SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 4
1 
2. JOHN LOCKE E O ESTADO LIBERAL 
John Locke ocupou-se ativamente dos assuntos políticos de seu país. 
Defensor radical do liberalismo político foi obrigado a refugiar-se na Holanda durante 
o período que compreende a fase final da restauração da Monarquia Absoluta dos 
Stuart e a Revolução Gloriosa (de 1683 a 1689). Da Holanda, contribuiu ativamente 
para a elaboração das bases teóricas da monarquia parlamentar inglesa, da qual era 
incondicional defensor. Além disso, ficou responsável pelos preparativos do envio de 
Guilherme de Orange e sua esposa Mary Stuart para a Inglaterra. Voltou em 1689 
para sua terra natal (no mesmo navio em que viajava o casal real) e recebeu todas 
as honras que lhe era dividida, pela elaboração do Primeiro e do Segundo Tratado 
sobre o Governo, suas grandes obras políticas. Era a grande preocupação, mas 
também o contentamento de Locke com o curso que as coisas tomavam em seu 
país de origem. Vejamos o que ele diz no prefácio de uma de suas obras: 
A obra deve contribuir para consolidar o trono de nosso grande salvador, o 
atual rei Guilherme, demonstrar a legitimidade de sua aspiração ao 
consentimento do povo [...] e justificar o povo inglês diante do mundo, cujo 
amor aos seus direitos e justos e naturais, ligado à determinação de 
preservá-los, salvou a nação quando esta se encontra à beira da ruína e da 
escravidão. (apud HELFERICH, 2006, p. 187). 
2.1 - O ESTADO DE NATUREZA OU PRÉ-CIVIL 
Para o pensador inglês, o ser humano, em seu estado pré-civil, encontra-se 
sob o conjunto das leis da natureza que, se seguidas, podem garantir uma condição 
de relativa paz e cooperação mútua. Em seu estado natural, o homem tem direitos 
naturais inalienáveis, irrenunciáveis e irrevogáveis, dentre os quais estão: a vida, a 
liberdade, o próprio corpo, mas principalmente a propriedade privada de bens. 
Locke via no conjunto dos direitos naturais a estrutura fundamental da lei da 
natureza regulamentadora do estado de natureza. Em outras palavras, no estado 
pré-civil, os homens livres e iguais viviam sem governo, pautando-se somente por 
uma lei natural segundo a qual, agindo de maneira estritamente racional, ninguém 
deve infligir danos ou prejuízo à vida, à liberdade, ao corpo e à propriedade de 
outrem.
2 
No entanto, as pessoas nem sempre observam os preceitos de tal lei, pois, no 
estado de natureza, todos os seres humanos são juízes em causa própria e, agindo 
de maneira irracional, podem dar início a um estado de instabilidade e disputa 
extremamente complicado, pois não haveria instituição capaz de restaurar e fazer 
prevalecer o direito da razão, ou seja, o conjunto de direitos que o ser humano 
possui por natureza. 
2.1.1 - O CONTRATO SOCIAL E A CONSTITUIÇÃO DO ESTADO CIVIL 
Como podemos ver, somente o estado de natureza não é suficiente para a 
existência do ser humano, pois se trata de um estado para seres racionais, em 
outras palavras, para pessoas cuja conduta fosse pautada pelo conjunto de leis 
naturais, mas como os homens nem sempre agem de maneira racional, faz-se 
necessária a constituição de uma instância independente, que possa, de maneira 
isenta, resolver as pendências entre os homens. Assim, John Locke, destacando a 
origem democrática do poder político, defende que a elaboração de um contrato 
social não tem outra razão senão a necessidade de garantir, a partir de um pacto 
entre os indivíduos, a manutenção dos direitos naturais, especialmente o desfrute da 
propriedade. 
A partir do que foi visto até aqui, entendemos o estado civil como o estado 
que sucede o estado de natureza, constituído para fundar as estruturas básicas do 
convívio social sob a influência e fiscalização de uma autoridade legitimamente 
constituída para tanto. Então, o estado civil é a garantia de uma convivência racional 
entre os indivíduos. 
