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MARGULIS, Lynn & SAGAN, Dorion. O que é Vida? Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2002(a).
Resumo por: Carlos Jorge Burke – www.cburke.com.br
OBS: Se desejar, solicitar arquivo pelo blog.


“A vida, apesar de material, é inextricável do comportamento do ser vivo. Desafiando
qualquer definição – palavra que significa “fixar ou marcar os limites de algo” -, as
células vivas se movimentam e se expandem incessantemente. Ultrapassam suas
fronteiras: uma se transforma em duas, que se transformam em muitas. Embora troquem
uma grande variedade de materiais e transmitam uma enorme quantidade de
informações, todos os seres vivos, em última instância, compartilham um passado
comum.” P. 19

“Um cientista, entretanto, conseguiu pesquisar a vida em Marte antes que a missão
Viking fosse lançada. Em 1967, James E. Lovelock, o inventor inglês de um aparelho
que mede os clorofluorcarbonetos implicados na produção de buracos na camada de
ozônio, foi consultado pela Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço (NASA),
que estava investigando a vida extraterrestre. A NASA interessou-se pelo que a
invenção de Lovelock – um instrumento de medição de gases que é milhares de vezes
mais sensível a certos componentes atmosféricos do que qualquer aparelho anterior –
poderia revelar a respeito de Marte. Como químico da atmosfera, Lovelock desconfiava
que, em princípio, a vida em qualquer planeta poderia ser detectada pelos marcadores
químicos remanescentes no ar desses planetas. Como os componentes da atmosfera de
Marte já eram conhecidos pela assinatura espectroscópica da luz refletida do planeta,
Lovelock acreditou que esses dados já seriam suficientes para determinar se Marte era
um planeta vivo. E concluiu: Marte era desprovido de vida. Aliás, com seu estilo
característico de serena implicância iconoclástica, ele se gabou de que sua previsão
dispensava a necessidade de qualquer visita a Marte e de que pouparia à NASA uma
despesa prodigiosa.” P. 27

“A vida – tanto no aspecto local, como corpos de animais, plantas e micróbios, quanto
no plano global, como a biosfera – é um fenômeno material sumamente complexo. Ela
exibe as propriedades químicas e físicas habituais da matéria, mas com um toque
diferente. A areia da praia costuma ser dióxido de silício. Também desse elemento são
as partes internas da unidade central de processamento dos computadores – mas os
computadores não são montes de areia. A vida se distingue não por seus componentes
químicos, mas pelo comportamento desses componentes. Assim, a pergunta “o que é
vida?” é uma armadilha lingüística. Para respondê-la de acordo com as regras
gramaticais, devemos fornecer um substantivo, uma coisa. Mas a vida na Terra
assemelha-se mais a um verbo. Ela conserta, sustenta, recria e supera a si mesma.
Esse ímpeto de atividade, que se aplica não somente às células e animais, mas a toda a
atmosfera terrestre, está intimamente ligado com duas da mais famosas leis da ciência –
as leis da termodinâmica. A primeira delas diz que, durante qualquer transformação, a
energia total de um sistema e de seu meio não é perdida nem ganha. A energia – seja
como luz, movimento, radiação, calor, radioatividade, química ou outras formas – se
conserva.
Mas nem todas as formas de energia são iguais, nem todas têm o mesmo efeito. O calor
é o tipo de energia em que as outras formas tendem a se converter, e o calor tende a
desorganizar a matéria. A segunda lei da termodinâmica diz que os sistemas físicos
tendem a perder calor para seu meio circundante.” P. 28s

“A medida que os sistemas locais perdem calor, o universo como um todo ganha calor.
Embora isso já não seja muito popular hoje em dia, no passado físicos e químicos
previram que o universo se desintegraria numa “morte térmica”, em conseqüência da
tendência ao aumento da entropia. Mais recentemente, eles inventaram a expressão
“entropia negativa” para se referir à vida, a qual, em sua tendência a aumentar as
informações e a certeza, parece contradizer a segunda lei. Mas não a contradiz; a
segunda lei continua válida, desde que se encare o sistema (a vida) em seu meio
ambiente.” P. 29

“Ilhas de ordem num oceano de caos, os organismos são muito superiores às máquinas
construídas pelo homem. Ao contrário da máquina a vapor de James Watt, por exemplo,
o corpo concentra a ordem. Ele se refaz continuamente. A cada cinco dias, temos um
novo revestimento interno do estômago. Ganhamos um novo fígado a cada dois meses.
Nossa pele se repõe a cada seis semanas. A cada ano, 98 por cento dos átomos de nosso
corpo são substituídos. Essa substituição química ininterrupta, o metabolismo, é um
sinal seguro de vida. E a “máquina” requer uma entrada continua de energia e de
substâncias químicas (alimentos).” P. 31

“Os biólogos chilenos Humberto Maturana e Francisco Varela vêem no metabolismo a
essência de algo realmente fundamental para a vida. Dão o nome de “autopoese”.
Proveniente das raízes gregas que significam “si mesmo” (auto) e “fazer” (poiein, como
em “poesia”), a autopoese refere-se à produção continua de si mesmo pela vida. (...).
Uma entidade autopoética efetua continuamente o metabolismo, perpetua-se através da
atividade química, da movimentação das moléculas. A autopoese acarreta um gasto de
energia e a produção de alimentos. Na verdade ela é detectável pela incessante química
biológica e fluxo energético que é o metabolismo. Somente as células, os organismos
feitos de células e as biosferas feitas de organismos são autopoéticos e podem efetuar o
metabolismo.” P. 31

“A identidade e a auto-sustentação requerem o metabolismo. A química metabólica
(comumente chamada de fisiologia) precede a reprodução e a evolução. Para que uma
população evolua, seus membros têm que se reproduzir. No entanto, para que um ser
orgânico possa reproduzir-se, primeiro ele precisa se sustentar. Durante a vida de uma
célula, cada uma das aproximadamente cinco mil proteínas diferentes faz um
intercâmbio completo com o meio circundante, milhares de vezes. As células
bacterianas produzem DNA e RNA (ácidos nucléicos), proteínas de enzimas, gorduras,
carboidratos e outras substâncias químicas complexas de carbono. Os corpos de
protoctistas, fungos, animais e plantas também produzem, todos eles, essas e outras
substâncias. Contudo, o mais importante e espantoso é que qualquer corpo vivo produz
a si mesmo.” P. 32s

“A visão autopoética da vida difere dos ensinamentos padronizados da biologia. A
maioria dos autores de textos dessa área deixa implícito que o organismo existe
independentemente de seu meio, e que o meio é sobretudo um pano de fundo estático e
sem vida. Entretanto, os seres orgânicos e o meio ambiente acham-se entrelaçados. O
solo, por exemplo, não é isento de vida. É uma mistura de fragmentos de rochas, pólen,
filamentos de fungos, cistos de ciliados, esporos bacterianos, nematódeos e outros
animais microscópios e suas partes. “A natureza”, observou Aristóteles, “avança
paulatinamente das coisas sem vida para a vida animal, de tal maneira que é impossível
determinar a linha de demarcação exata”. Independência é um termo político, não
científico.” P. 33

“A biosfera como um todo é autopoética, no sentido de que sustenta a si mesma. Um de
seus “órgãos” vitais, a atmosfera, é claramente cuidado e alimentado. A atmosfera
terrestre, com aproximadamente 1/5 de oxigênio, difere radicalmente das de Marte e
Vênus. A atmosfera desses vizinhos planetários tem 9/10 de dióxido de carbono; na
atmosfera terrestre, o dióxido de carbono responde por apenas três partes em dez mil. Se
a biosfera terrestre não se compusesse de seres que consomem dióxido de carbono
(plantas, algas e bactérias fotossintéticas e produtoras de metano, entre miríades de
outras formas biológicas), há muito tempo nossa atmosfera teria chegado a uma
estabilidade química rica em dióxido de carbono, e praticamente todas as moléculas
capazes de reagir com outras já teriam o feito. Em vez disso, as atividades conjuntas da
vida autopoética da superfície levaram a uma atmosfera em que o oxigênio se mantêm
em níveis de aproximadamente 20 por cento há pelo menos 700 milhões de anos.” P. 34

“Usando a energia solar, apenas as plantas verdes, as algas e algumas bactérias de cor
verde e roxa são capazes de transformar compostos da água e do ar circundante na
matéria viva de seus corpos. Esse processo energizado pelo Sol, a fotossíntese, é a base
nutricional do resto da vida. Os animais, os fungos e a maioria das bactérias alimentam-
se dos produtores roxos e verdes. A fotossíntese evoluiu nos micróbios logo depois da
origem da vida. Em todos os níveis, desde o microbiano até o planetário, os seres
orgânicos usam o ar e a água ou outros seres orgânicos para construir seus eus
reprodutores. A ecologia local transforma-se em ecologia global. Como corolário, e a
despeito da gramática, a vida não existe na superfície da Terra, mas é a superfície da
Terra.” P. 36

“Apesar de adulterados por outros compostos, nós, como toda matéria viva, somos
basicamente feitos de água – ou seja, de hidrogênio e oxigênio. O hidrogênio compõe,
em termos de massa, 75 por cento dos átomos do cosmo. É o mesmo elemento que sob
intensa pressão gravitacional, transforma-se em hélio na reação de fusão nuclear que faz
com que nosso sol brilhe. Estrelas muito mais velhas e maiores desapareceram em
explosões, sob a forma de supernovas, e com isso criaram o carbono, o oxigênio, o
nitrogênio e os outros elementos mais pesados. A vida é feita dessa matéria estelar. No
universo, a vida pode ser rara ou até singular, porém a matéria de que é feita é
elementar.” P. 37

“A mente, em sua totalidade, é um fenômeno evolutivo. Centenas de milhões de anos
antes que seres orgânicos verbalizassem a vida, eles a reconheciam. Discernir o que
podia matá-los, o que eles podiam comer e com quem podiam acasalar, mais ou menos
nessa ordem, era crucial para a sobrevivência dos animais. Um ministro da Suprema
Corte dos Estados Unidos confessou que, embora talvez não fosse capaz de definir
obscenidade, decerto podia reconhecê-la quando a via. Todos temos uma capacidade
semelhante em relação à vida. Ela vem se reconhecendo desde muito antes de qualquer
livro de biologia ser escrito.” P. 42

“Mudar para permanecer o mesmo é a essência da autopoese. Aplica-se tanto à biosfera
quanto à célula. Aplicado às espécies, conduz à evolução.” P. 44
“A vida, fenômeno local da superfície terrestre, na verdade só pode ser compreendida
em seu meio cósmico. Formou-se de matéria estelar, logo depois que a Terra, há 4,6
bilhões de anos, congelou-se a partir de um resto de explosão de supernova. A vida
poderá terminar em meros 100milhões de anos, quando, em luta contra recursos
atmosféricos cada vez menores e o aumento do calor do Sol, os sistemas de regulagem
global da temperatura finalmente vierem a falhar. Ou então, encerrada em sistemas
ecológicos, ela poderá escapar e, de um porto seguro, assistir ao momento em que o Sol,
esgotando seu hidrogênio, explodir em chama gigantesca, fazendo ferverem os oceanos
terrestres, daqui a cinco bilhões de anos.” P. 44

“Exibir a permissão cartesiana para praticar a ciência produziu resultados. Os
investigadores devolveram a Bíblia e os livros clássicos a suas prateleiras empoeiradas.
Em vez disso, leram a Natureza, “escrita”, como dissera Galileu Galilei (1564-1642),
antes mesmo de Descartes, “num grande livro que está sempre aberto diante de nossos
olhos”. Galileu pagou caro por suas inclinações científicas. Como mecanicista
quantificador, medidor de corpos cadentes e descobridor de luas de Júpiter e da rotação
do Sol, ele preparou o terreno para os sucessores curiosos. Como desafiador de filósofos
poderosos e de teólogos cristãos, Galileu provocou a ira das autoridades eclesiásticas.
Embora, diferentemente de Bruno, não tenha sido queimado na fogueira, aos 58 anos foi
levado perante um tribunal da inquisição e acusado de heresia. Galileu desdisse suas
afirmações anteriores, tão divergentes da doutrina oficial da Igreja, e “admitiu” que a
Terra era o centro do universo.” P. 52

“O filósofo judeu-holandês Baruch Ezpinosa (1632-1677) retratou a matéria e a energia
como a natureza fundamental de um universo que era vivo em si.” P. 56

“Antes mesmo de Darwin, o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) havia
observado que, além de outras, as semelhanças entre esqueletos apontavam para laços
consangüíneos, para um parentesco comum entre todas as formas de vida. Kant admitia
que a totalidade da vida poderia ter surgido por um processo mecânico, parecido com
aquele pelo qual a natureza produzia os cristais, mas julgou que seria absurdo esperar
por “um Newton” capaz de tornar compreensível até mesmo o crescimento de uma
folha de capim, usando tão-somente uma teoria mecanicista. Haeckel propôs Darwin
como o próprio “Newton” que Kant havia julgado impossível.” p. 57

”Dado o legado restrito do dualismo metafísico (mente/corpo, espírito/matéria,
vida/não-vida), talvez não seja de admirar que dois dos mais profundos repensadores da
vida e de seu ambiente no século XX tenham uma perspectiva biosférica comum, mas
opiniões diametralmente opostas. Mas, enquanto o cientista russo Vladimir Ivanovich
Vernadsky (1863-1945) descreveu os organismos como viria a descrever os minerais,
chamando-os de “matéria-viva”, o cientista inglês James E. Lovelock descreveu a
superfície da Terra, inclusive as rochas e o ar, como vivos.” P. 60

“O geólogo austríaco Edward Suess (1831-1914) havia cunhado a palavra “biosfera”,
mas Vernadsky a pôs em uso corrente. Assim como a esfera das rochas é a litosfera e a
do ar é a atmosfera, a esfera em que existe vida é a “biosfera”. Em seu livro de 1926, A
biosfera, Vernadsky mostrou que a superfície terrestre era uma transformação ordeira
das energias solares. “A biosfera”, escreveu, “é, no mínimo, tanto uma criação do Sol
quanto o resultado de processos terrestres. As antigas instituições religiosas que
consideravam as criaturas terrestres como filhos do Sol, em especial o homem, estavam
muito mais perto da verdade do que presumem aqueles que vêem os seres terrestres
como meras criações efêmeras, surgidas da interação cega e acidental da matéria e das
forças. ...A matéria viva como um todo... é, portanto, um sistema único que acumula
energia química livre na biosfera pela transformação da radiação solar.”” P. 62

“Assim como Vernadsky rompeu a cisão mente/matéria através de um exame da matéria
viva em escala global, James E. Lovelock frustrou o dualismo metafísico por um
estratagema inverso – considerando viva a Terra. Vernadsky examinou a vida como
matéria num clima político e cultural receptivo – o ateísmo oficial da antiga União
Soviética, auxiliado pela aprovação do materialismo pela ciência. Em contraste,
Lovelock, retratando a biosfera auto-reguladora, um imenso corpo vivo estranhamente
esférico, que ele chamou de “Gaia” – foi estorvado pela ideologia sutil do mecanicismo
que perpassava a comunidade científica. Isso quer dizer que ele não apenas teve que
mostrar que a Terra se mantinha como um corpo vivo, como também precisou superar o
preconceito de que chamar de viva essa “coisa” não era ciência, mas uma personificação
poética. Dadas essas tensões, é um tributo à engenhosidade desse químico atmosférico
de primeira que sua teoria seja levada a sério como é pelos cientistas em atividade.” P.
63

