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Em Moçambique actualmente tem se verificado uma explosão do desenvolvimento no campo no
âmbito da criação das novas farmas agrarias, indústrias de alimentos da primeira necessidade. Com
isto o grupo pretende fazer um estudo mais rigoroso para tentar perceber até que ponto o rural esta
perdendo suas características tendo em conta que na altura alguns sociólogos que se dedicaram mais
pelo campo deram alguma menção de características do campo que actualmente nas sociedades
moçambicanas é um pouco difícil distinguir essas características
Em cada momento histórico, o rural apresenta diferentes conceituações e mesmo dentro de cada
período, há vários tipos de realidades rurais, pois além de dependerem das transformações globais,
dependem também de factores locais, o que os obriga a se adaptarem a certos factores para
sobreviverem. Até o século XVIII, o rural apresentava-se como um território de importância primária
para o conjunto da sociedade, tendo uma maior concentração populacional, se comparado ao meio
urbano, e representando uma significativa contribuição para a economia em termos produtivos. A
partir desse período, segundo Pérez (2001), inicia-se um processo de transformação da sociedade, na
qual a ideia de progresso surge como o caminho a ser trilhado pela humanidade a fim de avançar do
passado para um futuro, ou seja, passando do atrasado para o moderno, do rural para o urbano, da
agricultura para a indústria. Essa passagem culminou com a Revolução Industrial no fim do século
XVIII, a qual alterou as estruturas económicas, políticas e sociais daquela época, que passaram a dar
maior ênfase à indústria. Com isso, houve um boom nos sectores industriais que tiveram um
crescimento tanto da produção, quanto da absorção no número de empregos, fazendo com que esses
sectores passassem a garantir a maior contribuição no PIB nacional.
Transformação do Rural para a Manutenção das Sociedades Moçambicanas
As transformações do rural
O espaço rural tem sofrido um conjunto de mudanças estruturais resultantes fundamentalmente do
processo de urbanização que se estendem e penetram em áreas significativas das zonas rurais. No
entanto, as influências da urbanização não podem ser vistas de forma homogénea, elas não se
generalizam e não são apropriadas da mesma maneira pelas diferentes localidades e comunidades.
Pelo contrário, todos esses processos compreendem uma série de modalidades advindas de diferentes
relações estabelecidas entre a tradição e a modernização. Neste sentido, nem é o moderno que invade
e coloniza os espaços rurais, nem é a tradição que se apropria, à sua maneira, dos fenómenos
urbanos. Existe uma inter-relação constante que depende dos contextos sociais. A modernização e a
urbanização que penetram em espaços considerados rurais resultam de processos activos e
dinâmicos, desencadeados paralelamente pelas próprias comunidades locais, que interpretam e se
apropriam singularmente de uma série de factores de ordem socioeconómica e sociocultural.1
Desenvolvimento rural deve ser concebido no quadro da industrialização rural, com base produtiva,
comercial, social e regional alargada e diversificada, viável e competitiva, para eliminar a
dependência externa e desenvolver o País e melhoria das sociedades. Existem várias razões para isto.
 Primeira, a industrialização rural pode aumentar os rendimentos e expandir os mercados
rurais, o que a ausência de industrialização não permite fazer.
 Segunda, a industrialização permite penetrar em mercados mais dinâmicos e inovadores e
conferir maior solidez e energia ao processo de desenvolvimento rural.
 Terceira, a industrialização rural é a oportunidade para transformar radicalmente a qualidade
e a articulação de todos os serviços, infra-estruturas e unidades produtivas rurais.
 Quarta, a industrialização rural é a oportunidade de alargamento e diversificação regional e
social da base produtiva e comercial, das oportunidades futuras de desenvolvimento e dos
padrões de distribuição do rendimento.
 Quinta, a industrialização rural é o vector da urbanização rural.
 Sexta, industrialização rural pode ser um vector de unidade da economia nacional
fortalecendo as suas ligações internas.
1 Sociologias,Porto Alegre, ano 11, nº 21, jan./jun.2009,p. 252-28
Há, no entanto, muitos conceitos diferentes de industrialização rural: uns pensam em milhares, senão
milhões, de microprojectos espalhados pelo País, outros pensam num grupo pequeno de projectos de
grande dimensão e grande impacto, concentrados em alguns produtos (açúcar, biocombustíveis, etc.)
a gerarem ligações a montante e a jusante.
Embora a ideia de industrialização e transformação do rural no contexto de Moçambique possa ser
atraente e inspirar romantismo económico, é preciso não esquecer quão dura a realidade é. Por um
lado, as infra-estruturas e serviços estão concentrados nas zonas urbanas e no Sul de Moçambique. A
cidade de Maputo ainda concentra cerca de metade da rede comercial retalhista e dois terços da rede
grossista, 40% da rede de distribuição de combustíveis e assistência técnica auto, 80% das empresas
de serviços de transporte, comunicações, construção, consultoria e informação. Portanto, se a
industrialização rural parece ser uma resposta para o desafio de diversificação e articulação do
desenvolvimento nacional, esta opção nem é fácil nem rápida. Mas é claro que requer e poderá
proporcionar profundas mudanças políticas, sociais e de tendência económica.
Ligações Intersectoriais e Industrialização Rural
Industrialização rural é a construção de ligações intersectoriais e de capacidades produtivas
complexas e multifacetadas, o que tem implicações tecnológicas, institucionais e socioeconómicas e
afecta as relações entre grupos e agentes económicos e sociais. Por exemplo, o aumento da
produtividade e dos rendimentos agrícolas requer capacidades produtivas novas. Estas capacidades
não são apenas relacionadas com sementes, adubos e equipamentos. São capacidades muito mais
complexas:
Organização social e técnica da produção que permita a absorção da tecnologia, adaptação e
inovação, acesso a finanças, a escala mínima de produção que justifique os custos tecnológicos, que
minimize custos de transacção e de aprendizagem.
Logística: todos os processos comerciais de produção requerem uma eficaz organização da logística,
nomeadamente: aprovisionamento, transporte, armazenagem, comercialização, manutenção, etc.
