profissionais arquivistas que luta por um governo cada vez mais transparente. A pesquisa teve como objetivo analisar o Projeto Memórias Reveladas, buscando apresentar uma visão panorâmica que identificasse ou não o mesmo em um quadro de políticas públicas arquivísticas de caráter nacional. A importância do diálogo Estado- sociedade bem como a notoriedade do Centro de Referência motivou e despertou o interesse pelo tema. Usou-se de consultas ao Portal Memórias Reveladas e ao site do Arquivo Nacional, bem como a análise de todas as atas do Conselho Nacional de Arquivos, responsável por estabelecer diretrizes e implantar a Política Nacional de Arquivos. Além disso, trabalhos divulgados no Brasil e no exterior que pudessem sustentar a pesquisa.  Palavras-chave: Memórias Reveladas, políticas públicas arquivísticas, Arquivo Nacional, CONARQ.                      
  • 4. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO.......................................................................................................10 2. POLÍTICAS PÚBLICAS........................................................................................13 2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS: CONCEITUAÇÃO GERAL E HISTÓRICA...............................................................13 2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS DE INFORMAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS ARQUIVÍSTICAS........................................................................................................16 3. O ARQUIVO NACIONAL, O CONARQ E O PROJETO MEMÓRIAS REVELADAS..............................................................................................................20 3.1 O PROJETO MEMÓRIAS REVELADAS............................................................20 3.1.1 HISTÓRICO, ESTRUTURA E MECENATO....................................................20 3.1.2 OBJETIVOS E RESULTADOS ALCANÇADOS.............................................22 3.2 O ARQUIVO NACIONAL: HISTORICO............................................................26 3.3 O CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVOS....................................................27 3.3.1 O CONARQ, O MEMÓRIAS REVELADAS E AS POLÍTICAS PÚBLICAS ARQUIVÍSTICAS NO BRASIL.................................................................................29 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................33 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................35
  • 5. 10 INTRODUÇÃO O tema “políticas públicas” hoje em dia, conquista cada vez mais espaço na sociedade e vem reforçando os canais de comunicação entre os governantes e seus governados. Não obstante, o meio acadêmico tem participado desse fenômeno com as crescentes monografias, teses de mestrado e doutorado que tratam do tema. Ao longo das últimas décadas temos observado uma tentativa de verticalização teórica das “políticas públicas”, em especial do denominado “análise de políticas públicas”, expressão mais comumente encontrada na literatura das Ciências Políticas, Sociais e da Informação. Estudar as políticas públicas de informação no Brasil é vital para compreendermos o avanço (ou a falta de) nas questões pertinentes à gestão, ao acesso e à preservação da informação arquivística governamental. Diante desse panorama, um projeto específico do Arquivo Nacional foi alvo desse estudo. O objetivo da pesquisa foi analisar o Projeto Memórias Reveladas, buscando entender sua importância ou não em um quadro de políticas públicas arquivísticas de caráter nacional. A importância do diálogo Estado-sociedade bem como a notoriedade do Centro de Referência motivou e despertou o interesse pelo tema. Para tanto, foi levantada a bibliografia pertinente bem como foram estudadas todas as atas de reunião divulgadas pelo Conselho Nacional de Arquivos no período estudado (1994-2010). Assim, procurou-se identificar de que forma o Memórias Reveladas foi abordado pelo órgão responsável por ditar as diretrizes da Política Nacional de Arquivos. É significativo dizer que a maioria das atas não possui as referidas ocorrências em um contexto que indique ações do órgão que possam convergir para a materialização de uma política pública de arquivos de âmbito nacional. Muitas delas apenas se remetem à Lei nº 8159, lembrando as competências do CONARQ. Nesse contexto, a pesquisa sobre o Centro de Referência e o estudo das cinquenta e oito atas de reuniões nos leva diretamente a duas questões: 1) por que o Memórias Reveladas não cumpre integralmente sua função de garantir o pleno e irrestrito acesso aos seus documentos? 2) por que um projeto com sua dimensão não esteve em pautas do CONARQ nenhuma vez desde o momento de sua idealização (2005) até sua criação, em 2009 ? 3) por que uma política pública para os arquivos ainda não se materializou ? O projeto Memórias Reveladas, de iniciativa da Casa Civil da Presidência da República, nasceu no decreto que regulamenta a transferência dos acervos dos extintos
  • 6. 11 Conselho de Segurança Nacional, Comissão Geral de Investigações e Serviço Nacional de Informações, para o Arquivo Nacional. De acordo com o portal oficial do projeto, o Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil (Memórias Reveladas), tem como objetivo geral “tornar-se um pólo difusor de informações contidas nos registros documentais sobre as lutas políticas no Brasil nas décadas de 1960 a 1980”. O projeto consiste em integrar uma rede nacional de arquivos, instituições públicas e privadas tendo como prerrogativa a cooperação entre a União e os Estados brasileiros. Em seu momento inicial foram identificados acervos organizados em treze estados além do Distrito Federal e, digitalizados, passaram a fazer parte da rede. Em 13 de maio de 2009, data de assinatura da Portaria n.204, a ex-Ministra Chefe da Casa Civil Dilma Roussef, assinalou : Essa iniciativa inédita está possibilitando a articulação entre os entes federados com vistas a uma política de reconstituição da memória nacional do período da ditadura militar. Os acordos firmados entre a União e os Estados detentores de arquivos viabilizam o cumprimento do requisito constitucional de acesso à informação a serviço da cidadania. Estamos abrindo as cortinas do passado, criando as condições para aprimorarmos a democratização do Estado e da sociedade. Possibilitando o acesso às informações sobre os fatos políticos do País reencontramos nossa história, formamos nossa identidade e damos mais um passo para construir a nação que sonhamos: democrática, plural, mais justa e livre. (ROUSSEF, 2009) O entusiasmo da ex-Ministra parece compartilhado por praticamente todos os segmentos da imprensa, em suas diversas orientações ideológicas. Em 12 de novembro de 2008, a Carta Capital destina uma matéria ao tema e descreve o Memórias Reveladas como um projeto que irá catalogar e colocar à disposição do público pela internet os registros preservados das lutas políticas durante o regime militar. Ao fim da matéria, sentencia: “Revelar memórias faz muito bem à saúde do País.” Já em maio de 2009 foi a vez do jornal O Globo registrar a ótica do Presidente Lula sobre o projeto à época do lançamento do portal: “- Estou convencido que nós
  • 7. 12 vamos prestar um serviço à democracia brasileira na hora que a gente conseguir desvendar alguns mistérios que ainda persistem na nossa história.” O Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil ainda foi destaque em vários outros jornais e revistas do Brasil, aparecendo até em sites filiados a partidos políticos como o Portal Vermelho, do Partido Comunista do Brasil (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=52574&id_secao=1 ). Nesse contexto, a iniciativa governamental pode ser vista como um marco no que tange o acesso à informação. A integração entre os arquivos públicos brasileiros, a inovação na forma de acesso aos documentos e a resposta da sociedade ao projeto, verificada pela repercussão midiática; faz com que o Memórias Reveladas se projete como referência. Como este trabalho visa abordar a crescente discussão a respeito de políticas públicas arquivísticas e paralelamente o Projeto Memórias Reveladas, questiona-se: O Memórias Reveladas configura-se como uma política pública arquivística de caráter nacional ? Em artigo publicado na Revista Arquivo & Administração, Jardim (2006) sintetiza o conceito de políticas públicas arquivísticas: Conjunto de premissas, decisões e ações – produzidas pelo Estado e inseridas nas agendas governamentais em nome do interesse social – que contemplam os diversos aspectos (administrativos, legal, científico, cultural, tecnológico etc.) relativos à produção, uso e preservação da informação arquivística de natureza pública e privada. (JARDIM, 2006, p. 10) Diante desse cenário, serão debatidos diversos autores pertinentes que possibilitem uma análise do projeto Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional, dentro da perspectiva de políticas públicas de informação no Brasil. Para tanto, serão trabalhados tanto conceitos específicos (políticas públicas arquivísticas e políticas públicas de informação) quanto conceitos gerais (políticas sociais, políticas públicas e memória social).
