Este documento apresenta o livro "O Evangelho Inclusivo e a Homossexualidade" escrito por Fernando Cardoso. O livro discute a possibilidade de ser homossexual e cristão ao mesmo tempo, analisando passagens bíblicas relevantes e apresentando outras interpretações teológicas sobre o tema. O autor compartilha sua experiência pessoal como homossexual e cristão e defende a ideia de que a igreja deve acolher todas as pessoas independente de sua orientação sexual.
3. A Bíblia não deve ser lida de forma literal, mas sim
levando-se em consideração o contexto histórico em que
foi escrita. Passagens bíblicas isoladas e fora de
contexto foram usadas para justificar o racismo e a
submissão das mulheres, assim como hoje são usadas
para atacar os homossexuais.
Mas todos somos iguais perante Deus,
e é possível ser gay e ser religioso.
Gene Robinson
Amar a Deus é estudarmos sua palavra com afinco;
É reconhecer a nossa perfeição ao sermos criados
à sua imagem e semelhança;
É ter fé na nossa própria existência,
enxergando o propósito da criação;
É nos aceitarmos sem questionamentos,
pois os planos divinos são misteriosos,
E não cabe a nós, ainda, a revelação.
Fernando Cardoso
Fevereiro, 2010.
4. Agradecimentos
Humildemente e com alegria quero expressar
minha gratidão a diversos teólogos cristãos aos quais
recorri para uma percepção mais profunda do
Evangelho da Graça aos homossexuais e dos
pressupostos antagônicos da condenação bíblica à
homossexualidade: Brennan Manning, Yvette Dube,
Gene Robinson, Robin Scroggs, Victor Paul Furnis,
John McNeill, William Countryman, John Boswell,
Norman Pittenger, David Payne, André Sidnei
Musskopf, Daniel A. Helminiak, Philip Yancey,
Desmond Tutu, Peter Gomes, Jimmy Creech, Mel
White, Brian Zachary Mayer, Leonardo Boff, Márcio
Retamero, Bruno Lima, Marcos Gladstone, Luis
Corrêa Lima, entre outros.
E, ainda, a diversos outros escritores e críticos
engajados no campo político-social da
homossexualidade, por suas contribuições em minhas
percepções, enquanto escritor estreante: Atila
Iamarino, Bruno Bimbi, Daniel G. Karslake,
Humberto Rodrigues, Luis Mott, Talissa Camara
Tinoco de Siqueira, Danuza da Silva Crespo Bastos,
Andrea Camperio Ciani, Bruce Bagemihl, Christopher
Bagley, Pierre Tremblay, Deco Ribeiro, Paula Caplan,
Ana Bock, entre outros.
5. Apesar de não ter tido apoio dos meus pais na
elaboração deste trabalho, contei com o incentivo de
alguns amigos mais próximos – cujo papel, foi
fundamental na concretização –, através do suporte
moral, análise crítica do conteúdo, revisão do texto e
artes. Mas, principalmente, ao Vinicius de Souza pela
dedicação constante, pela paciência, pelo
companheirismo na formulação das idéias deste
trabalho. Apesar dos vieses, foi grande a importância
da tua presença na conclusão desta obra. Dispenso,
pois, meu “obrigado” a você.
Contudo, minha dívida mais profunda, ainda
assim, é para com minha mãe, pelo amor dedicado não
apenas materno, mas também enquanto cristã. Pelo
abrir de seu coração e mente ao assunto
homoafetividade, cujo desenvolvimento não foi fácil
devido sua formação tradicionalista e conservadora.
Ao meu pai pela garra e empenho despendido
incondicionalmente em meu sustento, pelo amor
dedicado a mim, à sua maneira, independente da
minha identidade sexual. E, a ambos, pela educação,
tanto pessoal quanto cristã, que me proporcionaram.
6. O F o c o D e s t e T r a b a l h o...
O Evangelho Inclusivo e a Homossexualidade...
Foi direcionado a um grupo específico de pessoas,
cujas necessidades foram traduzidas através dos
mesmos anseios que tive durante esta caminhada,
cuja solidão somente não foi total devida a sensação
de que tinha um Deus ao meu lado, mesmo diante de
tantos anos de dúvidas advindas das afirmações
descontextualizadas que a Igreja impunha, com sua
tradicional hermenêutica.
Este livro não foi escrito para cristãos
fundamentalistas o considerarem uma afronta à
Palavra de Deus.
Não foi escrito para ser usado como uma saída
alternativa nos debates contra a homofobia religiosa.
Não foi escrito sob a forma de militância gay
para refutar bravamente o que cristãos confusos vêm
gritando falaciosamente aos sete ventos.
