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Parque Farroupilha - Redenção
                             O parque na Imprensa

                             Por falar em calçadas
                      por QORPO
                          QORPO-SANTO/ Outubro de 1868

 Matéria e fotos publicadas na Zero Hora, de 26 de março de 2005, Caderno Cultura,
                                      Página 4



                                                     Que obra maravilhosa, que
                                                     riquíssimo passeio esboçaríamos
                                                     para que a Câmara Municipal1
                                                     mandasse edificar na Várzea2
                                                     desta cidade, se eu visse que
                                                     seus cofres regurgitavam de
                                                     ouro? Paredões com colunas,
                                                     jarros, figuras etc., à esquerda, à
                                                     direita, e no fim, formando assim
                                                     as ruas com tais frentes.
                                                     Árvores dentro plantadas,
                                                         ores
                                                     assentos, chafarizes, e tudo mais,
como jardins, etc., que pudesse encantar a vista, agradar o olfato, alegrar a
imajinação, e recrear o espírito.
Mas esta obra de tão jeral utilidade para os habitantes desta capital não pode, ao
meu ver, nem deve, em vista das necessidades urjentíssimas a que a Câmara tem de
atender - da praça da Independência3 para dentro -, ter começo, antes de decorridos
                                                     ,
estes mais próximos vinte anos.
Fique porém em memória todos que me lerem - que sou de opinião que um belo, um
magnífico passeio público naquela - é preferível à edificação que por tantas vezes se
tem tentado.
É preferível - porque não faltam, e até abundam terrenos não edificados dentro da
cidade, que mais que muito convém edificar para aformoseamento, e beleza desta. É
                                                   aformoseamento,
preferível em bem da salubridade de todos, recreio, etc.
Penso haver lembrado à Câmara desta capital - tudo quanto feito, começado, ou
providenciado a respeito - muito pode concorrer para utilidade jeral e encher de glória
seus Vereadores, cobertos de bênçãos pelos comunícipes; e por isso não sei se terei
        readores,
mais ocaziões de lembrá-la mais algum benefício público, mais algum modo de
                          la
distinguir-se por seus importantíssimos serviços de todos quantos se hão sentado nos
           se
bancos que tão dignamente ocupam.
                    namente
Creio haver cumprido o meu dever - sem haver faltado para com a Câmara, nem
mesmo à menor regra de civilidade; não me haver servido de termo algum qe a
possa ofender; se porém muito contra a minha vontade - tal houve - peço-lhe disso
desculpa, certo de não
espontaneidade de minha
intenção!
Notas
1. A Câmara Municipal era o
órgão administrativo da cidade,
durante o Império.
2. Grande área alagadiça, onde hoje está o parque Farroupilha.
3. Na área da atual Praça Argentina, mas mais extensa.
Sobre o autor
Para um maluco como Qorpo-Santo, nada melhor que um pequeno texto seu sobre
um sonho, quase um delírio para a época: transformar a Várzea em um passeio
público. Um texto especulativo, elaborado quem sabe em um transe de projetos para
embelezar a cidade. (Foram mantidas as singularidades de sua escrita, como o "j" em
lugar do "g" de mesmo som, os travessões de mera ênfase, os saborosos "etc.", até
as oscilações entre "que" e "qe", esta última a forma que postulava como correta,
numa reforma ortográfica que ele defendeu bastante.) Texto especulativo como
poucos na época, e já cheio de autocrítica, porque logo se censura e joga para duas
décadas depois a hipótese de gastar dinheiro público com tal desejo. De todo modo,
vale anotar que ele apresenta, em sua maluquice, um argumento bem razoável: pelo
que dá a entender, já havia tentativas de urbanizar a Várzea, construir nela, coisa
que Qorpo-Santo considera equivocada por haver terrenos "dentro da cidade", quer
dizer, da linha que hoje é a Duque de Caxias em direção à Alfândega e ao Gasômetro,
o que hoje se chama de Centro. Para felicidade nossa, seu desejo se cumpriu: de fato
aqueles campos encharcados viraram o parque da Redenção, que oficialmente se
chama parque Farroupilha, nome este que, além de marcar a nossa velha obstinação
em voltar ao lugar do crime histórico, a Guerra dos Farrapos, simboliza o tardio
momento em que se cumpriu a vontade do infeliz dramaturgo. Porque foi apenas em
1935, quando se organizou uma enorme exposição comemorativa ao centenário do
começo daquela guerra, que o charco deixou definitivamente de existir, em seu lugar
entrando um parque público que é nosso orgulho, prazer de nosso olfato e agrado de
nossa vista. Exatamente como ele queria. Qorpo-Santo nasceu José Joaquim de
Campos Leão, na cidade de Triunfo, em 1829, viveu uma atormentada existência por
algumas cidades do Rio Grande do Sul, fixando-se em Porto Alegre, onde faleceu, em
1883. Solitário ao ponto da incomunicação e acuado por um processo judicial movido
por sua esposa, foi interditado judicialmente, mas conseguiu fazer publicar textos
novos e republicar outros antigos a partir de 1877, num emaranhado composto por
peças de teatro de grande (às vezes descontrolada) criatividade, palpites sobre todas
as coisas, reflexões sobre educação (ele foi professor), poesias, muitas lembranças de
sua sofrida vida e muita coisa mais, conjunto a que ele deu o nome de Ensiqlopédia
ou Seus Meses de uma Enfermidade.