“Como foi que a matéria num banho de energia (ou a energia numa poção de matéria)
realizou pela primeira vez o feito da vida, ninguém sabe. Nenhuma molécula isolada é
capaz de se reproduzir. A forma de vida mais ínfima da Terra atual é um sistema, uma
esfera diminuta, delimitada por uma membrana, uma célula bacteriana que requer a
interação de muitas moléculas. Cerca de 500 a cinco mil genes compõem um número
similar de proteínas. As proteínas e o DNA se produzem mutuamente, dentro da
membrana celular que eles fabricam juntos. Sendo portadoras de uma bioquímica
comum, é provável que todas as formas de vida datem de um único momento histórico,
talvez (mas não necessariamente) improvável. Os fatores que levaram a matéria a seu
“ponto de fracionamento” peculiar, no qual o comportamento dissipativo transformou-
se em comportamento vivo, só precisam ter ocorrido uma vez. Fechadas por uma
membrana, talvez até subitamente, e dotadas de uma profusão de recursos, as primeiras
células vivas puderam dar-se o luxo de ser meio distantes da realidade externa. Por fim,
ameaçada por seu próprio desperdício e pela insensibilidade da substância da qual se
havia separado – mas da qual dependia integralmente para seu sustento -, a vida ficou
entregue à seus próprios recursos. Quando a matéria desterrou a si mesma, a vida foi
abandonada pelo mundo, mas o mundo não foi a parte alguma. Não havia como voltar
atrás.” P. 69

“Em vista da natureza material conservadora da vida reprodutiva, as células bacterianas
conservam indícios da química da superfície terrestre, tal como esta existiu no passado
remoto. As bactérias foram os primeiros seres verdes a brotarem de nada além do sol,
água e ar. E, sendo ainda os únicos seres aptos a executar muitos truques metabólicos
que nós, os animais, e até mesmo as plantas não somos capazes de fazer, as bactérias
foram as primeiras a respirar oxigênio e a nadar. Elas são os virtuoses da biosfera. São
também nossas parentas, o que provavelmente explica porque nos sentimos à vontade
para difamá-las.” P. 70

“Algumas rochas arqueanas “não-metamorfoseadas” – às que não foram submetidas a
alterações causadas pelo calor e pela pressão – conservam vestígios de vida. Rochas
australianas de 3,485 bilhões de anos contêm 11 ou mais tipos de bactérias fósseis
reconhecíveis. As rochas mais antigas da Terra atual, portanto, contém pelo menos a
idade que lhe poderíamos atribuir empiricamente.” P. 72

“A “produção abiótica” do ATP foi, na verdade, uma continuação do trabalho iniciado
por Stanley L. Miller, um aluno de pós-graduação do ganhador do Prêmio Nobel Harold
Urey (1893-1981), na Universidade de Chicago, em 1953. (...). Os experimentos de
Miller foram repetidos e modificados por muitos químicos entusiasmados. A adenina, a
citosina, a guanina, a timina e o uracil – as cinco bases do ácido nucléico que,
encadeadas, formam moléculas de DNA ou de RNA – foram todos sintetizados em
experimentos de química “pré-biótica”. P. 84s

“Dos seis tipos de átomos que são cruciais para a vida na Terra – carbono, nitrogênio,
hidrogênio, oxigênio, enxofre e fósforo – todos foram detectados no espaço. O
hidrogênio, elemento mais comum no DNA, no RNA, nas proteínas, nas gorduras e em
outros compostos criados pela vida, é também o mais comum no universo. (...). Os
compostos mais simples da vida formam-se facilmente a partir apenas da química” P.
85

“(...). Eric Jantsch (1920-85), um astrofísico e filósofo austríaco-americano, explicou
que,
     Enquanto a energia livre e novos participantes da reação são importados, os produtos finais
     da entropia e da reação são exportados – e aí encontramos o metabolismo de um sistema em
     sua manifestação mais simples. Com a ajuda dessa troca de energia e matéria com o meio, o
     sistema consegue manter seu desequilíbrio interno e, por sua vez, o desequilíbrio mantém
     os processos de troca. Poderíamos pensar na imagem de uma pessoa que tropeça, perde o
     equilíbrio e só consegue evitar uma queda de cara no chão continuando a avançar aos
     tropeços. A estrutura dissipativa renova-se continuamente e mantém um regime dinâmico
     particular, uma estrutura espaço-tempo globalmente estável. Parece interessar-se
     unicamente por sua própria integridade e auto-renovação.”

Entretanto, as estruturas dissipativas, sistemas químicos que usam fluxos de energia
para aumentar sua ordem interna, são raras e têm vida curta. Mas, se a ordem aumentada
é a da vida, então, havendo acesso do sistema a uma fonte de energia e ao tipo certo de
matéria (nutrientes), ela se manterá indefinidamente. Essa é a autopoese. (...) Atinge um
ponto crítico e não para mais de efetuar o metabolismo.” P. 88s

“A vida parece ter se originado em quaisquer que tenham sido os ancestrais primevos
das bactérias modernas. Como sistemas químicos que se transformaram em sistemas
biológicos, esses primeiros seres teriam metabolizado e incorporado energia, nutrientes,
água e sais em seus eus em desenvolvimento. Formaram-se as primeiras células. Como
na analogia de Jantsch sobre a pessoa que avança aos tropeços para não cair de cara no
chão, as células delimitadas por uma membrana, que replicavam RNA e produziam
outras moléculas, avançaram aos tropeços para a síntese do DNA baseada no RNA e nas
proteínas; em outras palavras, a reprodução tornou-se um meio de preservar a auto-
sustentação, de adiar o retorno ao equilíbrio termodinâmico,” p. 91

“É realmente surpreendente que, dentro da visão termodinâmica autopoética, nosso
corpo atual tenha uma química praticamente idêntica a que prevaleceu na superfície
terrestre há três bilhões de anos. (...).
A morte é ilusória num sentido muito real. Como pura persistência da bioquímica, “nós”
nunca morremos, durante a passagem de três bilhões de anos. Montanhas, mares e até
supercontinentes surgiram e se foram, mas nós persistimos.” P. 92
“Em contraste com nossa necessidade humana de vasculhar o meio ambiente em busca
de aminoácidos essenciais, nenhum ser vivo na Terra precisa espreitá-lo à procura de
desoxirribose indispensável a seu DNA. Ao contrário, a desoxirribose é sintetizada nas
células, desviando um átomo de oxigênio da ribose. É a ribose, o açúcar de cinco
moléculas de carbono do RNA, que costuma ser absorvida do exterior como alimento.
O fato de todas as células, ao receberem-na, serem capazes de produzir a desoxirribose a
partir dela sugere que a ribose foi a primeira a aparecer. O RNA, com a ribose, evoluiu
antes do DNA. O metabolismo do açúcar do DNA evoluiu mediante a retirada de
oxigênio dos açucares do RNA. As primeiras células talvez tenham sido seres de RNA,
que só mais tarde evoluíram para sistemas de DNA. Comparar o metabolismo do RNA
e do DNA é um exemplo de olhadela pelas janelas celulares, em busca de pistas das
origens mais remotas da vida.
Outras evidências contestam as pretensões do DNA, a “molécula mestra”, ao trono
bioquímico da vida. O RNA, mais versátil do que ele, é uma escolha melhor como
instrumento replicador do primeiro sistema autopoético da vida. Enquanto o DNA de
hélice dupla usa a desoxirribose em sua cadeia, o RNA, de uma só cadeia, usa a ribose,
material que origina da desoxirribose. Ao contrário do DNA, que tem que usar o RNA
para codificar as proteínas, o RNA pode dirigir sozinho sua replicação e a produção de
proteínas. Em tempos remotos, é provável que o RNA fizesse tudo o que o DNA faz
hoje no interior das células, e mais até.” P. 94

“O RNA, portanto, é um grande candidato à condição de supermolécula da vida
primitiva. Trabalhando em si mesmo enquanto crescia, é possível que ela tenha gerado
uma mescla de possibilidades em expansão. Capaz de se replicar e mutar, agindo como
enzima e como gene, o RNA executa operações que formam novas quantidades dele
mesmo. Podemos hoje imaginar que, na Terra do éon arqueano, foi o RNA delimitado
que desenvolveu sistemas de replicação e informação, ao iniciar, seqüestrado no interior
de gotas de óleo, a jornada para a autopoese. Assim, o atual mundo do DNA em que
estão todas as formas de vida pode ter se desenvolvido em células de RNA do “mundo
do RNA”, expressão cunhada em 1986 por Walter Gilbert, biólogo da Universidade de
Harvard que foi laureado com o Prêmio Nobel.” P. 95s

“No estado normal de vigília o corpo humano queima açucares aeróbicamente, usando
átomos de oxigênio retirados do ar. Nas atividades estafantes, no entanto, o corpo volta
a um metabolismo distinto: os músculos fermentam açucares, do mesmo modo
anaeróbico inventado pelas bactérias primitivas. Assim, quando sob tensão, nosso corpo
“recorda” as épocas anteriores ao momento em que a atmosfera ficou repleta de
oxigênio. Essas rememorações fisiológicas reapresentam as condições ambientais do
passado e os corpos que se desenvolveram para viver nelas. Num sentido muito real,
todos os seres de hoje preservam traços da biosfera mais primitiva da Terra.” P. 96

“Morowitz (Harold Morowitz – biofísico norte-americano) enfatizou que, no meio
aquoso em que surgiu a vida, era necessária uma barreira não-aquosa para separar a
célula do meio que a cercava. “Ser uma entidade distinta do ambiente exige uma
barreira a difusão livre. A necessidade de isolar um sub-sistema termodinamicamente é
uma condição irredutível da vida. É o fechamento de uma membrana anfifílica de duas
camadas, sob a forma de uma vesícula, que representa a transição clara da não-vida para
a vida.” Considerada em termos materiais, como um sistema de matéria e energia, a
vida é reconhecível por sua separação parcial do meio ambiente através de uma
membrana.” P. 96
“A vida é a representação, a “presentificação” de químicas passadas, de um ambiente
pretérito da Terra primitiva que, em virtude da vida, persiste na Terra moderna. É a
encapsulação aquosa do espaço-tempo delimitada por uma membrana. A morte faz parte
da vida porque até a matéria agonizante, uma vez reproduzida, resgata complexos
sistemas químicos e estruturas dissipativas florescentes do desequilíbrio termodinâmico.
A vida é um eixo de crescente sensibilidade e complexidade, num universo de matéria-
mãe que, comparada a ela, parece embotada e insensível. Ela tem que se manter,
contrariando a tendência universal do calor a se dissipar com o correr do tempo. Essa
visão termodinâmica explica, de certo modo, a determinação, o caráter deliberado da
vida: durante bilhões de anos, ela tem estado presa a um padrão do qual, mesmo se
quisesse, não poderia sair, e que consiste em aumentar a aposta à medida que ela
avança. É que a própria vida consiste nesses padrões de conservação química, num
universo que tende para a perda de calor e a desintegração. Preservando o passado e
estabelecendo uma diferença entre o passado e o presente, a vida vincula o tempo,
ampliando a complexidade e criando novos problemas para si mesma.” P. 97

“Finalmente a teoria do contágio microbiano foi amplamente aceita. Tipos diferentes de
bactérias foram implicados no antraz, na gonorréia, na febre tifóide e na lepra. Os
micróbios, antes pequenas anomalias divertidas, foram transformados em demônios.
Pasteur, e depois dele Howard Hughes, tinha fobia à sujeira e aos germes. Evitava os
apertos de mão. Esfregava e secava a louça de barro que utilizava, procurando
meticulosamente indícios de madeira, lã e outros detritos em seus alimentos. Não mais
sendo um escândalo divertido para as conversas de salão, os micróbios transformaram-
se num “outro” virulento, a ser destruído. A metáfora das tenazes bactérias infecciosas
foi usada na retórica nazista do genocídio. Hoje em dia, a baixa estima que se tem pelas
bactérias, como “agentes patológicos” liliputianos, continua a obscurecer sua enorme
importância para o bem-estar de todo o restante da vida.” P. 101

“A observação de que as arqueobactérias habitam meios desprovidos de oxigênio –
como o fundo dos oceanos, o estômago dos bovinos, a água dos esgotos, pobre em
oxigênio, e as fontes termais ácidas do Parque Nacional de Yellowstone – é compatível
com a imagem contemporânea de uma Terra quente no éon arqueano, na qual haveria,
quando muito, vestígios de oxigênio na atmosfera. O oxigênio só foi liberado na
atmosfera depois que as bactérias verde-azuladas desenvolveram um modo de usar a
energia da luz solar para quebrar as moléculas de água (H2O) e captar seu precioso
hidrogênio. Combinando o hidrogênio com os átomos de carbono extraídos do dióxido
de carbono, abundante na época, essas cianobactérias conseguiram fabricar DNA,
proteínas, açucares e todos os seus outros componentes celulares. Tais bactérias,
altamente necessitadas de luz, espalharam-se rapidamente pelas águas ensolaradas de
todas as partes da Terra arqueana. Ao fazê-lo, liberaram vastas quantidades de oxigênio
molecular que restara de sua busca de hidrogênio na água.
Com isso, a atmosfera terrestre tornou-se uma extensão do metabolismo das bactérias
em evolução. Somente através do trabalho das bactérias mais inovadoras de todos os
tempos é que a Terra, originalmente anóxica, recebeu uma atmosfera rica em oxigênio.
A princípio, o planeta fora povoado por produtores de metano, amantes do enxofre e
outros anaeróbicos – seres que não produziam nem usavam oxigênio em seu
metabolismo.” P. 103
“Elas podem ser as formas biológicas mais minúsculas da Terra, mas deram passos
gigantescos na evolução. As bactérias inventaram até a multicelularidade. A maioria das
que existem na natureza, a despeito da crença popular, é multicelular. Nesses seres
bacterianos multicelulares, cada célula é em si uma célula bacteriana.
Algumas linhagens de bactérias evoluíram para muitas espécies de seres diferentes,
inclusive nós mesmos. No interior das células de todos nós existem, neste momento,
antigas bactérias que usam oxigênio para gerar energia. Trata-se das mitocôndrias. Os
seres verdes-azulados fotossintéticos e seus descendentes (os plastídios das plantas)
retiram dióxido de carbono da atmosfera, usando o carbono em seu corpo e eliminando
como resto o oxigênio do ar fresco – apenas uma pequena porção do qual é usada pelas
mitocôndrias, que coabitam com o que um dia foram bactérias fotossintéticas em todas
as células vegetais.” P. 103

“Nossos planetas vizinhos, Marte e Vênus, têm atmosferas com mais de 90 por cento de
dióxido de carbono. O ar da Terra, no entanto, é uma mistura reativa, com sua imensa
parcela de oxigênio e menos de 0,1 por cento de dióxido de carbono. Foram as bactérias
que retiraram o dióxido de carbono e produziram o oxigênio. Na verdade, foram elas
que transformaram o meio ambiente planetário no que ele é hoje.
Todos os seres maiores contêm mitocôndrias em suas células, como descendentes vivos
das bactérias que viveram na Terra antes de o oxigênio se acumular no ar. A vida na
Terra é uma holarquia, uma rede fractal aninhada de seres interdependentes.” P. 104

“O medo das bactérias é, de certo modo, um medo da vida, medo de nós mesmos num
estágio anterior de evolução. Não é de admirar que hoje os micróbios nos considerem
tão atraentes. Uma vez que os compostos de carbono e hidrogênio de todos os
organismos já se encontram num estado ordenado, o corpo humano (como o de
qualquer outro ser vivo) é uma fonte de alimento desejável para essas formas biológicas
minúsculas. As bactérias procuram-nos como fontes de manutenção autopoética, em sua
antiqüíssima luta contra o equilíbrio termodinâmico.” P. 104

