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SUMÁRIO

Plataforma Sophia: um espaço vivencial                             7
Patrimônio e pranto                                               10
Indústria antes da Indústria                                      16
Engenho até...                                                    18
De que Engenho se fala?                                           22
Desvelar e vivificar                                              25

Ancoradouro de Potenciais Educativos                              34
Matriz didático-pedagógica                                        38

O projeto VouVolto                                                40
A monitoria integrada: questões relevantes, respostas em aberto   42

Laboratório de Memórias: em busca de uma memória coletiva         44
A geografia da memória                                            48

Território e transformações; a dinâmica do espaço de fronteira    50
História, ambiente e educação: transformação em três níveis       53
Parcerias: quando um mais um são três                             56

Resumo da Ópera                                                   57
Plataforma Sophia: um espaço vivencial
     Maria Cecília França Lourenço¹




                         Uma história trágica, Heróica em certos passos, mas essencialmente lúgubre no
                 dia-a-dia do povo multitudinário, que trabalha para produzir o que não come nem usa e
                sim o que é requerido dele por seus amos. O Brasil sempre foi,e ainda é, um espantoso
                    moinho de gastar gente; embora seja também, um poderoso criatório de gente. Seis
                      milhões existiam aqui quando o primeiro europeu chegou. Não sobram hoje, como
                índios, nem trezentos mil. Não se sabe quantos negros foram gastos, tanto nas caçadas
                da África como na tenebrosa travessia nos tumbeiros e, depois, já aqui, no duro eito dos
                                                                                           canaviais (...).
                                                                     Darcy Ribeiro. A Invenção do Brasil.

      Inúmeras são as ações preservacionistas, os sonhos e as trocas implementados
entre distintos segmentos, acerca das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, um
bem cultural da Universidade de São Paulo. Situado às margens do rio São Jorge, no
sopé do Morro da Nova Cintra, em Santos, estado de São Paulo, geraram acordos,
intervenções e sinceros esforços para vivificá-lo, cabendo a esta publicação apresentar
um fruto significativo – Plataforma Sophia2, projeto integralmente elaborado pelos edu-
cadores, concursados em 2004 pela Universidade de São Paulo, atuantes no bem
cultural.

      Adianto que felizmente muitos dos sonhos propostos já se transformaram em rea-
lidade histórica, graças a estudos, ações e esforços harmonizados. Os relatos sobre a
existência, a importância e os conflitos há muito vêm sendo objeto de significativos
registros, crônicas e interpretações, englobando desde um conjunto epistolar, diários
de viagem, até os relatos firmados desde o século XVI. A USP detém um sem número


                                                                                                              7
de processos, pareceres, fotos, desenhos, projetos, pedidos, relatórios, estudos, in-
    vestigações e gráficos, assim documentando de forma inequívoca todos os trabalhos
    de conservação, canalização, monitoramento e intervenções empreendidas por gera-
    ções de ciosos cidadãos, que entendem o bem cultural como um fator vivo e renovável
    de questionamentos e convergência em ações e ideais, debatidos entre muitos.

         Esta publicação apresenta o plano educacional, denominado Plataforma Sophia,
    uma base ampla, plural e inaugural de um futuro distinto, proposta pelos educadores
    admitidos por critérios transparentes liderados pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão
    Universitária da Universidade de São Paulo (USP) e atuantes desde agosto de 2004,
    nas Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. Advém da experiência de implantarem
    programas educacionais, funcionando de domingo a domingo, no verão e no inverno,
    nas aulas ou nas férias e em troca permanente com colegas das diferentes redes de
    ensino – santista, vicentina, estadual, universitária e para público em geral. Afinal, as
    Ruínas constituem um bem cultural da USP reconhecido como patrimônio exponencial
    em todas as instâncias - seja da própria Universidade, seja do Município, do Estado e
    da União

          Quando se fala do antigo Engenho de São Jorge, mandado erigir por Martim Afon-
    so de Sousa, em que pese sua inegável importância, estamos diante de um conjunto
    lacunar, seja de documentos e críticas continuados e em ordem de sucessão, seja de
    intenções associadas, interativas e harmônicas. Tenta-se, assim, estancar o imobilismo
    e convidar diferentes segmentos à produção compartilhada e continuada de conheci-
    mento, sobre inúmeros temas e áreas. Sublinho que desde os primórdios, quando o
    bem foi edificado por iniciativa de Martim Afonso de Sousa (século XVI), e o presente
    momento estamos diante de uma tradição instalada e ininterrupta, pois permanece em
    um mesmo espaço vivencial, o que é incomum para a realidade brasileira, sempre
    ávida por transformá-los.



8
De outra parte o engenho representa uma história de longa duração, porquanto a
cultura açucareira foi a primeira indústria exportável entre nós, continua operante e sem
interrupções há quase quinhentos anos, embora as Ruínas não possuam exatamente a
mesma área geográfica, em decorrência de sucessivos cerceamentos e conflitos. Cha-
mo aqui de espaço vivencial os locais em que se entrelaçam uma natureza dada com
ações e materialidades construídas, não sem uma série de lutas, sempre renovadas.
Estas até aqui por vezes foram veladas, ou esquecidas e, em outras, rememoradas,
razão pela qual proponho então a denominação – espaço vivencial, como um conceito
oposto a espaço contemplativo, belo, reificado ou dedicado a poucos, o que talvez
possa colaborar para se avançar em ações convergentes, potentes para transformar,
através de novas vivências plurais, um museu vivo de um passado que não se pode
esquecer, malgrado tenha sido, em alguns aspectos, nefasto se considerarmos valores
humanistas ressaltáveis.

      Vítima de confrontos, de lutas por posse, ganhos e promoção pessoal, também
alvo de ataques e revoltas, ao final do ano de 2005, ao contrário, as Ruínas ensejam um
momento bastante interessante e convergente: unem-se gerações, especialidades,
órgãos públicos e privados, setores, projetos diversificados e esforços de multidão de
interessados. O intento em vivificar o bem permite conferir concretude a dois marcos
exponenciais – de um lado a edição do projeto educacional, denominado, Plataforma
Sophia, e de outro o início da obra para se erigir a Base Avançada de Cultura e Exten-
são Universitária, projeto arquitetônico do mestre e arquiteto Júlio Roberto Katinsky,
sob responsabilidade da Universidade de São Paulo, em terreno cedido pela Prefeitu-
ra Municipal de Santos.




                                                                                            9
Patrimônio e pranto


                                                                              Lá na úmida senzala,
                                                                           Sentado na estrita sala,
                                                                       Junto ao braseiro, no chão,
                                                                      Entoa o escravo o seu canto,
                                                                 E ao cantar correm-lhe em pranto
                                                                        Saudades do seu torrão....
                                                                Castro Alves. A canção do africano.

           A longa história da violência do humano pode ser captada pela simples leitura das
     Convenções Internacionais elididas em órgãos criados para esta finalidade, em especi-
     al após o segundo pós-guerra. Inicialmente, ressalta-se o passado glorioso com mar-
     cos arquitetônicos ou de civilizações desaparecidas e, também, empreendem-se ações
     conservacionistas, cujo foco apresenta belas palavras sobre a enorme capacidade hu-
     mana para criar o raro, exponencial, caro, singular, incomum, escasso, feito de material
     e/ou forma inusitado, estranho e precioso; igualmente situações peculiares vão sendo
     incorporadas, entre as quais aquelas em que o bem, a ser pleiteado como patrimônio,
     possui uma trajetória de olvido, esquecimento, perda ou reclusão, ou ainda costumes
     afeitos a extenso segmento, maneiras de fazer, representar, práticas, ritos, apropria-
     ções e costumes, se pensarmos no chamado patrimônio imaterial, recentemente assi-
     nalado (2003). Contudo raramente pensa-se no pranto e nas vidas diluídas para erigi-
     los.

           Os discursos com ideais históricos, identitários, relacionais, nacionais e univer-
     sais geram também teoria e prática importantes, em que pese certa dose de interesses
     velados e que precisam ser interpretados. Bastaria, na atualidade, lembrar o discurso
     estadunidense recomendando a preservação da Mata Amazônica, depois de ter de-
     vastado sua própria. A qualificação de pautas comuns, contudo, sempre representa


10
uma autocrítica contra a desumanização operada pelo próprio humano e pipocam antes
mesmo de serem criados órgãos como a United Nations Educational, Scientific and
Cultural Organization (UNESCO) em 1946, ou o Conselho Internacional de Monumentos
e Sítios (ICOMOS), em 1964, como atesta a célebre Carta de Atenas, firmada no entre -
guerra (1933), quando se realiza o 4º Congresso Internacional de Arquitetura Moderna
(CIAM). O interessante de tais políticas é que envolvem os que se encontram na ponta
do dia a dia laborial e, graças a isto, configuram-se avanços, como os que se acreditam
propiciarão a Plataforma Sophia.

       O aparecimento de dado protocolo de intenções preservacionistas constitui uma
prática, desde a Antigüidade, implantando-se instituições para a memória dos altos de-
sígnios, sejam religiosos, de uma comunidade ou território, sejam artísticos e culturais.
Criaram-se templos, museus, monumentos, arquivos e bibliotecas para que tais valores
não caíssem no esquecimento. O que se discute aqui é uma política continuada com
ações preservacionistas por troca entre iguais, como aquelas surgidas no Século das
Luzes, após a Revolução Francesa (1789), visivelmente direcionada para estratégia
política. Quantos museus foram abertos e monumentos preservados, um saldo digno,
que parte de uma estratégia acalentada por impacto social! Essas práticas e apropria-
ções, geradoras da representação sobre o que deve ou não ser preservado intensifica-
se em progressão geométrica no período da chamada Guerra Fria, vale dizer nos anos
50 do século XX, em que a ameaça de uma dizimação nuclear aparece com contornos
de realidade iminente.

      Data, pois, do momento em que as Ruínas passam para a USP (1958) o conjunto
enorme e sistemático de recomendações internacionais, ampliado em encontros de
profissionais, em especial educadores, geógrafos, historiadores, museólogos, traba-
lhadores de órgãos preservacionistas, intelectuais, sociólogos, professores, juristas,
arqueólogos, arquitetos, urbanistas e tantos outros segmentos reunidos já elaboram
convenções, recomendações, cartas e declarações, que constituem o corpo teórico e


                                                                                            11
as práticas, limites e ideais de ações preservacionistas de ampla escala internacional.
     Não se pense em práticas unificadas, porquanto no Japão, por exemplo, desmontam-
     se e remontam-se construções, atualizando-se os materiais e preservando as premis-
     sas técnicas do fazer, porém há na atualidade inúmeras convergências.

             A disseminação de tais princípios para parcela significativa do dito mundo ociden-
     tal fica bem evidenciada se feito um paralelo entre as determinações internacionais e as
     ações preservacionistas empreendidas pela Universidade de São Paulo, desde a do-
     ação (1958) junto ao antigo Engenho do Governador (Martim Afonso de Sousa), dos
     “Armadores do Trato” (quando em 1544 é criada a associação com essa denominação)
     e de São Jorge dos Erasmos. Entre tantas convenções internacionais, ocorre em 1956
     a chamada, “Recomendação de Nova Dehli”, convocada pela UNESCO, acerca dos
     procedimentos, práticas e determinações relativas às investigações arqueológicas.

           Se antes só obras consensualmente entendidas como de valor artístico, incluindo-
     se a então recém lançada arte moderna, e o passado arqueológico remoto congrega-
     vam os profissionais, agora em 1962, a “Recomendação de Paris” (UNESCO) estabele-
     ce teoria e prática para salvaguardar a beleza e o caráter da paisagem, abrindo-se
     então um veio bastante profícuo, que até hoje se mantém interessante para grupos de
     profissionais. Entra também em campo subjetivo em que beleza e caráter representam
     contendas infinitas, entre estetas e teóricos, podendo haver o belo pictórico, ou seja
     digno de ser pintura e o outro, o terrificante, atraindo pela suspensão do previsível.
     Cabe lembrar que o Registro do bem, chamado Tombamento, etapa derradeira da pro-
     teção legal na instância federal, ocorre em 1963, dialogando com tais prescrições. Em
     1964, logo dois anos depois, realiza-se a “Carta de Veneza”, (ICOMOS), que evocará
     recomendações diferenciadas sobre o que deverá ou não ser reconstituído nas práti-
     cas arqueológicas e arquitetônicas, ainda diretamente ligadas à conservação e ao res-
     tauro de monumentos e sítios arqueológicos.



12
Como já se procurou demonstrar3, as ações de intervenção arquitetônica e esca-
vação arqueológica do arquiteto Luís Saia, ao ser passado para a USP, enquadram-se
com vantagens nesse cenário de convenções, tratados, recomendações e conven-
ções internacionais. Presidindo a regional paulista do Serviço de Patrimônio Nacional,
Saia representou um intelectual atualizado com as questões de seu métier e compõe
aquele quadro de modernistas dentro das ditas repartições, que associam de uma
forma distinta tradição e renovação, pois militam na vanguarda, sem apartarem-se da
esperada responsabilidade cidadã. Já em suas recomendações sobre o que fazer,
Saia mantém a sintonia aos campos de atuação preservacionistas, desde o início dan-
do atenção ao papel de planos continuados, avaliados e compartilhados na área edu-
cacional, como o que aqui se apresenta.

     Referências patrimoniais internacionais, sendo o Brasil signatário das mesmas,
apontam para uma conservação preventiva, capaz de garantir a integridade do bem,
porém desaconselham o restauro, caindo-se em uma concepção falsa e transforman-
do-o em novo, como se nada acontecera ali de grave. Esta é uma questão muito inte-
ressante, porquanto ainda na atualidade procura-se elidir pautas talvez parar gerar sen-
timentos de aglutinação em torno de ideais provincianos, e se fala em - abandono do
bem cultural, o que pode igualmente apontar para a absurda tese em restaurá-lo inte-
gralmente, ou fecha-lo ao público, como um laboratório de reserva de mercado para
poucos.

       As Ruínas constituem o que hoje se pode denominar um museu ao ar livre, por-
quanto reúne ambiente, biodiversidade, lutas e culturas em um espaço vivencial, carac-
terísticas de um dado tempo e, como tal, deve permanecer como testemunho ante
acertos e equívocos do humano sobre a terra. Fragmentos históricos atraem por ra-
zões múltiplas, entre as quais há a evidência de que suas pedras se mantiveram está-
ticas há séculos, porém aqui guardam Histórias de índios e negros escravizados, uma
mácula, que precisa ficar latente e não ser esquecida. O museu ao ar livre clama - o
lamento do pranto, contudo não deve se repetir.

                                                                                           13
As áreas que passam por hecatombes evocam situações extremas e elucidativas
     de formas absurdas em se tratar por restauro total os remanescentes materiais, seja por
     ação terrorista, acidente nuclear e conflito armamentista, sejam as senzalas brasileiras e
     os cemitérios indígenas. Apenas motivos sensacionalistas e mercantis poderiam levar
     a restaurá-los ou musealizá-los, no estado em que se encontram na atualidade. Bens
     dessa amplitude compõem marcos para promover trocas de saberes, ampliação das
     razões de tanta violência e não se recomenda reduzi-los em simples cenário, tipo
     parque temático para se levar crianças em finais de semana.

           As Ruínas enquadram-se neste caso e não se pode pensar em fazer uma das
     inúmeras modalidades de museus já existentes, o que eventualmente abrigaria algum
     interesse para se estabelecer hipótese relacional em campos frutíferos. A condição
     exponencial deste lugar, reitero para sublinhar, não é fazer dele mais um, como tantos,
     mas procurar promover trocas qualificadas, como as aqui propostas a partir de uma
     Plataforma Sophia, uma imagem muito feliz, que permite a chegada de saberes de
     vários quilates, faixa etária, altitudes e linguagens. Qual a outra experiência similar antes
     pensada para um monumento nacional como este, das Ruínas Engenho São Jorge dos
     Erasmos?

          O caso das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos insere-se nestes conflitos, a
     serem relembrados porquanto a própria Capitania de São Vicente, a que inicialmente
     pertencia o engenho, sofreu uma série de problemas, já no século XVI, especialmente
     em conseqüência de disputas na questão econômica e religiosa, mas também quanto
     à mão de obra para trabalhar na lavoura de cana-de-açúcar e na moagem do caldo, para
     produção de açúcar, além de outros relativos a sucessivos e diferenciados ataques por
     razões da posse territorial.

          Os próprios índios, a quem se desejava escravizar, juntamente com negros,
     freqüentemente queimaram as plantações e engenhos. A chegada do colonizador sem


14
dúvida justifica-se muito mais ante o desejo na expansão em territórios, na extração de
especiarias e de pau-brasil, o sonho de pedras preciosas e a abertura de mercado,
inclusive escravista, em dupla mão, ou seja, trazendo e, quem sabe, levando novos
contingentes para as duras tarefas nas quais não se envolviam, legando-as então para
escravizados, vigiados por feitores cônscios da dureza esperada no desempenho da
função, que exerciam com requintes de suplício.

      Pero Góis, um dos companheiros da esquadra de Martim Afonso de Sousa, em
carta ao Rei dom João III datada de 29 de abril de 1546, dá conta dos conflitos canden-
tes, juntando a este fato a existência de muitos engenhos de água, claramente prejudi-
cados (Cortesão, 1956: 321-3). Entre os engenhos, o São Jorge também passa por
inúmeras dificuldades, além de que o açúcar deixar de ser uma agricultura rentável,
ante os lucros da atividade no Nordeste, em especial em Pernambuco.

      Assaltos também ocorreram por europeus visando o poder sobre o território e a
gente da terra, associado à apropriação das ditas riquezas, na procura de retirar a
hegemonia da Península Ibérica, em especial durante o domínio espanhol sobre Portu-
gal e colônias, ou seja, entre 1580-1640. Entre estes, segundo relatos baseados em
célebre texto elaborado por Antony Knivet, teria se efetivado em 25 de dezembro de
1591, quando o pirata inglês, Thomas Cavendish4, ao chegar em São Vicente resolveu
queimar cinco engenhos (Marques, 1879, v. I: 347). Outro relato sempre associado à
queima de engenhos, afinal o chamado ouro branco, dada a imensa penetração atingi-
da, terá lugar posteriormente em 1615, realizada pelo holandês Joris van Spilbergen
(Fraco, 1940: 65).




                                                                                          15
Indústria antes da indústria


           Conflitos, disputas e lutas são fortes indicativos de que as atuais Ruínas Engenho
     São Jorge dos Erasmos já foram muito produtivas, embora os beneficiários tendo auferido
     lucros sem estar ou favorecer a cultura local. Contudo, a situação lucrativa, em meados
     do século XVII, transforma-se ante o esmorecimento da atividade açucareira na Capita-
     nia de São Vicente, o local em que foi primitivamente fundado o então chamado Enge-
     nho São Jorge dos Erasmos. Contribuem para tal reversão o despontar das demais
     regiões brasileiras para a cultura canavieira, tanto em função do clima e do próprio
     rendimento daquelas terras, quanto da maior proximidade delas em relação aos cen-
     tros europeus. O certo é que até hoje a história erigida ainda privilegia foco naqueles
     tempos áureos, em que europeus, africanos e os donos das terras se enfrentavam de
     forma aguerrida.

            Acrescente-se outra dificuldade de natureza comercial, residindo no fato de que,
     entre 1580-1640, Portugal está sob o julgo espanhol e que, data de 1585, o conflito da
     Espanha com a região dos então proprietários, agora então os descendentes de Erasmus
     Schetz havendo amplo controle nas transações comerciais, incluindo-se aquelas
     açucareiras, o que possivelmente também tenha dificultado tal empresa comercial. Su-
     blinhe-se que a forte industrialização brasileira só se efetivará no segundo pós-guerra
     do século XX, em especial na década de 50, porquanto durante séculos fomos expor-
     tadores de matéria prima e importadores de inúmeros produtos industrializados, porém
     neste caso açucareiro já começamos ao contrário, ou seja, exportando o produto indus-
     trializado.

          Graças a inúmeros esforços de historiadores do período colonial, sabe-se de
     uma série de dados, que permitem estabelecer múltiplas relações, a partir da vinda dos
     portugueses, sejam societárias, históricas, ou sobre a rede açucareira, sejam aquelas


16
comerciais, engendradas a partir da aquisição do Engenho São Jorge por Erasmus
Schetz. Se tantos avanços propiciaram significativas interpretações, ficam ainda por ser
determinadas as finalidades sucessivas, ou mesmo as atividades implementadas pe-
los índios naquela região antes da chegada dos colonizadores a esse espaço vivencial.
Hipóteses dão conta de que teria sido um curtume, pertencera a uma firma comercial,
entrara em contendas inventariais e judiciais, o que por si só já propicia um roteiro bem
amplo em diversos arquivos, inclusive vicentinos, já que a região antes pertencera a
esse município.

      Segundo Benedito Calixto, pintor e historiador santista, quando Martim Afonso de
Sousa deixa o país iniciara-se também a pecuária no Engenho de São Jorge. Acres-
centa que de volta a uma viagem aos mares da Ásia, o primeiro donatário reconhece
pouco avanço em sua capitania, deduzindo que este fator “(...) certamente o levou a
desfazer-se da parte que lhe tocava, na parceria do Engenho São Jorge, que só mais
tarde em mãos estranhas iria prosperar” (Calixto, 1924: 276-7).