Máquinas requerem operadores, peças e sobressalentes, combustíveis, assistência técnica, regras de
utilização e manutenção. Insumos requerem sistemas de produção, aprovisionamento, distribuição,
assistência à utilização, regras de utilização, controlo. A produção tem de ser escoada, vendida,
armazenada, transportada, baldeada, até ao consumidor final, com segurança, qualidade e rapidez.
Produtores e consumidores necessitam de logística financeira. A informação sobre o mercado e a
logística dos insumos, finanças e dos produtos finais tem de estar sistematicamente acessível a baixo
custo. A eficácia produtiva de uma empresa depende não só da sua eficácia interna (como é que ela
transforma os meios de produção em produtos), mas da eficácia da logística (como é que tem acesso
aos meios de produção, como é que mantém a sua capacidade produtiva, e como é que tem acesso
aos mercados). Grandes avanços na produção não fazem sentido nem são alcançáveis sem grandes
avanços na logística.
Ciência e tecnologia: nomeadamente no que diz respeita à investigação de processos produtivos, de
novos produtos e novos métodos; desenvolvimento de capacidade e sistemas de informação para
escolher, adoptar, dominar, adaptar e inovar produtos, sistemas e métodos de produção; à divulgação
sistemática e ampla das melhores práticas e experiências; à generalização de sistemas de extensão,
investigação e consultoria locais, acessíveis aos produtores, de alta qualidade, adaptabilidade e
adequados para os contextos sociais, culturais, ecológicos e económicos concretos, e a baixo custo;
formação profissional ampla (não só sobre tecnologias de produção, mas também sobre mercados,
preços, decisões de investimento, decisões de produção, gestão, organização da produção,
organização e motivação dos trabalhadores, meio ambiente, investigação, etc.); certificação e
licenciamento; celeridades na introdução de novas variedades genéticas quando tal seja benéfico, etc.
A ciência e tecnologia têm de ligar os laboratórios com as empresas, mercados e as condições
produtivas concretas. Do ponto de vista do desenvolvimento agrário, não basta ter boas sementes ou
saber muito sobre a génese de uma determinada planta, se isto não tiver enquadramento comercial e
empresarial concreto.
Finanças: Todos os produtores se queixam do sistema bancário e de o acesso e o custo do cré- dito
serem fortes impedimentos ao desenvolvimento, mas o problema permanece sem ser seriamente
tocado. A questão que se coloca é simples: se o objectivo é produzir em bases comerciais
competitivas e viáveis, é necessário resolver o problema das finanças. As finanças são geralmente
vistas apenas por um único lado, nomeadamente o do acesso a crédito da banca privada. Vale a pena
olhar para a complexidade das finanças para o desenvolvimento. Primeiro, quase tão importante
como o crédito é o acesso a seguros. Se os seguros reduzem o risco, então podem aumentar a
disponibilidade do crédito a mais baixo custo e a motivação dos produtores para investirem e
inovarem. Segundo, as finanças podem ser públicas e privadas, resultante de empréstimos ou de
poupança própria. Investimento público na infra-estrutura, na logística, em sistemas de informação e
na base de ciência e tecnologia, articulado em torno de objectivos produtivos concretos e localizados
territorialmente, é uma forma privilegiada do apoio à redução do risco e da incerteza, do aumento da
eficácia produtiva, da redução dos custos do investimento privado. Isto é, o investimento do Estado
em actividades complementares e básicas pode ser tão crucial como o acesso a crédito directo barato.
Além disto, o Estado pode ainda coordenar investimento competitivo para evitar excesso de
competição, subutilização de capacidade produtiva e desperdício de recursos e para promover
economias de escala e reduzir custos de transacção e de aprendizagem. Além de promover eficácia
produtiva, este tipo de actividade reduz custos e perdas para investidores privados. O Estado pode
desenvolver sistemas de subsídios e outros de apoio financeiro directo aos produtores, mas
inteiramente relacionado com objectivos económicos claramente identificados e mensuráveis, tais
como subsídios para adopção de novas tecnologias, introdução de novas variedades, formação,
penetração em novos mercados, a intervenção do Estado por via de sistemas de seguros, coordenação
e realização de investimento complementar, coordenação de investimento competitivo, etc., reduz
riscos e incerteza e aumenta as probabilidades de sucesso, o que torna a actividade agro-industrial
atractiva para o financiamento da banca privada a mais baixo custo.
Mudanças Institucionais e Industrialização Rural
Em parte, a proliferação de estratégias foi criada pela crise de identidade do Estado, desenvolvida ao
longo de duas décadas e meia de liberalização. Em Moçambique, o Estado deu quatro saltos enormes
nas últimas três décadas e meia: do Estado corporativo colonial (organizador e recrutador de mão-de-
obra barata, colector de impostos e promotor e protector da organização produtiva da economia
colonial) para o Estado empreendedor, planificador e alocador de recursos no período de
construção da economia socialista de Estado. Deste Estado centralizado para um liberal, com a
missão de facilitar a vida ao capital mas sem saber muito bem como, especialmente quando o capital
privado nacional é tão fraco, senão apenas emergente. Deste Estado liberal, mas ainda centralizado,
para um descentralizado mas sem uma clara lógica económica e social. A crise de identidade surge
naturalmente neste processo tão brusco de mudanças tão radicais e é exacerbada pela afluência de
inúmeras ideologias de construção do Estado (o Estado do contrato-social, o Estado-Nação, o
Partido-Estado, etc.) e pela dependência do Estado em relação ao financiamento externo da sua
actividade.
O Meio Rural Não é Somente Agrícola
O meio rural deixou de ser sinónimo de agrícola e passou a ser o local de actividades que eram
tipicamente urbanas. Segundo Baptista (1994), o declínio do lugar da agricultura nas actividades e
ocupações no espaço rural foi acompanhado pelo surgimento de funções não-agrícolas, tais como os
aspectos ambientais e de protecção à natureza, o lazer e o turismo, a caça, a pesca e o acolhimento
dos que aí pretendem viver temporária ou permanentemente. Segundo o autor, a procura por esses
usos tende a aumentar, e a questão que se coloca é saber quem se encarregará da oferta desses novos
serviços no interior das sociedades rurais.