O objetivo grande e principal, portanto, da união dos homens em 
comunidades, colocando-se eles sob um governo, é a preservação da 
propriedade privada, para esse objetivo muitas condições faltam no estado de 
natureza: Primeiro, falta uma lei firmada, conhecida, recebida e aceita 
mediante consentimento comum, como padrão de justo e do injusto e medida 
comum para resolver quaisquer controvérsias entre os homens; porque 
embora a lei da natureza seja evidente e inteligível para todas as criaturas 
racionais, os homens desviados pelos interesses [...] não são capazes de 
reconhece-las como lê que os obrigue nos casos particulares. Em segundo 
lugar, falta um juiz desconhecido e indiferente com autoridade para resolver 
quaisquer dissensões, de acordo com a lei estabelecida; porque sendo cada 
homem neste estado o juiz e executor da lei da natureza, sendo os homens 
parciais para consigo [...] a negligência e indiferença os tornam por demais 
descuidados nos casos de terceiros (LOCKE, 1973, p. 88).
3 
O acordo feito entre os homens deve ter como base o consentimento dos 
indivíduos, e não com a submissão, como defendia Hobbes. Ainda, para efeito de 
comparação, enquanto para Hobbes o poder concedido ao soberano é absoluto e 
indivisível, para Locke o poder Legislativo é o mais importante dos poderes, ao quais 
outros devem ser subordinados. Tal perspectiva de poder abre espaço para aquilo 
que ficaria conhecido como direito de insurreição, ou seja, a possibilidade dos que 
são governados, retirando seu consentimento, destituírem os governantes do 
exercício do poder. 
2.1.2 - O PÚBLICO, O PRIVADO, O EXERCÍCIO DA CIDADANIA E A 
PROPRIEDADE 
Distinguindo o público do privado, Locke permanece fiel a suas tendências 
antiabsolutistas, pois se mostra contrário à transmissão do governo por 
heditariedade, bem como à ingerência do Estado no contexto da vida do cidadão, 
principalmente no tocante à propriedade privada. Assim, permite a constituição de 
um corpo político unitário voltado para o bem comum e o livre exercício da cidadania 
por parte dos cidadãos. Plenamente cidadão, é aquele que tem acesso à 
propriedade privada, ou seja, é aquele que pelo concurso de suas mãos e de seu 
suor incorporou seu trabalho à terra, dádiva de Deus. A propriedade privada, é 
portanto, um direito natural que o ser humano, por meio de seu trabalho, efetiva, 
sendo perfeitamente natural que cada um se empenhe, tanto quanto possível, em 
apropriar-se de bens. Nesse contexto, os homens diferenciam-se e qualificam-se 
pela posse desigual de bens, e são tanto mais racionais e aptos quanto maior forem 
suas posses. 
Uma vez que para Locke, como já vimos, já no estado de natureza o 
procedimento racional equivale ao procedimento dos que possuem 
propriedade, todos os que não possuem propriedade também são pouco 
racionais. O trabalhador assalariado e o pobre dependente da assistência 
social não pensam muito; e vivem com poucos recursos. Para Locke isso é 
conseqüência da conformação natural e inalterável das coisas neste mundo. 
Além disso, a pobreza era considerada, na época de Locke, sinal de 
corrupção moral ou conduta irracional. (apud HELFERICH, 2006, p. 189 – 
190). 
2.1.3 - IMPORTÂNCIA E INFLUÊNCIA DE SEU PENSAMENTO
4 
Locke estava interessado nos grandes temas da filosofia tradicional: o sujeito, 
o mundo, Deus, e principalmente, o conhecimento e a política. Foi contemporâneo 
de Hobbes, mas, ao contrário dele, era liberal e tinha convicções parlamentaristas. 
Sua obra foi decisiva para a formação das democracias liberais do ocidente. No 
século XVIII, os iluministas franceses encontravam em seu legado elementos 
antiabsolutistas que se refletiram na Revolução Francesa. O Barão de Montesquieu 
(1689 – 1775) encontrou em Locke a inspiração necessária para formular a teoria 
dos três poderes, Decisiva e marcante influência pode ser encontrada na declaração 
da independência dos EUA, 1776.