  • 8. 13 2. POLÍTICAS PÚBLICAS As políticas públicas são elementos-chave para o entendimento das relações entre o Estado e os diversos grupos sociais que atuam para que seus interesses sejam atendidos. A compreensão destas em determinada sociedade, entretanto, implica em uma análise intensa da história, do regime vigente, da conscientização política da população e é claro, das condições estruturais e financeiras do Estado. Para que o estudo das políticas públicas de informação no Brasil seja realizado de forma eficiente, é necessário uma breve conceituação geral e histórica de políticas públicas. 2.1 Políticas Públicas e Análise de Políticas Públicas: Conceituação geral e histórica Ao abordar o conceito de política, Dagnino (2002, p.3) lembra que o termo pode ser empregado em pelo menos dez formas: 1. Campo de atividade ou envolvimento governamental (social, econômica), embora com limites nem sempre definidos 2. Objetivo ou situação desejada (estabilidade econômica) 3. Propósito específico (inflação zero) em geral relacionado a outros de menor ou maior ordem 4. Decisões do governo frente a situações emergenciais 5. Autorização formal (diploma legal), ainda que sem viabilidade de implementação 6. Programa (“pacote” envolvendo leis, organizações, recursos) 7. Resultado (o que é obtido na realidade e não os propósitos anunciados ou legalmente autorizados) 8. Impacto (diferente de resultado esperado) 9. Teoria ou modelo que busca explicar a relação entre ações e resultados 10. Processo (os nove acima são “fotos” é necessário um “filme”: enfoque processual).
  • 9. 14 E tenta sintetizá-lo em três elementos-chave, que são: 1. Uma teia de decisões e ações que alocam (implementam) valores; 2. Uma instância que, uma vez articulada, vai conformando o contexto no qual uma sucessão de decisões futuras serão tomadas; 3. Algo que envolve uma teia de decisões ou o desenvolvimento de ações no tempo, mais do que uma decisão única localizada no tempo. Heclo (1972, p. 84-85 apud DAGNINO, 2002, p. 2) por sua vez alerta para o curso das inações (ou não-ações), que seriam também formas de política. Wildavsky (1979, p. 387 apud DAGNINO, 2002, p. 2) nota que o termo “política” atende tanto para um processo de tomada de decisões quanto para o produto resultante desse processo. Já Jenkins (1978, p. 15 apud DAGNINO, 2002, p. 2) define um ”conjunto de decisões interrelacionadas, concernindo à seleção de metas e aos meios para alcançá-las, dentro de uma situação especificada”. Desta forma, percebemos alguns pontos de convergência entre os autores, notadamente a visão de política como um “conjunto de decisões” ou “teia de decisões”, excluindo do conceito ações ou inações isoladas. Em uma das definições de “política”, Gobert, Muller (1987 apud HOFLING, 2001, p. 31) a entende como o “Estado em ação”. Definição que Hofling (2001) adota e aprofunda como a implantação de projetos de governo, ou seja, sua intervenção junto a setores da sociedade. No entanto, Hofling (2001) alerta para o fato de que políticas públicas não podem ser concebidas como sinônimos de políticas estatais, uma vez que são compreendidas em um processo que envolve a participação de “diferentes organismos e agentes da sociedade relacionados à política implementada”. Faz também a distinção de políticas sociais, vistas como: [...]ações que determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais visando a diminuição das desigualdades estruturais
  • 10. 15 produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico (HOFLING, 2001, p. 31). Já para Muller e Surel ( 2004 apud SILVA, 2008 p. 47) esta “ação do Estado” pode ser considerada: [...] o lugar privilegiado em que as sociedades modernas, enquanto sociedades complexas, vão colocar o problema crucial de sua relação com o mundo através da construção de paradigmas ou de referenciais, sendo que este conjunto de matrizes cognitivas e normativas intelectuais determina, ao mesmo tempo, os instrumentos graças aos quais as sociedades agem sobre elas mesmas e os espaços de sentido no interior das quais os grupos sociais vão interagir. Vários autores do campo das Ciências Sociais e Políticas entretanto, debruçam- se sobre a expressão “análise de políticas públicas”. Dagnino (2002), adota como conceito “o conjunto de conhecimentos proporcionado por diversas disciplinas das ciências humanas utilizados para buscar resolver ou analisar problemas concretos em política (policy) pública”. O autor sugere que o objeto da Análise de Políticas Públicas seriam os problemas enfrentados pelos chamados policy makers (ou fazedores de políticas) e o objetivo seria o auxílio aos mesmos. Dagnino (2002) aponta que o surgimento da Análise de Políticas Públicas como campo acadêmico ocorre na década de sessenta, influenciado basicamente por dois fatores: a crescente dificuldade dos formuladores de políticas em lidar com os problemas que surgiam; e o desvio de atenção dos acadêmicos de Ciências Humanas para as questões relacionadas às políticas públicas, tentando solucionar os problemas existentes através da metodologia e do conhecimento. Em sua gênese, os cursos orientavam mais para uma área de pesquisa do que propriamente para a administração pública deixando de lado alguns elementos práticos de grande valia como os valores (DAGNINO, 2002). Os anos setenta trouxeram uma intensificação das pesquisas e diversas contribuições para a área. Surge então, nova abordagem que procurava solucionar os problemas concernentes aos cursos de ciências políticas. Cursos que, por sua vez, tomaram por ideal áreas da administração e falharam na importância excessiva de