Não foi escrito para tornar as Escrituras
Sagradas relativistas e tampouco para andar lado a
lado com o liberalismo moral que há em alguns guetos
inclusivos que se denominam “cristãos”.
Não foi escrito para cristãos que vivem
constantemente em um pedestal apoiando-se na
Bíblia e imaginando saber o que se passa dentro de
um coração aflito e sedento por compreensão.
7. Não foi escrito para despertar soldados
adormecidos e fanáticos, em busca da vitória
justificada através da guerra.
Não foi escrito para diplomar pessoas em um
assunto que só é passível de entendimento através da
santificação diária e compreensão através do Espírito
Santo.
Não foi escrito para se ter um álibi, justificativas
pessoais ou um modo de vida a ter que viver seguindo
o exemplo de Jesus aqui na terra.
O Evangelho Inclusivo e a
Homossexualidade... Foi escrito para os que crêem
na Bíblia, como única fonte de fé; portanto, se você
não crê no Deus Criador, pare a leitura por aqui.
Foi escrito para iniciantes, e não para
pesquisadores intelectualóides em busca de um
divisor de águas.
Foi escrito para pessoas angustiadas, cansadas,
perseguidas, humilhadas, andando na contramão da
vida, porém com determinação, humildade, gosto pelo
viver, esperança no porvir, que buscam a justiça
divina e se conforta com a revelação do amor
incondicional de Jesus.
Foi escrito para aqueles que sabem que são
meramente pó e ao pó retornarão, e que não se
contentam com um olhar de compaixão daqueles que
crêem estarem salvos.
Foi escrito para pessoas “alegres”, felizes,
teatrais, espirituosas, expansivas, graciosas, únicas,
8. diante de tanta seriedade, inveja, rancor, orgulho,
pretensão, ódio e soberba.
Foi escrito para aqueles com almas puras,
mesmo tendo o seu exterior pintado com
extravagâncias. Aquelas criaturas que seguem o
criador não apenas com exclamações verbais de fé,
mas sim concomitantemente às obras.
Foi escrito para aqueles que não têm medo de
dizer “Eu Te Amo” e de erguer a bandeira – não do
“orgulho” de uma única comunidade –, mas sim das
comunidades de Cristo que são bem mais amplas.
Foi escrito para os que não sentem mérito algum
por merecer o amor e proteção de Deus diante das
provas da vida. Foi escrito para pessoas providas de
inteligência, mas que compreendem que suas mentes
são limitadas; para servos fiéis que sabem que estão
propensos a cair.
O Evangelho Inclusivo e a
Homossexualidade... Foi escrito para mim mesmo e
para quem quer que tenha se sentido em pecado e
afastado de Deus, cansado e sobrecarregado, mas
almejam o alívio efetivo deste fardo ao longo do
caminho estreito.
Fernando Cardoso
Autor
9. SUMÁRIO
Introdução, 11
Conhecendo a homossexualidade, 15
Aspectos históricos da condenação aos
homossexuais, 22
Mudança lenta, porém positiva, 27
O relacionamento familiar e social, 31
Algumas teorias sobre os homossexuais, 38
Assembléia de Deus, 38
Astrologia, 39
Budismo, 40
Hare krishnas, 40
Espiritismo, 41
Psicanálise, 42
Seicho-no-ie, 43
Umbanda e Candomblé, 43
Cura da homossexualidade – verdade ou
mentira?, 44
A homossexualidade e o Cristianismo, 49
A homossexualidade e a Bíblia, 55
Gênesis 1.27, 58
Gênesis 2.24, 60
Gêneses 19.1-19, 61
10. Levítico 18. 22, 63
Levítico 20.13, 63
Deuteronômio 22.5, 68
Deuteronômio 23.17, 70
Juízes 19.22, 71
Romanos 1.26-27, 73
1 Coríntios 6.9-11, 76
1 Timóteo 1.10, 76
Uma incoerência ao citar Paulo, 80
A Aids é profética?, 82
Supostos personagens homossexuais, 85
Davi e Jônatas, 87
Noemi e Rute, 90
Daniel e Aspenaz, 91
Outras referências teológicas, 93
Exercendo o cristianismo, 96
A igreja inclusiva, 98
Conclusão do Assunto, 103
Considerações Finais, 105
Carta a uma Fundamentalista, 109
Bibliografia, 112
11. INTRODUÇÃO
O éEvangelhoque suscita egrandes discussões, mas
um tema
Inclusivo a Homossexualidade
ao final afirma a possibilidade da Inclusão Espiritual
de todos em Cristo! Eu tenho esta certeza e você
também a terá a partir do momento que abrir o
coração para que a luz destas palavras transcenda as
barreiras do entendimento humano. Segundo o
teólogo Luís Corrêa Lima1 a Igreja nasceu rompendo
as fronteiras do judaísmo no primeiro século,
incorporando multidões de povos que não eram
circuncidados. Hoje, pode também se conceber uma
identidade simultaneamente Homossexual e Cristã,
estimulando os grupos cristãos a acolherem as
diversidades segundo a interpretação correta da
Bíblia a cerca do tema.