Recentes pesquisas têm indicado que muitas áreas rurais estão rompendo com a ideia clássica de que
elas sempre tendem a perder competitividade e população para as áreas urbanas, pois estão
recebendo novos investimentos e atraindo empresas industriais e de serviços, de forma a diversificar
cada vez mais as actividades económicas. Como resultado, há um incremento de proporção da
população rural que passa a não depender exclusivamente da renda advinda da actividade agrícola. A
tradicional divisão social do trabalho entre as cidades e as áreas rurais torna-se cada vez mais
imprecisa, ou "borrada" (Saraceno, 1997).
A antiga concentração das actividades agrícolas nas áreas rurais e da manufactura nas cidades é cada
vez menos marcada por uma diferenciação de estrutura das actividades económicas e sociais
desenvolvidas nas áreas urbanas e rurais.
E cada vez mais frequente o fato de residentes urbanos passarem a viver no meio rural e viajarem
diariamente para seu trabalho (commuting) pelos mais diferentes motivos (custo de vida, segurança,
estilo de vida) e de empresas (serviços e indústria) mostrarem maior propensão a escolher sua
locação fora de grandes aglomerados urbanos.
O resultado dessas mudanças (rural diferente de agrícola) é que a distribuição do emprego está cada
vez menos polarizada e cada vez mais similar nas áreas urbanas e rurais. Do ponto de vista das
políticas públicas, uma alteração fundamental é os programas passarem a dar mais atenção ao
território (economia local) do que à polarização anterior entre rural e urbano, ou agrícolas e industrial
(Saraceno, 1997).
Saraceno (1994) argumenta que os motivos da crescente competitividade das economias locais,
incluindo as áreas rurais, estão ligados a duas ordens de factores. A primeira refere-se às razões
económicas, com destaque para: segmentação da demanda para certos produtos no mercado mundial;
maior capacidade de resposta a processos de produção não-massivos por parte das pequenas e médias
empresas; multiplicação de nichos ou mercados garantidos para produtos de áreas protegidas e
específicas; possibilidade de maior integração em redes das empresas de diferentes localidades,
integrando vantagens especializadas de cada uma; e oportunidades oferecidas pelas novas
tecnologias de comunicação, para trabalhar em áreas não-centrais. A segunda ordem de factores diz
respeito à razão social, com a criação de uma demanda por novos usos dos espaços rurais pela
população dos grandes centros (lazer, moradia, turismo, etc.).
Saraceno (1994) ressalta que a leitura rural-urbano da diferenciação espacial era relevante enquanto
os processos de urbanização e industrialização operavam de maneira clássica, típica da primeira
geração de países desenvolvidos. Com o deslocamento entre espaço e sector (industrialização difusa,
novas funções de lazer das áreas rurais, descentralização dos serviços públicos, etc.) surge um novo
tipo de área, mais dinâmica, antes caracterizada como área rural, mas que se tornou periurbana ou de
industrialização difusa, podendo ser mais bem descrita como economia local. Portanto, com essas
mudanças, as áreas rurais já não são espaços "tranquilos", onde nunca ocorre nada, excepto um lento
declínio socioeconómico.
Devido às novas funções do meio rural (lazer, moradia, turismo, preservação ambiental, sede de
empresas industriais e de serviços, etc.), que precisam ser regulamentadas, surgiram novos grupos
sociais de representação de interesses para esses temas (associações de consumidores, movimentos
ecológicos, etc.), de modo que os destinos do meio rural e de sua regulamentação deixaram de ser
exclusividade das associações de produtores rurais, pois existem outros grupos sociais com direitos
similares em participar da utilização desse espaço (Moyano Estrada e Hidalgo da Silva, 1991). Por
isso, as associações de produtores precisam mostrar uma maior sensibilidade para os novos
problemas do mundo rural, entendido como algo mais amplo do que o local onde se desenvolvem
apenas as actividades produtivas agro-pecuárias.
Os novos atores sociais estão procurando e explorando oportunidades para obter ganhos com o
desenvolvimento das novas actividades, enquanto o planejamento e a definição de políticas públicas
são fundamentais para direccionar esse processo e definir os direitos e usos da terra no meio rural. Se
não houver uma regulação adequada para os novos usos do meio rural, esse processo beneficiará
apenas alguns atores sociais, não promovendo um desenvolvimento integral das áreas rurais com
melhoras para a população rural residente.
Tendo em vista que, na última década, houve uma mudança no cenário político, passando de um
enfraquecimento da agenda nacional para um fortalecimento da agenda local/regional, os "arranjos
institucionais" nesse nível de governo estão lidando melhor com a heterogeneidade do uso da terra e
do espaço social rural, de forma a dar melhores respostas de regulação para os diferentes níveis de
desenvolvimento no meio rural (Marsden 1995). Nesse sentido, é necessário que os poderes públicos
locais, em parceria com as diferentes organizações colectivas e/ou socioprofissionais, busquem e
ofereçam soluções inovadoras e flexíveis aos problemas mais correntes da população rural, de modo
que o novo rural torne-se algo realmente positivo para a população rural, na geração de novas
ocupações e melhoras nas condições de vida, e não beneficie somente os componentes das classes
urbanas mais abastadas (Etxezarreta et alii, 1995; Saraceno, 1999).
Similaridades do Trabalho Rural e Urbano
Essa tendência ocorre, não apenas em relação à importância dos ramos de actividade na ocupação
das pessoas, mas à forma de organização do trabalho. Mingione e Pugliese (1987) chamam a atenção
para o papel da agricultura em tempo parcial (e depois da pluriactividade) na alteração da base
estrutural da organização social da agricultura e das áreas rurais. Ao diminuir a dedicação exclusiva
dos membros familiares à actividade agro-pecuária, crescendo, como contrapartida, as ocupações no
mercado de trabalho não-agrícola, houve maior homogeneização e mesmo uma unificação dos
mercados de trabalho urbano e rural.
A agricultura em tempo parcial e a pluriactividade promovem uma articulação entre a agricultura e
os demais sectores económicos, num contexto territorial que já foi agrícola e rural, passando cada
vez mais a ser caracterizado pela presença de diversos ramos de actividade, com excepção das áreas
mais atrasadas e mais pobres. Nesse espaço, onde o rural já não é sinónimo de agrícola, há forte
expansão das actividades industriais e de serviços, antes restritas às áreas urbanas, de tal forma que a
difusão de novas tecnologias, que acompanha esse processo, torna cada vez maior a analogia entre os
processos de trabalho na agricultura e na indústria e entre os mercados de trabalho urbano e rural.