  • 11. 16 elementos práticos. Na década seguinte, técnicas de administração do setor privado são trazidas à luz principalmente pela incapacidade do Estado de resolver problemas sociais, pela privatização e pela intensificação do debate Estado x mercado. (DAGNINO, 2002 p. 5). No que diz respeito aos estudos de Análise de Política, Dagnino (2002) apresenta uma classificação elaborada por Ham e Hill (1993) que os divide em duas categorias:  a análise que tem como objetivo desenvolver conhecimentos sobre o processo de elaboração políticas (formulação, implementação e avaliação) em si mesmo - estudos sobre as características das políticas e o processo de elaboração de políticas – que revelam, portanto, uma orientação predominantemente descritiva; e  a análise voltada a apoiar os fazedores de política, agregando conhecimento ao processo de elaboração de políticas, envolvendo-se diretamente na tomada de decisões, revelando assim um caráter mais prescritivo ou propositivo. Entretanto, a tensão visualizada por entre o descritivo e o prescritivo e sua distinção não é unanimidade entre os pensadores da área. Autores como Dye (1976), Lasswell (1951) e Dror (1971), citados por Dagnino (2002) entendem que a análise política possui simultaneamente as características prescritivas e descritivas. 2.2 Políticas públicas de informação e políticas públicas arquivisticas Políticas públicas arquivísticas é um tema ainda pouco explorado não só nos países periféricos, mas também nos centrais. A literatura da área ainda é incipiente e não se encontram muitos estudos publicados a respeito. De forma geral podemos entendê-la como uma das vertentes das políticas públicas de informação, que começa a se tornar um tema freqüente na segunda metade do século XX. Durante as décadas de sessenta e setenta, intensifica-se o debate acerca de “sistemas de informação”. Em uma proposta da UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) e do ICSU (Conselho Internacional de Associações Científicas) para a idealização do UNISIST (Sistema Mundial de Informação Científica e Tecnológica) e na Conferência Intergovernamental realizada
  • 12. 17 pela mesma em 1974, encontramos a preocupação em estabelecer diretrizes para políticas relacionadas à documentação, bibliotecas e arquivos: com vistas a analisar os conceitos gerais, resultantes das conclusões de conferências regionais sobre planejamento na América Latina, Ásia, África, Estados Árabes e definir diretrizes gerais da política e a metodologia do planejamento para aplicá-las aos serviços de documentação, bibliotecas e arquivos. (UNESCO, 1975 apud JARDIM, 1995 p.37) Na citada conferência, o UNISIST daria espaço ao conceito de NATIS (Sistemas Nacionais de Informação), que: implica que a administração central ou local de um Estado deve perseguir uma disponibilidade máxima de toda informação pertinente, mediante os serviços de documentação, bibliotecas e arquivos (...) eliminando toda a duplicação de atividades entre certas classes de serviços através de uma ação planejada (...) provavelmente isto será mais fácil para os novos países em desenvolvimento (grifo nosso) que para os antigos, nos quais há interesses criados (acadêmicos, associações científicas, grupos industriais) muito fortes”. (UNESCO, 1975 apud JARDIM, 1995 p.37) Ainda que os objetivos e as prerrogativas do NATIS não tenham sido plenamente alcançados, Jardim (1995) ressalta a importância do conceito que tornou-se um marco na literatura e de seus princípios, que ainda servem de referência em debates e ações que envolvem políticas públicas de informação nos países periféricos. Hernon e Relyea (1991), citados por Silva (2008), apontam para o termo “política de informação” através de uma definição objetiva, mas que deixa clara a complexidade e por vezes contraditória natureza do conceito: Política de informação tem sido definida como um conjunto de princípios, leis, diretrizes, regras, regulamentos e procedimentos inter- relacionados que orientam a supervisão e gestão do ciclo vital da informação: a produção, coleção, organização,
  • 13. 18 distribuição/disseminação, recuperação, uso e preservação da informação. (HERNON; RELYEA apud SILVA, 2008, p. 71) Jardim (2006), um dos poucos autores brasileiros a tratar do assunto, afirma que: A noção de "política de informação" tende a ser naturalizada e a designar diversas ações e processos do campo informacional: arquivos, bibliotecas, internet, tecnologia da informação, governo eletrônico, sociedade da informação, informação científica e tecnológica, etc. (JARDIM, 2006, p. 10) Por esse prisma podemos concluir que o próprio termo “política de informação” carece de verticalização teórica e sua aplicação ainda é bem extensiva. Jardim (2006) tenta, nesse sentido, uma aproximação com os aspectos teóricos da análise de políticas públicas e destaca cinco elementos que normalmente estão presentes nas políticas públicas de informação: a) O alcance e o conceito de informação identificam a política de informação. b) O alcance de ações da política de informação: - Ações no Estado - Ações na Sociedade - Ações Estado-Sociedade - Ações Sociedade – Estado c) O equilíbrio entre atividades normativas e operacionais na sua execução; d) A relação da política da informação com as demais políticas públicas, ou seja, a sua transversalidade: - Políticas de cultura - Políticas de saúde - Políticas de educação - Políticas de transportes - Políticas de meio ambiente - Políticas econômicas, etc. e) A participação dos diversos atores sociais que são contemplados por essas políticas de informação. (JARDIM, 2006, p. 10),
  • 14. 19 Uma política pública de arquivo pode ser considerada parte de uma política pública de informação. Ambas são intimamente relacionadas e se completam. São entendidas por Jardim (2006) como: [...]conjunto de premissas, decisões e ações – produzidas pelo Estado e inseridas nas agendas governamentais em nome do interesse social – que contemplam os diversos aspectos (administrativos, legal, científico, cultural, tecnológico etc.) relativos à produção, uso e preservação da informação arquivística de natureza pública e privada. (JARDIM, 2006, p. 10) Além da relação com políticas de informação, Jardim (2006) nota a importância de um “alto grau de transversatilidade” e intersecção com outras políticas públicas como saúde, ciência e habitação, pois o sucesso das mesmas sofre influência dos impactos das políticas arquivísticas nas respectivas áreas. Ao analisar a relação entre legislação e políticas públicas de arquivo, Jardim (2006) lembra que é freqüente a confusão de ambas. E afirma que a legislação arquivística fornece elementos normalizadores à política de arquivos, mas não corresponde a uma. Ainda sob essa ótica, Jardim (2006) desconstrói a imagem comum de que uma legislação arquivística seria o marco zero para uma mudança significativa e faz a distinção entre legislação e ações concretas na execução de políticas de arquivo. Deve ser simultaneamente instrumento e objeto de uma política arquivística, segundo o autor, que corrobora com Couture (1998), “a existência da lei não garante a sua aplicação... A legislação não pode ser confundida com a ação concreta”.
