1. Aula 1 – Linguagem, língua e variações linguísticas
O que é linguagem?
É uma habilidade universal e exclusiva que o homem possui de dar nome as coisas,
pessoas, sentimentos e pensamentos para exprimir suas ideias.
O homem adquiriu essa habilidade entre 500 mil e 100 mil a. C. Bem antes disso, há
milhares de anos, não possuíamos aparelho vocal suficiente para desenvolver a
linguagem. Por isso, nossa comunicação era estritamente não verbal muito parecida
com a dos demais animais, em especial o macaco. Comunicávamo-nos por gestos,
expressões faciais e vocalizações sem sentido. Imperava uma comunicação muito
subjetiva e havia dificuldade para a transmissão de conhecimentos.
A invenção da linguagem acabou com esse problema, dando objetividade à
comunicação humana. O homem pode transmitir melhor sua cultura.
A linguagem é um sistema formado por uma unidade lingüística, repleto de
significação, com o intuito de promover a comunicação entre os indivíduos de
uma comunidade, servido ainda como instrumento de representação do
mundo.
Em outras palavras, é o sistema de sinais que nos permite efetivar o ato da
comunicação.
Ela pode ser verbal, não verbal e sincrética.
O que é língua?
É a expressão localizada (geográfica) e cultural da linguagem; um sistema de
signos (código) que determinada região do mundo convencionou para se
comunicar.
Se observarmos cada local do planeta, verificaremos que a linguagem (essa
habilidade que todos os homens possuem) é colocada em prática de forma
diferente, pois cada país tem uma língua.
Portanto, podemos considerar a língua (ou idioma) como a aplicação
localizada da linguagem nos diferentes pontos do planeta.
O que é fala ?
É a expressão individual e concreta da língua; seu produto final.
Exemplo: embora todos os brasileiros utilizem a Língua Portuguesa como
código, o emprego do português é diferente de brasileiro a brasileiro.
2. Cada pessoa possui uma fala, um discurso diferente.
O que é Discurso ?
O discurso é uma exposição metódica sobre certo assunto, com o objetivo de influir no
raciocínio, nos sentimentos do ouvinte ou leitor.
Linguagem Oral e Linguagem escrita
Nosso código verbal, a Língua Portuguesa, se manifesta de duas formas: o
português falado e o português escrito.
A modalidade escrita surgiu inspirada na modalidade falada. A escrita tem sido
modificada ao longo dos anos em função de variações da fala.
Em funções dessas modificações, existem diferenças importantes entre as
línguas oral e escrita, que merecem ser destacadas. Ninguém fala como
escreve e vice-versa.
Linguagem Oral ( FALADA )
É livre, criativa e espontânea. Seu vocabulário é constantemente renovado.
Está sujeita a novas incorporações, como uma gíria ou um neologismo
(invenção de uma nova palavra);
Usa comumente onomatopéias e outros tipos de sons, que expressam emoções
e sentimentos;
Aceita frases feitas, clichês e chavões (Ex: “A união faz a força”/ “O sexo
frágil...”)
Manifesta-se, naturalmente, com entonações, timbre, ênfase, pausas e
velocidade da enunciação;
Não está presa estritamente às regras gramaticais;
É mais econômica;
Permite a repetição de palavras;
Comporta frases inacabadas e anacolutos. Ex: "...a minha roupa, levo ela
sempre àquela lavanderia da esquina";
É elaborada no momento exato do pensamento e, portanto, sem muito rigor;
sem preciosismo na escolha dos termos;
Permite o contato direto entre o emissor e o receptor, possibilitando a
correção de desentendimentos; evita mais facilmente os ruídos;
3. Conta, normalmente, com recursos extralinguísticos como gestos, expressões
faciais e posturas, que permitem melhor comunicação de ideias e sentimentos;
- Marcada pela subjetividade.
Exemplos da língua falada:
- Tô preocupado com essa situação/ Tô grilado com essa situação.
- Vô sumi daqui correndinho, antes que ele veja a zona que fiz.
- Carlos, cê ta aí no quarto?
- Sorte com roupa branca? Tá brincando!
-Não me diga que... eu sabia que isso iria acontecer!
-Me dê esse copo que está na mesa.
