[1] O trabalhador foi contratado como estagiário, mas exercia atividades como qualquer empregado, sem acompanhamento educacional adequado. Dessa forma, o contrato de estágio foi considerado nulo e o vínculo empregatício reconhecido desde o início.
[2] A empresa foi condenada a pagar diferenças salariais em relação a outros funcionários que exerciam a mesma função, com exceção do período de estágio no que se refere à participação nos lucros.
[3] A mera diferença de nomencl
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RECORRENTE: FIAT AUTOMÓVEIS S.A.
RECORRIDO: TOMAS MAGNO STOPA BOAVENTURA
EMENTA: CONTRATO DE ESTÁGIO. NULIDADE.
RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO. Para
a regularidade do contrato de estágio, é necessário o
atendimento aos requisitos previstos na Lei n. 11.788/08,
o que não restou demonstrado na hipótese dos autos.
Assim, em face do desvirtuamento do objetivo essencial
dessa modalidade de contrato, revela-se nulo o pacto de
estágio, impondo-se o reconhecimento do vínculo de
emprego.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de
recurso ordinário, interposto contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara do
Trabalho de Betim, em que figuram: como recorrente, FIAT AUTOMÓVEIS S.A.;
como recorrido, TOMAS MAGNO STOPA BOAVENTURA.
RELATÓRIO
O MM. Juiz da 2ª Vara do Trabalho de Betim, pela r.
sentença de f. 573/588, cujo relatório adoto, julgou parcialmente procedentes os
pedidos, para declarar a nulidade do contrato de estágio e, ato contínuo, reconhecer
o vínculo empregatício a partir de 11.12.2008 e condenar a reclamada a pagar ao
reclamante, no prazo legal, conforme se apurar em liquidação e nos termos da
fundamentação, as seguintes parcelas: 1. diferenças de parcelas rescisórias
consubstanciadas em 7/12 de 13º salário; 7/12 de férias + 1/3 e FGTS + 40% do
período; 2. PLR afeta ao período de estágio; 3. diferenças salariais a serem
computadas entre o paradigma de maior salário dentre os indicados, conforme
fichas financeiras carreadas aos autos, mês a mês, a partir do segundo mês da
contratação ora reconhecida, observadas as parcelas de caráter personalíssimo e
reflexos; 4. 30 minutos extras por dia de trabalho, sendo 15 minutos antes do início
da jornada e 15 minutos após a jornada, conforme frequências havidas nos cartões
de ponto, sendo que para o período de estágio considera-se a mesma sistemática e
a frequência de segunda a sexta-feira, conforme jornada fixada e reflexos; 5. 1h
extra em razão da inobservância do intervalo intrajornada, por três vezes na
semana, por todo o período ora reconhecido e reflexos; 6. adicional de
periculosidade, mês a mês, durante todo o contrato de trabalho reconhecido, à razão
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de 30% do seu salário base, conforme súmula 191/TST e reflexos; 7. indenização
pelo dano moral experimentado pelo autor no importe de R$5.000,00. Foi
determinado que: a) a reclamada proceda à anotação na CTPS do autor com data
de admissão em 11.12.2008 (ver doc. de fl. 245/246), com a função de laboratorista,
bem assim a real evolução salarial do reclamante, após o trânsito em julgado da
decisão, sob pena de multa diária de 1/30 do salário remontado do autor, limitada a
R$5.000,00; b) a observância dos adicionais constantes dos instrumentos
normativos ou, à sua falta, o adicional legal de 50% e os dias efetivamente
trabalhados; c) para o cálculo, a aplicação do divisor 220, observado o período de
incidência, as Súmulas 264 e 347 do TST, o art. 457 da CLT, a OJ 97 e a 394 da
SDI-I do TST a redução da hora noturna ficta e a evolução salarial do reclamante,
observando-se o salário recomposto, bem assim o adicional de periculosidade.
Embargos de declaração do reclamante às f. 589/590,
providos nos termos da decisão de f. 608/609.
Inconformada, a reclamada apresentou recurso ordinário
(f. 591/601), versando sobre os temas: contrato de estágio e vínculo de emprego;
horas extras; equiparação salarial; intervalo intrajornada; danos morais; minutos
residuais; adicional de periculosidade e participação nos lucros.