  • 15. 20 3. O ARQUIVO NACIONAL, O CONARQ E O PROJETO MEMÓRIAS REVELADAS Visando uma análise de qualidade e uma ótica que privilegie as políticas públicas arquivísticas no Brasil, é imprescindível o conhecimento do Arquivo Nacional (administrador do Centro de Referências das Lutas Políticas no Brasil) e do Conselho Nacional de Arquivos (CONARQ). Nesse sentido, estruturas, organogramas, parceiros e orçamentos entre outros aspectos serão discutidos ao longo do capítulo. 3.1 O Projeto Memórias Reveladas 3.1.1 Histórico, estrutura e mecenato O Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil ou “Memórias Reveladas”, foi idealizado em 2005 pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República. Em fevereiro, foi criado um Grupo de Trabalho cujo objetivo era elaborar um projeto de implantação de um centro de referência que abrigasse “informações, documentos, arquivos, objetos artísticos com valor simbólico, sobre as violações dos Direitos Humanos durante o período da ditadura militar no Brasil"1 . Ainda neste ano, inicia-se a transferência para o Arquivo Nacional de documentos produzidos e recebidos por instituições extintas e que estavam sob custódia da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) como CSN (Conselho de Segurança Nacional), CGI (Comissão Geral de Investigações) e SNI (Serviço Nacional de Informações). Dois anos depois, a captação de recursos pelo Arquivo Nacional é permitida por intermédio da Lei Rouanet (Lei nº 8.313/91), com vista ao tratamento dos acervos dos extintos DEOPS (Departamento Estadual de Ordem Política e Social) e DOPS (Departamento de Ordem Política e Social); entre outros de interesse do Arquivo Nacional. Finalmente, em 2009 o Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil é criado por intermédio da Portaria n. 204, de 13 de maio, pela Casa Civil da Presidência da República. Hoje, 55 entidades e instituições do Brasil e do exterior fazem parte da rede denominada “ Rede Nacional de Cooperação e Informações Arquivísticas – Memórias Reveladas”. De acordo com Stampa (2011), Coordenadora do Centro de Referência 1 (http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=3&sid=2 )
  • 16. 21 Memórias Reveladas, somente o acervo referente ao período da ditadura militar sob guarda do Arquivo Nacional é constituído por cerca de 17 milhões e 400 mil páginas de documentos textuais, 1363 mil metros lineares de outros tipos documentais (como fotografias), além de 220 mil microfichas e 110 rolos de microfilmes. Também vale ressaltar que campanhas institucionais como a “Doe seu Acervo” fizeram com que em menos de 2 anos fossem doadas mais de 200 mil páginas de documentos textuais, dezenas de livros e documentos sonoros em suportes variados. A estrutura do Centro de Referência é composta por: 1. Coordenação-Geral: responsabilidade do Diretor-Geral do Arquivo Nacional Jaime Antunes da Silva, é o órgão de gestão e de representação do Centro de Referência. 2. Assessoria de coordenação: equipe de servidores do Arquivo Nacional que tem como função a assessoria da Coordenação-Geral em sua atuação e planejamento, acompanhamento e avaliação das atividades técnico- administrativas do Memórias Reveladas. 3. Assessoria de Sistemas de Informação: equipe de especialistas do Arquivo Nacional que tem por função assessorar a Coordenação-Geral na sua atuação, criação, gestão e aperfeiçoamento dos sistemas de informação relacionados ao Memórias Reveladas. 4. Assessoria de Conteúdo do Portal: equipe de especialistas do Arquivo Nacional que tem por atribuição alimentar o portal e suas seções com matérias de interesse do Centro, bem como supervisionar as atividades de manutenção no que se refere ao design. 5. Conselho Consultivo: integrado por 19 membros, indicados por órgãos governamentais, associações e entidades parceiras, com o objetivo de subsidiar a gestão do Centro de Referência, acompanhando a implantação e o desenvolvimento de suas ações. 6. Comissão de Altos Estudos: formada por 21 pesquisadores e especialistas de instituições de ensino e pesquisa, tem por objetivo aproximar o Centro de Referência da comunidade acadêmica, promovendo a produção de artigos acadêmicos e de difusão científica, pesquisas e concursos monográficos. 7. Rede de Parceiros do Centro: formadas por instituições, entidades e pessoas físicas parceiras da Rede Nacional de Cooperação e Informações Arquivísticas, que tem o Memórias Reveladas como seu projeto piloto.
  • 17. 22 (http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start. htm?infoid=6&sid=2 ) Para facilitar a captação de recursos, o Centro de Referência conta com a parceria de cinco entidades que agem patrocinando projetos integrantes do Memórias Reveladas em várias partes do Brasil. O Banco do Brasil atua junto aos arquivos públicos estaduais de Minas Gerais, Alagoas, Ceará, Sergipe e Rio Grande do Norte. O BNDES atua em parceria com o Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, Arquivo Público Estadual João Emerenciano e Universidade Federal de Goiás. Já a Caixa investe em projetos desenvolvidos nos arquivos públicos estaduais do Rio de Janeiro e Maranhão, além da Associação de Arquivistas do Estado de São Paulo. A APERJ conta também, com o patrocínio da Eletrobrás. A Petrobrás, por fim, é parceira do arquivo público dos estados do Espírito Santo, São Paulo e Paraná. Além do Memórias Reveladas, o governo responde às demandas dos diversos setores sociais com um projeto de lei. No mesmo mês, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva envia ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 5228/2009, de cinco de maio de 2009, que regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal de 1988. Apesar de algumas lacunas ainda discutidas como a manutenção ou não do sigilo eterno de documentos ultra-secretos e de expressões que primam pela falta de objetividade como “local de fácil acesso” e “informações de interesse coletivo e geral”, o referido projeto de lei proporcionará significativos avanços no que se refere ao acesso dos documentos públicos. Entre as providências, caso aprovado o projeto, diminuirão as restrições de acesso e seus respectivos prazos. Estão previstas também responsabilidades para pessoa física ou entidade privada e suas respectivas sanções no art. 33º.2 3.1.2 Objetivos e resultados alcançados Administrado pelo Arquivo Nacional, o Memórias Reveladas tem como objetivo geral “tornar-se um pólo difusor de informações contidas nos registros documentais 2 O Projeto de Lei nº 5228/2009 sofreu alterações em seu bojo antes de sua aprovação na Câmara dos Deputados. Após, seguiu para o Senado Federal onde atualmente discute-se a manutenção ou não do sigilo eterno de documentos ultra-secretos.