“Talvez devamos consolar-nos com o fato de a matéria de nosso corpo, depois da morte,
retornar não a um estado de matéria inerte, mas à ordem bacteriana que sustenta a
biosfera. “Não vedes”, escreveu Giordano Bruno, “que o que foi semente virá a ser erva
verde, e que a erva se transformará em espiga, e a espiga em pão? O pão se transformará
num líquido nutriente, que produzirá o sangue e, a partir do sangue, o sêmen, o embrião,
os homens, os cadáveres, a Terra, a rocha e os minerais, e assim, a matéria mudará de
forma para sempre e será capaz de assumir qualquer forma natural,”” p. 104

“O desejo de conservar a juventude, a forma mais atraente que temos e, em última
instância, a própria vida, é frustrado no nível dos corpos animais. Porém nossa derrota
individual é uma vitória para as bactérias, que devolvem os compostos de hidrogênio e
carbono de nosso corpo a um meio ambiente vivo. Estando mais próximas das
estruturas originais da vida, as bactérias não vivem como nós, rumando para a morte.
Salvo por um acidente infeliz, uma mutação ou um encontro com outra bactéria que
resulte numa troca de genes, uma única célula bacteriana pode “sobreviver”
essencialmente para sempre em sua forma original, à medida que gerações após
gerações de cópias bacterianas dela mesma são produzidas pela divisão celular.
Cada um de nós, criaturas pluricelulares, é uma estrutura celular em desequilíbrio, assim
como uma bactéria é uma estrutura de matéria em desequilíbrio. A humanidade como
espécie e até todo o reino animal têm uma existência muito mais frágil do que a delas –
do mesmo modo que sua existência é mais tênue que a da matéria não-viva.” P. 104

“Todas as outras formas biológicas dependem do funcionamento de incontáveis
bactérias que vivem, morrem e efetuam o metabolismo. Nossas relações com as
bactérias que nos cercam por todos os lados entram como componentes de nossa saúde
e bem-estar de nosso solo, nossos alimentos e nossos animais de estimação. Por mais
nuas e simples que se afigurem as células bacterianas, elas estão permanentemente
ocupadas, tanto no nível celular quanto no planetário. Existem variedades de bactérias
que fazem a fotossíntese sem jamais liberar oxigênio, mas que usam dióxido de carbono
e hidrogênio para produzir todas as suas partes celulares. Outras incorporam o dióxido
de carbono e hidrogênio do ar em proteínas do corpo, convertendo seus dejetos em gás
metano. Outras, ainda, transformam o sulfato em sulfeto, ou incorporam nitrogênio
inerte em seu corpo. Somente os cidadãos do reino bacteriano são tão bem dotados em
termos metabólicos. Quando se descobre um animal (como o cupim, que produz
metano) ou uma planta (como a vagem, que começa a se suprir de nitrogênio a partir de
suas raízes) com essas habilidades metabólicas, é porque elas cooptaram corpos
bacterianos para sua especialização. Essa tomada de empréstimos também se aplica à
biotecnologia praticada pelos seres humanos que usam jalecos brancos nos laboratórios.
Nós, os seres humanos, não “inventamos” micróbios patenteáveis, mediante a
recombinação genética; antes, aprendemos a explorar e a manipular a antiga propensão
das bactérias a permutar genes.” P. 105s

“Esse ser de dimensões planetárias, sensível desde o começo, tornou-se mais expansivo
e auto-reflexivo à medida que, nos últimos três bilhões de anos, evoluiu para longe do
equilíbrio termodinâmico. Imagine que, num barzinho, você esbarre num sujeito de
cabelos verdes. Ao fazê-lo, adquire essa parte de sua dotação genética, talvez com mais
alguns outros itens novos. Não só você agora poderá transmitir o gene dos cabelos
verdes a seus filhos, como sairá do bar com o cabelo dessa cor. As bactérias entregam-
se o tempo todo a esse tipo de aquisição rápida e informal de genes. Ao se banharem,
liberam seus genes no líquido circundante. Se aplicarmos a elas a definição padrão de
espécie – um grupo de organismos que só se cruzam entre si -, diremos que todas as
bactérias do mundo pertencem a uma única espécie.” P. 106

“É comum as células bacterianas terem cadeias extras de DNA, isto é, conjuntos extras
de genes. Esses genes podem ser permutados como pedaços nus, chamados plasmídeos,
ou como pedaços revestidos de proteínas, chamados vírus. Em algumas bactérias,
forma-se uma ponte celular entre a que está doando seus genes e a que os recebe. Esse
processo de criação de uma ponte celular pela qual os genes são enviados, chamado
conjugação, distingue-se do sexo dos mamíferos. As células bacterianas não se fundem
nem os “genitores” fazem contribuições iguais para seus rebentos. Em vez disso, uma
bactéria, a “doadora”, passa seus genes numa direção para a “receptora”, que não
retribui a gentileza. Ainda assim, essa conjugação satisfaz os requisitos mínimos de um
ato sexual biológico, visto que a transferência dos genes produz uma nova bactéria, um
“recombinante genético” com genes de mais de um genitor.” P. 107

“Há mais espécies de besouros habitando a Terra do que qualquer outra forma de vida,
mas as bactérias são, de longe, os organismos terrestres mais numerosos. Consideradas
em conjunto, elas são também os mais diversificados. São os mais antigos, os que
tiveram mais tempo para evoluir, tirando pleno proveito dos habitats variados do
planeta, inclusive dos ambientes vivos dos demais seres com que convivem.” P. 109

“Por permutarem genes e adquirirem novos traços hereditários, as bactérias ampliam
sua capacidade genética – em minutos, ou, no máximo, em horas. Um imenso pool
genético planetário dá origem a “tipos” ou “cepas” bacterianos temporariamente
classificáveis, que se alteram rapidamente de maneira radical, em consonância com as
condições do meio ambiente. As bactérias da água, do solo e do ar são como células de
um ser global crescente. Enquanto os genes que você carrega ficam no interior de um
corpo com uma duração biológica distinta, as bactérias captam e doam os genes de seu
corpo no e para o meio ambiente. Embora, é claro, como todas as formas de vida, eles
possam morrer por inanição, calor, sal e dessecação, normalmente esses micróbios não
morrem. Enquanto o ambiente o permite, as bactérias crescem e se dividem, livres do
envelhecimento. Ao contrário do corpo dos mamíferos, que amadurece e morre, o corpo
bacteriano não tem limites. Como estrutura em desequilíbrio, cuspida por um universo
em evolução, ele é, em princípio, imortal. Retirando ordem de um universo
desordenado, a silenciosa biosfera bacteriana precedeu todas as plantas, animais, fungos
e até os progenitores protoctistas de todas essas formas biológicas maiores. Sem a
biosfera bacteriana, nenhuma outra forma de vida teria evoluído nem viveria
atualmente.” P. 109s

“A vida fermentativa e sem paredes celulares aproveitou a “boca-livre”, utilizando os
açucares disponíveis e outros compostos ricos em energia do doce meio ambiente
primevo. Nenhuma das bactérias foi obrigada a produzir seu próprio alimento. Mas, em
algum momento, o acúmulo das gerações em expansão fez com que o alimento
diminuísse mais depressa do que era restaurado. A crise era inevitável. (...).
A mais importante inovação metabólica da história do planeta foi a evolução da
fotossíntese. Através dela, a vida se libertou da escassez de energia; daí por diante,
passou a ser primordialmente limitada pela escassez deste ou daquele componente
material. A fotossíntese surgiu nas bactérias. Garimpando a energia da luz solar, esses
primeiros produtores de viveres (provavelmente, coletores de sulfeto de coloração
verde, como o moderno Chlorobium) geraram alimento e energia utilizável para o resto
da biosfera.” P. 112s

“Para a vida, a forma mais importante de radiação que incide sobre a superfície da Terra
não é nem a radiação ultravioleta de ondas curtas, que destrói os processos bioquímicos,
nem a radiação infravermelha de baixa energia e ondas mais longas, que os seres
humanos percebem como calor. A vida depende, antes, da radiação de ondas médias da
luz visível. Na fotossíntese, a energia de um fóton de luz solar visível excita um elétron
em uma molécula de clorofila, que transfere então a energia excedente para uma
molécula de ATP. A grande contribuição do ATP para a vida está em que ele permite
que um ser orgânico use a energia quando necessário – e não apenas quando o Sol (ou o
alimento ingerido) a torna disponível. O ATP é a forma eletiva de a vida poupar para o
futuro.” P. 113

“Ao liberar oxigênio, as bactérias verde-azuladas envolveram o mundo em átomos de
oxigênio. O oxigênio acelerou as mudanças, ao aumentar a velocidade das reações
químicas. Superando largamente em número suas irmãs purpúreas, as algas verde-
azuladas invadiram como um enxame a zona fótica – a região iluminada e irradiada pelo
Sol, que se estende até não mais de duzentos metros abaixo da superfície dos oceanos.
Nos meses mais quentes, as cianobactérias cresciam com o máximo de vigor.
Deslizando viscosamente pelas superfícies, aprisionando e ligando os sedimentos, elas
foram formando recifes ao longo das zonas costeiras e nas massas terrestres úmidas
semelhantes a tecidos.” P. 117

“Dois bilhões de anos atrás, não apenas o ferro, mas também o enxofre, o urânio e o
manganês oxidaram-se no mundo inteiro. Expostos ao gás da excreção bacteriana,
transformaram-se em hematita, pirita, uraninita e dióxido de manganês. Com o aumento
do oxigênio atmosférico, o ferro estriado, que abriga minerais não-oxigenados, deu
lugar aos “leitos vermelhos” – formações ferruginosas que se formaram em todo o
mundo. O registro rochoso dos minerais oxidados da crosta terrestre atesta o acréscimo
de oxigênio da nossa atmosfera planetária durante um intervalo de 400 milhões de anos,
entre 2,2 e 1,8 bilhões de anos atrás. Acabou não restando mais nenhum mineral que já
não houvesse reagido com o oxigênio, de modo que o gás excedente, que não mais tinha
para onde ir, começou a acumular no ar.” P. 117

“Longe de destruir o planeta, o oxigênio o energizou. Em sistemas muito distantes do
equilíbrio, os produtos da excreção necessariamente se acumulam. Mas o que pode ser
lixo para uns é alimento ou material de construção para outros.” P. 118

“Todo e qualquer ser orgânico da Terra é feito de um dentre apenas dois tipos de
células. O nosso tipo – e de outros animais, fungos, plantas e protoctistas – possui
núcleo. O outro tipo, a célula bacteriana, não é nucleado. Em 1937, Edouard Chatton,
um biólogo marinho francês, deu a este último tipo de célula o nome de “procariótica”;
os organismos que a possuem são procariotos (ou procariontes). Todos os demais somos
eucariotos (ou eucariontes), feitos de células nucleadas. Portanto, a presença de um
núcleo delimitado por uma membrana define a célula como “eucariótica”. Todos os
eucariotos vêm dos protoctistas; as bactérias, não.” P. 127

“A girafa é um organismo eucariótico, feito de células eucarióticas. O mesmo se aplica
as margaridas. E às amebas. As diferenças de comportamento, genética, organização,
metabolismo e, sobretudo, estrutura entre os procariotos e os eucariotos são muito mais
drásticas do que qualquer diferença entre plantas e animais. Tais diferenças marcam o
grande divisor celular. Os procariotos e os eucariotos formam, portanto, os dois
“supergrupos” biológicos da Terra. (...).
A via de transição entre os dois supergrupos é obscura. A evolução dos procariotos para
os eucariotos, das bactérias para os protoctistas, foi uma “ruptura de simetria” que
catapultou a vida para um nível maior de complexidade e lhe deu potenciais e riscos
diferentes. Não só pela mutação gradual, mas também, subitamente, através de alianças
simbióticas, formaram-se os primeiros eucariotos” P. 129

“Os organismos formam muitos tipos de simbioses, porém a mais assombrosa é a
associação excepcionalmente estreita que se conhece como endo-simbiose. Trata-se de
uma relação em que um ser – microbiano ou maior – vive não apenas perto de outro
(nem tampouco permanentemente em cima dele), mas em seu interior. Na endo-
simbiose, os seres orgânicos se fundem. Ela é como um encontro sexual duradouro, só
que os participantes são membros de espécies diferentes. Aliás, algumas ligações endo-
simbióticas tornaram-se permanentes.” P. 132
“A simbiose produz novos indivíduos. “Nós” não poderíamos sintetizar as vitaminas B
e K se não houvesse bactérias em nosso intestino. As vacas e cupins não seriam os
mesmos sem os fermentadores natatórios que habitam seu sistema digestivo – protistas
e bactérias que decompõem o capim e a madeira. Algumas algas que vivem no interior
de platelmintos transparentes são tão boas provedoras que estes têm a boca atrofiada; os
platelmintos verdes de boca fechada “tomam banho de sol”, em vez de procurar
alimento, e as algas endo-simbióticas até reciclam a excreção de ácido úrico desses
vermes, transformando-o em alimento.” P. 133

“Atualmente, a maioria das células dos protoctistas e todas as células de plantas,
animais e fungos contêm mitocôndrias. A respiração de oxigênio que mantém vivos os
membros dos quatro reinos biológicos mais novos ocorre no interior dessas organelas.
(Como os órgãos no interior do corpo, as organelas são estruturas funcionais dentro das
células eucarióticas). As organelas mitocondriais parecem bactérias. Chegam até a
crescer e se dividir em duas, com ritmo próprio, no interior da célula maior. Acredita-se
que elas tenham vindo de bactérias – mas, depois de mais de um bilhão de anos de
associação, não podem sobreviver fora dos limites celulares.” P. 133

“Qualquer que tenha sido o cenário exato da aquisição da motilidade e dos talentos às
vezes respiratórios e fotossintéticos dos eucariotos, a simbiose certamente deve fazer
parte dessa narrativa. As simbioses íntimas foram essenciais para a evolução das
células.” P. 141

“(...), as mitocôndrias de nossas células vieram de bactérias que nem evitavam nem
simplesmente toleravam o oxigênio. As bactérias que evoluíram para mitocôndrias, as
quais são matrilinearmente transmitidas – somente o óvulo as lega ao embrião humano -
, exploraram a grande reatividade do oxigênio.” P. 141

“Enquanto, em média, duas moléculas de ATP são produzidas pela fermentação de uma
molécula de açúcar, essa mesma molécula de açúcar, com a evolução da respiração,
passou a gerar até 36 moléculas de ATP. As novas bactérias – inclusive os ancestrais de
nossas mitocôndrias – recuperavam energia das moléculas de açúcar com mais de 15
vezes a eficiência de suas predecessoras, envenenadas pelo oxigênio.” P. 142

“Através da simbiose, diferentes variedades de bactérias se uniram e produziram células
nucleadas. Muitas vezes, essas células nucleadas clonavam-se em cópias múltiplas, que
permaneciam em contato físico após a reprodução. Um Parameciem ou Euglena é uma
célula “individual” nucleada, já fascinante por sua mistura de seres vivos. Mas a vida
vegetal, animal e fúngica, ampliou enormemente a complexidade das células protistas
de vida livre, repetindo-as para gerar cópias multicelulares que acabaram evoluindo para
tecidos separados, como o tecido reprodutor e o tecido nervoso, dotados de funções
distintas.” P. 146s

“Qualquer protoctista, planta, fungo ou animal é membro de uma espécie. É muito
provável que os protoctistas tenham sido os primeiros seres orgânicos a constituir
espécies e os primeiros cujas espécies se extinguiram. A origem de indivíduos que são
todos pertencentes a uma mesma espécie é idêntica à origem dos primeiros protoctitas.
O microbiologista canadense Sorin Sonea chama atenção para uma questão interessante,
ao afirmar que as bactérias, por trocarem genes reversivelmente em escala planetária,
não têm verdadeiras espécies. As espécies são grupos cujos membros cruzam entre si.
Todas as bactérias do planeta, em princípio, podem cruzar umas com as outras. Quando
muito, poder-se-ia dizer que formam uma única espécie global.” P. 147