Comprovantes de realização do depósito recursal e de
recolhimento das custas às f. 602/603 e 606/607.
O reclamante apresentou contrarrazões às f. 617/628,
sustentando o desprovimento ao recurso da reclamada.
Tudo visto e examinado.
VOTO
ADMISSIBILIDADE
Conheço do recurso interposto, porque atendidos os
pressupostos de admissibilidade.
Conheço também das contrarrazões, apresentadas a
tempo por procurador regularmente constituído (f. 195).
MÉRITO
1. Contrato de Estágio - Nulidade
A reclamada não se conforma com a declaração de que o
vínculo de emprego firmado entre ela e o reclamante ocorreu em data anterior
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àquela anotada na CTPS, abrangendo o período em que o trabalhador atuou como
estagiário.
Examino.
A Lei n. 11.788/08, já vigente à época da contratação do
reclamante como estagiário, estabelece em seu artigo 1º que:
“Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de
trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam
frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação
profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino
fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos”.
O artigo 3º da referida Lei do Estágio prevê requisitos
para o estabelecimento de um contrato desta natureza, cuja inobservância acarreta
a formação do vínculo empregatício com a empresa concedente, senão vejamos.
Art. 3º. O estágio, tanto na hipótese do § 1o do art. 2o desta Lei quanto na prevista
no § 2o do mesmo dispositivo, não cria vínculo empregatício de qualquer natureza,
observados os seguintes requisitos:
I – matrícula e freqüência regular do educando em curso de educação superior, de
educação profissional, de ensino médio, da educação especial e nos anos finais do
ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos e
atestados pela instituição de ensino;
II – celebração de termo de compromisso entre o educando, a parte concedente do
estágio e a instituição de ensino;
III – compatibilidade entre as atividades desenvolvidas no estágio e aquelas
previstas no termo de compromisso.
§ 1o O estágio, como ato educativo escolar supervisionado, deverá ter
acompanhamento efetivo pelo professor orientador da instituição de ensino e por
supervisor da parte concedente, comprovado por vistos nos relatórios referidos no
inciso IV do caput do art. 7o desta Lei e por menção de aprovação final.
§ 2o O descumprimento de qualquer dos incisos deste artigo ou de qualquer
obrigação contida no termo de compromisso caracteriza vínculo de emprego do
educando com a parte concedente do estágio para todos os fins da legislação
trabalhista e previdenciária.
A teor do art. 9º, inciso VII, da Lei, é obrigação da
empresa que fornece ao estágio “enviar à instituição de ensino, com periodicidade mínima
de 6 (seis) meses, relatório de atividades, com vista obrigatória ao estagiário”.
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Na hipótese, assim como a MM. Juíza de primeiro grau,
entendo por não observados os mencionados requisitos legais.
Conforme se verifica do termo de compromisso de f. 35 e
245/246, o reclamante foi contratado pela reclamada como estagiário em 11/12/08,
figurando a Escola Politécnica de Minas Gerais – Polimig como Instituição de Ensino
concedente.
De acordo com o Relatório Semestral de Avaliação de f.
37, a funcionária Izabela Silva Figueiredo ficou responsável pela supervisão do
estágio do autor.
O reclamante trouxe aos autos a “Declaração de
Conclusão” de f. 39, pretendendo provar a alegação inicial de que, à época da
contratação, já havia concluído seu Curso Técnico de Química, no 2º Semestre do
ano letivo de 2008. Todavia, ao prestar depoimento pessoal, contradisse a prova
documental por ele produzida, ao afirmar que “se formou como técnico em química no
ano de dezembro/2008” (f. 570). Como não foi produzida outra prova acerca da
duração do curso do autor, prevalece o referido Termo de Compromisso quanto à
regular matrícula do reclamante em Instituição de Ensino durante o período em que
ele atuou como estagiário.
Mas, ainda assim, a relação mantida entre as partes não
obedeceu ao que estabelece a mencionada Lei, uma vez que o estágio realizado no
período de 11/12/08 a 22/07/09, ao invés de configurar o “ato educativo escolar
supervisionado” de que trata a lei, consistiu em verdadeira relação empregatícia,
desempenhando o autor atividades em igualdade com outros empregados da
reclamada.
