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História de Angola encontra-se documentada do ponto de vista arqueológico desde
o Paleolítico. Este país da África Austral foi uma colónia portuguesa até 11 de
Novembro de 1975, quando acedeu à independência na sequência duma guerra de libertação.
[editar]História pré-colonial
Expansão bantu.
Na Lunda, no Zaire e no Cuangar foram encontrados instrumentos de pedra e outros, dos
homens do Paleolítico. No Deserto do Namibe foram encontradasgravuras rupestres nas
rochas. Trata-se das gravuras do Tchitundo-Hulo, atribuídas aos antepassados dos san.
Nos primeiros quinhentos anos da era actual, as populações bantu da África Central, que já
dominavam a siderurgia do ferro, iniciaram uma série de migrações para leste e para sul, a que
se chamou a expansão bantu. Parte destas populações fixaram-se a Norte e ao Sul da parte
inferior do Rio Congo (ou Zaire), portanto também no Noroeste do território da actual Angola.
Com o tempo, estas populações constituíram o povo Bakongo, de língua Kikongo. Outras
populações fixaram-se inicialmente na região dos Grandes Lagos Africanos e, no século XVII,
deslocaram-se para oeste, atravessando o Alto Zambeze até aoCunene: eram os grupos hoje
designados como ngangela, mas também os Ovambo e os Xindonga.
No ano de 1568, entrava um novo grupo pelo norte, os jagas, que combateram os Bakongo
que os empurraram para sul, para a região de Kassanje. No século XVI ou mesmo antes,
os nhanecas (vanyaneka) entraram pelo sul de Angola, atravessaram o Cunene e instalaram-se
no planalto da Huíla.
No mesmo século XVI, um outro povo abandonava a sua terra na região dos Grandes Lagos, no
centro de África, e veio também para as terras angolanas. Eram os hereros (ouovahelelos), um
povo de pastores. Os hereros entraram pelo extremo leste de Angola, atravessaram o planalto
do Bié e depois foram-se instalar entre o Deserto do Namibe e a Serra da Chela, no sudoeste
angolano.
Também no século XVI os portugueses instalam-se na região e fundam São Paulo da Assunção
de Luanda, a actual cidade de Luanda.
Já no século XVIII, entraram os ovambos (ou ambós), grandes técnicos na arte de trabalhar o
ferro, deixaram a sua região de origem no baixo Cubango e vieram estabelecer-se entre o alto
Cubango e o Cunene. No mesmo século, os quiocos (oukyokos) abandonaram o Catanga e
atravessaram o rio Cassai. Instalaram-se inicialmente na Lunda, no nordeste de Angola,
migrando depois para sul.
Finalmente, já no século XIX apareceu o último povo que veio instalar-se em Angola: os
cuangares (ou ovakwangali). Estes vieram do Orange, na África do Sul, em 1840, chefiados
por Sebituane, e foram-se instalar primeiro no Alto Zambeze. Então chamavam-se macocolos.
Do Alto Zambeze alguns passaram para o Cuangar no extremo sudoeste angolano, onde estão
hoje, entre os rios Cubango e Cuando.
As guerras entre estes povos eram frequentes. Os migrantes mais tardios eram obrigados a
combater os que se estavam estabelecidos para lhes conquistar terras. Para se defenderem, os
povos construíam muralhas em volta das sanzalas. Por isso, há em Angola muitas ruínas de
antigas muralhas de pedra. Essas muralhas são mais abundantes no planalto do Bié e no
planalto da Huíla, onde se encontram, também, túmulos de pedra e galerias de exploração de
minério, testemunhos de civilizações mais avançadas do que geralmente se supõe.
[editar]A chegada dos portugueses
Ver artigo principal: Dona Ana de Sousa, Reconquista de Angola
Ilustração da rainha Nzinga em negociações de Paz com o governador
português em Luanda em 1657.
Os portugueses, sob o comando de Diogo Cão, no reinado de D. João II, chegam
ao Zaire em 1484. É a partir daqui que se iniciará a conquista pelos portugueses desta região
de África, incluindoAngola. O primeiro passo foi estabelecer uma aliança com o Reino do
Congo, que dominava toda a região. A sul deste reino existiam dois outros, o do Reino de
Ndongo e o de Matamba, os quais não tardam a fundir-se, para dar origem ao Reino de
Angola (c. 1559).
Explorando as rivalidades e conflitos entre estes reinos, na segunda metade do século XVI os
portugueses instalam-se na região de Angola. O primeiro governador de Angola, Paulo Dias de
Novais, procura delimitar este vasto território e explorar os seus recursos naturais, em
particular os escravos. A penetração para o interior é muito limitada. Em 1576 fundam São
Paulo da Assunção de Luanda, a actual cidade de Luanda. Angola transforma-se rapidamente
no principal mercado abastecedor de escravos para as plantações da cana-de-açúcar do Brasil.
Durante a ocupação filipina de Portugal (1580-1640), os holandeses procuram desapossar os
portugueses desta região, ocupando grande parte do litoral (Benguela, Santo António do Zaire,
as barras do Bengo e do Cuanza). Em 1648 tropas portuguesas (luso-brasileiras) expulsam os
holandeses, possibilitando o reatamento das linhas de comércio (essencialmente tráfego de
escravos) de Salvador e Rio de Janeiro com Luanda.
Até finais do século XVIII, Angola funciona como um reservatório de escravos para as
plantações e minas do Brasil ou de outras colónias portuguesas do continente americano.[1]
A
ocupação dos portugueses aposta nas fortalezas e feitorias estabelecidas na costa.
A colonização efectiva do interior só se inicia no século XIX, após a independência do
Brasil (1822) e o fim do tráfico de escravos (1836-42), mas não da escravatura. Esta ocupação
do interior tinha o carácter de uma resposta às pretensões de outras potências europeias,
como a Inglaterra, a Alemanha e a França, que reclamavam na altura o seu quinhão em África.
Diversos tratados são firmados estabelecendo os territórios que a cada uma cabem, de acordo
com o seu poder e habilidade negocial.
Uma boa parte desses colonos são presos deportados de Portugal, como o célebre Zé do
Telhado. Paralelamente são feitas diversas viagens com objectivos políticos e científicos para o
interior do território angolano, tais como: José Rodrigues Graça (1843-1848) -
Malanje e Bié; José Brochado - Huambo, Mulando, Cuanhama; Silva Porto - Bié.
Devido à ausência de vias de comunicação terrestres, as campanhas de ocupação do interior
são feitas através dos cursos fluviais: Bacia do Cuango (1862), Bacia do Cuanza (1895, 1905 e
1908); Bacia do Cubango (1886-1889, 1902 e 1906); Bacia do Cunene (1906-1907); Bacia
do Alto Zambeze (1895-1896); Entre Zeusa e Dande (1872-1907), etc.
As fronteiras de Angola só são definidas em finais do século XIX, sendo a sua extensão
muitíssimo maior do que a do território dos Ambundu, a cuja língua o termo Angola anda
associado.
Em 1823, em Benguela, surgiu a Confederação Brasílica, um movimento com a finalidade de
juntar Angola ao recém-independente Brasil. Esse movimento foi formado por colonos e
soldados de Benguela que em boa parte provinham do Brasil. O governo da colónia em Luanda
chamou reforços e esmagou esta revolta. [2]
[editar]1900-1960
Vista de Luanda em 1883.
Automóvel em Angola, em 1949.
A colonização de Angola, após a implantação de um regime republicano em Portugal (1910),
entra numa nova fase. Os republicanos haviam criticado duramente os governos monárquicos
por terem abandonado as colónias. O aspecto mais relevante da sua ação circunscreveu-se à
criação de escolas. No plano económico, desde muito tempo era legal 1916 na região de
Luanda.
O desenvolvimento económico só se inicia de forma sistemática, em finais da década de 1930,
quando se incrementa a produção de café, sisal, cana do açúcar, milho e outros produtos.
Trata-se de produtos destinados à exportação.
A exportação da cana do açúcar, em 1914, pouco ultrapassava as 6 milhões de toneladas.
Em 1940 atingia já 4 mil milhões de toneladas exportadas.[carece de fontes]
As fazendas e a indústria
concentraram-se à volta das cidades de Luena e de Benguela.
A exportação de sisal desenvolve-se durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Em 1920,
foram exportadas pouco mais que que 62 toneladas , mas em 1941 atingia-se já as 3.888. Dois
anos depois, 12.731 toneladas. Em 1973 situavam-se nas 53.499. Estas plantações situavam-se
no planalto do Huambo, do Cubal para Leste, nas margens da linha férrea do Dilolo, Bocoió,
Balumbo, Luimbale, Lepi, Sambo, mas também no Cuinha do norte e Malange.
Abre-se um novo ciclo económico em Angola, que se prolonga até 1972, quando a exploração
petrolífera em Cabinda começar a dar os seus resultados. A subida da cotação do café no
mercado mundial, a partir de 1950, contribuiu decisivamente para o aumento vertiginoso
desta produção. Em 1900, as exportações pouco ultrapassaram as 5.800 milhões de toneladas.
Em1930 atingiam as 14.851.Em 1943 subiam para 18.838. A partir daqui o crescimento foi
vertiginoso. Em 1968 forma exportadas 182.954 e quatro anos depois, 218.681 toneladas.
Para além destes produtos, desenvolve-se a exploração dos minérios de ferro. Em 1957 funda-
se a Companhia Mineira do Lobito, que explorava as minas de Jamba, Cassinga e Txamutete.
Exploração que cedeu depois à Brasileira Krupp.
O desenvolvimento destas explorações, foi acompanhado por vagas de imigrantes
incentivados e apoiados muitas vezes pelo próprio Estado. Entre 1941 e 1950, saíram de
Portugal cerca de 110 mil imigrantes com destino às colónias, a maioria fixou-se em Angola. O
fluxo imigratório prosseguiu nos anos 1950 e 60.
Na década de 1950, a questão da descolonização das colónias africanas emerge no plano
internacional e torna-se uma questão incontornável. Em 1956 é publicado o primeiro
manifesto doMovimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).
[editar]1961-1974
Ver artigo principal: Guerra Colonial
Ford Taunus em Luanda, em 1972.
No princípio dos anos 1960, três movimentos de libertação (UPA/FNLA, MPLA e UNITA)
desencadearam uma luta armada contra o colonialismo português.[3]
O governo de Portugal (uma ditadura desde 1926), recusou-se a dialogar e prosseguiu na
defesa até ao limite do último grande império colonial europeu. Para África foram mobilizados
centenas de milhares de soldados. Enquanto durou o conflito armado, Portugal procurou
consolidar a sua presença em Angola, promovendo a realização de importantes obras públicas.
A produção industrial e agrícola conheceram neste território um desenvolvimento
impressionante. A exploração do petróleo de Cabinda iniciou-se em 1968, representando
em 1973 cerca de 30% das receitas das exportações desta colónia. Entre 1960 e 1973 a taxa de
crescimento do PIB (produto Interno Bruto) de Angola foi de 7% ao ano.
[editar]Independência e guerra civil
Ver artigo principal: Guerra Civil Angolana
Legado da guerra civil: edifício destruído no Huambo.
Na sequência do derrube da ditadura em Portugal (25 de Abril de 1974), abriram-se
perspectivas imediatas para a independência de Angola. O novo governo revolucionário
português abriu negociações com os três principais movimentos de libertação (MPLA –
Movimento Popular de Libertação de Angola, FNLA – Frente Nacional de Libertação de
Angola e UNITA – União Nacional para a Independência Total de Angola), o período de
transição e o processo de implantação de um regime democrático em Angola (Acordos de
Alvor, Janeiro de 1975).
A independência de Angola não foi o início da paz, mas o início de uma nova guerra aberta.
Muito antes do Dia da Independência, a 11 de Novembro de 1975, já os três grupos
nacionalistas que tinham combatido o colonialismo português lutavam entre si pelo controle
do país, e em particular da capital, Luanda. Cada um deles era na altura apoiado por potências
estrangeiras, dando ao conflito uma dimensão internacional.
A União Soviética e principalmente Cuba apoiavam o MPLA, que controlava a cidade de Luanda
e algumas outras regiões da costa, nomeadamente o Lobito e Benguela. Os cubanos não
tardaram a desembarcar em Angola (5 de Outubro de 1975). A África do Sul apoiava a UNITA e
invadiu Angola (9 de Agosto de 1975). O Zaire, que apoiava a FNLA, invadiu também este país,
em Julho de 1975. A FNLA contava também com o apoio da China, mercenários portugueses e
ingleses mas também com o apoio da África do Sul.
Os EUA, que apoiaram inicialmente apenas a FNLA, não tardaram a ajudar também a UNITA.
Neste caso, o apoio manteve-se até 1993. A sua estratégia foi durante muito tempo dividir
Angola.
Em Outubro de 1975, o transporte aéreo de quantidades enormes de armas e soldados
cubanos, organizado pelos soviéticos, mudou a situação, favorecendo o MPLA. As tropas sul-
africanas e zairenses retiraram-se e o MPLA conseguiu formar um governo socialista uni-
partidário.
O Brasil rapidamente estabeleceu relações diplomáticas com a nova República que se
instalara. Fez isso antes mesmo de qualquer país do bloco comunista. Nenhum país ocidental
ou mesmo africano seguiu o seu exemplo. A decisão de reconhecer como legítimo o governo
de Agostinho Neto foi tomada pelo então presidente Ernesto Geisel ainda em 6 de Novembro,
antes da data oficial de Independência de Angola.
Já em 1976, as Nações Unidas reconheciam o governo do MPLA como o legítimo
representante de Angola, o que não foi seguido nem pelos EUA, nem pela África do Sul.
No meio do caos que Angola se havia tornado, cerca de 800 mil portugueses abandonaram
este país entre 1974 e 1976, o que agravou de forma dramática a situação económica.
A 27 Maio de 1977, um grupo do MPLA encabeçado por Nito Alves, desencadeou um golpe de
Estado que ficou conhecido como Fraccionismo, terminando num banho de sangue que se
prolongou por dois anos. Em Dezembro, no rescaldo do golpe, o MPLA realizou o seu 1º
Congresso, onde se proclamou como sendo um partido Marxista-Leninista, adoptando o nome
de MPLA-Partido do Trabalho.
Ver artigo principal: Fraccionismo
A guerra continuava a alastrar por todo o território. A UNITA e a FNLA juntaram-se então
contra o MPLA. A UNITA começou por ser expulsa do seu quartel-general no Huambo, sendo
as suas forças dispersas e impelidas para o mato. Mais tarde, porém, o partido reagrupou-se,
iniciando uma guerra longa e devastadora contra o governo do MPLA. A UNITA apresentava-se
como sendo antimarxista e pró-ocidental, mas tinha também raízes regionais, principalmente
na população Ovimbundu do sul e centro de Angola.
Agostinho Neto morreu em Moscovo a 10 de Setembro de 1979, sucedendo-lhe no cargo
o ministro da Planificação, o engenheiro José Eduardo dos Santos.
No início da década de 1980, o número de mortos e refugiados não parou de aumentar. As
infraestruturas do país eram consecutivamente destruídas. Os ataques da África do Sul não
paravam. Em Agosto de 1981, lançaram aoperação "Smokeshell" utilizando 15.000 soldados,
blindados e aviões, avançando mais de 200 km na província do Cunene (sul de Angola). O
governo da África do Sul justificou a sua acção afirmando que na região estavam instaladas
bases dos guerrilheiros da SWAPO, o movimento de libertação da Namíbia. Na realidade
tratava-se de uma acção de apoio à UNITA, tendo em vista a criação de uma "zona libertada"
sob a sua administração. Estes conflitos só terminaram em Dezembro de 1988, quando
em Nova Iorque foi assinado um acordo tripartido (Angola, África do Sul e Cuba) que
estabelecia a Independência da Namíbia e a retirada dos cubanos de Angola.
A partir de 1989, com a queda do bloco da ex-União Soviética, sucederam-se em Angola os
acordos de paz entre a UNITA e o MPLA, seguidos do recomeço das hostilidades.
Em Junho de 1989, em Gbadolite (Zaire), a UNITA e o MPLA estabeleceram uma nova trégua. A
paz apenas durou dois meses.
Em fins de Prédefinição:DataEx, o governo de Angola anunciou o reinício das conversações
directas com a UNITA, com vista ao estabelecimento do cessar-fogo. No mês seguinte, a UNITA
reconhecia oficialmente José Eduardo dos Santos como o Chefe de Estado angolano. O
desmoronar da União Soviética acelerou o processo de democratização. No final do ano, o
MPLA anunciava a introdução de reformas democráticas no país. A 11 de Maio de 1991, o
governo publicou uma lei que autorizava a criação de novos partidos, pondo fim
ao monopartidário. A 22 de Maio os últimos cubanos saíram de Angola.
Em 31 de Maio de 1991, com a mediação de Portugal, EUA, União Soviética e da ONU,
celebraram-se os acordos de Bicesse (Estoril), terminando com a guerra civil desde 1975, e
marcando as eleições para o ano seguinte.
As eleições de Setembro de 1992, deram a vitória ao MPLA (cerca de 50% dos votos). A UNITA
(cerca de 40% dos votos) não reconheceu os resultados eleitorais. Quase de imediato sucedeu-
se um banho de sangue, reiniciando-se o conflito armado, primeiro em Luanda, mas
alastrando-se rapidamente ao restante território.
A UNITA restabeleceu primeiramente a sua capital no Planalto Central com sede no Huambo
(antiga Nova Lisboa), no leste e norte diamantífero.
Em 1993, o Conselho de Segurança das Nações Unidas embargou as transferências de armas e
petróleo para a UNITA. Tanto o governo como a UNITA acordaram em parar as novas
aquisições de armas, mas tudo não passou de palavras.
Em Novembro de 1994, celebrou-se o Protocolo de Lusaka, na Zâmbia entre a UNITA e
o Governo de Angola (MPLA). A paz parecia mais do que nunca estar perto de ser alcançada. A
UNITA usou o acordo de paz de Lusaka para impedir mais perdas territoriais e para fortalecer
as suas forças militares. Em 1996 e 1997 adquiriu grandes quantidades de armamentos e
combustível, enquanto ia cumprindo, sem pressa, vários dos compromissos que assumira
através do Protocolo de Lusaka[4]
.
Entretanto o Ocidente passara a apoiar o governo do MPLA, o que marcou o declínio militar e
político da UNITA, com este movimento a ter cada vez mais dificuldades em financiar as suas
compras militares, perante o avanço no terreno das FAA, e dado o embargo internacional e
diplomático a que se viu votada.
Em Dezembro de 1998, Angola retornou ao estado de guerra aberta, que só parou em 2002,
com a morte de Jonas Savimbi (líder da UNITA).
Com a morte do líder histórico da UNITA, este movimento iniciou negociações com o Governo
de Angola com vista à deposição das armas, deixando de ser um movimento armado, e
assumindo-se como mera força política.
Referências
3 - Introdução ao Estudo da História de Angola
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NAME: HELDER PONTE
LOCATION: CRANBROOK, COLÔMBIA BRITÂNICA, CANADA
Helder Fernando de Pinto Correia Ponte, também conhecido por Xinguila nos seus anos de
juventude em Luanda, Angola, nasceu em Maquela do Zombo, Uíge, Angola, em 1950. Viveu a
sua meninice na Roça Novo Fratel (Serra da Canda) e na Vila da Damba (Uíge), e a sua
juventude em Luanda e Cabinda. Frequentou os liceus Paulo Dias de Novais e Salvador Correia,
e o Curso Superior de Economia da Universidade de Luanda. Cumpriu serviço militar como
oficial miliciano do Serviço de Intendência (logística) do Exército Português em Luanda e
Cabinda. Deixou Angola em Novembro de 1975 e emigrou para o Canadá em 1977, onde vive
com a sua esposa Estela (Princesa do Huambo) e filho Marco Alexandre. É gestor de um grupo
de empresas de propriedade dos Índios Kootenay, na Colômbia Britânica, no sopé oeste das
Montanhas Rochosas Canadianas. Gosta da leitura e do estudo, e adora escrever sobre a
História de Angola, de África e do Atlântico Sul, com ênfase na Escravatura, sobre os quais tem
uma biblioteca pessoal extensa.
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3.9.3 Angola, o Fim da Guerra Fria, e a Re-Africa...
3.9.2 O Papel de Angola na Corrida à África e no ...
3.9.1 Os Escravos de Congo e Angola e a Ascensão ...
3.10 Linguagem, Estilo, Ortografia e Toponímia
3.9 Angola na História do Mundo
3.8 Tanta História Ainda por Contar...
3.7 Fontes da História de Angola
3.6 Porquê Estudar a História de Angola?
3.5 Tempos Diferentes ao Mesmo Tempo...
3.4 Os Grandes Períodos da História de Angola
May 2006
June 2007
July 2007
SATURDAY, JULY 28, 2007
3.9.3 Angola, o Fim da Guerra Fria, e a Re-Africanização da África Austral
3. Angola, o Fim da Guerra Fria, e a Re-Africanização da África Austral
Amigo Leitor - Este capítulo ainda em desenvolvimento
A mais longa guerra de libertação nacional em África
O Regresso das Caravelas
Angola Lugar Quente da Guerra Fria
O Fim da Rodésia, do Sudoeste Africano e do Apartheid na África do Sul
O desmoronamento da Unuião das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e o Fim da Guerra
Fria
Numa época mais recente, podemos ainda relembrar o exemplo da relevância do petróleo de
Angola na economia mundial do Séc. XXI.
posted by Helder Ponte | 7/28/2007 08:47:00 PM | 2 comments
3.9.2 O Papel de Angola na Corrida à África e no Estabelecimento de Impérios Coloniais
2. O Papel de Angola na Corrida à África e no Estabelecimento de Impérios Coloniais
Amigo Leitor - Este capítulo eastá ainda em desenvolvimento
Angola e o Colonialismo Europeu
1795 escravatura abolida na Holanda
1807 - tráfico de escravos abolido na Inglaterra
1834 - Escravatura abolida no Império Britânico
1867 - Os primeiros diamantes são descobertos na África do Sul
1869 - Completa-se a construção do Canal do Suez
2.1 A Revolução Industrial e o Imperialismo Europeu
A Revolução Industrial foi um factor decisivo no imperialismo europeu. As economias
europeias precisavam não só de matérias primas e de mão-de-obra a baixo custo, como
precisavam também de novos mercados para os seus produtos manufacturados. Os povos
africanos ofereciam aos estados europeus a melhor oportunidade de expansão não só pela sua
proximidade geográfica e massa de população, como também pelo facto de o continente
africano não estar sob a hegemonia de qualquer potência.
2.2 A Abolição da Escravatura e do Tráfico de Escravos
Assim, a abolição da escravatura e do tráfico de escravos do Atlântico acontecerem tão só por
razões morais mas mais por razões económicas. A Inglaterra, refeita da perda das colónias da
América, passou a concentrar os seus esforços na expansão de novos mercados fornecedores
de produtos tropicais essenciais ao crescimento da sua indústria, ao mesmo tempo que novos
mercados consumidores eram necessários para a colocação dos seus produtos. Com efeito,
consciente da concorrência que lhe podia advir dos Estados Unidos da América, nada melhor
que advogar e policiar a abolição da escravatura e do tráfico, pois tal reduziria a capacidade
das antigas colónias Americanas de expandir a sua economia, e deste modo desafiar a
hegemonia britânica, pois o escravo era ainda a principal fonte de riqueza nas Américas.
Quanto às colónias espanholas e portuguesas da América Central e do Sul, a estratégia
britânica baseou-se no suporte à onda de independência política que assolou a América Latina
no primeiro quartel do Século XIX e na abertura dos seus portos e economias às mercadorias
produzidas em Inglaterra.
2.3 Portugal e a Colónia de Angola
Este paradigma fez-se reflectir em Portugal e nas suas colónias através da independência do
Brasil em 1822 e a consequente abertura dos seus portos ao comercio internacional, e nas
praças de África, na abolição do tráfico negreiro. No caso particular de Angola, pode dizer-se
que a expansão do domínio português para o interior da colónia de Angola foi um dos
primeiros resultados da abolição da escravatura em Portugal mercê dos esforços do Marquês
de Sá da Bandeira em 1836.
Com efeito a expansão territorial do domínio português em Angola começou em 1838, com o
estabelecimento do Forte do Duque de Bragança perto da quedas do mesmo nome
(Calandula),perto da confluência dos rios Lucala e Quanza. Dentro dos próximos dez anos, os
Portugueses estenderam o seu domínio até à margem do Rio Cuando.
