1. UNIVERSIDADE REGIONAL DO CARIRI - URCA
CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS - CESA
DEPARTAMENTO DE DIREITO - CURSO DE DIREITO
DISCIPLINA: HERMENÊUTICA JURÍDICA
PROFESSOR: AMBRÓSIO
ALUNO: CLÁUDIO FERREIRA
A TEORIA DAARGUMENTAÇÃO JURÍDICA
O fenômeno da interpretação jurídica lida com situações de resolução mais simplificada e
com casos cuja resolução é mais difícil. As situações fáceis, a priori, podem ser decididos com base
na lógica formal, dedutiva, aplicando-se a norma pertinente aos fatos, mediante juízo de subsunção.
Nos casos difíceis, todavia, a solução precisa ser construída tendo em vista elementos que não estão
integralmente contidos nos enunciados normativos aplicáveis. Neste cenário, valorações morais e
políticas precisarão integrar o itinerário lógico da produção da decisão. Este é o ambiente típico da
argumentação jurídica.
1. Da interpretação da norma
A teoria da argumentação jurídica tem como intuito problematizar a validade de uma
premissa ou tese presente em um discurso jurídico, estipulando-lhe algumas regras de interpretação
e de aplicação. Em outras palavras, a argumentação jurídica busca justificar racionalmente um
discurso ou tese jurídica, conferindo-lhe cientificidade.
O objetivo mais perceptível de se buscar racionalizar uma tese jurídica é o de evitar a
aplicação do direito de forma arbitrária, ou até mesmo de evitar interpretações tendenciosas da
norma e de costumes, principalmente com o objetivo de favorecimento ou de prejuízo claro de
determinado grupo/categoria de pessoas em detrimento de outras.
O direito, nesse contexto, não pode ser estudado e aplicado apenas como um produto
acabado, aonde predomine a aplicação fria da norma, sem levar em conta elementos como sua
finalidade, sua aplicação ao caso concreto, sua mutação ao longo do tempo e do espaço, sua eficácia
social, etc. O processo de decisão judicial, ápice da aplicação da norma, deve, portanto, ser
2. devidamente fundamentado em uma ótica racional com base num conjunto de ideias, discussões,
ponderações, argumentações, etc.
A argumentação jurídica vem ganhando bastante destaque nas últimas décadas,
principalmente com a crise do positivismo e a superação da ideia da legalidade estrita e escrita. É
fato que, nos últimos anos, o direito tem passado por um processo de resgate dos valores,
normatização dos princípios e salutar relevância para a aplicação e garantia dos direitos
fundamentais.
A ascensão do direito constitucional para o centro do sistema jurídico também foi essencial
nesse processo, passando as cartas magnas de diversos países a figurar como norteadora da
interpretação de uma série de ramos do direito, com o poder até mesmo de extirpar do ordenamento
jurídico eventual norma, declara inconstitucional, que traga disposições que vão de encontro ao que
é previsto no texto constitucional.
Assim, num Estado Democrático de Direito como é o nosso, a aplicação tanto da lei quanto
de princípios através de um procedimento prévio de argumentação, traz, por exemplo, a obrigação
de motivar as decisões judiciais, uma vez que justificar uma decisão significa algo mais do que
efetuar uma operação dedutiva, como propunham os positivistas mais formais, que consiste em
extrair uma conclusão a partir de premissas normativas e fáticas. Nessa base, é possível garantir que
ações e decisões jurídicas sejam adotadas a partir de critérios racionais, garantidos por meio da
observância de um procedimento também racional.
A teoria da argumentação em si, não especificamente voltada ao direito, tem origem na
teoria do conhecimento (epistemologia), pertencente ao campo da filosofia, e engloba o estudo das
regras de inferência, da lógica e das regras de procedimento, tanto em cenários artificiais quanto no
mundo real. Já aplicada ao direito, tem como pressuposto, portanto, o fato de que as decisões
jurídicas devem e podem ser justificadas da melhor maneira possível. Afinal, a argumentação é
intrínseca ao universo jurídico, que é feito de linguagem, racionalidade e convencimento.
Resta claro, assim, que a argumentação jurídica é antagônica ao juízo formal de aplicação da
lei através de critérios “puros” de lógica formal ou de interpretação literal da norma. Por esse
raciocínio, o Direito se justifica na medida em que corresponda a uma forma racional de discurso,
delimitada por um determinado procedimento.