Weitere ähnliche Inhalte

Was ist angesagt?

Contrato social – wikipédia, a enciclopédia livre
Contrato social – wikipédia, a enciclopédia livreContrato social – wikipédia, a enciclopédia livre
Contrato social – wikipédia, a enciclopédia livreAdilsonivp
 
Contrato social locke
Contrato social   lockeContrato social   locke
Contrato social locke2013gmail
 
Aulla iv john locke 15042014
Aulla iv   john locke 15042014Aulla iv   john locke 15042014
Aulla iv john locke 15042014Bruno Uchôas
 
Movimento de Codificação
Movimento de Codificação Movimento de Codificação
Movimento de Codificação Ivan Furmann
 
1 aulas escola jurdica modif
1 aulas escola jurdica modif1 aulas escola jurdica modif
1 aulas escola jurdica modifMarta Esperanca
 
Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)
Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)
Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)TamelaG
 
Estudo Teoria Geral do Estado e Ciência Política
Estudo Teoria Geral do Estado e Ciência PolíticaEstudo Teoria Geral do Estado e Ciência Política
Estudo Teoria Geral do Estado e Ciência PolíticaPaula Pontes de Campos
 
Locke, Liberdade, Igualdade e Propriedade
Locke, Liberdade, Igualdade e PropriedadeLocke, Liberdade, Igualdade e Propriedade
Locke, Liberdade, Igualdade e Propriedadeerp_ufabc
 
Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Carlagi Gi
 
Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...
Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...
Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...Leandro Santos da Silva
 
Constitucionalismo
ConstitucionalismoConstitucionalismo
ConstitucionalismoDebora Rocha
 

Was ist angesagt? (19)

Contrato social – wikipédia, a enciclopédia livre
Contrato social – wikipédia, a enciclopédia livreContrato social – wikipédia, a enciclopédia livre
Contrato social – wikipédia, a enciclopédia livre
 
Apresentação John Locke
Apresentação John LockeApresentação John Locke
Apresentação John Locke
 
Ciência política [1o gq] Locke, Montesquieu & Rousseau
Ciência política [1o gq] Locke, Montesquieu & RousseauCiência política [1o gq] Locke, Montesquieu & Rousseau
Ciência política [1o gq] Locke, Montesquieu & Rousseau
 
John locke iluminismo
John locke   iluminismoJohn locke   iluminismo
John locke iluminismo
 
John locke
John lockeJohn locke
John locke
 
Contrato social locke
Contrato social   lockeContrato social   locke
Contrato social locke
 
Aulla iv john locke 15042014
Aulla iv   john locke 15042014Aulla iv   john locke 15042014
Aulla iv john locke 15042014
 
Movimento de Codificação
Movimento de Codificação Movimento de Codificação
Movimento de Codificação
 
John Locke
John LockeJohn Locke
John Locke
 
1 aulas escola jurdica modif
1 aulas escola jurdica modif1 aulas escola jurdica modif
1 aulas escola jurdica modif
 
Contratualismo e Hobbes
Contratualismo e HobbesContratualismo e Hobbes
Contratualismo e Hobbes
 
Slide locke
Slide lockeSlide locke
Slide locke
 
Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)
Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)
Apresentação slides i john locke teoria politica ii(1)
 
Estudo Teoria Geral do Estado e Ciência Política
Estudo Teoria Geral do Estado e Ciência PolíticaEstudo Teoria Geral do Estado e Ciência Política
Estudo Teoria Geral do Estado e Ciência Política
 
Locke, Liberdade, Igualdade e Propriedade
Locke, Liberdade, Igualdade e PropriedadeLocke, Liberdade, Igualdade e Propriedade
Locke, Liberdade, Igualdade e Propriedade
 
Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2
 
Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...
Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...
Aula 02 -_os_direitos_fundamentais_e_sua_evolução_-_fo ntes_e_antecedentes_do...
 