Entretanto em 1840, era fundada a povoação de Moçâmedes, a sul de Benguela, e durante o
mesmo período os Portugueses tentaram a conquista dos povos da costa entre Luanda e
Cabinda (Ambriz, Ambrizete (Nzeto), e Santo António do Zaire (Soio), não conseguindo porém
os seus objectivos devido à oposição britânica.
Como medida de estabelecer com melhor firmeza o seu domínio no reduzido território que
controlavam ao longo do Rio Quanza, os Portugueses impuseram um imposto “por cabeça”
que tinha de ser pago por africanos em moeda corrente ou em produtos coloniais, obrigando-
os assim a participar na economia colonial, o que em breve resultou na expansão do domínio
económico dos Portugueses às regiões limítrofes do interior.
2.4 As Viagens de David Livingstone e o Imperialismo Britânico
David Livingstone nas suas viagens ao interior de África que desde 1852 tinham assegurado um
bom número de acordos de protecção britânica com muitos chefes locais, alguns dos quais
situados no território entre Angola e Moçambique, agravou as diferenças entre Portugal e a
Inglaterra que disputavam a vassalagem dos povos da região. levando e o objectivo britânico
de dominar todos os territórios ao longo da faixa entre o Cabo (na África do Sul) e Cairo (no
Egipto) eram desafios que os Portugueses não podiam deixar de ignorar e atender de
imediato, sob pena do não reconhecimento pela comunidade internacional dos seus direitos
históricos, que não eram já reconhecidos por nenhum estado europeu.
2.5 A Sociedade de Geografia de Lisboa
Em 1870 o Ministro da Marinha e do Ultramar português estabeleceu uma comissão para
preparar uma expedição por terra entre Angola e Moçambique com o fim de reafirmar o
domínio português sobre a longa faixa de território entre as duas colónias. Com a criação da
Sociedade de Geografia de Lisboa em 1875, o esforço português em África ganhou um ímpeto
muito grande, já que mobilizou um número grande de comerciantes e industriais, estudiosos,
missionários e oficiais militares de carreira, e fazendo Portugal acordar para a realidade
africana uma geração após a independência do Brasil.
Melhores meios financeiros e maiores recursos humanos foram postos à disposição pelo
governo português para estudo, ocupação e colonização de praças em África, e um pequeno
volume de emigração foi orientada para as novas colónias, em especial para Angola e
Moçambique.
2.6 O Acordo Luso-Britânico de 1884 sobre a Foz do Zaire
Assim e pela mesma razão os Portugueses ocuparam o Antigo Reino do Congo em 1881 e
Cabinda e Massábi em 1883, como medida de afastar ou tentar neutralizar a influência dos
franceses a norte (Ponta Negra) e de Leopoldo II da Bélgica na foz do rio Zaire (Boma e
Matadi), que entretanto tinham estabelecido um número de feitorias comerciais ao longo da
costa.
Com o objectivo de confirmar o seu domínio sobre a região, Portugal assinou um acordo com a
Inglaterra em 1884, em que a Inglaterra confirmava a pretensão portuguesa. Contudo, tanto
os Franceses com Leopoldo II da Bélgica montaram uma oposição muito forte contra o acordo,
não o reconhecendo de forma alguma, e até argumentando ruídos de guerra. Face à oposição
internacional e ao risco da deterioração das suas relações com o resto da Europa, incluindo o
risco de uma nova guerra, o Parlamento Inglês não reconheceu o acordo com Portugal.
2.7 A Conferência de Berlim
Com o objectivo de confirmar e haver reconhecidas as suas possessões em África,
especialmente os seus direitos históricos sobre a foz do Rio Zaire, Portugal de iniciativa própria
apelou ao Chanceler Alemão Otto von Bismark para a realização de uma conferência
internacional sobre a Bacia do Congo.
O pedido de tal conferência, que tinha sido feita por Portugaljá algumas vezes em anos
anteriores e tinha acabado em “ouvidos de mouco”, desta vez porém capturou a atenção de
Bismark, que se via preocupado com a expansão francesa e inglesa em África, e com a falta de
colónias alemãs em África.
Até aquela altura, a posição oficial (embora não a de facto) do governo alemão era que a
Alemanha não estava interessada em colónias; contudo, a rápida ascensão da Inglaterra como
potência económica através da Revolução industrial, convenceu Bismark que esta era a melhor
oportunidade para a Alemanha se lançar também na Corrida à África, com o objectivo de
assegurar fontes de matérias primas para a indústria alemã e de novos mercados para a sua
economia emergente, e também de despoletar uma situação internacional que se tornava
gradualmente mais explosiva.
A conferência teve lugar em Berlim, entre 15 de Novembro de 1884 e 26 de Novembro de
1885, durando os trabalhos quase um ano. Quatorze estados fizeram-se representar - Suécia-
Noruega (que estavam unidas até 1905), Dinamarca, Inglaterra, Holanda, Bélgica, França,
Alemanha, o Império Austro-Húngaro, Itália, Espanha, Portugal, Turquia, Rússia, e Estados
Unidos da América - dos quais a França, a Inglaterra, a Alemanha e Portugal foram os mais
protagonistas.
A conferência começou por discutir o estatuto internacional advogado para o delta do Rio
Níger e da foz do Rio Zaire, que passariam a ser abertas ao comércio internacional, e não
sujeitas a qualquer domínio colonial. Apesar do acordo atingido no que respeita à neutralidade
para a foz do Zaire, a grande bacia do Zaire, incluindo a região do Baixo Congo (imediatamente
a norte e Nordeste de Angola) passou a ser colónia privada do Rei Leopoldo II da Bélgica, sob a
bandeira do Estado Livre do Congo.
2.8 A Corrida à África
Até ao tempo da Conferência de Berlim, a presença europeia em África reduzia-se a um
número limitado de entrepostos costeiros, que tinham servido de portos negreiros durante os
350 anos do tráfico de escravos do Atlântico, com a excepção da presença portuguesa ao
longo do curso do Rio Cuanza na costa ocidental, e do Rio Zambeze na costa oriental, e da
penetração Boer na colónia do Cabo, no Transval e no Estado Livre de Orange na África austral.
É certo que a descoberta de diamantes a norte do Transval em 1867 tinha atraído um grande
número de colonos à região, representando no todo menos de 10% da superfície total do
continente. A Conferência de Berlim foi a primeira conferência global na história, na medida
em que envolveu a maioria dos estados mais desenvolvidos na época (Europa e Estados
Unidos da América), se bem que não tenha incluído qualquer estado da Ásia.
A conferência adoptou ainda o princípio fundamental de ocupação efectiva do território, pela
qual a soberania de um estado colonizador sobre um território colonial era somente
reconhecida pela comunidade internacional, se o país colonizador demonstrasse que tivesse
uma presença efectiva que pudesse proteger o comércio na colónia, tivesse uma
administração colonial e uma presença militar efectiva.
O princípio da ocupação efectiva fez da África um manto de retalhos de colónias europeias e
resultou na configuração territorial das colónias não corresponder às fronteiras dos estados
tradicionais africanos, pela qual nações africanas ficaram divididas entre várias colónias, e uma
mesma colónia incluir estados tradicionais africanos inimigo tradicionais.
2.9 Impérios e Colónias
Após a Conferência, a África ficou assim dividida: Para a Inglaterra, o eixo de colónias do Cabo
ao Cairo, incluindo o Sudão, Uganda, Quénia, Rodésia e Niassalândia (Zâmbia, Malawi, e
Zimbabwe), Bechuanalândia (Botsuana), e Suazilândia (Lesoto), e as colónias da Costa do Ouro
(Gana) e Nigéria.
A França ficou com a maior parte da África Ocidental, da Mauritânia ao Chade, e as colónias do
Gabão e do Congo Francês (Brazzaville) na África Central.
A Alemanha ficou com a colónia do Togo no Golfo da Guiné, Sudoeste Africano (Namibia), e
Tanganica (Tanzânia).
O Rei Leopoldo II da Bélgica viu confirmada a sua soberania sobre of Estado Livre do Congo
(Congo Kinshasa).
Portugal ficou com Angola na costa ocidental e Moçambique na costa oriental. A Itália ficou
com a Somalilândia (Somália) e parte da Etiópia.
A Espanha ficou com a pequena colónia da Guiné Equatorial (Rio Muni).
Introdução - Razões históricas da Presença portuguesa em África Angola e a Conferência de
Berlim.
posted by Helder Ponte | 7/28/2007 08:46:00 PM | 1 comments
3.9.1 Os Escravos de Congo e Angola e a Ascensão da Hegemonia Europeia
1. Os Escravos de Angola e a Ascensão da Hegemonia Europeia
Começamos por relembrar que, como resultado do Tratado de Tordesilhas firmado entre
Portugal e Espanha em 1494, os dois reinos ibéricos dividiram o mundo entre si, cabendo aos
Portugueses o hemisfério oriental incluindo a África com a sua riqueze em ouro e marfim, e
com o seu manancial quase infinito de mão-de-obra, e a Índia com possibilidades infinitas no
comércio das especiarias. Os Espanhóis, por seu lado, ficaram com o hemisfério ocidental que
incluia os ricos depósitos de ouro e prata nas Américas e com o comércio do Pacífico,
incluindo as Ilhas Molucas (Filipinas) no Extremo Oriente; contudo sem uma oferta
abundante, rentável e segura de mão-de-obra, que podia ser fornecida somente pelos
Portugueses.
Portugal foi o primeiro estado europeu a estabelecer colónias de base agrícola nas novas
terras descobertas, inicialmente no Atlântico (Madeira), depois em África (São Tomé) e mais
tarde na América do Sul (Brasil); contudo, com uma população relativamente escassa e tendo
em atenção o sorvedouro de gente que a empresa da Índia requeria, os Portugueses depressa
concluiram que a empresa da colónia agrícola de plantação era de facto muito rentável, mas
que requeria outra fonte de mão-de-obra que não somente colonos portugueses, descobrindo
assim o papel fundamental que o escravo africano haveria a desempenhar neste novo
sistema económico mundial.
Convém aqui lembrar que em termos relativos de emigração (emigração em relação à
população), emigraram mais Portugueses para a Índia, para o Brasil e para África, que todos os
emigrantes Espanhois, Ingleses, e Franceses juntos para as Américas.
No que respeita à fonte (oferta) de mão-de-obra, os Portugueses usaram escravos africanos
primeiro na produção de açúcar na Ilha da Madeira, e depois na Ilha de São Tomé, onde
ganharam a experiência na captura, transporte e venda de escravos africanos da costa
ocidental de África para regiões distantes.
O lucro do tráfico negreiro depressa convenceu os Portugueses a estabelecerem feitorias para
o tráfico de escravos ao longo da costa africana. Estabeleceram assim a feitoria de Arguim na
costa ocidental, e em 1481 construiram o Forte de São Jorge da Mina - um projecto de
construção verdadeiramente revolucionário para a época, pois os edifícios do forte foram
todos pré-fabricados em Portugal, e os componentes foram "reconstruídos" por um grande
contingente de pedreiros e carpinteiros portugueses, que em ecomissão de serviço, tinham
sido contratados para completar a construção do forte no local.
A Corôa portuguesa entretanto tinha aperfeiçoado o regime devenda de privilégios
reais a feitores para o tráfico negreiro nas costas de África. Esta experiência mostrou-se
valiosa nos primeiros "asientos" (contrato de fornecimento de escravos) que Filipe II de
Espanha (I de Portugal) já no tempo da União Ibérica conferiu em 1595 a negreiros de
transportarem escravos das regiões de captura em África directamente para as minas de ouro
no México, estabelecendo-se assim o que mais tarde se veio a designar pelotráfico de
escravos do Atlântico, e no qual Portugal viria a desempenhar o papel mais destacado na sua
primeira fase.
Com a derrota da Armada Invencível da União Ibérica no Canal da Mancha em 1588, Portugal
perdeu grande parte da sua marinha de guerra e mercante e com elas o seu primeiro império
colonial - a Índia. Para Portugal havia assim que reagrupar depressa e encontrar outra fonte
de riqueza essencial para o sustento da sua economia, o que se veio a concretizar com a rápida
expansão da cultura do açúcar (a famosa cana mélica do Levante) no Brasil. Nasceu assim
o segundo império português - o Brasil - que havia de perdurar até ao Grito do Ipiranga
(declaração de Independência do Brasil) em 1822.
1.1 O Escravo de Angola no Ciclo do Açúcar do Brasil no Século XVII
Como bem disse o Padre António Vieira em meados dos Séc. XVII na sua campanha de
angariar suporte para a retomada pelos Portugueses das fontes de escravos na África Central
(São Jorge da Mina, São Tomé, Loango, Cabinda, Malembo, Sonho, Luanda e Benguela)"Sem
Negros não há Pernambuco e sem Angola não há Negros!".
A mais-valia extraída do trabalho dos escravos de Angola foi o fulcro principal que sustentou
a economia açucareira do Brasil no Século XVII, a mineira no Século XVIII, e a cafeeira até aos
fins do Século XIX. Durante estes três séculos o Brasil desenvolveu um papel fundamental no
quadro da economia mundial, ao mesmo tempo que o trabalho do escravo Angolano era o
agente principal da criação da riqueza no Brasil e da contribuição deste para a economia
mundial.
Em termos estatísticos muito sumários, estima-se que durante o período do tráfico de
escravos do Atlântico (entre 1519 e 1867), tenham sido levados de Angola e da Bacia do
Congo mais the 5milhões de pessoas, a uma média mensal de cerca de 1.250 (ou média diária
de cerca de 40 escravos), perfazendo cerca de 44% da exportação de escravos de África. Cerca
de 10.000 escravos chegava em média anualmente ao Brasil. Em termos do total para o tráfico
de escravos do Atlântico, de 1519 a 1867, 11,6 milhões de homens, mulheres e crianças
foram levadas do interior de África para as Américas, 3,3 milhões morreram no percurso
entre a sua região de origem e o porto negreiro na costa, e 1,5 milhões morreram na
Passagem do Meio (travessia do Atlântico). O número total de pessoas escravizadas e
vendidas ou que morreram no tráfico do Atlântico sómente, excluindo o número de escravos
exportados para o Norte de África e estados árabes e o número de escravos exportados para o
Irão, Índia, e para o resto da Ásia, estima-se em mais de 15 milhões.
Ainda que em forma muito sumária, penso que é útil delinear aqui a estrutura da economia
mundial dos séculos XVII e XVIII e o papel que Angola e o Brasil desempenharam na mesma.
1.2 Os Holandeses no Atlântico Sul
Vazios de homens e de capitais, de equipamento e de meios de transporte, os Portugueses
tiveram que financiar a empresa do açúcar brasileiro com empréstimos concedidos por
banqueiros e comerciantes Holandeses, para a compra de equipamento produzido na
Holanda, ao mesmo tempo que o transporte do açúcar brasileiro para a Europa e dos escravos
de África para o Brasil eram feitos também em navios holandeses.
O influxo de capitais para os Países-Baixos foi por sua vez sustentado em grande parte
por Judeus (Cristãos-Novos) que tinham sido expulsos da Península Ibérica e que se haviam
refugiado nos Países-Baixos. Porém, é importante relembrar que desde os primórdios da
colonização das Américas os Holandeses adoptaram uma stratégia económica nacional com
base no comércio ultramarino. Com a fundação das companhias de comércio ultramarino (as
percursoras das actuais sociedades anónimas), os Holandeses desde a partida asseguraram o
monopólio do comércio com a Ásia, a África e as Américas no Século XVII. A sua frota marítima
era constituída por navios de maior tonelagem e de menor tripulação, o que rendia maiores
lucros, e nos finais do Século XVII a sua frota mercante era maior que as frotas da Inglaterra,
da França, da Alemanha, e de Portugal combinadas.
Pela sua oportunidade e importância, transcrevo a seguir um trecho da "Formação Económica
do Brasil", páginas 10 e 11, do Professor Celso Furtado, recentemente falecido, cuja obra
considero a mais importante de todos os economistas de língua portuguesa:
"A partir da metade do Século XVI a produção portuguesa de açúcar passa a ser mais e mais
uma empresa em comum com os flamengos, inicialmente representados pelos interesses de
Antuérpia e em seguida pelos de Amsterdã. Os flamengos recolhiam o produto em Lisboa,
refinavam-no e faziam a distribuição por toda a Europa, particularmente o Báltico, a França e a
Inglaterra.
A contribuição dos flamengos - particularmente dos holandeses - para a grande expansão do
mercado do açúcar, na segunda metade do Século XVI, constitui um fator fundamental do êxito
da colonização do Brasil. Especializados no comércio intra-europeu, grande parte do qual
financiavam, os holandeses eram nessa epoca o único povo que dispunha de suficiente
organização comercial para criar um mercado de grandes dimensões para um produto
práticamente, como era o açúcar.
... E não sómente com a sua experiência comercial contribuíram os holandeses. Parte
substancial dos capitais requeridos pela empresa açucareira viera dos Países-Baixos. Existem
indícios abundantes de que os capitalistas holandeses não se limitaram a financiar a refinação
e comercialização do produto. Tudo indica que os capitais flamengos participaram no
financiamento das instalações produtivas no Brasil bem como no da importação da mão-de-
obra escrava.
... Se se tem em conta que os holandeses controlavam o transporte (inclusive parte do
transporte entre o Brasil e Portugal), a refinação e a comercialização do produto depreende-se
que o negócio do açúcar era na realidade mais deles do que dos portugueses. Somente os
lucros da refinação alcançavam aproximadamente a terça parte do valor do açúcar em bruto."
Animados com o êxito da Companhia das Índias Orientais na Insulíndia (Indonésia actual) e
com a derrota dos Portugueses na Índia e a sua fraqueza militar e económica no Brasil e em
África, os Holandeses depressa adoptaram a mesma solução para o domínio do Atlântico Sul, o
que levou primeiro ao estabelecimento da Companhia Privilegiada da Índias Ocidentais em
1621 e àconquista de Salvador da Bahia em 1624 (retomada pelos Portugueses e Espanhois
no ano seguinte), de Recife (na Capitania de Pernambuco) em 1630, e poucos anos depois a
costa entre Sergipe e o Maranhão.
Cientes da necessidade de assegurar uma oferta abundante, segura e barata de escravos
africanos, os Holandeses tomaram aos Portugueses em 1637 o Forte de São Jorge da Mina no
Golfo da Guiné, e mais tarde em 1641 a Ilha de São Tomé e a colónia de Angola (Cabinda,
Pinda (Soyo), Luanda e Benguela), que eram já os principais portos negreiros fornecedores de
escravos na costa africana a sul do equador para a indústria do açúcar brasileira. Em 1652 os
Holandeses fundaram a Colónia do Cabo (na África do Sul de hoje) como posto de
reabastecimento ás suas carreiras para a Insulíndia e base militar para policiamento do
Atlântico Sul.
O sucesso batavo nesta empresa foi assinalável, já que por 24 anos, osholandeses tomaram
aos Portugueses as sete capitanias mais prósperas da costa brasileira, embora nunca tenham
sido capazes de expulsar completamente os Portugueses do Brasil. O apogeu do domínio
batavo do Brasil teve lugar durante o consulado do Príncipe João Maurício de Nassau (1637 a
1644), que em poucos anos transformou a cidade do Recife, capital de Pernambuco e sede do
governo holandês, numa das cidades mais modernas e cosmopolitas do mundo de então.
1.3 El Cerro Rico de Potosi
A descoberta da América por Cristóvão Colombo em 1492 e da descoberta do Brasil por
Pedro Álvares Cabral em 1500 (em que o debate está ainda em aberto se a viagem de Pedro
Álvares à costa brasileira foi acidental, se planeada, ou mesmo se Duarte Pacheco Pereira já lá
tinha chegado poucos anos antes), abriram o Novo Mundo à Espanha e Portugal. Estas
descobertas foram um tanto acidentais, pois os dois estados ibéricos encontraram as
Américas como um corolário inesperado na procura de uma rota marítima ocidental para a
Índia, e daí o termo "Índio" dado aos habitantes nativos do Novo Mundo.
Os primeiros contactos com os habitantes do Novo Mundo não levaram ao estabelecimento de
qualquer comércio de monta de imediato, ao contrário da experiência dos Portugueses em
África e na Índia. A única excepção de nota foi a exploração do pau brasil ao longo da costa
oriental da América do Sul, mais tarde designada Brasil, termo com raíz na palavra francesa cor
de braza / vermelha do pau que se passou a usar na produção de corante de tinturaria para a
crescente indústria textil francesa sediada em Rouen e na Flandres.
Os Espanhois, por seu lado, procuravam em vão uma passagem por terra para o Ocidente,
através do novo continente. A primeira colónia permanente no Novo Mundo foi estabelecida
por Cristóvão Colombo na sua segunda viagem, na costa norte da Ilha Hispaniola, onde se fez o
traçado para uma cidade, o governo municipal foi estabelecido, e terra foi dividida entre os
colonos espanhois, que com a atribuição da terra, recebiam também um número de nativos
para trabalhar a terra (encomienda).
A cana de açúcar foi introduzida cedo na Ilha Hispaniola (hoje República Dominicana e Haiti)
em 1493, e em 1520 havia 28 engenhos activos na produção de açúcar. Em 1513 foi
encontrado ouro na costa sul da Hispaniola, o que despertou o interesse da corôa espanhola.
Ainda em 1513 Juan Ponce de Leon reconheceu a costa da Florida e Vasco Nunez de
Balboa atravessou o istmo do Panamá e avistou o Oceano Pacifico. Em 1516 Juan Díaz Solis
explorou a foz do Rio da Prata. Em 1518 a costa da Península do Yucatan foi reconhecida
porFranciscoHernandez de Córdoba e Juan de Grijalva.
Após Fernão de Magalhães ter provado em 1521 através da sua viagem de circum-navegação
que as Molucas (parte do arquipélago das Ilhas Filipinas) se podia atingir pelo ocidente, a
estratégia colonial espanhola mudou. Constatada que foi a duração e custo de tal viagem, a
corôa espanhola concentrou os seus esforços na procura de metais preciosos no Novo Mundo,
e relegou para segundo lugar a preocupação de competir com os Portugueses no comércio das
especiarias da Insulíndia. Como sabemos Fernão de Magalhães não chegou a cumprir a
viagem pois foi morto numa escaramuça com os nativos das Ilhas Cebú, o que não lhe tira o
crédito de ter planeado e comandado a expedição mais difícil até hoje realizada na
exploração do planeta.
Em 1521 HernánCortés conquistou o México e surpreendeu o mundo com a quantidade de
ouro e prata obtida dos povos conquistados, com valor muito superior a qualquer comércio de
especiarias com a Índia. A conquista do México mudou a estratégia dos Espanhois no Novo
Mundo. Não importava jamais procurar e desenvolver o comércio, já que a riqueza em ouro e
prata tudo suplantava. Assim, assistimos à acção dos Conquistadores em procura do El Dorado,
que com colunas militares relativamente pequenas conquistaram impérios imensos no Novo
Mundo.
A conquista da América Central foi completada em 1525, e por cerca de 1543, os Espanhois
dominavam mais de metada do território da América do Norte, entre as Carolinas na costa
atlântica e o Oregon na costa do Pacífico. Em 1531 Francisco Pizarro completou a conquista
do Império Inca e surpreendeu ainda mais o mundo com a riqueza em ouro e prata do despojo
da conquista de Cuzco e MachuPichu, em valor muito mais elevado que o arrecadado por
HernánCortés no México.
Devido à sua riqueza o Perú passou desde a sua conquista a ser o centro principal da expansão
Espanhola nas Américas. Por outro lado, nas Caraíbas, a cidade de Havana, fundada em 1519
desde cedo se tornou o centro da expansão Espanhola nas Caraíbas, e Buenos Aires, fundada
em 1536, tornou-se o centro da expansão do interior da América do Sul, a partir da foz do Rio
da Prata. Em 1545 os Espanhois descobriram a mina de prata de Potosi, numa região remota e
montanhosa do Perú (na região que mais tarde se havia de chamar Bolívia), talvez a mina mais
rica do mundo. Outras descobertas de minas muito ricas se fizeram em seguida, tornando-se a
América Espanhola o maior produtor de ouro e prata do mundo de então.
