Este documento discute o conceito de crônica e fornece um exemplo de crônica escrita por Miguel Esteves Cardoso. A crônica contém comentários críticos sobre vários tópicos como família, morte, sonhos, Portugal e assassinatos.
1. Língua Portuguesa e Francesa – Dúvidas e recursos
A Crónica
Definição de Crónica
A crónica é o comentário noticioso de factos, que vive do quotidiano mas não visa a
informação. Pode ser uma espécie de narração de acontecimentos, uma apreciação de
situações ou, na definição tradicional, assumir-se como relato histórico.
Antigamente, a crónica era um relato histórico ou uma narração de factos históricos
redigida segundo a ordem do tempo (a palavra grega cronos significa tempo; e em latim
chronica, diz-se da narrativa de factos de acordo com o decorrer dos tempos).
A crónica moderna é, muitas vezes, uma apreciação crítica, um comentário ou uma
narração de acontecimentos reais ou imaginários, a que se exige oportunidade e caráter
pessoal, alterna a subjetividade literária com o relato de factos.
1. Lê a seguinte crónica de Miguel Esteves Cardoso:
O Pensamento Vivo
- Há qualquer coisa de errado na família. A família não funciona. Sei que,
como conservador, deveria defender a família. Mas não consigo. A família
é indefensável. É um equívoco. É um efeito de economia. A família está a
dar cabo das pessoas. E das famílias.
- A morte é um nojo. Morrer é uma autêntica vergonha. Que sentido é que
faz? A vida pode não ser bonita, mas a morte é um horror. Qual paz, qual
sopa de alho porro. Qual "não tenhas medo, estás nas mãos de Deus"!
Diante da morte, o medo é a única reacção sensata que se pode ter. A morte
é um atraso de vida.
- A vida pode ser difícil mas a morte é demasiado fácil. A vida é diferente
mas a morte é igual. A vida é comprida. A morte é um instante. Da nossa
vida tudo nos é pedido e esperado. Da morte ninguém exige nada. Mais
vale viver mal e errado que morrer bem a arrumado.
- Em bom português, a expressão "Estás com boa cara" significa
exactamente: "Ultimamente tens andado com má cara". A partir de uma
certa idade, a cara é muito importante. De nada interessa uma pessoa sentir-
2. Língua Portuguesa e Francesa – Dúvidas e recursos
se bem, ou estar bem, ou mesmo ser bem. Em Portugal, todos os check-ups
do mundo não valem o olhinho arguto de um transeunte que diz " Está com
má cara".
- Não há nada, mas nada, mais entediante do que ouvir alguém contar um
sonho. Dá sono. Para adormecer, não há melhor. Quanto mais esquisito o
sonho, mais chato.
- Os melhores sonhos de todos são aqueles que nos põem a pensar e a
mexer. Os únicos sonhos de que vale a pena falar são os que não nos
deixam dormir.
- Voltar a Portugal é como voltar a fumar: é maravilhoso e, ao mesmo
tempo, horrível.
- Os homens são brutos e insensíveis. Matam mais criancinhas, portam-se
pior à mesa, cospem e coçam-se mais. Os homens - e sobretudo os homens
que gostam de mulheres - são menos inteligentes, menos delicados e menos
civilizados que as mulheres. A única coisa que têm a favor deles, à parte
certas características discutíveis, como serem menos histéricos, é as
mulheres gostarem deles. Por que é que as mulheres gostam dos homens?
Como lésbica que sou nunca entendi.
- Confesso. Não acredito em Deus. Recuso-me a ser ateu. Quero acreditar
em Deus. Faz-me falta. Faz-me mal não acreditar Nele.
- Ser filho é difícil. Mais difícil que ser pai. É raro ouvir-se falar de um
"bom filho". Por alguma razão. Os filhos são sempre maus. Mamam e
fogem. Sugam os pais até o tutano, dando-lhes cabo da paciência, da saúde
e do orçamento e quando estão anafados e nutridos, licenciados e
fresquinhos, chamam-lhes senis e dão o solex à primeira oportunidade.
- O que mais notabiliza o assassino português é já estar morto. Ou pelo
menos preso. Os nossos homicidas matam-se e entregam-se mal estejam
despachados. Os assassinos estrangeiros fazem questão de continuarem
vivos. Combinam, premeditadamente, os seus crimes, planejam fugas,
arranjam álibis, dão luta aos investigadores. Os nossos, está quieto. Os
assassinos estrangeiros voltam ao local do crime: os portugueses nem
sequer se dão ao trabalho de abandoná-lo.
3. Língua Portuguesa e Francesa – Dúvidas e recursos
- Nós, portugueses, somos demasiado teatrais no dia-a-dia para sermos
bons actores no teatro.
- Um menino é um fascista com lapsos de anjinho. É um tirano-junior
maníaco depressivo de lágrima-puxa-risota e risota-puxa-birra, com o
coração mais branquinho, a transbordar de fuligem e de maldade. É um
psicopata com as asas presas nos suspensórios.
- Se há uma coisa que os portugueses não têm à mesa é finesse. A fineza é
uma coisa que fazem. Não é coisa que tenham.
- Quando eu era garoto pensava que "decadência" significava "caírem os
dentes". Depois aprendi que não era. Hoje descobri afinal que era verdade.
2. Responde agora às seguintes perguntas, sobre a crónica:
a) Ao longo de toda a crónica nota-se um tom largamente crítico. Indica
que críticas são feitas.
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b) Explica por palavras tuas esta frase "quando estão anafados e nutridos,
licenciados e fresquinhos".
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4. Língua Portuguesa e Francesa – Dúvidas e recursos
3. Atenta na seguinte frase:
"O homem que mordeu o cão"
3.1. A partir deste título de uma notícia escreve a tua crónica.
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