Constitucionalismo
ConstitucionalismoConstitucionalismo
Constitucionalismo
 
Unidade 4
Unidade 4Unidade 4
Unidade 4
 

Ähnlich wie John lockeEstado Liberal

Os contratualistas: Hobbes e Locke
Os contratualistas: Hobbes e LockeOs contratualistas: Hobbes e Locke
Os contratualistas: Hobbes e LockeRogerio Terra
 
Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Carlagi Gi
 
Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Carlagi Gi
 
Formação do estado moderno terceiro ano
Formação do estado moderno terceiro anoFormação do estado moderno terceiro ano
Formação do estado moderno terceiro anoAdriano Capilupe
 
Ciência política - John Lock
Ciência política - John LockCiência política - John Lock
Ciência política - John Lockunisocionautas
 
Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3Allan Jacks
 
trab filosofia
trab filosofiatrab filosofia
trab filosofiakpinha
 
Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3Allan Jacks
 
Os contratualistas
Os contratualistasOs contratualistas
Os contratualistasConrado_p_m
 
Os contratualistas
Os contratualistasOs contratualistas
Os contratualistasConrado_p_m
 
4 - Contratualistas (1).pptx
4 - Contratualistas (1).pptx4 - Contratualistas (1).pptx
4 - Contratualistas (1).pptxMarcilon De Souza
 
Positivismo Jurídico - Norberto Bobbio
Positivismo Jurídico - Norberto BobbioPositivismo Jurídico - Norberto Bobbio
Positivismo Jurídico - Norberto BobbioLeonardo Canaan
 
Filosofia para-o-enem-8ª-semana
Filosofia para-o-enem-8ª-semanaFilosofia para-o-enem-8ª-semana
Filosofia para-o-enem-8ª-semanabrunojmrezende
 

Ähnlich wie John lockeEstado Liberal (20)

Apresentação de jhon locke (2)
Apresentação de jhon locke (2)Apresentação de jhon locke (2)
Apresentação de jhon locke (2)
 
Hobbes, Locke e Rousseau.pptx
Hobbes, Locke e Rousseau.pptxHobbes, Locke e Rousseau.pptx
Hobbes, Locke e Rousseau.pptx
 
11. Locke - Política.ppt
11. Locke - Política.ppt11. Locke - Política.ppt
11. Locke - Política.ppt
 
Os contratualistas: Hobbes e Locke
Os contratualistas: Hobbes e LockeOs contratualistas: Hobbes e Locke
Os contratualistas: Hobbes e Locke
 
Contratualistas.pptx
Contratualistas.pptxContratualistas.pptx
Contratualistas.pptx
 
Locke
LockeLocke
Locke
 
Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2
 
Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2Teoria Geral do Estado - Aula 2
Teoria Geral do Estado - Aula 2
 
Formação do estado moderno terceiro ano
Formação do estado moderno terceiro anoFormação do estado moderno terceiro ano
Formação do estado moderno terceiro ano
 
Nicolau Maquiavel
Nicolau MaquiavelNicolau Maquiavel
Nicolau Maquiavel
 
Ciência política - John Lock
Ciência política - John LockCiência política - John Lock
Ciência política - John Lock
 
Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3
 
trab filosofia
trab filosofiatrab filosofia
trab filosofia
 
Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3Jusnaturalismo 3
Jusnaturalismo 3
 
Os contratualistas
Os contratualistasOs contratualistas
Os contratualistas
 
Os contratualistas
Os contratualistasOs contratualistas
Os contratualistas
 
4 - Contratualistas (1).pptx
4 - Contratualistas (1).pptx4 - Contratualistas (1).pptx
4 - Contratualistas (1).pptx
 
Positivismo Jurídico - Norberto Bobbio
Positivismo Jurídico - Norberto BobbioPositivismo Jurídico - Norberto Bobbio
Positivismo Jurídico - Norberto Bobbio
 
Rousseau, Do Contrato Social
Rousseau, Do Contrato SocialRousseau, Do Contrato Social
Rousseau, Do Contrato Social
 
Filosofia para-o-enem-8ª-semana
Filosofia para-o-enem-8ª-semanaFilosofia para-o-enem-8ª-semana
Filosofia para-o-enem-8ª-semana
 

Mehr von Matheus Felipe

Mehr von Matheus Felipe (10)

Bioetica
BioeticaBioetica
Bioetica
 
Eutanasia
EutanasiaEutanasia
Eutanasia
 
Poriferos
Poriferos Poriferos
Poriferos
 
Montesquieu
Montesquieu  Montesquieu
Montesquieu
 
Jean jacques rousseau
Jean jacques rousseauJean jacques rousseau
Jean jacques rousseau
 