      Se os dados brasileiros são ainda esboçados já os europeus desfrutam de condi-
ções bem distintas, com arquivos bem cuidados, a espera apenas de ciosos interessa-
dos, como atesta a quantidade significativa de referências a Erasmus Schetz. Este ad-
quire o engenho em sociedade com Johan van Hielst possivelmente em 1544, segun-
do o historiador Francisco Martins dos Santos, embora sem documentar as fontes (San-
tos, 1986:349). Já outra versão registra a data de 1550, quando da morte de Rui Pinto
para a aquisição, especificando que a base seria uma escritura pública lavrada em
Lisboa em 18 de junho de 1550 (Franco, 1958:686).

      A figura de Erasmus é de fato muito sedutora, atraindo estudos, se considerarmos
o fato de que freqüentava príncipes e o círculo esclarecido de Erasmus de Roterdam.
Mantinha correspondência com Erasmus de Roterdam e se registra carta datada em 30
de janeiro de 1525, em que o senhor de Engenho relata ao grande pensador, que


                                                                                            17
recebera de um amigo da Espanha, Franciscus de Vaylle, notícias sobre a ampla pene-
     tração de seus escritos entre os espanhóis (Bataillon, 1950:161). Outros dados sobre
     Erasmus Schetz advêm de estudos sobre a contribuição de uma série de europeus na
     formação brasileira, que acrescentam que “era dono de grande casa de comércio (...)
     se dedicava além de comércio ultramarino, às transações bancárias e à mineração. Sua
     família era originária de Aachen, transferindo-se de lá para Antdorf, como era conhecida
     a Antuérpia até o século XIIII” (Oberacker Jr., 1968: 63).

           Importante documento traduzido por Eddy Stols, em pesquisas realizadas em
     1968, informa que em 1548, o engenho já se encontra velho e a roda comprometida,
     que devia então ser “levada para cima e deve ser feito um bom que ficará na descida da
     colina” (Stols, 1968: 417). Seria então transferido para a atual localização? Onde estari-
     am as fontes, por onde correriam as águas em que terras estavam os canaviais e a roda
     d’água? Quais as pesquisas empreendidas para se analisar a formação geológica do
     solo? Como se constata a Plataforma Sophia poderá abrir inúmeras frentes para novas
     pesquisas.


          Engenho até ....


           Sabe-se até por novas mídias que as datas de nascimento e morte de Erasmus
     Schetz são ainda objeto de dúvidas e desencontros. Seria o terceiro filho de Cuntz e
     Marie Crans, casado em primeiro matrimônio com Ida Van Rechterghem (1511) e em
     segundo com Katharina de Cock (1549). (http://www. genealogy.euweb.cz/). As ativida-
     des dos Schetz encontravam-se muito afinadas às demandas de seu tempo e Eugenia
     W. Herberts, em estudo sobre o uso de metais em diferentes utilidades, Red Gold of
     Africa, acrescenta que Erasmus Schetz controlava minas de cobre na Westhphalia e de
     zinco na Bélgica. Segundo a autora, algumas produções em latão dos Schetz passa-


18
ram a ser consideradas como padrão de qualidade, em relação ao qual os artefatos
similares se referenciavam, para ser avaliada a qualidade (www.coincoin.com).

      Fontes aludem à data de 30 de maio de 1550 para falecimento de Erasmus Schetz,
cabendo a seu filho Gaspar adquirir a parte do sócio e assumir a direção da firma
(Oberacker Jr., 1968: 63) até morrer em 9 de novembro de 1580, em Mons, quando a
propriedade passa então para os irmãos. Entre as controvérsias sobre a data de nasci-
mento e morte de Erasmus5, uma chama a atenção, pois documenta como falecimento
deste - 30 de maio de 1550, passando então o Engenho para administração do filho
Gaspar, que acaba comprando a parte de Veniste. Se a escritura relativa à venda das
terras de Rui Pinto data de 18 de junho, como poderia já estar morto? Acrescente-se
que fontes recentes no estudo genealógico aventam outras teorias, mais plausíveis, ou
seja, Erasmus Schetz teria nascido por volta de 1481 e falecido na Antuérpia em 13 de
junho de 15606, o que altera o quadro das hipóteses.

      A história de Gaspar Schetz tem sido igualmente objeto de inúmeros estudos e
por ela constata-se que, como o pai, também aproxima-se de importantes persona-
gens, sendo próximo dos jesuítas. Gaspar casa-se em primeiro matrimônio com
Margareta van der Brugghe (1535) e em segundo com Katharina von Ursel, deixando
extensa linhagem. São filhas do primeiro casamento, Isabela e Agnes, e do segundo
Lancelot, Johan Karl, Melchior Nikolaus e Conrad. Quando Gaspar falece há correspon-
dência trocada por Lancelot e Melchior Nikolaus com vistas à propriedade vicentina,
que têm direito, embora Erasmus Schetz possuísse outros herdeiros além de Gaspar
Schetz: Melchior Nikolaus, Balthasar, Konrad e Isabela (www.genealogy.euweb.cz/).

      Dados iniciais encontram-se hoje em exame, porquanto há uma correspondência
vastíssima, por vezes assinada por um ou outro Schetz. Não obstante as datas e nomes
repetidos dificultam as datações. Assim, Erasmus teve uma série de filhos e mesmo
nas datas destes não há total coincidência entre as fontes, a saber Gaspar (1513 ou 14-


                                                                                          19
1580), Melchior Nicolaus (1516- antes 1578), Balthasar( ??-1586), Conrad(??-1579) e
     Isabela (???) casada com Jan Vleminck, fato em se aventar a hipótese de que este
     pudesse ser o tal Veniste relatado pelos cronistas do século XVII. Melchior tornou-se
     objeto de célebre carta de Anchieta datando de 7 de junho de 15787, em que lamenta a
     morte para Gaspar, talvez há um ano, e o padre deixa claras as relações de reciprocida-
     de entre o padre, a Companhia de Jesus e os Schetz:

           (...) Todo o tempo que residi em São Vicente procurei socorrer a casa de V. M.
          com os ministérios de nossa Companhia, como também agora fazem os padres
          que lá estão (...).
          Jesidro e Luís, filho de João Batista, aportaram aqui o ano passado e já chegaram
          a São Vicente. Deram-me a notícia que era falecido o senhor Melchior Schetz, no
          tempo daquela turbulência de Antuérpia. A dor que a todos nós cá sentimos Nosso
          Senhor sabe, por faltar lá uma cabeça tão católica em tal ocasião; e por não faltar
          de nossa parte a nosso ofício e há muita caridade que tem V. M. à nossa Compa-
          nhia, muitas missas lhe dissemos por toda esta costa, como nos obriga a razão
          (...).

          O filho de Erasmus, Gaspar, que detém os títulos de Senhor de Grobbendonck e
     Barão van Wesemael já é uma figura mais estudada, considerando-se que ocupará
     posições ressaltáveis na vida dos Países Baixos, naquele período, havendo certa con-
     vergência para o fato de que nascera em 20 de julho de 1514 na Antuérpia e morrera em
     9 de novembro de 1581 em Mons8. Grande parte da documentação reunida sobre as
     Ruínas em arquivos holandeses e belgas será assinada por ele e, após sua morte por
     seus herdeiros, sendo uma das dificuldades a repetição freqüente em várias gerações
     dos nomes, Gaspar, Erasmus, Melchior e Lancelot. Quando e para quem exatamente
     os Schetz venderam o referido Engenho São Jorge dos Erasmos?

          Investigações sobre a sucessão, após os Schetz, vêm sendo elaboradas e, em
     breve se espera divulgá-las. Estudos anteriores e importantes, assim como a valoriza-

20
ção do engenho e a passagem para a USP se deram em grande parte pela ação firme
da pesquisadora da então Faculdade de Filosofia Ciências e Letras/ USP, Maria Regina
da Cunha Rodrigues, incansável na luta para a preservação, junto às autoridades. Os
colegas da FAU/USP sempre relembram como a determinação dela sobre o papel
único e ímpar da USP na preservação do bem, contribuiu de forma decisiva para a
integridade do local, etapa indispensável para se atingir o presente estado, que tenho
a honra de introduzir.

      Pesquisas inéditas efetuadas pelo professor holandês, Paul Meurs, cujo título é
Engenho São Jorge dos Erasmos, Santos Preservation Studies, 1990, por solicitação
do atual Centro de Preservação Cultural (CPC) da Universidade de São Paulo, amplia-
ram bastante tal lacuna, possibilitando estudos em fontes editadas e em tabelionatos,
conforme se informa entre parênteses. Entre os dados acrescenta que em 1687 o então
chamado Sítio de São Jorge é vendido pelo espólio de Mariana Pedroso (de Barros)
(Trindade, 1983: 3). Observe-se que agora a escala já se torna outra.

      Durante o século XVII, Meurs localizou os seguintes dados: em 1768, José de
Morais de Góis vendeu o Sítio de São Jorge para Jacinto Moniz de Gusmãos (Costa e
Silva, 1973, I); os filhos destes com a morte do pai (1792) vendem para Bento Tomaz
Viana (Tabelião Joseph da Costa Benavides), que vende o sítio e a cachoeira para
Manoel Marques do Vale, sem localizar data (Tabelião José Carvalho da Silva). Em
1804, Vale por sua vez vende para Manuel José da Graça, incluindo canaviais (Tabelião
Antônio José de Lima). Com a morte deste em 1810, São Jorge é transferido para
Margarida da Graça Martins (Costa e Silva, 1973). Curiosamente em 1823, há notícias de
que lá se produz farinha de mandioca, arroz, café e aguardente, revelando que a ativi-
dade diversificou-se (Censo de 1823).

     Data de 1875, ainda segundo Meurs a passagem de Joaquim Floriano de Toledo
para João Floriano Martins de Toledo (Costa e Silva, 1973, V), que ao morrer em 1881


                                                                                         21
passa a propriedade para seus herdeiros. Em 1943, a propriedade passa então para
     Octávio Ribeiro de Araújo, que doa para a USP em 1958. A Plataforma Sophia com
     certeza permitirá a atividade sistemática de obtenção de dados, relações e nexos,
     ampliando-se em muito a capacidade de se inquirir e reconstruir o passado. Já a Base
     Avançada de Cultura e Extensão Universitária sediará conjunto de pesquisas em inúme-
     ras áreas para se avançar no entendimento do que podemos almejar a partir desta
     plataforma.


          De que Engenho se fala?


                               Os escravos são as mãos e os pés do senhor do engenho, porque sem eles no
                     Brasil não é possível fazer, conservar e aumentar fazenda, nem ter engenho corrente. E
                         do modo com que se há com eles, depende tê-los bons ou maus para o serviço. Por
                      isso, é necessário comprar cada ano algumas peças e reparti-las pelos partidos, roças,
                     serrarias e barcas. E porque comumente são de nações diversas, e uns mais boçais que
                        outros e de forças muito diferentes, se há de fazer a repartição com reparos e não às
                     cegas. Os que vêm para o Brasil são ardas, minas, congos, de São Tomé, de Angola, de
                                         Cabo Verde e, alguns de Moçambique, que vêm das naus das Índias.
                                          João Antônio Andreoni (Antonil) Cultura e opulência do Brasil (1711).

            A História firmada em dados e fatos muito se preocupa com primazias, gerando
     prolongadas disputas, da que daremos uma pálida visão, pois questões sobre poder e
     territorialidade acerca do bem cultural constituem um acervo muito mais relevante. Con-
     tudo, há consenso entre os autores sobre o fato de que Martim Afonso de Sousa, ao
     aportar em São Vicente, distribuiu terras para alguns nobres de famílias que também o
     acompanharam, tendo sido já objeto de muitos documentos sobre o tema. Cabe lem-
     brar que recebera amplos poderes do Rei Dom João III e aportou com vários nobres e
     enorme tripulação, no ano de 1532.


22
Encontram-se entre as famílias nobres beneficiadas por doação das terras do pri-
meiro donatário luso, a dos Góis (em que erigem o Engenho Madre de Deus), a família
Adorno (o de São João, no Ribeirão de São Jerônimo, no Morro do Fontana), a de
Pinto (local em que seria plantada a cana para seu próprio engenho), bem como com
membros da tripulação; assim o de São Jorge seria em parceria com o piloto Vicente
Gonçalves, João Veniste9 e Francisco Lobo. O Livro de Registro de Sesmarias, em seu
título 1555, às páginas 42, 61 e 84 confirma e embasa de que o primeiro engenho
mandado erigir por Martim Afonso de Sousa foi dedicado por vocação a São Jorge
(Leme, 1929: 67).

      Outros documentos sempre citados dão conta que em 1550, com a morte de Rui
Pinto, os herdeiros venderam em Lisboa por escritura pública firmada em 18 de junho
de 1550 as terras para o banqueiro e comerciante de minas estabelecido na Antuérpia,
Erasmus Schetz em parceria com o próprio Veniste. Já na primeira edição de História
do Brasil, de Francisco Adolfo Varnhagen menciona que se trata de um técnico na
construção de moinhos hidráulicos (Oberacker Jr., 1968: 62-3).

     Escritores Setecentistas mencionam a existência do bem, defendendo a hipótese
de que o Engenho São Jorge dos Erasmos seria o primeiro, entre os engenhos de
cana de açúcar criados por Martim Afonso de Sousa. Entre estes relatos cabe mencio-
nar o de Pedro Taques de Almeida Paes Leme (1714-77), em História da Capitania de
São Vicente, editada em 1772, afirma que “Martim Afonso de Sousa (...) estabeleceu o
primeiro engenho de açúcar que houve em todo o Brasil, com vocação de São Jorge”
(Leme, 1929:66-7). Outro reiterativo foi o do monge beneditino Frei Gaspar da Madre de
Deus (1715-1800), que em sua obra Memórias para a História da Capitania de São
Vicente, publicada em 1797, alude da mesma forma ao fato (Madre de Deus, 1975: 84).

     Diferentemente, será no século XIX que o renomado historiador Manuel Eufrásio
de Azevedo Marques, em Apontamentos históricos..., irá trazer outra hipótese seqüencial


                                                                                          23
para a edificação de engenhos no Brasil, julgando ser o primeiro o de Pedro de Góis,
     ou seja, o Engenho Madre de Deus (Marques, 1879, v. 2: 100-1). Segue tal ordem o
     trabalho de Francisco de Assis Carvalho Franco, em Os 32 Companheiros de Martim
     Afonso e a Cidade de São Paulo (1958) de que o primeiro engenho seria o Madre de
     Deus (Franco, 1958: 677).

          Francisco Martins dos Santos, autor da significativa obra História de Santos (1937),
     implementa raciocínio que merece ser acompanhado, pois já em ofício à Câmara dos
     Vereadores de Santos, após cobrar medidas para a proteção das ruínas, em 27 de
     março de 1950, resolve datar os engenhos na Baixada Santista: 1532 – Engenho de
     Madre de Deus, no Morro das Neves; 1533, o de São João, na atual Praça Rui Barbosa;
     1534 - o de São Jorge dos Erasmos, entre outros.

          Quando após sua morte resolve-se editar segunda edição de História de Santos
     reuniram-se “Monografias do autor” (1986), incluindo-se um estudo específico sobre
     Fundação e Desenvolvimento do Engenho de S. Jorge dos Erasmos, acrescida de
     estudos do coordenador da edição em uma terceira parte, como bem este distingue a
     própria contribuição. Nesta monografia há uma inversão, pois, se refere como primeiro
     engenho, datando-o de 1532-3, o dos Adornos (São João), o de São Jorge em 1534-5,
     logo o segundo e o terceiro o Madre de Deus, no sítio Nossa Senhora, das Neves, em
     1546 (Santos, 1986: 350). Fundamenta-se no fato de que apenas em 1534 o donatário
     recebe efetivamente a doação da Capitânia de São Vicente, outorgada pelo Rei.

           “(...) e quando Johan van Hielst (holandês) (e não João Veniste), representante de
     Erasmo Schetz em Lisboa, veio para S. Vicente para assumir o seu lugar na sociedade
     feita e dar início à indústria (...) Em 1544, terminado o Governo de Cristóvão Aguiar de
     Altero, voltou este fidalgo a Portugal e, ali, com a presença de Johan Van Hielst, repre-
     sentante dos Armadores holandeses foi feita a venda de quinhões de Martim Afonso,
     Pero Lobo e Vicente Gonçalves, e ERASMOS SCHETZ, banqueiro e Armador de


24
Amsterdam, os quais, somados aos de Van Hielst deram a esse Erasmo Schetz a
propriedade total do Engenho de S. Vicente, o qual, dali em diante, passaria a ser
conhecido como ENGENHO DOS ERASMOS, OU DE SÃO JORGE DOS ERASMOS(...)
” (Santos, 1986: 349).

      A primeira pergunta seria – qual a base documental para a afirmação sobre a data
da chegada de Van Hielst e a venda do quinhão de Sousa para Erasmus Schetz? A
outra também significativa é saber por que o donatário, a quem se atribui a introdução
da lavoura da cana, não se beneficia em primeiro lugar de tal cultura, importantíssima na
época, concedendo tal primazia a outro, mais ainda subordinado, antes mesmo de
serem efetivadas suas posses por D. João III?


     Desvelar e vivificar


                      Alguém conseguiu levantar o véu da deusa [Isis] em Saïs. Mas o que foi que viu?
                     Viu – maravilha das maravilhas - a si próprio! Novalis. “Le disciples a Saïs” (1798).



      Impressiona investigar em livros, periódicos e documentos, em particular nos pro-
cessos da Universidade de São Paulo e dos órgãos preservacionistas, constatando-
se quantas vezes já se fizeram esforços, visando acolher e disseminar o bem cultural.
Assemelha-se a Isis, a divindade egípcia, inconformada buscando Osíris, seu marido
assassinado pelo irmão, que embarca em desesperadoras viagens para, após encontrá-
lo, devolver-lhe a vida (Brunel, 1998:498-503). As iniciativas parecem andar em dois
pólos: de uma parte, há esforços para acolher – hipóteses, soluções, projetos, rema-
nescentes, documentos, depoimentos, pesquisas em inúmeras áreas, cuidados junto
ao entorno e ao próprio bem cultural.


                                                                                                             25
Contudo, a Isis, igualmente se associa à invenção da língua e da escrita (Brunel,
     1998: 500), lado este ligado à disseminação do saber. No caso das Ruínas, este lado
     aparece via a geração monumental, formada por conjunto de atos procurando a
     extroversão em – visitas escolares programadas, difusão da prática arqueológica, apre-
     sentação em congressos, simpósios, encontros internos e fóruns públicos; há também
     outro segmento amplo reunindo dados, cartas, recibos, documentos e interpretações
     depositados em publicações, desde o pioneiro livro do professor José Pedro Leite
     Cordeiro, em 1945, sob o título “O Engenho São Jorge dos Erasmos”, como também
     em anais, periódicos e livros, enfim todo um esforço investigativo, para suspensão do
     mito fundador – seria o Engenho São Jorge o primeiro, o segundo ou o terceiro funda-
     do entre nós?

            Os esforços são, em minha opinião, cumulativos e muitos sonhos hoje já passam
     para o livro das realizações. Entre estes, um vislumbrado há dez anos, veio à luz,
     vivificado com grande humanidade, porquanto as Ruínas possuem competentes edu-
     cadores, contratados por meio de processo seletivo público e, mais, capazes de ela-
     borar um plano conceitual, a Plataforma Sophia. A Plataforma Sophia constitui-se num
     ancoradouro direcionado ao porvir, de modo a abrigar inúmeras iniciativas direcionadas
     ao público em geral, a aquele escolar, nos diferentes âmbitos, incluindo-se os que
     demandam atendimento especial. Sintetiza um programa dentro daquilo que uma uni-
     versidade pública e de qualidade pode almejar – trocar com a comunidade, trazer o
     aprendizado para suas pesquisas e ações educacionais, assim cumprindo aspectos
     exaltáveis de sua missão, graças ao reconhecimento de importantes parceiros para
     potencializar rumos educacionais.

           O fato auspicioso enseja rememoração de alguns aspectos destacáveis em sua
     história plena de lutas, realizada no último decênio (1995-2005). Ressalte-se o papel
     estelar da direção da USP e da Pró-Reitoria, em todos os escalões, sem os quais nada
     disso estaria concretizado, bem como o do atual Centro de Preservação Cultural (CPC),


26
então Comissão de Patrimônio Cultural. Convidada, em outubro de 1995, pelo então
Pró-Reitor de Cultura e Extensão Universitária, Prof. Jacques Marcovitch, para exarar
um Plano Gestor, destinado a então denominada Comissão do Patrimônio Cultural (CPC),
eu pude perceber que já haviam sido criadas inúmeras iniciativas e comissões para
vivificar este fantástico legado Quinhentista.

      A tentativa de sonhar um sonho complexo e para o qual chegava após vivências
incomuns, entre as quais posso expressar o de dirigir o mais antigo museu do Estado
de São Paulo, a Pinacoteca do Estado, levou-me a aceitar o desafio. Propus um projeto
fundado no conceito que denominei - uso qualificado, envolvendo uma série de aspec-
tos, na tentativa de pensar uma rede de ações cotidianas e conjugadas, que resultas-
sem em uma utilização distinta, compartilhada e enraizada dos bens culturais da USP,
que fizesse do patrimônio um bem cultural, ou seja, compartilhado por grandes seg-
mentos, dentro e fora da Universidade.

