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O 1º de Maio e a mercadorização da vida
    Jornal Público, 08/05/2012

    Elísio Estanque
    Centro de Estudos Sociais/ Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra


     É claro que o 1º de Maio já não é o que foi no passado. Mas a prova de que a sua força simbólica
não desapareceu é que a ação de marketing do Pingo Doce (PD) só ganhou relevo devido a essa data
histórica. Só o facto do «dia do trabalhador» continuar presente é que permite a alguns invocar – com
euforia ou cinismo – que se tratou do «dia do consumidor».

     Mais do que o próprio ato de consumo e o direito de cada um a usufruir das vantagens comerciais
que lhes são oferecidas – na sociedade de mercado e de austeridade em que estamos mergulhados –, o
que dá que pensar é os contornos de sofreguidão e de caos gerados pela corrida louca às lojas do PD. O
dia mundial dos «direitos do consumidor» foi recentemente celebrado (a 15 de março), mas o que este
«fenómeno» revelou é a facilidade com que os indivíduos, com os seus direitos a desaparecer (no
consumo e no trabalho), desenquadrados, desprotegidos e vulneráveis entram em comportamentos de
multidão e de irracionalidade, onde o instinto aumenta em exponencial enquanto as inteligências se
anulam umas às outras: «quando todos pensam da mesma forma, é porque ninguém está a pensar» (W.
Lippman). Por outro lado, o que tais situações também ilustram é que do civismo à barbárie vai apenas
um pequeno passo. Num momento em que invocar direitos começa a ser estigmatizante, o «bodo aos
pobres» ou o «pão e circo» apenas promovem a naturalização da pobreza e da miséria. No interior e à
porta das lojas do PD viram-se cenas reveladoras de uma «pobreza» que não é apenas económica.
Quando os (ex-)remediados empobrecem tão rapidamente o medo do empobrecimento pode
desencadear a volúpia pelo consumo.

     E logo no dia 1º de Maio! Podia ter sido noutra data? Podia. Mas não era a mesma coisa. Nem o
mais ingénuo dos cidadãos acreditou na coincidência. Para lá de todas as intenções subjetivas, o
subtexto parece claro: era preciso mostrar aos «recalcitrantes sindicalistas» quem está com o Povo; era
preciso mostrar a um sindicalismo anacrónico, dividido e fragilizado que gritar pela «unidade sindical» é
pregar no deserto. Se os direitos laborais e o trabalho digno estão a ser varridos, nada melhor do que
encenar numa «catedral» de consumo uma grande «homilia» à total mercadorização da vida. Pôr as
classes média-baixa e trabalhadora a «manifestar-se de contentamento» contra os «saudosistas do
PREC», seria a vitória do consumismo contra a luta da classe trabalhadora. Os media fizeram o resto. E
não deixa de ser deprimente ver o autor de «O Operariado Português nas Vésperas da República, 1909-
1910», (Manuel Villaverde Cabral) aplaudir tal ação como «genial». Enfim, quando são os próprios
historiadores a perder a memória, o que esperar do Povo?

    Desde as revoltas das fábricas têxteis inglesas do mítico «Captain Ludd» de início do século XIX,
passando pelos protestos e greves de Chicago, os «Haymarket riots» de maio de 1886, pelas
manifestações em França de 1889 e pela declaração do Senado francês de 1919 (que declarou feriado o
1º de Maio) até aos dias de hoje, com as inúmeras lutas de milhões de trabalhadores do mundo inteiro
contra os excessos do capitalismo selvagem, que as sociedades ocidentais não pararam de progredir de
todos os pontos de vista (social, económico, tecnológico, científico, comunicacional, etc). Sem tais lutas
o mundo seria o mesmo? A história do movimento operário representa, pois, um património riquíssimo
sem o qual nem as liberdades políticas, nem as democracias, nem o Estado social nem os direitos
humanos nem a sociedade de consumo, nem as classes médias do Ocidente teriam existido. E isso não é
uma questão menor, como qualquer capitalista ético reconhece.

     É verdade que o lema da OIT «O trabalho não é uma mercadoria» (Declaração de Filadélfia, 1944)
está longe de ser cumprido. Entrámos numa espiral regressiva e de vulnerabilidade do trabalhador. É
verdade que o ritual da Alameda carece de novos slogans, de renovação geracional e de um discurso
mais adequado à precariedade da força de trabalho. Mas o trabalho continua no centro das nossas vidas
(sobretudo a falta dele), e engana-se quem pense que as lutas laborais possam ser substituídas por uma
ida às compras (embora a catarse do PD tenha aliviado tensões momentâneas). Se um dia o trabalho
forçado e gratuito se generalizar, outros 1ºs de Maio ou outros «capitães Ludd» poderão irromper
contra o excesso de mercantilismo. Porque numa sociedade fundada na desigualdade e na injustiça as
lutas sociais não param.