Processos de produção uniformes, especialização da mão-de-obra, estabilidade no emprego e uso da
força de trabalho adulta masculina eram, até pouco tempo, as características marcantes da produção
industrial no modelo fordista. Com as mudanças na produção industrial, houve uma aproximação do
modelo de trabalho típico da agricultura (trabalho por conta própria, produção flexível, escassa
divisão do trabalho, trabalho de mulheres e jovens, sazonalidade, subemprego, etc.). Esse modelo de
trabalho e de emprego generalizou-se para quase todos os sectores da economia. Suas características,
que podem parecer restos do passado, ou aspectos do carácter atrasado da agricultura, são
perfeitamente compatíveis com a modernização capitalista. Outras semelhanças entre os mercados de
trabalho rural e urbano são a crescente informatização na indústria e nos serviços, a redução da
escala de produção, o aumento do emprego por conta própria, a externalização de fases do processo
produtivo e o crescimento do número de pessoas pluriactivas (Pugliese, 1991).
Com essas mudanças, houve uma "desdiferenciação" na divisão social do trabalho, pois é cada vez
mais frequente o fato de uma mesma pessoa possuir o estatuto de empregado e de conta própria
simultaneamente, como resultado das tendências do processo de produção industrial no âmbito
do agribusiness e da necessidade decrescente de mão-de-obra para as actividades agro-pecuárias,
decorrente da generalização de tecnologias que tornam o trabalho humano redundante (Mingione e
Pugliese, 1987).
Bonanno (1989) também aborda algumas das características semelhantes entre as estruturas do
mercado de trabalho urbano e rural. Segundo o autor, apesar de ainda existirem diferenças entre a
força de trabalho urbana e a rural, tem sido observado um processo geral de homogeneização do
trabalho. As mudanças incluem, primeiramente, uma alteração na regularidade do emprego. Os
empregos tradicionais urbanos eram caracterizados como sendo para o ano inteiro e,
consequentemente, eram qualitativamente diferentes dos empregos agrícolas, largamente sazonais.
Hoje, a regularidade do emprego está, no geral, decrescendo e é praticamente ausente nos sectores
informais e descentralizados que estão emergindo.
As mudanças também envolvem a remuneração do trabalho, que tende a ser menor que no passado.
O decréscimo do emprego em empresas centrais e a expansão de indústrias periféricas, assim como
do sector de serviços, levaram ao desenvolvimento de uma situação em que uma porção significativa
dos empregos novos disponíveis paga menos, em termos reais, do que há uma década. Essa situação
contrasta com os padrões estabelecidos no pós-guerra, nos quais a remuneração abaixo dos níveis
salariais estabelecidos por lei ou por acordos sindicais era típica dos trabalhos agrícolas. Finalmente,
as mudanças envolvem os sujeitos do emprego. O aparato produtivo reestruturado, nos âmbitos
industriais e de serviços, crescentemente emprega trabalhadores "marginais". Um grande número de
mulheres, idosos, adolescentes e imigrantes ilegais encontra emprego em sectores tradicionalmente
caracterizados pela presença de trabalhadores masculinos de idade mediana. A prática de empregar
trabalhadores "marginais" era constante na agricultura porque esse segmento da classe trabalhadora
constitui-se em importante fonte de trabalho em períodos de intensa demanda por mão-de-obra,
como na colheita.
Mudanças na Estrutura das Propriedades Rurais
As alterações têm impulsionado boa parte dos membros familiares para as actividades não-agrícolas.
Segundo Arnalte (1989), o modelo clássico de redução de custos na agricultura está associado a uma
das formas básicas de progresso técnico: a mecanização, junto com uma dimensão mínima das
propriedades, abaixo da qual não é rentável o uso dos equipamentos mecânicos. Isso, segundo o
autor, explicava a diferenciação de técnicas produtivas entre pequenas e grandes explorações e a
consequente crise económica e o desaparecimento das primeiras, impossibilitadas de acompanhar
o treadmill tecnológico, ao menos em regiões onde as condições de topografia dificultam sua
orientação para produções menos mecanizadas.
No entanto, alguns autores observam, na agricultura europeia e mesmo na brasileira, que muitas
pequenas e médias propriedades têm conseguido baixar seus custos de produção transferindo às
empresas de serviços externos a gestão e execução de uma parte substancial do processo
produtivo, fenómeno chamado de externalização ou desativação de serviços, antes internos às
propriedades rurais. Essa mudança na estrutura das explorações atinge também as grandes
propriedades.
Com esse processo de externalização, as explorações convertem-se na sede física de uma série de
actividades que podem ser realizadas: com máquinas, equipamentos e outros meios de produção que
não pertencem à exploração; com mão-de-obra empregada e paga por empresas externas à
exploração; e a partir de decisões (de tipo de cultivo, características das operações culturais) não
tomadas pela exploração, senão impostas por indústrias, cooperativas ou empresas comerciais.
Portanto, a externalização de serviços coloca novos pontos de análise sobre as explorações agro-
pecuárias, mas um dos mais pertinentes é que ela libera e "expulsa" para o mercado de trabalho a
mão-de-obra familiar até então ocupada nas explorações agro-pecuárias.
Arnalte (1989) mostra que a forma de externalização das actividades varia de acordo com a estrutura
das explorações. Em virtude da estrutura agrária e do tamanho das propriedades, esse processo
cumpre uma função diferente. É nas regiões de pequenas explorações que a externalização de tarefas
mecanizadas contribui de forma mais evidente para a eficiência do processo produtivo e redução de
custos de produção, permitindo o aproveitamento de economias de escala associado ao uso de
tecnologias mecânicas modernas. Nessas regiões, também ocorrem as mudanças mais substanciais na
natureza das explorações (principalmente no tocante à distribuição do trabalho familiar).