     Em síntese com base nos documentos poderia assim resumir, como deixei assi-
nalada em minha carta de despedida para os funcionários e colaboradores:

           Ações pontuais e coligadas compreenderam: 1) o levantamento de dados, a
     análise, a formulação de estratégias e de recomendações sobre a utilização de
     acervos; 2) ampliação de acervos materiais, quantitativamente significativa e res-
     ponsável; 3) a prestação de serviço informacional sobre o patrimônio cultural da
     USP; 4) a identificação do que precisa ter seu uso qualificado; 5) o estabelecimen-
     to de critérios compartilhados com os distintos segmentos, seja da comunidade
     uspiana, seja a externa; 6) a extensão do conceito de patrimônio cultural, evitando-
     se transformá-lo em apenas jóias contemplativas; 7) a atuação junto ao público e
     aos órgãos envolvidos com o patrimônio cultural, praticadas nas diversas inter-
     venções de conservação e de restauro de bens; 8) a busca de verbas para ne-
     cessidades emergenciais; 9) a participação e a proposição de grupos formuladores


                                                                                            27
de recomendações e de práticas preservacionistas, formuladas em todas as eta-
          pas de tal processo, entre as quais – abrigo, conservação, documentação, estu-
          do, interpretação, divulgação e extroversão, especialmente criada para distintos
          segmentos etários e sociais.

           O Colegiado CPC analisou e acolheu o Projeto, para as Ruínas e os demais bens,
     tendo papel decisivo na consecução das primeiras medidas preservacionistas. Quanto
     ao Engenho, a primeira etapa pensada voltou-se à questão deste passar a ser adminis-
     trado pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, dada a iminência das obras
     de conservação e integridade, que então demandavam, passando-se para mim, na
     condição de coordenadora, o encaminhamento junto à Faculdade de Filosofia Letras e
     Ciências Humanas/ USP.

          Associei-me de imediato com a Comissão do Engenho, existente e centralizada
     na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas/ USP para acompanhar, discutir e
     apoiar as iniciativas, tendo já esta, como membro externa, a Profa. Wilma Terezinha F.
     de Andrade, professora de uma geração de historiadores santistas. Contudo, nas reuni-
     ões, visitas e conversas da CPC, um dos membros, antes já envolvido com as Ruínas
     e também coordenador da CPC, o Prof. José Sebastião Witter, sempre insistia muito na
     necessidade em ser nomeado um gestor, com o qual deveríamos dialogar, sendo suas
     sugestões muito enfáticas.

          Atendendo à solicitação, o colegiado da CPC propôs a formação de uma comis-
     são para discutir as sugestões, aferir as hierarquias e elaborar diagnóstico sobre o
     rumo de uma série de intervenções imediatas, encaminhando o pleito ao Pró-Reitor,
     agora o Prof. Adilson Avansi de Abreu. Formulou em 8 de maio de 1998 uma Portaria
     convocando o próprio Prof. Witter, junto com o Prof. Júlio Roberto Katinsky e o Prof.
     José Bueno Conti com as seguintes atribuições:



28
I- disponibilizar para o público o Engenho São Jorge dos Erasmos em 21 de abril
     de 2000, dentro dos padrões acadêmicos voltados à pesquisa, docência e exten-
     são cultural;
     II- dispor sobre o gerenciamento do bem em exame de modo a concretizar o item
     anterior;
     III- estabelecer a destinação do legado arqueológico;
     IV- garantir a continuidade da pesquisa nas diversas áreas concernentes ao mes-
     mo;
     V- estabelecer o relacionamento técnico-administrativo com as instâncias das es-
     feras, municipal, estadual e federal.

      Este grupo de notáveis sensibilizou-se muito ante a necessidade premente em se
refazer toda a cobertura de telha, traçar um conjunto de medidas para garantir a ameaçada
integridade das crianças da escola situada na lateral e do bem, resolver problemas de
invasão no morro contíguo e posterior ao bem cultural, julgando indispensável que
houvesse a figura de um único gestor, subordinado à CPC, sugerindo ao Pró-reitor o
Prof. Júlio Roberto Katinsky, o que foi decisivo para que a pauta proposta fosse integral-
mente cumprida. Reitero o que assinalei anteriormente, ao apresentar um Plano Gestor
para as Ruínas, relativas ao período 2002-6:

          Inúmeros esforços foram implementados nos últimos anos pela USP, em
     especial na atualidade graças à atuação do Gestor Prof. Júlio Katinsky. Entre as
     inúmeras ações do Gestor, destacaria, em primeiro lugar o respeito e a generosi-
     dade em acolher a propor. Igualmente proveu significativo trabalho de consolida-
     ção, conservação e restauro, coibindo riscos iminentes nas Ruínas e no Pavilhão
     Saia, o convite a colegas para atuação nas questões da pesquisa, prospecção e
     escavações arqueológicas, sempre debatidas no Colegiado da CPC e na Pró-
     Reitoria de Cultura e Extensão Universitária.



                                                                                             29
Mestre engajado, não se desviou da desejada troca de opiniões, estando
          atento ante projetos educacionais, a ampliação e organização da participação da
          comunidade local e uspiana, o levantamento de arquivos e iniciativas para tradu-
          ção de material inédito, o estágio para estudantes no âmbito da Graduação, a
          realização da maquete com os estudantes, sempre mantendo contatos sistemáti-
          cos com órgãos preservacionistas, realizando trabalhos de conservação no Pavi-
          lhão Saia, reunindo, em edição, debates e pareceres sobre o caminho para
          perenizar o Engenho e, também, criando estudo para a consecução da Base
          Avançada de Apoio à Cultura e Extensão, na Baixada Santista, aprovado pelas
          instâncias competentes.

           O bem cultural tem sido alvo de valiosos projetos com viso educacional e, agora,
     os educadores planejam uma plataforma do saber, cabendo-me a honrosa tarefa de
     versar sobre tal iniciativa. Acredito que ações educacionais precisam partir da troca,
     para serem de fato uma atividade extensionista significativa, ou seja, totalmente aparta-
     da de vínculos assistencialistas, daí o interesse em expor inicialmente o porquê de se
     implementar a Plataforma Sophia. O foco principal se encontra direcionado a articular,
     junto com a comunidade envoltória, atividades, oficinas e contato distinto para segmen-
     tos diferenciados, tanto em interesses e motivações, quanto em condições sócio-edu-
     cacionais e etárias.

          A Universidade de São Paulo, assim, pode vislumbrar intercâmbio frutífero com
     uma enorme gama de público. Atuantes desde agosto de 2004, os educadores pro-
     põem programas especialmente projetados, desta forma olhando as especificidades e
     fundamentando-os em valores, generosos, plurais e identitários, sonhando chegar a
     disseminar, sob forma participativa, o mais antigo remanescente material, entre os pio-
     neiros engenhos de cana de açúcar, se considerar-mos que foi implantado quando da
     chegada a São Vicente de Martim Afonso de Sousa, em 1532. Ciça, Primavera, 2005.



30
Notas


1
 - Professora Titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo/USP e Presidente do Conselho Curador das
Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos.
2
 - A Plataforma de projetos interdisciplinares leva este nome em virtude da abrangência que pretende dar às
diversas áreas do conhecimento. Sophia: palavra grega que significa saber.
3
 - LOURENÇO, Maria Cecília França. Enredos e segredos. In: Revista de Cultura e Extensão- USP (O): 62-73.
jul.-dez 2005.
4
 - Uma dessas histórias, sempre lembradas, foi elaborada pelo então diretor do Museu Histórico Nacional, o
polêmico Gustavo Barroso, muito preocupado com a conservação das tradições judaico-cristãs, refere-se ao fato
de que o assalto de Cavendish, “não fora cometido pelo Natal, que os ingleses respeitam e celebram tradicional-
mente; porque em 1591 já haviam os portugueses adotado o calendário da chamada Reforma Gregoriana e,
enquanto para eles na Inglaterra) era ainda no dia 15, para os portugueses (de Santos) já era o dia 25 (de natal).
(www..novomilênio.inf.br.em 21 jul. 2005}
5
 - Entre as primeiras fontes, citadas pelo estudo de Carl Laga, abordando a dada de morte, seria a de F. Donnet,
em1892, Notice historique et statistique sur lê raffinage et lês raffineries de Sucre à Anvers. In: LAGA, Carl. O
Engenho dos Erasmos em São Vicente; resultado de pesquisas em arquivos belgas. Estudos Históricos (1):16,
Marília, 1963 Em 1943. Sommer alude ao Almanaque de Gotha de 1897, segundo o qual a origem da família
descenderia de Bernard de Schetzenbergue, que viveu em 1308 e acrescenta que teria falecido em 30 de maio
de 1550. SOMMER, F. Os Schetz da Antuérpia e de S. Vicente. Revista do Arquivo Municipal (XCIII): 80, out.-
dez.1943 Ainda na atualidade registra a mesma informação em http:genealogy.euweb.cz/ursel em 16 jul. 2005.
6
 - http://users.telenet.be/henk.coolen/genealogie em 15 jul. 2005.
7
 - ANCHIETA, José de, S. J. Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1933, p.265. Transcrito também In: http:/purl.pt/155/1/ em 20 jul. 2005
8
 - http://users.telenet.be/henk.coolen/genealogie em 11 jul. 2005
9
 - A figura de Veniste tem dado margem a uma série de especulações, pois na célebre viagem de Ulrico Schmidl
de Straubing, em 1534, relatadas no texto Derrotero y viaje a españa y las Índias, quando no capítulo 51 revela
que oito dias antes de partir de volta de viagem para seu país obteve notícias da chegada de Portugal de um
barco de Johan van Hielst, um comerciante e administrador de Erasmus Schetz (www. usuanos. lycos.es em 14
jul. 2005).




                                                                                                                     31
Bibliografia Citada


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32
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                                                                                        33
Ancoradouro de Potenciais Educativos


          O uso qualificado de bens culturais e a sua conseqüente preservação constituem-
     se em grandes desafios para governos e comunidades neste início de século. Somen-
     te ações baseadas em conhecimentos interdisciplinares podem nortear projetos edu-
     cacionais necessários a tal preservação e à valorização destes bens. Com efeito, as
     universidades destacam-se na sociedade contemporânea por formarem profissionais
     atuantes em diversificados segmentos seja criando, orientando, decidindo ou execu-
     tando trabalhos que influenciem a sociedade, questionando o senso comum das repre-
     sentações sociais, levando-as à criticidade.

           Acompanhando esta tendência, a Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária
     da USP vem ampliar as perspectivas de trabalho junto às Ruínas Engenho São Jorge
     dos Erasmos, em Santos-SP, implementando ações que privilegiem a atuação educativa.
     O conjunto aqui proposto, pela gestão das Ruínas e pelos educadores da Universidade
     de São Paulo, direciona-se para criação de uma plataforma de atividades que busque
     congregar diversos projetos educacionais tendo como locus de atuação a área das
     Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos e a confluência de suas transformações
     históricas, sociais e ambientais.

          Assim surge a Plataforma Sophia como uma proposta que visa privilegiar a inves-
     tigação de novos enfoques incentivando, simultaneamente, a especialização e o
     aprofundamento característicos do conhecimento científico. Sua relevância sinaliza a
     dinâmica de uma postura conjugada que propõe discussões acerca dos elementos
     constituintes da memória em face das problemáticas, anseios e buscas de nossa soci-
     edade.

         A área onde estão situadas as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos expressa
     um dos testemunhos mais antigos da história do Brasil quinhentista, fator de incentivo a

34
diversos projetos acadêmicos e educacionais. Neste sentido, a amplitude dos traba-
lhos previstos na Plataforma Sophia permite o aprimoramento em diversificadas áreas
do saber de maneira interdisciplinar.

       Embora seja este um conceito bastante decantado, mas pouco assimilado, a
interdisciplinaridade vem sendo foco, cada vez mais da atenção de programas educa-
cionais. A interdisciplinaridade é uma categoria de ação. Trata-se de uma atitude, sem a
qual o conhecimento perde sua relevância mais essencial: a de responder a questões
do presente. A iniciativa baseada na interdisciplinaridade possibilita assumir o uso qua-
lificado deste espaço, conjugando novos conhecimentos em prol do benefício comum.

     Para além desta pretensão, a Plataforma busca aproximar as diversas áreas do
saber a partir da proposição de projetos educacionais coligados a visitas curriculares
programadas conjuntamente. Assim, educadores das Ruínas, professores e comunida-
de escolar planejam conjuntamente os projetos e os planos curriculares a serem intro-
duzidos nas discussões, estabelecendo uma inter-relação promissora e saudável para
todos os integrantes.

     Elemento de interação significativo, a presença dos educadores da Universidade
de São Paulo nas Ruínas objetiva permitir a integração entre o bem cultural e a comuni-
dade docente, que de certa maneira vinha (antes da criação e implementação da Plata-
forma Sophia) corroborando a impressão equivocada da comunidade de que se tratava
de um terreno propício apenas à manutenção do abandono e de fantasiosas lendas.

      A Plataforma busca ampliar os horizontes referentes ao conhecimento do que foi,
é e do de pode vir a se tornar este bem cultural, servindo de base para que sejam
implementados programas que tenham como foco de ação interpretações sobre os
silenciamentos destas ruínas centenárias.



                                                                                            35
Para tanto, propõe a criação de atividades educacionais fundamentadas nas voca-
     ções das Ruínas expostas e aprovadas no seu Plano Gestor, a saber:

          · Oficina Permanente de Resistência: esforço sistemático e continuado para a sus-
     pensão e conscientização sobre os silenciamentos relativos aos caminhos vividos na
     longa história das Ruínas.

          · Laboratório para Eternização de Valores: construção crítica de significados e
     constante reavaliação desses conceitos, confrontando e revendo valores.

          · Sítio Permanente de Proteção: vocação preservacionista das inúmeras áreas,
     que visam garantir a proteção das Ruínas e de seu envoltório, protegendo-os de fatores
     adversos.

          · Bem Cultural de Germinação: elaboração de programas para intercâmbio capa-
     zes de germinar posturas distintas, em face da responsabilidade de todos na preserva-
     ção de espaços de memória como as Ruínas.

          Em síntese, o local serviria para experimentação, estudos e práticas conjuntas,
     além de cenário para eventos que promovam o intercâmbio entre o conhecimento pro-
     duzido nas universidades e a comunidade.




36
Matriz didático-pedagógica


                                                                          Sem sedução, não há educação!
                                    A construção desta só se efetiva por meio das sensibilidades individuais
                                                         Ressaltadas e respeitadas a partir de um coletivo
                                                                                                        (...)
                                                                    Consiste nisto a boniteza da educação!
                                                                                               Paulo Freire

           Interessa-nos particularmente as idéias de Vygotsky e Piaget, segundo as quais a
     aprendizagem gera autonomia e desenvolvimento. O autor russo, defensor de uma
     pedagogia conhecida como sócio-interacionismo, porque previa a interação entre os
     sujeitos e a sociedade, afirma que uma criança, se puder aprender com auxílio de
     outras pessoas que têm objetivos comuns, terá um ritmo de desenvolvimento mais
     acelerado em comparação a outra que aprende sozinha. Por outro lado, Jean Piaget,
     idealizador do construtivismo, parte da premissa que o sujeito constrói o conhecimento
     junto com seu professor, colegas e sociedade na qual está inserido, numa nova inter-
     pretação do mundo físico e social. Ambos os autores percebem a relação ensino-
     aprendizagem como uma constante troca entre as inspirações do sujeito e os elemen-
     tos da sociedade. Portanto, o conceito de saber, aprendizagem e inteligência tornam-
     se bem mais complexos.

            Atualmente o conceito de inteligência tem mudado sensivelmente. Idéias solitári-
     as, soluções individualistas, inteligência setorizada tornaram-se potencialidades obso-
     letas. Ganha espaço o que vem sendo preconizado por estudiosos liderados por Howad
     Gardner (uma grande equipe da Universidade de Harvard): o ser-humano é dotado de
     inteligências múltiplas, manifestando preferências e utilizando, portanto, formas diferen-
     tes de compreender e expressar o mundo. Os estímulos diversos são, mais do que
     nunca, vistos como o “alimento” das inteligências.


38
Um outro tipo de inteligência, coletiva, emocional e mais complexa tem sido cada
vez mais estudado. Trata-se da pedagogia que vê no lúdico e não na competitividade
a solução para um desenvolvimento psico-social mais autônomo. Como suporte desta
original proposta os jogos cooperativos incentivam as potencialidades coletivas sem
menosprezar as individualidades. Os jogos cooperativos são a união entre a coopera-
ção e a autonomia, processo que potencializa a aprendizagem baseada no respeito,
no agir com o outro e na capacidade de cooperar e redescobrir a solidariedade, tendo
como estímulo a constante motivação para o conhecimento.

      A proposta pedagógica norteadora dos projetos educacionais inseridos na Plata-
forma Sophia pretende tratar os elementos formadores do complexo das Ruínas Enge-
nho São Jorge dos Erasmos como algo que possibilite ao estudante dois princípios
básicos: a) estimular a construção de sua identidade, incentivando o sentimento de
pertencimento deste frente ao patrimônio cultural (uma vez membro da sociedade, deve-
se preservar e zelar pela manutenção de sua história e do meio em que vive); b)
sinalizar para este aluno a necessidade de se preservar a sensibilidade coletiva, sem
desprezar a identidade individual despertando neste o senso crítico e a postura ética.

     Identificar, preservar, valorizar e transmitir conhecimento são, portanto, ações que
fazem da Plataforma Sophia um porto seguro para as ações educacionais preocupadas
em qualificar o conhecimento levando em consideração a autonomia daquele que de-
seja conhecer.

      No quadro das preocupações mais legítimas dos projetos inseridos nesta Plata-
forma insere-se a necessidade de se compreender a relação entre o patrimônio natural
e histórico numa dupla abrangência: local/global (proposta baseada nos Parâmetros
Curriculares), correlação fundamental para se apreender os elementos de identificação
do processo de gestão ambiental, cultural e histórica das Ruínas.



                                                                                            39
Em contato com esta premissa básica (educar para conhecer) a comunidade esti-
     mula-se a preservar, conscientizando-se da importância de seu papel na perenidade
     do bem cultural. A conservação deste patrimônio deve ser pensada, portanto, segundo
     um esquema de preservação em larga escala (Ruínas e adjacências). Isto assegura a
     não deturpação de seus significados históricos, uma vez que a conservação e preser-
     vação rompem as fronteiras limítrofes da cultura material para abranger a comunidade
     em que está inserido. Tais elementos sustentam a relevância e a abrangência desta
     Plataforma que tem em andamento programas educacionais que merecem destaque.


          O projeto VouVolto


           O carro chefe destas ações educativas é o já bem sucedido projeto VouVolto.
     Idealizado pela Profª Drª Maria Cecília França Lourenço, Presidente do Conselho Curador
     das Ruínas, o VouVolto caracteriza-se pela manutenção e qualificação do espaço em
     questão por meio de atuações pedagógicas conjuntas entre os professores das redes
     de ensino municipal e estadual e os educadores das Ruínas.

           Este projeto busca, através da interdisciplinaridade e baseado em técnicas de
     educação histórico-ambiental formal e informal, influenciar o domínio afetivo dos visitan-
     tes, seus valores e interesses, tendo como meta final a mudança de atitudes destas
     pessoas com relação ao uso do bem cultural.

          O público preferencial deste projeto é o atendido pelas escolas públicas dos
     municípios de Santos e São Vicente, bem como o alunado de toda a rede pública
     estadual de ensino. A metodologia de atuação utilizada pelos educadores prevê que
     os professores das redes de educação conheçam as Ruínas anteriormente à vinda dos
     alunos, o que caracteriza um avanço pedagógico, uma vez que o docente não prepara
     seu roteiro ou plano de aula sozinho, mas em conjunto com os educadores.

40
Esta é a fase em que as impressões dos docentes com relação às Ruínas possi-
bilitam a construção de um plano de visitas que leve em consideração o planejamento
e os conteúdos discutidos pelo professor caracterizando assim uma visita personaliza-
da. Nesta visita técnica o professor (no papel de especialista da educação) conhece as
Ruínas, o projeto, o roteiro da visita monitorada (que congrega determinados conteú-
dos, estruturas adequadas à realidade dos alunos, seqüência e forma de apresentação
das atividades, estímulos e meios a serem utilizados), bem como o Manual do Profes-
sor - elaborado pela equipe de educadores - e o material de apoio disponibilizado.

     A partir daí terá elementos suficientes para elaborar um Plano de Estudos. Partindo
do pressuposto de que a improvisação é uma terrível inimiga da aprendizagem, este
insere a data da visita com seus alunos no Plano de Curso em andamento na escola,
planejando as atividades de ensino-aprendizagem, que serão desenvolvidas em sala
de aula, antes da visita.

      A segunda etapa deste processo é a visitação dos alunos propriamente dita. O
VouVolto prevê visitas monitoradas em cinco dias da semana (incluindo sábados e
domingos), com duração média de duas horas e meia. Após a recepção, os alunos se
reúnem na edificação principal para receber as primeiras orientações. Neste ponto, a
turma será dividida em dois grupos, cada um ficando com um educador, respectiva-
mente nas partes alta e baixa da planta do engenho.