O preposto ouvido em audiência afirmou que: “o
reclamante era laboratorista de um posto de analise específica, no caso, a pré-pintura; que o
reclamante era subordinado ao CPQ que era subordinado a Isabela; que esta não lhe dava
ordens, ficando em outra área, fora da area produtiva” (f. 570).
A primeira testemunha indicada pelo reclamante, Carlos
Rodrigues Satorno, disse que: “era CPQ (condutor de processo de qualidade), sendo o
superior do reclamante; que Isabela comparecia na área de trabalho uma vez por dia, por 1h;
que Isabela dava ordens diretas ao reclamante quando ele, depoente, não estava presente;
(...) que depois de dois meses de contratado como estagiário, o reclamante passou a
trabalhar como laboratorista, exercendo também as mesmas funções que o especializado” (f.
571).
O que se verifica é que o autor, logo após a admissão,
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passou a trabalhar como laboratorista da empresa ré, sendo certo que a supervisora
designada para orientá-lo acompanhou seu trabalho durante no máximo uma hora
por dia.
Na verdade, as funções desempenhadas pelo reclamante
em parte do período que foi estagiário foram as mesmas desenvolvidas na época
posterior à sua contratação como empregado. Tanto é que foram deferidas em
primeiro grau as diferenças salariais oriundas da equiparação salarial com outros
empregados da reclamada, abrangendo a condenação parte do tempo em que
vigorou o “pseudo” estágio - o que será mantido por esta decisão, conforme será
fundamentado no tópico seguinte.
O que ficou evidenciado é que a intenção da recorrente
não era aprimorar os conhecimentos teóricos dos estagiários, mas sim qualificá-los
para atuar como seus empregados, provavelmente ante a especificidade do serviço
que realiza.
Nesse contexto, tem-se por ilegítima a pactuação do
estágio, nos moldes verificados, tendo em vista que o contrato desta natureza possui
regulamentação e finalidade próprias, que, se não observadas, desvirtuam-no,
emergindo a relação de emprego.
Quanto à retificação da CTPS do trabalhador e ao
deferimento das diferenças de verbas rescisórias relativas ao período do estágio,
consiste em mera consequência do reconhecimento do vínculo.
Merece reforma a sentença somente quanto à PLR afeta
ao período, uma vez que o autor não juntou qualquer documento que prove a
instituição de tal parcela nessa época de vigência do pacto laboral.
Provejo, para absolver a reclamada do pagamento da
PLR afeta ao período do suposto estágio.
2. Equiparação salarial
Pretende a reclamada ser absolvida da condenação ao
pagamento de diferenças salariais decorrentes da equiparação salarial.
Assiste-lhe parcial razão.
Para a configuração da equiparação salarial, é necessário
que reclamante e paradigmas exerçam as mesmas funções, com igual produtividade
e perfeição técnica, e que a diferença de tempo no exercício da função seja inferior a
dois anos, incumbindo ao empregado a prova dos fatos constitutivos de seu direito
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e, ao empregador, dos fatos impeditivos, modificativos e extintivos da pretensão
equiparatória (art. 461 da CLT).
Esclareça-se, ainda, que a mera diferença de
nomenclatura do cargo ou função exercida por paradigma e paragonado, ou mesmo
do setor em que exerceram suas funções não impede a apreciação do pleito
equiparatório, uma vez que o que importa, aos olhos da lei, é a identidade ou
distinção entre os efetivos serviços prestados por cada um deles (Súmula 6, item III,
do TST).
O contrato de trabalho de f. 248/249 revela que, após ter
trabalhado como estagiário, o reclamante foi contratado para exercer o cargo de
“Laboratorista”, em 23/07/09.
As fichas de registro dos paradigmas Hudson da Silva
Rodrigues (f. 449/450), Leonardo Jordane (f. 484/485) e Danilo Eustáquio dos
Santos (f. 522/523), revelam que os dois primeiros ocuparam esse mesmo cargo até
01/02/10 e, o terceiro, até 01/09/09.
A identidade da nomenclatura dos cargos durante parte
do contrato de trabalho gera, por si só, uma presunção de identidade das funções
desempenhadas no período coincidente, sendo certo que a distinção do cargo a
partir de determinada época (quando os modelos foram promovidos para
“Laboratorista Especializado”) não elide o pleito equiparatório, se provado o
exercício das mesmas tarefas, conforme mencionado.