Botanica
Botanica Botanica
Botanica
 
Nietzsche e a transmutacao de valores
Nietzsche e a transmutacao de valoresNietzsche e a transmutacao de valores
Nietzsche e a transmutacao de valores
 
A filosofia moral de Immanuel Kant
A filosofia moral de Immanuel KantA filosofia moral de Immanuel Kant
A filosofia moral de Immanuel Kant
 
Aquino e Agostinho
Aquino e Agostinho Aquino e Agostinho
Aquino e Agostinho
 
Biologia
BiologiaBiologia
Biologia
 

John lockeEstado Liberal

  • 1. 1 2. JOHN LOCKE E O ESTADO LIBERAL John Locke ocupou-se ativamente dos assuntos políticos de seu país. Defensor radical do liberalismo político foi obrigado a refugiar-se na Holanda durante o período que compreende a fase final da restauração da Monarquia Absoluta dos Stuart e a Revolução Gloriosa (de 1683 a 1689). Da Holanda, contribuiu ativamente para a elaboração das bases teóricas da monarquia parlamentar inglesa, da qual era incondicional defensor. Além disso, ficou responsável pelos preparativos do envio de Guilherme de Orange e sua esposa Mary Stuart para a Inglaterra. Voltou em 1689 para sua terra natal (no mesmo navio em que viajava o casal real) e recebeu todas as honras que lhe era dividida, pela elaboração do Primeiro e do Segundo Tratado sobre o Governo, suas grandes obras políticas. Era a grande preocupação, mas também o contentamento de Locke com o curso que as coisas tomavam em seu país de origem. Vejamos o que ele diz no prefácio de uma de suas obras: A obra deve contribuir para consolidar o trono de nosso grande salvador, o atual rei Guilherme, demonstrar a legitimidade de sua aspiração ao consentimento do povo [...] e justificar o povo inglês diante do mundo, cujo amor aos seus direitos e justos e naturais, ligado à determinação de preservá-los, salvou a nação quando esta se encontra à beira da ruína e da escravidão. (apud HELFERICH, 2006, p. 187). 2.1 - O ESTADO DE NATUREZA OU PRÉ-CIVIL Para o pensador inglês, o ser humano, em seu estado pré-civil, encontra-se sob o conjunto das leis da natureza que, se seguidas, podem garantir uma condição de relativa paz e cooperação mútua. Em seu estado natural, o homem tem direitos naturais inalienáveis, irrenunciáveis e irrevogáveis, dentre os quais estão: a vida, a liberdade, o próprio corpo, mas principalmente a propriedade privada de bens. Locke via no conjunto dos direitos naturais a estrutura fundamental da lei da natureza regulamentadora do estado de natureza. Em outras palavras, no estado pré-civil, os homens livres e iguais viviam sem governo, pautando-se somente por uma lei natural segundo a qual, agindo de maneira estritamente racional, ninguém deve infligir danos ou prejuízo à vida, à liberdade, ao corpo e à propriedade de outrem.
  • 2. 2 No entanto, as pessoas nem sempre observam os preceitos de tal lei, pois, no estado de natureza, todos os seres humanos são juízes em causa própria e, agindo de maneira irracional, podem dar início a um estado de instabilidade e disputa extremamente complicado, pois não haveria instituição capaz de restaurar e fazer prevalecer o direito da razão, ou seja, o conjunto de direitos que o ser humano possui por natureza. 2.1.1 - O CONTRATO SOCIAL E A CONSTITUIÇÃO DO ESTADO CIVIL Como podemos ver, somente o estado de natureza não é suficiente para a existência do ser humano, pois se trata de um estado para seres racionais, em outras palavras, para pessoas cuja conduta fosse pautada pelo conjunto de leis naturais, mas como os homens nem sempre agem de maneira racional, faz-se necessária a constituição de uma instância independente, que possa, de maneira isenta, resolver as pendências entre os homens. Assim, John Locke, destacando a origem democrática do poder político, defende que a elaboração de um contrato social não tem outra razão senão a necessidade de garantir, a partir de um pacto entre os indivíduos, a manutenção dos direitos naturais, especialmente o desfrute da propriedade. A partir do que foi visto até aqui, entendemos o estado civil como o estado que sucede o estado de natureza, constituído para fundar as estruturas básicas do