“A demarcação das espécies, portanto, é muito mais aplicável aos protoctistas, nos quais
ela de fato apareceu pela primeira vez; o mesmo se deu com a sexualidade – do tipo
“meiótico”. De um modo fatídico para a história futura de formas biológicas como nós,
a sexualidade, nos protoctistas, passou a estar inextricavelmente ligada à morte. As
bactérias podem ser mortas, mas não morrem naturalmente. Alguns protoctistas, em
especial os ciliados e os micetozoários, diversamente das bactérias, envelhecem, mesmo
que as condições externas sejam adequadas à saúde. O envelhecimento e a morte, nos
quais as células vivas se desintegram em prazos previsíveis, desenvolveram-se
inicialmente nos protoctistas sexuados. A morte “programada”, como ponto final do
metabolismo de uma vida inteira, inexistia na origem da vida – e muito tempo depois
dela.” P. 148

“Houve época, segundo acreditamos, em que a alimentação e o acasalamento eram a
mesma coisa. A indigestão microbiana terminal talvez pareça bem pouco romântica
como fonte do impulso sexual humano. (...). Em tempos de escassez, nossos ancestrais
unicelulares mais primitivos deviam alimentar-se desesperadamente uns dos outros. De
vez em quando, suas membranas deviam fundir-se.” P. 150

“Tendo sido, originalmente, talvez canibais aflitos, os protistas cromossomicamente
duplicados são nossos ancestrais. Os seres humanos e todos os animais herdaram a
morte desses eucariotos primitivos. Cada geração começa onde a última acabou e,
dependendo de quem sobreviva, cada uma segue um curso ligeiramente diferente. No
correr do tempo, isso leva a novas espécies.” P. 151

“Quando o alimento é abundante, as amebas comem sozinhas. Mas, quando ele
escasseia, cada célula faminta segrega um composto que exerce uma atração mútua. As
amebas movem-se em direção à concentração mais alta. Juntas, as células se fundem e
formam um “grude” móvel, que cresce verticalmente numa massa pegajosa, até que sua
“cabeça” estoura e libera cistos de paredes robustas, passíveis de ser transportados em
segurança pelo vento e pela água. Quando os cistos chegam a um meio ambiente
clemente, começa uma nova geração de amebas.” P. 151

“Examinar nossa origem nos protoctistas leva-nos à humildade. Não há como negar
nosso parentesco com esse tipo de matéria viva. Os seres humanos são colônias
integradas de seres amebóides, assim como os seres amebóides – os protoctistas – são
colônias integradas de bactérias. Querendo ou não, viemos do lodo.” P. 151

“A vida é uma extensão do ser para a geração seguinte, para a espécie seguinte. É a
engenhosidade de tirar o máximo proveito da contingência – de criar animais, por
exemplo, a partir de uma tentativa atamancada de canibalismo. A vida é maior do que a
célula ou o organismo. Inclui a biosfera, o meio ambiente da superfície planetária como
um todo – desde a formação de nuvens marinhas até o controle da química dos oceanos
pelos protoctistas e seus progenitores.” P. 154

“Os animais são montagens multicelulares que sempre se desenvolvem a partir de uma
única célula. Um espermatozóide nadador (dotado de undulipódios) penetra num óvulo
e o fertiliza. Em seguida, já fertilizado, o ovo se divide em duas, quatro, oito e mais
células, que compõem a fase embrionária da blástula, essência da animalidade.” P. 157

“Os fósseis revelam que os animais evoluíram antes das plantas ou fungos. Os animais –
exclusivamente animais marinhos – começaram a deixar um rico registro fóssil no
início da era paleozóica. Mas não há vestígios de plantas nem fungos até se passarem
mais de 100 milhões de anos depois do surgimento de animais providos de carapaças.
Mesmo hoje, os animais – sendo típicos nesse aspecto, já que a vida desenvolveu-se na
água – são mais abundantes nos meios aquáticos do que em terra. Apenas os vegetais e
fungos são criaturas paradigmaticamente terrestres. Os micróbios tiveram que se
aventurar pelas regiões de terra antes que esses reinos mais novos pudessem evoluir
nelas.” P. 157

“Não só os animais têm consciência, como todo ser orgânico, toda célula autopoética é
consciente. No sentido mais simples, a consciência é um dar-se conta do mundo
externo. E esse mundo não precisa ser o mundo externo à pelagem de um mamífero.
Também pode ser o mundo externo à membrana celular. Sem dúvida, algum nível de
consciência e de reatividade decorrente dessa consciência está implicado em todos os
sistemas autopoéticos. Afinal, o mundo não é uma placa de Petri e não chove Agar do
céu. Todo ser vivo sente e reage incessantemente e com vivacidade aquilo que o cerca.”
P. 161

“Todos os animais têm uma etapa multitissular em sua história de vida. Mas a química
complexa da vida ainda se restringe à célula, cujo diâmetro pequeniníssimo tem menos
de um único mícron. Cada geração de toda sorte de animais retorna à célula única do
tipo ancestral como o ovo fertilizado. O aumento do tamanho e da complexidade da
vida animal ocorreu à medida que células socialmente agregadas evoluíram e formaram
corpos unificados.” P. 161

“Os animais – todos com genitores bissexuais e ovos fertilizados que formam embriões
– amadurecem, transformando-se em reprodutores sujeitos à morte individual
programada. Apesar de sua diversidade e exuberância, eles são novatos evolutivos. Os
primeiros animais desenvolveram-se num mundo rico em oxigênio, com grandes massas
continentais e mares abertos – um mundo não muito diferente do que hoje nos sustenta.
Mas, na época de seu aparecimento, 80 por cento da história da vida – até ali – já se
havia desenrolado.” P. 162

“Habitantes dos oceanos desde o começo, os primeiros animais só apareceram no
registro fóssil no fim do éon proterozóico, há uns 600 milhões de anos. Os famosos
trilobitas, animais marinhos do início do período cambriano, são ainda mais recentes.
As provas claras de fósseis abundantes de animais providos de partes duras datam de
menos de 600 milhões de anos atrás. Como faz a maioria dos animais de hoje, todos
viviam na água do mar. Pouquíssimos ancestrais dos animais modernos – alguns
craniados, vermes, insetos, aranhas e moluscos – conseguiram deixar para trás o oceano
e sobreviver em terra.” P. 162

“O menor animal existente hoje é o Trichoplax – uma criatura sem cabeça nem cauda,
descoberta a se arrastar de barriga pela lateral de um aquário marinho da Filadélfia, em
1965. Não fosse por sua vida sexual e seu embrião, o Trichoplax seria um protoctista.
Deslizando sobre seus undulipódios, assemelha-se superficialmente a uma larva de
mixomiceto ou a uma ameba gigante. Mas é um ser multicelular durante toda a sua vida
e um verdadeiro animal. Tem mais undulipódios no ventre do que no dorso. Não tendo
cabeça nem cauda, lado direito ou esquerdo, nem tampouco olhos ou estômago, esse
lento e minúsculo rastejador só revela o segredo de sua animalidade na reprodução.
Após a fusão com o espermatozóide, o ovo esférico do Trichoplax transforma-se numa
blástula embrionária que, com a continuidade da divisão celular, achata-se e, à
semelhança das amebas, é expelida. Embora você não quisesse pendurar um retrato dele
em sua sala, é provável que o Trichoplax tenha uma forte semelhança com nossos
ancestrais animais mais primitivos.” P. 165

“A transição da célula para a sociedade celular e o organismo animal é uma antiga
história na evolução: os indivíduos agrupam-se em sociedades, as quais, por sua vez,
tornam-se indivíduos. Sob pressões intensas da seleção, os protistas nadadores
transformaram-se em protoctistas coloniais. Depois, na fase final do éon proterozóico,
surgiram corpos de animais parecidos com o Trichoplax. A especialização de um
número maciço de células em indivíduos integrados encontra-se na base da vida animal
– e na dos grupos posteriores de fungos e vegetais.” P. 166

“Na verdade, toda a nossa vida, do ventre até o túmulo, é uma etapa intermediária no
ciclo de vida de minúsculas células fundidas. Os animais emergem numa outra
dimensão, da vida visível e da consciência, apenas para voltar, através da sexualidade, a
seu antigo estado microbiano unicelular. A morte é o preço que todos pagamos por essa
antiga história de composição multicelular, por essa incapacidade de os protistas
famintos desfazerem suas amarras da era proterozóica. O que “morre” é o corpo, a carne
adulta, depois de haver liberado na água ou num líquido corporal o espermetazóide
caudado, semelhante a um protista, e o óvulo, mais rechonchudo. A vida animal só
ressurge a partir de predecessores protoctistas. Os protoctistas com ciclos complexos de
fertilização, multicelularidade e meiose tornam-se animais.” P. 168

“Como a morte programada, o sexo não é intrínseco à vida. Ele evoluiu. As células dos
diferentes tipos de parceiros protoctistas de hoje, a princípio tinham aparência idêntica.
A fusão sazonal e a restauração do número de cromossomos na fertilização prepararam
o terreno para a origem do sexo. Os primeiros parceiros sexuais encontraram-se
apressadamente num ambiente aquoso da época, como fazem os protoctistas atuais.
Reagindo às ligeiras diferenças químicas de cada um, os parceiros se uniram. As
esponjas, os ouriços-do-mar, os peixes e até os gametas dos mamíferos, como seus
ancestrais protoctistas, ainda têm seus encontros em lugares aquosos.” P. 168

“Os numerosos e minúsculos espermatozóides dos machos, comparados aos óvulos
pouco numerosos e maiores das fêmeas, foram o início de uma assimetria evolutiva que
hoje se estende pelos campos do debate político, sociolingüístico e psicológico. Os
biólogos evolucionistas sugerem que a desigualdade sexual primitiva – os machos
maximizavam a reprodução, inseminando o maior número possível de fêmeas,
enquanto, depois de um certo limite, o acasalamento tornava-se supérfluo para as
fêmeas, cerceada pela dedicação a sua quantidade menor de óvulos – está por trás
atitudes distintas de machos e fêmeas em relação ao sexo.” P. 169

“As bactérias e os protoctistas prepararam o terreno. Eles, e não os animais,
introduziram a recombinação do DNA, a locomoção, a reprodução que levou ao
crescimento exponencial, a fotossíntese e os esporos resistentes à fervura. Eles, e não os
animais, foram os pioneiros da simbiose e da organização de indivíduos a partir de
coletividades multicelulares. Eles inventaram a motilidade intracelular (inclusive a
mitose), os ciclos complexos de desenvolvimento, a meiose, a fusão sexual, a
individualidade e a morte programada. Os micróbios procrarióticos, e não os animais,
ou os vegetais, ainda dirigem todos os ciclos geoquímicos que tornam o planeta
habitável.” P. 170

“Entre os espécimes mais tocantes do xisto de Burgess encontra-se a Pikaia, o primeiro
membro conhecido de nosso grupo dos cordados – aquele a que pertencem os seres
humanos e todos os outros animais providos de espinha dorsal. A Pikaia, uma criatura
nadadora segmentada, vermiforme, é discreta, se comparada a formas mais
espetaculares de Burgess. Mas tem nas costas um sólido bastão cartilaginoso – a
notocórdia. Essa estrutura universal dos cordados, quando não está presente no adulto,
faz uma aparição fugaz nas larvas ou noutros estágios imaturos do ciclo de vida. Até a
descoberta da Pikaia no xisto de Burgess, não se conhecia nenhum cordado proveniente
de rochas com mais de 450 milhões de anos, depositadas durante o ordiviciano, o
período geológico posterior ao cambriano.” P. 171

“Aqueles dentre nós que sucumbem à morte programada e cujos restos mortais não são
devorados como carniça, nem tampouco incinerados, vão para o submundo fúngico. As
substâncias químicas de nosso corpo são devolvidas a terra. Os fungos mantêm a
reciclagem dos compostos da vida. O funcionamento global do reino dos Mychota é tão
regular quanto o de um rim ou um fígado. Nós, com nosso passado nômade, ainda
estamos nos adaptando à idéia de que, num sistema fechado, os frutos de nosso trabalho
e nossos esforços não podem acumular-se indefinidamente. Têm que ser distribuídos,
devolvidos ao sistema de onde vieram. Essa é uma lição difícil: a matéria de nosso
corpo, nossa propriedade e nossa riqueza, não nos pertence. Pertence à Terra, à biosfera,
e, queiramos ou não, é para lá que se destina, sempre. Os fungos ajudam-na a chegar
lá.” P. 200

“A vida é uma rede de alianças cruzadas entre reinos, da qual o reino Mychota é um
participante voluntário e habilidoso. A vida é uma orgia de atrações, desde a trapaça das
“flores” falsas até o estranho fascínio das trufas e de alucinógenos difíceis de engolir.
Tal como os fungos, a vida tanto procura o submundo do solo e da podridão quanto às
paisagens ensolaradas, carregadas de seres fotossintéticos. A vida é auto-renovadora, e
os fungos, como recicladores, mantêm toda a superfície planetária fervilhando de vida.
Transmigrando a matéria, os bolores e os micélios encontraram sua vocação. Criando e
destruindo, atraindo e repelindo, garantindo e derrubando, eles são partes integrantes da
terra firma.” P. 201.