A MM. Juíza de primeira instância considerou “provada à
saciedade a identidade de funções, a partir do segundo mês de contratação até o final do
contrato de trabalho do autor”, tendo em vista as informações prestadas pelas
testemunhas ouvidas na audiência de instrução (f. 576/577; grifos acrescidos).
Veja-se que Carlos Rodrigues Satorno, testemunha
ouvida a rogo do trabalhador, respondeu que: “trabalhou na reclamada de março/1996 a
dezembro/2010, tendo trabalhado no mesmo setor do reclamante; que era CPQ (condutor de
processo de qualidade), sendo o superior do reclamante; (...) que depois de dois meses de
contratado como estagiário, o reclamante passou a trabalhar como laboratorista, exercendo
também as mesmas funções que o especializado; que na realidade não havia especializado
no exercício das funções, sendo que o reclamante muitas vezes chegava para render o
especializado no mesmo posto de trabalho; (...); que não havia diferença entre o serviço do
reclamante e paradigmas”(...) que já trabalhou com os paradigmas, com frequência; que
reclamante e paradigmas eram lotados no mesmo laboratório; que Danilo foi o primeiro
classificado como laboratorista especializado; (...); que os laboratoristas, inclusive os
especializados, faziam quaisquer atividades, sendo que inclusive, não havia posto fixo de
trabalho; que o especializado não tem mais experiência de laboratório” (f. 571; grifos
acrescidos).
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Por sua vez, a segunda testemunha do reclamante, Jose
Aricelio Pereira Duarte, disse que “trabalhou por empresa terceirizada na reclamada, de
agosto/09 a março/2010 no processo de pré-tratamento de pintura; que muitas vezes
trabalhou no mesmo do reclamante e dos paradigmas; (...) que os exames que o reclamante e
paradigma faziam eram os mesmos” (f. 571; grifos acrescidos).
O que se extrai dos depoimentos acima, de fato, é que as
funções desempenhadas pelo paradigma e pelo reclamante eram as mesmas desde
o período em que o autor atuava como “estagiário”, inexistindo a alegada distinção
de complexidade do trabalho realizado pelos modelos indicados na inicial e
tampouco a diferença de tempo no serviço superior a dois anos.
Evidenciada, pois, a identidade funcional, não há
qualquer óbice ao deferimento da equiparação salarial pretendida, tendo em vista
que a reclamada não provou a existência de qualquer fato impeditivo, modificativo
ou extintivo do direito do autor.
Todavia, a sentença enseja pequeno reparo quanto ao
período objeto da condenação, uma vez que, ao prestar depoimento pessoal, o
próprio reclamante admitiu que apenas “depois de três/quatro meses como estagiário
passou a exercer as mesmas funções que Hudson, Leonardo e Danilo ” (f. 570; grifos
acrescidos), sendo exatamente estes os paradigmas indicados na inicial, como
mencionado.
Impõe-se, portanto, a limitação do deferimento em
questão ao período posterior ao quinto mês do contrato.
Provejo, para determinar que as diferenças salariais
decorrentes da equiparação salarial deferidas no item 3 de f. 586/587 sejam
apuradas a partir do quinto mês da contratação reconhecida, ficando a reclamada
absolvida do respectivo pagamento no período compreendido entre a admissão e o
quarto mês do pacto laboral.
3. Horas extras. Turnos ininterruptos de revezamento.
Sustenta a reclamada que o reclamante não tem direito
ao recebimento, como extras, das horas laboradas após a sexta diária, ao
argumento de que inexistiu, no caso, o labor em turnos ininterruptos de
revezamento.
No aspecto, o recurso encontra-se sem objeto, uma vez
que a r. decisão de primeira instância indeferiu o pedido em questão, ao fundamento
de que “não há quaisquer direitos ao pagamento de jornada excedente da 6ª diária e seus
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consectários” (f. 578).
Nada a prover.
4. Intervalo intrajornada
Insurge-se a reclamada contra a condenação ao
pagamento de horas extras decorrentes da não concessão do intervalo intrajornada
de uma hora. Alega que, ao menos no período em que o autor foi estagiário, houve
confissão quanto ao gozo de uma hora de pausa para repouso e alimentação.
