SlideShare ist ein Scribd-Unternehmen logo
1 von 116
Downloaden Sie, um offline zu lesen
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES
AUDREY DANIELLE BESERRA DE BRITO
Os contos de fadas contemporâneos na versão fílmica e a
construção psicológica de valores : um estudo exploratório na
perspectiva dos Modelos Organizadores do Pensamento
São Paulo
2011
2
AUDREY DANIELLE BESERRA DE BRITO
Os contos de fadas contemporâneos na versão fílmica e a
construção psicológica de valores : um estudo exploratório na
perspectiva dos Modelos Organizadores do Pensamento
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado a Escola de Artes,
Ciências e Humanidades da
Universidade de São Paulo para a
obtenção do título de especialista
em Ética, Valores e Saúde na
Escola.
Área de Concentração:
Educação e Construção de
Valores
Orientador(a): Profª Ângela
Esteves Modesto
São Paulo
2011
3
RESUMO
BRITO, A. D. B. et al (Ed). Os contos de fadas contemporâneos na versão fílmica e
a construção psicológica de valores : um estudo exploratório na perspectiva dos
Modelos Organizadores do Pensamento. 2011. 116 f. TCC - Escola de Artes, Ciências e
Humanidades, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.
A sociedade contemporânea passou a priorizar os valores hedonistas, principalmente,
por influencia da mídia. Além disso, é fato que os meios de comunicação passaram a
utilizar-se da linguagem sincrética para comunicar, seduzir, persuadir, distrair, informar
e também para manipular. Mas, será que o sincretismo das versões fílmicas
contemporâneas tanto dos contos de fadas tradicionais, como dos contos de fadas
atuais, buscam construir nas crianças ensinamentos éticos e morais? Ou será que
estas versões, por serem produtos midiáticos, constroem valores hedonistas? Estes
questionamentos convergiram em uma grande inquietação, que nos levou a buscar
descobrir como ocorre a representação da moralidade nos contos de fadas midiáticos
voltados para crianças. Assim, o objetivo desta pesquisa foi investigar, por meio de
modelos organizadores do pensamento, o aparecimento ou não dos valores morais
generosidade e compaixão e do valor não-moral egoísmo, em crianças de 10 a 12
anos, a partir de conflitos de natureza moral presentes em cenas recortadas dos contos
de fadas contemporâneos, na versão fílmica. Esta pesquisa justifica-se pelo fato de se
fazer necessário analisar a essência dos contos de fadas contemporâneos, na versão
fílmica, a fim de descobrir se eles ainda buscam construir valores morais ou se foram
“contaminados” pelos valores hedonistas presentes na sociedade contemporânea.
Palavras-chave: Valores morais e não-morais. Generosidade. Compaixão. Egoísmo.
Modelos Organizadores do Pensamento.
4
Ao propor que se leve em conta a generosidade, para
compreender a moralidade, estaremos concebendo o ser
humano como um ‘saco de virtudes’? De modo algum. Uma
teoria do ‘saco de virtudes’ pressupões justaposição entre
diversas virtudes. Quanto a nós, propomos uma integração
entre elas”
Yves de La Taille (2004)
5
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho 53
Quadro 2 Deu a louca na Cinderela 62
Quadro 3 Deu a louca na Branca de Neve 71
Quadro 4 Enrolados 79
Quadro 5 Shrek I 88
Quadro 6 Shrek II 89
Quadro 7 Shrek III 90
6
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Quantidade de recortes por filme 48
Tabela 2 Configuração dos Modelos Organizadores de
Pensamento e sub-modelos referente ao filme
“Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho”
55
Tabela 3 Disposição afetiva em relação aos valores
expressos no filme “Deu a louca na Chapeuzinho
Vermelho”
58
Tabela 4 Configuração dos Modelos Organizadores de
Pensamento e sub-modelos referente ao filme
“Deu a louca na Cinderela”
63
Tabela 5 Disposição afetiva em relação aos valores
expressos no filme “Deu a louca na Cinderela”
66
Tabela 6 Configuração dos modelos organizadores de
pensamento e sub-modelos referente ao filme
“Deu a louca na Branca de Neve”
72
Tabela 7 Disposição afetiva em relação aos valores
expressos no filme “Deu a louca na Branca de
Neve”
75
Tabela 8 Configuração dos modelos organizadores de
pensamento e sub-modelos referente ao filme
“Enrolados”
83
Tabela 9 Disposição afetiva em relação aos valores
expressos no filme “Enrolados”
85
Tabela 10 Configuração dos modelos organizadores de
pensamento e sub-modelos referente ao filme
“Shrek I, II e III”
91
Tabela 11 Disposição afetiva em relação aos valores