A riqueza em ouro e prata do Perú e do México foi decerto o elemento chave do arranque
económico do império Espanhol no Novo Mundo; contudo, a agricultura e pecuária foram as
actividades que possibilitarm a dominação efectiva dos Espanhois sobre um território tão
vasto. A mão-de-obra nativa, utilizada inicialmente na forma de "encomiendas" provou não
ser solução suficiente para a crescente procura de mão-de-obra para trabalhar as minas.
Tornou-se então necessário recorrer ao trabalho escravo de africanos, que em número sempre
crescente, depressa substituíu a mão-de-obra nativa (Índia).
Assim, no Novo Mundo os escravos africanos depressa não eram só essenciais à produção de
açúcar do Brasil; eles tornaram-se tambémimprescindíveis às minas de ouro do e prata do
México, e às minas de prata do Perú e da Bolívia (a serra de prata de Potosi). Em termos
muito sumários as minas da América Espanhola absorveram durante o período do tráfico de
escravos do Atlântico mais de 2,6 milhões de africanos (à razão de cerca de 7.500 por ano), o
que levou a União Ibérica (Espanha e Portugal) a concentrar os seus esforços na reconquista
imediata da Bahia, Pernambuco e Maranhão aos Holandeses.
Assim, em 1625, coadjuvados pelos Espanhois, os Portugueses conseguiram reunir a mais
poderosa esquadra naval jamais vista no Atlântico Sul (52 navios e 12.000 homens)
e reconquistaram Salvador da Bahia (que era a sede do poder Português no Brasil), e com
a ajuda dos Portugueses do Rio de Janeiro, reconquistaram Luanda, Benguela e São Tomé
em 1648.
Contudo, os Holandeses mantiveram o controle sobre os dois portos negreiros estratégicos
do Forte de São Jorge da Mina e de Loango, que dominavam o comércio negreiro no Golfo da
Guiné. Este esforço veio a materializar-se com a expulsão definitiva dos Holandeses de Angola
e São Tomé em 1648 e do Brasil (Recife, Pernambuco) em 1654, e a consequente restauração
do domínio português (mais própriamente, o domínio brasileiro) do Atlântico Sul.
1.4 Salvador Correia de Sá e a Restauração do Domínio Português no Atlântico Sul
XXXXX - Ainda em desenvolvimento
1.5 A Ascensão da Economia de Plantação nas Antilhas
Depois da sua expulsão do Brasil, mas ainda cientes do seu controle sobre a economia
açucareira, os Holandeses deixaram o Brasil mas não sem levarem consigo a tecnologia, o
capital, o equipamento, e as fontes de escravos africanos, e mudaram-se para as Antilhas,
onde depressa estabeleceram plantações que em poucos anos suplantaram o volume de
produção do açúcar brasileiro, o que veio a resultar numa baixa mundial de preços do açúcar
muito longa que se traduziu numa crise económica muito longa e profunda da economia
açúcareira brasileira da qual jamais se haveria de recuperar.
De facto, com fontes de capital e mão-de-obra asseguradas, com maquinaria e equipamento
novo e mais moderno, e com custos de transporte mais baixos do açúcar para a Europa e as
Colónias Americanas devido à maior proximidade entre as regiões produtoras (Antilhas) e as
de consumo (Europa), os Holandeses depressa retomaram o comando da produção e
comércio mundial de açúcar, e com isto despertaram o interesse da Inglaterra e da França
para fazerem o mesmo, deixando os Portugueses no Brasil na difícil posição de terem de
competir num mercado em que os preços estavam numa baixa de longa duração, enquanto os
seus custos de produção continuavam a cresecer, e a distância de mercados obrigava a custos
de transporte mais elevados.
Seguindo o exemplo dos Holandeses, em breve os Ingleses e Franceses tomaram aos
Espanhois as ilhas mais importantes nas Antilhas, com a excepção das ilhas de Cuba e Porto
Rico, estabelecendo promissoras colónias de plantação de açúcar no Haiti (França), na
Jamaica e em Barbados (Inglaterra). Com um excedente de população relativamente grande,
a Inglaterra depressa copiou e expandiu o modelo de plantação de açúcar levado pelos
Holandeses para as Antilhas, que passou a incluir também plantações de tabaco e anil nas
ilhas, e de algodão nas Colónias Americanas mais meridionais (Virginia, as Carolinas e a
Geórgia) no continente americano.
Antes de recorrerem ao tráfico de escravos africanos através do Atlântico, os Ingleses usaram
primeiro o excedente da sua própria população nas suas Ilhas Britânicas com fonte principal
de mão-de-obra para as suas novas colónias nas Antilhas e na América. Como resultado das
profundas transformações económicas na agricultura inglesa (o regime de propriedade
cercada (enclosures) para a criação de grandes rebanhos de carneiros para a produção
industrial de lã nas cidades), grande número de trabalhadores da terra viram-se sem
possibilidades de sobrevivência nos campos, não tendo outro recurso senão tentarem melhor
sorte nas cidades, para onde emigravam em grande número, e oferecerem a sua força de
trabalho no Novo Mundo através de contratos de regime de servidão temporária de cinco a
sete anos (indenture), a troco do pagamento da passagem, comida e dormida durante o termo
do contrato, e no final deste, um pedaço de terra no Novo Mundo, ou um pequeno montante
em dinheiro, que podiam investir eles próprios em pequenas fazendas ou comércio.
É importante salientar aqui que as condições de trabalho para os trabalhadores ingleses em
regime de servidão temporária nas Antilhas e nas Colónias Americanas não eram melhores
que as do escravo africano, na medida em que o trabalhador em regime de servidão
temporária era mais barato que o escravo de África, e a sua oferta em número era muito
maior que a procura. A estes factores devemos adicionar o facto que os donos das plantações
de açúcar viam os trabalhadores em regime de servidão temporária como possível
concorrência à sua posição de poder no quadro económico local e regional, de forma que
nunca fizeram o tempo do contrato um período aprazível ou atraente ao trabalhador
emigrante.
Porém, devido à concorrência militar entre a Inglaterra e a França no Novo Mundo, e ao
estado mais ou menos constante de guerra entre elas, este excesso de população passou a ser
usado também na guarnição de fortes espalhados pelo mundo e no número crescente de
navios de guerra necessários para manter a sua hegemonia, em vez de continuar a ser
canalizada para a economia de plantação nas Antilhas. Esta redução crescente da oferta de
mão-de-obra para as plantações nas Antilhas e na América levou a Inglaterra e a França a
embarcar também no negócio do tráfico de escravos africanos em grande escala, e que em
breve haviam de desafiar a supremacia histórica portuguesa no tráfico negreiro.
1.6 O Desenvolvimento das Colónias Inglesas na América
Com o rápido desenvolvimento económico e populacional das Antilhas, os Ingleses
encontraram nas colónias da Nova Inglaterra (New England - Maine, New Hampshire,
Massachussets, Rhode Island, New York, Pennsylvania, Delaware e Maryland), a região ideal
para a produção de artigos de consumo e de capital (cereais, batata, madeira, vestuário,
ferramentas, equipamento, e navios) para venda nas Antilhas, a um preço mais baixo que os
produtos produzidos na Europa, já que os custos de mão-de-obra eram mais baixos na
América e o custo do frete marítimo era muito menor, devido a maior proximidade da
América em relação às Antilhas, do que a distância longa e perigosa entre as Antilhas e a
Europa.
Da interacção de todos estes factores resultou o rápido desenvolvimento económico e
populacional das Colónias Americanas, que cedo se estabeleceram com o mercado fornecedor
da maioria dos bens necessários (bens de consumo e de capitais) às economias de plantação
nas Antilhas e as colónias emergentes no centro e sul do continente norte-americano. Do
mesmo modo, as colónias do Sul (Virgínia, Carolinas e Geórgia) cedo se especializaram na
produção de tabaco, arroz, e, principalmente, algodão, que em breves anos se tornaram a
principal região produtora de algodão e abastecedora das economias emergentes no Novo
Mundo, em África, e principalmente na Europa.
1.7 O Ciclo do Ouro no Brasil
A descoberta de ouro no Rio das Velhas (Ouro Preto) e em Vila Ricanos últimos anos do Século
XVII e de diamantes em 1723 em Cerro do Frio, na Capitania de Minas Gerais, no Brasil, anos
mais tardesalvou a independência política de Portugal por mais de um século, ao mesmo
tempo que, irónicamente, relegou a economia lusitana para um estado de
subdesenvolvimento crónico que havia de perdurar quase três séculos.
Isto porque os rendimentos do "quinto" arrecadado do ouro do Brasil pela corôa portuguesa
foram suficientemente abundantes para Portugal poder continuar como estado independente,
ao mesmo tempo que enfeudaram a economia portuguesa ao domínio da inglesa, através dos
tratados de 1654 e de Methuen em 1703, pelos quais o suporte militar inglês era garantido a
custo da ausência completa de qualquer indústria agrícola ou transformadora de relevo em
Portugal e sujeição absoluta à indústria inglesa.
Assim, o ouro do Brasil não parava sequer em Lisboa; era imediatamente re-exportado como
pagamento para as importações inglesas, ao passo que o papel de Portugal na economia
europeia era reduzido à produção de vinho do Porto para exportação, cuja indústria e
comércio eram por sua vez controlados por mercadores ingleses.
1.8 O Escravo Angolano na Economia Mineira do Brasil
YYYY - Ainda em desenvolvimento
"O Brasil era o paraíso para o Mulato, Purgatório para o Branco, e Inferno para o Negro"
Eduardo Bueno "Terá sido o pior lugar do mundo, o ventre da besta e o bojo da fera, embora
para aqueles que eram responsáveis por ele, não estavam lá, fosse o mais lucrativo dos
depósitos e o mais vendável dos estoques. No porão dos navios negreiros que por mais de
trezentos anos cruzaram o Atlântico, desed a costa oeste de África até à costa nordeste do
Brasil, mais de três milhões de africanos fizeram uma viagem sem volta, cujos horrores
geraram fortunas fabulosas, ergueram impérios familiares e construíram uma nação. O bojo
dos navios da danação e da morte eram o ventre da besta mercantilista: uma máquina de
moer carne humana, funcionando incessantemente para alimentar as plantações e os
engenhos, as minas e as mesas,a casa e a cama dos senhores - e, mais do que tudo, os cofres
dos traficantes de homens.
... um único exemplo. Em 1841, a belonave inglesa Fawn, capturou na costa brasileira, o navio
Dois de Fevereiro. Desde 7 de Dezembro de 1831, o tráfico era ilegal no Brasil e navios de
guerra britânicos patrulhavam o litoral. Após a apreensão do tumbeiro, o capitão do Fawn
anotou, no diário de bordo a cena com o qual se deparou nos porões da embarcação: "Os vivos,
os moribundos e os mortos amontoados numa única massa. Alguns desafortunados no mais
lamentável estado de varíola, doentes com oftalmia, alguns completamente cegos; outros
esqueletos vivos, arrastando-se com dificuldade, incapazes de suportarem o peso dos seus
corpos miseráveis. Mães com crianças pequenas penduradas em seus peitos, incapazes de
darem a ela uma gota de alimento. Como os tinham trazido até aquele ponto era
surpreendente: todos estavam completamente nús. Seus membros tinham escoriações por
terem estado deitados sobre o assoalho durante tanto tempo. No compartimento inferior o
mau-cheiro era insuportável. Parecia inacreditável que seres humanos sobrevivessem naquela
atmosfera".
1.9 Portugal, a Inglaterra e o Tratado de Methuen
Por outro lado, o que restava da riqueza do ouro foi aplicada em Portugal em investimentos
supéfluos e retrógrados como o Convento de Mafra, em vez de serem canalizados para
investimentos na agricultura, na indústria ou na renovação da frota marítima, que haveriam de
valorizar a economia. Para a Inglaterra, os lucros imensos das exportações para Portugal
foram um factor chave para a rápida industrialização inglesa, pois permitiram uma
acumulação de capital muito rápida e extensa, o que constituiu o impulso inicial para a
Revolução Industrial Inglesa já nos princípios do Século XIX.
O Marquês de Pombal caracterizou bem esta relação económica quando disse "que a
Inglaterra havia reduzido Portugal a uma situação de dependência, conquistando o reino sem
os incovenientes de uma conquista militar, em que Portugal tinha de importar tudo",
relembrando até que "os escravos que trabalhavam nas minas do Brasil tinham que ser
vestidos pelos Ingleses"(citado por Celso Furtado).
Por outro lado e ainda citado por Celso Furtado, o historiador inglêsW.
Cunningham nasuaobra "The Growth of Modern Industry and Commerce, Modern Times",
Cambridge, 1921, caracterizoumelhorosbenefíciosdesteacordoeconómicopara a
Inglaterraquandodisse: "To extent to which Portugal took off our manufacturers, and thus
encouraged industry in this country, appeared to be measured by the vast amount of Brazilian
bullion which was annually imported from Portugal. This was estimated at 50,000 Pounds per
week... We cannot wonder that, according to the ideas of the time, Methuen's achievement
was rated very high: he had opened up a large foreign demand for our goods, and had
stimulated the employment of labour at home; while much of the returns from Portugal came
to us in the form which was most necessary for restoring the currency, and most convenient for
carrying on the great European War", e Alan Manchester nasuaobra "British Preeminence in
Brazil, Its Rise and Decline", publicadaem 1933, afirmouque o comércioportuguês era "at the
present time the most advantageous that we drove anywhere, the very best branch of all our
European commerce".
Como resultado do afluxo ao mercado de quantidades imensas de ouro do Brasil à Inglaterra
(via Portugal), Londres substituiu Amsterdão como o maior centro financeiro do mundo,
lugar cimeiro que havia de ocupar por mais de duzentos anos.
Referência Bibliográfica
Se quiseres aprofundar o estudo desta época tão importante para a hegemonia europeia da
economia mundial, sugiro a consulta dos textos do Professor Celso Furtado "Teoria e Política
do Desenvolvimento Económico", edição portuguesa das Publicações Dom Quixote, Lisboa,
1971, o clássico "Formação Económica do Brasil" 17a. edição da Editora Nacional, São Paulo,
1980, e "A Economia Colonial no Brasil dos Séculos XVI e XVII", publicado pela Editora
Hucitec, São Paulo, 2000;
Recomendo ainda a consulta da obra extensa do Professor Charles Ralph Boxer, também
recentemente falecido, da qual realço o clássico "The Portuguese SeabornEmpire 1415 - 1825"
originalmente publicado em 1969, e recentemente publicado pela editora Carcanet em
cooperação com a Fundação Calouste Gulbenkian e a Comissão Nacional para as
Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. Esta obra é talvez a melhor análise da
expansão portuguesa no mundo, e está traduzida em Português, tendo sido publicada no Brasil
e em Portugal;
a obra "Salvador de Sá andtheStruggle for Braziland Angola 1602 - 1686", publicada pela
Universityof London e a AthlonPress, London, 1952; e a obra "The Golden Age ofBrazil -
Growing Pains of a Colonial Society 1695 - 1750", publicada pela St. Martin'sPress, New York,
1995.
Sugiro ainda a consulta de dois estudos muito bons de história económica: a obra clássica de J.
Lúcio de Azevedo "Épocas de Portugal Económico", 3a. edição da Livraria Clássica Editora,
Lisboa, 1973; a obra fundamental do Professor Vitorino Magalhães Godinho "Os
Descobrimentos Portugueses e a Economia Mundial", 2a edição publicada pela Editorial
Presença, em Lisboa, 1983;
E, finalmente, a obra de Caio Prado Júnior "Histórica Económica do Brasil", publicado pela
Editora Brasiliense, 46a. reimpressão, São Paulo, 2004.
Recomendo sobretudo a leitura da obra magnífica de divulgação histórica de Eduardo
Bueno "Brasil: uma história - a Incrível Saga de um País", 6a. impressão da Editora Ática, São
Paulo, 2005, pois além do seu excelente conteúdo, nos presenteia com uma colecção
impressionante the gravuras e imagens da história do país irmão.
posted by Helder Ponte | 7/28/2007 08:44:00 PM | 4 comments
SATURDAY, JUNE 02, 2007
3.10 Linguagem, Estilo, Ortografia e Toponímia
Longe que estou do convívio quotidiano falado e escrito da língua portuguesa, foi por
vezes difícil encontrar soluções para um grande número de questões de linguagem, estilo,
ortografia e toponímia. O que a seguir descrevo são apenas as soluções um tanto arbitrárias e
nem sempre consistentes que optei para algumas questões de língua e de escrita. Espero
assim que a sua explicação aqui ajude o leitor a deliciar mais e compreender melhor este
tópico tão extenso e complexo.
1. Obra Solitária
O relatar desta Viagem Pela História de Angola foi uma tarefa solitária. Há mais de trinta anos
removido que estive da língua portuguesa, das novas regras de ortografia, dos novos nomes
para lugares, da linguagem corrente em Angola e Portugal, ao que se acrescentou a dificuldade
de escolher qual o estilo mais próprio para melhor trasmitir ideias ou processos diferentes,
não foi sem desafios que a obra prosseguiu.
Não tive o benefício de ter um editor para rever o que escrevia, nem sequer para discutir
ideias antes de as incluir no texto. Embora ajudado um pouco pelo processador de texto
(WordPerfect e Microsoft Word), às vezes perdi o acesso ao teclado em português, tive que
recorrer a soluções que tornaram mais difícil o manuseamento de texto.
A fim de ultrapassar a maioria destes desafios, optei por uma estratégia de revisão contínua de
texto, sempre que encontrava um êrro ou recebia a dica de alguém a apontar uma correcção.
Assim, este é um trabalho que está em construção perpétua, que depende necessariamente
dos comentários e sugestões dos leitores pacientes que embarcam comigo nesta Viagem.
As restrições na escolha e colocação de imagens nos blogs limitaram em certa medida o
recurso à imagem visual, que teve que ser substituída pelo texto descritivo ou conceptual.
Contudo, esforcei-me sempre por encontrar um balanco entre o texto e a imagem, de forma a
tornar a leitura mais simples e "arejada" (menos densa).
2. Língua Portuguesa
Talvez mais do que o francês e o espanhol, mas certamente menos que o inglês, o português é
hoje uma língua internacional, "personalizado" fortemente em cada país em que é falado.
Assim, o português falado em Angola é muito diferente do português falado no Brasil, em
Moçambique , ou mesmo em Portugal. Em cada um desses países, fala-se um português
diferente, não só recorrendo extensivamente termos locais, mas até na construção de frases
ou do discurso.
Esta variedade de sotaques reflectiu-se necessariamente no texto que é apresentado ao leitor.
Contudo, achei por em basear o texto num portguês mais estabelecido, pelo que escolhi o
português falado em Portugal, que é mais antigo, mais estruturado, e mais universal, em
detrimento do português falado em Angola, que é mais local e que está atravessando
correntemente transformações profundas, e que do qual tinha muito menos fontes de
referência.
Assim, a língua que usei neste trabalho é a portuguesa (de Portugal, e não de Angola ou do
Brasil), se bem que usei alguns termos caracteristicamente angolanos nalgumas passagens.
Evitei assim o uso do "k", do "w", e do "y", letras que não fazem parte do alfabeto português,
embora de uso muito corrente no português falado e escrito actualmente em Angola. Em
certas passagens transcrevi trechos de texto original num português mais arcaico que já não se
encontra em uso.
3. Toponímia
No que respeita à toponímia, usei tanto quanto possível os nomes de vilas, cidades e regiões
de uso corrente em Angola, com os nomes correspondentes da idade colonial normalmente
em parentesis, ou vice-versa. Contudo, em muitas situações, como é o caso do nome dos rios,
usei os nomes escritos ainda à maneira do tempo colonial, com "C", em vez de "K", como
Cuanza (em vez de Kuanza), e a segunda letra com "u" em vez de "w", como em Cuanza em vez
de Kwanza.
A divisão administrativa de Angola alterou-se pouco depois da Independência, o que facilitou
muito a referência a distritos e regiões que mantiveram o mesmo nome. Contudo, numa
perspectiva mais local, embora tenha acesso à divisão dos concelhos em "postos" (mais ou
menos equivalentes a "freguesias" em Portugal), foi para mim muito difícil encontrar os nomes
actuais para povoados, sanzalas, e "postos", pois alguns já não existem, e outros mudaram de
nome que não consegui encontrar.
Por falta de tradução própria de certos nomes internacionais para português, usei a
terminologia internacional corrente. Em alguns casos porém, continueir fiel à terminologia
portuguesa; usando o termo "Congo" em vez de "Kongo" e de "Cuíto" em vez de Kuíto.
Ainda como limitações muito importantes na preparação desta Viagem Pela História de
Angola, não tive acesso a nenhum atlas corrente de Angola, bem como não tive disponível um
prontuário ortográfico português para consulta, nem tive o benefício de usar um editor
profissional, pelo que o leitor encontrará decerto algumas faltas que me perdoará.
4. Estilo
Devido à natureza breve e ligeira deste trabalho, usei um estilodescritivo e não analítico, se
bem que sucinto. Na maioria das situações o leitor encontrará os factos, e por vezes não
encontrará as razões, se bem que me preocupei em as avançar sempre que possível.
Contudo, devido à sua própria natureza, especialmente no estudo de "Angola" nos diversos
aspectos multidisciplinares, e no estudo de "história" como ciência e conhecimento, usei um
enfoque analítico, muito mais útil à compreensão mais fácil das ideias e conceitos que me
proponho a avançar.
5. Cronologia
Em termos da sequência dos tópicos abordados, segui de uma maneira geral um
encadeamento cronológico dos tópicos na apresentação do trabalho; embora, para melhor
exposição de ideias e relações, tenha também tratado a maioria dos tópicos em grupos, sem
maior obediência ao rigor cronológico. Esta aglomeração de tópicos em "grupo" (clusters em
inglês) facilita grandemente a explicação e a compreensão dos tópicos expostos.
Assim, na cobertura de certos tópicos, "saltamos" às vezes no tempo, não cobrindo o
continuum do tempo por completo. A cobertura da História de Angola não se reduz só à
descrição de acontecimentos isolados ao longo dos tempos; com efeito, ela acontece no
espaço (geografia), no tempo (cronologia), e no processo de pensamento (teoria) usado na sua
explicação.
posted by Helder Ponte | 6/02/2007 08:19:00 PM | 1 comments
MONDAY, MAY 29, 2006
3.9 Angola na História do Mundo
Mencionei já nesta Viagem que o estudo da História de Angola não ocorre num vácuo, ou
numa proveta de laboratório, nem se limita ao que aconteceu em Angola sómente. O seu
estudo tem que ter em atenção o que se passou ou passava nos estados ou povos mais
chegados a Angola ao longo dos tempos. Precisamos assim de relacionar Angola com o resto
do mundo, e investigar as influências que recebeu do exterior e a influência que exerceu nos
povos da África Central, no Atlântico Sul, nas Américas, na Europa, e mesmo no mundo; em
poucas palavras, é necessário enquadrar a História de Angola na História Universal.
Assim é importante relacionar a História de Angola com a história dos povos Bantos que cedo
se estabeleceram no que hoje chamamos território de Angola; com a história
de Portugal como potência colonial de cinco séculos; com a história do Brasil, nação irmã e
cliente mais importante na parceria do tráfico de escravos - onde hoje há mais descendentes
de africanos do que africanos em Angola; e com a própria história geral de África - seja de
povos próximo como os do Congo ou de São Tomé, ou de sociedades ou culturas mais
distantes no espaço e no tempo, como oacivilizaçãoSuahili na costa oriental de África ou
mesmo da República daÁfrica do Sul nos tempos mais recentes.
É ainda necessário relacionar a História de Angola com a história atlântica e de todos os seus
povos ribeirinhos, como a América Latina (antigas colónias de Espanha e Portugal), as Antilhas,
a Holanda, a Inglaterra, a França, e até os Estados Unidos da América; de realçar o papel do
tráfico de escravos angolanos na economia mundial do século XVI ao século XIX.