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Parque Farroupilha - Redenção: O sonho de Qorpo-Santo de transformar a Várzea em passeio público

  • 1. Parque Farroupilha - Redenção O parque na Imprensa Por falar em calçadas por QORPO QORPO-SANTO/ Outubro de 1868 Matéria e fotos publicadas na Zero Hora, de 26 de março de 2005, Caderno Cultura, Página 4 Que obra maravilhosa, que riquíssimo passeio esboçaríamos para que a Câmara Municipal1 mandasse edificar na Várzea2 desta cidade, se eu visse que seus cofres regurgitavam de ouro? Paredões com colunas, jarros, figuras etc., à esquerda, à direita, e no fim, formando assim as ruas com tais frentes. Árvores dentro plantadas, ores assentos, chafarizes, e tudo mais, como jardins, etc., que pudesse encantar a vista, agradar o olfato, alegrar a imajinação, e recrear o espírito. Mas esta obra de tão jeral utilidade para os habitantes desta capital não pode, ao meu ver, nem deve, em vista das necessidades urjentíssimas a que a Câmara tem de atender - da praça da Independência3 para dentro -, ter começo, antes de decorridos , estes mais próximos vinte anos. Fique porém em memória todos que me lerem - que sou de opinião que um belo, um magnífico passeio público naquela - é preferível à edificação que por tantas vezes se tem tentado. É preferível - porque não faltam, e até abundam terrenos não edificados dentro da cidade, que mais que muito convém edificar para aformoseamento, e beleza desta. É aformoseamento, preferível em bem da salubridade de todos, recreio, etc. Penso haver lembrado à Câmara desta capital - tudo quanto feito, começado, ou providenciado a respeito - muito pode concorrer para utilidade jeral e encher de glória seus Vereadores, cobertos de bênçãos pelos comunícipes; e por isso não sei se terei readores, mais ocaziões de lembrá-la mais algum benefício público, mais algum modo de la distinguir-se por seus importantíssimos serviços de todos quantos se hão sentado nos se bancos que tão dignamente ocupam. namente Creio haver cumprido o meu dever - sem haver faltado para com a Câmara, nem mesmo à menor regra de civilidade; não me haver servido de termo algum qe a possa ofender; se porém muito contra a minha vontade - tal houve - peço-lhe disso desculpa, certo de não espontaneidade de minha intenção! Notas 1. A Câmara Municipal era o órgão administrativo da cidade, durante o Império.
  • 2. 2. Grande área alagadiça, onde hoje está o parque Farroupilha. 3. Na área da atual Praça Argentina, mas mais extensa. Sobre o autor Para um maluco como Qorpo-Santo, nada melhor que um pequeno texto seu sobre um sonho, quase um delírio para a época: transformar a Várzea em um passeio público. Um texto especulativo, elaborado quem sabe em um transe de projetos para embelezar a cidade. (Foram mantidas as singularidades de sua escrita, como o "j" em lugar do "g" de mesmo som, os travessões de mera ênfase, os saborosos "etc.", até as oscilações entre "que" e "qe", esta última a forma que postulava como correta, numa reforma ortográfica que ele defendeu bastante.) Texto especulativo como poucos na época, e já cheio de autocrítica, porque logo se censura e joga para duas décadas depois a hipótese de gastar dinheiro público com tal desejo. De todo modo, vale anotar que ele apresenta, em sua maluquice, um argumento bem razoável: pelo que dá a entender, já havia tentativas de urbanizar a Várzea, construir nela, coisa que Qorpo-Santo considera equivocada por haver terrenos "dentro da cidade", quer dizer, da linha que hoje é a Duque de Caxias em direção à Alfândega e ao Gasômetro, o que hoje se chama de Centro. Para felicidade nossa, seu desejo se cumpriu: de fato aqueles campos encharcados viraram o parque da Redenção, que oficialmente se chama parque Farroupilha, nome este que, além de marcar a nossa velha obstinação em voltar ao lugar do crime histórico, a Guerra dos Farrapos, simboliza o tardio momento em que se cumpriu a vontade do infeliz dramaturgo. Porque foi apenas em 1935, quando se organizou uma enorme exposição comemorativa ao centenário do começo daquela guerra, que o charco deixou definitivamente de existir, em seu lugar entrando um parque público que é nosso orgulho, prazer de nosso olfato e agrado de nossa vista. Exatamente como ele queria. Qorpo-Santo nasceu José Joaquim de Campos Leão, na cidade de Triunfo, em 1829, viveu uma atormentada existência por algumas cidades do Rio Grande do Sul, fixando-se em Porto Alegre, onde faleceu, em 1883. Solitário ao ponto da incomunicação e acuado por um processo judicial movido por sua esposa, foi interditado judicialmente, mas conseguiu fazer publicar textos novos e republicar outros antigos a partir de 1877, num emaranhado composto por peças de teatro de grande (às vezes descontrolada) criatividade, palpites sobre todas as coisas, reflexões sobre educação (ele foi professor), poesias, muitas lembranças de sua sofrida vida e muita coisa mais, conjunto a que ele deu o nome de Ensiqlopédia ou Seus Meses de uma Enfermidade.