“”A ação da radiação solar nos processos terrestres fornece uma base precisa para
considerarmos a biosfera como um mecanismo tanto terrestre quanto cósmico. O sol
transformou por completo a face da Terra ao penetrar na biosfera, que modificou a
história e o destino de nosso planeta, convertendo os raios solares em novas e variadas
formas de energia. Ao mesmo tempo, a biosfera é, predominantemente, um produto
dessa radiação. (citação de Vladimir Vernadsky).”” P. 203

“A fonte suprema de toda a energia, crescimento e comportamento da vida é o Sol.
Queimando como um frio fogo verde, os seres fotossintéticos transmudam a luz solar
neles mesmos. Os protoctistas (cocolitoforídeos, diatomáceas e algas marinhas) são os
principais transmutadores no mar; as plantas são os principais em terra.” P. 205

“A economia provém da vida fotossintética e do sol. Os fotossintetizadores utilizam a
radiação solar para produzir a fria moeda em espécie da biosfera. O calor se dissipa e a
energia degradada perde-se no espaço, à medida que a riqueza primitiva se acumula.
Bactérias forossintéticas coloridas, protoctistas e plantas do mundo inteiro produzem e
“poupam”. Ao comê-los, os consumidores podem “gastar” em atividades metabólicas a
energia fotossintética acumulada, ou armazená-la anabolicamente (e temporariamente)
em seus tecidos herbívoros ou predadores. A riqueza primitiva também pode acabar na
armazenagem a longo prazo (ou ser totalmente perdida), quando os consumidores
morrem e são enterrados sem que haja decomposição.” P. 210

“(...), o estrago humano dos meios ambientes exuberantes que nos nutriam não constitui
prova de qualquer capacidade singular de por em risco toda a vida na Terra. No
passado, nenhuma espécie isolada jamais ameaçou todas as outras. Qualquer tendência
de uma espécie a crescer em demasia e causar devastação era contida por todas as
demais. A essência da “seleção natural” está em que as tendências irrefreáveis de uma
população a crescer, a ponto de causar degradação ambiental são contidas pelo
crescimento das outras. A expansão da população humana segue as mesmas regras: o
ambiente degradado gera doenças, altos índices de mortalidade e, em última instância,
até mesmo a extinção.” P. 212

“Vislumbramos algumas maneiras de descrever o que é vida: um processo material que
peneira e desliza sobre a matéria como uma lenta e estranha onda; uma exuberância
planetária; um fenômeno solar – a transmutação astronomicamente localizada do ar, da
água e da radiação solar recebida pela Terra em células. A vida pode ser vista como um
intricado padrão de crescimento e morte, aceleração e recuo, transformação e
decadência. Ligada pelo tempo darwiniano à primeira bactéria e pelo espaço
vernadskiano a todos os cidadãos da biosfera, ela é uma rede única em expansão. A vida
é a matéria desenfreada, capaz de escolher sua própria direção para adiar
indefinidamente o momento inevitável do equilíbrio termodinâmico - a morte. A vida é
também uma pergunta que o universo faz a si mesmo, sob a forma do ser humano.” P.
225
A vida como um fenômeno material complexo e autopoiético

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A vida como um fenômeno material complexo e autopoiético