  • 18. 23 sobre as lutas políticas no Brasil nas décadas de 1960 a 1980”. Entre os objetivos secundários, destacam-se: Estimular pesquisas, na perspectiva da história, da sociologia, da antropologia, da ciência política e do direito, mediante: •Controle das fontes primárias e da produção bibliográfica disponíveis; •Busca de novas fontes documentais; •Gerenciamento de instrumentos de pesquisa disponíveis e elaboração de novos instrumentos com caráter coletivo. .Promover amplo acesso às fontes de informação e de conhecimento assim sistematizadas, mediante: •Criação de uma rede virtual de amplo espectro; •Montagem de exposições; •Edição (em suporte-papel ou em meio digital) de obras de referência, estudos monográficos e periódicos, em parceria com outras instituições; •Confecção, em parceria, de material didático. Contribuir para o debate de natureza acadêmica e política sobre o período, mediante: •Organização de seminários e eventos de caráter interdisciplinar; •Promoção de concursos monográficos; •Intercâmbio com instituições congêneres, nacionais e estrangeiras. (http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilu a.exe/sys/start.htm?infoid=4&sid=2) Até o presente momento, percebemos o êxito em alguns objetivos específicos enquanto outros deixam a desejar e ainda não podem ser vistos como atingidos. A criação de uma rede virtual pode ser verificada no “Banco de Dados Memórias Reveladas”, que reúne documentos digitalizados de mais de duzentos fundos de trinta e nove instituições participantes, inclusive o próprio Arquivo Nacional. Pesquisas podem ser feitas de três formas (multinível, livre e avançada) e o banco conta também com um manual de instruções para o usuário, o que é de grande utilidade para os pesquisadores não-usuais.
  • 19. 24 A montagem de exposições também deixou o campo dos objetivos e tem sido realizada com regularidade. As primeiras exposições inclusive (“A ditadura por sua agência” e “Na teia do regime militar: o SNI e os órgãos de informação e repressão no Brasil 1964-1985”), já estão disponíveis no portal com alguns textos e fotos reproduzidos digitalmente. Também vale ressaltar que a mais recente, “Registros de uma Guerra Surda”, está tendo cobertura de jornais de grande circulação do Rio de Janeiro. A promoçao de concursos monográficos também se verifica pelo Prêmio de Pesquisa Memórias Reveladas, onde uma comissão designada julga as monografias inscritas no projeto. Segundo Stampa (2011), o Centro vem atuando também na promoção e no apoio a eventos relativos à direitos humanos e acesso à informação pública. Em novembro de 2009, o Arquivo Nacional foi convidado ao III Seminário Latino-Americano de Anistia e Direitos Humanos - Manoel da Conceição (realizado em Brasília-DF) e participou da gravação de depoimentos dos camponeses que moram na região da Guerrilha do Araguaia. Em 2010, mais dois eventos: Seminário Nacional Arquivos da Ditadura e Democracia e o Seminário Internacional sobre Acesso à Informação. Infelizmente, esses avanços contrastam com denúncias graves que cercam o projeto. Em 2010 o historiador Carlos Fico, então presidente substituto da Comissão de Altos Estudos do Memórias Reveladas, entregou uma carta de demissão ao Coordenador-Geral Jaime Antunes da Silva expondo graves problemas Centro de Referência. À época, a notícia teve destaque e foi publicada juntamente à carta de demissão no jornal O Globo de 3 de novembro de 2010 em um artigo de Chico Otávio: Não obstante o Brasil possua um grande acervo documental sobre a ditadura militar já transferido para o Arquivo Nacional e arquivos estaduais – em tese disponível à consulta pública – sua pesquisa, muitas vezes, tem sido bastante dificultada. (FICO, 2010) Uma das razões da demissão do historiador é relatada na matéria, onde o acesso à documentos é negado a uma aluna de doutorado, Adriana Setemy. A própria relata o episódio: Comecei a pesquisa em janeiro, mas quando voltei em setembro, o funcionário disse que era para desconsiderar tudo o que eu já havia
  • 20. 25 levantado, porque a consulta direta aos instrumentos de pesquisa (lista que contém os documentos contidos em cada acervo) já não estava mais disponível. O historiador Carlos Fico traz à luz interferências políticas que afetam diretamente a credibilidade do projeto ao dificultarem e criarem barreiras para a consulta pública de documentos. À época eleitoral, as interferências foram constatadas com mais freqüência coincidindo inclusive a data do final das eleições com a data de liberação de alguns documentos que deveriam estar acessíveis à qualquer dia e hora como é a premissa de um ”pólo difusor de informações”: Nas últimas semanas, pesquisadores foram impedidos de consultar os documentos do Conselho de Segurança Nacional e da Divisão de Segurança e Informações do Ministério das Relações Exteriores sob a alegação que jornalistas estariam fazendo uso indevido da documentação buscando dados sobre candidatos envolvidos na campanha eleitoral. Decidi, naquele momento, afastar-me do Memórias Reveladas porque, evidentemente, não concordo com este procedimento ilegítimo. (FICO, 2010) Em outro trecho, Fico (2010) relata a proibição de consulta até de instrumentos de pesquisa: Tampouco pode perdurar o entendimento improcedente que insiste em tratar como “sigiloso” o documento já desclassificado pela lei. Os documentos que outrora foram classificados como secretos, confidenciais etc. e cujos prazos de classificação se esgotaram são documentos ostensivos e todos podem ter acesso a eles. Essas percepções restritivas levaram ao absurdo de proibir-se a consulta até mesmo dos instrumentos de pesquisa. (FICO, 2010) Adiante, Fico (2010) denuncia uma “distinção” por parte do Arquivo Nacional entre os consulentes, privilegiando pesquisadores renomados e dificultando o acesso de jornalistas e estudantes:
  • 21. 26 Não é cabível que os arquivos façam distinções entre jornalistas, pesquisadores, estudantes, associações de vítimas do regime militar etc. tratando de maneira diferente cada uma dessas pessoas ou órgãos, criando maiores obstáculos, por exemplo, para os jornalistas e para os estudantes de graduação ou, ao contrário, privilegiando pesquisadores renomados. Todos devem ter acesso indiscriminadamente, aos acervos documentais. (FICO, 2010) Ao final, o historiador e ex-presidente substituto da Comissão de Altos Estudos do Memórias Reveladas, não tem dúvidas ao sentenciar o fracasso do Centro de Referência: “Lamento que o Memórias Reveladas não tenha se constituído em um grande portal de acesso aos documentos do regime militar como era seu objetivo inicial.” (FICO, 2010) Logo após a demissão de Carlos Fico, a historiadora Jesse Jane também se desliga do projeto alegando os motivos semelhantes, também registrados pelo jornal O Globo no dia 3 de novembro de 2010: Da ideia inicial de oferecer o acesso aos documentos da ditadura, o Memórias Reveladas virou um projeto burocrático do Arquivo Nacional. Documentos que deveriam ser públicos, porque já foram desclassificados, continuam submetidos à cultura do segredo. (JANE, 2010) 3.2 O Arquivo Nacional: Histórico O Arquivo Nacional, com sede no Rio de Janeiro, é a mais importante e antiga instituição arquivística do Brasil. Tem como finalidade recolher e gerir os documentos produzidos e recebidos pelo Poder Executivo Federal bem como implementar e acompanhar a Política Nacional de Arquivos. Sua criação remete ao antigo Arquivo Público do Império, que em 2 de janeiro de 1838 foi idealizado para cumprir o previsto na legislação de 1824. É estabelecido, provisoriamente, na Secretaria de Estado dos Negócios do Império. Tinha por objetivo guardar os documentos públicos e era organizado em três seções: Administrativa,
  • 22. 27 responsável pelos documentos dos poderes Executivo e Moderador; Legislativa, incumbida da guarda dos documentos produzidos pelo Poder Legislativo e Histórica. Sua primeira sede situava-se no edifício do Ministério do Império. Em 1893 o Arquivo Público do Império passa a denominar-se Arquivo Público Nacional e em 1911 adota o nome atual, Arquivo Nacional. Em 1978 o Decreto nº 82.308, de 25 de setembro, institui o Sistema Nacional de Arquivos – SINAR, que tem no AN o Órgão Central e o CONARQ, para entre outras medidas acessorar o Órgão Central e propor modificações aprimoradas ao Sistema. Em 1991 é promulgada a Lei nº 8159, ou Lei de Arquivos, que dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados. Através dela, ficaram estabelecidos os deveres do Poder Público e a gestão documental como instrumento de apoio à administração, à cultura e ao desenvolvimento científico. Em 1994 é criado o Conselho Nacional de Arquivos, órgão colegiado e vinculado ao AN. Uma de suas competências é definir e estabelecer diretrizes para o funcionamento do Sistema Nacional de Arquivos – SINAR. O Arquivo Nacional foi subordinado ao Ministério da Justiça, transferido em 2000 à estrutura da Casa Civil da Presidência da República e no ano de 2011 retornou ao antigo ministério. 3.3 O Conselho Nacional de Arquivos O Conselho Nacional de Arquivos - CONARQ é um órgão vinculado ao Arquivo Nacional do Ministério da Justiça, que tem por finalidade definir a política nacional de arquivos públicos e privados e como órgão central do Sistema Nacional de Arquivos, exercer orientação normativa visando à gestão documental e à proteção especial aos documentos de arquivo. Ao Arquivo Nacional, cabe dar suporte técnico e administrativo ao CONARQ. O CONARQ foi criado pelo art. 26 da Lei nº 8.159/91 e regulamentado pelo Decreto nº 4.073, de três de janeiro de 2002. Entre as principais competências definidas pelo seu regimento, temos:
  • 23. 28 I. estabelecer diretrizes para o funcionamento do Sistema Nacional de Arquivos - SINAR, visando à gestão, à preservação e ao acesso aos documentos de arquivos; II. propor ao Ministro de Estado da Justiça normas legais necessárias ao aperfeiçoamento e à implementação da política nacional de arquivos públicos e privados; III. subsidiar a elaboração de planos nacionais de desenvolvimento, sugerindo metas e prioridades da política nacional de arquivos públicos e privados; IV. estimular a implantação de sistemas de arquivos nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, dos Estados, do Distrito Federal e nos Poderes Executivo e Legislativo dos Municípios; V. estimular a integração e modernização dos arquivos públicos e privados; identificar os arquivos privados de interesse público e social, nos termos do art. 12 da Lei no 8.159, de 1991; VI. articular-se com outros órgãos do Poder Público formuladores de políticas nacionais nas áreas de educação, cultura, ciência, tecnologia, informação e informática. (http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/s tart.htm) O CONARQ é formado por dezessete membros conselheiros: o Diretor-Geral do Arquivo Nacional, representantes dos poderes Executivo Federal, Judiciário Federal, Legislativo Federal, do Arquivo Nacional, dos arquivos públicos estaduais e do Distrito Federal, dos arquivos públicos municipais, das instituições mantenedoras de curso superior de Arquivologia, de associações de arquivistas e de instituições que congreguem profissionais que atuem nas áreas de ensino, pesquisa, preservação ou acesso a fontes documentais. Essa deveria ser uma forma de dar voz aos diversos atores políticos da sociedade e tentar uma convergência entre seus interesses. Entretanto, a composição indica uma predominância significativa do Estado em relação ao resto. Ao Arquivo Nacional, cabe dar suporte técnico e administrativo ao CONARQ.