Língua escrita
É conservadora. Não permite gírias e outras variações, pois deve se aproximar o
máximo possível do código (Língua Portuguesa), que é o que mantém a
unidade linguística de um povo;
Está presa às regras gramaticais estabelecidas no código e, em função disso,
costuma ser considerada a língua padrão para as atividades importantes em
sociedade;
Exige rigor na concordância verbal e nominal, na regência verbal e nominal, no
uso de pronomes etc;
É extensa e complexa, portanto, não é econômica;
É bem elaborada. O emissor tem tempo para escolher os signos e até
reescrever algo que não tenha gostado, antes de passar a idéia ao receptor;
Não estabelece contato direto com o receptor, o que pode gerar ruídos. Daí a
necessidade de contextualizar bem o receptor;
Exige clareza na redação, sem omissões e ambiguidades;
Tentam reproduzir, com imperfeição, os sons, a ênfase e as pausas da língua
falada por meio de sinais gráficos de pontuação, como o acento, as aspas ou a
reticências;
Não comporta orações incompletas. Toda ideia precisa ter início, meio e fim.
É marcada pela objetividade.
4. * Exemplos da língua escrita:
- Estou preocupada com essa situação
- Deixe-me ir embora rapidamente, antes que ele veja a desordem que fiz.
- Carlos, você está no quarto?
- Levo minha roupa sempre à lavanderia
-Não me diga que você perdeu o prazo de inscrição para o concurso! Eu sabia que isso
iria acontecer!
-Não acredito que a pessoa que veste roupa branca tem mais sorte.
INTERAÇÃO
- Apesar das diferenças, há uma interação entre as duas línguas, que admite graus
diferentes de influência de uma sobre a outra, sem afetar, é claro, os padrões
essenciais (convencionais) que caracterizam a Língua Portuguesa.
Variações Linguísticas
A Língua Portuguesa, como qualquer outra, configura-se como um conjunto de
variantes, que podem ser determinadas por períodos de tempo, espaços geográficos,
camadas sociais, áreas profissionais ou mesmo por situações específicas vividas pelo
indivíduo.
-Se compararmos o português falado e escrito em Portugal com o português falado e
escrito no Brasil, observaremos claramente essas variações, em função da distância e
do contexto vivido em cada um desses países. A palavra “camisola” em Portugal, por
exemplo, significa camisa (suéter), enquanto que no nosso português significa roupa
feminina para dormir.
- Mesmo o português utilizado em Manaus, Salvador ou em Porto Alegre apresenta
diferenças em relação ao utilizado na cidade de São Paulo. No Rio de Janeiro, o zíper
do paulistano é chamado de fechecler.
- O tipo de linguagem que utilizamos em casa, com nossos familiares, é diferente do
tipo de linguagem que usamos no trabalho. Um professor pode usar um tipo de
linguagem para uma turma de Publicidade, com termos específicos da área, e outro
tipo de linguagem para alunos do curso de Jornalismo.
- Essas variações linguísticas recebem nomes específicos.
* Diacrônica: é a variação linguística que ocorre entre períodos de tempo. Ex: o
português que se empregava no Brasil no século XVIII não é o mesmo que o utilizado
no século XXI. Ex: Vossa mercê > Você.
*Diatópica (dialeto): ocorre em espaços geográficos diversos. O dialeto, portanto, é
variedade regional de uma língua. ´´
OBS: quando as diferenças regionais não são tantas para constituírem um dialeto,
alguns autores as classificam como “regionalismo”. Dizem, por exemplo, que no
Brasil não há dialeto, mas regionalismos. Embora esses autores apontem diferenças
entre dialeto e regionalismo, vamos considerar esses termos como sendo a mesma
coisa.
5. * Diastrática (socioleto): variação que ocorre de uma camada social para outra.
Exemplo: o português empregado pelas pessoas que têm acesso à escola e aos meios
de instrução difere daquele empregado pelas pessoas privadas de escolaridade.
* Idioleto: variação linguística que se verifica quando um mesmo indivíduo adapta sua
linguagem à situação (mais ou menos formal) por ele vivida. Certamente um jornalista
não se comunica com sua mãe da mesma forma como se comunica com seus leitores
no jornal em que escreve.
Quando está com a sua família, ele vive uma situação menos formal, que possibilita o
uso de uma linguagem menos tensa, menos rigorosa até em termos de respeito às
regras gramaticais. Se com a sua mãe esse jornalista pode dizer despretensiosa e
espontaneamente a frase: “Deixa eu ver”. Com seus leitores ele jamais poderia
cometer essa transgressão gramatical. Neste último caso, ele diria: “Deixe-me ver”.