     As explicações ocorrem de maneira simultânea e paralela (com previsão de uma
hora) segundo o procedimento de atuação/explicação de cada educador. Acompanha-
dos dos educadores e de seu professor os alunos são sensibilizados a participarem
das discussões levando em consideração seus conhecimentos prévios sobre o con-
teúdo discutido. Após a primeira parte da visita os educadores trocam de turmas o que
possibilita que todos tenham as duas monitorias (sócio-histórica e ambiental). Ao térmi-
no da visita os alunos são sensibilizados a voltarem em outras ocasiões, para que
possam junto aos seus parentes e amigos demonstrarem o que foi apreendido na visita
com a escola.
                                                                                           41
A monitoria integrada: questões relevantes, respostas em aberto


            A visita monitorada tem como foco de suas discussões a análise de uma “Linha do
     tempo da utilização da cana de açúcar pelo ser humano” e a explanação sobre alguns
     fatos históricos referentes às Ruínas Engenho, inserindo tais informações num amplo
     debate sobre a criação e manutenção do primeiro grande ciclo econômico nacional: o
     ciclo do açúcar dos séculos XVI e XVII. Este instrumento pretende evidenciar a relação
     existente entre as necessidades humanas e a utilização (plantio, produção e
     beneficiamento) da cana de açúcar ao longo do tempo. O objetivo é enfocar como, a
     partir de quando e com qual intuito a cana-de-açúcar foi introduzida no cotidiano huma-
     no. A partir deste mote são discutidos os seguintes elementos:

          a) a origem da planta: expansão do plantio no mundo até sua chegada ao Brasil.
          Nesta etapa, evidenciam-se os apontamentos histórico-sociais da cultura canavieira,
          tais como a vivência e sociabilidade do ser humano com o lido da cana de açúcar
          enfocando como os diferentes sujeitos (produtores e consumidores) viam e vêem
          a cana, seus produtos e subprodutos. Paralelamente a esta preocupação também
          são enfocadas informações ambientais e econômicas que permitam uma maior
          percepção dos elementos vinculados ao complexo canavieiro: como se dava a
          interação ambiental entre a vegetação nativa e a cultura canavieira; qual o impacto
          da produção em escala desta cultura no meio nativo, dentre outras questões.

          b) Histórico da indústria canavieira brasileira e paulista em especial, cujo enfoque
          central é a construção do Engenho São Jorge dos Erasmos – hoje, Ruínas. Pre-
          tende-se evidenciar os elementos que deram vida a este complexo engenho
          apontando seus mais significativos marcos histórico-temporais, bem como enfocar
          a relação entre a implantação da cultura canavieira e a transformação das relações
          sócio-culturais da sociedade colonial.


42
c) Percepção atual das Ruínas: enfocar a necessidade da preservação como agen-
     te de criação de uma identidade (sociedade/ Ruínas). Por que preservar? Como
     preservar? A monitoria sócio-histórica termina propondo questionamentos sobre a
     relevância histórica de se ter nos “quintais” da cidade um bem cultural tão especi-
     al.

      Paralelamente às questões histórico-sociais vinculadas ao universo canavieiro, o
desenvolvimento da monitoria ambiental utiliza como estratégias a interpretação da na-
tureza e dinâmicas de grupo. Na primeira há o propósito de caracterizar o ambiente
biofísico, os fenômenos que nele ocorrem e os relacionamentos perceptíveis entre a
vida das plantas e dos animais que estão presentes nas proximidades. Utiliza-se como
laboratório, portanto, o metabolismo de locais onde a visualização do meio ambiente,
muitas vezes confundido com a natureza, se mostra plenamente identificável, sem focar
apenas características ímpares e sim também aquilo que ocorre naturalmente, como a
adaptação de certas epífitas e a sucessão vegetal.

     A dinâmica de grupo é o momento para estimular o emprego de todos os sentidos
a fim de despertar a curiosidade e o espírito de observação dos alunos para construir
conceitos a respeito da diversidade biológica presente nas Florestas Tropicais e em
sua representante local, a mata atlântica.

      Durante a caminhada até a grande árvore sediada na parte baixa da planta das
Ruínas os alunos serão motivados a experimentar uma aproximação com o ambiente,
exercitando sua percepção dos detalhes e relacionando tais descobertas com as infor-
mações novas e/ou já existentes a respeito do ecossistema mata atlântica (espécies
nativas e exóticas, relações ecológicas, desmatamento versus conservação dos recur-
sos naturais, os ciclos das águas, a erosão do solo, populações tradicionais etc.).



                                                                                           43
Esta monitoria visa o desenvolvimento de habilidades e atitudes necessárias para
     entender e apreciar as inter-relações entre o homem, sua cultura e seu ambiente envoltório
     (o uso prático da natureza, o sentido mítico e místico da natureza, a vitalidade individual
     ou coletiva perante a natureza).

          Com efeito, os instrumentos previstos nesta monitoria integrada (interdisciplinar
     por princípio) atuam como alicerces para a solidificação de novos valores que ajudam a
     preservar o testemunho e a memória coletiva.


          Laboratório de Memórias: em busca de uma memória coletiva


            Outro programa educacional atrelado à Plataforma Sophia tem por objetivo regis-
     trar fragmentos de memória de moradores da comunidade circunvizinha às Ruínas En-
     genho São Jorge dos Erasmos e que tenham como cenário de lembranças o terreno
     do bem cultural propriamente dito.

           O esvaziamento contemporâneo do espaço público, como cenário em que ocor-
     rem os principais acontecimentos humanos, tem trazido um desencanto quase generali-
     zado para os que acreditam na salvaguarda da memória coletiva como princípio maior
     que possa regulamentar a permanência dos legados da convivência humana. Esse
     princípio, pensado e vivido a partir de uma racionalidade produzida pelo embate demo-
     crático de nossas diferenças, dá sentido para a vida social. Articulada a esta idéia está
     a noção de esvaziamento das relações coletivas, em detrimento de uma valorização
     crescente do indivíduo no âmbito do espaço privado.

           Em contrapartida, um dos fenômenos culturais e políticos surpreendentes desde
     o final do século passado foi a emersão da memória como uma das preocupações


44
centrais das sociedades ocidentais, como têm apontado inúmeros autores com desta-
que para Jacques Le Goff e Pierre Nora (1995). A partir das décadas de 1980 e 1990 o
foco das questões mudou do entendimento dos futuros presentes para o dos passados
presentes (Jeudy,1986:4).

     Este deslocamento na experiência e na sensibilidade do tempo precisa ser com-
preendido historicamente. A memória feita de pedra, isto é os artefatos deixados à luz
de formas espaciais, votivas, religiosas, ou artísticas, também podem desencadear
rememorações sugestivas de passados presentes, assim tornando-se elementos-cha-
ve na compreensão de novos lugares de memória.

      Com o tempo fugidio e as invenções tecnológicas, as memórias tornaram-se
projetivas (desarmônicas) e sua função identitária se apagou diante de seu poder ima-
ginário. As estratégias culturais de salvaguarda dos patrimônios foram cada vez mais
desafiadas pelo jogo plural de uma nova perspectiva histórica. Em nossos dias, a
reconstituição sistemática de modos de vida de uma época anterior, através de espa-
ços e trocas sociais converte o campo da memória em teatro preferencial de uma
busca objetiva de conhecimento.

      Em decorrência disto, a interação entre a memória e o patrimônio ainda gera uma
teatralização dos valores de uma época. A reconstituição do modus vivendi de uma
época anterior, através dos espaços e trocas sociais transforma o campo da memória
em teatro de um conhecimento objetivo. Coloca-se então um paradoxo sobre o qual
nem a memória nem o ato preservacionista têm controle: estabelece-se um duelo entre
o poder destruidor das memórias e o poder petrificador e conservacionista das cultu-
ras.

     O foco sobre este atributo destruidor da memória ganha então relevância porque
muitas das testemunhas dos diversos espaços/lugares têm idades avançadas, o que


                                                                                         45
aponta para uma diferenciada postura no resguarde de suas ações. Isto denota que a
     memória sempre se qualifica de acordo com o significado que ela atribui aos fatos,
     lembranças e lugares. No caso específico das lembranças elegidas sobre as Ruínas
     Engenho São Jorge dos Erasmos, estas, apresentam-se necessariamente como ele-
     mentos problematizadores do presente e não como informações cristalizadoras de um
     passado. Por isso a confluência de detalhes que, sob o foco das memórias parecem
     sempre tão desconexos.

            Estabelece-se assim, o que Marc Augé chama de lugares em que se sobressai
     uma antropologia do próximo. Nesse sentido, este lugar tem pelo menos três caracte-
     rísticas comuns. Se pretende identitário, relacional e histórico.

           Como corolário da discussão acerca dos lugares antropológicos, Augé considera
     o binômio Espaço /Tempo uma dimensão indissociável perante a relação entre público
     e o privado. Esta constatação busca lidar com o sentido da história humana, ou seja,
     visa analisar o passado, propondo as tarefas de hoje, em função do que se deseja
     obter amanhã, pois segundo o próprio, a individualização das ações humanas e seu
     correlato da memória mostram que o ser humano ainda não acertou o caminho por onde
     poderia ir.

           É a partir desta proposta de se entender o passado para se conceber o agora que
     o ensaio de Marc Augé sobre os lugares antropológicos nos interessa diretamente. Os
     lugares antropológicos permitiriam, então, uma experiência inusitada: as pessoas se
     sentiriam solidárias exatamente na medida em que cada uma delas vivencia um aconte-
     cimento gerado a partir de uma dada troca seja esta simbólico-emocional, mnemônico-
     histórica ou simplesmente relacional. A questão ligada à memória individual parece-nos
     seguir caminho bem parecido. Diante da necessidade pungente de se conhecer o que
     o passado traz, a memória do indivíduo torna-se nebulosa, obliterada por um imperativo
     maior: o de se construir ou reconstituir uma memória coletiva. Tempo, espaço e memó-
     ria como pilares da construção social coletiva.

46
É objetivando transcender a aceitação da memória individual como centro das
ações históricas e nos fundamentar na noção de lugar antropológico (relacional-social –
histórico) que pensamos articular este projeto.

       De um outro prisma, o estudo de como dado bem precisa ser apresentado para
se comunicar, frente a distintos públicos também se mostra fundamental. Isto é, a manei-
ra como as Ruínas são apreendidas pelas pessoas que as conhecem (não como algo
reificado, petrificado pela ação do tempo, mas como espaço qualificado, produtor de
conhecimento e arregimentador de memórias plurais) é a condição primordial para o
não esquecimento deste bem. Este é um dos papéis desempenhados pelas Ruínas
Engenho São Jorge dos Erasmos: lugar em que pessoas encontram proximidade
identitária e que por isso congrega memórias diversas, coletivas e individuais.

      O lugar de atuação dessas ações e memórias coletivas pode ser o mais diverso
possível. Exemplo disto é a interação criada a partir de uma comunidade e as memóri-
as que esta produz sobre um dado lugar. Nesta interação, as pessoas, suas memórias
e as transformações ocorridas no espaço através do qual criaram identidade, fundem-
se num plasma que congrega passado e presente de maneira pouco nítida. O que se
viu e o que se vê misturam-se diante dos olhares plurais. Exemplo acabado de espaço
que tem esta característica são as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos.

       A partir de relatos de pessoas que, por algum momento, tiveram contato com as
Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, pretende-se reconstituir parte de suas me-
mórias levando em consideração um elemento significativo: o que a comunidade regis-
trou com relação a este bem cultural a partir de suas percepções individuais cindidas
pela junção da memória coletiva. Visto que as memórias são plurais, busca-se dar
visibilidade a estas vivências.



                                                                                           47
A geografia da memória


           A zona Noroeste da cidade de Santos iniciou sua urbanização a pouco menos de
     30 anos. O fato de ter ocorrido um processo tardio de urbanização certamente colabo-
     rou para que muito de sua mata nativa e seus segredos arquitetônicos mais antigos
     permanecessem sumariamente preservados. Um dos bairros constituintes deste re-
     cente surto urbanístico é a Vila São Jorge. Erguida na década de 1950 esta localidade
     foi testemunha da ocupação que, de certa forma, ajudou na conservação e preservação
     de um dos mais importantes e antigos bens culturais do Brasil: as Ruínas Engenho São
     Jorge dos Erasmos.

           A Vila São Jorge, que recebe este nome em homenagem ao santo padroeiro do
     Engenho e do curso d’água (hoje canalizado) que corta a região é atualmente uma
     valiosa comunidade no que tange aos potenciais memorialísticos sobre a história re-
     cente desta região e, sobretudo, da localidade onde estão situadas as Ruínas Engenho
     São Jorge dos Erasmos. Movimentos que busquem a preservação da memória desta
     localidade tornam-se enriquecedores instrumentos de conscientização sobre a impor-
     tância do cidadão para o processo preservacionista.

          Se por um lado a urbanização acelerou a especulação imobiliária mudando a
     paisagem da região (atualmente a Vila São Jorge ocupa uma área de 512 mil m2 com
     uma população de pouco mais de 50 mil habitantes), por outro a distância do centro da
     cidade e do fluxo de pessoas e transportes colaborou para que nestes últimos 50 anos
     o patrimônio histórico em questão permanecesse como a séculos atrás.


          A incorporação das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos pela Universidade
     de São Paulo, a partir de finais da década de 1950, favoreceu ainda mais sua salvaguar-


48
da. Após uma sucessão de diversos proprietários e um longo período de quase es-
quecimento, foi a partir deste momento que sua importância como documento passou a
ser reconhecida, cabendo a cada época vivificar as Ruínas com seus mais diletos
valores.

      Com a implementação de um sistemático processo preservacionista a Universida-
de de São Paulo, desde 2003, vem firmando parceria com as Secretarias dos municípi-
os de Santos e São Vicente visando implementar projetos pedagógico-educacionais
que busquem dar visibilidade à questão da preservação e da construção da identidade
histórica, pela via institucional, assim garantindo o predicado de bem público.

      Frente à originalidade histórica deste bem cultural, projetos que incentivem sua
preservação justificam-se não só pela necessidade premente da salvaguarda, mas,
sobretudo devido à reconstituição de parte significativa de nossa história. Com efeito,
movimentos que busquem a preservação da memória desta localidade, somados à
interação entre as universidades e a comunidade tornam-se enriquecedores por valori-
zarem a troca e não simplesmente a transmissão de conhecimento. É visando preser-
var fragmentos desta memória que este projeto busca dar voz aos relatos da comunida-
de, relevância às suas lembranças e visibilidade à iconografia remanescente.

     Trata-se, portanto da reconstituição de uma história que, junto com o emaranhado
das memórias destes moradores precisa vir à luz das novas gerações. A comunidade
da Vila São Jorge certamente poderá nos ajudar nesta busca. Identificar como a comu-
nidade da Vila São Jorge viu e vê as Ruínas São Jorge dos Erasmos (por meio de sua
memória coletiva e da percepção que detêm sobre o bem cultural) nos permitirá enten-
der melhor a relação existente entre os moradores do bairro e este patrimônio.

    Procura-se, portanto, a partir de evidências orais e fotográficas, inventariar as infor-
mações disponíveis por esta comunidade sobre a localidade e o seu entorno. Funda-


                                                                                               49
mentais para o entendimento de sua história recente, as informações disponibilizadas
     por estes moradores nos auxiliarão no entendimento mais aprofundado sobre a ocupa-
     ção e os condicionantes que fizeram deste bem algo destacável da paisagem semi-
     urbanizada da região.

          Esta paisagem, recentemente constituída é também palco para o desenvolvimen-
     to de um programa que objetiva discutir as transformações ocorridas no último século
     no que hoje vem a ser o território circunvizinho às Ruínas Engenho.


          Território e Transformações: a dinâmica do espaço de fronteira


          O projeto Território e Transformações sinaliza a preocupação notória da
     contemporaneidade de registrar a frenética mudança no modus vivendi das popula-
     ções frente aos seus lugares de atuação sócio-histórico. Tal necessidade se baseia
     não só pelo de se interpretar.

           O processo de formação do território paulista deu-se, em primeira instância, a
     partir do litoral. Em função desta expansão implantaram-se sesmarias que posterior-
     mente tornaram-se referências de partilha entre gerações. Uma vez recortadas e distri-
     buídas tais glebas deram origens a municípios, que iniciariam um processo de
     mapeamento regional, fator preponderante na formação das primeiras cidades. Esta
     paulatina transformação e migração deram-se de maneira não refratária às interferências
     tanto do mundo europeu, quanto das dinâmicas internas à nova terra recém colonizada.

           De maneira bastante abrangente esta dinâmica reproduziu seu foco durante sécu-
     los. As mudanças na silhueta de alguns territórios, bem como no traçado de suas fron-
     teiras apontaram para a necessidade de se reconsiderar um elemento bastante signifi-


50
cativo na relação entre a população e seu espaço de atuação: o elemento político. Foi
a partir deste elemento político que houve a reconfiguração sócio-espacial de muitas
regiões do país. Exemplo claro desta transformação é o território contíguo que corta a
Ilha de São Vicente: a divisa geográfico/administrativa entre os municípios de Santos e
São Vicente.

     A territorialidade expressa, determina e, portanto, designa a formação social e
econômica de um dado território, reforçando a diferença e a separação entre as pesso-
as e os lugares. Parte daí o interesse de discutir como se dão as relações de transfor-
mação entre a espacialidade e o cotidiano dessas pessoas que vivem ou viveram
nesta região marcada pela ação modificadora da recente urbanização.

     Historicamente, a cidade de Santos, assim como o município de São Vicente,
vivenciou a dinâmica de uma economia monocultora de exportação (o açúcar) exigindo
o avanço tecnológico e a articulação do trabalho cada vez mais especializado e, por tal,
compartimentado. O que, nos primórdios da colonização, foi o resultado prático das
ações do capitalismo mercantilista recém disseminado tornou-se séculos depois o ele-
mento desencadeador de um processo irreversível de urbanização. Tanto no século
XVI como no XIX ou XX a ordem dinâmica sempre foi a expansão territorial como corolário
de uma expansão econômico-social.

      Dois fatores são então essenciais nesta tentativa de se entender o recente pro-
cesso de transformação urbana do centro da Ilha de São Vicente. Em primeiro lugar, o
quotidiano daqueles que trabalharam e produziram a riqueza do período, sempre este-
ve vinculado a esta dinâmica de transformação dos lugares em que eram inseridos. Por
isso a lógica da transformação espacial/territorial manteve-se em direta proporção com
a submissão de um trabalho que visava à reprodução do estado de alienação.
Escravização inicialmente, dependência externa posteriormente e uma quase nula di-
mensão sobre a questão do trabalho marcaram a equação trazida a partir da expansão
capitalista. Trabalho mais expansão, igual a escravização e perpetuação social.

                                                                                           51
Em decorrência do elemento cotidiano, a questão identitária destes trabalhadores
     também se torna algo relevante nesta tentativa de se perceber as transformações histó-
     rico-espaciais da Ilha de São Vicente. O cotidiano forja partes desta identidade que, por
     sua vez busca sempre codificar e decodificar as mensagens deste cotidiano possibili-
     tando a formação de uma identidade cada vez mais vinculada ao espaço em que esta
     inserida.

           Todas essas questões históricas vêm à baila justamente quando nos deparamos
     com uma realidade bastante específica, tanto social quanto economicamente. O debate
     contemporâneo a respeito da espacialidade (fruto das preocupações históricas vincula-
     das às origens espaciais do nosso território brasileiro, mas com maior ênfase no espa-
     ço litorâneo paulista) resulta desse novo e complexo momento da realidade em que
     vivemos, aludido genericamente como período de globalização: uma perspectiva que
     propõe dar conta de explicar algo que, enquanto conceito, já nasceu fragmentado, tal
     como na frase famosa do judeu alemão, Karl Marx: “Tudo que é sólido se desmancha
     no ar...”.

           Nesse sentido, a análise crítica do processo de globalização nos permite identifi-
     car, simultaneamente, um processo de fragmentação espacial, portanto de regionalização
     e de individualização. Isto implica também considerarmos, como lembra o próprio San-
     tos (1996), a complexidade da qual se reveste a realidade territorial em que vivemos.
     Horizontalidades e Verticalidades que se criam e recriam simultaneamente.

           O desafio que nos é colocado no processo de análise regional é o de especificar
     e compreender as ligações entre os atores, as relações que eles tecem, seus
     condicionantes históricos, seus interesses, os embates que eles promovem e os seus
     resultados através de um dado espaço de atuação sócio histórico.



52
História, ambiente e educação: transformação em três níveis


     A história do litoral sul paulista preservou legados arquitetônicos surpreendentes
destacando-se muitas edificações dos séculos XVII, XVIII e XIX porém, guarda segre-
dos bem mais antigos. Exemplo disto são as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos.
Localizadas atualmente no que se convencionou chamar de Zona Noroeste da cidade
de Santos, as Ruínas são hoje o testemunho de uma história que precisa ser preserva-
da. Sua singularidade e originalidade comprovam isto.

       A despeito de atualmente pertencer administrativamente à cidade de Santos, o
território em que estão instaladas tais ruínas foi, pelo menos até o século XIX pertencen-
te à cidade de São Vicente. O entroncamento fronteiriço localizado bem no centro da
ilha de São Vicente confundiu por vários séculos a localização exata deste engenho,
fator que ainda hoje, do ponto de vista geográfico, suscita controvérsias.