  • 24. 29 3.3.1 O CONARQ, o Memórias Reveladas e as políticas públicas arquivísticas no Brasil Para elaborar uma análise cuja ótica são as políticas públicas arquivísticas, é necessário investigar a ação do CONARQ, órgão responsável por estabelecer as diretrizes e estimular a implantação da Política Nacional de Arquivos, na janela de tempo entre o fim de 1994 (primeiro ano de funcionamento) até o fim de 2010. Para tanto, foram consultadas todas as 58 atas de reunião do CONARQ disponíveis em seu portal na web (http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm), de onde foram destacadas as que faziam menção à uma política nacional de arquivos, à políticas arquivísticas ou ao Memórias Reveladas, direta ou indiretamente. A primeira ata disponível data de 15 de dezembro de 1994 e a última, 19 de agosto de 2010. Uma vez que o órgão foi criado com a finalidade de implantar uma política nacional de arquivos, entendemos que até então não haviam políticas públicas arquivísticas definidas. Essa visão é compartilhada pelos próprios conselheiros como podemos ver na ata da 4ª Reunião, de 14 de dezembro de 1995, onde o conselheiro Milton Seligman é mencionado: “Concluiu sua exposição, desejando ao Arquivo Nacional, por intermédio do CONARQ, sucesso na definição e delineamento de uma política nacional de arquivos a ser desenvolvida em parceria com a sociedade. Colocou-se, pessoalmente, e o Ministério da Justiça à disposição para colaborar nessa missão.” Sete anos mais tarde, a ata da 26ª Reunião, de 3 de julho de 2002 registrou uma discussão entre conselheiros, mediada pelo presidente Jaime Antunes da Silva. A proposta em questão era a mudança da estrutura e funcionamento do CONARQ, tranformando-o num órgão político e colocando o próprio Diretor-Geral do Arquivo Nacional Jaime Antunes como secretário da vislumbrada Executiva do Conselho. Desta forma, segundo o mesmo, fortaleceria o CONARQ na definição e implementação da Política Nacional de Arquivos:
  • 25. 30 “Por considerar que o Conselho deverá ser transformado em um órgão político, o Presidente colocou em discussão proposta no sentido de passar a vinculação do CONARQ para a Casa Civil da Presidência da República, a quem caberá a sua presidência, e criar uma Secretaria Executiva do Conselho, cujo secretário será o Diretor-Geral do Arquivo Nacional, membro nato do Conselho, fortalecendo, desta forma, o Conselho como órgão político e não técnico, na definição e implementação da política nacional de arquivos.” Argumentando contrariamente, a Conselheira Maria Odila Fonseca adotou uma visão restrita da Política Nacional de Arquivos e sugeriu que: “(...) no momento, não ocorresse a alteração proposta, uma vez que o Conselho cumpre sua finalidade na definição da política nacional de arquivos, demonstrada pela edição de vários decretos e resoluções e que, qualquer alteração, na atual conjuntura, poderá acarretar descontinuidade nos trabalhos do Conselho.” O Presidente nesse momento pede para que o Plenário estude a questão e volte a ela posteriormente o que, pelos registros de atas, não se realiza. A discussão evidencia uma falta de clareza do CONARQ em suas funções visto que a Lei nº 8159/1991 já o define como um órgão político. Anos mais tarde, na 41ª ata de Reunião de 31 de julho de 2006, encontramos mais um indício de que os próprios membros do CONARQ ainda não reconhecem uma política pública de arquivos de caráter nacional e que esta ainda está sendo esboçada. Na ocasião o Presidente Jaime Antunes da Silva, após dar boas vindas aos novos Conselheiros (que passaram a integrar o CONARQ após término do mandato de outros membros): “Disse que os trabalhos desenvolvidos pelo Plenário, subsidiando o delineamento da Política Nacional de Arquivos, tem sido de grande valor, não só para os órgãos federais, mas também, para os órgãos estaduais e municipais porventura já criados, e que a troca de experiências entre os diversos profissionais e seguimentos da sociedade
  • 26. 31 tem sido extremamente gratificante para o Conselho, e que isso enriquece os produtos que daqui saem, com uma visão que atende não só às especificidades e necessidades da administração pública, como do seguimento dos arquivos privados de interesse público e social.” (grifo nosso) Na 53ª ata de Reunião, de 20 de maio de 2009, o Memórias Reveladas (MR) entra em pauta pela primeira vez. Sete dias após sua criação, o Presidente do CONARQ, Jaime Antunes da Silva, também Diretor-Geral do Arquivo Nacional e Coordenador- Geral do Centro de Referência, informou a respeito da cerimônia de lançamento do MR ocorrida no Palácio do Itamaraty e exibiu um vídeo aos conselheiros sobre o mesmo. Logo em seguida, prosseguiu ao próximo assunto da pauta sem levantar nenhuma consideração. A ata da Reunião seguinte, a 54ª de 21 de maio de 2009, apresenta uma discussão significativa a respeito das ponderações do Conselheiro Alexandre Libonati, que indagara na reunião anterior se o CONARQ tem competência para deliberar sobre os Arquivos do Judiciário. Iniciada a sessão o Presidente Jaime Antunes lembra que de acordo com a Lei nº 8159, de 1991, cabe ao CONARQ: “(...) definir as diretrizes da política nacional de arquivos públicos e privados independente da esfera de Poderes. O que a Lei citada prescreve, em seu art. 20 é que "competem aos arquivos do Poder Judiciário Federal a gestão e o recolhimento dos documentos produzidos e recebidos pelo Poder Judiciário Federal no exercício de suas funções, tramitadas em juízo e oriundos de cartórios e secretariais, bem como preservar e facultar o acesso aos documentos sob sua guarda". Assim, entende que o CONARQ não pode abrir mão de definir as diretrizes das políticas arquivísticas.” Diante do impasse, o próprio Conselheiro Alexandre Libonati propõe uma resolução conjunta em que se pudessem contemplar ações de cooperação técnica entre CONARQ e Conselho Nacional de Justiça. Também sugeriu que esta fosse o mais generalizante possível para possibilitar os desdobramentos necessários da área técnica visando uma maior apreciação dos ministros do Plenário do Conselho Nacional de Justiça.
  • 27. 32 Durante a mesma reunião, o Presidente da Câmara Setorial de Arquivos Médicos Paulo Elian, defende a articulação do CONARQ com os órgãos responsáveis pelas políticas na área de saúde como o Conselho Nacional de Saúde e as enxerga como possíveis parceiras. A iniciativa é fundamental para que se perceba a característica de transversatilidade das políticas públicas de informação, relacionando-se com as demais políticas. Entretanto, até a presente reunião percebemos apenas um esboço da mesma: Paulo Elian “enfatiza a importância de se iniciar uma conversa com o CFM, e destaca a necessidade de que haja um acordo político entre CONARQ e CFM para que seja possível um avanço na discussão sobre gestão documental em instituições de saúde”. Por fim as duas últimas atas de reunião disponíveis, 57ª e 58º correspondentes aos dias 18 e 19 de agosto de 2010, têm em pauta uma proposta de decreto elaborado pela Conselheira e Diretora do Arquivo Público do Paraná Deysi Lucia Ramos de Andrade. A proposta visa à adoção de políticas de acesso universal e comum aos arquivos integrantes da Rede Nacional de Cooperação e Informações Arquivísticas – Memórias Reveladas. Após debates nas duas reuniões, o Decreto é enviado aos Governadores, aos Secretários de Estado e aos Diretores de Arquivos Públicos.