*Jargão: ocorre em áreas profissionais específicas. O jargão é uma expressão ou
palavra comum para um ou alguns grupos profissionais.
Por exemplo, para os advogados "peticionar" significa o que os leigos conhecem por
"entrar com a ação" ou "pedir para o juiz".
Na área de Marketing, “prospectar” pode significar entrar em contato com potenciais
clientes para investigar o possível interesse na compra de um produto ou para
investigar um mercado.
“Brifar” significa projetar ou levantar dados sobre um case.
Na área jornalística, “cruzar a informação” significa comparar a informação de uma
“fonte” (entrevistado) com a de outras.
Níveis de linguagem
Além dessas variações, tanto a língua oral como a escrita apresentam níveis de
linguagem, ou seja, formas de usar a língua, que variam conforme nos
aproximamos ou nos distanciamos das normas gramaticais impostas por nossa
Língua Portuguesa.
Segundo o linguista Dino Preti, podemos classificar em três os níveis de
linguagem: o nível culto (ou formal), o nível comum (ou familiar, também
chamado de coloquial) e o nível popular.
Nível culto (formal)
Faz uso da língua padrão, seguindo estritamente as normas gramaticais;
Preserva a unidade da Língua;
Desfruta de prestígio, sendo empregado por falantes altamente escolarizados;
pode acabar servindo de instrumento de discriminação;
Utilizado em situações formais;
Normalmente é usado pela Literatura e pelas Ciências;
É burocrático e conservador;
Vocabulário diversificado e rico;
É desprovido de espontaneidade; passa artificialidade;
6. Possui sintaxe complexa;
Não suporta gírias, clichês ou expressões vulgares;
Além da denotação, explora a conotação, com uma linguagem bem trabalhada,
longe do lugar comum.
Nível comum ( Familiar ou coloquial )
É intermediário entre o nível culto e o popular;
Foge às formalidades e ao preciosismo gramatical;
Usado nas conversas despretensiosas;
Utiliza vocabulário limitado;
Possui sintaxe simples;
Usa frases curtas;
Ocorrência de repetições.
O nível coloquial (ou comum, ou familiar) pode ter ainda duas variações:
Nível coloquial tenso (que mistura o nível culto com o comum): linguagem que
usa um vocabulário usual, mas respeita as regras gramaticais.
Nível coloquial distenso: neste, ao contrário, são admitidas pequenas
transgressões à gramática.
Nível Popular
-Variante informal;
-Tem pouco prestígio se comparado ao nível culto ou comum; - É espontâneo e
descontraído; - É rico em inventividade; - Seu objetivo é a comunicação da forma mais
clara possível; - Bastante subjetivo;
- Usado, muitas vezes, por pessoas de um mesmo grupo social, com baixa escolaridade
ou que são analfabetas; - As construções se afastam da normatividade gramatical; -
Simplificações sintáticas. Ex: “Pega ele pra mim”; - Ausência de rigor quanto às
concordâncias verbal e nominal;
-Uso de gíria, clichês, frases feitas e provérbios.
OBS: dentro do nível popular, a língua pode atingir um nível ainda mais informal
chamado de “vulgar”. Esse nível se caracteriza pelo uso excessivo da gíria, do calão
(termo chulo). Muitas vezes pode ser utilizada para manter um segredo social.
Exemplo: a linguagem dos traficantes.
IMPORTANTE
- Os níveis de linguagem devem ser empregados, conforme a situação em que o
indivíduo se encontra. Devemos, portanto, adequar o uso da linguagem à situação em
que estamos. - O poema “Pronominais”, de Oswald de Andrade, ironiza bem o uso da
língua, de acordo com o contexto vivido: “Dê-me um cigarro/ Diz a gramática/ Do
professor e do aluno/ E do mulato sabido/ Mas o bom negro e o bom branco/ Da
Nação Brasileira/ Dizem todos os dias/ Deixa disso camarada/ Me dá um cigarro”. - É
importante ainda destacar que, por mais interessantes e criativas que sejam as
invenções populares na língua falada, a incorporação destas à língua escrita deve ser
sempre cautelosamente analisada, sob pena de quebrarmos a unidade linguística de
nosso povo: esse sistema de normas chamado Língua Portuguesa.