É bom lembrar que desde a sua imersão na economia e história mundiais nos finais do Século
XV, os povos de Angola, embora hoje um pouco arredados dos centros de decisão mundial,
estiveram nocerne de três grandes desenvolvimentos da história da humanidade nos últimos
quinhentos anos. A saber,
a) Os escravos levados de Angola e da bacia do Congoaguentaram durante mais de 350 anos a
carga mais difícil na construção do Novo Mundo (Brasil, Antilhas e Estados Unidos) e
alimentaram a riqueza económica e preponderância política da Europa durante o mesmo
período;
b) As disputas territoriais em Angola entre Portugal (Lunda, Foz do Zaire, costa da região do
Ambriz, e bacia dos rios LunguéBungo e Zambeze no Moxico) e Leopoldo II da Bélgica (Lunda e
Katanga, Estado Livre do Congo) foram o pomo de discórdia que levou à realização
da Conferência de Berlim onde a consequente partilha de África teve lugar e onde nasceram
os impérios coloniais europeus que haviam de perdurar cerca de um século; e,
c) Foi nas chanas das Terras do Fim-do-Mundo em Angola(Cuito Cuanavale) que se travaram
as batalhas finais mais decisivas da Guerra Fria , o que eventualmente resultou
nodesmoronar dos bastiões brancos em África (Rodésia, Sudoeste Africano e o regime
de apartheid na República da África do Sul), e na queda final da experência marxista-
leninista de 70 anos da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) na Europa Oriental e
Ásia Central.
Assim, vamos rever em mais detalhe nos próximos três capítulos cada um destes três
i,portantes desenvolvimentos históricos de forma a podermos compreender melhor o papel de
Angola na história da humanidade.
Nota ao Leitor:
Encontrarás nesta Viagem algumas vinhetas cujos temas não aparentam uma ligação directa
ou imediata com a História de Angola; contudo elas são importantes para uma melhor
compreensão do que pretendo expôr. Estas vinhetas expõem o contexto regional, global e
temporal em que a História de Angola se desenrolou, ajudando assim a enriquecer a nossa
compreensão dos factores externos mais relevantes que a moldaram.
posted by Helder Ponte | 5/29/2006 05:54:00 PM | 1 comments
3.8 Tanta História Ainda por Contar...
1. Muito Ainda Está por Estudar e Escrever
Apesar do grande esforço de um bom número de investigadores de história, o conhecimento
da História de Angola é ainda hoje muito incompleto. Com efeito, podemos dizer que a
história completa de Angola está ainda por escrever, pois existem muitas lacunas muito
extensas no seu corpo de conhecimento. Há períodos completos ou grupos étnicos inteiros
sobre os quais pouco ou nada se sabe da sua história. Como exemplos citamos apenas a
história de alguns povos bantos que vieram ocupar Angola, e ainda menos o que se sabe sobre
a história pré-Banta de Angola.
No caso específico desta Viagem Pela História de Angola, menciono o exemplo das migrações
dos povos Bantos e o seu impacto nas populações que até aí ocupavam o território de Angola,
que desconhecemos quase completamente. De facto, com a excepção do corpo magro de
conhecimento arqueológico muito escasso de estudos sobre o Antigo Reino do Congo e de
alguns povos do planalto e da savana, e da pesquisa sobre o tráfico de escravos e sobre as
Campanhas Militares de Ocupação, pouco mais se sabe, pois não existe ainda um corpo de
conhecimento histórico organizado estabelecido para os outros povos de Angola.
Para o Português dos Séculos XVI ou XVII interessado na história dos Antigo Reino do Congo e
do Reino de Ndongo (Angola), o estudo da história (ou melhor, da pré-história) destes povos e
os seus percursores na região representava um desafio considerável, já que o modelo de
criação com base na Bíblia Judeo-Cristã que explicava a história dos povos da Europa e do
Próximo-Oriente do seu tempo, o não podia acomodar e muito menos explicar, e a ausência de
fontes escritas revelavam-se como uma parede intransponível para o estudo efectivo da sua
história. Desde cedo ele reconheceu a utilidade e limitações da história oral, e a dificuldade
(quase impossibilidade) em estudar os povos que habitaram a região antes da chegada dos
povos de língua Banta.
Em termos de cobertura historiográfica para todos os povos de Angola, os Antigos Reinos do
Congo e de Ndongo são decerto os que receberam mais atenção dos historiadores. De facto,
as fontes de história para estes reinos desde o início do contacto com os Portugueses até ao
final do Século XVII são relativamente abundantes, comparando com outras regiões e povos de
África a sul do Sahara. Após a abolição da escravatura e do tráfico houve um ressurgimento de
estudos e fontes para as regiões de Luanda, Ambaca, Congo, Cabinda, Benguela, Lundas e
Moçâmedes, e após a Conferência de Berlim as fontes são melhores na cobertura das
Campanhas Militares de Ocupação, embora essas fontes realcem a perspetiva portuguesa e
não cubram a angolana.
Contudo, quase não existem fontes primárias para a história dos povos Ovimbundo,
Nganguela, Nhaneca-Humbe, Ambó, Herero, Xindonga e os povos pré-Bantos (Khoisan, Cuepes
e Cuíssis) desde a sua chegada ao que é hoje o território de Angola até a um passado muito
recente (meados do Século XX).
Na verdade, para a maioria dos povos de Angola, não sabemos exactamente quem eram,
como e quando chegaram, como se formaram, e quanto mudaram desde o tempo do seu
relacionamento inicial com outros povos que já lá viviam.
Para colmatar algumas destas lacunas é importante que estudemos a extensa documentação
existente nos arquivos históricos em Angola, em Portugal e no Brasil.
2. Trabalhos de Estudiosos Estrangeiros
É também necessário traduzir e divulgar em língua portuguesa algumas obras de importância
extraordinária para o estudo da História de Angola publicadas no estrangeiro, como os
trabalhos de E. G. Ravenstein, Heli Chatelain, Monsenhor Cuvelier e Louis Jadin, Edgar
Prestage, C.R. Boxer, J.D.Fage, R.A. Oliver, Jan Vansina, DesmondClark, Douglas Wheeler,
Georges Balandier, James Duffy, MerlinEnnis, Basil Davidson, David Birmingham, Gerald
Bender, John Thornton, Phyllis Martin, Joseph Miller, Lawrence Henderson, GladwinChilds,
PhilipCurtin, Eugene Genovese, Herbert Klein, Patrick Manning, Paul Lovejoy, Gervase
Clarence-Smith, René Pelissier, David Eltis, Franz-WilheimHeimer, BeatrixHeintz, Linda
Heywood, Robert Blackburn, A.J. Russell Wood, Marc Ferro, Susan Broadhead, Anne Hilton,
John Reader, Marq de Villiers, e José Curto, e outros estudiosos tornando-as assim mais
disponíveis ao estudioso lusófono da História de Angola.
3. Trabalhos de Historiadores Brasileiros
É ainda essencial a divulgação das obras de estudiosos brasileiros como Gilberto Freire, Celso
Furtado, Caio Prado Júnior, Josué de Castro, Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, Sérgio
Buarque da Holanda, Luís Pereira, Henrique Fernando Cardoso, Maria Beatriz Nizza da Silva,
Kátia de Queiroz Mattoso, Décio Freitas, Jaime Rodrigues, Luis Felipe de Alencastro, Marina de
Mello e Souza, e Eduardo Bueno, que apesar de incidirem sobre o estudo da história do Brasil,
abriram novos caminhos para uma compreensão mais completa da História de Angola.
4. História da África Central
Angola está inserida a África Central, pelo que se torna importante ao estudioso da sua
História saber relacionar acontecimentos e tendências em Angola com os ocorridos na África
Central e vice-versa, relacionar acontecimentos e desenvolvimentos na África Central e como
estes influenciaram a História de Angola.
Assim, penso que é útil referir a obra de alguns estudiosos que se salientam neste campo
especial da História. Em primeiro lugar cabe-me citar o nome de Jan Vansina que desde a
década de cinquenta do século passado produziu talvez a obra mais abundante e fecunda
sobre a África Central. Eu penso que a leitura da sua obra é imprescindível não só ao estudo da
África Central, como também ao estudo da História de Angola. Torna-se assim obrigatória a
leitura da sua obra "KingdomsoftheSavanna" para quem quiser aprofundar conhecimentos
sobre a pré-história dos antigos estados do Congo, Luba, Lunda, Cazembe, e Lozi. Se quisermos
aprofundar o conhecimento sobre a história do Antigo ImérioKuba, a leste do Rio Cuango e
vizinho de Angola, sugiro a leitura da sua obra "TheChildrenoftheWoot". A sua obra "Paths in
theRainforest" é por muitos considerada o melhor estudo de pré-história dos povos antigos
que habitavam o território hoje designado com África Equatorial, que compreende os
territórios do sul dos Camarões, Gabão, Guiné Equatorial, Congo (Brazzaville), Burkina Fasso
(República Centro Africana), Zaire, e até Cabinda. De capital importância para o estudo da pré-
história do Antigo Reino do Congo e dos povos ao longo do Quanza é a obra (já clássica) de
Vansina "HowSocieties Are Born - Governance in West Central Africa Before 1600", em que
Vansina combina evidência arqueológica com linguística histórica para explicar a evolução de
pequenos núcleos de população espalhados pelo território, em sociedades que partilhando a
mesma raíz linguística, deram origem aos estados organizados que os Portugueses lá
encontraram no Séc. XVI. Assim, em termos do estudo da História de Angola, a sua obra
"HowSocieties Are Born" é essencial, pois nesta obra Jan Vansina oferece o melhor estudo
sobre a pré-história dos povos que viveram na região a que hoje chamamos Angola.
A obra de Jan Vansina não é só importante no estudos dos povos da África Central, pois a sua
obra é também por muitos considerada como a que abriu caminho ao estudo da etno-história,
às relações entre a linguística e a história, e à aceitação da história oral como um instrumento
efectivo e válido no método do estudo da história.
Duas obras de grande relevo para uma melhor compreensão da História de Angola,
especialmente da sua paleo-história e proto-história, são as obras de DesmondClark "ThePre-
Historyof Africa" e "ThePre-Historyof Southern Africa". Não posso de modo algum deixar de
mencionar aqui a importante obra do saudoso Dr. Carlos Ervedosa "Arqueologia de Angola",
que é sem dúvida a melhor introdução em português à arqueologia do território a que mais
tarde se veio a chamar Angola.
Outras obras importantes que se torna necessário consultar incluem a "General Historyof
Africa" , em oito volumes, publicada pela UNESCO, a "Historyof Central Africa" editada por
David Birmingham e Phillys Martin, a obra "A Historyof Africa" (História de África", em
português, em colaboração com William Tordoff) da autoria de J.D. Fage, a "A
HistoryofSouthand Central Africa" de Derek Wilson, e a obra de A.J. Wills "Anintroduction to
theHistoryof Central Africa - Zambia, Malawi and Zimbabwe", e a obra de Robert Collins e
James Burns "A HistoryofSub-Saharan Africa".
Para uma melhor compreensão da génese e evolução histórica dos estados Umbundos é útil a
leitura da obra "Kings andKinsmen - EarlyMbunduStates in Angola" da autoria do Prof. Joseph
Miller, e da obra "TradeandConflict in Angola -
TheMbunduandtheirNeighboursundertheinfluenceofthe Portuguese 1483 - 1790" , da autoria
do Prof. David Birmingham, que também editou em associação com Richard Gray "Pre-
ColonialAfricanTrade - EssaysonTrade in Central andEastern Africa before 1900" que nos
oferece uma perspectiva muito boa sobre o papel do comércio na África Central e Oriental
antes da chegada dos Europeus à região.
No campo do tráfico de escravos e o papel que os povos da região ao que chamamos hoje
Angola, bem como o impacto do tráfico nesses povos, também é essencial a leitura da obra de
Joseph Miller "WayofDeath", e de toda a obra de Basil Davidson, um pioneiro do estudo da
influência do tráfico de escravos do Atlântico nas sociedades africanas entre os séculos XVI e
XIX. Como introdução geral à demografia do tráfico de escravos do Atântico é fundamental a
obra de PhillipCurtin "TheAtlanticSlaveTrade - A Census". Como obra de referência, recomendo
também a consulta de "TheTrans-AtlanticSlaveTradeDatabaseonCD-Rom" compilada por David
Eltis, Stephen D. Behrendt, David Richardson, e Herbert Klein, que nos fornece informação
sobre 27.233 viagens de navios negreiros entre 1585 e 1866. Ainda essencial é o "Atlas
oftheTransatlanticSlaveTrade" organizado por David Eltis e David Richardson, que nos oferecea
melhor série estatística sobre o movimento de escravos através do Atlântico sob as
perspectivas de porto de saída em África e porto de chegada no Novo Mundo.
5. Estudos Sobre a História do Atlântico Sul
Não é possível estudar a História de Angola entre os Séculos XVI e XIX sem estudar também a
História do Brasil, pois durante mais de 350 era de Angola de onde vinha a mão-de-obra
escrava para trabalhar os engenhos de açucar, minas de ouro ou fazendas de café do Brasil.
Assim, torna-se imprescindível a leitura das obras clássicas de Celso Furtado "Economia
Colonial do Brasil nos Séculos XVI e XVII" e "Formação Económica do Brasil", a "História
Económica do Brasil" de Caio Prado Júnior, e "The Golden Age ofBrazil", de C.R. Boxer, bem
como "Casa Grande e Senzala", de Gilberto Freire. No que respeita às relações entre a costa de
Angola e o Brasil é essencial a consulta da obra de Luiz Felipe de Alencastro "O Tratado dos
Viventes - Formação do Brasil no Atlântico Sul".
Mais numa perspectiva mais global da história e economia do Atlântico Sul e do sistema
económico mundial, é essencial o estudo dos trabalhos de João Lúcio de Azevedo, Fernand
Braudel, Vitorino Magalhães Godinho e Armando de Castro no domínio da história económica,
as obras extensas de Jaime Cortesão e de Damião Peres no domínio da expansão portuguesa, e
a obra de Luís de Albuquerque nos domínios dos Descobrimentos Portugueses e da cartografia
antiga.
Se bem que mais contemporânea e com focus no processo histórico da descolonização
africana é ainda importante estudar as obras de Frantz Fanon "Os Condenados da Terra" e
"Peles Negras, Máscaras Brancas" para melhor compreender o enquadramento do
colonialismo como sistema económico e político e o seu impacto na psicologia dos povos
colonizados.
Para uma melhor compreensão deste tema tão importante é útil a leitura da obra de Jaime
Rodrigues "De Costa a Costa - Escravos, marinheiros e intermediários do tráfico negreiro de
Angola ao Rio de Janeiro (1780 - 1860)". Ainda de muito interesse é a obra
"EnslavingConnections - Changingculturesof Africa andBrazilduringthe era ofslavery" editada
pelos Profs. José Curto e Paul Lovejoy. Embora sob a capa de leitura mais ligeira e muito bem
ilustrada, e por isso mesmo uma importante obra de divulgação, é muito útil a leitura da obra
"África e o Brasil Africano" de Marina de Mello e Souza.
6. Cronistas e Historiadores Portugueses
Mais próximo de Angola, sugiro uma "re-leitura" dos textos históricos de Gomes Eannes de
Azurara, Rui de Pina, Garcia de Resende, João de Barros, Fernão Lopes de Castanheda, Damião
de Gois, Duarte Lopez e FelippoPigafetta, Domingos de Abreu e Brito, António de Oliveira
Cadornega, Alexandre Elias da Silva Corrêa, Joaquim Lopes de Lima, Oliveira Martins, Luciano
Cordeiro, João de Mattos e Silva à luz de um estudo mais crítico e profundo dos seus
testemunhos.
7. Trabalhos Importantes Sobre a História de Angola
Outros estudiosos da História de Angola mais recentes que são leitura obrigatória para uma
melhor compreensão incluem Alfredo Trony, Visconde Paiva Manso, Alberto de Almeida
Teixeira, Monsenhor Alves da Cunha, Alfredo de Albuquerque Felner, Padre Ruela Pombo,
Francisco Castelbranco, Gastão Sousa Dias, Alberto Ferreira de Lemos, Henrique Galvão, Ralph
Delgado, Marcello Caetano, António Brásio, Fernando Batalha, António da Silva Rego, José
Gonçalo Santa-Rita, Hélio Felgas, Walter Marques, Manuel da Silva Cunha, Eduardo dos Santos,
Martins dos Santos, Júlio de Castro Lopo, Carlos Alberto Garcia, Carlos Couto, José de Almeida
Santos, Manuel da Costa Lobo, Norberto Gonzaga, Mário António Fernades de Oliveira,
Manuel Nunes Gabriel, Ilídio Amaral, Cerviño Padrão, Roberto Correia, Aida Freudenthal, e
Maria Emília Madeira dos Santos, alguns dos quais requerendo um esforço de tradução mais
acentuado para balançar a perspectiva um tanto euro-cêntrica e colonial das suas obras.
8. Estudos de Etno-História
Na área da etno-história é essencial o estudo das obras de Henrique Dias de Carvalho, Padre
Carlos Estermann, Óscar Ribas, José Redinha, João Vicente Martins, Mário Milheiros,
Mesquitela Lima, Manuel Alfredo de Morais Martins, Jorge e Jill Dias, Abílio Lima de Carvalho,
Manuel Guerreiro, José Pereira Neto, Padre José Martins Vaz, Padre Joaquim Martins, Ilídio do
Amaral (mais no domínio da geografia humana do que etnografia ou história), Herman
Possinger, Franz-WilhelmHeimer e Ramiro Ladeiro Monteiro mais na área de sociologia.
9. Estudos Sobre o Tráfico de Escravos em Angola
Com mais foco no tráfico de escravos, é ainda essencial a leitura das obras de Alfredo Diogo
Júnior, António Carreira, e Adriano Parreira, que primeiro estudaram o papel de Angola no
tráfico de escravos do Atlântico, pois elas revelam um sem-fim de matéria-prima para uma
melhor compreensão dos povos de Angola e da sua história.
Cabe-me aqui declarar agora a minha relativa ignorância quanto aos esforços de estudar e
publicar história que com certo vigor se publicaram já depois da independência. Longe da
acção, tem sido difícil para mim encontrar bibliografia tão recente. Contudo, cumpre-me citar
o trabalho fecundo de Henrique Abranches ("Reflexões Sobre a Cultura Nacional") que decerto
necessita de alcançar um público muito mais vasto, e da grande obra de difusão do romance
histórico angolano levada a cabo pela excelente pena de Pepetela (Artur Pestana).
Finalmente, tomo aqui a oportunidade de guiar o leitor para as minhas notas sobre a
bibliografia da História de Angola que apresento no fim deste trabalho. Elas não são decerto
completas, pois incluem apenas algumas notas pessoais sobre textos que conheço,
organizadas de acordo com temas e épocas; apenas um achego simples a tão importante
veículo do estudo da História de Angola.
posted by Helder Ponte | 5/29/2006 05:20:00 PM | 4 comments
3.7 Fontes da História de Angola
De uma forma geral, as fontes de estudo da História de Angola são muito escassas e de frágil
objectividade. Mas antes de discutir as fontes da história de Angola é útil cobrir dois
conceitos-chave defontes escritas de história. As fontes de história classificam-se em geral em
dois tipos: fontes primárias e fontes secundárias.
1. Fontes Primárias
Fontes primárias referem-se a qualquer trabalho que tenha sido escrito durante a época (ou
pouco tempo depois) em que o objecto de estudo aconteceu. As fontes primárias são a
matéria prima básica para o estudo da história. Um exemplo de uma fonte primária no estudo
da história de Angola é a RelationedelReamedi Congo
etdelleCircuonvicineContradeTrattadalliScritti&RagionamentidiOdoardoLopezPortoghese per
FilippoPigafetta com disiegnivaridi Geografia, dipiante, d'abiti, d'animali, &altro - Relação do
Reino do Congo e das Terras Circunvizinhas - Tirada dos escritos e discursos de Duarte Lopez,
Português - Por FilippoPigafetta - Com Desenhos vários de Geografia, de Plantas, de trajos, de
animais, etc., publicado em Roma em 1591 e traduzido em português por Rosa Capeans,
publicado pela Agência Geral do Ultramar, em Lisboa em 1951. Nesta importante fonte da
história de Angola encontramos uma descrição em primeira mão do Antigo Reino do Congo
durante a época logo a seguir à chegada dos Portugueses e da sua consequente expansão para
o Antigo Reino de Ndongo.
2. Fontes Secundárias
Por outro lado, fontes secundárias são aquelas que estudam as fontes primárias de um tópico
em história depois do tempo do tópico a que o estudo se refere. Fontes secundárias são em
geralestudos posteriores que cobrem a descrição, análise e explicação de fontes primárias. A
obra do Professor Joseph Miller "WayofDeath - Merchant
CapitalismandtheAngolanSlaveTrade 1730 - 1830", publicada em 1988 pela Universityof
Wisconsin Press é um exemplo de uma fonte secundária pois é um estudo extenso e profundo
de fontes primárias sobre a prática do tráfico de escravos da região de Angola durante o século
que vai de 1730 a 1830, escrita no último quartel do Séc. XX.
Em termos de documentação escrita, no estudo da História de Angola só temos acesso
a documentos escritos depois da chegada dos Portugueses à foz do Zaire em 1481. Estas
fontes escritas se bem que escassas são valiosas, pois dão-nos uma descrição em primeira mão
de como ocorreu o processo de contacto entre duas culturas; contudo, devemos sempre notar
que os escritos dos Portugueses e dos missionários reflectem necessáriamente as perspectivas
portuguesa e cristã ao longo dos tempos, e não necessáriamente a objectividade dos factos
históricos.
A bibliografia colonial portuguesa sobre Angola é de certa forma extensa, comparada com a
bibliografia de outras regiões africanas a sul do Sahara. Contudo, esta precisa de ser
"traduzida" antes que se possa usar com propriedade na formulação da História de Angola. É
assim difícil discernir nas diferentes "Histórias de Angola" publicadas ao longo dos tempos, as
diferentes interpretações que os seus autores lhes deram.
De particular importância para o estudo da História de Angola é ainda o estudo das descrições
e memórias, autobiografias, relatos de viagens, diários e correspondência privada existentes.
Contudo, apenas podemos usar estas fontes depois de as despir-mos de opiniões pessoais e
juízos de valor que as acompanham, enquadradas no espaço e no tempo. É de facto muito
interessante ler, por exemplo, as opiniões e comentários do Padre João António Cavazzi de
Montecúccolo, na sua Descrição Histórica dos Três Reinos do Congo, Matamba e Angola,
onde a evidência da sua formação europeia e cristã do seu tempo está sempre tão presente.
3. Tradição Oral
Não temos também acesso a informantes, entrevistas e narrativas detradição oral, pois
escasso é o trabalho neste campo de investigação histórica, e mais escassas ainda são as suas
fontes para uma melhor compreensão da História de Angola.
Cabe ainda referir o papel importante que a mitologia, as lendas,contos, advinhas, canções,
danças, festejos e jogos podem desempenhar na interpretação de factos ou personagens
históricas passadas. A cultura popular e o folclore dão uma visão não oficial dos factos,
personagens e acontecimentos importantes, muitas vezes mais ricas e mais verdadeiras, e
pouco mencionados nas fontes mais convencionais. Por exemplo, a obra de Óscar Ribas, pelo
seu esforço em transcrever um grande número de elementos de cultura popular luandense, é
hoje uma fonte imprescindível, na verdade um tesouro valioso, para se compreender o
quotidiano de Luanda antiga.
4. Evidência Arqueológica
A evidência arqueológica é também muito escassa e ainda não está organizada numa forma
sistemática. Apesar dos trabalhos de DesmondClark, Camarate França, Santos Júnior, Carlos
Ervedosa, e outros, na segunda metade do Séc. XX, muito ainda está por estudar no que diz
respeito à cobertura arqueológica de Angola.
5. Antropologia e Etno-História
Cabe aqui realçar o papel especial da antropologia (por alguns estudiosos designada por
etnologia ou etnografia) e da etno-história no estudo e compreensão das sociedades
angolanas tradicionais, e a contribuição que estas podem dar a uma formulação mais correcta
e abrangente da História de Angola. Sabemos assim das contribuições valiosas que um número
restrito de etnólogos (ou antropólogos, a saber, Henrique de Carvalho, José Redinha, Carlos
Estermann, João Vicente Martins, Mário Milheiros, Manuel Alfredo Morais Martins, e
Mesquitela Lima) deram para o conhecimento mais profundo da história de alguns povos de
Angola.
É ainda importante referir que para esta Viagem Pela História de Angola recorri somente a
fontes secundárias (bibliografia) e que não conduzi qualquer investigação original baseada em
fontes primárias. Assim, filtrei e extrapolei a informação que tive disponível e recorri sempre
que necessário à economia política, à sociologia, à antropologia, à demografia e a outras
disciplinas sociais para tentar colmatar as lacunas da desejada evidência histórica.