convívio social sob a influência e fiscalização de uma autoridade legitimamente constituída para tanto. Então, o estado civil é a garantia de uma convivência racional entre os indivíduos. O objetivo grande e principal, portanto, da união dos homens em comunidades, colocando-se eles sob um governo, é a preservação da propriedade privada, para esse objetivo muitas condições faltam no estado de natureza: Primeiro, falta uma lei firmada, conhecida, recebida e aceita mediante consentimento comum, como padrão de justo e do injusto e medida comum para resolver quaisquer controvérsias entre os homens; porque embora a lei da natureza seja evidente e inteligível para todas as criaturas racionais, os homens desviados pelos interesses [...] não são capazes de reconhece-las como lê que os obrigue nos casos particulares. Em segundo lugar, falta um juiz desconhecido e indiferente com autoridade para resolver quaisquer dissensões, de acordo com a lei estabelecida; porque sendo cada homem neste estado o juiz e executor da lei da natureza, sendo os homens parciais para consigo [...] a negligência e indiferença os tornam por demais descuidados nos casos de terceiros (LOCKE, 1973, p. 88).
  • 3. 3 O acordo feito entre os homens deve ter como base o consentimento dos indivíduos, e não com a submissão, como defendia Hobbes. Ainda, para efeito de comparação, enquanto para Hobbes o poder concedido ao soberano é absoluto e indivisível, para Locke o poder Legislativo é o mais importante dos poderes, ao quais outros devem ser subordinados. Tal perspectiva de poder abre espaço para aquilo que ficaria conhecido como direito de insurreição, ou seja, a possibilidade dos que são governados, retirando seu consentimento, destituírem os governantes do exercício do poder. 2.1.2 - O PÚBLICO, O PRIVADO, O EXERCÍCIO DA CIDADANIA E A PROPRIEDADE Distinguindo o público do privado, Locke permanece fiel a suas tendências antiabsolutistas, pois se mostra contrário à transmissão do governo por heditariedade, bem como à ingerência do Estado no contexto da vida do cidadão, principalmente no tocante à propriedade privada. Assim, permite a constituição de um corpo político unitário voltado para o bem comum e o livre exercício da cidadania por parte dos cidadãos. Plenamente cidadão, é aquele que tem acesso à propriedade privada, ou seja, é aquele que pelo concurso de suas mãos e de seu suor incorporou seu trabalho à terra, dádiva de Deus. A propriedade privada, é portanto, um direito natural que o ser humano, por meio de seu trabalho, efetiva, sendo perfeitamente natural que cada um se empenhe, tanto quanto possível, em apropriar-se de bens. Nesse contexto, os homens diferenciam-se e qualificam-se pela posse desigual de bens, e são tanto mais racionais e aptos quanto maior forem suas posses. Uma vez que para Locke, como já vimos, já no estado de natureza o procedimento racional equivale ao procedimento dos que possuem propriedade, todos os que não possuem propriedade também são pouco racionais. O trabalhador assalariado e o pobre dependente da assistência social não pensam muito; e vivem com poucos recursos. Para Locke isso é conseqüência da conformação natural e inalterável das coisas neste mundo. Além disso, a pobreza era considerada, na época de Locke, sinal de corrupção moral ou conduta irracional. (apud HELFERICH, 2006, p. 189 – 190). 2.1.3 - IMPORTÂNCIA E INFLUÊNCIA DE SEU PENSAMENTO
  • 4. 4 Locke estava interessado nos grandes temas da filosofia tradicional: o sujeito, o mundo, Deus, e principalmente, o conhecimento e a política. Foi contemporâneo de Hobbes, mas, ao contrário dele, era liberal e tinha convicções parlamentaristas. Sua obra foi decisiva para a formação das democracias liberais do ocidente. No século XVIII, os iluministas franceses encontravam em seu legado elementos antiabsolutistas que se refletiram na Revolução Francesa. O Barão de Montesquieu (1689 – 1775) encontrou em Locke a inspiração necessária para formular a teoria dos três poderes, Decisiva e marcante influência pode ser encontrada na declaração da independência dos EUA, 1776.