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O 1o de Maio e a mercadorização da vida

  • 1. O 1º de Maio e a mercadorização da vida Jornal Público, 08/05/2012 Elísio Estanque Centro de Estudos Sociais/ Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra É claro que o 1º de Maio já não é o que foi no passado. Mas a prova de que a sua força simbólica não desapareceu é que a ação de marketing do Pingo Doce (PD) só ganhou relevo devido a essa data histórica. Só o facto do «dia do trabalhador» continuar presente é que permite a alguns invocar – com euforia ou cinismo – que se tratou do «dia do consumidor». Mais do que o próprio ato de consumo e o direito de cada um a usufruir das vantagens comerciais que lhes são oferecidas – na sociedade de mercado e de austeridade em que estamos mergulhados –, o que dá que pensar é os contornos de sofreguidão e de caos gerados pela corrida louca às lojas do PD. O dia mundial dos «direitos do consumidor» foi recentemente celebrado (a 15 de março), mas o que este «fenómeno» revelou é a facilidade com que os indivíduos, com os seus direitos a desaparecer (no consumo e no trabalho), desenquadrados, desprotegidos e vulneráveis entram em comportamentos de multidão e de irracionalidade, onde o instinto aumenta em exponencial enquanto as inteligências se anulam umas às outras: «quando todos pensam da mesma forma, é porque ninguém está a pensar» (W. Lippman). Por outro lado, o que tais situações também ilustram é que do civismo à barbárie vai apenas um pequeno passo. Num momento em que invocar direitos começa a ser estigmatizante, o «bodo aos pobres» ou o «pão e circo» apenas promovem a naturalização da pobreza e da miséria. No interior e à porta das lojas do PD viram-se cenas reveladoras de uma «pobreza» que não é apenas económica. Quando os (ex-)remediados empobrecem tão rapidamente o medo do empobrecimento pode desencadear a volúpia pelo consumo. E logo no dia 1º de Maio! Podia ter sido noutra data? Podia. Mas não era a mesma coisa. Nem o mais ingénuo dos cidadãos acreditou na coincidência. Para lá de todas as intenções subjetivas, o subtexto parece claro: era preciso mostrar aos «recalcitrantes sindicalistas» quem está com o Povo; era preciso mostrar a um sindicalismo anacrónico, dividido e fragilizado que gritar pela «unidade sindical» é pregar no deserto. Se os direitos laborais e o trabalho digno estão a ser varridos, nada melhor do que encenar numa «catedral» de consumo uma grande «homilia» à total mercadorização da vida. Pôr as classes média-baixa e trabalhadora a «manifestar-se de contentamento» contra os «saudosistas do PREC», seria a vitória do consumismo contra a luta da classe trabalhadora. Os media fizeram o resto. E não deixa de ser deprimente ver o autor de «O Operariado Português nas Vésperas da República, 1909- 1910», (Manuel Villaverde Cabral) aplaudir tal ação como «genial». Enfim, quando são os próprios historiadores a perder a memória, o que esperar do Povo? Desde as revoltas das fábricas têxteis inglesas do mítico «Captain Ludd» de início do século XIX, passando pelos protestos e greves de Chicago, os «Haymarket riots» de maio de 1886, pelas manifestações em França de 1889 e pela declaração do Senado francês de 1919 (que declarou feriado o 1º de Maio) até aos dias de hoje, com as inúmeras lutas de milhões de trabalhadores do mundo inteiro
  • 2. contra os excessos do capitalismo selvagem, que as sociedades ocidentais não pararam de progredir de todos os pontos de vista (social, económico, tecnológico, científico, comunicacional, etc). Sem tais lutas o mundo seria o mesmo? A história do movimento operário representa, pois, um património riquíssimo sem o qual nem as liberdades políticas, nem as democracias, nem o Estado social nem os direitos humanos nem a sociedade de consumo, nem as classes médias do Ocidente teriam existido. E isso não é uma questão menor, como qualquer capitalista ético reconhece. É verdade que o lema da OIT «O trabalho não é uma mercadoria» (Declaração de Filadélfia, 1944) está longe de ser cumprido. Entrámos numa espiral regressiva e de vulnerabilidade do trabalhador. É verdade que o ritual da Alameda carece de novos slogans, de renovação geracional e de um discurso mais adequado à precariedade da força de trabalho. Mas o trabalho continua no centro das nossas vidas (sobretudo a falta dele), e engana-se quem pense que as lutas laborais possam ser substituídas por uma ida às compras (embora a catarse do PD tenha aliviado tensões momentâneas). Se um dia o trabalho forçado e gratuito se generalizar, outros 1ºs de Maio ou outros «capitães Ludd» poderão irromper contra o excesso de mercantilismo. Porque numa sociedade fundada na desigualdade e na injustiça as lutas sociais não param.