Foi pois difícil para mim escrever sobre um tópico em que as fontes sejam tão limitadas e
esparsas. Contudo, e apesar das grandes lacunas que reconheço, é importante que o faça com
o maior rigor e objectividade possível. Recorri assim a numerosas obras em inglês, francês e
espanhol, em que alguns autores tentaram com alguma frequência denegrir o esforço
português e a sua obra, o que me senti obrigado de vez em quando a abrandar ou corrigir.
No meu caso pessoal, não tive o benefício do diálogo ou da troca de ideias com outros
amantes da História de Angola, pois estou longe de qualquer grupo que se interessa por este
tópico tão exótico. Esta foi assim uma empresa solitária, e por isso mesmo mais sujeita ainda a
maior risco de subjectividade.
posted by Helder Ponte | 5/29/2006 04:15:00 PM | 0 comments
3.6 Porquê Estudar a História de Angola?
O passado condiciona necessáriamente não só o que somos hoje, mas também o que fomos
ontem, e mesmo o que seremos amanhã. Assim, o estudo da História de Angola ajuda-nos a
compreender melhor o processo de mudança ao longo do tempo e assim entender melhor o
que é hoje Angola.
1. Ir à Raíz das Questões
Com frequência, o estudo de acontecimentos recentes não é suficiente para explicar uma
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  • 1. História de Angola encontra-se documentada do ponto de vista arqueológico desde o Paleolítico. Este país da África Austral foi uma colónia portuguesa até 11 de Novembro de 1975, quando acedeu à independência na sequência duma guerra de libertação. [editar]História pré-colonial Expansão bantu. Na Lunda, no Zaire e no Cuangar foram encontrados instrumentos de pedra e outros, dos homens do Paleolítico. No Deserto do Namibe foram encontradasgravuras rupestres nas rochas. Trata-se das gravuras do Tchitundo-Hulo, atribuídas aos antepassados dos san. Nos primeiros quinhentos anos da era actual, as populações bantu da África Central, que já dominavam a siderurgia do ferro, iniciaram uma série de migrações para leste e para sul, a que se chamou a expansão bantu. Parte destas populações fixaram-se a Norte e ao Sul da parte inferior do Rio Congo (ou Zaire), portanto também no Noroeste do território da actual Angola. Com o tempo, estas populações constituíram o povo Bakongo, de língua Kikongo. Outras populações fixaram-se inicialmente na região dos Grandes Lagos Africanos e, no século XVII, deslocaram-se para oeste, atravessando o Alto Zambeze até aoCunene: eram os grupos hoje designados como ngangela, mas também os Ovambo e os Xindonga. No ano de 1568, entrava um novo grupo pelo norte, os jagas, que combateram os Bakongo que os empurraram para sul, para a região de Kassanje. No século XVI ou mesmo antes, os nhanecas (vanyaneka) entraram pelo sul de Angola, atravessaram o Cunene e instalaram-se no planalto da Huíla. No mesmo século XVI, um outro povo abandonava a sua terra na região dos Grandes Lagos, no centro de África, e veio também para as terras angolanas. Eram os hereros (ouovahelelos), um povo de pastores. Os hereros entraram pelo extremo leste de Angola, atravessaram o planalto do Bié e depois foram-se instalar entre o Deserto do Namibe e a Serra da Chela, no sudoeste angolano. Também no século XVI os portugueses instalam-se na região e fundam São Paulo da Assunção de Luanda, a actual cidade de Luanda.
  • 2. Já no século XVIII, entraram os ovambos (ou ambós), grandes técnicos na arte de trabalhar o ferro, deixaram a sua região de origem no baixo Cubango e vieram estabelecer-se entre o alto Cubango e o Cunene. No mesmo século, os quiocos (oukyokos) abandonaram o Catanga e atravessaram o rio Cassai. Instalaram-se inicialmente na Lunda, no nordeste de Angola, migrando depois para sul. Finalmente, já no século XIX apareceu o último povo que veio instalar-se em Angola: os cuangares (ou ovakwangali). Estes vieram do Orange, na África do Sul, em 1840, chefiados por Sebituane, e foram-se instalar primeiro no Alto Zambeze. Então chamavam-se macocolos. Do Alto Zambeze alguns passaram para o Cuangar no extremo sudoeste angolano, onde estão hoje, entre os rios Cubango e Cuando. As guerras entre estes povos eram frequentes. Os migrantes mais tardios eram obrigados a combater os que se estavam estabelecidos para lhes conquistar terras. Para se defenderem, os povos construíam muralhas em volta das sanzalas. Por isso, há em Angola muitas ruínas de antigas muralhas de pedra. Essas muralhas são mais abundantes no planalto do Bié e no planalto da Huíla, onde se encontram, também, túmulos de pedra e galerias de exploração de minério, testemunhos de civilizações mais avançadas do que geralmente se supõe. [editar]A chegada dos portugueses Ver artigo principal: Dona Ana de Sousa, Reconquista de Angola Ilustração da rainha Nzinga em negociações de Paz com o governador português em Luanda em 1657. Os portugueses, sob o comando de Diogo Cão, no reinado de D. João II, chegam ao Zaire em 1484. É a partir daqui que se iniciará a conquista pelos portugueses desta região de África, incluindoAngola. O primeiro passo foi estabelecer uma aliança com o Reino do Congo, que dominava toda a região. A sul deste reino existiam dois outros, o do Reino de Ndongo e o de Matamba, os quais não tardam a fundir-se, para dar origem ao Reino de Angola (c. 1559). Explorando as rivalidades e conflitos entre estes reinos, na segunda metade do século XVI os portugueses instalam-se na região de Angola. O primeiro governador de Angola, Paulo Dias de Novais, procura delimitar este vasto território e explorar os seus recursos naturais, em particular os escravos. A penetração para o interior é muito limitada. Em 1576 fundam São
  • 3. Paulo da Assunção de Luanda, a actual cidade de Luanda. Angola transforma-se rapidamente no principal mercado abastecedor de escravos para as plantações da cana-de-açúcar do Brasil. Durante a ocupação filipina de Portugal (1580-1640), os holandeses procuram desapossar os portugueses desta região, ocupando grande parte do litoral (Benguela, Santo António do Zaire, as barras do Bengo e do Cuanza). Em 1648 tropas portuguesas (luso-brasileiras) expulsam os holandeses, possibilitando o reatamento das linhas de comércio (essencialmente tráfego de escravos) de Salvador e Rio de Janeiro com Luanda. Até finais do século XVIII, Angola funciona como um reservatório de escravos para as plantações e minas do Brasil ou de outras colónias portuguesas do continente americano.[1] A ocupação dos portugueses aposta nas fortalezas e feitorias estabelecidas na costa. A colonização efectiva do interior só se inicia no século XIX, após a independência do Brasil (1822) e o fim do tráfico de escravos (1836-42), mas não da escravatura. Esta ocupação do interior tinha o carácter de uma resposta às pretensões de outras potências europeias, como a Inglaterra, a Alemanha e a França, que reclamavam na altura o seu quinhão em África. Diversos tratados são firmados estabelecendo os territórios que a cada uma cabem, de acordo com o seu poder e habilidade negocial. Uma boa parte desses colonos são presos deportados de Portugal, como o célebre Zé do Telhado. Paralelamente são feitas diversas viagens com objectivos políticos e científicos para o interior do território angolano, tais como: José Rodrigues Graça (1843-1848) - Malanje e Bié; José Brochado - Huambo, Mulando, Cuanhama; Silva Porto - Bié. Devido à ausência de vias de comunicação terrestres, as campanhas de ocupação do interior são feitas através dos cursos fluviais: Bacia do Cuango (1862), Bacia do Cuanza (1895, 1905 e 1908); Bacia do Cubango (1886-1889, 1902 e 1906); Bacia do Cunene (1906-1907); Bacia do Alto Zambeze (1895-1896); Entre Zeusa e Dande (1872-1907), etc. As fronteiras de Angola só são definidas em finais do século XIX, sendo a sua extensão muitíssimo maior do que a do território dos Ambundu, a cuja língua o termo Angola anda associado. Em 1823, em Benguela, surgiu a Confederação Brasílica, um movimento com a finalidade de juntar Angola ao recém-independente Brasil. Esse movimento foi formado por colonos e soldados de Benguela que em boa parte provinham do Brasil. O governo da colónia em Luanda chamou reforços e esmagou esta revolta. [2] [editar]1900-1960
  • 4. Vista de Luanda em 1883. Automóvel em Angola, em 1949. A colonização de Angola, após a implantação de um regime republicano em Portugal (1910), entra numa nova fase. Os republicanos haviam criticado duramente os governos monárquicos por terem abandonado as colónias. O aspecto mais relevante da sua ação circunscreveu-se à criação de escolas. No plano económico, desde muito tempo era legal 1916 na região de Luanda. O desenvolvimento económico só se inicia de forma sistemática, em finais da década de 1930, quando se incrementa a produção de café, sisal, cana do açúcar, milho e outros produtos. Trata-se de produtos destinados à exportação. A exportação da cana do açúcar, em 1914, pouco ultrapassava as 6 milhões de toneladas. Em 1940 atingia já 4 mil milhões de toneladas exportadas.[carece de fontes] As fazendas e a indústria concentraram-se à volta das cidades de Luena e de Benguela. A exportação de sisal desenvolve-se durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Em 1920, foram exportadas pouco mais que que 62 toneladas , mas em 1941 atingia-se já as 3.888. Dois anos depois, 12.731 toneladas. Em 1973 situavam-se nas 53.499. Estas plantações situavam-se no planalto do Huambo, do Cubal para Leste, nas margens da linha férrea do Dilolo, Bocoió, Balumbo, Luimbale, Lepi, Sambo, mas também no Cuinha do norte e Malange. Abre-se um novo ciclo económico em Angola, que se prolonga até 1972, quando a exploração petrolífera em Cabinda começar a dar os seus resultados. A subida da cotação do café no mercado mundial, a partir de 1950, contribuiu decisivamente para o aumento vertiginoso desta produção. Em 1900, as exportações pouco ultrapassaram as 5.800 milhões de toneladas. Em1930 atingiam as 14.851.Em 1943 subiam para 18.838. A partir daqui o crescimento foi vertiginoso. Em 1968 forma exportadas 182.954 e quatro anos depois, 218.681 toneladas. Para além destes produtos, desenvolve-se a exploração dos minérios de ferro. Em 1957 funda- se a Companhia Mineira do Lobito, que explorava as minas de Jamba, Cassinga e Txamutete. Exploração que cedeu depois à Brasileira Krupp.
  • 5. O desenvolvimento destas explorações, foi acompanhado por vagas de imigrantes incentivados e apoiados muitas vezes pelo próprio Estado. Entre 1941 e 1950, saíram de Portugal cerca de 110 mil imigrantes com destino às colónias, a maioria fixou-se em Angola. O fluxo imigratório prosseguiu nos anos 1950 e 60. Na década de 1950, a questão da descolonização das colónias africanas emerge no plano internacional e torna-se uma questão incontornável. Em 1956 é publicado o primeiro manifesto doMovimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). [editar]1961-1974 Ver artigo principal: Guerra Colonial Ford Taunus em Luanda, em 1972. No princípio dos anos 1960, três movimentos de libertação (UPA/FNLA, MPLA e UNITA) desencadearam uma luta armada contra o colonialismo português.[3] O governo de Portugal (uma ditadura desde 1926), recusou-se a dialogar e prosseguiu na defesa até ao limite do último grande império colonial europeu. Para África foram mobilizados centenas de milhares de soldados. Enquanto durou o conflito armado, Portugal procurou consolidar a sua presença em Angola, promovendo a realização de importantes obras públicas. A produção industrial e agrícola conheceram neste território um desenvolvimento impressionante. A exploração do petróleo de Cabinda iniciou-se em 1968, representando em 1973 cerca de 30% das receitas das exportações desta colónia. Entre 1960 e 1973 a taxa de crescimento do PIB (produto Interno Bruto) de Angola foi de 7% ao ano. [editar]Independência e guerra civil Ver artigo principal: Guerra Civil Angolana Legado da guerra civil: edifício destruído no Huambo. Na sequência do derrube da ditadura em Portugal (25 de Abril de 1974), abriram-se perspectivas imediatas para a independência de Angola. O novo governo revolucionário português abriu negociações com os três principais movimentos de libertação (MPLA –
  • 6. Movimento Popular de Libertação de Angola, FNLA – Frente Nacional de Libertação de Angola e UNITA – União Nacional para a Independência Total de Angola), o período de transição e o processo de implantação de um regime democrático em Angola (Acordos de Alvor, Janeiro de 1975). A independência de Angola não foi o início da paz, mas o início de uma nova guerra aberta. Muito antes do Dia da Independência, a 11 de Novembro de 1975, já os três grupos nacionalistas que tinham combatido o colonialismo português lutavam entre si pelo controle do país, e em particular da capital, Luanda. Cada um deles era na altura apoiado por potências estrangeiras, dando ao conflito uma dimensão internacional. A União Soviética e principalmente Cuba apoiavam o MPLA, que controlava a cidade de Luanda e algumas outras regiões da costa, nomeadamente o Lobito e Benguela. Os cubanos não tardaram a desembarcar em Angola (5 de Outubro de 1975). A África do Sul apoiava a UNITA e invadiu Angola (9 de Agosto de 1975). O Zaire, que apoiava a FNLA, invadiu também este país, em Julho de 1975. A FNLA contava também com o apoio da China, mercenários portugueses e ingleses mas também com o apoio da África do Sul. Os EUA, que apoiaram inicialmente apenas a FNLA, não tardaram a ajudar também a UNITA. Neste caso, o apoio manteve-se até 1993. A sua estratégia foi durante muito tempo dividir Angola. Em Outubro de 1975, o transporte aéreo de quantidades enormes de armas e soldados cubanos, organizado pelos soviéticos, mudou a situação, favorecendo o MPLA. As tropas sul- africanas e zairenses retiraram-se e o MPLA conseguiu formar um governo socialista uni- partidário. O Brasil rapidamente estabeleceu relações diplomáticas com a nova República que se instalara. Fez isso antes mesmo de qualquer país do bloco comunista. Nenhum país ocidental ou mesmo africano seguiu o seu exemplo. A decisão de reconhecer como legítimo o governo de Agostinho Neto foi tomada pelo então presidente Ernesto Geisel ainda em 6 de Novembro, antes da data oficial de Independência de Angola. Já em 1976, as Nações Unidas reconheciam o governo do MPLA como o legítimo representante de Angola, o que não foi seguido nem pelos EUA, nem pela África do Sul. No meio do caos que Angola se havia tornado, cerca de 800 mil portugueses abandonaram este país entre 1974 e 1976, o que agravou de forma dramática a situação económica. A 27 Maio de 1977, um grupo do MPLA encabeçado por Nito Alves, desencadeou um golpe de Estado que ficou conhecido como Fraccionismo, terminando num banho de sangue que se prolongou por dois anos. Em Dezembro, no rescaldo do golpe, o MPLA realizou o seu 1º Congresso, onde se proclamou como sendo um partido Marxista-Leninista, adoptando o nome de MPLA-Partido do Trabalho. Ver artigo principal: Fraccionismo
  • 7. A guerra continuava a alastrar por todo o território. A UNITA e a FNLA juntaram-se então contra o MPLA. A UNITA começou por ser expulsa do seu quartel-general no Huambo, sendo as suas forças dispersas e impelidas para o mato. Mais tarde, porém, o partido reagrupou-se, iniciando uma guerra longa e devastadora contra o governo do MPLA. A UNITA apresentava-se como sendo antimarxista e pró-ocidental, mas tinha também raízes regionais, principalmente na população Ovimbundu do sul e centro de Angola. Agostinho Neto morreu em Moscovo a 10 de Setembro de 1979, sucedendo-lhe no cargo o ministro da Planificação, o engenheiro José Eduardo dos Santos. No início da década de 1980, o número de mortos e refugiados não parou de aumentar. As infraestruturas do país eram consecutivamente destruídas. Os ataques da África do Sul não paravam. Em Agosto de 1981, lançaram aoperação "Smokeshell" utilizando 15.000 soldados, blindados e aviões, avançando mais de 200 km na província do Cunene (sul de Angola). O governo da África do Sul justificou a sua acção afirmando que na região estavam instaladas bases dos guerrilheiros da SWAPO, o movimento de libertação da Namíbia. Na realidade tratava-se de uma acção de apoio à UNITA, tendo em vista a criação de uma "zona libertada" sob a sua administração. Estes conflitos só terminaram em Dezembro de 1988, quando em Nova Iorque foi assinado um acordo tripartido (Angola, África do Sul e Cuba) que estabelecia a Independência da Namíbia e a retirada dos cubanos de Angola. A partir de 1989, com a queda do bloco da ex-União Soviética, sucederam-se em Angola os acordos de paz entre a UNITA e o MPLA, seguidos do recomeço das hostilidades. Em Junho de 1989, em Gbadolite (Zaire), a UNITA e o MPLA estabeleceram uma nova trégua. A paz apenas durou dois meses. Em fins de Prédefinição:DataEx, o governo de Angola anunciou o reinício das conversações directas com a UNITA, com vista ao estabelecimento do cessar-fogo. No mês seguinte, a UNITA reconhecia oficialmente José Eduardo dos Santos como o Chefe de Estado angolano. O desmoronar da União Soviética acelerou o processo de democratização. No final do ano, o MPLA anunciava a introdução de reformas democráticas no país. A 11 de Maio de 1991, o governo publicou uma lei que autorizava a criação de novos partidos, pondo fim ao monopartidário. A 22 de Maio os últimos cubanos saíram de Angola. Em 31 de Maio de 1991, com a mediação de Portugal, EUA, União Soviética e da ONU, celebraram-se os acordos de Bicesse (Estoril), terminando com a guerra civil desde 1975, e marcando as eleições para o ano seguinte. As eleições de Setembro de 1992, deram a vitória ao MPLA (cerca de 50% dos votos). A UNITA (cerca de 40% dos votos) não reconheceu os resultados eleitorais. Quase de imediato sucedeu- se um banho de sangue, reiniciando-se o conflito armado, primeiro em Luanda, mas alastrando-se rapidamente ao restante território. A UNITA restabeleceu primeiramente a sua capital no Planalto Central com sede no Huambo (antiga Nova Lisboa), no leste e norte diamantífero.