Tudo começou aos 5 anos. Foram as primeiras
memórias que tive, enquanto homossexual ou gay,
tanto faz. Desde pequeno, enquanto as outras
crianças brincavam, aproveitando sua inocência, eu,
1 Padre jesuíta, Doutor em História pela Universidade de
Brasília, Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, Coordenador de projeto de pesquisa sobre
Homossexualidade e Religião.
12. reflexivo, me auto-analisava e, ao mundo ao meu
redor. Sentia que era diferente dos demais, mas não
entendia o porquê, ainda. Eu observava os meninos de
longe com “admiração”, enquanto ficava sempre nos
grupos de meninas, compartilhando os assuntos. A
partir daí iniciaram os rótulos “bichinha”, “viadinho”,
entre outros que ouvi durante a fase escolar, além das
chacotas coletivas, com conotações negativas.
Durante muitos anos de minha vida passei
tentando criar teorias próprias, não para justificar a
minha homossexualidade, como se fosse uma válvula
de escape para descarga de conciência – como
acreditam alguns –, mas sim para entender os
motivos que me levavam a ser “diferente”, pois eu
sabia e sentia, acima de tudo, que era amado e
protegido por Deus. Contudo, mesmo eu tendo nascido
e sido criado em um lar cristão, constantemente ao
chegar na igreja, sentava-me no banco para ouvir os
sermões e me deparava com a mesma situação,
aquelas mesmas retóricas difamatórias pastorais que,
segundo eles, são chamadas de mensagens “divinas”
contra o homossexualISMO.
A minha sensação era de estar “murchando”,
despertava-me uma angústia, uma vontade de
levantar e sair o mais rápido possível daquele lugar,
mas em seguida me vinha o pensamento de que se o
fizera, as pessoas perceberiam que eu estava
encomodado e logo, perceberiam que eu era Gay.
13. Essa situação me matava aos poucos, como
certamente a você também não é diferente. Mas tudo
mudou a partir do momento que comecei a pesquisar
as Escrituras Sagradas, não sob a minha perspectiva,
mas sim à luz da palavra de Deus. Ao encontrar
outras interpretações que me foram escondidas
durante muito tempo, me dava conta do quanto a
Igreja é complacente com as situações conflitantes que
milhões de homossexuais enfrentam ao estar na casa
de Deus, cujo objetivo deveria ser para todos. Dessa
forma pude compreender melhor e me aceitar como
gay – a parte mais difícil do processo –, e entender o
mesmo amor de Cristo “pregado” em minha vida.
Fazendo estas observações, não quero atenuar a
importância da palavra de Deus contida na Bíblia ou
contrariar sua autoridade e inspiração para a vida
cristã. Ao contrário, amar a palavra de Deus é
esforçar-se para entendê-la e não apenas aceitar o que
é dito nos púlpitos por meio de pastores, ou seja,
homens, assim como eu, suscetíveis a erros de
interpretação. Tampouco defendo minhas crenças
representadas por “placa de igreja”, mesmo porque a
inclusão espiritual não necessita deste recurso.
A idéia deste livro surgiu após analisar pessoas
se surpreendendo ao saber que eu sou Homossexual e
Cristão. Por qual motivo a minha identidade sexual
me distanciaria de Deus? Isto não ocorre e você
entenderá o porquê no decorrer da leitura. Além do
mais, durante minha vida encontrei pessoas que
14. atravessaram conflitos com a família e com a fé, pelo
fato da homossexualidade. Foi quando pensei que
deveria fazer algo a esse respeito.
Outra alavanca deste trabalho se deu após
assistir alguns filmes baseados em fatos reais:
“Tremendo diante de Deus”, documentário de 2001;
“Assim me diz a Bíblia”, documentário norte-
americano de 2007; e “Orações para Bobby”, filme
norte-americano de 2009.
Como toda nova idéia dita em voz alta, minha
visão sob o assunto trará luz e esperança a alguns, e
hostilidade a outros. Isto sempre acontece quando
ensinamentos cristãos persuasivos e opressivos são
refutados, principalmente daqueles que afirmam ser
representantes de Deus aqui na terra.