2. Da argumentação jurídica
A premissa básica adotada pela teoria da argumentação se constitui na ponderação de que,
“se existem diversas possibilidades interpretativas sobre uma mesma hipótese, qual delas é capaz de
apresentar uma fundamentação racional consistente?”.
3. As teorias da argumentação jurídica tiveram suas origens numa série de obras desenvolvidas
a partir da década de 1950, que partiram do ponto comum de rejeição da lógica formal como
instrumento para análise do direito. Vários autores, de diferentes escolas, são referência no campo
da argumentação jurídica, cada um deles chegando a propor diferentes critérios e procedimentos
que devem ser levados em consideração quando da interpretação e aplicação do direito.
Contudo, o grande percussor da argumentação jurídica foi Chaïm Perelman, nascido em
Varsóvia em 1912, que empreendeu um trabalho sem precedentes no campo da teoria da
argumentação, procurando estabelecer uma lógica dos juízos de valor amparada no raciocínio
jurídico. A construção da teoria da Perelman tem como base fundamental as críticas que faz ao
positivismo jurídico, problematizando que, ao lado das ciências matemáticas, entendidas como
modelo de conduta para as ciências formais em geral, existe outro campo, o argumentativo, que
serve sobretudo para as ciências em que o uso da razão é imprescindível (como o direito, por
exemplo, onde, segundo o autor, a argumentação encontra terreno fértil).
Mas o principal trabalho sobre o tema é talvez do jurista espanhol Manuel Atienza, que em
sua obra “Teorias da Argumentação Jurídica” sistematiza as teorias de argumentação jurídica de
Theodor Viehweg, Perelman, Stephen E. Toulmin, Neil MacCormick e Robert Alexy. Todos esses
autores assentam-se em uma perspectiva pós-positivista, na qual os princípios gerais do direito
ocupam lugar de primazia, alcançando o posto de base de apoio de todo o ordenamento jurídico,
constituindo o seu fundamento último de legitimidade.
Atienza, ao analisar as contribuições desses autores, afirma que a argumentação jurídica
deve ser avaliada a partir de três panoramas diferentes: seu objeto, seu método e sua função (o que
se busca argumentar, como e com qual finalidade). Com isso, ele pondera que a teoria da
argumentação jurídica deveria compreender três funções: uma de caráter teórico ou cognoscitivo,
outra de natureza prática ou técnica, e uma terceira, política e moral. Apresenta, então, um modelo
próprio que ele acredita resumir todo o processo de argumentação jurídica. Para o autor, a
argumentação jurídica atinge três campos: o da produção de normas, o da aplicação de normas e o
da dogmática jurídica.
O primeiro se atém à fase legislativa das normas, o segundo dispõe sobre os casos difíceis e
polêmicos relativos à interpretação e aplicação do direito e o último se volta para a análise dos
critérios que auxiliam no processo de tomada de decisão.
Convém explicitar, contudo, uma das principais contribuições de Alexy para a teoria da
argumentação jurídica, qual seja indicação da necessidade de existência de um sistema de regras e
princípios cuja observância assegure a racionalidade da argumentação e de seus resultados. De
acordo com o autor, a teoria do discurso não é uma máquina que permita determinar exata, objetiva
4. e definitivamente o peso de cada tese, mas a existência de um mínimo de regras e de procedimentos
teria como condão evitar uma interpretação arbitrária ou injusta de uma norma, por exemplo.
Aliás, segundo os próprios fundamentos e características da teoria da argumentação, a
existência de uma única resposta correta para cada caso ocorreria apenas se sua aplicação garantisse
sempre um consenso, somente admissível através de uma sequência de idealizações (improváveis
de ocorrer na prática) que envolveriam tempo ilimitado, informação ilimitada, claridade linguística
ilimitada e carência de prejuízo ilimitada.
Como tal encadeamento de eventos é extremamente peculiar, a valoração de regras
procedimentais seriam a melhor forma de garantir uma melhor aplicação e interpretação do direito
no caso concreto.
Merece destaque ainda o modelo de teoria da argumentação jurídica criado por Stephen E.
Toulmin, que orienta cinco passos a serem seguidos com vistas à construção do argumento jurídico.