      A constatação de que o território em questão veio se transformando paulatinamen-
te até modificar sua silhueta na virada do século XIX para o XX e, mais detidamente, a
partir dos anos de 1950, justifica a necessidade de se entender esta mutação como
resultado de uma série de reconfigurações sócio/histórico/espaciais na região citada.
Isto equivale a dizer que, se hoje as Ruínas ESJE estão localizadas administrativamen-
te no território santista, sua história demonstra que por séculos constituiu parte significa-
tiva do município contíguo, razão pela qual entender o Engenho São Jorge dos Erasmos
como confluência de dois territórios politicamente distintos se torna um veio interessan-
te para se perceber as transformações oriundas do processo de urbanização recente
desta localidade.

      Atualmente, a Zona Noroeste da cidade de Santos tem sido considerada a última
fronteira de expansão populacional e territorial da ilha. Iniciou sua urbanização há pouco


                                                                                                53
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Plataformasophia

  • 1.
  • 2.
  • 3.
  • 4.
  • 5. SUMÁRIO Plataforma Sophia: um espaço vivencial 7 Patrimônio e pranto 10 Indústria antes da Indústria 16 Engenho até... 18 De que Engenho se fala? 22 Desvelar e vivificar 25 Ancoradouro de Potenciais Educativos 34 Matriz didático-pedagógica 38 O projeto VouVolto 40 A monitoria integrada: questões relevantes, respostas em aberto 42 Laboratório de Memórias: em busca de uma memória coletiva 44 A geografia da memória 48 Território e transformações; a dinâmica do espaço de fronteira 50 História, ambiente e educação: transformação em três níveis 53 Parcerias: quando um mais um são três 56 Resumo da Ópera 57
  • 6.
  • 7. Plataforma Sophia: um espaço vivencial Maria Cecília França Lourenço¹ Uma história trágica, Heróica em certos passos, mas essencialmente lúgubre no dia-a-dia do povo multitudinário, que trabalha para produzir o que não come nem usa e sim o que é requerido dele por seus amos. O Brasil sempre foi,e ainda é, um espantoso moinho de gastar gente; embora seja também, um poderoso criatório de gente. Seis milhões existiam aqui quando o primeiro europeu chegou. Não sobram hoje, como índios, nem trezentos mil. Não se sabe quantos negros foram gastos, tanto nas caçadas da África como na tenebrosa travessia nos tumbeiros e, depois, já aqui, no duro eito dos canaviais (...). Darcy Ribeiro. A Invenção do Brasil. Inúmeras são as ações preservacionistas, os sonhos e as trocas implementados entre distintos segmentos, acerca das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, um bem cultural da Universidade de São Paulo. Situado às margens do rio São Jorge, no sopé do Morro da Nova Cintra, em Santos, estado de São Paulo, geraram acordos, intervenções e sinceros esforços para vivificá-lo, cabendo a esta publicação apresentar um fruto significativo – Plataforma Sophia2, projeto integralmente elaborado pelos edu- cadores, concursados em 2004 pela Universidade de São Paulo, atuantes no bem cultural. Adianto que felizmente muitos dos sonhos propostos já se transformaram em rea- lidade histórica, graças a estudos, ações e esforços harmonizados. Os relatos sobre a existência, a importância e os conflitos há muito vêm sendo objeto de significativos registros, crônicas e interpretações, englobando desde um conjunto epistolar, diários de viagem, até os relatos firmados desde o século XVI. A USP detém um sem número 7
  • 8. de processos, pareceres, fotos, desenhos, projetos, pedidos, relatórios, estudos, in- vestigações e gráficos, assim documentando de forma inequívoca todos os trabalhos de conservação, canalização, monitoramento e intervenções empreendidas por gera- ções de ciosos cidadãos, que entendem o bem cultural como um fator vivo e renovável de questionamentos e convergência em ações e ideais, debatidos entre muitos. Esta publicação apresenta o plano educacional, denominado Plataforma Sophia, uma base ampla, plural e inaugural de um futuro distinto, proposta pelos educadores admitidos por critérios transparentes liderados pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo (USP) e atuantes desde agosto de 2004, nas Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. Advém da experiência de implantarem programas educacionais, funcionando de domingo a domingo, no verão e no inverno, nas aulas ou nas férias e em troca permanente com colegas das diferentes redes de ensino – santista, vicentina, estadual, universitária e para público em geral. Afinal, as Ruínas constituem um bem cultural da USP reconhecido como patrimônio exponencial em todas as instâncias - seja da própria Universidade, seja do Município, do Estado e da União Quando se fala do antigo Engenho de São Jorge, mandado erigir por Martim Afon- so de Sousa, em que pese sua inegável importância, estamos diante de um conjunto lacunar, seja de documentos e críticas continuados e em ordem de sucessão, seja de intenções associadas, interativas e harmônicas. Tenta-se, assim, estancar o imobilismo e convidar diferentes segmentos à produção compartilhada e continuada de conheci- mento, sobre inúmeros temas e áreas. Sublinho que desde os primórdios, quando o bem foi edificado por iniciativa de Martim Afonso de Sousa (século XVI), e o presente momento estamos diante de uma tradição instalada e ininterrupta, pois permanece em um mesmo espaço vivencial, o que é incomum para a realidade brasileira, sempre ávida por transformá-los. 8
  • 9. De outra parte o engenho representa uma história de longa duração, porquanto a cultura açucareira foi a primeira indústria exportável entre nós, continua operante e sem interrupções há quase quinhentos anos, embora as Ruínas não possuam exatamente a mesma área geográfica, em decorrência de sucessivos cerceamentos e conflitos. Cha- mo aqui de espaço vivencial os locais em que se entrelaçam uma natureza dada com ações e materialidades construídas, não sem uma série de lutas, sempre renovadas. Estas até aqui por vezes foram veladas, ou esquecidas e, em outras, rememoradas, razão pela qual proponho então a denominação – espaço vivencial, como um conceito oposto a espaço contemplativo, belo, reificado ou dedicado a poucos, o que talvez possa colaborar para se avançar em ações convergentes, potentes para transformar, através de novas vivências plurais, um museu vivo de um passado que não se pode esquecer, malgrado tenha sido, em alguns aspectos, nefasto se considerarmos valores humanistas ressaltáveis. Vítima de confrontos, de lutas por posse, ganhos e promoção pessoal, também alvo de ataques e revoltas, ao final do ano de 2005, ao contrário, as Ruínas ensejam um momento bastante interessante e convergente: unem-se gerações, especialidades, órgãos públicos e privados, setores, projetos diversificados e esforços de multidão de interessados. O intento em vivificar o bem permite conferir concretude a dois marcos exponenciais – de um lado a edição do projeto educacional, denominado, Plataforma Sophia, e de outro o início da obra para se erigir a Base Avançada de Cultura e Exten- são Universitária, projeto arquitetônico do mestre e arquiteto Júlio Roberto Katinsky, sob responsabilidade da Universidade de São Paulo, em terreno cedido pela Prefeitu- ra Municipal de Santos. 9
  • 10. Patrimônio e pranto Lá na úmida senzala, Sentado na estrita sala, Junto ao braseiro, no chão, Entoa o escravo o seu canto, E ao cantar correm-lhe em pranto Saudades do seu torrão.... Castro Alves. A canção do africano. A longa história da violência do humano pode ser captada pela simples leitura das Convenções Internacionais elididas em órgãos criados para esta finalidade, em especi- al após o segundo pós-guerra. Inicialmente, ressalta-se o passado glorioso com mar- cos arquitetônicos ou de civilizações desaparecidas e, também, empreendem-se ações conservacionistas, cujo foco apresenta belas palavras sobre a enorme capacidade hu- mana para criar o raro, exponencial, caro, singular, incomum, escasso, feito de material e/ou forma inusitado, estranho e precioso; igualmente situações peculiares vão sendo incorporadas, entre as quais aquelas em que o bem, a ser pleiteado como patrimônio, possui uma trajetória de olvido, esquecimento, perda ou reclusão, ou ainda costumes afeitos a extenso segmento, maneiras de fazer, representar, práticas, ritos, apropria- ções e costumes, se pensarmos no chamado patrimônio imaterial, recentemente assi- nalado (2003). Contudo raramente pensa-se no pranto e nas vidas diluídas para erigi- los. Os discursos com ideais históricos, identitários, relacionais, nacionais e univer- sais geram também teoria e prática importantes, em que pese certa dose de interesses velados e que precisam ser interpretados. Bastaria, na atualidade, lembrar o discurso estadunidense recomendando a preservação da Mata Amazônica, depois de ter de- vastado sua própria. A qualificação de pautas comuns, contudo, sempre representa 10
  • 11. uma autocrítica contra a desumanização operada pelo próprio humano e pipocam antes mesmo de serem criados órgãos como a United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) em 1946, ou o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS), em 1964, como atesta a célebre Carta de Atenas, firmada no entre - guerra (1933), quando se realiza o 4º Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM). O interessante de tais políticas é que envolvem os que se encontram na ponta do dia a dia laborial e, graças a isto, configuram-se avanços, como os que se acreditam propiciarão a Plataforma Sophia. O aparecimento de dado protocolo de intenções preservacionistas constitui uma prática, desde a Antigüidade, implantando-se instituições para a memória dos altos de- sígnios, sejam religiosos, de uma comunidade ou território, sejam artísticos e culturais. Criaram-se templos, museus, monumentos, arquivos e bibliotecas para que tais valores não caíssem no esquecimento. O que se discute aqui é uma política continuada com ações preservacionistas por troca entre iguais, como aquelas surgidas no Século das Luzes, após a Revolução Francesa (1789), visivelmente direcionada para estratégia política. Quantos museus foram abertos e monumentos preservados, um saldo digno, que parte de uma estratégia acalentada por impacto social! Essas práticas e apropria- ções, geradoras da representação sobre o que deve ou não ser preservado intensifica- se em progressão geométrica no período da chamada Guerra Fria, vale dizer nos anos 50 do século XX, em que a ameaça de uma dizimação nuclear aparece com contornos de realidade iminente. Data, pois, do momento em que as Ruínas passam para a USP (1958) o conjunto enorme e sistemático de recomendações internacionais, ampliado em encontros de profissionais, em especial educadores, geógrafos, historiadores, museólogos, traba- lhadores de órgãos preservacionistas, intelectuais, sociólogos, professores, juristas, arqueólogos, arquitetos, urbanistas e tantos outros segmentos reunidos já elaboram convenções, recomendações, cartas e declarações, que constituem o corpo teórico e 11
  • 12. as práticas, limites e ideais de ações preservacionistas de ampla escala internacional. Não se pense em práticas unificadas, porquanto no Japão, por exemplo, desmontam- se e remontam-se construções, atualizando-se os materiais e preservando as premis- sas técnicas do fazer, porém há na atualidade inúmeras convergências. A disseminação de tais princípios para parcela significativa do dito mundo ociden- tal fica bem evidenciada se feito um paralelo entre as determinações internacionais e as ações preservacionistas empreendidas pela Universidade de São Paulo, desde a do- ação (1958) junto ao antigo Engenho do Governador (Martim Afonso de Sousa), dos “Armadores do Trato” (quando em 1544 é criada a associação com essa denominação) e de São Jorge dos Erasmos. Entre tantas convenções internacionais, ocorre em 1956 a chamada, “Recomendação de Nova Dehli”, convocada pela UNESCO, acerca dos procedimentos, práticas e determinações relativas às investigações arqueológicas. Se antes só obras consensualmente entendidas como de valor artístico, incluindo- se a então recém lançada arte moderna, e o passado arqueológico remoto congrega- vam os profissionais, agora em 1962, a “Recomendação de Paris” (UNESCO) estabele- ce teoria e prática para salvaguardar a beleza e o caráter da paisagem, abrindo-se então um veio bastante profícuo, que até hoje se mantém interessante para grupos de profissionais. Entra também em campo subjetivo em que beleza e caráter representam contendas infinitas, entre estetas e teóricos, podendo haver o belo pictórico, ou seja digno de ser pintura e o outro, o terrificante, atraindo pela suspensão do previsível. Cabe lembrar que o Registro do bem, chamado Tombamento, etapa derradeira da pro- teção legal na instância federal, ocorre em 1963, dialogando com tais prescrições. Em 1964, logo dois anos depois, realiza-se a “Carta de Veneza”, (ICOMOS), que evocará recomendações diferenciadas sobre o que deverá ou não ser reconstituído nas práti- cas arqueológicas e arquitetônicas, ainda diretamente ligadas à conservação e ao res- tauro de monumentos e sítios arqueológicos. 12
  • 13. Como já se procurou demonstrar3, as ações de intervenção arquitetônica e esca- vação arqueológica do arquiteto Luís Saia, ao ser passado para a USP, enquadram-se com vantagens nesse cenário de convenções, tratados, recomendações e conven- ções internacionais. Presidindo a regional paulista do Serviço de Patrimônio Nacional, Saia representou um intelectual atualizado com as questões de seu métier e compõe aquele quadro de modernistas dentro das ditas repartições, que associam de uma forma distinta tradição e renovação, pois militam na vanguarda, sem apartarem-se da esperada responsabilidade cidadã. Já em suas recomendações sobre o que fazer, Saia mantém a sintonia aos campos de atuação preservacionistas, desde o início dan- do atenção ao papel de planos continuados, avaliados e compartilhados na área edu- cacional, como o que aqui se apresenta. Referências patrimoniais internacionais, sendo o Brasil signatário das mesmas, apontam para uma conservação preventiva, capaz de garantir a integridade do bem, porém desaconselham o restauro, caindo-se em uma concepção falsa e transforman- do-o em novo, como se nada acontecera ali de grave. Esta é uma questão muito inte- ressante, porquanto ainda na atualidade procura-se elidir pautas talvez parar gerar sen- timentos de aglutinação em torno de ideais provincianos, e se fala em - abandono do bem cultural, o que pode igualmente apontar para a absurda tese em restaurá-lo inte- gralmente, ou fecha-lo ao público, como um laboratório de reserva de mercado para poucos. As Ruínas constituem o que hoje se pode denominar um museu ao ar livre, por- quanto reúne ambiente, biodiversidade, lutas e culturas em um espaço vivencial, carac- terísticas de um dado tempo e, como tal, deve permanecer como testemunho ante acertos e equívocos do humano sobre a terra. Fragmentos históricos atraem por ra- zões múltiplas, entre as quais há a evidência de que suas pedras se mantiveram está- ticas há séculos, porém aqui guardam Histórias de índios e negros escravizados, uma mácula, que precisa ficar latente e não ser esquecida. O museu ao ar livre clama - o lamento do pranto, contudo não deve se repetir. 13
  • 14. As áreas que passam por hecatombes evocam situações extremas e elucidativas de formas absurdas em se tratar por restauro total os remanescentes materiais, seja por ação terrorista, acidente nuclear e conflito armamentista, sejam as senzalas brasileiras e os cemitérios indígenas. Apenas motivos sensacionalistas e mercantis poderiam levar a restaurá-los ou musealizá-los, no estado em que se encontram na atualidade. Bens dessa amplitude compõem marcos para promover trocas de saberes, ampliação das razões de tanta violência e não se recomenda reduzi-los em simples cenário, tipo parque temático para se levar crianças em finais de semana. As Ruínas enquadram-se neste caso e não se pode pensar em fazer uma das inúmeras modalidades de museus já existentes, o que eventualmente abrigaria algum interesse para se estabelecer hipótese relacional em campos frutíferos. A condição exponencial deste lugar, reitero para sublinhar, não é fazer dele mais um, como tantos, mas procurar promover trocas qualificadas, como as aqui propostas a partir de uma Plataforma Sophia, uma imagem muito feliz, que permite a chegada de saberes de vários quilates, faixa etária, altitudes e linguagens. Qual a outra experiência similar antes pensada para um monumento nacional como este, das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos? O caso das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos insere-se nestes conflitos, a serem relembrados porquanto a própria Capitania de São Vicente, a que inicialmente pertencia o engenho, sofreu uma série de problemas, já no século XVI, especialmente em conseqüência de disputas na questão econômica e religiosa, mas também quanto à mão de obra para trabalhar na lavoura de cana-de-açúcar e na moagem do caldo, para produção de açúcar, além de outros relativos a sucessivos e diferenciados ataques por razões da posse territorial. Os próprios índios, a quem se desejava escravizar, juntamente com negros, freqüentemente queimaram as plantações e engenhos. A chegada do colonizador sem 14
  • 15. dúvida justifica-se muito mais ante o desejo na expansão em territórios, na extração de especiarias e de pau-brasil, o sonho de pedras preciosas e a abertura de mercado, inclusive escravista, em dupla mão, ou seja, trazendo e, quem sabe, levando novos contingentes para as duras tarefas nas quais não se envolviam, legando-as então para escravizados, vigiados por feitores cônscios da dureza esperada no desempenho da função, que exerciam com requintes de suplício. Pero Góis, um dos companheiros da esquadra de Martim Afonso de Sousa, em carta ao Rei dom João III datada de 29 de abril de 1546, dá conta dos conflitos canden- tes, juntando a este fato a existência de muitos engenhos de água, claramente prejudi- cados (Cortesão, 1956: 321-3). Entre os engenhos, o São Jorge também passa por inúmeras dificuldades, além de que o açúcar deixar de ser uma agricultura rentável, ante os lucros da atividade no Nordeste, em especial em Pernambuco. Assaltos também ocorreram por europeus visando o poder sobre o território e a gente da terra, associado à apropriação das ditas riquezas, na procura de retirar a hegemonia da Península Ibérica, em especial durante o domínio espanhol sobre Portu- gal e colônias, ou seja, entre 1580-1640. Entre estes, segundo relatos baseados em célebre texto elaborado por Antony Knivet, teria se efetivado em 25 de dezembro de 1591, quando o pirata inglês, Thomas Cavendish4, ao chegar em São Vicente resolveu queimar cinco engenhos (Marques, 1879, v. I: 347). Outro relato sempre associado à queima de engenhos, afinal o chamado ouro branco, dada a imensa penetração atingi- da, terá lugar posteriormente em 1615, realizada pelo holandês Joris van Spilbergen (Fraco, 1940: 65). 15
  • 16. Indústria antes da indústria Conflitos, disputas e lutas são fortes indicativos de que as atuais Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos já foram muito produtivas, embora os beneficiários tendo auferido lucros sem estar ou favorecer a cultura local. Contudo, a situação lucrativa, em meados do século XVII, transforma-se ante o esmorecimento da atividade açucareira na Capita- nia de São Vicente, o local em que foi primitivamente fundado o então chamado Enge- nho São Jorge dos Erasmos. Contribuem para tal reversão o despontar das demais regiões brasileiras para a cultura canavieira, tanto em função do clima e do próprio rendimento daquelas terras, quanto da maior proximidade delas em relação aos cen- tros europeus. O certo é que até hoje a história erigida ainda privilegia foco naqueles tempos áureos, em que europeus, africanos e os donos das terras se enfrentavam de forma aguerrida. Acrescente-se outra dificuldade de natureza comercial, residindo no fato de que, entre 1580-1640, Portugal está sob o julgo espanhol e que, data de 1585, o conflito da Espanha com a região dos então proprietários, agora então os descendentes de Erasmus Schetz havendo amplo controle nas transações comerciais, incluindo-se aquelas açucareiras, o que possivelmente também tenha dificultado tal empresa comercial. Su- blinhe-se que a forte industrialização brasileira só se efetivará no segundo pós-guerra do século XX, em especial na década de 50, porquanto durante séculos fomos expor- tadores de matéria prima e importadores de inúmeros produtos industrializados, porém neste caso açucareiro já começamos ao contrário, ou seja, exportando o produto indus- trializado. Graças a inúmeros esforços de historiadores do período colonial, sabe-se de uma série de dados, que permitem estabelecer múltiplas relações, a partir da vinda dos portugueses, sejam societárias, históricas, ou sobre a rede açucareira, sejam aquelas 16
  • 17. comerciais, engendradas a partir da aquisição do Engenho São Jorge por Erasmus Schetz. Se tantos avanços propiciaram significativas interpretações, ficam ainda por ser determinadas as finalidades sucessivas, ou mesmo as atividades implementadas pe- los índios naquela região antes da chegada dos colonizadores a esse espaço vivencial. Hipóteses dão conta de que teria sido um curtume, pertencera a uma firma comercial, entrara em contendas inventariais e judiciais, o que por si só já propicia um roteiro bem amplo em diversos arquivos, inclusive vicentinos, já que a região antes pertencera a esse município. Segundo Benedito Calixto, pintor e historiador santista, quando Martim Afonso de Sousa deixa o país iniciara-se também a pecuária no Engenho de São Jorge. Acres- centa que de volta a uma viagem aos mares da Ásia, o primeiro donatário reconhece pouco avanço em sua capitania, deduzindo que este fator “(...) certamente o levou a desfazer-se da parte que lhe tocava, na parceria do Engenho São Jorge, que só mais tarde em mãos estranhas iria prosperar” (Calixto, 1924: 276-7). Se os dados brasileiros são ainda esboçados já os europeus desfrutam de condi- ções bem distintas, com arquivos bem cuidados, a espera apenas de ciosos interessa- dos, como atesta a quantidade significativa de referências a Erasmus Schetz. Este ad- quire o engenho em sociedade com Johan van Hielst possivelmente em 1544, segun- do o historiador Francisco Martins dos Santos, embora sem documentar as fontes (San- tos, 1986:349). Já outra versão registra a data de 1550, quando da morte de Rui Pinto para a aquisição, especificando que a base seria uma escritura pública lavrada em Lisboa em 18 de junho de 1550 (Franco, 1958:686). A figura de Erasmus é de fato muito sedutora, atraindo estudos, se considerarmos o fato de que freqüentava príncipes e o círculo esclarecido de Erasmus de Roterdam. Mantinha correspondência com Erasmus de Roterdam e se registra carta datada em 30 de janeiro de 1525, em que o senhor de Engenho relata ao grande pensador, que 17