  • 8. Em 1993, o Conselho de Segurança das Nações Unidas embargou as transferências de armas e petróleo para a UNITA. Tanto o governo como a UNITA acordaram em parar as novas aquisições de armas, mas tudo não passou de palavras. Em Novembro de 1994, celebrou-se o Protocolo de Lusaka, na Zâmbia entre a UNITA e o Governo de Angola (MPLA). A paz parecia mais do que nunca estar perto de ser alcançada. A UNITA usou o acordo de paz de Lusaka para impedir mais perdas territoriais e para fortalecer as suas forças militares. Em 1996 e 1997 adquiriu grandes quantidades de armamentos e combustível, enquanto ia cumprindo, sem pressa, vários dos compromissos que assumira através do Protocolo de Lusaka[4] . Entretanto o Ocidente passara a apoiar o governo do MPLA, o que marcou o declínio militar e político da UNITA, com este movimento a ter cada vez mais dificuldades em financiar as suas compras militares, perante o avanço no terreno das FAA, e dado o embargo internacional e diplomático a que se viu votada. Em Dezembro de 1998, Angola retornou ao estado de guerra aberta, que só parou em 2002, com a morte de Jonas Savimbi (líder da UNITA). Com a morte do líder histórico da UNITA, este movimento iniciou negociações com o Governo de Angola com vista à deposição das armas, deixando de ser um movimento armado, e assumindo-se como mera força política. Referências
  • 9. 3 - Introdução ao Estudo da História de Angola About Me NAME: HELDER PONTE LOCATION: CRANBROOK, COLÔMBIA BRITÂNICA, CANADA Helder Fernando de Pinto Correia Ponte, também conhecido por Xinguila nos seus anos de juventude em Luanda, Angola, nasceu em Maquela do Zombo, Uíge, Angola, em 1950. Viveu a sua meninice na Roça Novo Fratel (Serra da Canda) e na Vila da Damba (Uíge), e a sua juventude em Luanda e Cabinda. Frequentou os liceus Paulo Dias de Novais e Salvador Correia, e o Curso Superior de Economia da Universidade de Luanda. Cumpriu serviço militar como oficial miliciano do Serviço de Intendência (logística) do Exército Português em Luanda e Cabinda. Deixou Angola em Novembro de 1975 e emigrou para o Canadá em 1977, onde vive com a sua esposa Estela (Princesa do Huambo) e filho Marco Alexandre. É gestor de um grupo de empresas de propriedade dos Índios Kootenay, na Colômbia Britânica, no sopé oeste das Montanhas Rochosas Canadianas. Gosta da leitura e do estudo, e adora escrever sobre a História de Angola, de África e do Atlântico Sul, com ênfase na Escravatura, sobre os quais tem uma biblioteca pessoal extensa. Viewmy complete profile 3.9.3 Angola, o Fim da Guerra Fria, e a Re-Africa... 3.9.2 O Papel de Angola na Corrida à África e no ... 3.9.1 Os Escravos de Congo e Angola e a Ascensão ... 3.10 Linguagem, Estilo, Ortografia e Toponímia 3.9 Angola na História do Mundo 3.8 Tanta História Ainda por Contar... 3.7 Fontes da História de Angola 3.6 Porquê Estudar a História de Angola? 3.5 Tempos Diferentes ao Mesmo Tempo... 3.4 Os Grandes Períodos da História de Angola May 2006
  • 10. June 2007 July 2007 SATURDAY, JULY 28, 2007 3.9.3 Angola, o Fim da Guerra Fria, e a Re-Africanização da África Austral 3. Angola, o Fim da Guerra Fria, e a Re-Africanização da África Austral Amigo Leitor - Este capítulo ainda em desenvolvimento A mais longa guerra de libertação nacional em África O Regresso das Caravelas Angola Lugar Quente da Guerra Fria O Fim da Rodésia, do Sudoeste Africano e do Apartheid na África do Sul O desmoronamento da Unuião das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e o Fim da Guerra Fria
  • 11. Numa época mais recente, podemos ainda relembrar o exemplo da relevância do petróleo de Angola na economia mundial do Séc. XXI. posted by Helder Ponte | 7/28/2007 08:47:00 PM | 2 comments 3.9.2 O Papel de Angola na Corrida à África e no Estabelecimento de Impérios Coloniais 2. O Papel de Angola na Corrida à África e no Estabelecimento de Impérios Coloniais Amigo Leitor - Este capítulo eastá ainda em desenvolvimento Angola e o Colonialismo Europeu 1795 escravatura abolida na Holanda 1807 - tráfico de escravos abolido na Inglaterra 1834 - Escravatura abolida no Império Britânico 1867 - Os primeiros diamantes são descobertos na África do Sul 1869 - Completa-se a construção do Canal do Suez 2.1 A Revolução Industrial e o Imperialismo Europeu A Revolução Industrial foi um factor decisivo no imperialismo europeu. As economias europeias precisavam não só de matérias primas e de mão-de-obra a baixo custo, como precisavam também de novos mercados para os seus produtos manufacturados. Os povos africanos ofereciam aos estados europeus a melhor oportunidade de expansão não só pela sua proximidade geográfica e massa de população, como também pelo facto de o continente africano não estar sob a hegemonia de qualquer potência. 2.2 A Abolição da Escravatura e do Tráfico de Escravos Assim, a abolição da escravatura e do tráfico de escravos do Atlântico acontecerem tão só por razões morais mas mais por razões económicas. A Inglaterra, refeita da perda das colónias da América, passou a concentrar os seus esforços na expansão de novos mercados fornecedores de produtos tropicais essenciais ao crescimento da sua indústria, ao mesmo tempo que novos mercados consumidores eram necessários para a colocação dos seus produtos. Com efeito, consciente da concorrência que lhe podia advir dos Estados Unidos da América, nada melhor que advogar e policiar a abolição da escravatura e do tráfico, pois tal reduziria a capacidade
  • 12. das antigas colónias Americanas de expandir a sua economia, e deste modo desafiar a hegemonia britânica, pois o escravo era ainda a principal fonte de riqueza nas Américas. Quanto às colónias espanholas e portuguesas da América Central e do Sul, a estratégia britânica baseou-se no suporte à onda de independência política que assolou a América Latina no primeiro quartel do Século XIX e na abertura dos seus portos e economias às mercadorias produzidas em Inglaterra. 2.3 Portugal e a Colónia de Angola Este paradigma fez-se reflectir em Portugal e nas suas colónias através da independência do Brasil em 1822 e a consequente abertura dos seus portos ao comercio internacional, e nas praças de África, na abolição do tráfico negreiro. No caso particular de Angola, pode dizer-se que a expansão do domínio português para o interior da colónia de Angola foi um dos primeiros resultados da abolição da escravatura em Portugal mercê dos esforços do Marquês de Sá da Bandeira em 1836. Com efeito a expansão territorial do domínio português em Angola começou em 1838, com o estabelecimento do Forte do Duque de Bragança perto da quedas do mesmo nome (Calandula),perto da confluência dos rios Lucala e Quanza. Dentro dos próximos dez anos, os Portugueses estenderam o seu domínio até à margem do Rio Cuando. Entretanto em 1840, era fundada a povoação de Moçâmedes, a sul de Benguela, e durante o mesmo período os Portugueses tentaram a conquista dos povos da costa entre Luanda e Cabinda (Ambriz, Ambrizete (Nzeto), e Santo António do Zaire (Soio), não conseguindo porém os seus objectivos devido à oposição britânica. Como medida de estabelecer com melhor firmeza o seu domínio no reduzido território que controlavam ao longo do Rio Quanza, os Portugueses impuseram um imposto “por cabeça” que tinha de ser pago por africanos em moeda corrente ou em produtos coloniais, obrigando- os assim a participar na economia colonial, o que em breve resultou na expansão do domínio económico dos Portugueses às regiões limítrofes do interior. 2.4 As Viagens de David Livingstone e o Imperialismo Britânico David Livingstone nas suas viagens ao interior de África que desde 1852 tinham assegurado um bom número de acordos de protecção britânica com muitos chefes locais, alguns dos quais situados no território entre Angola e Moçambique, agravou as diferenças entre Portugal e a Inglaterra que disputavam a vassalagem dos povos da região. levando e o objectivo britânico de dominar todos os territórios ao longo da faixa entre o Cabo (na África do Sul) e Cairo (no Egipto) eram desafios que os Portugueses não podiam deixar de ignorar e atender de imediato, sob pena do não reconhecimento pela comunidade internacional dos seus direitos históricos, que não eram já reconhecidos por nenhum estado europeu. 2.5 A Sociedade de Geografia de Lisboa
  • 13. Em 1870 o Ministro da Marinha e do Ultramar português estabeleceu uma comissão para preparar uma expedição por terra entre Angola e Moçambique com o fim de reafirmar o domínio português sobre a longa faixa de território entre as duas colónias. Com a criação da Sociedade de Geografia de Lisboa em 1875, o esforço português em África ganhou um ímpeto muito grande, já que mobilizou um número grande de comerciantes e industriais, estudiosos, missionários e oficiais militares de carreira, e fazendo Portugal acordar para a realidade africana uma geração após a independência do Brasil. Melhores meios financeiros e maiores recursos humanos foram postos à disposição pelo governo português para estudo, ocupação e colonização de praças em África, e um pequeno volume de emigração foi orientada para as novas colónias, em especial para Angola e Moçambique. 2.6 O Acordo Luso-Britânico de 1884 sobre a Foz do Zaire Assim e pela mesma razão os Portugueses ocuparam o Antigo Reino do Congo em 1881 e Cabinda e Massábi em 1883, como medida de afastar ou tentar neutralizar a influência dos franceses a norte (Ponta Negra) e de Leopoldo II da Bélgica na foz do rio Zaire (Boma e Matadi), que entretanto tinham estabelecido um número de feitorias comerciais ao longo da costa. Com o objectivo de confirmar o seu domínio sobre a região, Portugal assinou um acordo com a Inglaterra em 1884, em que a Inglaterra confirmava a pretensão portuguesa. Contudo, tanto os Franceses com Leopoldo II da Bélgica montaram uma oposição muito forte contra o acordo, não o reconhecendo de forma alguma, e até argumentando ruídos de guerra. Face à oposição internacional e ao risco da deterioração das suas relações com o resto da Europa, incluindo o risco de uma nova guerra, o Parlamento Inglês não reconheceu o acordo com Portugal. 2.7 A Conferência de Berlim Com o objectivo de confirmar e haver reconhecidas as suas possessões em África, especialmente os seus direitos históricos sobre a foz do Rio Zaire, Portugal de iniciativa própria apelou ao Chanceler Alemão Otto von Bismark para a realização de uma conferência internacional sobre a Bacia do Congo. O pedido de tal conferência, que tinha sido feita por Portugaljá algumas vezes em anos anteriores e tinha acabado em “ouvidos de mouco”, desta vez porém capturou a atenção de Bismark, que se via preocupado com a expansão francesa e inglesa em África, e com a falta de colónias alemãs em África. Até aquela altura, a posição oficial (embora não a de facto) do governo alemão era que a Alemanha não estava interessada em colónias; contudo, a rápida ascensão da Inglaterra como potência económica através da Revolução industrial, convenceu Bismark que esta era a melhor oportunidade para a Alemanha se lançar também na Corrida à África, com o objectivo de assegurar fontes de matérias primas para a indústria alemã e de novos mercados para a sua
  • 14. economia emergente, e também de despoletar uma situação internacional que se tornava gradualmente mais explosiva. A conferência teve lugar em Berlim, entre 15 de Novembro de 1884 e 26 de Novembro de 1885, durando os trabalhos quase um ano. Quatorze estados fizeram-se representar - Suécia- Noruega (que estavam unidas até 1905), Dinamarca, Inglaterra, Holanda, Bélgica, França, Alemanha, o Império Austro-Húngaro, Itália, Espanha, Portugal, Turquia, Rússia, e Estados Unidos da América - dos quais a França, a Inglaterra, a Alemanha e Portugal foram os mais protagonistas. A conferência começou por discutir o estatuto internacional advogado para o delta do Rio Níger e da foz do Rio Zaire, que passariam a ser abertas ao comércio internacional, e não sujeitas a qualquer domínio colonial. Apesar do acordo atingido no que respeita à neutralidade para a foz do Zaire, a grande bacia do Zaire, incluindo a região do Baixo Congo (imediatamente a norte e Nordeste de Angola) passou a ser colónia privada do Rei Leopoldo II da Bélgica, sob a bandeira do Estado Livre do Congo. 2.8 A Corrida à África Até ao tempo da Conferência de Berlim, a presença europeia em África reduzia-se a um número limitado de entrepostos costeiros, que tinham servido de portos negreiros durante os 350 anos do tráfico de escravos do Atlântico, com a excepção da presença portuguesa ao longo do curso do Rio Cuanza na costa ocidental, e do Rio Zambeze na costa oriental, e da penetração Boer na colónia do Cabo, no Transval e no Estado Livre de Orange na África austral. É certo que a descoberta de diamantes a norte do Transval em 1867 tinha atraído um grande número de colonos à região, representando no todo menos de 10% da superfície total do continente. A Conferência de Berlim foi a primeira conferência global na história, na medida em que envolveu a maioria dos estados mais desenvolvidos na época (Europa e Estados Unidos da América), se bem que não tenha incluído qualquer estado da Ásia. A conferência adoptou ainda o princípio fundamental de ocupação efectiva do território, pela qual a soberania de um estado colonizador sobre um território colonial era somente reconhecida pela comunidade internacional, se o país colonizador demonstrasse que tivesse uma presença efectiva que pudesse proteger o comércio na colónia, tivesse uma administração colonial e uma presença militar efectiva. O princípio da ocupação efectiva fez da África um manto de retalhos de colónias europeias e resultou na configuração territorial das colónias não corresponder às fronteiras dos estados tradicionais africanos, pela qual nações africanas ficaram divididas entre várias colónias, e uma mesma colónia incluir estados tradicionais africanos inimigo tradicionais. 2.9 Impérios e Colónias Após a Conferência, a África ficou assim dividida: Para a Inglaterra, o eixo de colónias do Cabo
  • 15. ao Cairo, incluindo o Sudão, Uganda, Quénia, Rodésia e Niassalândia (Zâmbia, Malawi, e Zimbabwe), Bechuanalândia (Botsuana), e Suazilândia (Lesoto), e as colónias da Costa do Ouro (Gana) e Nigéria. A França ficou com a maior parte da África Ocidental, da Mauritânia ao Chade, e as colónias do Gabão e do Congo Francês (Brazzaville) na África Central. A Alemanha ficou com a colónia do Togo no Golfo da Guiné, Sudoeste Africano (Namibia), e Tanganica (Tanzânia). O Rei Leopoldo II da Bélgica viu confirmada a sua soberania sobre of Estado Livre do Congo (Congo Kinshasa). Portugal ficou com Angola na costa ocidental e Moçambique na costa oriental. A Itália ficou com a Somalilândia (Somália) e parte da Etiópia. A Espanha ficou com a pequena colónia da Guiné Equatorial (Rio Muni). Introdução - Razões históricas da Presença portuguesa em África Angola e a Conferência de Berlim. posted by Helder Ponte | 7/28/2007 08:46:00 PM | 1 comments 3.9.1 Os Escravos de Congo e Angola e a Ascensão da Hegemonia Europeia 1. Os Escravos de Angola e a Ascensão da Hegemonia Europeia Começamos por relembrar que, como resultado do Tratado de Tordesilhas firmado entre Portugal e Espanha em 1494, os dois reinos ibéricos dividiram o mundo entre si, cabendo aos Portugueses o hemisfério oriental incluindo a África com a sua riqueze em ouro e marfim, e com o seu manancial quase infinito de mão-de-obra, e a Índia com possibilidades infinitas no comércio das especiarias. Os Espanhóis, por seu lado, ficaram com o hemisfério ocidental que incluia os ricos depósitos de ouro e prata nas Américas e com o comércio do Pacífico,
  • 16. incluindo as Ilhas Molucas (Filipinas) no Extremo Oriente; contudo sem uma oferta abundante, rentável e segura de mão-de-obra, que podia ser fornecida somente pelos Portugueses. Portugal foi o primeiro estado europeu a estabelecer colónias de base agrícola nas novas terras descobertas, inicialmente no Atlântico (Madeira), depois em África (São Tomé) e mais tarde na América do Sul (Brasil); contudo, com uma população relativamente escassa e tendo em atenção o sorvedouro de gente que a empresa da Índia requeria, os Portugueses depressa concluiram que a empresa da colónia agrícola de plantação era de facto muito rentável, mas que requeria outra fonte de mão-de-obra que não somente colonos portugueses, descobrindo assim o papel fundamental que o escravo africano haveria a desempenhar neste novo sistema económico mundial. Convém aqui lembrar que em termos relativos de emigração (emigração em relação à população), emigraram mais Portugueses para a Índia, para o Brasil e para África, que todos os emigrantes Espanhois, Ingleses, e Franceses juntos para as Américas. No que respeita à fonte (oferta) de mão-de-obra, os Portugueses usaram escravos africanos primeiro na produção de açúcar na Ilha da Madeira, e depois na Ilha de São Tomé, onde ganharam a experiência na captura, transporte e venda de escravos africanos da costa ocidental de África para regiões distantes. O lucro do tráfico negreiro depressa convenceu os Portugueses a estabelecerem feitorias para o tráfico de escravos ao longo da costa africana. Estabeleceram assim a feitoria de Arguim na costa ocidental, e em 1481 construiram o Forte de São Jorge da Mina - um projecto de construção verdadeiramente revolucionário para a época, pois os edifícios do forte foram todos pré-fabricados em Portugal, e os componentes foram "reconstruídos" por um grande contingente de pedreiros e carpinteiros portugueses, que em ecomissão de serviço, tinham sido contratados para completar a construção do forte no local. A Corôa portuguesa entretanto tinha aperfeiçoado o regime devenda de privilégios reais a feitores para o tráfico negreiro nas costas de África. Esta experiência mostrou-se valiosa nos primeiros "asientos" (contrato de fornecimento de escravos) que Filipe II de Espanha (I de Portugal) já no tempo da União Ibérica conferiu em 1595 a negreiros de transportarem escravos das regiões de captura em África directamente para as minas de ouro no México, estabelecendo-se assim o que mais tarde se veio a designar pelotráfico de escravos do Atlântico, e no qual Portugal viria a desempenhar o papel mais destacado na sua primeira fase. Com a derrota da Armada Invencível da União Ibérica no Canal da Mancha em 1588, Portugal perdeu grande parte da sua marinha de guerra e mercante e com elas o seu primeiro império colonial - a Índia. Para Portugal havia assim que reagrupar depressa e encontrar outra fonte de riqueza essencial para o sustento da sua economia, o que se veio a concretizar com a rápida expansão da cultura do açúcar (a famosa cana mélica do Levante) no Brasil. Nasceu assim o segundo império português - o Brasil - que havia de perdurar até ao Grito do Ipiranga
  • 17. (declaração de Independência do Brasil) em 1822. 1.1 O Escravo de Angola no Ciclo do Açúcar do Brasil no Século XVII Como bem disse o Padre António Vieira em meados dos Séc. XVII na sua campanha de angariar suporte para a retomada pelos Portugueses das fontes de escravos na África Central (São Jorge da Mina, São Tomé, Loango, Cabinda, Malembo, Sonho, Luanda e Benguela)"Sem Negros não há Pernambuco e sem Angola não há Negros!". A mais-valia extraída do trabalho dos escravos de Angola foi o fulcro principal que sustentou a economia açucareira do Brasil no Século XVII, a mineira no Século XVIII, e a cafeeira até aos fins do Século XIX. Durante estes três séculos o Brasil desenvolveu um papel fundamental no quadro da economia mundial, ao mesmo tempo que o trabalho do escravo Angolano era o agente principal da criação da riqueza no Brasil e da contribuição deste para a economia mundial. Em termos estatísticos muito sumários, estima-se que durante o período do tráfico de escravos do Atlântico (entre 1519 e 1867), tenham sido levados de Angola e da Bacia do Congo mais the 5milhões de pessoas, a uma média mensal de cerca de 1.250 (ou média diária de cerca de 40 escravos), perfazendo cerca de 44% da exportação de escravos de África. Cerca de 10.000 escravos chegava em média anualmente ao Brasil. Em termos do total para o tráfico de escravos do Atlântico, de 1519 a 1867, 11,6 milhões de homens, mulheres e crianças foram levadas do interior de África para as Américas, 3,3 milhões morreram no percurso entre a sua região de origem e o porto negreiro na costa, e 1,5 milhões morreram na Passagem do Meio (travessia do Atlântico). O número total de pessoas escravizadas e vendidas ou que morreram no tráfico do Atlântico sómente, excluindo o número de escravos exportados para o Norte de África e estados árabes e o número de escravos exportados para o Irão, Índia, e para o resto da Ásia, estima-se em mais de 15 milhões. Ainda que em forma muito sumária, penso que é útil delinear aqui a estrutura da economia mundial dos séculos XVII e XVIII e o papel que Angola e o Brasil desempenharam na mesma. 1.2 Os Holandeses no Atlântico Sul Vazios de homens e de capitais, de equipamento e de meios de transporte, os Portugueses tiveram que financiar a empresa do açúcar brasileiro com empréstimos concedidos por banqueiros e comerciantes Holandeses, para a compra de equipamento produzido na Holanda, ao mesmo tempo que o transporte do açúcar brasileiro para a Europa e dos escravos de África para o Brasil eram feitos também em navios holandeses. O influxo de capitais para os Países-Baixos foi por sua vez sustentado em grande parte por Judeus (Cristãos-Novos) que tinham sido expulsos da Península Ibérica e que se haviam refugiado nos Países-Baixos. Porém, é importante relembrar que desde os primórdios da colonização das Américas os Holandeses adoptaram uma stratégia económica nacional com base no comércio ultramarino. Com a fundação das companhias de comércio ultramarino (as
  • 18. percursoras das actuais sociedades anónimas), os Holandeses desde a partida asseguraram o monopólio do comércio com a Ásia, a África e as Américas no Século XVII. A sua frota marítima era constituída por navios de maior tonelagem e de menor tripulação, o que rendia maiores lucros, e nos finais do Século XVII a sua frota mercante era maior que as frotas da Inglaterra, da França, da Alemanha, e de Portugal combinadas. Pela sua oportunidade e importância, transcrevo a seguir um trecho da "Formação Económica do Brasil", páginas 10 e 11, do Professor Celso Furtado, recentemente falecido, cuja obra considero a mais importante de todos os economistas de língua portuguesa: "A partir da metade do Século XVI a produção portuguesa de açúcar passa a ser mais e mais uma empresa em comum com os flamengos, inicialmente representados pelos interesses de Antuérpia e em seguida pelos de Amsterdã. Os flamengos recolhiam o produto em Lisboa, refinavam-no e faziam a distribuição por toda a Europa, particularmente o Báltico, a França e a Inglaterra. A contribuição dos flamengos - particularmente dos holandeses - para a grande expansão do mercado do açúcar, na segunda metade do Século XVI, constitui um fator fundamental do êxito da colonização do Brasil. Especializados no comércio intra-europeu, grande parte do qual financiavam, os holandeses eram nessa epoca o único povo que dispunha de suficiente organização comercial para criar um mercado de grandes dimensões para um produto práticamente, como era o açúcar. ... E não sómente com a sua experiência comercial contribuíram os holandeses. Parte substancial dos capitais requeridos pela empresa açucareira viera dos Países-Baixos. Existem indícios abundantes de que os capitalistas holandeses não se limitaram a financiar a refinação e comercialização do produto. Tudo indica que os capitais flamengos participaram no financiamento das instalações produtivas no Brasil bem como no da importação da mão-de- obra escrava. ... Se se tem em conta que os holandeses controlavam o transporte (inclusive parte do transporte entre o Brasil e Portugal), a refinação e a comercialização do produto depreende-se que o negócio do açúcar era na realidade mais deles do que dos portugueses. Somente os lucros da refinação alcançavam aproximadamente a terça parte do valor do açúcar em bruto." Animados com o êxito da Companhia das Índias Orientais na Insulíndia (Indonésia actual) e com a derrota dos Portugueses na Índia e a sua fraqueza militar e económica no Brasil e em África, os Holandeses depressa adoptaram a mesma solução para o domínio do Atlântico Sul, o que levou primeiro ao estabelecimento da Companhia Privilegiada da Índias Ocidentais em 1621 e àconquista de Salvador da Bahia em 1624 (retomada pelos Portugueses e Espanhois no ano seguinte), de Recife (na Capitania de Pernambuco) em 1630, e poucos anos depois a costa entre Sergipe e o Maranhão. Cientes da necessidade de assegurar uma oferta abundante, segura e barata de escravos africanos, os Holandeses tomaram aos Portugueses em 1637 o Forte de São Jorge da Mina no
  • 19. Golfo da Guiné, e mais tarde em 1641 a Ilha de São Tomé e a colónia de Angola (Cabinda, Pinda (Soyo), Luanda e Benguela), que eram já os principais portos negreiros fornecedores de escravos na costa africana a sul do equador para a indústria do açúcar brasileira. Em 1652 os Holandeses fundaram a Colónia do Cabo (na África do Sul de hoje) como posto de reabastecimento ás suas carreiras para a Insulíndia e base militar para policiamento do Atlântico Sul. O sucesso batavo nesta empresa foi assinalável, já que por 24 anos, osholandeses tomaram aos Portugueses as sete capitanias mais prósperas da costa brasileira, embora nunca tenham sido capazes de expulsar completamente os Portugueses do Brasil. O apogeu do domínio batavo do Brasil teve lugar durante o consulado do Príncipe João Maurício de Nassau (1637 a 1644), que em poucos anos transformou a cidade do Recife, capital de Pernambuco e sede do governo holandês, numa das cidades mais modernas e cosmopolitas do mundo de então. 1.3 El Cerro Rico de Potosi A descoberta da América por Cristóvão Colombo em 1492 e da descoberta do Brasil por Pedro Álvares Cabral em 1500 (em que o debate está ainda em aberto se a viagem de Pedro Álvares à costa brasileira foi acidental, se planeada, ou mesmo se Duarte Pacheco Pereira já lá tinha chegado poucos anos antes), abriram o Novo Mundo à Espanha e Portugal. Estas descobertas foram um tanto acidentais, pois os dois estados ibéricos encontraram as Américas como um corolário inesperado na procura de uma rota marítima ocidental para a Índia, e daí o termo "Índio" dado aos habitantes nativos do Novo Mundo. Os primeiros contactos com os habitantes do Novo Mundo não levaram ao estabelecimento de qualquer comércio de monta de imediato, ao contrário da experiência dos Portugueses em África e na Índia. A única excepção de nota foi a exploração do pau brasil ao longo da costa oriental da América do Sul, mais tarde designada Brasil, termo com raíz na palavra francesa cor de braza / vermelha do pau que se passou a usar na produção de corante de tinturaria para a crescente indústria textil francesa sediada em Rouen e na Flandres. Os Espanhois, por seu lado, procuravam em vão uma passagem por terra para o Ocidente, através do novo continente. A primeira colónia permanente no Novo Mundo foi estabelecida por Cristóvão Colombo na sua segunda viagem, na costa norte da Ilha Hispaniola, onde se fez o traçado para uma cidade, o governo municipal foi estabelecido, e terra foi dividida entre os colonos espanhois, que com a atribuição da terra, recebiam também um número de nativos para trabalhar a terra (encomienda). A cana de açúcar foi introduzida cedo na Ilha Hispaniola (hoje República Dominicana e Haiti) em 1493, e em 1520 havia 28 engenhos activos na produção de açúcar. Em 1513 foi encontrado ouro na costa sul da Hispaniola, o que despertou o interesse da corôa espanhola. Ainda em 1513 Juan Ponce de Leon reconheceu a costa da Florida e Vasco Nunez de Balboa atravessou o istmo do Panamá e avistou o Oceano Pacifico. Em 1516 Juan Díaz Solis explorou a foz do Rio da Prata. Em 1518 a costa da Península do Yucatan foi reconhecida