  • 1. MARGULIS, Lynn & SAGAN, Dorion. O que é Vida? Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002(a). Resumo por: Carlos Jorge Burke – www.cburke.com.br OBS: Se desejar, solicitar arquivo pelo blog. “A vida, apesar de material, é inextricável do comportamento do ser vivo. Desafiando qualquer definição – palavra que significa “fixar ou marcar os limites de algo” -, as células vivas se movimentam e se expandem incessantemente. Ultrapassam suas fronteiras: uma se transforma em duas, que se transformam em muitas. Embora troquem uma grande variedade de materiais e transmitam uma enorme quantidade de informações, todos os seres vivos, em última instância, compartilham um passado comum.” P. 19 “Um cientista, entretanto, conseguiu pesquisar a vida em Marte antes que a missão Viking fosse lançada. Em 1967, James E. Lovelock, o inventor inglês de um aparelho que mede os clorofluorcarbonetos implicados na produção de buracos na camada de ozônio, foi consultado pela Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço (NASA), que estava investigando a vida extraterrestre. A NASA interessou-se pelo que a invenção de Lovelock – um instrumento de medição de gases que é milhares de vezes mais sensível a certos componentes atmosféricos do que qualquer aparelho anterior – poderia revelar a respeito de Marte. Como químico da atmosfera, Lovelock desconfiava que, em princípio, a vida em qualquer planeta poderia ser detectada pelos marcadores químicos remanescentes no ar desses planetas. Como os componentes da atmosfera de Marte já eram conhecidos pela assinatura espectroscópica da luz refletida do planeta, Lovelock acreditou que esses dados já seriam suficientes para determinar se Marte era um planeta vivo. E concluiu: Marte era desprovido de vida. Aliás, com seu estilo característico de serena implicância iconoclástica, ele se gabou de que sua previsão dispensava a necessidade de qualquer visita a Marte e de que pouparia à NASA uma despesa prodigiosa.” P. 27 “A vida – tanto no aspecto local, como corpos de animais, plantas e micróbios, quanto no plano global, como a biosfera – é um fenômeno material sumamente complexo. Ela exibe as propriedades químicas e físicas habituais da matéria, mas com um toque diferente. A areia da praia costuma ser dióxido de silício. Também desse elemento são as partes internas da unidade central de processamento dos computadores – mas os computadores não são montes de areia. A vida se distingue não por seus componentes químicos, mas pelo comportamento desses componentes. Assim, a pergunta “o que é vida?” é uma armadilha lingüística. Para respondê-la de acordo com as regras gramaticais, devemos fornecer um substantivo, uma coisa. Mas a vida na Terra assemelha-se mais a um verbo. Ela conserta, sustenta, recria e supera a si mesma. Esse ímpeto de atividade, que se aplica não somente às células e animais, mas a toda a atmosfera terrestre, está intimamente ligado com duas da mais famosas leis da ciência – as leis da termodinâmica. A primeira delas diz que, durante qualquer transformação, a energia total de um sistema e de seu meio não é perdida nem ganha. A energia – seja como luz, movimento, radiação, calor, radioatividade, química ou outras formas – se conserva. Mas nem todas as formas de energia são iguais, nem todas têm o mesmo efeito. O calor é o tipo de energia em que as outras formas tendem a se converter, e o calor tende a
  • 2. desorganizar a matéria. A segunda lei da termodinâmica diz que os sistemas físicos tendem a perder calor para seu meio circundante.” P. 28s “A medida que os sistemas locais perdem calor, o universo como um todo ganha calor. Embora isso já não seja muito popular hoje em dia, no passado físicos e químicos previram que o universo se desintegraria numa “morte térmica”, em conseqüência da tendência ao aumento da entropia. Mais recentemente, eles inventaram a expressão “entropia negativa” para se referir à vida, a qual, em sua tendência a aumentar as informações e a certeza, parece contradizer a segunda lei. Mas não a contradiz; a segunda lei continua válida, desde que se encare o sistema (a vida) em seu meio ambiente.” P. 29 “Ilhas de ordem num oceano de caos, os organismos são muito superiores às máquinas construídas pelo homem. Ao contrário da máquina a vapor de James Watt, por exemplo, o corpo concentra a ordem. Ele se refaz continuamente. A cada cinco dias, temos um novo revestimento interno do estômago. Ganhamos um novo fígado a cada dois meses. Nossa pele se repõe a cada seis semanas. A cada ano, 98 por cento dos átomos de nosso corpo são substituídos. Essa substituição química ininterrupta, o metabolismo, é um sinal seguro de vida. E a “máquina” requer uma entrada continua de energia e de substâncias químicas (alimentos).” P. 31 “Os biólogos chilenos Humberto Maturana e Francisco Varela vêem no metabolismo a essência de algo realmente fundamental para a vida. Dão o nome de “autopoese”. Proveniente das raízes gregas que significam “si mesmo” (auto) e “fazer” (poiein, como em “poesia”), a autopoese refere-se à produção continua de si mesmo pela vida. (...). Uma entidade autopoética efetua continuamente o metabolismo, perpetua-se através da atividade química, da movimentação das moléculas. A autopoese acarreta um gasto de energia e a produção de alimentos. Na verdade ela é detectável pela incessante química biológica e fluxo energético que é o metabolismo. Somente as células, os organismos feitos de células e as biosferas feitas de organismos são autopoéticos e podem efetuar o metabolismo.” P. 31 “A identidade e a auto-sustentação requerem o metabolismo. A química metabólica (comumente chamada de fisiologia) precede a reprodução e a evolução. Para que uma população evolua, seus membros têm que se reproduzir. No entanto, para que um ser orgânico possa reproduzir-se, primeiro ele precisa se sustentar. Durante a vida de uma célula, cada uma das aproximadamente cinco mil proteínas diferentes faz um intercâmbio completo com o meio circundante, milhares de vezes. As células bacterianas produzem DNA e RNA (ácidos nucléicos), proteínas de enzimas, gorduras, carboidratos e outras substâncias químicas complexas de carbono. Os corpos de protoctistas, fungos, animais e plantas também produzem, todos eles, essas e outras substâncias. Contudo, o mais importante e espantoso é que qualquer corpo vivo produz a si mesmo.” P. 32s “A visão autopoética da vida difere dos ensinamentos padronizados da biologia. A maioria dos autores de textos dessa área deixa implícito que o organismo existe independentemente de seu meio, e que o meio é sobretudo um pano de fundo estático e sem vida. Entretanto, os seres orgânicos e o meio ambiente acham-se entrelaçados. O solo, por exemplo, não é isento de vida. É uma mistura de fragmentos de rochas, pólen, filamentos de fungos, cistos de ciliados, esporos bacterianos, nematódeos e outros
  • 3. animais microscópios e suas partes. “A natureza”, observou Aristóteles, “avança paulatinamente das coisas sem vida para a vida animal, de tal maneira que é impossível determinar a linha de demarcação exata”. Independência é um termo político, não científico.” P. 33 “A biosfera como um todo é autopoética, no sentido de que sustenta a si mesma. Um de seus “órgãos” vitais, a atmosfera, é claramente cuidado e alimentado. A atmosfera terrestre, com aproximadamente 1/5 de oxigênio, difere radicalmente das de Marte e Vênus. A atmosfera desses vizinhos planetários tem 9/10 de dióxido de carbono; na atmosfera terrestre, o dióxido de carbono responde por apenas três partes em dez mil. Se a biosfera terrestre não se compusesse de seres que consomem dióxido de carbono (plantas, algas e bactérias fotossintéticas e produtoras de metano, entre miríades de outras formas biológicas), há muito tempo nossa atmosfera teria chegado a uma estabilidade química rica em dióxido de carbono, e praticamente todas as moléculas capazes de reagir com outras já teriam o feito. Em vez disso, as atividades conjuntas da vida autopoética da superfície levaram a uma atmosfera em que o oxigênio se mantêm em níveis de aproximadamente 20 por cento há pelo menos 700 milhões de anos.” P. 34 “Usando a energia solar, apenas as plantas verdes, as algas e algumas bactérias de cor verde e roxa são capazes de transformar compostos da água e do ar circundante na matéria viva de seus corpos. Esse processo energizado pelo Sol, a fotossíntese, é a base nutricional do resto da vida. Os animais, os fungos e a maioria das bactérias alimentam- se dos produtores roxos e verdes. A fotossíntese evoluiu nos micróbios logo depois da origem da vida. Em todos os níveis, desde o microbiano até o planetário, os seres orgânicos usam o ar e a água ou outros seres orgânicos para construir seus eus reprodutores. A ecologia local transforma-se em ecologia global. Como corolário, e a despeito da gramática, a vida não existe na superfície da Terra, mas é a superfície da Terra.” P. 36 “Apesar de adulterados por outros compostos, nós, como toda matéria viva, somos basicamente feitos de água – ou seja, de hidrogênio e oxigênio. O hidrogênio compõe, em termos de massa, 75 por cento dos átomos do cosmo. É o mesmo elemento que sob intensa pressão gravitacional, transforma-se em hélio na reação de fusão nuclear que faz com que nosso sol brilhe. Estrelas muito mais velhas e maiores desapareceram em explosões, sob a forma de supernovas, e com isso criaram o carbono, o oxigênio, o nitrogênio e os outros elementos mais pesados. A vida é feita dessa matéria estelar. No universo, a vida pode ser rara ou até singular, porém a matéria de que é feita é elementar.” P. 37 “A mente, em sua totalidade, é um fenômeno evolutivo. Centenas de milhões de anos antes que seres orgânicos verbalizassem a vida, eles a reconheciam. Discernir o que podia matá-los, o que eles podiam comer e com quem podiam acasalar, mais ou menos nessa ordem, era crucial para a sobrevivência dos animais. Um ministro da Suprema Corte dos Estados Unidos confessou que, embora talvez não fosse capaz de definir obscenidade, decerto podia reconhecê-la quando a via. Todos temos uma capacidade semelhante em relação à vida. Ela vem se reconhecendo desde muito antes de qualquer livro de biologia ser escrito.” P. 42 “Mudar para permanecer o mesmo é a essência da autopoese. Aplica-se tanto à biosfera quanto à célula. Aplicado às espécies, conduz à evolução.” P. 44
  • 4. “A vida, fenômeno local da superfície terrestre, na verdade só pode ser compreendida em seu meio cósmico. Formou-se de matéria estelar, logo depois que a Terra, há 4,6 bilhões de anos, congelou-se a partir de um resto de explosão de supernova. A vida poderá terminar em meros 100milhões de anos, quando, em luta contra recursos atmosféricos cada vez menores e o aumento do calor do Sol, os sistemas de regulagem global da temperatura finalmente vierem a falhar. Ou então, encerrada em sistemas ecológicos, ela poderá escapar e, de um porto seguro, assistir ao momento em que o Sol, esgotando seu hidrogênio, explodir em chama gigantesca, fazendo ferverem os oceanos terrestres, daqui a cinco bilhões de anos.” P. 44 “Exibir a permissão cartesiana para praticar a ciência produziu resultados. Os investigadores devolveram a Bíblia e os livros clássicos a suas prateleiras empoeiradas. Em vez disso, leram a Natureza, “escrita”, como dissera Galileu Galilei (1564-1642), antes mesmo de Descartes, “num grande livro que está sempre aberto diante de nossos olhos”. Galileu pagou caro por suas inclinações científicas. Como mecanicista quantificador, medidor de corpos cadentes e descobridor de luas de Júpiter e da rotação do Sol, ele preparou o terreno para os sucessores curiosos. Como desafiador de filósofos poderosos e de teólogos cristãos, Galileu provocou a ira das autoridades eclesiásticas. Embora, diferentemente de Bruno, não tenha sido queimado na fogueira, aos 58 anos foi levado perante um tribunal da inquisição e acusado de heresia. Galileu desdisse suas afirmações anteriores, tão divergentes da doutrina oficial da Igreja, e “admitiu” que a Terra era o centro do universo.” P. 52 “O filósofo judeu-holandês Baruch Ezpinosa (1632-1677) retratou a matéria e a energia como a natureza fundamental de um universo que era vivo em si.” P. 56 “Antes mesmo de Darwin, o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) havia observado que, além de outras, as semelhanças entre esqueletos apontavam para laços consangüíneos, para um parentesco comum entre todas as formas de vida. Kant admitia que a totalidade da vida poderia ter surgido por um processo mecânico, parecido com aquele pelo qual a natureza produzia os cristais, mas julgou que seria absurdo esperar por “um Newton” capaz de tornar compreensível até mesmo o crescimento de uma folha de capim, usando tão-somente uma teoria mecanicista. Haeckel propôs Darwin como o próprio “Newton” que Kant havia julgado impossível.” p. 57 ”Dado o legado restrito do dualismo metafísico (mente/corpo, espírito/matéria, vida/não-vida), talvez não seja de admirar que dois dos mais profundos repensadores da vida e de seu ambiente no século XX tenham uma perspectiva biosférica comum, mas opiniões diametralmente opostas. Mas, enquanto o cientista russo Vladimir Ivanovich Vernadsky (1863-1945) descreveu os organismos como viria a descrever os minerais, chamando-os de “matéria-viva”, o cientista inglês James E. Lovelock descreveu a superfície da Terra, inclusive as rochas e o ar, como vivos.” P. 60 “O geólogo austríaco Edward Suess (1831-1914) havia cunhado a palavra “biosfera”, mas Vernadsky a pôs em uso corrente. Assim como a esfera das rochas é a litosfera e a do ar é a atmosfera, a esfera em que existe vida é a “biosfera”. Em seu livro de 1926, A biosfera, Vernadsky mostrou que a superfície terrestre era uma transformação ordeira das energias solares. “A biosfera”, escreveu, “é, no mínimo, tanto uma criação do Sol quanto o resultado de processos terrestres. As antigas instituições religiosas que
  • 5. consideravam as criaturas terrestres como filhos do Sol, em especial o homem, estavam muito mais perto da verdade do que presumem aqueles que vêem os seres terrestres como meras criações efêmeras, surgidas da interação cega e acidental da matéria e das forças. ...A matéria viva como um todo... é, portanto, um sistema único que acumula energia química livre na biosfera pela transformação da radiação solar.”” P. 62 “Assim como Vernadsky rompeu a cisão mente/matéria através de um exame da matéria viva em escala global, James E. Lovelock frustrou o dualismo metafísico por um estratagema inverso – considerando viva a Terra. Vernadsky examinou a vida como matéria num clima político e cultural receptivo – o ateísmo oficial da antiga União Soviética, auxiliado pela aprovação do materialismo pela ciência. Em contraste, Lovelock, retratando a biosfera auto-reguladora, um imenso corpo vivo estranhamente esférico, que ele chamou de “Gaia” – foi estorvado pela ideologia sutil do mecanicismo que perpassava a comunidade científica. Isso quer dizer que ele não apenas teve que mostrar que a Terra se mantinha como um corpo vivo, como também precisou superar o preconceito de que chamar de viva essa “coisa” não era ciência, mas uma personificação poética. Dadas essas tensões, é um tributo à engenhosidade desse químico atmosférico de primeira que sua teoria seja levada a sério como é pelos cientistas em atividade.” P. 63 “Como foi que a matéria num banho de energia (ou a energia numa poção de matéria) realizou pela primeira vez o feito da vida, ninguém sabe. Nenhuma molécula isolada é capaz de se reproduzir. A forma de vida mais ínfima da Terra atual é um sistema, uma esfera diminuta, delimitada por uma membrana, uma célula bacteriana que requer a interação de muitas moléculas. Cerca de 500 a cinco mil genes compõem um número similar de proteínas. As proteínas e o DNA se produzem mutuamente, dentro da membrana celular que eles fabricam juntos. Sendo portadoras de uma bioquímica comum, é provável que todas as formas de vida datem de um único momento histórico, talvez (mas não necessariamente) improvável. Os fatores que levaram a matéria a seu “ponto de fracionamento” peculiar, no qual o comportamento dissipativo transformou- se em comportamento vivo, só precisam ter ocorrido uma vez. Fechadas por uma membrana, talvez até subitamente, e dotadas de uma profusão de recursos, as primeiras células vivas puderam dar-se o luxo de ser meio distantes da realidade externa. Por fim, ameaçada por seu próprio desperdício e pela insensibilidade da substância da qual se havia separado – mas da qual dependia integralmente para seu sustento -, a vida ficou entregue à seus próprios recursos. Quando a matéria desterrou a si mesma, a vida foi abandonada pelo mundo, mas o mundo não foi a parte alguma. Não havia como voltar atrás.” P. 69 “Em vista da natureza material conservadora da vida reprodutiva, as células bacterianas conservam indícios da química da superfície terrestre, tal como esta existiu no passado remoto. As bactérias foram os primeiros seres verdes a brotarem de nada além do sol, água e ar. E, sendo ainda os únicos seres aptos a executar muitos truques metabólicos que nós, os animais, e até mesmo as plantas não somos capazes de fazer, as bactérias foram as primeiras a respirar oxigênio e a nadar. Elas são os virtuoses da biosfera. São também nossas parentas, o que provavelmente explica porque nos sentimos à vontade para difamá-las.” P. 70 “Algumas rochas arqueanas “não-metamorfoseadas” – às que não foram submetidas a alterações causadas pelo calor e pela pressão – conservam vestígios de vida. Rochas
  • 6. australianas de 3,485 bilhões de anos contêm 11 ou mais tipos de bactérias fósseis reconhecíveis. As rochas mais antigas da Terra atual, portanto, contém pelo menos a idade que lhe poderíamos atribuir empiricamente.” P. 72 “A “produção abiótica” do ATP foi, na verdade, uma continuação do trabalho iniciado por Stanley L. Miller, um aluno de pós-graduação do ganhador do Prêmio Nobel Harold Urey (1893-1981), na Universidade de Chicago, em 1953. (...). Os experimentos de Miller foram repetidos e modificados por muitos químicos entusiasmados. A adenina, a citosina, a guanina, a timina e o uracil – as cinco bases do ácido nucléico que, encadeadas, formam moléculas de DNA ou de RNA – foram todos sintetizados em experimentos de química “pré-biótica”. P. 84s “Dos seis tipos de átomos que são cruciais para a vida na Terra – carbono, nitrogênio, hidrogênio, oxigênio, enxofre e fósforo – todos foram detectados no espaço. O hidrogênio, elemento mais comum no DNA, no RNA, nas proteínas, nas gorduras e em outros compostos criados pela vida, é também o mais comum no universo. (...). Os compostos mais simples da vida formam-se facilmente a partir apenas da química” P. 85 “(...). Eric Jantsch (1920-85), um astrofísico e filósofo austríaco-americano, explicou que, Enquanto a energia livre e novos participantes da reação são importados, os produtos finais da entropia e da reação são exportados – e aí encontramos o metabolismo de um sistema em sua manifestação mais simples. Com a ajuda dessa troca de energia e matéria com o meio, o sistema consegue manter seu desequilíbrio interno e, por sua vez, o desequilíbrio mantém os processos de troca. Poderíamos pensar na imagem de uma pessoa que tropeça, perde o equilíbrio e só consegue evitar uma queda de cara no chão continuando a avançar aos tropeços. A estrutura dissipativa renova-se continuamente e mantém um regime dinâmico particular, uma estrutura espaço-tempo globalmente estável. Parece interessar-se unicamente por sua própria integridade e auto-renovação.” Entretanto, as estruturas dissipativas, sistemas químicos que usam fluxos de energia para aumentar sua ordem interna, são raras e têm vida curta. Mas, se a ordem aumentada é a da vida, então, havendo acesso do sistema a uma fonte de energia e ao tipo certo de matéria (nutrientes), ela se manterá indefinidamente. Essa é a autopoese. (...) Atinge um ponto crítico e não para mais de efetuar o metabolismo.” P. 88s “A vida parece ter se originado em quaisquer que tenham sido os ancestrais primevos das bactérias modernas. Como sistemas químicos que se transformaram em sistemas biológicos, esses primeiros seres teriam metabolizado e incorporado energia, nutrientes, água e sais em seus eus em desenvolvimento. Formaram-se as primeiras células. Como na analogia de Jantsch sobre a pessoa que avança aos tropeços para não cair de cara no chão, as células delimitadas por uma membrana, que replicavam RNA e produziam outras moléculas, avançaram aos tropeços para a síntese do DNA baseada no RNA e nas proteínas; em outras palavras, a reprodução tornou-se um meio de preservar a auto- sustentação, de adiar o retorno ao equilíbrio termodinâmico,” p. 91 “É realmente surpreendente que, dentro da visão termodinâmica autopoética, nosso corpo atual tenha uma química praticamente idêntica a que prevaleceu na superfície terrestre há três bilhões de anos. (...).