  • 28. 33 CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa teve como objetivo analisar o Projeto Memórias Reveladas, buscando apresentar à classe arquivística uma visão panorâmica que identificasse ou não o mesmo em um quadro de políticas públicas arquivísticas de caráter nacional. A importância do diálogo Estado-sociedade bem como a notoriedade do Centro de Referência motivou e despertou o interesse pelo tema. Infelizmente a pesquisa e a bibliografia da área arquivística apontam para a não- materialização da Política Nacional de Arquivos, prevista na Lei nº 8159/91. Política essa, que supriria a carência da área por reconhecimento, fomentaria a modernização das práticas arquivísticas e protegeria o patrimônio documental dando suporte e diretrizes a todos os arquivos públicos e privados do Brasil. Auxiliaria também nas dificuldades encontradas pelos arquivos brasileiros que vão desde a escassez de pessoal qualificado à falta de estrutura e instrumentos básicos necessários à gestão e preservação de documentos. Faria, inclusive, com que projetos como o próprio Memórias Reveladas fossem beneficiados e cumprissem plenamente seus objetivos de promover acesso irrestrito às fontes de informação. O Memórias Reveladas, além da óbvia ligação com o Arquivo Nacional, deveria estar intimamente ligado ao CONARQ por seu alcance e para que os diversos atores sociais presentes no Conselho pudessem expressar os anseios da sociedade. Em um contexto de políticas públicas nacional, não se pode privar da voz de representantes sociais e se pautar apenas em decisões do Estado. Os dados indicam que toda a concepção e implementação do Memórias Reveladas deu-se basicamente à margem da pauta do CONARQ. Essa ausência torna-se ainda mais intrigante se considerarmos que o Presidente do CONARQ é também Diretor-Geral do Arquivo Nacional e Coordenador-Geral do Centro de Referência. Estando à margem das decisões do CONARQ, o projeto põe-se como uma ação descontinuada que não tem participação em uma política pública de arquivos de âmbito nacional. E ainda que paralelamente ao Conselho Nacional de Arquivos, o Centro de Referência não apresenta os elementos característicos de uma política arquivística e por consequência, de uma política de informação. Sua não-relação com outras políticas públicas denuncia a falta de transversatilidade, enquanto a não-participação de atores sociais no direcionamento do projeto evidencia outra lacuna. A pesquisa nos leva a crer que o Memórias Reveladas trata-se apenas de uma política de memória.
  • 29. 34 Apesar da dificuldade de ler e analisar tamanha documentação, e do desafio que este trabalho representou, acreditamos que o mesmo cumpriu seus objetivos e possui relevância devido à uma abordagem inédita do projeto. Ao mesmo tempo, procurou fomentar o debate sobre políticas públicas na classe arquivística brasileira e na sociedade brasileira em geral. Por mais que hajam indícios de crescimento do interesse pela área, contamos ainda com poucas publicações a respeito e isso fará diferença na velocidade com que as ações governamentais serão tomadas. Somente através do envolvimento da classe e da sociedade representada em seus diversos segmentos, uma política pública é formulada e implementada.
  • 30. 35 REFERÊNCIAS BURKE, Peter. História como memória social. In: Variedades de história cultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2000, p. 67-89 DAGNINO, Renato et al. Metodologia de análise de políticas públicas. In: ____. Gestão estratégica da inovação: metodologias para análise e implementação. Taubaté: Editora Cabral Universitária, 2002. GOIS, Chico de. ; FRACOULA, Bernardo Mello. Lula diz que abertura de arquivos da ditadura não é questão de revanchismo. 13 de maio de 2009. O Globo. Rio de Janeiro. http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/05/13/lula-diz-que-abertura-de-arquivos-da- ditadura-nao-questao-de-revanchismo-755846269.asp . Acesso em 13 de outubro 2010, 18:39. GONDAR, J., DODEBEI, V. O que é memória social?. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2005. HOFLING, Eloisa de Mattos. Estado e políticas (públicas) sociais. Caderno Cedes, V. 21, n. 55, nov./2001 JARDIM, J. M. ; SILVA, Sérgio Conde de Albite ; NHARRELUGA, R. S. Análise de Políticas Públicas: uma abordagem em direção às políticas públicas de informação. Perspectivas em Ciência da Informação , v. 14, p. 2-22, 2009. ______. O inferno das boas intenções: legislação e políticas arquivísticas. In. MATTAR, Eliana (org.). Acesso à informação e política de arquivos. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2003. ______. Políticas públicas arquivísticas: princípios, atores e processos. Arquivo & Administração. Rio de Janeiro: Associação dos Arquivistas Brasileiros, 2006. v. 5, n. 2, p. 5-16. ______. Sistemas e políticas públicas de arquivos no Brasil. Niterói : EDUFF,. 1995. Cap 13 - p. 165-176. LE GOFF, Jacques. Memória. In: ______. História e memória. 5ª ed. Campinas, SP: Editora UNICAMP, 2003. p. 419-476. MARCONDES, CELSO. Memórias Reveladas. CARTA CAPITAL, São Paulo, nov. 2008. Disponível em http://www.cartacapital.com.br/politica/memorias-reveladas. Acesso em: 01 jan. 2010, 05:57. NORA, Pierre. “Entre Memória e História: a problemática dos lugares”, In: Projeto História. São Paulo: PUC, n. 10, pp. 07-28, dezembro de 1993.
  • 31. 36 OTAVIO, CHICO. Historiador se demite em protesto contra sigilo de acervos da ditadura no período eleitoral. O Globo, Rio de Janeiro, 03 de novembro de 2010. Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/eleicoes2010/mat/2010/11/03/historiador- se-demite-em-protesto-contra-sigilo-de-acervos-da-ditadura-no-periodo-eleitoral- 922934844.asp. Acesso em 05 de junho de 2011, 11:32. ROUSSEFF, Dilma Vana.CENTRO DE REFERENCIAS DAS LUTAS POLÍTICAS NO BRASIL.2009. http://www.memoriasreveladas.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?info id=1&sid=2 . Acesso em 13 de outubro de 2010, 19:15. SILVA, Sérgio Conde de Albite. A preservação da informação arquivística governamental nas políticas públicas do Brasil. 1. ed. Rio de Janeiro: Associação dos Arquivistas Brasileiros, 2008. p. 284 STAMPA, Inez. Memórias Reveladas e os arquivos do período da ditadura militar. Revista Com Ciência. 2011. http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=65&id=825&tipo=1. Acesso em 05 de junho de 2011, 11:11.