  • 20. porFranciscoHernandez de Córdoba e Juan de Grijalva. Após Fernão de Magalhães ter provado em 1521 através da sua viagem de circum-navegação que as Molucas (parte do arquipélago das Ilhas Filipinas) se podia atingir pelo ocidente, a estratégia colonial espanhola mudou. Constatada que foi a duração e custo de tal viagem, a corôa espanhola concentrou os seus esforços na procura de metais preciosos no Novo Mundo, e relegou para segundo lugar a preocupação de competir com os Portugueses no comércio das especiarias da Insulíndia. Como sabemos Fernão de Magalhães não chegou a cumprir a viagem pois foi morto numa escaramuça com os nativos das Ilhas Cebú, o que não lhe tira o crédito de ter planeado e comandado a expedição mais difícil até hoje realizada na exploração do planeta. Em 1521 HernánCortés conquistou o México e surpreendeu o mundo com a quantidade de ouro e prata obtida dos povos conquistados, com valor muito superior a qualquer comércio de especiarias com a Índia. A conquista do México mudou a estratégia dos Espanhois no Novo Mundo. Não importava jamais procurar e desenvolver o comércio, já que a riqueza em ouro e prata tudo suplantava. Assim, assistimos à acção dos Conquistadores em procura do El Dorado, que com colunas militares relativamente pequenas conquistaram impérios imensos no Novo Mundo. A conquista da América Central foi completada em 1525, e por cerca de 1543, os Espanhois dominavam mais de metada do território da América do Norte, entre as Carolinas na costa atlântica e o Oregon na costa do Pacífico. Em 1531 Francisco Pizarro completou a conquista do Império Inca e surpreendeu ainda mais o mundo com a riqueza em ouro e prata do despojo da conquista de Cuzco e MachuPichu, em valor muito mais elevado que o arrecadado por HernánCortés no México. Devido à sua riqueza o Perú passou desde a sua conquista a ser o centro principal da expansão Espanhola nas Américas. Por outro lado, nas Caraíbas, a cidade de Havana, fundada em 1519 desde cedo se tornou o centro da expansão Espanhola nas Caraíbas, e Buenos Aires, fundada em 1536, tornou-se o centro da expansão do interior da América do Sul, a partir da foz do Rio da Prata. Em 1545 os Espanhois descobriram a mina de prata de Potosi, numa região remota e montanhosa do Perú (na região que mais tarde se havia de chamar Bolívia), talvez a mina mais rica do mundo. Outras descobertas de minas muito ricas se fizeram em seguida, tornando-se a América Espanhola o maior produtor de ouro e prata do mundo de então. A riqueza em ouro e prata do Perú e do México foi decerto o elemento chave do arranque económico do império Espanhol no Novo Mundo; contudo, a agricultura e pecuária foram as actividades que possibilitarm a dominação efectiva dos Espanhois sobre um território tão vasto. A mão-de-obra nativa, utilizada inicialmente na forma de "encomiendas" provou não ser solução suficiente para a crescente procura de mão-de-obra para trabalhar as minas. Tornou-se então necessário recorrer ao trabalho escravo de africanos, que em número sempre crescente, depressa substituíu a mão-de-obra nativa (Índia). Assim, no Novo Mundo os escravos africanos depressa não eram só essenciais à produção de
  • 21. açúcar do Brasil; eles tornaram-se tambémimprescindíveis às minas de ouro do e prata do México, e às minas de prata do Perú e da Bolívia (a serra de prata de Potosi). Em termos muito sumários as minas da América Espanhola absorveram durante o período do tráfico de escravos do Atlântico mais de 2,6 milhões de africanos (à razão de cerca de 7.500 por ano), o que levou a União Ibérica (Espanha e Portugal) a concentrar os seus esforços na reconquista imediata da Bahia, Pernambuco e Maranhão aos Holandeses. Assim, em 1625, coadjuvados pelos Espanhois, os Portugueses conseguiram reunir a mais poderosa esquadra naval jamais vista no Atlântico Sul (52 navios e 12.000 homens) e reconquistaram Salvador da Bahia (que era a sede do poder Português no Brasil), e com a ajuda dos Portugueses do Rio de Janeiro, reconquistaram Luanda, Benguela e São Tomé em 1648. Contudo, os Holandeses mantiveram o controle sobre os dois portos negreiros estratégicos do Forte de São Jorge da Mina e de Loango, que dominavam o comércio negreiro no Golfo da Guiné. Este esforço veio a materializar-se com a expulsão definitiva dos Holandeses de Angola e São Tomé em 1648 e do Brasil (Recife, Pernambuco) em 1654, e a consequente restauração do domínio português (mais própriamente, o domínio brasileiro) do Atlântico Sul. 1.4 Salvador Correia de Sá e a Restauração do Domínio Português no Atlântico Sul XXXXX - Ainda em desenvolvimento 1.5 A Ascensão da Economia de Plantação nas Antilhas Depois da sua expulsão do Brasil, mas ainda cientes do seu controle sobre a economia açucareira, os Holandeses deixaram o Brasil mas não sem levarem consigo a tecnologia, o capital, o equipamento, e as fontes de escravos africanos, e mudaram-se para as Antilhas, onde depressa estabeleceram plantações que em poucos anos suplantaram o volume de produção do açúcar brasileiro, o que veio a resultar numa baixa mundial de preços do açúcar muito longa que se traduziu numa crise económica muito longa e profunda da economia açúcareira brasileira da qual jamais se haveria de recuperar. De facto, com fontes de capital e mão-de-obra asseguradas, com maquinaria e equipamento novo e mais moderno, e com custos de transporte mais baixos do açúcar para a Europa e as Colónias Americanas devido à maior proximidade entre as regiões produtoras (Antilhas) e as de consumo (Europa), os Holandeses depressa retomaram o comando da produção e comércio mundial de açúcar, e com isto despertaram o interesse da Inglaterra e da França para fazerem o mesmo, deixando os Portugueses no Brasil na difícil posição de terem de competir num mercado em que os preços estavam numa baixa de longa duração, enquanto os seus custos de produção continuavam a cresecer, e a distância de mercados obrigava a custos de transporte mais elevados. Seguindo o exemplo dos Holandeses, em breve os Ingleses e Franceses tomaram aos Espanhois as ilhas mais importantes nas Antilhas, com a excepção das ilhas de Cuba e Porto
  • 22. Rico, estabelecendo promissoras colónias de plantação de açúcar no Haiti (França), na Jamaica e em Barbados (Inglaterra). Com um excedente de população relativamente grande, a Inglaterra depressa copiou e expandiu o modelo de plantação de açúcar levado pelos Holandeses para as Antilhas, que passou a incluir também plantações de tabaco e anil nas ilhas, e de algodão nas Colónias Americanas mais meridionais (Virginia, as Carolinas e a Geórgia) no continente americano. Antes de recorrerem ao tráfico de escravos africanos através do Atlântico, os Ingleses usaram primeiro o excedente da sua própria população nas suas Ilhas Britânicas com fonte principal de mão-de-obra para as suas novas colónias nas Antilhas e na América. Como resultado das profundas transformações económicas na agricultura inglesa (o regime de propriedade cercada (enclosures) para a criação de grandes rebanhos de carneiros para a produção industrial de lã nas cidades), grande número de trabalhadores da terra viram-se sem possibilidades de sobrevivência nos campos, não tendo outro recurso senão tentarem melhor sorte nas cidades, para onde emigravam em grande número, e oferecerem a sua força de trabalho no Novo Mundo através de contratos de regime de servidão temporária de cinco a sete anos (indenture), a troco do pagamento da passagem, comida e dormida durante o termo do contrato, e no final deste, um pedaço de terra no Novo Mundo, ou um pequeno montante em dinheiro, que podiam investir eles próprios em pequenas fazendas ou comércio. É importante salientar aqui que as condições de trabalho para os trabalhadores ingleses em regime de servidão temporária nas Antilhas e nas Colónias Americanas não eram melhores que as do escravo africano, na medida em que o trabalhador em regime de servidão temporária era mais barato que o escravo de África, e a sua oferta em número era muito maior que a procura. A estes factores devemos adicionar o facto que os donos das plantações de açúcar viam os trabalhadores em regime de servidão temporária como possível concorrência à sua posição de poder no quadro económico local e regional, de forma que nunca fizeram o tempo do contrato um período aprazível ou atraente ao trabalhador emigrante. Porém, devido à concorrência militar entre a Inglaterra e a França no Novo Mundo, e ao estado mais ou menos constante de guerra entre elas, este excesso de população passou a ser usado também na guarnição de fortes espalhados pelo mundo e no número crescente de navios de guerra necessários para manter a sua hegemonia, em vez de continuar a ser canalizada para a economia de plantação nas Antilhas. Esta redução crescente da oferta de mão-de-obra para as plantações nas Antilhas e na América levou a Inglaterra e a França a embarcar também no negócio do tráfico de escravos africanos em grande escala, e que em breve haviam de desafiar a supremacia histórica portuguesa no tráfico negreiro. 1.6 O Desenvolvimento das Colónias Inglesas na América Com o rápido desenvolvimento económico e populacional das Antilhas, os Ingleses encontraram nas colónias da Nova Inglaterra (New England - Maine, New Hampshire, Massachussets, Rhode Island, New York, Pennsylvania, Delaware e Maryland), a região ideal para a produção de artigos de consumo e de capital (cereais, batata, madeira, vestuário,
  • 23. ferramentas, equipamento, e navios) para venda nas Antilhas, a um preço mais baixo que os produtos produzidos na Europa, já que os custos de mão-de-obra eram mais baixos na América e o custo do frete marítimo era muito menor, devido a maior proximidade da América em relação às Antilhas, do que a distância longa e perigosa entre as Antilhas e a Europa. Da interacção de todos estes factores resultou o rápido desenvolvimento económico e populacional das Colónias Americanas, que cedo se estabeleceram com o mercado fornecedor da maioria dos bens necessários (bens de consumo e de capitais) às economias de plantação nas Antilhas e as colónias emergentes no centro e sul do continente norte-americano. Do mesmo modo, as colónias do Sul (Virgínia, Carolinas e Geórgia) cedo se especializaram na produção de tabaco, arroz, e, principalmente, algodão, que em breves anos se tornaram a principal região produtora de algodão e abastecedora das economias emergentes no Novo Mundo, em África, e principalmente na Europa. 1.7 O Ciclo do Ouro no Brasil A descoberta de ouro no Rio das Velhas (Ouro Preto) e em Vila Ricanos últimos anos do Século XVII e de diamantes em 1723 em Cerro do Frio, na Capitania de Minas Gerais, no Brasil, anos mais tardesalvou a independência política de Portugal por mais de um século, ao mesmo tempo que, irónicamente, relegou a economia lusitana para um estado de subdesenvolvimento crónico que havia de perdurar quase três séculos. Isto porque os rendimentos do "quinto" arrecadado do ouro do Brasil pela corôa portuguesa foram suficientemente abundantes para Portugal poder continuar como estado independente, ao mesmo tempo que enfeudaram a economia portuguesa ao domínio da inglesa, através dos tratados de 1654 e de Methuen em 1703, pelos quais o suporte militar inglês era garantido a custo da ausência completa de qualquer indústria agrícola ou transformadora de relevo em Portugal e sujeição absoluta à indústria inglesa. Assim, o ouro do Brasil não parava sequer em Lisboa; era imediatamente re-exportado como pagamento para as importações inglesas, ao passo que o papel de Portugal na economia europeia era reduzido à produção de vinho do Porto para exportação, cuja indústria e comércio eram por sua vez controlados por mercadores ingleses. 1.8 O Escravo Angolano na Economia Mineira do Brasil YYYY - Ainda em desenvolvimento "O Brasil era o paraíso para o Mulato, Purgatório para o Branco, e Inferno para o Negro" Eduardo Bueno "Terá sido o pior lugar do mundo, o ventre da besta e o bojo da fera, embora para aqueles que eram responsáveis por ele, não estavam lá, fosse o mais lucrativo dos depósitos e o mais vendável dos estoques. No porão dos navios negreiros que por mais de trezentos anos cruzaram o Atlântico, desed a costa oeste de África até à costa nordeste do
  • 24. Brasil, mais de três milhões de africanos fizeram uma viagem sem volta, cujos horrores geraram fortunas fabulosas, ergueram impérios familiares e construíram uma nação. O bojo dos navios da danação e da morte eram o ventre da besta mercantilista: uma máquina de moer carne humana, funcionando incessantemente para alimentar as plantações e os engenhos, as minas e as mesas,a casa e a cama dos senhores - e, mais do que tudo, os cofres dos traficantes de homens. ... um único exemplo. Em 1841, a belonave inglesa Fawn, capturou na costa brasileira, o navio Dois de Fevereiro. Desde 7 de Dezembro de 1831, o tráfico era ilegal no Brasil e navios de guerra britânicos patrulhavam o litoral. Após a apreensão do tumbeiro, o capitão do Fawn anotou, no diário de bordo a cena com o qual se deparou nos porões da embarcação: "Os vivos, os moribundos e os mortos amontoados numa única massa. Alguns desafortunados no mais lamentável estado de varíola, doentes com oftalmia, alguns completamente cegos; outros esqueletos vivos, arrastando-se com dificuldade, incapazes de suportarem o peso dos seus corpos miseráveis. Mães com crianças pequenas penduradas em seus peitos, incapazes de darem a ela uma gota de alimento. Como os tinham trazido até aquele ponto era surpreendente: todos estavam completamente nús. Seus membros tinham escoriações por terem estado deitados sobre o assoalho durante tanto tempo. No compartimento inferior o mau-cheiro era insuportável. Parecia inacreditável que seres humanos sobrevivessem naquela atmosfera". 1.9 Portugal, a Inglaterra e o Tratado de Methuen Por outro lado, o que restava da riqueza do ouro foi aplicada em Portugal em investimentos supéfluos e retrógrados como o Convento de Mafra, em vez de serem canalizados para investimentos na agricultura, na indústria ou na renovação da frota marítima, que haveriam de valorizar a economia. Para a Inglaterra, os lucros imensos das exportações para Portugal foram um factor chave para a rápida industrialização inglesa, pois permitiram uma acumulação de capital muito rápida e extensa, o que constituiu o impulso inicial para a Revolução Industrial Inglesa já nos princípios do Século XIX. O Marquês de Pombal caracterizou bem esta relação económica quando disse "que a Inglaterra havia reduzido Portugal a uma situação de dependência, conquistando o reino sem os incovenientes de uma conquista militar, em que Portugal tinha de importar tudo", relembrando até que "os escravos que trabalhavam nas minas do Brasil tinham que ser vestidos pelos Ingleses"(citado por Celso Furtado). Por outro lado e ainda citado por Celso Furtado, o historiador inglêsW. Cunningham nasuaobra "The Growth of Modern Industry and Commerce, Modern Times", Cambridge, 1921, caracterizoumelhorosbenefíciosdesteacordoeconómicopara a Inglaterraquandodisse: "To extent to which Portugal took off our manufacturers, and thus encouraged industry in this country, appeared to be measured by the vast amount of Brazilian bullion which was annually imported from Portugal. This was estimated at 50,000 Pounds per week... We cannot wonder that, according to the ideas of the time, Methuen's achievement was rated very high: he had opened up a large foreign demand for our goods, and had
  • 25. stimulated the employment of labour at home; while much of the returns from Portugal came to us in the form which was most necessary for restoring the currency, and most convenient for carrying on the great European War", e Alan Manchester nasuaobra "British Preeminence in Brazil, Its Rise and Decline", publicadaem 1933, afirmouque o comércioportuguês era "at the present time the most advantageous that we drove anywhere, the very best branch of all our European commerce". Como resultado do afluxo ao mercado de quantidades imensas de ouro do Brasil à Inglaterra (via Portugal), Londres substituiu Amsterdão como o maior centro financeiro do mundo, lugar cimeiro que havia de ocupar por mais de duzentos anos. Referência Bibliográfica Se quiseres aprofundar o estudo desta época tão importante para a hegemonia europeia da economia mundial, sugiro a consulta dos textos do Professor Celso Furtado "Teoria e Política do Desenvolvimento Económico", edição portuguesa das Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1971, o clássico "Formação Económica do Brasil" 17a. edição da Editora Nacional, São Paulo, 1980, e "A Economia Colonial no Brasil dos Séculos XVI e XVII", publicado pela Editora Hucitec, São Paulo, 2000; Recomendo ainda a consulta da obra extensa do Professor Charles Ralph Boxer, também recentemente falecido, da qual realço o clássico "The Portuguese SeabornEmpire 1415 - 1825" originalmente publicado em 1969, e recentemente publicado pela editora Carcanet em cooperação com a Fundação Calouste Gulbenkian e a Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. Esta obra é talvez a melhor análise da expansão portuguesa no mundo, e está traduzida em Português, tendo sido publicada no Brasil e em Portugal; a obra "Salvador de Sá andtheStruggle for Braziland Angola 1602 - 1686", publicada pela Universityof London e a AthlonPress, London, 1952; e a obra "The Golden Age ofBrazil - Growing Pains of a Colonial Society 1695 - 1750", publicada pela St. Martin'sPress, New York, 1995. Sugiro ainda a consulta de dois estudos muito bons de história económica: a obra clássica de J. Lúcio de Azevedo "Épocas de Portugal Económico", 3a. edição da Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1973; a obra fundamental do Professor Vitorino Magalhães Godinho "Os Descobrimentos Portugueses e a Economia Mundial", 2a edição publicada pela Editorial Presença, em Lisboa, 1983; E, finalmente, a obra de Caio Prado Júnior "Histórica Económica do Brasil", publicado pela Editora Brasiliense, 46a. reimpressão, São Paulo, 2004. Recomendo sobretudo a leitura da obra magnífica de divulgação histórica de Eduardo Bueno "Brasil: uma história - a Incrível Saga de um País", 6a. impressão da Editora Ática, São
  • 26. Paulo, 2005, pois além do seu excelente conteúdo, nos presenteia com uma colecção impressionante the gravuras e imagens da história do país irmão. posted by Helder Ponte | 7/28/2007 08:44:00 PM | 4 comments SATURDAY, JUNE 02, 2007 3.10 Linguagem, Estilo, Ortografia e Toponímia Longe que estou do convívio quotidiano falado e escrito da língua portuguesa, foi por vezes difícil encontrar soluções para um grande número de questões de linguagem, estilo, ortografia e toponímia. O que a seguir descrevo são apenas as soluções um tanto arbitrárias e nem sempre consistentes que optei para algumas questões de língua e de escrita. Espero assim que a sua explicação aqui ajude o leitor a deliciar mais e compreender melhor este tópico tão extenso e complexo. 1. Obra Solitária O relatar desta Viagem Pela História de Angola foi uma tarefa solitária. Há mais de trinta anos removido que estive da língua portuguesa, das novas regras de ortografia, dos novos nomes para lugares, da linguagem corrente em Angola e Portugal, ao que se acrescentou a dificuldade de escolher qual o estilo mais próprio para melhor trasmitir ideias ou processos diferentes, não foi sem desafios que a obra prosseguiu. Não tive o benefício de ter um editor para rever o que escrevia, nem sequer para discutir ideias antes de as incluir no texto. Embora ajudado um pouco pelo processador de texto (WordPerfect e Microsoft Word), às vezes perdi o acesso ao teclado em português, tive que recorrer a soluções que tornaram mais difícil o manuseamento de texto.
  • 27. A fim de ultrapassar a maioria destes desafios, optei por uma estratégia de revisão contínua de texto, sempre que encontrava um êrro ou recebia a dica de alguém a apontar uma correcção. Assim, este é um trabalho que está em construção perpétua, que depende necessariamente dos comentários e sugestões dos leitores pacientes que embarcam comigo nesta Viagem. As restrições na escolha e colocação de imagens nos blogs limitaram em certa medida o recurso à imagem visual, que teve que ser substituída pelo texto descritivo ou conceptual. Contudo, esforcei-me sempre por encontrar um balanco entre o texto e a imagem, de forma a tornar a leitura mais simples e "arejada" (menos densa). 2. Língua Portuguesa Talvez mais do que o francês e o espanhol, mas certamente menos que o inglês, o português é hoje uma língua internacional, "personalizado" fortemente em cada país em que é falado. Assim, o português falado em Angola é muito diferente do português falado no Brasil, em Moçambique , ou mesmo em Portugal. Em cada um desses países, fala-se um português diferente, não só recorrendo extensivamente termos locais, mas até na construção de frases ou do discurso. Esta variedade de sotaques reflectiu-se necessariamente no texto que é apresentado ao leitor. Contudo, achei por em basear o texto num portguês mais estabelecido, pelo que escolhi o português falado em Portugal, que é mais antigo, mais estruturado, e mais universal, em detrimento do português falado em Angola, que é mais local e que está atravessando correntemente transformações profundas, e que do qual tinha muito menos fontes de referência. Assim, a língua que usei neste trabalho é a portuguesa (de Portugal, e não de Angola ou do Brasil), se bem que usei alguns termos caracteristicamente angolanos nalgumas passagens. Evitei assim o uso do "k", do "w", e do "y", letras que não fazem parte do alfabeto português, embora de uso muito corrente no português falado e escrito actualmente em Angola. Em certas passagens transcrevi trechos de texto original num português mais arcaico que já não se encontra em uso. 3. Toponímia No que respeita à toponímia, usei tanto quanto possível os nomes de vilas, cidades e regiões de uso corrente em Angola, com os nomes correspondentes da idade colonial normalmente em parentesis, ou vice-versa. Contudo, em muitas situações, como é o caso do nome dos rios, usei os nomes escritos ainda à maneira do tempo colonial, com "C", em vez de "K", como Cuanza (em vez de Kuanza), e a segunda letra com "u" em vez de "w", como em Cuanza em vez de Kwanza.
  • 28. A divisão administrativa de Angola alterou-se pouco depois da Independência, o que facilitou muito a referência a distritos e regiões que mantiveram o mesmo nome. Contudo, numa perspectiva mais local, embora tenha acesso à divisão dos concelhos em "postos" (mais ou menos equivalentes a "freguesias" em Portugal), foi para mim muito difícil encontrar os nomes actuais para povoados, sanzalas, e "postos", pois alguns já não existem, e outros mudaram de nome que não consegui encontrar. Por falta de tradução própria de certos nomes internacionais para português, usei a terminologia internacional corrente. Em alguns casos porém, continueir fiel à terminologia portuguesa; usando o termo "Congo" em vez de "Kongo" e de "Cuíto" em vez de Kuíto. Ainda como limitações muito importantes na preparação desta Viagem Pela História de Angola, não tive acesso a nenhum atlas corrente de Angola, bem como não tive disponível um prontuário ortográfico português para consulta, nem tive o benefício de usar um editor profissional, pelo que o leitor encontrará decerto algumas faltas que me perdoará. 4. Estilo Devido à natureza breve e ligeira deste trabalho, usei um estilodescritivo e não analítico, se bem que sucinto. Na maioria das situações o leitor encontrará os factos, e por vezes não encontrará as razões, se bem que me preocupei em as avançar sempre que possível. Contudo, devido à sua própria natureza, especialmente no estudo de "Angola" nos diversos aspectos multidisciplinares, e no estudo de "história" como ciência e conhecimento, usei um enfoque analítico, muito mais útil à compreensão mais fácil das ideias e conceitos que me proponho a avançar. 5. Cronologia Em termos da sequência dos tópicos abordados, segui de uma maneira geral um encadeamento cronológico dos tópicos na apresentação do trabalho; embora, para melhor exposição de ideias e relações, tenha também tratado a maioria dos tópicos em grupos, sem maior obediência ao rigor cronológico. Esta aglomeração de tópicos em "grupo" (clusters em inglês) facilita grandemente a explicação e a compreensão dos tópicos expostos. Assim, na cobertura de certos tópicos, "saltamos" às vezes no tempo, não cobrindo o continuum do tempo por completo. A cobertura da História de Angola não se reduz só à descrição de acontecimentos isolados ao longo dos tempos; com efeito, ela acontece no espaço (geografia), no tempo (cronologia), e no processo de pensamento (teoria) usado na sua explicação. posted by Helder Ponte | 6/02/2007 08:19:00 PM | 1 comments MONDAY, MAY 29, 2006
  • 29. 3.9 Angola na História do Mundo Mencionei já nesta Viagem que o estudo da História de Angola não ocorre num vácuo, ou numa proveta de laboratório, nem se limita ao que aconteceu em Angola sómente. O seu estudo tem que ter em atenção o que se passou ou passava nos estados ou povos mais chegados a Angola ao longo dos tempos. Precisamos assim de relacionar Angola com o resto do mundo, e investigar as influências que recebeu do exterior e a influência que exerceu nos povos da África Central, no Atlântico Sul, nas Américas, na Europa, e mesmo no mundo; em poucas palavras, é necessário enquadrar a História de Angola na História Universal. Assim é importante relacionar a História de Angola com a história dos povos Bantos que cedo se estabeleceram no que hoje chamamos território de Angola; com a história de Portugal como potência colonial de cinco séculos; com a história do Brasil, nação irmã e cliente mais importante na parceria do tráfico de escravos - onde hoje há mais descendentes de africanos do que africanos em Angola; e com a própria história geral de África - seja de povos próximo como os do Congo ou de São Tomé, ou de sociedades ou culturas mais distantes no espaço e no tempo, como oacivilizaçãoSuahili na costa oriental de África ou mesmo da República daÁfrica do Sul nos tempos mais recentes. É ainda necessário relacionar a História de Angola com a história atlântica e de todos os seus povos ribeirinhos, como a América Latina (antigas colónias de Espanha e Portugal), as Antilhas, a Holanda, a Inglaterra, a França, e até os Estados Unidos da América; de realçar o papel do tráfico de escravos angolanos na economia mundial do século XVI ao século XIX. É bom lembrar que desde a sua imersão na economia e história mundiais nos finais do Século XV, os povos de Angola, embora hoje um pouco arredados dos centros de decisão mundial, estiveram nocerne de três grandes desenvolvimentos da história da humanidade nos últimos quinhentos anos. A saber, a) Os escravos levados de Angola e da bacia do Congoaguentaram durante mais de 350 anos a
  • 30. carga mais difícil na construção do Novo Mundo (Brasil, Antilhas e Estados Unidos) e alimentaram a riqueza económica e preponderância política da Europa durante o mesmo período; b) As disputas territoriais em Angola entre Portugal (Lunda, Foz do Zaire, costa da região do Ambriz, e bacia dos rios LunguéBungo e Zambeze no Moxico) e Leopoldo II da Bélgica (Lunda e Katanga, Estado Livre do Congo) foram o pomo de discórdia que levou à realização da Conferência de Berlim onde a consequente partilha de África teve lugar e onde nasceram os impérios coloniais europeus que haviam de perdurar cerca de um século; e, c) Foi nas chanas das Terras do Fim-do-Mundo em Angola(Cuito Cuanavale) que se travaram as batalhas finais mais decisivas da Guerra Fria , o que eventualmente resultou nodesmoronar dos bastiões brancos em África (Rodésia, Sudoeste Africano e o regime de apartheid na República da África do Sul), e na queda final da experência marxista- leninista de 70 anos da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) na Europa Oriental e Ásia Central. Assim, vamos rever em mais detalhe nos próximos três capítulos cada um destes três i,portantes desenvolvimentos históricos de forma a podermos compreender melhor o papel de Angola na história da humanidade. Nota ao Leitor: Encontrarás nesta Viagem algumas vinhetas cujos temas não aparentam uma ligação directa ou imediata com a História de Angola; contudo elas são importantes para uma melhor compreensão do que pretendo expôr. Estas vinhetas expõem o contexto regional, global e temporal em que a História de Angola se desenrolou, ajudando assim a enriquecer a nossa compreensão dos factores externos mais relevantes que a moldaram. posted by Helder Ponte | 5/29/2006 05:54:00 PM | 1 comments 3.8 Tanta História Ainda por Contar...