  • 7. A morte é ilusória num sentido muito real. Como pura persistência da bioquímica, “nós” nunca morremos, durante a passagem de três bilhões de anos. Montanhas, mares e até supercontinentes surgiram e se foram, mas nós persistimos.” P. 92 “Em contraste com nossa necessidade humana de vasculhar o meio ambiente em busca de aminoácidos essenciais, nenhum ser vivo na Terra precisa espreitá-lo à procura de desoxirribose indispensável a seu DNA. Ao contrário, a desoxirribose é sintetizada nas células, desviando um átomo de oxigênio da ribose. É a ribose, o açúcar de cinco moléculas de carbono do RNA, que costuma ser absorvida do exterior como alimento. O fato de todas as células, ao receberem-na, serem capazes de produzir a desoxirribose a partir dela sugere que a ribose foi a primeira a aparecer. O RNA, com a ribose, evoluiu antes do DNA. O metabolismo do açúcar do DNA evoluiu mediante a retirada de oxigênio dos açucares do RNA. As primeiras células talvez tenham sido seres de RNA, que só mais tarde evoluíram para sistemas de DNA. Comparar o metabolismo do RNA e do DNA é um exemplo de olhadela pelas janelas celulares, em busca de pistas das origens mais remotas da vida. Outras evidências contestam as pretensões do DNA, a “molécula mestra”, ao trono bioquímico da vida. O RNA, mais versátil do que ele, é uma escolha melhor como instrumento replicador do primeiro sistema autopoético da vida. Enquanto o DNA de hélice dupla usa a desoxirribose em sua cadeia, o RNA, de uma só cadeia, usa a ribose, material que origina da desoxirribose. Ao contrário do DNA, que tem que usar o RNA para codificar as proteínas, o RNA pode dirigir sozinho sua replicação e a produção de proteínas. Em tempos remotos, é provável que o RNA fizesse tudo o que o DNA faz hoje no interior das células, e mais até.” P. 94 “O RNA, portanto, é um grande candidato à condição de supermolécula da vida primitiva. Trabalhando em si mesmo enquanto crescia, é possível que ela tenha gerado uma mescla de possibilidades em expansão. Capaz de se replicar e mutar, agindo como enzima e como gene, o RNA executa operações que formam novas quantidades dele mesmo. Podemos hoje imaginar que, na Terra do éon arqueano, foi o RNA delimitado que desenvolveu sistemas de replicação e informação, ao iniciar, seqüestrado no interior de gotas de óleo, a jornada para a autopoese. Assim, o atual mundo do DNA em que estão todas as formas de vida pode ter se desenvolvido em células de RNA do “mundo do RNA”, expressão cunhada em 1986 por Walter Gilbert, biólogo da Universidade de Harvard que foi laureado com o Prêmio Nobel.” P. 95s “No estado normal de vigília o corpo humano queima açucares aeróbicamente, usando átomos de oxigênio retirados do ar. Nas atividades estafantes, no entanto, o corpo volta a um metabolismo distinto: os músculos fermentam açucares, do mesmo modo anaeróbico inventado pelas bactérias primitivas. Assim, quando sob tensão, nosso corpo “recorda” as épocas anteriores ao momento em que a atmosfera ficou repleta de oxigênio. Essas rememorações fisiológicas reapresentam as condições ambientais do passado e os corpos que se desenvolveram para viver nelas. Num sentido muito real, todos os seres de hoje preservam traços da biosfera mais primitiva da Terra.” P. 96 “Morowitz (Harold Morowitz – biofísico norte-americano) enfatizou que, no meio aquoso em que surgiu a vida, era necessária uma barreira não-aquosa para separar a célula do meio que a cercava. “Ser uma entidade distinta do ambiente exige uma barreira a difusão livre. A necessidade de isolar um sub-sistema termodinamicamente é uma condição irredutível da vida. É o fechamento de uma membrana anfifílica de duas camadas, sob a forma de uma vesícula, que representa a transição clara da não-vida para
  • 8. a vida.” Considerada em termos materiais, como um sistema de matéria e energia, a vida é reconhecível por sua separação parcial do meio ambiente através de uma membrana.” P. 96 “A vida é a representação, a “presentificação” de químicas passadas, de um ambiente pretérito da Terra primitiva que, em virtude da vida, persiste na Terra moderna. É a encapsulação aquosa do espaço-tempo delimitada por uma membrana. A morte faz parte da vida porque até a matéria agonizante, uma vez reproduzida, resgata complexos sistemas químicos e estruturas dissipativas florescentes do desequilíbrio termodinâmico. A vida é um eixo de crescente sensibilidade e complexidade, num universo de matéria- mãe que, comparada a ela, parece embotada e insensível. Ela tem que se manter, contrariando a tendência universal do calor a se dissipar com o correr do tempo. Essa visão termodinâmica explica, de certo modo, a determinação, o caráter deliberado da vida: durante bilhões de anos, ela tem estado presa a um padrão do qual, mesmo se quisesse, não poderia sair, e que consiste em aumentar a aposta à medida que ela avança. É que a própria vida consiste nesses padrões de conservação química, num universo que tende para a perda de calor e a desintegração. Preservando o passado e estabelecendo uma diferença entre o passado e o presente, a vida vincula o tempo, ampliando a complexidade e criando novos problemas para si mesma.” P. 97 “Finalmente a teoria do contágio microbiano foi amplamente aceita. Tipos diferentes de bactérias foram implicados no antraz, na gonorréia, na febre tifóide e na lepra. Os micróbios, antes pequenas anomalias divertidas, foram transformados em demônios. Pasteur, e depois dele Howard Hughes, tinha fobia à sujeira e aos germes. Evitava os apertos de mão. Esfregava e secava a louça de barro que utilizava, procurando meticulosamente indícios de madeira, lã e outros detritos em seus alimentos. Não mais sendo um escândalo divertido para as conversas de salão, os micróbios transformaram- se num “outro” virulento, a ser destruído. A metáfora das tenazes bactérias infecciosas foi usada na retórica nazista do genocídio. Hoje em dia, a baixa estima que se tem pelas bactérias, como “agentes patológicos” liliputianos, continua a obscurecer sua enorme importância para o bem-estar de todo o restante da vida.” P. 101 “A observação de que as arqueobactérias habitam meios desprovidos de oxigênio – como o fundo dos oceanos, o estômago dos bovinos, a água dos esgotos, pobre em oxigênio, e as fontes termais ácidas do Parque Nacional de Yellowstone – é compatível com a imagem contemporânea de uma Terra quente no éon arqueano, na qual haveria, quando muito, vestígios de oxigênio na atmosfera. O oxigênio só foi liberado na atmosfera depois que as bactérias verde-azuladas desenvolveram um modo de usar a energia da luz solar para quebrar as moléculas de água (H2O) e captar seu precioso hidrogênio. Combinando o hidrogênio com os átomos de carbono extraídos do dióxido de carbono, abundante na época, essas cianobactérias conseguiram fabricar DNA, proteínas, açucares e todos os seus outros componentes celulares. Tais bactérias, altamente necessitadas de luz, espalharam-se rapidamente pelas águas ensolaradas de todas as partes da Terra arqueana. Ao fazê-lo, liberaram vastas quantidades de oxigênio molecular que restara de sua busca de hidrogênio na água. Com isso, a atmosfera terrestre tornou-se uma extensão do metabolismo das bactérias em evolução. Somente através do trabalho das bactérias mais inovadoras de todos os tempos é que a Terra, originalmente anóxica, recebeu uma atmosfera rica em oxigênio. A princípio, o planeta fora povoado por produtores de metano, amantes do enxofre e outros anaeróbicos – seres que não produziam nem usavam oxigênio em seu metabolismo.” P. 103
  • 9. “Elas podem ser as formas biológicas mais minúsculas da Terra, mas deram passos gigantescos na evolução. As bactérias inventaram até a multicelularidade. A maioria das que existem na natureza, a despeito da crença popular, é multicelular. Nesses seres bacterianos multicelulares, cada célula é em si uma célula bacteriana. Algumas linhagens de bactérias evoluíram para muitas espécies de seres diferentes, inclusive nós mesmos. No interior das células de todos nós existem, neste momento, antigas bactérias que usam oxigênio para gerar energia. Trata-se das mitocôndrias. Os seres verdes-azulados fotossintéticos e seus descendentes (os plastídios das plantas) retiram dióxido de carbono da atmosfera, usando o carbono em seu corpo e eliminando como resto o oxigênio do ar fresco – apenas uma pequena porção do qual é usada pelas mitocôndrias, que coabitam com o que um dia foram bactérias fotossintéticas em todas as células vegetais.” P. 103 “Nossos planetas vizinhos, Marte e Vênus, têm atmosferas com mais de 90 por cento de dióxido de carbono. O ar da Terra, no entanto, é uma mistura reativa, com sua imensa parcela de oxigênio e menos de 0,1 por cento de dióxido de carbono. Foram as bactérias que retiraram o dióxido de carbono e produziram o oxigênio. Na verdade, foram elas que transformaram o meio ambiente planetário no que ele é hoje. Todos os seres maiores contêm mitocôndrias em suas células, como descendentes vivos das bactérias que viveram na Terra antes de o oxigênio se acumular no ar. A vida na Terra é uma holarquia, uma rede fractal aninhada de seres interdependentes.” P. 104 “O medo das bactérias é, de certo modo, um medo da vida, medo de nós mesmos num estágio anterior de evolução. Não é de admirar que hoje os micróbios nos considerem tão atraentes. Uma vez que os compostos de carbono e hidrogênio de todos os organismos já se encontram num estado ordenado, o corpo humano (como o de qualquer outro ser vivo) é uma fonte de alimento desejável para essas formas biológicas minúsculas. As bactérias procuram-nos como fontes de manutenção autopoética, em sua antiqüíssima luta contra o equilíbrio termodinâmico.” P. 104 “Talvez devamos consolar-nos com o fato de a matéria de nosso corpo, depois da morte, retornar não a um estado de matéria inerte, mas à ordem bacteriana que sustenta a biosfera. “Não vedes”, escreveu Giordano Bruno, “que o que foi semente virá a ser erva verde, e que a erva se transformará em espiga, e a espiga em pão? O pão se transformará num líquido nutriente, que produzirá o sangue e, a partir do sangue, o sêmen, o embrião, os homens, os cadáveres, a Terra, a rocha e os minerais, e assim, a matéria mudará de forma para sempre e será capaz de assumir qualquer forma natural,”” p. 104 “O desejo de conservar a juventude, a forma mais atraente que temos e, em última instância, a própria vida, é frustrado no nível dos corpos animais. Porém nossa derrota individual é uma vitória para as bactérias, que devolvem os compostos de hidrogênio e carbono de nosso corpo a um meio ambiente vivo. Estando mais próximas das estruturas originais da vida, as bactérias não vivem como nós, rumando para a morte. Salvo por um acidente infeliz, uma mutação ou um encontro com outra bactéria que resulte numa troca de genes, uma única célula bacteriana pode “sobreviver” essencialmente para sempre em sua forma original, à medida que gerações após gerações de cópias bacterianas dela mesma são produzidas pela divisão celular. Cada um de nós, criaturas pluricelulares, é uma estrutura celular em desequilíbrio, assim como uma bactéria é uma estrutura de matéria em desequilíbrio. A humanidade como
  • 10. espécie e até todo o reino animal têm uma existência muito mais frágil do que a delas – do mesmo modo que sua existência é mais tênue que a da matéria não-viva.” P. 104 “Todas as outras formas biológicas dependem do funcionamento de incontáveis bactérias que vivem, morrem e efetuam o metabolismo. Nossas relações com as bactérias que nos cercam por todos os lados entram como componentes de nossa saúde e bem-estar de nosso solo, nossos alimentos e nossos animais de estimação. Por mais nuas e simples que se afigurem as células bacterianas, elas estão permanentemente ocupadas, tanto no nível celular quanto no planetário. Existem variedades de bactérias que fazem a fotossíntese sem jamais liberar oxigênio, mas que usam dióxido de carbono e hidrogênio para produzir todas as suas partes celulares. Outras incorporam o dióxido de carbono e hidrogênio do ar em proteínas do corpo, convertendo seus dejetos em gás metano. Outras, ainda, transformam o sulfato em sulfeto, ou incorporam nitrogênio inerte em seu corpo. Somente os cidadãos do reino bacteriano são tão bem dotados em termos metabólicos. Quando se descobre um animal (como o cupim, que produz metano) ou uma planta (como a vagem, que começa a se suprir de nitrogênio a partir de suas raízes) com essas habilidades metabólicas, é porque elas cooptaram corpos bacterianos para sua especialização. Essa tomada de empréstimos também se aplica à biotecnologia praticada pelos seres humanos que usam jalecos brancos nos laboratórios. Nós, os seres humanos, não “inventamos” micróbios patenteáveis, mediante a recombinação genética; antes, aprendemos a explorar e a manipular a antiga propensão das bactérias a permutar genes.” P. 105s “Esse ser de dimensões planetárias, sensível desde o começo, tornou-se mais expansivo e auto-reflexivo à medida que, nos últimos três bilhões de anos, evoluiu para longe do equilíbrio termodinâmico. Imagine que, num barzinho, você esbarre num sujeito de cabelos verdes. Ao fazê-lo, adquire essa parte de sua dotação genética, talvez com mais alguns outros itens novos. Não só você agora poderá transmitir o gene dos cabelos verdes a seus filhos, como sairá do bar com o cabelo dessa cor. As bactérias entregam- se o tempo todo a esse tipo de aquisição rápida e informal de genes. Ao se banharem, liberam seus genes no líquido circundante. Se aplicarmos a elas a definição padrão de espécie – um grupo de organismos que só se cruzam entre si -, diremos que todas as bactérias do mundo pertencem a uma única espécie.” P. 106 “É comum as células bacterianas terem cadeias extras de DNA, isto é, conjuntos extras de genes. Esses genes podem ser permutados como pedaços nus, chamados plasmídeos, ou como pedaços revestidos de proteínas, chamados vírus. Em algumas bactérias, forma-se uma ponte celular entre a que está doando seus genes e a que os recebe. Esse processo de criação de uma ponte celular pela qual os genes são enviados, chamado conjugação, distingue-se do sexo dos mamíferos. As células bacterianas não se fundem nem os “genitores” fazem contribuições iguais para seus rebentos. Em vez disso, uma bactéria, a “doadora”, passa seus genes numa direção para a “receptora”, que não retribui a gentileza. Ainda assim, essa conjugação satisfaz os requisitos mínimos de um ato sexual biológico, visto que a transferência dos genes produz uma nova bactéria, um “recombinante genético” com genes de mais de um genitor.” P. 107 “Há mais espécies de besouros habitando a Terra do que qualquer outra forma de vida, mas as bactérias são, de longe, os organismos terrestres mais numerosos. Consideradas em conjunto, elas são também os mais diversificados. São os mais antigos, os que
  • 11. tiveram mais tempo para evoluir, tirando pleno proveito dos habitats variados do planeta, inclusive dos ambientes vivos dos demais seres com que convivem.” P. 109 “Por permutarem genes e adquirirem novos traços hereditários, as bactérias ampliam sua capacidade genética – em minutos, ou, no máximo, em horas. Um imenso pool genético planetário dá origem a “tipos” ou “cepas” bacterianos temporariamente classificáveis, que se alteram rapidamente de maneira radical, em consonância com as condições do meio ambiente. As bactérias da água, do solo e do ar são como células de um ser global crescente. Enquanto os genes que você carrega ficam no interior de um corpo com uma duração biológica distinta, as bactérias captam e doam os genes de seu corpo no e para o meio ambiente. Embora, é claro, como todas as formas de vida, eles possam morrer por inanição, calor, sal e dessecação, normalmente esses micróbios não morrem. Enquanto o ambiente o permite, as bactérias crescem e se dividem, livres do envelhecimento. Ao contrário do corpo dos mamíferos, que amadurece e morre, o corpo bacteriano não tem limites. Como estrutura em desequilíbrio, cuspida por um universo em evolução, ele é, em princípio, imortal. Retirando ordem de um universo desordenado, a silenciosa biosfera bacteriana precedeu todas as plantas, animais, fungos e até os progenitores protoctistas de todas essas formas biológicas maiores. Sem a biosfera bacteriana, nenhuma outra forma de vida teria evoluído nem viveria atualmente.” P. 109s “A vida fermentativa e sem paredes celulares aproveitou a “boca-livre”, utilizando os açucares disponíveis e outros compostos ricos em energia do doce meio ambiente primevo. Nenhuma das bactérias foi obrigada a produzir seu próprio alimento. Mas, em algum momento, o acúmulo das gerações em expansão fez com que o alimento diminuísse mais depressa do que era restaurado. A crise era inevitável. (...). A mais importante inovação metabólica da história do planeta foi a evolução da fotossíntese. Através dela, a vida se libertou da escassez de energia; daí por diante, passou a ser primordialmente limitada pela escassez deste ou daquele componente material. A fotossíntese surgiu nas bactérias. Garimpando a energia da luz solar, esses primeiros produtores de viveres (provavelmente, coletores de sulfeto de coloração verde, como o moderno Chlorobium) geraram alimento e energia utilizável para o resto da biosfera.” P. 112s “Para a vida, a forma mais importante de radiação que incide sobre a superfície da Terra não é nem a radiação ultravioleta de ondas curtas, que destrói os processos bioquímicos, nem a radiação infravermelha de baixa energia e ondas mais longas, que os seres humanos percebem como calor. A vida depende, antes, da radiação de ondas médias da luz visível. Na fotossíntese, a energia de um fóton de luz solar visível excita um elétron em uma molécula de clorofila, que transfere então a energia excedente para uma molécula de ATP. A grande contribuição do ATP para a vida está em que ele permite que um ser orgânico use a energia quando necessário – e não apenas quando o Sol (ou o alimento ingerido) a torna disponível. O ATP é a forma eletiva de a vida poupar para o futuro.” P. 113 “Ao liberar oxigênio, as bactérias verde-azuladas envolveram o mundo em átomos de oxigênio. O oxigênio acelerou as mudanças, ao aumentar a velocidade das reações químicas. Superando largamente em número suas irmãs purpúreas, as algas verde- azuladas invadiram como um enxame a zona fótica – a região iluminada e irradiada pelo Sol, que se estende até não mais de duzentos metros abaixo da superfície dos oceanos.
  • 12. Nos meses mais quentes, as cianobactérias cresciam com o máximo de vigor. Deslizando viscosamente pelas superfícies, aprisionando e ligando os sedimentos, elas foram formando recifes ao longo das zonas costeiras e nas massas terrestres úmidas semelhantes a tecidos.” P. 117 “Dois bilhões de anos atrás, não apenas o ferro, mas também o enxofre, o urânio e o manganês oxidaram-se no mundo inteiro. Expostos ao gás da excreção bacteriana, transformaram-se em hematita, pirita, uraninita e dióxido de manganês. Com o aumento do oxigênio atmosférico, o ferro estriado, que abriga minerais não-oxigenados, deu lugar aos “leitos vermelhos” – formações ferruginosas que se formaram em todo o mundo. O registro rochoso dos minerais oxidados da crosta terrestre atesta o acréscimo de oxigênio da nossa atmosfera planetária durante um intervalo de 400 milhões de anos, entre 2,2 e 1,8 bilhões de anos atrás. Acabou não restando mais nenhum mineral que já não houvesse reagido com o oxigênio, de modo que o gás excedente, que não mais tinha para onde ir, começou a acumular no ar.” P. 117 “Longe de destruir o planeta, o oxigênio o energizou. Em sistemas muito distantes do equilíbrio, os produtos da excreção necessariamente se acumulam. Mas o que pode ser lixo para uns é alimento ou material de construção para outros.” P. 118 “Todo e qualquer ser orgânico da Terra é feito de um dentre apenas dois tipos de células. O nosso tipo – e de outros animais, fungos, plantas e protoctistas – possui núcleo. O outro tipo, a célula bacteriana, não é nucleado. Em 1937, Edouard Chatton, um biólogo marinho francês, deu a este último tipo de célula o nome de “procariótica”; os organismos que a possuem são procariotos (ou procariontes). Todos os demais somos eucariotos (ou eucariontes), feitos de células nucleadas. Portanto, a presença de um núcleo delimitado por uma membrana define a célula como “eucariótica”. Todos os eucariotos vêm dos protoctistas; as bactérias, não.” P. 127 “A girafa é um organismo eucariótico, feito de células eucarióticas. O mesmo se aplica as margaridas. E às amebas. As diferenças de comportamento, genética, organização, metabolismo e, sobretudo, estrutura entre os procariotos e os eucariotos são muito mais drásticas do que qualquer diferença entre plantas e animais. Tais diferenças marcam o grande divisor celular. Os procariotos e os eucariotos formam, portanto, os dois “supergrupos” biológicos da Terra. (...). A via de transição entre os dois supergrupos é obscura. A evolução dos procariotos para os eucariotos, das bactérias para os protoctistas, foi uma “ruptura de simetria” que catapultou a vida para um nível maior de complexidade e lhe deu potenciais e riscos diferentes. Não só pela mutação gradual, mas também, subitamente, através de alianças simbióticas, formaram-se os primeiros eucariotos” P. 129 “Os organismos formam muitos tipos de simbioses, porém a mais assombrosa é a associação excepcionalmente estreita que se conhece como endo-simbiose. Trata-se de uma relação em que um ser – microbiano ou maior – vive não apenas perto de outro (nem tampouco permanentemente em cima dele), mas em seu interior. Na endo- simbiose, os seres orgânicos se fundem. Ela é como um encontro sexual duradouro, só que os participantes são membros de espécies diferentes. Aliás, algumas ligações endo- simbióticas tornaram-se permanentes.” P. 132