Assiste-lhe parcial razão.
Na inicial, o autor alegou que, em pelo menos três dias na
semana, durante todo o período do contrato (estágio e emprego), não podia se valer
da totalidade do intervalo intrajornada, “dadas as funções que lhe eram incumbidas” (f.
03).
Todavia, em depoimento pessoal, disse que “enquanto
estagiário não havia cartão de ponto, trabalhando de 8h às 15h20min/15h30min, de segunda
a sexta-feira, com intervalo de 1h” (f. 570; grifos acrescidos).
Portanto, a controvérsia quanto à ausência de fruição do
intervalo intrajornada ficou restrita ao período em que a reclamada contratou o autor
como empregado (23/07/09 em diante; f. 28), impondo-se excluir da condenação o
lapso temporal compreendido entre 11/12/08 e 22/07/09, relativo à contratação como
estagiário.
Por outro lado, a prova oral favoreceu o autor quanto ao
referido período controverso.
De acordo com a testemunha Carlos Rodrigues Satorno,
“muitas vezes o reclamante não tinha intervalo integral para refeição e descanso porque era
acionado ou tinha questões para resolver na linha” (f. 571).
No mesmo sentido, o depoimento da testemunha José
Aricelio Pereira Duarte: “que quase sempre não dava para cumprir 1h de intervalo por
causa do serviço, o mesmo ocorrendo com o reclamante” (f. 571).
O teor de tais depoimentos autoriza a manutenção da
sentença que condenou a recorrente ao pagamento de uma hora extra, por três
vezes na semana, em face da ausência do gozo integral do período intervalar,
ressaltando-se apenas, como já fundamentado, que o deferimento fica adstrito ao
período posterior a 23/07/09.
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Cabe registrar, no particular, que, uma vez concedido
tempo inferior ao legalmente exigido, torna-se devida uma hora extra, e não apenas
os minutos que faltam para completar uma hora, uma vez que o deferimento, como
extra, de parte do tempo destinado ao repouso não atingiria a finalidade do instituto.
Nesse sentido a O. J. nº 307 da SDI-I do TST.
E, ainda, segundo a exegese do § 4º do art. 71 da CLT, o
intervalo intrajornada, quando não concedido pelo empregador, deve ser
remunerado com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre a hora normal de trabalho. O
legislador, ao usar o vocábulo "remunerar", deixa claro que a natureza é salarial, e
não indenizatória, sendo devidos os reflexos legais e convencionais garantidos (O.J.
354/SDI-1/TST e Súmula nº 5 deste Tribunal).
Provejo, para absolver a reclamada do pagamento das
horas extras decorrentes da inobservância do intervalo intrajornada relativamente ao
período anterior a 23/07/09.
5. Dano moral
Insurge-se a reclamada contra a condenação ao
pagamento de indenização por assédio moral, arbitrada em R$5.000,00.
Sem razão.
É cediço que o valor social do trabalho constitui princípio
fundamental da República Federativa do Brasil e qualquer fato que conduza à
minoração da sua utilização para o ser humano, que implique frustração, angústia e
ansiedade deve ser combatido, pois tanto a higidez física, como a mental e
emocional do ser humano são bens fundamentais de sua vida, privada e pública, de
sua intimidade, de sua autoestima e afirmação social e, nesta medida, também de
sua honra (o artigo 1º, IV, da CF/88). São bens, portanto, inquestionavelmente
tutelados e, se agredidos em face de circunstâncias laborativas, passam a merecer
tutela ainda mais forte e específica da ordem constitucional.
Assim, o dano moral provocado pode se manifestar de
várias formas, inclusive por meio de uma conduta específica do agente agressor,
configurando-se o assédio moral, que possui determinadas peculiaridades que
constituem verdadeiros pressupostos à sua caracterização.
De acordo com Marie-France Hirigoyen, "o assédio moral
no trabalho é definido como qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento,
atitude...) que atente, por sua repetição, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física
de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho" (Assédio
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Moral: a violência perversa no cotidiano. São Paulo: Betrand Brasil, 2000).