  • 18. recebera de um amigo da Espanha, Franciscus de Vaylle, notícias sobre a ampla pene- tração de seus escritos entre os espanhóis (Bataillon, 1950:161). Outros dados sobre Erasmus Schetz advêm de estudos sobre a contribuição de uma série de europeus na formação brasileira, que acrescentam que “era dono de grande casa de comércio (...) se dedicava além de comércio ultramarino, às transações bancárias e à mineração. Sua família era originária de Aachen, transferindo-se de lá para Antdorf, como era conhecida a Antuérpia até o século XIIII” (Oberacker Jr., 1968: 63). Importante documento traduzido por Eddy Stols, em pesquisas realizadas em 1968, informa que em 1548, o engenho já se encontra velho e a roda comprometida, que devia então ser “levada para cima e deve ser feito um bom que ficará na descida da colina” (Stols, 1968: 417). Seria então transferido para a atual localização? Onde estari- am as fontes, por onde correriam as águas em que terras estavam os canaviais e a roda d’água? Quais as pesquisas empreendidas para se analisar a formação geológica do solo? Como se constata a Plataforma Sophia poderá abrir inúmeras frentes para novas pesquisas. Engenho até .... Sabe-se até por novas mídias que as datas de nascimento e morte de Erasmus Schetz são ainda objeto de dúvidas e desencontros. Seria o terceiro filho de Cuntz e Marie Crans, casado em primeiro matrimônio com Ida Van Rechterghem (1511) e em segundo com Katharina de Cock (1549). (http://www. genealogy.euweb.cz/). As ativida- des dos Schetz encontravam-se muito afinadas às demandas de seu tempo e Eugenia W. Herberts, em estudo sobre o uso de metais em diferentes utilidades, Red Gold of Africa, acrescenta que Erasmus Schetz controlava minas de cobre na Westhphalia e de zinco na Bélgica. Segundo a autora, algumas produções em latão dos Schetz passa- 18
  • 19. ram a ser consideradas como padrão de qualidade, em relação ao qual os artefatos similares se referenciavam, para ser avaliada a qualidade (www.coincoin.com). Fontes aludem à data de 30 de maio de 1550 para falecimento de Erasmus Schetz, cabendo a seu filho Gaspar adquirir a parte do sócio e assumir a direção da firma (Oberacker Jr., 1968: 63) até morrer em 9 de novembro de 1580, em Mons, quando a propriedade passa então para os irmãos. Entre as controvérsias sobre a data de nasci- mento e morte de Erasmus5, uma chama a atenção, pois documenta como falecimento deste - 30 de maio de 1550, passando então o Engenho para administração do filho Gaspar, que acaba comprando a parte de Veniste. Se a escritura relativa à venda das terras de Rui Pinto data de 18 de junho, como poderia já estar morto? Acrescente-se que fontes recentes no estudo genealógico aventam outras teorias, mais plausíveis, ou seja, Erasmus Schetz teria nascido por volta de 1481 e falecido na Antuérpia em 13 de junho de 15606, o que altera o quadro das hipóteses. A história de Gaspar Schetz tem sido igualmente objeto de inúmeros estudos e por ela constata-se que, como o pai, também aproxima-se de importantes persona- gens, sendo próximo dos jesuítas. Gaspar casa-se em primeiro matrimônio com Margareta van der Brugghe (1535) e em segundo com Katharina von Ursel, deixando extensa linhagem. São filhas do primeiro casamento, Isabela e Agnes, e do segundo Lancelot, Johan Karl, Melchior Nikolaus e Conrad. Quando Gaspar falece há correspon- dência trocada por Lancelot e Melchior Nikolaus com vistas à propriedade vicentina, que têm direito, embora Erasmus Schetz possuísse outros herdeiros além de Gaspar Schetz: Melchior Nikolaus, Balthasar, Konrad e Isabela (www.genealogy.euweb.cz/). Dados iniciais encontram-se hoje em exame, porquanto há uma correspondência vastíssima, por vezes assinada por um ou outro Schetz. Não obstante as datas e nomes repetidos dificultam as datações. Assim, Erasmus teve uma série de filhos e mesmo nas datas destes não há total coincidência entre as fontes, a saber Gaspar (1513 ou 14- 19
  • 20. 1580), Melchior Nicolaus (1516- antes 1578), Balthasar( ??-1586), Conrad(??-1579) e Isabela (???) casada com Jan Vleminck, fato em se aventar a hipótese de que este pudesse ser o tal Veniste relatado pelos cronistas do século XVII. Melchior tornou-se objeto de célebre carta de Anchieta datando de 7 de junho de 15787, em que lamenta a morte para Gaspar, talvez há um ano, e o padre deixa claras as relações de reciprocida- de entre o padre, a Companhia de Jesus e os Schetz: (...) Todo o tempo que residi em São Vicente procurei socorrer a casa de V. M. com os ministérios de nossa Companhia, como também agora fazem os padres que lá estão (...). Jesidro e Luís, filho de João Batista, aportaram aqui o ano passado e já chegaram a São Vicente. Deram-me a notícia que era falecido o senhor Melchior Schetz, no tempo daquela turbulência de Antuérpia. A dor que a todos nós cá sentimos Nosso Senhor sabe, por faltar lá uma cabeça tão católica em tal ocasião; e por não faltar de nossa parte a nosso ofício e há muita caridade que tem V. M. à nossa Compa- nhia, muitas missas lhe dissemos por toda esta costa, como nos obriga a razão (...). O filho de Erasmus, Gaspar, que detém os títulos de Senhor de Grobbendonck e Barão van Wesemael já é uma figura mais estudada, considerando-se que ocupará posições ressaltáveis na vida dos Países Baixos, naquele período, havendo certa con- vergência para o fato de que nascera em 20 de julho de 1514 na Antuérpia e morrera em 9 de novembro de 1581 em Mons8. Grande parte da documentação reunida sobre as Ruínas em arquivos holandeses e belgas será assinada por ele e, após sua morte por seus herdeiros, sendo uma das dificuldades a repetição freqüente em várias gerações dos nomes, Gaspar, Erasmus, Melchior e Lancelot. Quando e para quem exatamente os Schetz venderam o referido Engenho São Jorge dos Erasmos? Investigações sobre a sucessão, após os Schetz, vêm sendo elaboradas e, em breve se espera divulgá-las. Estudos anteriores e importantes, assim como a valoriza- 20
  • 21. ção do engenho e a passagem para a USP se deram em grande parte pela ação firme da pesquisadora da então Faculdade de Filosofia Ciências e Letras/ USP, Maria Regina da Cunha Rodrigues, incansável na luta para a preservação, junto às autoridades. Os colegas da FAU/USP sempre relembram como a determinação dela sobre o papel único e ímpar da USP na preservação do bem, contribuiu de forma decisiva para a integridade do local, etapa indispensável para se atingir o presente estado, que tenho a honra de introduzir. Pesquisas inéditas efetuadas pelo professor holandês, Paul Meurs, cujo título é Engenho São Jorge dos Erasmos, Santos Preservation Studies, 1990, por solicitação do atual Centro de Preservação Cultural (CPC) da Universidade de São Paulo, amplia- ram bastante tal lacuna, possibilitando estudos em fontes editadas e em tabelionatos, conforme se informa entre parênteses. Entre os dados acrescenta que em 1687 o então chamado Sítio de São Jorge é vendido pelo espólio de Mariana Pedroso (de Barros) (Trindade, 1983: 3). Observe-se que agora a escala já se torna outra. Durante o século XVII, Meurs localizou os seguintes dados: em 1768, José de Morais de Góis vendeu o Sítio de São Jorge para Jacinto Moniz de Gusmãos (Costa e Silva, 1973, I); os filhos destes com a morte do pai (1792) vendem para Bento Tomaz Viana (Tabelião Joseph da Costa Benavides), que vende o sítio e a cachoeira para Manoel Marques do Vale, sem localizar data (Tabelião José Carvalho da Silva). Em 1804, Vale por sua vez vende para Manuel José da Graça, incluindo canaviais (Tabelião Antônio José de Lima). Com a morte deste em 1810, São Jorge é transferido para Margarida da Graça Martins (Costa e Silva, 1973). Curiosamente em 1823, há notícias de que lá se produz farinha de mandioca, arroz, café e aguardente, revelando que a ativi- dade diversificou-se (Censo de 1823). Data de 1875, ainda segundo Meurs a passagem de Joaquim Floriano de Toledo para João Floriano Martins de Toledo (Costa e Silva, 1973, V), que ao morrer em 1881 21
  • 22. passa a propriedade para seus herdeiros. Em 1943, a propriedade passa então para Octávio Ribeiro de Araújo, que doa para a USP em 1958. A Plataforma Sophia com certeza permitirá a atividade sistemática de obtenção de dados, relações e nexos, ampliando-se em muito a capacidade de se inquirir e reconstruir o passado. Já a Base Avançada de Cultura e Extensão Universitária sediará conjunto de pesquisas em inúme- ras áreas para se avançar no entendimento do que podemos almejar a partir desta plataforma. De que Engenho se fala? Os escravos são as mãos e os pés do senhor do engenho, porque sem eles no Brasil não é possível fazer, conservar e aumentar fazenda, nem ter engenho corrente. E do modo com que se há com eles, depende tê-los bons ou maus para o serviço. Por isso, é necessário comprar cada ano algumas peças e reparti-las pelos partidos, roças, serrarias e barcas. E porque comumente são de nações diversas, e uns mais boçais que outros e de forças muito diferentes, se há de fazer a repartição com reparos e não às cegas. Os que vêm para o Brasil são ardas, minas, congos, de São Tomé, de Angola, de Cabo Verde e, alguns de Moçambique, que vêm das naus das Índias. João Antônio Andreoni (Antonil) Cultura e opulência do Brasil (1711). A História firmada em dados e fatos muito se preocupa com primazias, gerando prolongadas disputas, da que daremos uma pálida visão, pois questões sobre poder e territorialidade acerca do bem cultural constituem um acervo muito mais relevante. Con- tudo, há consenso entre os autores sobre o fato de que Martim Afonso de Sousa, ao aportar em São Vicente, distribuiu terras para alguns nobres de famílias que também o acompanharam, tendo sido já objeto de muitos documentos sobre o tema. Cabe lem- brar que recebera amplos poderes do Rei Dom João III e aportou com vários nobres e enorme tripulação, no ano de 1532. 22
  • 23. Encontram-se entre as famílias nobres beneficiadas por doação das terras do pri- meiro donatário luso, a dos Góis (em que erigem o Engenho Madre de Deus), a família Adorno (o de São João, no Ribeirão de São Jerônimo, no Morro do Fontana), a de Pinto (local em que seria plantada a cana para seu próprio engenho), bem como com membros da tripulação; assim o de São Jorge seria em parceria com o piloto Vicente Gonçalves, João Veniste9 e Francisco Lobo. O Livro de Registro de Sesmarias, em seu título 1555, às páginas 42, 61 e 84 confirma e embasa de que o primeiro engenho mandado erigir por Martim Afonso de Sousa foi dedicado por vocação a São Jorge (Leme, 1929: 67). Outros documentos sempre citados dão conta que em 1550, com a morte de Rui Pinto, os herdeiros venderam em Lisboa por escritura pública firmada em 18 de junho de 1550 as terras para o banqueiro e comerciante de minas estabelecido na Antuérpia, Erasmus Schetz em parceria com o próprio Veniste. Já na primeira edição de História do Brasil, de Francisco Adolfo Varnhagen menciona que se trata de um técnico na construção de moinhos hidráulicos (Oberacker Jr., 1968: 62-3). Escritores Setecentistas mencionam a existência do bem, defendendo a hipótese de que o Engenho São Jorge dos Erasmos seria o primeiro, entre os engenhos de cana de açúcar criados por Martim Afonso de Sousa. Entre estes relatos cabe mencio- nar o de Pedro Taques de Almeida Paes Leme (1714-77), em História da Capitania de São Vicente, editada em 1772, afirma que “Martim Afonso de Sousa (...) estabeleceu o primeiro engenho de açúcar que houve em todo o Brasil, com vocação de São Jorge” (Leme, 1929:66-7). Outro reiterativo foi o do monge beneditino Frei Gaspar da Madre de Deus (1715-1800), que em sua obra Memórias para a História da Capitania de São Vicente, publicada em 1797, alude da mesma forma ao fato (Madre de Deus, 1975: 84). Diferentemente, será no século XIX que o renomado historiador Manuel Eufrásio de Azevedo Marques, em Apontamentos históricos..., irá trazer outra hipótese seqüencial 23
  • 24. para a edificação de engenhos no Brasil, julgando ser o primeiro o de Pedro de Góis, ou seja, o Engenho Madre de Deus (Marques, 1879, v. 2: 100-1). Segue tal ordem o trabalho de Francisco de Assis Carvalho Franco, em Os 32 Companheiros de Martim Afonso e a Cidade de São Paulo (1958) de que o primeiro engenho seria o Madre de Deus (Franco, 1958: 677). Francisco Martins dos Santos, autor da significativa obra História de Santos (1937), implementa raciocínio que merece ser acompanhado, pois já em ofício à Câmara dos Vereadores de Santos, após cobrar medidas para a proteção das ruínas, em 27 de março de 1950, resolve datar os engenhos na Baixada Santista: 1532 – Engenho de Madre de Deus, no Morro das Neves; 1533, o de São João, na atual Praça Rui Barbosa; 1534 - o de São Jorge dos Erasmos, entre outros. Quando após sua morte resolve-se editar segunda edição de História de Santos reuniram-se “Monografias do autor” (1986), incluindo-se um estudo específico sobre Fundação e Desenvolvimento do Engenho de S. Jorge dos Erasmos, acrescida de estudos do coordenador da edição em uma terceira parte, como bem este distingue a própria contribuição. Nesta monografia há uma inversão, pois, se refere como primeiro engenho, datando-o de 1532-3, o dos Adornos (São João), o de São Jorge em 1534-5, logo o segundo e o terceiro o Madre de Deus, no sítio Nossa Senhora, das Neves, em 1546 (Santos, 1986: 350). Fundamenta-se no fato de que apenas em 1534 o donatário recebe efetivamente a doação da Capitânia de São Vicente, outorgada pelo Rei. “(...) e quando Johan van Hielst (holandês) (e não João Veniste), representante de Erasmo Schetz em Lisboa, veio para S. Vicente para assumir o seu lugar na sociedade feita e dar início à indústria (...) Em 1544, terminado o Governo de Cristóvão Aguiar de Altero, voltou este fidalgo a Portugal e, ali, com a presença de Johan Van Hielst, repre- sentante dos Armadores holandeses foi feita a venda de quinhões de Martim Afonso, Pero Lobo e Vicente Gonçalves, e ERASMOS SCHETZ, banqueiro e Armador de 24
  • 25. Amsterdam, os quais, somados aos de Van Hielst deram a esse Erasmo Schetz a propriedade total do Engenho de S. Vicente, o qual, dali em diante, passaria a ser conhecido como ENGENHO DOS ERASMOS, OU DE SÃO JORGE DOS ERASMOS(...) ” (Santos, 1986: 349). A primeira pergunta seria – qual a base documental para a afirmação sobre a data da chegada de Van Hielst e a venda do quinhão de Sousa para Erasmus Schetz? A outra também significativa é saber por que o donatário, a quem se atribui a introdução da lavoura da cana, não se beneficia em primeiro lugar de tal cultura, importantíssima na época, concedendo tal primazia a outro, mais ainda subordinado, antes mesmo de serem efetivadas suas posses por D. João III? Desvelar e vivificar Alguém conseguiu levantar o véu da deusa [Isis] em Saïs. Mas o que foi que viu? Viu – maravilha das maravilhas - a si próprio! Novalis. “Le disciples a Saïs” (1798). Impressiona investigar em livros, periódicos e documentos, em particular nos pro- cessos da Universidade de São Paulo e dos órgãos preservacionistas, constatando- se quantas vezes já se fizeram esforços, visando acolher e disseminar o bem cultural. Assemelha-se a Isis, a divindade egípcia, inconformada buscando Osíris, seu marido assassinado pelo irmão, que embarca em desesperadoras viagens para, após encontrá- lo, devolver-lhe a vida (Brunel, 1998:498-503). As iniciativas parecem andar em dois pólos: de uma parte, há esforços para acolher – hipóteses, soluções, projetos, rema- nescentes, documentos, depoimentos, pesquisas em inúmeras áreas, cuidados junto ao entorno e ao próprio bem cultural. 25
  • 26. Contudo, a Isis, igualmente se associa à invenção da língua e da escrita (Brunel, 1998: 500), lado este ligado à disseminação do saber. No caso das Ruínas, este lado aparece via a geração monumental, formada por conjunto de atos procurando a extroversão em – visitas escolares programadas, difusão da prática arqueológica, apre- sentação em congressos, simpósios, encontros internos e fóruns públicos; há também outro segmento amplo reunindo dados, cartas, recibos, documentos e interpretações depositados em publicações, desde o pioneiro livro do professor José Pedro Leite Cordeiro, em 1945, sob o título “O Engenho São Jorge dos Erasmos”, como também em anais, periódicos e livros, enfim todo um esforço investigativo, para suspensão do mito fundador – seria o Engenho São Jorge o primeiro, o segundo ou o terceiro funda- do entre nós? Os esforços são, em minha opinião, cumulativos e muitos sonhos hoje já passam para o livro das realizações. Entre estes, um vislumbrado há dez anos, veio à luz, vivificado com grande humanidade, porquanto as Ruínas possuem competentes edu- cadores, contratados por meio de processo seletivo público e, mais, capazes de ela- borar um plano conceitual, a Plataforma Sophia. A Plataforma Sophia constitui-se num ancoradouro direcionado ao porvir, de modo a abrigar inúmeras iniciativas direcionadas ao público em geral, a aquele escolar, nos diferentes âmbitos, incluindo-se os que demandam atendimento especial. Sintetiza um programa dentro daquilo que uma uni- versidade pública e de qualidade pode almejar – trocar com a comunidade, trazer o aprendizado para suas pesquisas e ações educacionais, assim cumprindo aspectos exaltáveis de sua missão, graças ao reconhecimento de importantes parceiros para potencializar rumos educacionais. O fato auspicioso enseja rememoração de alguns aspectos destacáveis em sua história plena de lutas, realizada no último decênio (1995-2005). Ressalte-se o papel estelar da direção da USP e da Pró-Reitoria, em todos os escalões, sem os quais nada disso estaria concretizado, bem como o do atual Centro de Preservação Cultural (CPC), 26
  • 27. então Comissão de Patrimônio Cultural. Convidada, em outubro de 1995, pelo então Pró-Reitor de Cultura e Extensão Universitária, Prof. Jacques Marcovitch, para exarar um Plano Gestor, destinado a então denominada Comissão do Patrimônio Cultural (CPC), eu pude perceber que já haviam sido criadas inúmeras iniciativas e comissões para vivificar este fantástico legado Quinhentista. A tentativa de sonhar um sonho complexo e para o qual chegava após vivências incomuns, entre as quais posso expressar o de dirigir o mais antigo museu do Estado de São Paulo, a Pinacoteca do Estado, levou-me a aceitar o desafio. Propus um projeto fundado no conceito que denominei - uso qualificado, envolvendo uma série de aspec- tos, na tentativa de pensar uma rede de ações cotidianas e conjugadas, que resultas- sem em uma utilização distinta, compartilhada e enraizada dos bens culturais da USP, que fizesse do patrimônio um bem cultural, ou seja, compartilhado por grandes seg- mentos, dentro e fora da Universidade. Em síntese com base nos documentos poderia assim resumir, como deixei assi- nalada em minha carta de despedida para os funcionários e colaboradores: Ações pontuais e coligadas compreenderam: 1) o levantamento de dados, a análise, a formulação de estratégias e de recomendações sobre a utilização de acervos; 2) ampliação de acervos materiais, quantitativamente significativa e res- ponsável; 3) a prestação de serviço informacional sobre o patrimônio cultural da USP; 4) a identificação do que precisa ter seu uso qualificado; 5) o estabelecimen- to de critérios compartilhados com os distintos segmentos, seja da comunidade uspiana, seja a externa; 6) a extensão do conceito de patrimônio cultural, evitando- se transformá-lo em apenas jóias contemplativas; 7) a atuação junto ao público e aos órgãos envolvidos com o patrimônio cultural, praticadas nas diversas inter- venções de conservação e de restauro de bens; 8) a busca de verbas para ne- cessidades emergenciais; 9) a participação e a proposição de grupos formuladores 27
  • 28. de recomendações e de práticas preservacionistas, formuladas em todas as eta- pas de tal processo, entre as quais – abrigo, conservação, documentação, estu- do, interpretação, divulgação e extroversão, especialmente criada para distintos segmentos etários e sociais. O Colegiado CPC analisou e acolheu o Projeto, para as Ruínas e os demais bens, tendo papel decisivo na consecução das primeiras medidas preservacionistas. Quanto ao Engenho, a primeira etapa pensada voltou-se à questão deste passar a ser adminis- trado pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, dada a iminência das obras de conservação e integridade, que então demandavam, passando-se para mim, na condição de coordenadora, o encaminhamento junto à Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas/ USP. Associei-me de imediato com a Comissão do Engenho, existente e centralizada na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas/ USP para acompanhar, discutir e apoiar as iniciativas, tendo já esta, como membro externa, a Profa. Wilma Terezinha F. de Andrade, professora de uma geração de historiadores santistas. Contudo, nas reuni- ões, visitas e conversas da CPC, um dos membros, antes já envolvido com as Ruínas e também coordenador da CPC, o Prof. José Sebastião Witter, sempre insistia muito na necessidade em ser nomeado um gestor, com o qual deveríamos dialogar, sendo suas sugestões muito enfáticas. Atendendo à solicitação, o colegiado da CPC propôs a formação de uma comis- são para discutir as sugestões, aferir as hierarquias e elaborar diagnóstico sobre o rumo de uma série de intervenções imediatas, encaminhando o pleito ao Pró-Reitor, agora o Prof. Adilson Avansi de Abreu. Formulou em 8 de maio de 1998 uma Portaria convocando o próprio Prof. Witter, junto com o Prof. Júlio Roberto Katinsky e o Prof. José Bueno Conti com as seguintes atribuições: 28