  • 13. “A simbiose produz novos indivíduos. “Nós” não poderíamos sintetizar as vitaminas B e K se não houvesse bactérias em nosso intestino. As vacas e cupins não seriam os mesmos sem os fermentadores natatórios que habitam seu sistema digestivo – protistas e bactérias que decompõem o capim e a madeira. Algumas algas que vivem no interior de platelmintos transparentes são tão boas provedoras que estes têm a boca atrofiada; os platelmintos verdes de boca fechada “tomam banho de sol”, em vez de procurar alimento, e as algas endo-simbióticas até reciclam a excreção de ácido úrico desses vermes, transformando-o em alimento.” P. 133 “Atualmente, a maioria das células dos protoctistas e todas as células de plantas, animais e fungos contêm mitocôndrias. A respiração de oxigênio que mantém vivos os membros dos quatro reinos biológicos mais novos ocorre no interior dessas organelas. (Como os órgãos no interior do corpo, as organelas são estruturas funcionais dentro das células eucarióticas). As organelas mitocondriais parecem bactérias. Chegam até a crescer e se dividir em duas, com ritmo próprio, no interior da célula maior. Acredita-se que elas tenham vindo de bactérias – mas, depois de mais de um bilhão de anos de associação, não podem sobreviver fora dos limites celulares.” P. 133 “Qualquer que tenha sido o cenário exato da aquisição da motilidade e dos talentos às vezes respiratórios e fotossintéticos dos eucariotos, a simbiose certamente deve fazer parte dessa narrativa. As simbioses íntimas foram essenciais para a evolução das células.” P. 141 “(...), as mitocôndrias de nossas células vieram de bactérias que nem evitavam nem simplesmente toleravam o oxigênio. As bactérias que evoluíram para mitocôndrias, as quais são matrilinearmente transmitidas – somente o óvulo as lega ao embrião humano - , exploraram a grande reatividade do oxigênio.” P. 141 “Enquanto, em média, duas moléculas de ATP são produzidas pela fermentação de uma molécula de açúcar, essa mesma molécula de açúcar, com a evolução da respiração, passou a gerar até 36 moléculas de ATP. As novas bactérias – inclusive os ancestrais de nossas mitocôndrias – recuperavam energia das moléculas de açúcar com mais de 15 vezes a eficiência de suas predecessoras, envenenadas pelo oxigênio.” P. 142 “Através da simbiose, diferentes variedades de bactérias se uniram e produziram células nucleadas. Muitas vezes, essas células nucleadas clonavam-se em cópias múltiplas, que permaneciam em contato físico após a reprodução. Um Parameciem ou Euglena é uma célula “individual” nucleada, já fascinante por sua mistura de seres vivos. Mas a vida vegetal, animal e fúngica, ampliou enormemente a complexidade das células protistas de vida livre, repetindo-as para gerar cópias multicelulares que acabaram evoluindo para tecidos separados, como o tecido reprodutor e o tecido nervoso, dotados de funções distintas.” P. 146s “Qualquer protoctista, planta, fungo ou animal é membro de uma espécie. É muito provável que os protoctistas tenham sido os primeiros seres orgânicos a constituir espécies e os primeiros cujas espécies se extinguiram. A origem de indivíduos que são todos pertencentes a uma mesma espécie é idêntica à origem dos primeiros protoctitas. O microbiologista canadense Sorin Sonea chama atenção para uma questão interessante, ao afirmar que as bactérias, por trocarem genes reversivelmente em escala planetária, não têm verdadeiras espécies. As espécies são grupos cujos membros cruzam entre si.
  • 14. Todas as bactérias do planeta, em princípio, podem cruzar umas com as outras. Quando muito, poder-se-ia dizer que formam uma única espécie global.” P. 147 “A demarcação das espécies, portanto, é muito mais aplicável aos protoctistas, nos quais ela de fato apareceu pela primeira vez; o mesmo se deu com a sexualidade – do tipo “meiótico”. De um modo fatídico para a história futura de formas biológicas como nós, a sexualidade, nos protoctistas, passou a estar inextricavelmente ligada à morte. As bactérias podem ser mortas, mas não morrem naturalmente. Alguns protoctistas, em especial os ciliados e os micetozoários, diversamente das bactérias, envelhecem, mesmo que as condições externas sejam adequadas à saúde. O envelhecimento e a morte, nos quais as células vivas se desintegram em prazos previsíveis, desenvolveram-se inicialmente nos protoctistas sexuados. A morte “programada”, como ponto final do metabolismo de uma vida inteira, inexistia na origem da vida – e muito tempo depois dela.” P. 148 “Houve época, segundo acreditamos, em que a alimentação e o acasalamento eram a mesma coisa. A indigestão microbiana terminal talvez pareça bem pouco romântica como fonte do impulso sexual humano. (...). Em tempos de escassez, nossos ancestrais unicelulares mais primitivos deviam alimentar-se desesperadamente uns dos outros. De vez em quando, suas membranas deviam fundir-se.” P. 150 “Tendo sido, originalmente, talvez canibais aflitos, os protistas cromossomicamente duplicados são nossos ancestrais. Os seres humanos e todos os animais herdaram a morte desses eucariotos primitivos. Cada geração começa onde a última acabou e, dependendo de quem sobreviva, cada uma segue um curso ligeiramente diferente. No correr do tempo, isso leva a novas espécies.” P. 151 “Quando o alimento é abundante, as amebas comem sozinhas. Mas, quando ele escasseia, cada célula faminta segrega um composto que exerce uma atração mútua. As amebas movem-se em direção à concentração mais alta. Juntas, as células se fundem e formam um “grude” móvel, que cresce verticalmente numa massa pegajosa, até que sua “cabeça” estoura e libera cistos de paredes robustas, passíveis de ser transportados em segurança pelo vento e pela água. Quando os cistos chegam a um meio ambiente clemente, começa uma nova geração de amebas.” P. 151 “Examinar nossa origem nos protoctistas leva-nos à humildade. Não há como negar nosso parentesco com esse tipo de matéria viva. Os seres humanos são colônias integradas de seres amebóides, assim como os seres amebóides – os protoctistas – são colônias integradas de bactérias. Querendo ou não, viemos do lodo.” P. 151 “A vida é uma extensão do ser para a geração seguinte, para a espécie seguinte. É a engenhosidade de tirar o máximo proveito da contingência – de criar animais, por exemplo, a partir de uma tentativa atamancada de canibalismo. A vida é maior do que a célula ou o organismo. Inclui a biosfera, o meio ambiente da superfície planetária como um todo – desde a formação de nuvens marinhas até o controle da química dos oceanos pelos protoctistas e seus progenitores.” P. 154 “Os animais são montagens multicelulares que sempre se desenvolvem a partir de uma única célula. Um espermatozóide nadador (dotado de undulipódios) penetra num óvulo
  • 15. e o fertiliza. Em seguida, já fertilizado, o ovo se divide em duas, quatro, oito e mais células, que compõem a fase embrionária da blástula, essência da animalidade.” P. 157 “Os fósseis revelam que os animais evoluíram antes das plantas ou fungos. Os animais – exclusivamente animais marinhos – começaram a deixar um rico registro fóssil no início da era paleozóica. Mas não há vestígios de plantas nem fungos até se passarem mais de 100 milhões de anos depois do surgimento de animais providos de carapaças. Mesmo hoje, os animais – sendo típicos nesse aspecto, já que a vida desenvolveu-se na água – são mais abundantes nos meios aquáticos do que em terra. Apenas os vegetais e fungos são criaturas paradigmaticamente terrestres. Os micróbios tiveram que se aventurar pelas regiões de terra antes que esses reinos mais novos pudessem evoluir nelas.” P. 157 “Não só os animais têm consciência, como todo ser orgânico, toda célula autopoética é consciente. No sentido mais simples, a consciência é um dar-se conta do mundo externo. E esse mundo não precisa ser o mundo externo à pelagem de um mamífero. Também pode ser o mundo externo à membrana celular. Sem dúvida, algum nível de consciência e de reatividade decorrente dessa consciência está implicado em todos os sistemas autopoéticos. Afinal, o mundo não é uma placa de Petri e não chove Agar do céu. Todo ser vivo sente e reage incessantemente e com vivacidade aquilo que o cerca.” P. 161 “Todos os animais têm uma etapa multitissular em sua história de vida. Mas a química complexa da vida ainda se restringe à célula, cujo diâmetro pequeniníssimo tem menos de um único mícron. Cada geração de toda sorte de animais retorna à célula única do tipo ancestral como o ovo fertilizado. O aumento do tamanho e da complexidade da vida animal ocorreu à medida que células socialmente agregadas evoluíram e formaram corpos unificados.” P. 161 “Os animais – todos com genitores bissexuais e ovos fertilizados que formam embriões – amadurecem, transformando-se em reprodutores sujeitos à morte individual programada. Apesar de sua diversidade e exuberância, eles são novatos evolutivos. Os primeiros animais desenvolveram-se num mundo rico em oxigênio, com grandes massas continentais e mares abertos – um mundo não muito diferente do que hoje nos sustenta. Mas, na época de seu aparecimento, 80 por cento da história da vida – até ali – já se havia desenrolado.” P. 162 “Habitantes dos oceanos desde o começo, os primeiros animais só apareceram no registro fóssil no fim do éon proterozóico, há uns 600 milhões de anos. Os famosos trilobitas, animais marinhos do início do período cambriano, são ainda mais recentes. As provas claras de fósseis abundantes de animais providos de partes duras datam de menos de 600 milhões de anos atrás. Como faz a maioria dos animais de hoje, todos viviam na água do mar. Pouquíssimos ancestrais dos animais modernos – alguns craniados, vermes, insetos, aranhas e moluscos – conseguiram deixar para trás o oceano e sobreviver em terra.” P. 162 “O menor animal existente hoje é o Trichoplax – uma criatura sem cabeça nem cauda, descoberta a se arrastar de barriga pela lateral de um aquário marinho da Filadélfia, em 1965. Não fosse por sua vida sexual e seu embrião, o Trichoplax seria um protoctista. Deslizando sobre seus undulipódios, assemelha-se superficialmente a uma larva de
  • 16. mixomiceto ou a uma ameba gigante. Mas é um ser multicelular durante toda a sua vida e um verdadeiro animal. Tem mais undulipódios no ventre do que no dorso. Não tendo cabeça nem cauda, lado direito ou esquerdo, nem tampouco olhos ou estômago, esse lento e minúsculo rastejador só revela o segredo de sua animalidade na reprodução. Após a fusão com o espermatozóide, o ovo esférico do Trichoplax transforma-se numa blástula embrionária que, com a continuidade da divisão celular, achata-se e, à semelhança das amebas, é expelida. Embora você não quisesse pendurar um retrato dele em sua sala, é provável que o Trichoplax tenha uma forte semelhança com nossos ancestrais animais mais primitivos.” P. 165 “A transição da célula para a sociedade celular e o organismo animal é uma antiga história na evolução: os indivíduos agrupam-se em sociedades, as quais, por sua vez, tornam-se indivíduos. Sob pressões intensas da seleção, os protistas nadadores transformaram-se em protoctistas coloniais. Depois, na fase final do éon proterozóico, surgiram corpos de animais parecidos com o Trichoplax. A especialização de um número maciço de células em indivíduos integrados encontra-se na base da vida animal – e na dos grupos posteriores de fungos e vegetais.” P. 166 “Na verdade, toda a nossa vida, do ventre até o túmulo, é uma etapa intermediária no ciclo de vida de minúsculas células fundidas. Os animais emergem numa outra dimensão, da vida visível e da consciência, apenas para voltar, através da sexualidade, a seu antigo estado microbiano unicelular. A morte é o preço que todos pagamos por essa antiga história de composição multicelular, por essa incapacidade de os protistas famintos desfazerem suas amarras da era proterozóica. O que “morre” é o corpo, a carne adulta, depois de haver liberado na água ou num líquido corporal o espermetazóide caudado, semelhante a um protista, e o óvulo, mais rechonchudo. A vida animal só ressurge a partir de predecessores protoctistas. Os protoctistas com ciclos complexos de fertilização, multicelularidade e meiose tornam-se animais.” P. 168 “Como a morte programada, o sexo não é intrínseco à vida. Ele evoluiu. As células dos diferentes tipos de parceiros protoctistas de hoje, a princípio tinham aparência idêntica. A fusão sazonal e a restauração do número de cromossomos na fertilização prepararam o terreno para a origem do sexo. Os primeiros parceiros sexuais encontraram-se apressadamente num ambiente aquoso da época, como fazem os protoctistas atuais. Reagindo às ligeiras diferenças químicas de cada um, os parceiros se uniram. As esponjas, os ouriços-do-mar, os peixes e até os gametas dos mamíferos, como seus ancestrais protoctistas, ainda têm seus encontros em lugares aquosos.” P. 168 “Os numerosos e minúsculos espermatozóides dos machos, comparados aos óvulos pouco numerosos e maiores das fêmeas, foram o início de uma assimetria evolutiva que hoje se estende pelos campos do debate político, sociolingüístico e psicológico. Os biólogos evolucionistas sugerem que a desigualdade sexual primitiva – os machos maximizavam a reprodução, inseminando o maior número possível de fêmeas, enquanto, depois de um certo limite, o acasalamento tornava-se supérfluo para as fêmeas, cerceada pela dedicação a sua quantidade menor de óvulos – está por trás atitudes distintas de machos e fêmeas em relação ao sexo.” P. 169 “As bactérias e os protoctistas prepararam o terreno. Eles, e não os animais, introduziram a recombinação do DNA, a locomoção, a reprodução que levou ao crescimento exponencial, a fotossíntese e os esporos resistentes à fervura. Eles, e não os
  • 17. animais, foram os pioneiros da simbiose e da organização de indivíduos a partir de coletividades multicelulares. Eles inventaram a motilidade intracelular (inclusive a mitose), os ciclos complexos de desenvolvimento, a meiose, a fusão sexual, a individualidade e a morte programada. Os micróbios procrarióticos, e não os animais, ou os vegetais, ainda dirigem todos os ciclos geoquímicos que tornam o planeta habitável.” P. 170 “Entre os espécimes mais tocantes do xisto de Burgess encontra-se a Pikaia, o primeiro membro conhecido de nosso grupo dos cordados – aquele a que pertencem os seres humanos e todos os outros animais providos de espinha dorsal. A Pikaia, uma criatura nadadora segmentada, vermiforme, é discreta, se comparada a formas mais espetaculares de Burgess. Mas tem nas costas um sólido bastão cartilaginoso – a notocórdia. Essa estrutura universal dos cordados, quando não está presente no adulto, faz uma aparição fugaz nas larvas ou noutros estágios imaturos do ciclo de vida. Até a descoberta da Pikaia no xisto de Burgess, não se conhecia nenhum cordado proveniente de rochas com mais de 450 milhões de anos, depositadas durante o ordiviciano, o período geológico posterior ao cambriano.” P. 171 “Aqueles dentre nós que sucumbem à morte programada e cujos restos mortais não são devorados como carniça, nem tampouco incinerados, vão para o submundo fúngico. As substâncias químicas de nosso corpo são devolvidas a terra. Os fungos mantêm a reciclagem dos compostos da vida. O funcionamento global do reino dos Mychota é tão regular quanto o de um rim ou um fígado. Nós, com nosso passado nômade, ainda estamos nos adaptando à idéia de que, num sistema fechado, os frutos de nosso trabalho e nossos esforços não podem acumular-se indefinidamente. Têm que ser distribuídos, devolvidos ao sistema de onde vieram. Essa é uma lição difícil: a matéria de nosso corpo, nossa propriedade e nossa riqueza, não nos pertence. Pertence à Terra, à biosfera, e, queiramos ou não, é para lá que se destina, sempre. Os fungos ajudam-na a chegar lá.” P. 200 “A vida é uma rede de alianças cruzadas entre reinos, da qual o reino Mychota é um participante voluntário e habilidoso. A vida é uma orgia de atrações, desde a trapaça das “flores” falsas até o estranho fascínio das trufas e de alucinógenos difíceis de engolir. Tal como os fungos, a vida tanto procura o submundo do solo e da podridão quanto às paisagens ensolaradas, carregadas de seres fotossintéticos. A vida é auto-renovadora, e os fungos, como recicladores, mantêm toda a superfície planetária fervilhando de vida. Transmigrando a matéria, os bolores e os micélios encontraram sua vocação. Criando e destruindo, atraindo e repelindo, garantindo e derrubando, eles são partes integrantes da terra firma.” P. 201. “”A ação da radiação solar nos processos terrestres fornece uma base precisa para considerarmos a biosfera como um mecanismo tanto terrestre quanto cósmico. O sol transformou por completo a face da Terra ao penetrar na biosfera, que modificou a história e o destino de nosso planeta, convertendo os raios solares em novas e variadas formas de energia. Ao mesmo tempo, a biosfera é, predominantemente, um produto dessa radiação. (citação de Vladimir Vernadsky).”” P. 203 “A fonte suprema de toda a energia, crescimento e comportamento da vida é o Sol. Queimando como um frio fogo verde, os seres fotossintéticos transmudam a luz solar
  • 18. neles mesmos. Os protoctistas (cocolitoforídeos, diatomáceas e algas marinhas) são os principais transmutadores no mar; as plantas são os principais em terra.” P. 205 “A economia provém da vida fotossintética e do sol. Os fotossintetizadores utilizam a radiação solar para produzir a fria moeda em espécie da biosfera. O calor se dissipa e a energia degradada perde-se no espaço, à medida que a riqueza primitiva se acumula. Bactérias forossintéticas coloridas, protoctistas e plantas do mundo inteiro produzem e “poupam”. Ao comê-los, os consumidores podem “gastar” em atividades metabólicas a energia fotossintética acumulada, ou armazená-la anabolicamente (e temporariamente) em seus tecidos herbívoros ou predadores. A riqueza primitiva também pode acabar na armazenagem a longo prazo (ou ser totalmente perdida), quando os consumidores morrem e são enterrados sem que haja decomposição.” P. 210 “(...), o estrago humano dos meios ambientes exuberantes que nos nutriam não constitui prova de qualquer capacidade singular de por em risco toda a vida na Terra. No passado, nenhuma espécie isolada jamais ameaçou todas as outras. Qualquer tendência de uma espécie a crescer em demasia e causar devastação era contida por todas as demais. A essência da “seleção natural” está em que as tendências irrefreáveis de uma população a crescer, a ponto de causar degradação ambiental são contidas pelo crescimento das outras. A expansão da população humana segue as mesmas regras: o ambiente degradado gera doenças, altos índices de mortalidade e, em última instância, até mesmo a extinção.” P. 212 “Vislumbramos algumas maneiras de descrever o que é vida: um processo material que peneira e desliza sobre a matéria como uma lenta e estranha onda; uma exuberância planetária; um fenômeno solar – a transmutação astronomicamente localizada do ar, da água e da radiação solar recebida pela Terra em células. A vida pode ser vista como um intricado padrão de crescimento e morte, aceleração e recuo, transformação e decadência. Ligada pelo tempo darwiniano à primeira bactéria e pelo espaço vernadskiano a todos os cidadãos da biosfera, ela é uma rede única em expansão. A vida é a matéria desenfreada, capaz de escolher sua própria direção para adiar indefinidamente o momento inevitável do equilíbrio termodinâmico - a morte. A vida é também uma pergunta que o universo faz a si mesmo, sob a forma do ser humano.” P. 225