Já no conceito do Prof. Messias Pereira Donato, o
assédio moral “constitui um processo – uma série de atos - de procedimento repetitivo,
movido por interesses os mais distintos, mas, de regra levado pelo intuito de obtenção de
favores da vítima ou de se livrar dela, por ato da própria demissão ou por adesão a programa
promocional de incentivo à demissão de iniciativa da empresa” (Curso de Direito Individual
do Trabalho, SP, LTr, 2008, p. 698).
Ou seja, constitui assédio moral o abuso do poder diretivo
do empregador que, extrapolando os limites do uso legal do poder empregatício,
expõe o trabalhador a situações humilhantes, repetitivas e prolongadas, durante a
jornada de trabalho e no exercício de suas funções.
Portanto, para se amparar a pretensão indenizatória pelo
assédio moral, além da presença dos elementos caracterizadores próprios: atitude
repetitiva e prolongada pelo agressor, intencional, visando desestabilizar a vítima e
objetivando afastá-la do ambiente de trabalho, mister se faz, também, a presença
dos requisitos essenciais à existência do dano moral, pois o assédio moral é uma
modalidade de dano moral que ocorre no ambiente de trabalho. Esses requisitos, de
acordo com o art. 186 do Código Civil, são: a conduta danosa do agente (culposa ou
dolosa), o dano (efetivo prejuízo para a vítima) e o nexo de causalidade entre a
conduta ilícita e o dano causado.
No presente caso, não ficou provado o tratamento
discriminatório direcionado especificamente ao autor para desestabilizá-lo, humilhá-
lo ou diminuí-lo, mas sim um tratamento grosseiro e inadequado da preposta da
reclamada, Izabela Silva Figueiredo, dispensado aos empregados de forma geral.
É o que revela o depoimento da testemunha Carlos
Rodrigues Satorno: “que Isabela comparecia na área de trabalho uma vez por dia, por 1h;
que Isabela dava ordens diretas ao reclamante quando ele, depoente, não estava presente;
que seu relacionamento com Isabela não era bom, tendo muita dificuldade, havendo gritos,
mudanças constantes de horários conforme necessidade dela, desacordo em análises com
cobranças aos gritos; que com o reclamante, a atitude de Isabela era a mesma; (...) que já viu
o reclamante ser admoestado por Isabela na presença de outras pessoas, algumas vezes;
que essas advertências eram acompanhadas de ameaças de desligamento; (...) que ajuizou
ação postulando indenização por danos morais em face de Isabela; que as admoestações de
Isabela se relacionavam apenas a questões profissionais” (f. 571).
No mesmo sentido, o depoimento de Jose Aricelio Pereira
Duarte: “que Isabela não tinha um "pingo" de educação para tratar com ninguém, sendo
muito ríspida; (...); que já presenciou Isabela conversar com o reclamante, de forma ríspida,
mas não se recorda do teor” (f. 571).
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Como se vê, apesar de não demonstrada a existência da
discriminação especificamente dirigida ao autor para afastá-lo do ambiente de
trabalho, tem-se por evidenciada a conduta desrespeitosa da empregada Izabela
com os empregados da reclamada, inclusive com relação ao reclamante.
Ora, o Judiciário não pode compactuar com o empregador
que permite que seus prepostos tratem seus subordinados da forma aqui
demonstrada, através de xingamentos e apelidos insultuosos, atingindo a dignidade
da pessoa e sua paz interior. A urbanidade deve imperar na convivência em
sociedade, especialmente nas relações de trabalho, onde o respeito e a boa fé das
partes são as bases para a fidúcia inerente a esse tipo de contrato. Tal conduta,
indubitavelmente, extrapola o exercício do poder diretivo e disciplinar inerente ao
empregador, em claro abuso de direito.
Tem-se, pois, por caracterizado o dano moral, de que
resulta o reconhecimento da culpa empresária pela conduta ilícita praticada por
preposto, tornando inequívoca a existência do dano, que sequer exige prova
concreta, por ser mera inferência da prática abusiva demonstrada.
Correta, portanto, a condenação ao pagamento de
indenização por dano moral, fixada em R$5.000,00, quantia que se mostra
proporcional ao dano sofrido, considerados os patamares adotados por essa Turma
no exame de casos semelhantes, sendo de se ressaltar que o importe arbitrado
cumpre a finalidade pedagógica e inibitória da reincidência do ilícito e se mostra
razoável para a reparação do dano sofrido.