Nas regiões de "agricultura familiar consolidada", a externalização tem um papel complementar e o
uso de tarefas externas centra-se em trabalhos com máquinas especializadas modernas, pois o
equipamento mecânico básico é de propriedade dos agricultores. Finalmente, nas regiões de grandes
explorações, o processo de externalização visa, principalmente, a mecanismos de gestão da força de
trabalho e de redução do emprego assalariado permanente nas explorações. É bastante comum a
existência de trabalho precário nas empresas de serviços contratadas para esse fim. No Brasil, as
cooperativas de trabalho são um bom exemplo da manutenção de condições precárias e da não-
extensão dos direitos trabalhistas para os trabalhadores rurais

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Sociologia rural

  • 1. Em Moçambique actualmente tem se verificado uma explosão do desenvolvimento no campo no âmbito da criação das novas farmas agrarias, indústrias de alimentos da primeira necessidade. Com isto o grupo pretende fazer um estudo mais rigoroso para tentar perceber até que ponto o rural esta perdendo suas características tendo em conta que na altura alguns sociólogos que se dedicaram mais pelo campo deram alguma menção de características do campo que actualmente nas sociedades moçambicanas é um pouco difícil distinguir essas características Em cada momento histórico, o rural apresenta diferentes conceituações e mesmo dentro de cada período, há vários tipos de realidades rurais, pois além de dependerem das transformações globais, dependem também de factores locais, o que os obriga a se adaptarem a certos factores para sobreviverem. Até o século XVIII, o rural apresentava-se como um território de importância primária para o conjunto da sociedade, tendo uma maior concentração populacional, se comparado ao meio urbano, e representando uma significativa contribuição para a economia em termos produtivos. A partir desse período, segundo Pérez (2001), inicia-se um processo de transformação da sociedade, na qual a ideia de progresso surge como o caminho a ser trilhado pela humanidade a fim de avançar do passado para um futuro, ou seja, passando do atrasado para o moderno, do rural para o urbano, da agricultura para a indústria. Essa passagem culminou com a Revolução Industrial no fim do século XVIII, a qual alterou as estruturas económicas, políticas e sociais daquela época, que passaram a dar maior ênfase à indústria. Com isso, houve um boom nos sectores industriais que tiveram um crescimento tanto da produção, quanto da absorção no número de empregos, fazendo com que esses sectores passassem a garantir a maior contribuição no PIB nacional.
  • 2. Transformação do Rural para a Manutenção das Sociedades Moçambicanas As transformações do rural O espaço rural tem sofrido um conjunto de mudanças estruturais resultantes fundamentalmente do processo de urbanização que se estendem e penetram em áreas significativas das zonas rurais. No entanto, as influências da urbanização não podem ser vistas de forma homogénea, elas não se generalizam e não são apropriadas da mesma maneira pelas diferentes localidades e comunidades. Pelo contrário, todos esses processos compreendem uma série de modalidades advindas de diferentes relações estabelecidas entre a tradição e a modernização. Neste sentido, nem é o moderno que invade e coloniza os espaços rurais, nem é a tradição que se apropria, à sua maneira, dos fenómenos urbanos. Existe uma inter-relação constante que depende dos contextos sociais. A modernização e a urbanização que penetram em espaços considerados rurais resultam de processos activos e dinâmicos, desencadeados paralelamente pelas próprias comunidades locais, que interpretam e se apropriam singularmente de uma série de factores de ordem socioeconómica e sociocultural.1 Desenvolvimento rural deve ser concebido no quadro da industrialização rural, com base produtiva, comercial, social e regional alargada e diversificada, viável e competitiva, para eliminar a dependência externa e desenvolver o País e melhoria das sociedades. Existem várias razões para isto.  Primeira, a industrialização rural pode aumentar os rendimentos e expandir os mercados rurais, o que a ausência de industrialização não permite fazer.  Segunda, a industrialização permite penetrar em mercados mais dinâmicos e inovadores e conferir maior solidez e energia ao processo de desenvolvimento rural.  Terceira, a industrialização rural é a oportunidade para transformar radicalmente a qualidade e a articulação de todos os serviços, infra-estruturas e unidades produtivas rurais.  Quarta, a industrialização rural é a oportunidade de alargamento e diversificação regional e social da base produtiva e comercial, das oportunidades futuras de desenvolvimento e dos padrões de distribuição do rendimento.  Quinta, a industrialização rural é o vector da urbanização rural.  Sexta, industrialização rural pode ser um vector de unidade da economia nacional fortalecendo as suas ligações internas. 1 Sociologias,Porto Alegre, ano 11, nº 21, jan./jun.2009,p. 252-28
  • 3. Há, no entanto, muitos conceitos diferentes de industrialização rural: uns pensam em milhares, senão milhões, de microprojectos espalhados pelo País, outros pensam num grupo pequeno de projectos de grande dimensão e grande impacto, concentrados em alguns produtos (açúcar, biocombustíveis, etc.) a gerarem ligações a montante e a jusante. Embora a ideia de industrialização e transformação do rural no contexto de Moçambique possa ser atraente e inspirar romantismo económico, é preciso não esquecer quão dura a realidade é. Por um lado, as infra-estruturas e serviços estão concentrados nas zonas urbanas e no Sul de Moçambique. A cidade de Maputo ainda concentra cerca de metade da rede comercial retalhista e dois terços da rede grossista, 40% da rede de distribuição de combustíveis e assistência técnica auto, 80% das empresas de serviços de transporte, comunicações, construção, consultoria e informação. Portanto, se a industrialização rural parece ser uma resposta para o desafio de diversificação e articulação do desenvolvimento nacional, esta opção nem é fácil nem rápida. Mas é claro que requer e poderá proporcionar profundas mudanças políticas, sociais e de tendência económica. Ligações Intersectoriais e Industrialização Rural Industrialização rural é a construção de ligações intersectoriais e de capacidades produtivas complexas e multifacetadas, o que tem implicações tecnológicas, institucionais e socioeconómicas e afecta as relações entre grupos e agentes económicos e sociais. Por exemplo, o aumento da produtividade e dos rendimentos agrícolas requer capacidades produtivas novas. Estas capacidades não são apenas relacionadas com sementes, adubos e equipamentos. São capacidades muito mais complexas: Organização social e técnica da produção que permita a absorção da tecnologia, adaptação e inovação, acesso a finanças, a escala mínima de produção que justifique os custos tecnológicos, que minimize custos de transacção e de aprendizagem. Logística: todos os processos comerciais de produção requerem uma eficaz organização da logística, nomeadamente: aprovisionamento, transporte, armazenagem, comercialização, manutenção, etc. Máquinas requerem operadores, peças e sobressalentes, combustíveis, assistência técnica, regras de utilização e manutenção. Insumos requerem sistemas de produção, aprovisionamento, distribuição, assistência à utilização, regras de utilização, controlo. A produção tem de ser escoada, vendida, armazenada, transportada, baldeada, até ao consumidor final, com segurança, qualidade e rapidez. Produtores e consumidores necessitam de logística financeira. A informação sobre o mercado e a logística dos insumos, finanças e dos produtos finais tem de estar sistematicamente acessível a baixo