  • 31. 1. Muito Ainda Está por Estudar e Escrever Apesar do grande esforço de um bom número de investigadores de história, o conhecimento da História de Angola é ainda hoje muito incompleto. Com efeito, podemos dizer que a história completa de Angola está ainda por escrever, pois existem muitas lacunas muito extensas no seu corpo de conhecimento. Há períodos completos ou grupos étnicos inteiros sobre os quais pouco ou nada se sabe da sua história. Como exemplos citamos apenas a história de alguns povos bantos que vieram ocupar Angola, e ainda menos o que se sabe sobre a história pré-Banta de Angola. No caso específico desta Viagem Pela História de Angola, menciono o exemplo das migrações dos povos Bantos e o seu impacto nas populações que até aí ocupavam o território de Angola, que desconhecemos quase completamente. De facto, com a excepção do corpo magro de conhecimento arqueológico muito escasso de estudos sobre o Antigo Reino do Congo e de alguns povos do planalto e da savana, e da pesquisa sobre o tráfico de escravos e sobre as Campanhas Militares de Ocupação, pouco mais se sabe, pois não existe ainda um corpo de conhecimento histórico organizado estabelecido para os outros povos de Angola. Para o Português dos Séculos XVI ou XVII interessado na história dos Antigo Reino do Congo e do Reino de Ndongo (Angola), o estudo da história (ou melhor, da pré-história) destes povos e os seus percursores na região representava um desafio considerável, já que o modelo de criação com base na Bíblia Judeo-Cristã que explicava a história dos povos da Europa e do Próximo-Oriente do seu tempo, o não podia acomodar e muito menos explicar, e a ausência de fontes escritas revelavam-se como uma parede intransponível para o estudo efectivo da sua história. Desde cedo ele reconheceu a utilidade e limitações da história oral, e a dificuldade (quase impossibilidade) em estudar os povos que habitaram a região antes da chegada dos povos de língua Banta. Em termos de cobertura historiográfica para todos os povos de Angola, os Antigos Reinos do Congo e de Ndongo são decerto os que receberam mais atenção dos historiadores. De facto, as fontes de história para estes reinos desde o início do contacto com os Portugueses até ao
  • 32. final do Século XVII são relativamente abundantes, comparando com outras regiões e povos de África a sul do Sahara. Após a abolição da escravatura e do tráfico houve um ressurgimento de estudos e fontes para as regiões de Luanda, Ambaca, Congo, Cabinda, Benguela, Lundas e Moçâmedes, e após a Conferência de Berlim as fontes são melhores na cobertura das Campanhas Militares de Ocupação, embora essas fontes realcem a perspetiva portuguesa e não cubram a angolana. Contudo, quase não existem fontes primárias para a história dos povos Ovimbundo, Nganguela, Nhaneca-Humbe, Ambó, Herero, Xindonga e os povos pré-Bantos (Khoisan, Cuepes e Cuíssis) desde a sua chegada ao que é hoje o território de Angola até a um passado muito recente (meados do Século XX). Na verdade, para a maioria dos povos de Angola, não sabemos exactamente quem eram, como e quando chegaram, como se formaram, e quanto mudaram desde o tempo do seu relacionamento inicial com outros povos que já lá viviam. Para colmatar algumas destas lacunas é importante que estudemos a extensa documentação existente nos arquivos históricos em Angola, em Portugal e no Brasil. 2. Trabalhos de Estudiosos Estrangeiros É também necessário traduzir e divulgar em língua portuguesa algumas obras de importância extraordinária para o estudo da História de Angola publicadas no estrangeiro, como os trabalhos de E. G. Ravenstein, Heli Chatelain, Monsenhor Cuvelier e Louis Jadin, Edgar Prestage, C.R. Boxer, J.D.Fage, R.A. Oliver, Jan Vansina, DesmondClark, Douglas Wheeler, Georges Balandier, James Duffy, MerlinEnnis, Basil Davidson, David Birmingham, Gerald Bender, John Thornton, Phyllis Martin, Joseph Miller, Lawrence Henderson, GladwinChilds, PhilipCurtin, Eugene Genovese, Herbert Klein, Patrick Manning, Paul Lovejoy, Gervase Clarence-Smith, René Pelissier, David Eltis, Franz-WilheimHeimer, BeatrixHeintz, Linda Heywood, Robert Blackburn, A.J. Russell Wood, Marc Ferro, Susan Broadhead, Anne Hilton, John Reader, Marq de Villiers, e José Curto, e outros estudiosos tornando-as assim mais disponíveis ao estudioso lusófono da História de Angola. 3. Trabalhos de Historiadores Brasileiros É ainda essencial a divulgação das obras de estudiosos brasileiros como Gilberto Freire, Celso Furtado, Caio Prado Júnior, Josué de Castro, Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, Sérgio Buarque da Holanda, Luís Pereira, Henrique Fernando Cardoso, Maria Beatriz Nizza da Silva, Kátia de Queiroz Mattoso, Décio Freitas, Jaime Rodrigues, Luis Felipe de Alencastro, Marina de Mello e Souza, e Eduardo Bueno, que apesar de incidirem sobre o estudo da história do Brasil, abriram novos caminhos para uma compreensão mais completa da História de Angola.
  • 33. 4. História da África Central Angola está inserida a África Central, pelo que se torna importante ao estudioso da sua História saber relacionar acontecimentos e tendências em Angola com os ocorridos na África Central e vice-versa, relacionar acontecimentos e desenvolvimentos na África Central e como estes influenciaram a História de Angola. Assim, penso que é útil referir a obra de alguns estudiosos que se salientam neste campo especial da História. Em primeiro lugar cabe-me citar o nome de Jan Vansina que desde a década de cinquenta do século passado produziu talvez a obra mais abundante e fecunda sobre a África Central. Eu penso que a leitura da sua obra é imprescindível não só ao estudo da África Central, como também ao estudo da História de Angola. Torna-se assim obrigatória a leitura da sua obra "KingdomsoftheSavanna" para quem quiser aprofundar conhecimentos sobre a pré-história dos antigos estados do Congo, Luba, Lunda, Cazembe, e Lozi. Se quisermos aprofundar o conhecimento sobre a história do Antigo ImérioKuba, a leste do Rio Cuango e vizinho de Angola, sugiro a leitura da sua obra "TheChildrenoftheWoot". A sua obra "Paths in theRainforest" é por muitos considerada o melhor estudo de pré-história dos povos antigos que habitavam o território hoje designado com África Equatorial, que compreende os territórios do sul dos Camarões, Gabão, Guiné Equatorial, Congo (Brazzaville), Burkina Fasso (República Centro Africana), Zaire, e até Cabinda. De capital importância para o estudo da pré- história do Antigo Reino do Congo e dos povos ao longo do Quanza é a obra (já clássica) de Vansina "HowSocieties Are Born - Governance in West Central Africa Before 1600", em que Vansina combina evidência arqueológica com linguística histórica para explicar a evolução de pequenos núcleos de população espalhados pelo território, em sociedades que partilhando a mesma raíz linguística, deram origem aos estados organizados que os Portugueses lá encontraram no Séc. XVI. Assim, em termos do estudo da História de Angola, a sua obra "HowSocieties Are Born" é essencial, pois nesta obra Jan Vansina oferece o melhor estudo sobre a pré-história dos povos que viveram na região a que hoje chamamos Angola. A obra de Jan Vansina não é só importante no estudos dos povos da África Central, pois a sua obra é também por muitos considerada como a que abriu caminho ao estudo da etno-história, às relações entre a linguística e a história, e à aceitação da história oral como um instrumento efectivo e válido no método do estudo da história. Duas obras de grande relevo para uma melhor compreensão da História de Angola, especialmente da sua paleo-história e proto-história, são as obras de DesmondClark "ThePre- Historyof Africa" e "ThePre-Historyof Southern Africa". Não posso de modo algum deixar de mencionar aqui a importante obra do saudoso Dr. Carlos Ervedosa "Arqueologia de Angola", que é sem dúvida a melhor introdução em português à arqueologia do território a que mais tarde se veio a chamar Angola. Outras obras importantes que se torna necessário consultar incluem a "General Historyof Africa" , em oito volumes, publicada pela UNESCO, a "Historyof Central Africa" editada por David Birmingham e Phillys Martin, a obra "A Historyof Africa" (História de África", em português, em colaboração com William Tordoff) da autoria de J.D. Fage, a "A
  • 34. HistoryofSouthand Central Africa" de Derek Wilson, e a obra de A.J. Wills "Anintroduction to theHistoryof Central Africa - Zambia, Malawi and Zimbabwe", e a obra de Robert Collins e James Burns "A HistoryofSub-Saharan Africa". Para uma melhor compreensão da génese e evolução histórica dos estados Umbundos é útil a leitura da obra "Kings andKinsmen - EarlyMbunduStates in Angola" da autoria do Prof. Joseph Miller, e da obra "TradeandConflict in Angola - TheMbunduandtheirNeighboursundertheinfluenceofthe Portuguese 1483 - 1790" , da autoria do Prof. David Birmingham, que também editou em associação com Richard Gray "Pre- ColonialAfricanTrade - EssaysonTrade in Central andEastern Africa before 1900" que nos oferece uma perspectiva muito boa sobre o papel do comércio na África Central e Oriental antes da chegada dos Europeus à região. No campo do tráfico de escravos e o papel que os povos da região ao que chamamos hoje Angola, bem como o impacto do tráfico nesses povos, também é essencial a leitura da obra de Joseph Miller "WayofDeath", e de toda a obra de Basil Davidson, um pioneiro do estudo da influência do tráfico de escravos do Atlântico nas sociedades africanas entre os séculos XVI e XIX. Como introdução geral à demografia do tráfico de escravos do Atântico é fundamental a obra de PhillipCurtin "TheAtlanticSlaveTrade - A Census". Como obra de referência, recomendo também a consulta de "TheTrans-AtlanticSlaveTradeDatabaseonCD-Rom" compilada por David Eltis, Stephen D. Behrendt, David Richardson, e Herbert Klein, que nos fornece informação sobre 27.233 viagens de navios negreiros entre 1585 e 1866. Ainda essencial é o "Atlas oftheTransatlanticSlaveTrade" organizado por David Eltis e David Richardson, que nos oferecea melhor série estatística sobre o movimento de escravos através do Atlântico sob as perspectivas de porto de saída em África e porto de chegada no Novo Mundo. 5. Estudos Sobre a História do Atlântico Sul Não é possível estudar a História de Angola entre os Séculos XVI e XIX sem estudar também a História do Brasil, pois durante mais de 350 era de Angola de onde vinha a mão-de-obra escrava para trabalhar os engenhos de açucar, minas de ouro ou fazendas de café do Brasil. Assim, torna-se imprescindível a leitura das obras clássicas de Celso Furtado "Economia Colonial do Brasil nos Séculos XVI e XVII" e "Formação Económica do Brasil", a "História Económica do Brasil" de Caio Prado Júnior, e "The Golden Age ofBrazil", de C.R. Boxer, bem como "Casa Grande e Senzala", de Gilberto Freire. No que respeita às relações entre a costa de Angola e o Brasil é essencial a consulta da obra de Luiz Felipe de Alencastro "O Tratado dos Viventes - Formação do Brasil no Atlântico Sul". Mais numa perspectiva mais global da história e economia do Atlântico Sul e do sistema económico mundial, é essencial o estudo dos trabalhos de João Lúcio de Azevedo, Fernand Braudel, Vitorino Magalhães Godinho e Armando de Castro no domínio da história económica, as obras extensas de Jaime Cortesão e de Damião Peres no domínio da expansão portuguesa, e a obra de Luís de Albuquerque nos domínios dos Descobrimentos Portugueses e da cartografia antiga.
  • 35. Se bem que mais contemporânea e com focus no processo histórico da descolonização africana é ainda importante estudar as obras de Frantz Fanon "Os Condenados da Terra" e "Peles Negras, Máscaras Brancas" para melhor compreender o enquadramento do colonialismo como sistema económico e político e o seu impacto na psicologia dos povos colonizados. Para uma melhor compreensão deste tema tão importante é útil a leitura da obra de Jaime Rodrigues "De Costa a Costa - Escravos, marinheiros e intermediários do tráfico negreiro de Angola ao Rio de Janeiro (1780 - 1860)". Ainda de muito interesse é a obra "EnslavingConnections - Changingculturesof Africa andBrazilduringthe era ofslavery" editada pelos Profs. José Curto e Paul Lovejoy. Embora sob a capa de leitura mais ligeira e muito bem ilustrada, e por isso mesmo uma importante obra de divulgação, é muito útil a leitura da obra "África e o Brasil Africano" de Marina de Mello e Souza. 6. Cronistas e Historiadores Portugueses Mais próximo de Angola, sugiro uma "re-leitura" dos textos históricos de Gomes Eannes de Azurara, Rui de Pina, Garcia de Resende, João de Barros, Fernão Lopes de Castanheda, Damião de Gois, Duarte Lopez e FelippoPigafetta, Domingos de Abreu e Brito, António de Oliveira Cadornega, Alexandre Elias da Silva Corrêa, Joaquim Lopes de Lima, Oliveira Martins, Luciano Cordeiro, João de Mattos e Silva à luz de um estudo mais crítico e profundo dos seus testemunhos. 7. Trabalhos Importantes Sobre a História de Angola Outros estudiosos da História de Angola mais recentes que são leitura obrigatória para uma melhor compreensão incluem Alfredo Trony, Visconde Paiva Manso, Alberto de Almeida Teixeira, Monsenhor Alves da Cunha, Alfredo de Albuquerque Felner, Padre Ruela Pombo, Francisco Castelbranco, Gastão Sousa Dias, Alberto Ferreira de Lemos, Henrique Galvão, Ralph Delgado, Marcello Caetano, António Brásio, Fernando Batalha, António da Silva Rego, José Gonçalo Santa-Rita, Hélio Felgas, Walter Marques, Manuel da Silva Cunha, Eduardo dos Santos, Martins dos Santos, Júlio de Castro Lopo, Carlos Alberto Garcia, Carlos Couto, José de Almeida Santos, Manuel da Costa Lobo, Norberto Gonzaga, Mário António Fernades de Oliveira, Manuel Nunes Gabriel, Ilídio Amaral, Cerviño Padrão, Roberto Correia, Aida Freudenthal, e Maria Emília Madeira dos Santos, alguns dos quais requerendo um esforço de tradução mais acentuado para balançar a perspectiva um tanto euro-cêntrica e colonial das suas obras. 8. Estudos de Etno-História Na área da etno-história é essencial o estudo das obras de Henrique Dias de Carvalho, Padre Carlos Estermann, Óscar Ribas, José Redinha, João Vicente Martins, Mário Milheiros,
  • 36. Mesquitela Lima, Manuel Alfredo de Morais Martins, Jorge e Jill Dias, Abílio Lima de Carvalho, Manuel Guerreiro, José Pereira Neto, Padre José Martins Vaz, Padre Joaquim Martins, Ilídio do Amaral (mais no domínio da geografia humana do que etnografia ou história), Herman Possinger, Franz-WilhelmHeimer e Ramiro Ladeiro Monteiro mais na área de sociologia. 9. Estudos Sobre o Tráfico de Escravos em Angola Com mais foco no tráfico de escravos, é ainda essencial a leitura das obras de Alfredo Diogo Júnior, António Carreira, e Adriano Parreira, que primeiro estudaram o papel de Angola no tráfico de escravos do Atlântico, pois elas revelam um sem-fim de matéria-prima para uma melhor compreensão dos povos de Angola e da sua história. Cabe-me aqui declarar agora a minha relativa ignorância quanto aos esforços de estudar e publicar história que com certo vigor se publicaram já depois da independência. Longe da acção, tem sido difícil para mim encontrar bibliografia tão recente. Contudo, cumpre-me citar o trabalho fecundo de Henrique Abranches ("Reflexões Sobre a Cultura Nacional") que decerto necessita de alcançar um público muito mais vasto, e da grande obra de difusão do romance histórico angolano levada a cabo pela excelente pena de Pepetela (Artur Pestana). Finalmente, tomo aqui a oportunidade de guiar o leitor para as minhas notas sobre a bibliografia da História de Angola que apresento no fim deste trabalho. Elas não são decerto completas, pois incluem apenas algumas notas pessoais sobre textos que conheço, organizadas de acordo com temas e épocas; apenas um achego simples a tão importante veículo do estudo da História de Angola. posted by Helder Ponte | 5/29/2006 05:20:00 PM | 4 comments 3.7 Fontes da História de Angola De uma forma geral, as fontes de estudo da História de Angola são muito escassas e de frágil
  • 37. objectividade. Mas antes de discutir as fontes da história de Angola é útil cobrir dois conceitos-chave defontes escritas de história. As fontes de história classificam-se em geral em dois tipos: fontes primárias e fontes secundárias. 1. Fontes Primárias Fontes primárias referem-se a qualquer trabalho que tenha sido escrito durante a época (ou pouco tempo depois) em que o objecto de estudo aconteceu. As fontes primárias são a matéria prima básica para o estudo da história. Um exemplo de uma fonte primária no estudo da história de Angola é a RelationedelReamedi Congo etdelleCircuonvicineContradeTrattadalliScritti&RagionamentidiOdoardoLopezPortoghese per FilippoPigafetta com disiegnivaridi Geografia, dipiante, d'abiti, d'animali, &altro - Relação do Reino do Congo e das Terras Circunvizinhas - Tirada dos escritos e discursos de Duarte Lopez, Português - Por FilippoPigafetta - Com Desenhos vários de Geografia, de Plantas, de trajos, de animais, etc., publicado em Roma em 1591 e traduzido em português por Rosa Capeans, publicado pela Agência Geral do Ultramar, em Lisboa em 1951. Nesta importante fonte da história de Angola encontramos uma descrição em primeira mão do Antigo Reino do Congo durante a época logo a seguir à chegada dos Portugueses e da sua consequente expansão para o Antigo Reino de Ndongo. 2. Fontes Secundárias Por outro lado, fontes secundárias são aquelas que estudam as fontes primárias de um tópico em história depois do tempo do tópico a que o estudo se refere. Fontes secundárias são em geralestudos posteriores que cobrem a descrição, análise e explicação de fontes primárias. A obra do Professor Joseph Miller "WayofDeath - Merchant CapitalismandtheAngolanSlaveTrade 1730 - 1830", publicada em 1988 pela Universityof Wisconsin Press é um exemplo de uma fonte secundária pois é um estudo extenso e profundo de fontes primárias sobre a prática do tráfico de escravos da região de Angola durante o século que vai de 1730 a 1830, escrita no último quartel do Séc. XX. Em termos de documentação escrita, no estudo da História de Angola só temos acesso a documentos escritos depois da chegada dos Portugueses à foz do Zaire em 1481. Estas fontes escritas se bem que escassas são valiosas, pois dão-nos uma descrição em primeira mão de como ocorreu o processo de contacto entre duas culturas; contudo, devemos sempre notar que os escritos dos Portugueses e dos missionários reflectem necessáriamente as perspectivas portuguesa e cristã ao longo dos tempos, e não necessáriamente a objectividade dos factos históricos. A bibliografia colonial portuguesa sobre Angola é de certa forma extensa, comparada com a bibliografia de outras regiões africanas a sul do Sahara. Contudo, esta precisa de ser "traduzida" antes que se possa usar com propriedade na formulação da História de Angola. É assim difícil discernir nas diferentes "Histórias de Angola" publicadas ao longo dos tempos, as diferentes interpretações que os seus autores lhes deram.
  • 38. De particular importância para o estudo da História de Angola é ainda o estudo das descrições e memórias, autobiografias, relatos de viagens, diários e correspondência privada existentes. Contudo, apenas podemos usar estas fontes depois de as despir-mos de opiniões pessoais e juízos de valor que as acompanham, enquadradas no espaço e no tempo. É de facto muito interessante ler, por exemplo, as opiniões e comentários do Padre João António Cavazzi de Montecúccolo, na sua Descrição Histórica dos Três Reinos do Congo, Matamba e Angola, onde a evidência da sua formação europeia e cristã do seu tempo está sempre tão presente. 3. Tradição Oral Não temos também acesso a informantes, entrevistas e narrativas detradição oral, pois escasso é o trabalho neste campo de investigação histórica, e mais escassas ainda são as suas fontes para uma melhor compreensão da História de Angola. Cabe ainda referir o papel importante que a mitologia, as lendas,contos, advinhas, canções, danças, festejos e jogos podem desempenhar na interpretação de factos ou personagens históricas passadas. A cultura popular e o folclore dão uma visão não oficial dos factos, personagens e acontecimentos importantes, muitas vezes mais ricas e mais verdadeiras, e pouco mencionados nas fontes mais convencionais. Por exemplo, a obra de Óscar Ribas, pelo seu esforço em transcrever um grande número de elementos de cultura popular luandense, é hoje uma fonte imprescindível, na verdade um tesouro valioso, para se compreender o quotidiano de Luanda antiga. 4. Evidência Arqueológica A evidência arqueológica é também muito escassa e ainda não está organizada numa forma sistemática. Apesar dos trabalhos de DesmondClark, Camarate França, Santos Júnior, Carlos Ervedosa, e outros, na segunda metade do Séc. XX, muito ainda está por estudar no que diz respeito à cobertura arqueológica de Angola. 5. Antropologia e Etno-História Cabe aqui realçar o papel especial da antropologia (por alguns estudiosos designada por etnologia ou etnografia) e da etno-história no estudo e compreensão das sociedades angolanas tradicionais, e a contribuição que estas podem dar a uma formulação mais correcta e abrangente da História de Angola. Sabemos assim das contribuições valiosas que um número restrito de etnólogos (ou antropólogos, a saber, Henrique de Carvalho, José Redinha, Carlos Estermann, João Vicente Martins, Mário Milheiros, Manuel Alfredo Morais Martins, e Mesquitela Lima) deram para o conhecimento mais profundo da história de alguns povos de Angola. É ainda importante referir que para esta Viagem Pela História de Angola recorri somente a fontes secundárias (bibliografia) e que não conduzi qualquer investigação original baseada em fontes primárias. Assim, filtrei e extrapolei a informação que tive disponível e recorri sempre que necessário à economia política, à sociologia, à antropologia, à demografia e a outras
  • 39. disciplinas sociais para tentar colmatar as lacunas da desejada evidência histórica. Foi pois difícil para mim escrever sobre um tópico em que as fontes sejam tão limitadas e esparsas. Contudo, e apesar das grandes lacunas que reconheço, é importante que o faça com o maior rigor e objectividade possível. Recorri assim a numerosas obras em inglês, francês e espanhol, em que alguns autores tentaram com alguma frequência denegrir o esforço português e a sua obra, o que me senti obrigado de vez em quando a abrandar ou corrigir. No meu caso pessoal, não tive o benefício do diálogo ou da troca de ideias com outros amantes da História de Angola, pois estou longe de qualquer grupo que se interessa por este tópico tão exótico. Esta foi assim uma empresa solitária, e por isso mesmo mais sujeita ainda a maior risco de subjectividade. posted by Helder Ponte | 5/29/2006 04:15:00 PM | 0 comments 3.6 Porquê Estudar a História de Angola? O passado condiciona necessáriamente não só o que somos hoje, mas também o que fomos ontem, e mesmo o que seremos amanhã. Assim, o estudo da História de Angola ajuda-nos a compreender melhor o processo de mudança ao longo do tempo e assim entender melhor o que é hoje Angola. 1. Ir à Raíz das Questões Com frequência, o estudo de acontecimentos recentes não é suficiente para explicar uma