Desprovejo.
6. Minutos residuais
A reclamada não se conforma com a sentença que a
condenou ao pagamento, como extras, de trinta minutos residuais por dia de
trabalho.
Assiste-lhe parcial razão.
Na inicial, o autor alegou que, no período compreendido
entre 23/07/09 até a data da dispensa, “iniciava seu efetivo labor com 15 (quinze) minutos
de antecedência, período este que não era lançado nos cartões de ponto, passando pois à
margem de qualquer remuneração” (f. 16). Ao formular o pedido, o trabalhador postulou
tão somente o recebimento desses 15 minutos anteriores ao começo da jornada
(letra “r”; f. 26).
Essa breve narrativa das alegações iniciais já permite
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concluir pela necessidade de reforma da sentença, que deferiu ao autor “ 30 minutos
extras por dia de trabalho, sendo 15 minutos antes do início da jornada e 15 minutos após a
jornada, conforme registros havidos nos cartões de ponto” (f. 579), ultrapassando,
portanto, os limites do pedido.
Quanto aos 15 minutos postulados e que foram objeto da
condenação, nada há a modificar, já que a prova oral demonstrou que, apesar de
este tempo ter sido gasto com atos preparatórios às atividades laborais, não era
computado na jornada registrada nos cartões.
Veja-se que, ao ser indagado a respeito, a testemunha
Carlos Rodrigues Satorno, afirmou que: “o reclamante trabalhava 15/20min antes e
depois da jornada, para se inteirar da situação do turno anterior e passar a do próprio turno,
fazer relatórios, adiantar análises”; (...) que não era permitido bater o ponto assim que
chegasse à empresa” (f. 571).
Provada, portanto, a existência dos 15 minutos residuais
antecedentes ao início da jornada, que, conforme mencionado pelo d. Juízo a quo,
eram destinados à realização de funções empreendidas em prol da reclamada,
impõe-se a condenação da recorrente ao pagamento deste tempo, como
extraordinário.
Provejo, para limitar a condenação em exame a 15
minutos extras por dia de trabalho, correspondentes ao tempo gasto no início da
jornada de trabalho, absolvendo a reclamada do pagamento dos outros 15 minutos
posteriores à jornada registrada, visto que não houve tal postulação.
7. Adicional de periculosidade
Pretende a reclamada ser absolvida do pagamento do
adicional de periculosidade.
Sem razão.
Para a apuração das condições de trabalho periculosas
alegadas na inicial, foi designada prova pericial, vindo o respectivo laudo às f.
419/428.
Após analisar as atividades desempenhadas pelo autor
como “Estagiário” e Laboratorista (descritas às f. 420/421), o perito chegou à
seguinte conclusão:
“Com base na inspeção realizada, nas informações recebidas, nas Normas
Regulamentadoras da Portaria nº 3.214, de 08/06/78, o Perito concluiu que foi
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caracterizado em condição de periculosidade o ingresso habitual do reclamante em
ambiente fechado de armazenamento de líquidos inflamáveis, conforme exposto no
item VII.4, no período entre 23/07/09 e 01/07/10, desde que confirmadas suas
declarações. Caso contrário, não foram caracterizados em condições de
periculosidade e insalubridade as atividades e ambientes de trabalho do reclamante”
(f. 427).
O ambiente fechado de armazenamento de líquidos
inflamáveis mencionado pelo perito, cujo ingresso habitual é ensejador da
periculosidade, consiste na “Central de Tintas” da reclamada, na qual o reclamante
declarou, ao acompanhar os trabalhos periciais, ter adentrado com frequência
estimada de “duas vezes por semana, por 30 minutos por vez, para levar documentos,
buscar filtros, separar corpos de prova, buscar material de montagem de banho das bonders,
contatos com Ceva, etc.” (f. 421).
A conclusão condicionada do expert teve por fundamento
o fato de o “Condutor de Processo de Qualidade” da reclamada, Edmar José de
Almeida - que também acompanhou a realização da perícia, ter negado a
mencionada informação do autor, sustentando que “os ingressos na Central de Tintas
são realizados pelos Condutores e não por Laboratorista” (f. 421).