  • 4. custo. A eficácia produtiva de uma empresa depende não só da sua eficácia interna (como é que ela transforma os meios de produção em produtos), mas da eficácia da logística (como é que tem acesso aos meios de produção, como é que mantém a sua capacidade produtiva, e como é que tem acesso aos mercados). Grandes avanços na produção não fazem sentido nem são alcançáveis sem grandes avanços na logística. Ciência e tecnologia: nomeadamente no que diz respeita à investigação de processos produtivos, de novos produtos e novos métodos; desenvolvimento de capacidade e sistemas de informação para escolher, adoptar, dominar, adaptar e inovar produtos, sistemas e métodos de produção; à divulgação sistemática e ampla das melhores práticas e experiências; à generalização de sistemas de extensão, investigação e consultoria locais, acessíveis aos produtores, de alta qualidade, adaptabilidade e adequados para os contextos sociais, culturais, ecológicos e económicos concretos, e a baixo custo; formação profissional ampla (não só sobre tecnologias de produção, mas também sobre mercados, preços, decisões de investimento, decisões de produção, gestão, organização da produção, organização e motivação dos trabalhadores, meio ambiente, investigação, etc.); certificação e licenciamento; celeridades na introdução de novas variedades genéticas quando tal seja benéfico, etc. A ciência e tecnologia têm de ligar os laboratórios com as empresas, mercados e as condições produtivas concretas. Do ponto de vista do desenvolvimento agrário, não basta ter boas sementes ou saber muito sobre a génese de uma determinada planta, se isto não tiver enquadramento comercial e empresarial concreto. Finanças: Todos os produtores se queixam do sistema bancário e de o acesso e o custo do cré- dito serem fortes impedimentos ao desenvolvimento, mas o problema permanece sem ser seriamente tocado. A questão que se coloca é simples: se o objectivo é produzir em bases comerciais competitivas e viáveis, é necessário resolver o problema das finanças. As finanças são geralmente vistas apenas por um único lado, nomeadamente o do acesso a crédito da banca privada. Vale a pena olhar para a complexidade das finanças para o desenvolvimento. Primeiro, quase tão importante como o crédito é o acesso a seguros. Se os seguros reduzem o risco, então podem aumentar a disponibilidade do crédito a mais baixo custo e a motivação dos produtores para investirem e inovarem. Segundo, as finanças podem ser públicas e privadas, resultante de empréstimos ou de poupança própria. Investimento público na infra-estrutura, na logística, em sistemas de informação e na base de ciência e tecnologia, articulado em torno de objectivos produtivos concretos e localizados territorialmente, é uma forma privilegiada do apoio à redução do risco e da incerteza, do aumento da eficácia produtiva, da redução dos custos do investimento privado. Isto é, o investimento do Estado em actividades complementares e básicas pode ser tão crucial como o acesso a crédito directo barato.
  • 5. Além disto, o Estado pode ainda coordenar investimento competitivo para evitar excesso de competição, subutilização de capacidade produtiva e desperdício de recursos e para promover economias de escala e reduzir custos de transacção e de aprendizagem. Além de promover eficácia produtiva, este tipo de actividade reduz custos e perdas para investidores privados. O Estado pode desenvolver sistemas de subsídios e outros de apoio financeiro directo aos produtores, mas inteiramente relacionado com objectivos económicos claramente identificados e mensuráveis, tais como subsídios para adopção de novas tecnologias, introdução de novas variedades, formação, penetração em novos mercados, a intervenção do Estado por via de sistemas de seguros, coordenação e realização de investimento complementar, coordenação de investimento competitivo, etc., reduz riscos e incerteza e aumenta as probabilidades de sucesso, o que torna a actividade agro-industrial atractiva para o financiamento da banca privada a mais baixo custo. Mudanças Institucionais e Industrialização Rural Em parte, a proliferação de estratégias foi criada pela crise de identidade do Estado, desenvolvida ao longo de duas décadas e meia de liberalização. Em Moçambique, o Estado deu quatro saltos enormes nas últimas três décadas e meia: do Estado corporativo colonial (organizador e recrutador de mão-de- obra barata, colector de impostos e promotor e protector da organização produtiva da economia colonial) para o Estado empreendedor, planificador e alocador de recursos no período de construção da economia socialista de Estado. Deste Estado centralizado para um liberal, com a missão de facilitar a vida ao capital mas sem saber muito bem como, especialmente quando o capital privado nacional é tão fraco, senão apenas emergente. Deste Estado liberal, mas ainda centralizado, para um descentralizado mas sem uma clara lógica económica e social. A crise de identidade surge naturalmente neste processo tão brusco de mudanças tão radicais e é exacerbada pela afluência de inúmeras ideologias de construção do Estado (o Estado do contrato-social, o Estado-Nação, o Partido-Estado, etc.) e pela dependência do Estado em relação ao financiamento externo da sua actividade. O Meio Rural Não é Somente Agrícola O meio rural deixou de ser sinónimo de agrícola e passou a ser o local de actividades que eram tipicamente urbanas. Segundo Baptista (1994), o declínio do lugar da agricultura nas actividades e ocupações no espaço rural foi acompanhado pelo surgimento de funções não-agrícolas, tais como os aspectos ambientais e de protecção à natureza, o lazer e o turismo, a caça, a pesca e o acolhimento