São eles: a) a formulação de um ponto de vista; b) o apontamento de dados os quais se dispõe no
caso em pauta; c) a produção de uma justificativa; d) o provimento de novas informações que
sirvam de apoio para tese em discussão; e) a consideração de possíveis exceções ao caso.
Interessante ainda é a Teoria da Argumentação Jurídica de MacCormick, segundo a qual os
casos considerados singelos poderiam ser solucionados através de uma simples argumentação
dedutiva, ao passo que os mais complexos exigiriam o emprego de outras virtudes humanas, como o
senso de justiça, a humanidade, a compaixão, etc, sempre em consonância com a universalidade,
consistência e coerência da decisão a qual se tenha chegado.
Deve-se levar em conta ainda que a integridade do ordenamento jurídico deve ser preservada
no sentido de que o intérprete do direito deve ter compromisso com a unidade e com a coerência da
ordem jurídica, chegando a conclusões universais aplicáveis a todos os casos em que estejam
presentes as mesmas circunstâncias, e não de forma casuística.
Considerações finais
A partir do exposto, é possível sintetizar que a argumentação jurídica nada mais é do que
uma atividade que visa fornecer razões para a defesa de um ponto de vista com o objetivo de
justificar de determinada tese ou aplicação do direito.
Anteriormente, e por muito tempo, a subsunção foi o raciocínio padrão na aplicação e
interpretação do direito. Através desta, uma premissa maior (a norma, neste caso) incide sobre a
premissa menor (os fatos), produzindo um resultado, fruto da aplicação da norma ao caso concreto.
5. Contudo, a complexidades dos fatos e a evolução da sociedade têm feito com que sejam
buscadas novas soluções para os problemas enfrentados pela modernidade. A utilização da
subsunção como técnica interpretativa, por exemplo, apesar de ainda ser cabível em uma gama de
situações jurídicas, não é suficiente para lidar com as situações mais complexas de nosso
ordenamento, principalmente quando lidamos com choque entre normas de mesma hierarquia.
Nestes casos o juízo de subsunção não encontraria terreno, visto que haverá várias premissas
maiores (normas) e apenas uma premissa menor (fato) que não pode ser encaixada completamente
em apenas uma daquelas. O exemplo mais comum é o quando de um fato decorre a violação de
princípios fundamentais aparentemente contrapostos. Por exemplo, quando há um choque entre o
direito à imagem e a liberdade de imprensa.
Como consequência, a interpretação constitucional viu-se na contingência de desenvolver
técnicas capazes de produzir uma solução dotada de racionalidade e de controlabilidade diante de
normas que entrem em rota de colisão. Uma das técnicas consiste justamente na utilização da
argumentação jurídica para buscar a melhor solução para o caso concreto.
Assim, diante da realidade e da apresentação dos mais diversos fatos para serem analisados e
para os quais deve ser dada uma solução jurídica, o intérprete da lei deve assumir o papel de
argumentador crítico, não apenas de mero aplicador de preceitos. Trata-se de um processo racional e
discursivo de análise de determinada solução proposta, que procura, através da ponderação de
premissas e dos fatos em pauta, a concretização da justiça.
Referências:
ATIENZA, Manuel. As razões do direito: teorias da argumentação jurídica. 3. ed. São Paulo: Landy, 2006.
DORICO, Eliane Aparecida.A teoria da argumentação jurídica como instrumento para a solução justa dos
casos. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 ago. 2013. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?
artigos&ver=2.44965&seo=1>. Acesso em: 17 nov. 2016.
JANNUCCI, Alessander. Teorias da argumentação jurídica e hermenêutica. Conteudo Juridico, Brasilia-DF:
20 dez. 2014. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.51586&seo=1>. Acesso
em: 17 nov. 2016.
6. OLIVEIRA, Nayla Soares de; MORAIS, Evilanne Brandão de. Teoria da argumentação jurídica de Neil
MacCormick. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3517, 16 fev. 2013. Disponível
em:<https://jus.com.br/artigos/23733>. Acesso em: 16 nov. 2016.
7. OLIVEIRA, Nayla Soares de; MORAIS, Evilanne Brandão de. Teoria da argumentação jurídica de Neil
MacCormick. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3517, 16 fev. 2013. Disponível
em:<https://jus.com.br/artigos/23733>. Acesso em: 16 nov. 2016.