  • 29. I- disponibilizar para o público o Engenho São Jorge dos Erasmos em 21 de abril de 2000, dentro dos padrões acadêmicos voltados à pesquisa, docência e exten- são cultural; II- dispor sobre o gerenciamento do bem em exame de modo a concretizar o item anterior; III- estabelecer a destinação do legado arqueológico; IV- garantir a continuidade da pesquisa nas diversas áreas concernentes ao mes- mo; V- estabelecer o relacionamento técnico-administrativo com as instâncias das es- feras, municipal, estadual e federal. Este grupo de notáveis sensibilizou-se muito ante a necessidade premente em se refazer toda a cobertura de telha, traçar um conjunto de medidas para garantir a ameaçada integridade das crianças da escola situada na lateral e do bem, resolver problemas de invasão no morro contíguo e posterior ao bem cultural, julgando indispensável que houvesse a figura de um único gestor, subordinado à CPC, sugerindo ao Pró-reitor o Prof. Júlio Roberto Katinsky, o que foi decisivo para que a pauta proposta fosse integral- mente cumprida. Reitero o que assinalei anteriormente, ao apresentar um Plano Gestor para as Ruínas, relativas ao período 2002-6: Inúmeros esforços foram implementados nos últimos anos pela USP, em especial na atualidade graças à atuação do Gestor Prof. Júlio Katinsky. Entre as inúmeras ações do Gestor, destacaria, em primeiro lugar o respeito e a generosi- dade em acolher a propor. Igualmente proveu significativo trabalho de consolida- ção, conservação e restauro, coibindo riscos iminentes nas Ruínas e no Pavilhão Saia, o convite a colegas para atuação nas questões da pesquisa, prospecção e escavações arqueológicas, sempre debatidas no Colegiado da CPC e na Pró- Reitoria de Cultura e Extensão Universitária. 29
  • 30. Mestre engajado, não se desviou da desejada troca de opiniões, estando atento ante projetos educacionais, a ampliação e organização da participação da comunidade local e uspiana, o levantamento de arquivos e iniciativas para tradu- ção de material inédito, o estágio para estudantes no âmbito da Graduação, a realização da maquete com os estudantes, sempre mantendo contatos sistemáti- cos com órgãos preservacionistas, realizando trabalhos de conservação no Pavi- lhão Saia, reunindo, em edição, debates e pareceres sobre o caminho para perenizar o Engenho e, também, criando estudo para a consecução da Base Avançada de Apoio à Cultura e Extensão, na Baixada Santista, aprovado pelas instâncias competentes. O bem cultural tem sido alvo de valiosos projetos com viso educacional e, agora, os educadores planejam uma plataforma do saber, cabendo-me a honrosa tarefa de versar sobre tal iniciativa. Acredito que ações educacionais precisam partir da troca, para serem de fato uma atividade extensionista significativa, ou seja, totalmente aparta- da de vínculos assistencialistas, daí o interesse em expor inicialmente o porquê de se implementar a Plataforma Sophia. O foco principal se encontra direcionado a articular, junto com a comunidade envoltória, atividades, oficinas e contato distinto para segmen- tos diferenciados, tanto em interesses e motivações, quanto em condições sócio-edu- cacionais e etárias. A Universidade de São Paulo, assim, pode vislumbrar intercâmbio frutífero com uma enorme gama de público. Atuantes desde agosto de 2004, os educadores pro- põem programas especialmente projetados, desta forma olhando as especificidades e fundamentando-os em valores, generosos, plurais e identitários, sonhando chegar a disseminar, sob forma participativa, o mais antigo remanescente material, entre os pio- neiros engenhos de cana de açúcar, se considerar-mos que foi implantado quando da chegada a São Vicente de Martim Afonso de Sousa, em 1532. Ciça, Primavera, 2005. 30
  • 31. Notas 1 - Professora Titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo/USP e Presidente do Conselho Curador das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. 2 - A Plataforma de projetos interdisciplinares leva este nome em virtude da abrangência que pretende dar às diversas áreas do conhecimento. Sophia: palavra grega que significa saber. 3 - LOURENÇO, Maria Cecília França. Enredos e segredos. In: Revista de Cultura e Extensão- USP (O): 62-73. jul.-dez 2005. 4 - Uma dessas histórias, sempre lembradas, foi elaborada pelo então diretor do Museu Histórico Nacional, o polêmico Gustavo Barroso, muito preocupado com a conservação das tradições judaico-cristãs, refere-se ao fato de que o assalto de Cavendish, “não fora cometido pelo Natal, que os ingleses respeitam e celebram tradicional- mente; porque em 1591 já haviam os portugueses adotado o calendário da chamada Reforma Gregoriana e, enquanto para eles na Inglaterra) era ainda no dia 15, para os portugueses (de Santos) já era o dia 25 (de natal). (www..novomilênio.inf.br.em 21 jul. 2005} 5 - Entre as primeiras fontes, citadas pelo estudo de Carl Laga, abordando a dada de morte, seria a de F. Donnet, em1892, Notice historique et statistique sur lê raffinage et lês raffineries de Sucre à Anvers. In: LAGA, Carl. O Engenho dos Erasmos em São Vicente; resultado de pesquisas em arquivos belgas. Estudos Históricos (1):16, Marília, 1963 Em 1943. Sommer alude ao Almanaque de Gotha de 1897, segundo o qual a origem da família descenderia de Bernard de Schetzenbergue, que viveu em 1308 e acrescenta que teria falecido em 30 de maio de 1550. SOMMER, F. Os Schetz da Antuérpia e de S. Vicente. Revista do Arquivo Municipal (XCIII): 80, out.- dez.1943 Ainda na atualidade registra a mesma informação em http:genealogy.euweb.cz/ursel em 16 jul. 2005. 6 - http://users.telenet.be/henk.coolen/genealogie em 15 jul. 2005. 7 - ANCHIETA, José de, S. J. Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1933, p.265. Transcrito também In: http:/purl.pt/155/1/ em 20 jul. 2005 8 - http://users.telenet.be/henk.coolen/genealogie em 11 jul. 2005 9 - A figura de Veniste tem dado margem a uma série de especulações, pois na célebre viagem de Ulrico Schmidl de Straubing, em 1534, relatadas no texto Derrotero y viaje a españa y las Índias, quando no capítulo 51 revela que oito dias antes de partir de volta de viagem para seu país obteve notícias da chegada de Portugal de um barco de Johan van Hielst, um comerciante e administrador de Erasmus Schetz (www. usuanos. lycos.es em 14 jul. 2005). 31
  • 32. Bibliografia Citada ANCHIETA, José de, S. J. Cartas, informações, fragmentos históricos e sermões. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1933. ANDREONI, João Antônio (Antonil). Cultura e opulência do Brasil. São Paulo: Nacional, 1967, 2v.. BATAILLON, Marcel. Erasmo y Espana: estúdios sobre la historia espiritual del siglo XVI.. México FCE,1950 (original em francês de 1937). CALIXTO, Benedito. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, (XXI):90- 302, 1924. BRUNEL, Pierre. Dicionário de mitos literários. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998. CORTESÃO, Jaime. Pauliceae lusitana monumenta histórica. Lisboa:Real Gabinete Por- tuguês de Leitura, 1956. COSTA E SILVA SOBRINHO. Martim Afonso de Sousa e o Engenho São Jorge dos Erasmos. 5 artigos. A Tribuna Santos 12 e 21 de agosto, 11 de setembro, 16 e 30 de outubro de 1973. FRANCO, Francisco de Assis Carvalho. Os capitães-mores vicentinos. Revista do Ar- quivo Municipal, São Paulo (LXV): 27-108, março, 1940. ———— Os 32 companheiros de Martim Afonso e a cidade de São Paulo.In. Ensaios paulistas. São Paulo: Anhembi, 1958, 670-707. LAGA, Carl. O Engenho dos Erasmos em São Vicente; resultado de pesquisas em arquivos belgas. Estudos Históricos (1): 13-, Marília, 1963 LEME, Pedro Taques de Almeida Paes. História da Capitania de São Vicente: com um escorço biográfico do autor por Affonso de E. Taunay. São Paulo: Melhoramentos, 1929. [edição original de 1772]. MADRE DE DEUS, Frei Gaspar da. Memórias para a História da Capitania de São Vicente.. Belo Horizonte: Itatiaia/ São Paulo: Edusp, 1975. [1a. publicação: 1797] MARQUES, Manoel Eufrásio de Azevedo. Apontamentos: Históricos, Geográficos, Bio- 32
  • 33. gráficos, estatísticos e Noticiosos da Província de São Paulo, seguidos de cronologia dos acontecimentos mais notáveis desde a fundação da Capitania de São Vicente até o ano de 1876. Rio de Janeiro: Universal, 1879, 2v. MEURS, Paul. Engenho São Jorge dos Erasmos, Santos Preservation Studies. São Paulo: CPC, 1990 (inédito). OBERACKER JR. Carlos H. A contribuição teuta à formação da nação brasileira. Rio de Janeiro: Presença, 1968. RIBEIRO, Darcy & Moreira Neto, Carlos. A fundação do Brasil: testemunhos, 1500-1700. Petrópolis, Vozes, 1992. SANTOS, Francisco Martins dos. História de Santos. 2 ed.. Santos: Caudex, 1986 (1ª. edição 1937). SOMMER, F. Os Schetz da Antuérpia e de S. Vicente. Revista do Arquivo Municipal (XCIII): 75-86, out.- dez.1943 STOLS, Eddy. Um dos primeiros documentos sobre sobre o engenho dos Schetz em São Vicente. Revista de História (37): 407-19, 1968. TRINDADE, Jaelson Britan. Engenho São Jorge dos Erasmos (Ruínas do) Relatório SPHAN, São Paulo 9.3.1983 (inédito). Referências Webgráficas www..novomilênio.inf.br www. usuanos. lycos.es http:genealogy.euweb.cz/ursel http://users.telenet.be/henk.coolen/genealogie http:/purl.pt/155 33
  • 34. Ancoradouro de Potenciais Educativos O uso qualificado de bens culturais e a sua conseqüente preservação constituem- se em grandes desafios para governos e comunidades neste início de século. Somen- te ações baseadas em conhecimentos interdisciplinares podem nortear projetos edu- cacionais necessários a tal preservação e à valorização destes bens. Com efeito, as universidades destacam-se na sociedade contemporânea por formarem profissionais atuantes em diversificados segmentos seja criando, orientando, decidindo ou execu- tando trabalhos que influenciem a sociedade, questionando o senso comum das repre- sentações sociais, levando-as à criticidade. Acompanhando esta tendência, a Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da USP vem ampliar as perspectivas de trabalho junto às Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, em Santos-SP, implementando ações que privilegiem a atuação educativa. O conjunto aqui proposto, pela gestão das Ruínas e pelos educadores da Universidade de São Paulo, direciona-se para criação de uma plataforma de atividades que busque congregar diversos projetos educacionais tendo como locus de atuação a área das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos e a confluência de suas transformações históricas, sociais e ambientais. Assim surge a Plataforma Sophia como uma proposta que visa privilegiar a inves- tigação de novos enfoques incentivando, simultaneamente, a especialização e o aprofundamento característicos do conhecimento científico. Sua relevância sinaliza a dinâmica de uma postura conjugada que propõe discussões acerca dos elementos constituintes da memória em face das problemáticas, anseios e buscas de nossa soci- edade. A área onde estão situadas as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos expressa um dos testemunhos mais antigos da história do Brasil quinhentista, fator de incentivo a 34
  • 35. diversos projetos acadêmicos e educacionais. Neste sentido, a amplitude dos traba- lhos previstos na Plataforma Sophia permite o aprimoramento em diversificadas áreas do saber de maneira interdisciplinar. Embora seja este um conceito bastante decantado, mas pouco assimilado, a interdisciplinaridade vem sendo foco, cada vez mais da atenção de programas educa- cionais. A interdisciplinaridade é uma categoria de ação. Trata-se de uma atitude, sem a qual o conhecimento perde sua relevância mais essencial: a de responder a questões do presente. A iniciativa baseada na interdisciplinaridade possibilita assumir o uso qua- lificado deste espaço, conjugando novos conhecimentos em prol do benefício comum. Para além desta pretensão, a Plataforma busca aproximar as diversas áreas do saber a partir da proposição de projetos educacionais coligados a visitas curriculares programadas conjuntamente. Assim, educadores das Ruínas, professores e comunida- de escolar planejam conjuntamente os projetos e os planos curriculares a serem intro- duzidos nas discussões, estabelecendo uma inter-relação promissora e saudável para todos os integrantes. Elemento de interação significativo, a presença dos educadores da Universidade de São Paulo nas Ruínas objetiva permitir a integração entre o bem cultural e a comuni- dade docente, que de certa maneira vinha (antes da criação e implementação da Plata- forma Sophia) corroborando a impressão equivocada da comunidade de que se tratava de um terreno propício apenas à manutenção do abandono e de fantasiosas lendas. A Plataforma busca ampliar os horizontes referentes ao conhecimento do que foi, é e do de pode vir a se tornar este bem cultural, servindo de base para que sejam implementados programas que tenham como foco de ação interpretações sobre os silenciamentos destas ruínas centenárias. 35
  • 36. Para tanto, propõe a criação de atividades educacionais fundamentadas nas voca- ções das Ruínas expostas e aprovadas no seu Plano Gestor, a saber: · Oficina Permanente de Resistência: esforço sistemático e continuado para a sus- pensão e conscientização sobre os silenciamentos relativos aos caminhos vividos na longa história das Ruínas. · Laboratório para Eternização de Valores: construção crítica de significados e constante reavaliação desses conceitos, confrontando e revendo valores. · Sítio Permanente de Proteção: vocação preservacionista das inúmeras áreas, que visam garantir a proteção das Ruínas e de seu envoltório, protegendo-os de fatores adversos. · Bem Cultural de Germinação: elaboração de programas para intercâmbio capa- zes de germinar posturas distintas, em face da responsabilidade de todos na preserva- ção de espaços de memória como as Ruínas. Em síntese, o local serviria para experimentação, estudos e práticas conjuntas, além de cenário para eventos que promovam o intercâmbio entre o conhecimento pro- duzido nas universidades e a comunidade. 36
  • 37.
  • 38. Matriz didático-pedagógica Sem sedução, não há educação! A construção desta só se efetiva por meio das sensibilidades individuais Ressaltadas e respeitadas a partir de um coletivo (...) Consiste nisto a boniteza da educação! Paulo Freire Interessa-nos particularmente as idéias de Vygotsky e Piaget, segundo as quais a aprendizagem gera autonomia e desenvolvimento. O autor russo, defensor de uma pedagogia conhecida como sócio-interacionismo, porque previa a interação entre os sujeitos e a sociedade, afirma que uma criança, se puder aprender com auxílio de outras pessoas que têm objetivos comuns, terá um ritmo de desenvolvimento mais acelerado em comparação a outra que aprende sozinha. Por outro lado, Jean Piaget, idealizador do construtivismo, parte da premissa que o sujeito constrói o conhecimento junto com seu professor, colegas e sociedade na qual está inserido, numa nova inter- pretação do mundo físico e social. Ambos os autores percebem a relação ensino- aprendizagem como uma constante troca entre as inspirações do sujeito e os elemen- tos da sociedade. Portanto, o conceito de saber, aprendizagem e inteligência tornam- se bem mais complexos. Atualmente o conceito de inteligência tem mudado sensivelmente. Idéias solitári- as, soluções individualistas, inteligência setorizada tornaram-se potencialidades obso- letas. Ganha espaço o que vem sendo preconizado por estudiosos liderados por Howad Gardner (uma grande equipe da Universidade de Harvard): o ser-humano é dotado de inteligências múltiplas, manifestando preferências e utilizando, portanto, formas diferen- tes de compreender e expressar o mundo. Os estímulos diversos são, mais do que nunca, vistos como o “alimento” das inteligências. 38
  • 39. Um outro tipo de inteligência, coletiva, emocional e mais complexa tem sido cada vez mais estudado. Trata-se da pedagogia que vê no lúdico e não na competitividade a solução para um desenvolvimento psico-social mais autônomo. Como suporte desta original proposta os jogos cooperativos incentivam as potencialidades coletivas sem menosprezar as individualidades. Os jogos cooperativos são a união entre a coopera- ção e a autonomia, processo que potencializa a aprendizagem baseada no respeito, no agir com o outro e na capacidade de cooperar e redescobrir a solidariedade, tendo como estímulo a constante motivação para o conhecimento. A proposta pedagógica norteadora dos projetos educacionais inseridos na Plata- forma Sophia pretende tratar os elementos formadores do complexo das Ruínas Enge- nho São Jorge dos Erasmos como algo que possibilite ao estudante dois princípios básicos: a) estimular a construção de sua identidade, incentivando o sentimento de pertencimento deste frente ao patrimônio cultural (uma vez membro da sociedade, deve- se preservar e zelar pela manutenção de sua história e do meio em que vive); b) sinalizar para este aluno a necessidade de se preservar a sensibilidade coletiva, sem desprezar a identidade individual despertando neste o senso crítico e a postura ética. Identificar, preservar, valorizar e transmitir conhecimento são, portanto, ações que fazem da Plataforma Sophia um porto seguro para as ações educacionais preocupadas em qualificar o conhecimento levando em consideração a autonomia daquele que de- seja conhecer. No quadro das preocupações mais legítimas dos projetos inseridos nesta Plata- forma insere-se a necessidade de se compreender a relação entre o patrimônio natural e histórico numa dupla abrangência: local/global (proposta baseada nos Parâmetros Curriculares), correlação fundamental para se apreender os elementos de identificação do processo de gestão ambiental, cultural e histórica das Ruínas. 39
  • 40. Em contato com esta premissa básica (educar para conhecer) a comunidade esti- mula-se a preservar, conscientizando-se da importância de seu papel na perenidade do bem cultural. A conservação deste patrimônio deve ser pensada, portanto, segundo um esquema de preservação em larga escala (Ruínas e adjacências). Isto assegura a não deturpação de seus significados históricos, uma vez que a conservação e preser- vação rompem as fronteiras limítrofes da cultura material para abranger a comunidade em que está inserido. Tais elementos sustentam a relevância e a abrangência desta Plataforma que tem em andamento programas educacionais que merecem destaque. O projeto VouVolto O carro chefe destas ações educativas é o já bem sucedido projeto VouVolto. Idealizado pela Profª Drª Maria Cecília França Lourenço, Presidente do Conselho Curador das Ruínas, o VouVolto caracteriza-se pela manutenção e qualificação do espaço em questão por meio de atuações pedagógicas conjuntas entre os professores das redes de ensino municipal e estadual e os educadores das Ruínas. Este projeto busca, através da interdisciplinaridade e baseado em técnicas de educação histórico-ambiental formal e informal, influenciar o domínio afetivo dos visitan- tes, seus valores e interesses, tendo como meta final a mudança de atitudes destas pessoas com relação ao uso do bem cultural. O público preferencial deste projeto é o atendido pelas escolas públicas dos municípios de Santos e São Vicente, bem como o alunado de toda a rede pública estadual de ensino. A metodologia de atuação utilizada pelos educadores prevê que os professores das redes de educação conheçam as Ruínas anteriormente à vinda dos alunos, o que caracteriza um avanço pedagógico, uma vez que o docente não prepara seu roteiro ou plano de aula sozinho, mas em conjunto com os educadores. 40
  • 41. Esta é a fase em que as impressões dos docentes com relação às Ruínas possi- bilitam a construção de um plano de visitas que leve em consideração o planejamento e os conteúdos discutidos pelo professor caracterizando assim uma visita personaliza- da. Nesta visita técnica o professor (no papel de especialista da educação) conhece as Ruínas, o projeto, o roteiro da visita monitorada (que congrega determinados conteú- dos, estruturas adequadas à realidade dos alunos, seqüência e forma de apresentação das atividades, estímulos e meios a serem utilizados), bem como o Manual do Profes- sor - elaborado pela equipe de educadores - e o material de apoio disponibilizado. A partir daí terá elementos suficientes para elaborar um Plano de Estudos. Partindo do pressuposto de que a improvisação é uma terrível inimiga da aprendizagem, este insere a data da visita com seus alunos no Plano de Curso em andamento na escola, planejando as atividades de ensino-aprendizagem, que serão desenvolvidas em sala de aula, antes da visita. A segunda etapa deste processo é a visitação dos alunos propriamente dita. O VouVolto prevê visitas monitoradas em cinco dias da semana (incluindo sábados e domingos), com duração média de duas horas e meia. Após a recepção, os alunos se reúnem na edificação principal para receber as primeiras orientações. Neste ponto, a turma será dividida em dois grupos, cada um ficando com um educador, respectiva- mente nas partes alta e baixa da planta do engenho. As explicações ocorrem de maneira simultânea e paralela (com previsão de uma hora) segundo o procedimento de atuação/explicação de cada educador. Acompanha- dos dos educadores e de seu professor os alunos são sensibilizados a participarem das discussões levando em consideração seus conhecimentos prévios sobre o con- teúdo discutido. Após a primeira parte da visita os educadores trocam de turmas o que possibilita que todos tenham as duas monitorias (sócio-histórica e ambiental). Ao térmi- no da visita os alunos são sensibilizados a voltarem em outras ocasiões, para que possam junto aos seus parentes e amigos demonstrarem o que foi apreendido na visita com a escola. 41