  • 6. dos que aí pretendem viver temporária ou permanentemente. Segundo o autor, a procura por esses usos tende a aumentar, e a questão que se coloca é saber quem se encarregará da oferta desses novos serviços no interior das sociedades rurais. Recentes pesquisas têm indicado que muitas áreas rurais estão rompendo com a ideia clássica de que elas sempre tendem a perder competitividade e população para as áreas urbanas, pois estão recebendo novos investimentos e atraindo empresas industriais e de serviços, de forma a diversificar cada vez mais as actividades económicas. Como resultado, há um incremento de proporção da população rural que passa a não depender exclusivamente da renda advinda da actividade agrícola. A tradicional divisão social do trabalho entre as cidades e as áreas rurais torna-se cada vez mais imprecisa, ou "borrada" (Saraceno, 1997). A antiga concentração das actividades agrícolas nas áreas rurais e da manufactura nas cidades é cada vez menos marcada por uma diferenciação de estrutura das actividades económicas e sociais desenvolvidas nas áreas urbanas e rurais. E cada vez mais frequente o fato de residentes urbanos passarem a viver no meio rural e viajarem diariamente para seu trabalho (commuting) pelos mais diferentes motivos (custo de vida, segurança, estilo de vida) e de empresas (serviços e indústria) mostrarem maior propensão a escolher sua locação fora de grandes aglomerados urbanos. O resultado dessas mudanças (rural diferente de agrícola) é que a distribuição do emprego está cada vez menos polarizada e cada vez mais similar nas áreas urbanas e rurais. Do ponto de vista das políticas públicas, uma alteração fundamental é os programas passarem a dar mais atenção ao território (economia local) do que à polarização anterior entre rural e urbano, ou agrícolas e industrial (Saraceno, 1997). Saraceno (1994) argumenta que os motivos da crescente competitividade das economias locais, incluindo as áreas rurais, estão ligados a duas ordens de factores. A primeira refere-se às razões económicas, com destaque para: segmentação da demanda para certos produtos no mercado mundial; maior capacidade de resposta a processos de produção não-massivos por parte das pequenas e médias empresas; multiplicação de nichos ou mercados garantidos para produtos de áreas protegidas e específicas; possibilidade de maior integração em redes das empresas de diferentes localidades, integrando vantagens especializadas de cada uma; e oportunidades oferecidas pelas novas tecnologias de comunicação, para trabalhar em áreas não-centrais. A segunda ordem de factores diz
  • 7. respeito à razão social, com a criação de uma demanda por novos usos dos espaços rurais pela população dos grandes centros (lazer, moradia, turismo, etc.). Saraceno (1994) ressalta que a leitura rural-urbano da diferenciação espacial era relevante enquanto os processos de urbanização e industrialização operavam de maneira clássica, típica da primeira geração de países desenvolvidos. Com o deslocamento entre espaço e sector (industrialização difusa, novas funções de lazer das áreas rurais, descentralização dos serviços públicos, etc.) surge um novo tipo de área, mais dinâmica, antes caracterizada como área rural, mas que se tornou periurbana ou de industrialização difusa, podendo ser mais bem descrita como economia local. Portanto, com essas mudanças, as áreas rurais já não são espaços "tranquilos", onde nunca ocorre nada, excepto um lento declínio socioeconómico. Devido às novas funções do meio rural (lazer, moradia, turismo, preservação ambiental, sede de empresas industriais e de serviços, etc.), que precisam ser regulamentadas, surgiram novos grupos sociais de representação de interesses para esses temas (associações de consumidores, movimentos ecológicos, etc.), de modo que os destinos do meio rural e de sua regulamentação deixaram de ser exclusividade das associações de produtores rurais, pois existem outros grupos sociais com direitos similares em participar da utilização desse espaço (Moyano Estrada e Hidalgo da Silva, 1991). Por isso, as associações de produtores precisam mostrar uma maior sensibilidade para os novos problemas do mundo rural, entendido como algo mais amplo do que o local onde se desenvolvem apenas as actividades produtivas agro-pecuárias. Os novos atores sociais estão procurando e explorando oportunidades para obter ganhos com o desenvolvimento das novas actividades, enquanto o planejamento e a definição de políticas públicas são fundamentais para direccionar esse processo e definir os direitos e usos da terra no meio rural. Se não houver uma regulação adequada para os novos usos do meio rural, esse processo beneficiará apenas alguns atores sociais, não promovendo um desenvolvimento integral das áreas rurais com melhoras para a população rural residente. Tendo em vista que, na última década, houve uma mudança no cenário político, passando de um enfraquecimento da agenda nacional para um fortalecimento da agenda local/regional, os "arranjos institucionais" nesse nível de governo estão lidando melhor com a heterogeneidade do uso da terra e do espaço social rural, de forma a dar melhores respostas de regulação para os diferentes níveis de desenvolvimento no meio rural (Marsden 1995). Nesse sentido, é necessário que os poderes públicos locais, em parceria com as diferentes organizações colectivas e/ou socioprofissionais, busquem e ofereçam soluções inovadoras e flexíveis aos problemas mais correntes da população rural, de modo
  • 8. que o novo rural torne-se algo realmente positivo para a população rural, na geração de novas ocupações e melhoras nas condições de vida, e não beneficie somente os componentes das classes urbanas mais abastadas (Etxezarreta et alii, 1995; Saraceno, 1999). Similaridades do Trabalho Rural e Urbano Essa tendência ocorre, não apenas em relação à importância dos ramos de actividade na ocupação das pessoas, mas à forma de organização do trabalho. Mingione e Pugliese (1987) chamam a atenção para o papel da agricultura em tempo parcial (e depois da pluriactividade) na alteração da base estrutural da organização social da agricultura e das áreas rurais. Ao diminuir a dedicação exclusiva dos membros familiares à actividade agro-pecuária, crescendo, como contrapartida, as ocupações no mercado de trabalho não-agrícola, houve maior homogeneização e mesmo uma unificação dos mercados de trabalho urbano e rural. A agricultura em tempo parcial e a pluriactividade promovem uma articulação entre a agricultura e os demais sectores económicos, num contexto territorial que já foi agrícola e rural, passando cada vez mais a ser caracterizado pela presença de diversos ramos de actividade, com excepção das áreas mais atrasadas e mais pobres. Nesse espaço, onde o rural já não é sinónimo de agrícola, há forte expansão das actividades industriais e de serviços, antes restritas às áreas urbanas, de tal forma que a difusão de novas tecnologias, que acompanha esse processo, torna cada vez maior a analogia entre os processos de trabalho na agricultura e na indústria e entre os mercados de trabalho urbano e rural. Processos de produção uniformes, especialização da mão-de-obra, estabilidade no emprego e uso da força de trabalho adulta masculina eram, até pouco tempo, as características marcantes da produção industrial no modelo fordista. Com as mudanças na produção industrial, houve uma aproximação do modelo de trabalho típico da agricultura (trabalho por conta própria, produção flexível, escassa divisão do trabalho, trabalho de mulheres e jovens, sazonalidade, subemprego, etc.). Esse modelo de trabalho e de emprego generalizou-se para quase todos os sectores da economia. Suas características, que podem parecer restos do passado, ou aspectos do carácter atrasado da agricultura, são perfeitamente compatíveis com a modernização capitalista. Outras semelhanças entre os mercados de trabalho rural e urbano são a crescente informatização na indústria e nos serviços, a redução da escala de produção, o aumento do emprego por conta própria, a externalização de fases do processo produtivo e o crescimento do número de pessoas pluriactivas (Pugliese, 1991).
