2. O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar; http://www.youtube.com/watch?fe
À roda da nau voou três vezes, ature=player_embedded&v=f0RS
Voou três vezes a chiar, m-OfIqk#
E disse: “Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?”
E o homem do leme disse, tremendo:
“El-Rei D. João Segundo!”
“De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?”
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso,
“Quem vem poder o que eu só posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?”
E o homem do leme tremeu e disse:
“El-Rei D. João Segundo!”
Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
“Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!”
3. Este poema é constituído por 3 estrofes, de 9 versos cada, ou seja, são
nonas.
Existe alternância de rimas ricas e rimas pobres;
A rima apresenta também algumas irregularidades.
O esquema rimático é AABAACDCD com rimas emparelhadas em
“A”, cruzadas em “C” e “D”, e em verso solto “B”.
4. Refrão Hexassilábico: “El-Rei D. João Segundo!” o restante poema é
decassilábico.
Ritmo crescente (cresce à medida que o homem do Leme “cresce” em
coragem).
A fraca adjectivação ( tem apenas três adjectivos: "negros", "imundo" e
"grosso") e a grande quantidade de nomes.
5. O Mostrengo inserido na segunda parte da Mensagem – “O Mar Português” – poemas
inspirados na expectativa e incerteza do desconhecido e no espaço heróico na luta
contra as dificuldades e as adversidades.
Este poema inspira-se na passagem do Cabo das Tormentas, ou seja, a passagem do
Oceano Atlântico para o Oceano Índico, e simboliza o ultrapassar dos medos.
6. Este poema apresenta profunda semelhança com o episódio “Adamastor” de
“Os Lusíadas”.
O “Mostrengo” é o retomar da figura presente no “Adamastor” que assusta e
ameaça os navegadores.
No poema de Pessoa, o Homem do Leme, ao serviço de D. João II, representa
a “vontade” de um povo que quer o Mar que o Monstro afirma ser seu.
O poema apresenta uma estrutura narrativa com um diálogo repetido entre
Mostrengo (Golias) e o Homem do Leme (David).
7. Numero 3: É um número misterioso por excelência, exprime uma
espiritualidade em Deus, resume-se á união entre o Céu e a Terra.
O Mostrengo: Simboliza o desconhecido, as lendas do Mar, os obstáculos e os
medos dos navegadores portugueses.
O homem do leme: Representa o povo português, o patriotismo e a vontade de
Portugal em evoluir e alcançar um objectivo;
O leme: Símbolo de responsabilidade; significa autoridade, cuidado, poder de
decisão.
8. Contém vários tempos verbais: Verbos “dinâmicos”, de movimento o
Infinitivo: “Voou três vezes a chiar”; o Presente do indicativo: “O mostrengo
que está no fim do mar”; o Pretérito perfeito: “E disse: Quem é que ousou
entrar”; o Gerúndio: “E o homem do leme disse, tremendo:”; o Conjuntivo:
“Que moro onde nunca ninguém me visse”;
9. Metáfora: “Meus tectos negros do fim do mundo?”
Anástrofe: “Três vezes do leme as mãos ergueu,” – (É a inversão do sentido da frase)
Quiasmo: “Disse o mostrengo, e rodou três vezes / Três vezes rodou imundo e grosso” –
(Dispõe os elementos em ordem inversa)
Anáfora: “De quem são as velas onde me roço? / De quem as quilhas que vejo e ouço?” –
(Repetição da mesma palavra em várias frases)
Interrogações retóricas: “….E escorro os meus medos do mar sem fundo?” –
(Frase interrogativa, dirigida a um destinatário
presente ou ausente, sem que se espere obter resposta)
Hipérbato: "três vezes do leme as mãos ergueu", "três vezes ao leme as reprendeu", "E
mais que o mostrengo, que me a alma teme” – (troca da ordem direta dos termos da oração)
10. Concluímos que Pessoa com este poema queria exprimir os obstáculos
que os portugueses na era dos descobrimentos tinham pela frente, e
que acima de tudo conseguiam superar os seus medos.