Conforme pontuado no laudo, o “Perito não teve elementos
para dirimir a controvérsia” (f. 421), que, no entanto, foi elucidada pela prova oral
produzida no feito, senão vejamos.
De acordo com a testemunha Carlos Rodrigues Satorno,
de “duas a três vezes por semana o reclamante entrava na central de tintas para apanhar
material ou entregar algum relatório ou documento; que os funcionários que trabalhavam no
local não faziam esse serviço porque tinha suas próprias atividades; que como CPQ tinha o
acesso bastante livre ao local; que os laboratoristas pegavam esse material rotineiramente;
(...) que é necessário passar o cartão eletrônico para adentrar à central de tintas, o mesmo
que bate o ponto; que o reclamante não tinha o cartão de acesso à central, sendo que alguém
lhe liberava o acesso; que o acesso era dado aos CPQs, laboratoristas da central de tintas,
alguns fornecedores, alguns empregados da Comau; que não sabe por quanto tempo o
reclamante ficava dentro da central de tintas, mas em torno de 15/20min para pegar
material” (f. 571).
A outra testemunha ouvida nos autos, Jose Aricelio
Pereira Duarte, disse que “o reclamante entrava na central de tintas; que sabe dizer a
respeito porque ligou para localizá-lo e o mesmo dizia que estava no local; que outros
laboratoristas também entravam na central de tintas de vez em quando; (...) que já viu o
reclamante entrar na central de tintas” (f. 571).
O que se extrai do conjunto probatório é que, durante
duas vezes por semana, o reclamante adentrava na Central de Tintas da reclamada,
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lá permanecendo por cerca de 15 a 20 minutos, o que, a meu ver, caracteriza a
intermitência na prestação de serviço em local perigoso.
Diversamente do que entende a recorrente, o contato
acima mencionado não pode ser interpretado como tempo extremamente reduzido
ou eventual, pois, cada vez que o reclamante adentrava no ambiente fechado de
armazenamento de líquidos inflamáveis - denominado pela empresa de Central de
Tintas - expunha-se ao agente perigoso, sendo certo que eventual só pode ser
considerado aquele serviço fortuito, hipotético e imprevisível, o que não era o caso.
Fica afastada, em consequência, a aplicação da segunda parte da Súmula 364, item
I, que trata da eventualidade do contato com o agente periculoso.
Desprovejo.
ISTO POSTO, dou provimento parcial ao recurso da
reclamada, para absolvê-la do pagamento das seguintes parcelas: a) PLR afeta ao
período do suposto estágio; b) diferenças salariais decorrentes da equiparação
salarial atinentes ao período compreendido entre a admissão e o quarto mês do
contrato de trabalho reconhecido; c) horas extras decorrentes da inobservância do
intervalo intrajornada no período anterior a 23/07/09; d) 15 minutos extras por dia de
trabalho, relativamente ao tempo gasto após a jornada, mantendo a condenação
quanto os 15 minutos anteriores ao início da jornada.
FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,
O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela
sua Primeira Turma, preliminarmente, à unanimidade, conheceu do recurso; no
mérito, sem divergência, deu-lhe provimento parcial para absolver a reclamada do
pagamento das seguintes parcelas: a) PLR afeta ao período do suposto estágio; b)
diferenças salariais decorrentes da equiparação salarial atinentes ao período
compreendido entre a admissão e o quarto mês do contrato de trabalho
reconhecido; c) horas extras decorrentes da inobservância do intervalo intrajornada
no período anterior a 23/07/09; d) 15 minutos extras por dia de trabalho,
relativamente ao tempo gasto após a jornada, mantendo a condenação quanto os 15
minutos anteriores ao início da jornada. Reduziu o valor arbitrado à condenação em
primeira instância (R$35.000,00 trinta e cinco mil reais - f. 588) para R$25.000,00
(vinte e cinco mil reais), com custas correspondentes de R$500,00 (quinhentos
reais), autorizando a restituição do valor pago a mais a esse título, conforme
procedimento próprio a ser observado perante a Receita Federal do Brasil.
Belo Horizonte, 12 de dezembro de 2011.
15. PODER JUDICIÁRIO
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MARIA LAURA FRANCO LIMA DE FARIA
Desembargadora Relatora