  • 9. Com essas mudanças, houve uma "desdiferenciação" na divisão social do trabalho, pois é cada vez mais frequente o fato de uma mesma pessoa possuir o estatuto de empregado e de conta própria simultaneamente, como resultado das tendências do processo de produção industrial no âmbito do agribusiness e da necessidade decrescente de mão-de-obra para as actividades agro-pecuárias, decorrente da generalização de tecnologias que tornam o trabalho humano redundante (Mingione e Pugliese, 1987). Bonanno (1989) também aborda algumas das características semelhantes entre as estruturas do mercado de trabalho urbano e rural. Segundo o autor, apesar de ainda existirem diferenças entre a força de trabalho urbana e a rural, tem sido observado um processo geral de homogeneização do trabalho. As mudanças incluem, primeiramente, uma alteração na regularidade do emprego. Os empregos tradicionais urbanos eram caracterizados como sendo para o ano inteiro e, consequentemente, eram qualitativamente diferentes dos empregos agrícolas, largamente sazonais. Hoje, a regularidade do emprego está, no geral, decrescendo e é praticamente ausente nos sectores informais e descentralizados que estão emergindo. As mudanças também envolvem a remuneração do trabalho, que tende a ser menor que no passado. O decréscimo do emprego em empresas centrais e a expansão de indústrias periféricas, assim como do sector de serviços, levaram ao desenvolvimento de uma situação em que uma porção significativa dos empregos novos disponíveis paga menos, em termos reais, do que há uma década. Essa situação contrasta com os padrões estabelecidos no pós-guerra, nos quais a remuneração abaixo dos níveis salariais estabelecidos por lei ou por acordos sindicais era típica dos trabalhos agrícolas. Finalmente, as mudanças envolvem os sujeitos do emprego. O aparato produtivo reestruturado, nos âmbitos industriais e de serviços, crescentemente emprega trabalhadores "marginais". Um grande número de mulheres, idosos, adolescentes e imigrantes ilegais encontra emprego em sectores tradicionalmente caracterizados pela presença de trabalhadores masculinos de idade mediana. A prática de empregar trabalhadores "marginais" era constante na agricultura porque esse segmento da classe trabalhadora constitui-se em importante fonte de trabalho em períodos de intensa demanda por mão-de-obra, como na colheita. Mudanças na Estrutura das Propriedades Rurais As alterações têm impulsionado boa parte dos membros familiares para as actividades não-agrícolas. Segundo Arnalte (1989), o modelo clássico de redução de custos na agricultura está associado a uma das formas básicas de progresso técnico: a mecanização, junto com uma dimensão mínima das propriedades, abaixo da qual não é rentável o uso dos equipamentos mecânicos. Isso, segundo o
  • 10. autor, explicava a diferenciação de técnicas produtivas entre pequenas e grandes explorações e a consequente crise económica e o desaparecimento das primeiras, impossibilitadas de acompanhar o treadmill tecnológico, ao menos em regiões onde as condições de topografia dificultam sua orientação para produções menos mecanizadas. No entanto, alguns autores observam, na agricultura europeia e mesmo na brasileira, que muitas pequenas e médias propriedades têm conseguido baixar seus custos de produção transferindo às empresas de serviços externos a gestão e execução de uma parte substancial do processo produtivo, fenómeno chamado de externalização ou desativação de serviços, antes internos às propriedades rurais. Essa mudança na estrutura das explorações atinge também as grandes propriedades. Com esse processo de externalização, as explorações convertem-se na sede física de uma série de actividades que podem ser realizadas: com máquinas, equipamentos e outros meios de produção que não pertencem à exploração; com mão-de-obra empregada e paga por empresas externas à exploração; e a partir de decisões (de tipo de cultivo, características das operações culturais) não tomadas pela exploração, senão impostas por indústrias, cooperativas ou empresas comerciais. Portanto, a externalização de serviços coloca novos pontos de análise sobre as explorações agro- pecuárias, mas um dos mais pertinentes é que ela libera e "expulsa" para o mercado de trabalho a mão-de-obra familiar até então ocupada nas explorações agro-pecuárias. Arnalte (1989) mostra que a forma de externalização das actividades varia de acordo com a estrutura das explorações. Em virtude da estrutura agrária e do tamanho das propriedades, esse processo cumpre uma função diferente. É nas regiões de pequenas explorações que a externalização de tarefas mecanizadas contribui de forma mais evidente para a eficiência do processo produtivo e redução de custos de produção, permitindo o aproveitamento de economias de escala associado ao uso de tecnologias mecânicas modernas. Nessas regiões, também ocorrem as mudanças mais substanciais na natureza das explorações (principalmente no tocante à distribuição do trabalho familiar). Nas regiões de "agricultura familiar consolidada", a externalização tem um papel complementar e o uso de tarefas externas centra-se em trabalhos com máquinas especializadas modernas, pois o equipamento mecânico básico é de propriedade dos agricultores. Finalmente, nas regiões de grandes explorações, o processo de externalização visa, principalmente, a mecanismos de gestão da força de trabalho e de redução do emprego assalariado permanente nas explorações. É bastante comum a existência de trabalho precário nas empresas de serviços contratadas para esse fim. No Brasil, as
  • 11. cooperativas de trabalho são um bom exemplo da manutenção de condições precárias e da não- extensão dos direitos trabalhistas para os trabalhadores rurais