  • 42. A monitoria integrada: questões relevantes, respostas em aberto A visita monitorada tem como foco de suas discussões a análise de uma “Linha do tempo da utilização da cana de açúcar pelo ser humano” e a explanação sobre alguns fatos históricos referentes às Ruínas Engenho, inserindo tais informações num amplo debate sobre a criação e manutenção do primeiro grande ciclo econômico nacional: o ciclo do açúcar dos séculos XVI e XVII. Este instrumento pretende evidenciar a relação existente entre as necessidades humanas e a utilização (plantio, produção e beneficiamento) da cana de açúcar ao longo do tempo. O objetivo é enfocar como, a partir de quando e com qual intuito a cana-de-açúcar foi introduzida no cotidiano huma- no. A partir deste mote são discutidos os seguintes elementos: a) a origem da planta: expansão do plantio no mundo até sua chegada ao Brasil. Nesta etapa, evidenciam-se os apontamentos histórico-sociais da cultura canavieira, tais como a vivência e sociabilidade do ser humano com o lido da cana de açúcar enfocando como os diferentes sujeitos (produtores e consumidores) viam e vêem a cana, seus produtos e subprodutos. Paralelamente a esta preocupação também são enfocadas informações ambientais e econômicas que permitam uma maior percepção dos elementos vinculados ao complexo canavieiro: como se dava a interação ambiental entre a vegetação nativa e a cultura canavieira; qual o impacto da produção em escala desta cultura no meio nativo, dentre outras questões. b) Histórico da indústria canavieira brasileira e paulista em especial, cujo enfoque central é a construção do Engenho São Jorge dos Erasmos – hoje, Ruínas. Pre- tende-se evidenciar os elementos que deram vida a este complexo engenho apontando seus mais significativos marcos histórico-temporais, bem como enfocar a relação entre a implantação da cultura canavieira e a transformação das relações sócio-culturais da sociedade colonial. 42
  • 43. c) Percepção atual das Ruínas: enfocar a necessidade da preservação como agen- te de criação de uma identidade (sociedade/ Ruínas). Por que preservar? Como preservar? A monitoria sócio-histórica termina propondo questionamentos sobre a relevância histórica de se ter nos “quintais” da cidade um bem cultural tão especi- al. Paralelamente às questões histórico-sociais vinculadas ao universo canavieiro, o desenvolvimento da monitoria ambiental utiliza como estratégias a interpretação da na- tureza e dinâmicas de grupo. Na primeira há o propósito de caracterizar o ambiente biofísico, os fenômenos que nele ocorrem e os relacionamentos perceptíveis entre a vida das plantas e dos animais que estão presentes nas proximidades. Utiliza-se como laboratório, portanto, o metabolismo de locais onde a visualização do meio ambiente, muitas vezes confundido com a natureza, se mostra plenamente identificável, sem focar apenas características ímpares e sim também aquilo que ocorre naturalmente, como a adaptação de certas epífitas e a sucessão vegetal. A dinâmica de grupo é o momento para estimular o emprego de todos os sentidos a fim de despertar a curiosidade e o espírito de observação dos alunos para construir conceitos a respeito da diversidade biológica presente nas Florestas Tropicais e em sua representante local, a mata atlântica. Durante a caminhada até a grande árvore sediada na parte baixa da planta das Ruínas os alunos serão motivados a experimentar uma aproximação com o ambiente, exercitando sua percepção dos detalhes e relacionando tais descobertas com as infor- mações novas e/ou já existentes a respeito do ecossistema mata atlântica (espécies nativas e exóticas, relações ecológicas, desmatamento versus conservação dos recur- sos naturais, os ciclos das águas, a erosão do solo, populações tradicionais etc.). 43
  • 44. Esta monitoria visa o desenvolvimento de habilidades e atitudes necessárias para entender e apreciar as inter-relações entre o homem, sua cultura e seu ambiente envoltório (o uso prático da natureza, o sentido mítico e místico da natureza, a vitalidade individual ou coletiva perante a natureza). Com efeito, os instrumentos previstos nesta monitoria integrada (interdisciplinar por princípio) atuam como alicerces para a solidificação de novos valores que ajudam a preservar o testemunho e a memória coletiva. Laboratório de Memórias: em busca de uma memória coletiva Outro programa educacional atrelado à Plataforma Sophia tem por objetivo regis- trar fragmentos de memória de moradores da comunidade circunvizinha às Ruínas En- genho São Jorge dos Erasmos e que tenham como cenário de lembranças o terreno do bem cultural propriamente dito. O esvaziamento contemporâneo do espaço público, como cenário em que ocor- rem os principais acontecimentos humanos, tem trazido um desencanto quase generali- zado para os que acreditam na salvaguarda da memória coletiva como princípio maior que possa regulamentar a permanência dos legados da convivência humana. Esse princípio, pensado e vivido a partir de uma racionalidade produzida pelo embate demo- crático de nossas diferenças, dá sentido para a vida social. Articulada a esta idéia está a noção de esvaziamento das relações coletivas, em detrimento de uma valorização crescente do indivíduo no âmbito do espaço privado. Em contrapartida, um dos fenômenos culturais e políticos surpreendentes desde o final do século passado foi a emersão da memória como uma das preocupações 44
  • 45. centrais das sociedades ocidentais, como têm apontado inúmeros autores com desta- que para Jacques Le Goff e Pierre Nora (1995). A partir das décadas de 1980 e 1990 o foco das questões mudou do entendimento dos futuros presentes para o dos passados presentes (Jeudy,1986:4). Este deslocamento na experiência e na sensibilidade do tempo precisa ser com- preendido historicamente. A memória feita de pedra, isto é os artefatos deixados à luz de formas espaciais, votivas, religiosas, ou artísticas, também podem desencadear rememorações sugestivas de passados presentes, assim tornando-se elementos-cha- ve na compreensão de novos lugares de memória. Com o tempo fugidio e as invenções tecnológicas, as memórias tornaram-se projetivas (desarmônicas) e sua função identitária se apagou diante de seu poder ima- ginário. As estratégias culturais de salvaguarda dos patrimônios foram cada vez mais desafiadas pelo jogo plural de uma nova perspectiva histórica. Em nossos dias, a reconstituição sistemática de modos de vida de uma época anterior, através de espa- ços e trocas sociais converte o campo da memória em teatro preferencial de uma busca objetiva de conhecimento. Em decorrência disto, a interação entre a memória e o patrimônio ainda gera uma teatralização dos valores de uma época. A reconstituição do modus vivendi de uma época anterior, através dos espaços e trocas sociais transforma o campo da memória em teatro de um conhecimento objetivo. Coloca-se então um paradoxo sobre o qual nem a memória nem o ato preservacionista têm controle: estabelece-se um duelo entre o poder destruidor das memórias e o poder petrificador e conservacionista das cultu- ras. O foco sobre este atributo destruidor da memória ganha então relevância porque muitas das testemunhas dos diversos espaços/lugares têm idades avançadas, o que 45
  • 46. aponta para uma diferenciada postura no resguarde de suas ações. Isto denota que a memória sempre se qualifica de acordo com o significado que ela atribui aos fatos, lembranças e lugares. No caso específico das lembranças elegidas sobre as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, estas, apresentam-se necessariamente como ele- mentos problematizadores do presente e não como informações cristalizadoras de um passado. Por isso a confluência de detalhes que, sob o foco das memórias parecem sempre tão desconexos. Estabelece-se assim, o que Marc Augé chama de lugares em que se sobressai uma antropologia do próximo. Nesse sentido, este lugar tem pelo menos três caracte- rísticas comuns. Se pretende identitário, relacional e histórico. Como corolário da discussão acerca dos lugares antropológicos, Augé considera o binômio Espaço /Tempo uma dimensão indissociável perante a relação entre público e o privado. Esta constatação busca lidar com o sentido da história humana, ou seja, visa analisar o passado, propondo as tarefas de hoje, em função do que se deseja obter amanhã, pois segundo o próprio, a individualização das ações humanas e seu correlato da memória mostram que o ser humano ainda não acertou o caminho por onde poderia ir. É a partir desta proposta de se entender o passado para se conceber o agora que o ensaio de Marc Augé sobre os lugares antropológicos nos interessa diretamente. Os lugares antropológicos permitiriam, então, uma experiência inusitada: as pessoas se sentiriam solidárias exatamente na medida em que cada uma delas vivencia um aconte- cimento gerado a partir de uma dada troca seja esta simbólico-emocional, mnemônico- histórica ou simplesmente relacional. A questão ligada à memória individual parece-nos seguir caminho bem parecido. Diante da necessidade pungente de se conhecer o que o passado traz, a memória do indivíduo torna-se nebulosa, obliterada por um imperativo maior: o de se construir ou reconstituir uma memória coletiva. Tempo, espaço e memó- ria como pilares da construção social coletiva. 46
  • 47. É objetivando transcender a aceitação da memória individual como centro das ações históricas e nos fundamentar na noção de lugar antropológico (relacional-social – histórico) que pensamos articular este projeto. De um outro prisma, o estudo de como dado bem precisa ser apresentado para se comunicar, frente a distintos públicos também se mostra fundamental. Isto é, a manei- ra como as Ruínas são apreendidas pelas pessoas que as conhecem (não como algo reificado, petrificado pela ação do tempo, mas como espaço qualificado, produtor de conhecimento e arregimentador de memórias plurais) é a condição primordial para o não esquecimento deste bem. Este é um dos papéis desempenhados pelas Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos: lugar em que pessoas encontram proximidade identitária e que por isso congrega memórias diversas, coletivas e individuais. O lugar de atuação dessas ações e memórias coletivas pode ser o mais diverso possível. Exemplo disto é a interação criada a partir de uma comunidade e as memóri- as que esta produz sobre um dado lugar. Nesta interação, as pessoas, suas memórias e as transformações ocorridas no espaço através do qual criaram identidade, fundem- se num plasma que congrega passado e presente de maneira pouco nítida. O que se viu e o que se vê misturam-se diante dos olhares plurais. Exemplo acabado de espaço que tem esta característica são as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. A partir de relatos de pessoas que, por algum momento, tiveram contato com as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos, pretende-se reconstituir parte de suas me- mórias levando em consideração um elemento significativo: o que a comunidade regis- trou com relação a este bem cultural a partir de suas percepções individuais cindidas pela junção da memória coletiva. Visto que as memórias são plurais, busca-se dar visibilidade a estas vivências. 47
  • 48. A geografia da memória A zona Noroeste da cidade de Santos iniciou sua urbanização a pouco menos de 30 anos. O fato de ter ocorrido um processo tardio de urbanização certamente colabo- rou para que muito de sua mata nativa e seus segredos arquitetônicos mais antigos permanecessem sumariamente preservados. Um dos bairros constituintes deste re- cente surto urbanístico é a Vila São Jorge. Erguida na década de 1950 esta localidade foi testemunha da ocupação que, de certa forma, ajudou na conservação e preservação de um dos mais importantes e antigos bens culturais do Brasil: as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. A Vila São Jorge, que recebe este nome em homenagem ao santo padroeiro do Engenho e do curso d’água (hoje canalizado) que corta a região é atualmente uma valiosa comunidade no que tange aos potenciais memorialísticos sobre a história re- cente desta região e, sobretudo, da localidade onde estão situadas as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. Movimentos que busquem a preservação da memória desta localidade tornam-se enriquecedores instrumentos de conscientização sobre a impor- tância do cidadão para o processo preservacionista. Se por um lado a urbanização acelerou a especulação imobiliária mudando a paisagem da região (atualmente a Vila São Jorge ocupa uma área de 512 mil m2 com uma população de pouco mais de 50 mil habitantes), por outro a distância do centro da cidade e do fluxo de pessoas e transportes colaborou para que nestes últimos 50 anos o patrimônio histórico em questão permanecesse como a séculos atrás. A incorporação das Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos pela Universidade de São Paulo, a partir de finais da década de 1950, favoreceu ainda mais sua salvaguar- 48
  • 49. da. Após uma sucessão de diversos proprietários e um longo período de quase es- quecimento, foi a partir deste momento que sua importância como documento passou a ser reconhecida, cabendo a cada época vivificar as Ruínas com seus mais diletos valores. Com a implementação de um sistemático processo preservacionista a Universida- de de São Paulo, desde 2003, vem firmando parceria com as Secretarias dos municípi- os de Santos e São Vicente visando implementar projetos pedagógico-educacionais que busquem dar visibilidade à questão da preservação e da construção da identidade histórica, pela via institucional, assim garantindo o predicado de bem público. Frente à originalidade histórica deste bem cultural, projetos que incentivem sua preservação justificam-se não só pela necessidade premente da salvaguarda, mas, sobretudo devido à reconstituição de parte significativa de nossa história. Com efeito, movimentos que busquem a preservação da memória desta localidade, somados à interação entre as universidades e a comunidade tornam-se enriquecedores por valori- zarem a troca e não simplesmente a transmissão de conhecimento. É visando preser- var fragmentos desta memória que este projeto busca dar voz aos relatos da comunida- de, relevância às suas lembranças e visibilidade à iconografia remanescente. Trata-se, portanto da reconstituição de uma história que, junto com o emaranhado das memórias destes moradores precisa vir à luz das novas gerações. A comunidade da Vila São Jorge certamente poderá nos ajudar nesta busca. Identificar como a comu- nidade da Vila São Jorge viu e vê as Ruínas São Jorge dos Erasmos (por meio de sua memória coletiva e da percepção que detêm sobre o bem cultural) nos permitirá enten- der melhor a relação existente entre os moradores do bairro e este patrimônio. Procura-se, portanto, a partir de evidências orais e fotográficas, inventariar as infor- mações disponíveis por esta comunidade sobre a localidade e o seu entorno. Funda- 49
  • 50. mentais para o entendimento de sua história recente, as informações disponibilizadas por estes moradores nos auxiliarão no entendimento mais aprofundado sobre a ocupa- ção e os condicionantes que fizeram deste bem algo destacável da paisagem semi- urbanizada da região. Esta paisagem, recentemente constituída é também palco para o desenvolvimen- to de um programa que objetiva discutir as transformações ocorridas no último século no que hoje vem a ser o território circunvizinho às Ruínas Engenho. Território e Transformações: a dinâmica do espaço de fronteira O projeto Território e Transformações sinaliza a preocupação notória da contemporaneidade de registrar a frenética mudança no modus vivendi das popula- ções frente aos seus lugares de atuação sócio-histórico. Tal necessidade se baseia não só pelo de se interpretar. O processo de formação do território paulista deu-se, em primeira instância, a partir do litoral. Em função desta expansão implantaram-se sesmarias que posterior- mente tornaram-se referências de partilha entre gerações. Uma vez recortadas e distri- buídas tais glebas deram origens a municípios, que iniciariam um processo de mapeamento regional, fator preponderante na formação das primeiras cidades. Esta paulatina transformação e migração deram-se de maneira não refratária às interferências tanto do mundo europeu, quanto das dinâmicas internas à nova terra recém colonizada. De maneira bastante abrangente esta dinâmica reproduziu seu foco durante sécu- los. As mudanças na silhueta de alguns territórios, bem como no traçado de suas fron- teiras apontaram para a necessidade de se reconsiderar um elemento bastante signifi- 50
  • 51. cativo na relação entre a população e seu espaço de atuação: o elemento político. Foi a partir deste elemento político que houve a reconfiguração sócio-espacial de muitas regiões do país. Exemplo claro desta transformação é o território contíguo que corta a Ilha de São Vicente: a divisa geográfico/administrativa entre os municípios de Santos e São Vicente. A territorialidade expressa, determina e, portanto, designa a formação social e econômica de um dado território, reforçando a diferença e a separação entre as pesso- as e os lugares. Parte daí o interesse de discutir como se dão as relações de transfor- mação entre a espacialidade e o cotidiano dessas pessoas que vivem ou viveram nesta região marcada pela ação modificadora da recente urbanização. Historicamente, a cidade de Santos, assim como o município de São Vicente, vivenciou a dinâmica de uma economia monocultora de exportação (o açúcar) exigindo o avanço tecnológico e a articulação do trabalho cada vez mais especializado e, por tal, compartimentado. O que, nos primórdios da colonização, foi o resultado prático das ações do capitalismo mercantilista recém disseminado tornou-se séculos depois o ele- mento desencadeador de um processo irreversível de urbanização. Tanto no século XVI como no XIX ou XX a ordem dinâmica sempre foi a expansão territorial como corolário de uma expansão econômico-social. Dois fatores são então essenciais nesta tentativa de se entender o recente pro- cesso de transformação urbana do centro da Ilha de São Vicente. Em primeiro lugar, o quotidiano daqueles que trabalharam e produziram a riqueza do período, sempre este- ve vinculado a esta dinâmica de transformação dos lugares em que eram inseridos. Por isso a lógica da transformação espacial/territorial manteve-se em direta proporção com a submissão de um trabalho que visava à reprodução do estado de alienação. Escravização inicialmente, dependência externa posteriormente e uma quase nula di- mensão sobre a questão do trabalho marcaram a equação trazida a partir da expansão capitalista. Trabalho mais expansão, igual a escravização e perpetuação social. 51
  • 52. Em decorrência do elemento cotidiano, a questão identitária destes trabalhadores também se torna algo relevante nesta tentativa de se perceber as transformações histó- rico-espaciais da Ilha de São Vicente. O cotidiano forja partes desta identidade que, por sua vez busca sempre codificar e decodificar as mensagens deste cotidiano possibili- tando a formação de uma identidade cada vez mais vinculada ao espaço em que esta inserida. Todas essas questões históricas vêm à baila justamente quando nos deparamos com uma realidade bastante específica, tanto social quanto economicamente. O debate contemporâneo a respeito da espacialidade (fruto das preocupações históricas vincula- das às origens espaciais do nosso território brasileiro, mas com maior ênfase no espa- ço litorâneo paulista) resulta desse novo e complexo momento da realidade em que vivemos, aludido genericamente como período de globalização: uma perspectiva que propõe dar conta de explicar algo que, enquanto conceito, já nasceu fragmentado, tal como na frase famosa do judeu alemão, Karl Marx: “Tudo que é sólido se desmancha no ar...”. Nesse sentido, a análise crítica do processo de globalização nos permite identifi- car, simultaneamente, um processo de fragmentação espacial, portanto de regionalização e de individualização. Isto implica também considerarmos, como lembra o próprio San- tos (1996), a complexidade da qual se reveste a realidade territorial em que vivemos. Horizontalidades e Verticalidades que se criam e recriam simultaneamente. O desafio que nos é colocado no processo de análise regional é o de especificar e compreender as ligações entre os atores, as relações que eles tecem, seus condicionantes históricos, seus interesses, os embates que eles promovem e os seus resultados através de um dado espaço de atuação sócio histórico. 52
  • 53. História, ambiente e educação: transformação em três níveis A história do litoral sul paulista preservou legados arquitetônicos surpreendentes destacando-se muitas edificações dos séculos XVII, XVIII e XIX porém, guarda segre- dos bem mais antigos. Exemplo disto são as Ruínas Engenho São Jorge dos Erasmos. Localizadas atualmente no que se convencionou chamar de Zona Noroeste da cidade de Santos, as Ruínas são hoje o testemunho de uma história que precisa ser preserva- da. Sua singularidade e originalidade comprovam isto. A despeito de atualmente pertencer administrativamente à cidade de Santos, o território em que estão instaladas tais ruínas foi, pelo menos até o século XIX pertencen- te à cidade de São Vicente. O entroncamento fronteiriço localizado bem no centro da ilha de São Vicente confundiu por vários séculos a localização exata deste engenho, fator que ainda hoje, do ponto de vista geográfico, suscita controvérsias. A constatação de que o território em questão veio se transformando paulatinamen- te até modificar sua silhueta na virada do século XIX para o XX e, mais detidamente, a partir dos anos de 1950, justifica a necessidade de se entender esta mutação como resultado de uma série de reconfigurações sócio/histórico/espaciais na região citada. Isto equivale a dizer que, se hoje as Ruínas ESJE estão localizadas administrativamen- te no território santista, sua história demonstra que por séculos constituiu parte significa- tiva do município contíguo, razão pela qual entender o Engenho São Jorge dos Erasmos como confluência de dois territórios politicamente distintos se torna um veio interessan- te para se perceber as transformações oriundas do processo de urbanização recente desta localidade. Atualmente, a Zona Noroeste da cidade de Santos tem sido considerada a última fronteira de expansão populacional e territorial da ilha. Iniciou sua urbanização há pouco 53