expressos no filme “Shrek I, II e III”
94
Tabela 12 Exemplos de respostas que ilustram o modelo 2 97
Tabela 13 Exemplos de respostas que ilustram o modelo 1 101
Tabela 14 Sentimentos morais e não-morais expressos a
partir da análise dos recortes dos contos de fadas
na versão fílmica
105
7
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Construção de valores, em porcentagem, a partir
do filme “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho”
57
Gráfico 2 Posição dos valores no filme “Deu a louca na
Chapeuzinho Vermelho”
57
Gráfico 3 Presença dos valores nos protocolos de respostas
do filme “Deu a louca na Cinderela”
64
Gráfico 4 Posição dos valores no filme “Deu a louca na
Cinderela”
66
Gráfico 5 Presença dos valores nos protocolos de respostas
do filme “Deu a louca na Branca de Neve”
74
Gráfico 6 Posição dos valores no filme “Deu a louca na
Branca de Neve”
75
Gráfico 7 Presença dos valores nos protocolos de respostas
do filme “Enrolados”
83
Gráfico 8 Posição dos valores no filme “Enrolados” 84
Gráfico 9 Presença dos valores nos protocolos de respostas
do filme “Shrek”
92
Gráfico 10 Posição dos valores no filme “Shrek” 93
Gráfico 11 Agrupamento de sujeitos pelos valores construídos
ou não construídos
96
Gráfico 12 Presença do Egoísmo em cada Filme 99
Gráfico 13 Egoísmo como valor central e periférico 100
Gráfico 14 Valor moral e valor não-moral como valor central e
periférico.
101
Gráfico 15 Presença da Generosidade em cada Filme 104
Gráfico 16 Generosidade como valor central e periférico 105
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Sujeito Psicológico 21
Figura 2 Comparação entre a Jornada do Escritor e a
Jornada do Herói
33
9
SUMÁRIO
1 APRESENTAÇÃO ................................................................................ 11
1.1 A pergunta de pesquisa .......................................................... 12
1.2 Hipóteses................................................................................. 12
1.3 Objetivo geral.......................................................................... 12
1.4 Objetivos específicos............................................................... 13
1.5 Justificativa.............................................................................. 13
1.6 Método e metodologia............................................................. 13
2 QUADRO TEÓRICO ............................................................................ 14
2.1 O sujeito contemporâneo: identidade e valores.......................... 14
2.1.1 Valores: conceito e processo de internalização................ 17
2.1.2 O sujeito psicológico e a construção de valores................ 21
2.1.3 A criança e o processo de internalização dos valores....... 27
2.1.4 Valores morais e não-morais............................................. 29
2.2 Os contos de fadas...................................................................... 30
2.2.1 A estrutura das narrativas maravilhosas........................... 31
2.2.2 Os contos e fadas e os valores morais e éticos................ 35
2.2.3 O longa-metragem animado.............................................. 39
3 METODOLOGIA DE PESQUISA......................................................... 43
3.1 Método......................................................................................... 43
3.2 A investigação da moralidade a partir dos modelos
organizadores do pensamento....................................................
45
3.3 Procedimentos metodológicos.................................................... 47
3.4 Procedimentos para a coleta de informações............................. 49
3.5 Procedimentos para a análise das informações.......................... 50
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS ........................ 51
4.1 Chapeuzinho Vermelho 51
4.1.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 51
4.1.2 Apresentação dos modelos organizadores de
pensamento relativos ao filme “Deu a louca na Chapeuzinho
Vermelho”
53
4.2 Cinderela 59
4.2.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 59
4.2.2 Apresentação dos modelos organizadores de
pensamento relativos ao filme “Deu a louca na Cinderela”.........
62
4.3 Branca de Neve........................................................................... 68
4.3.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 68
4.3.2 Apresentação dos modelos organizadores de
pensamento relativos ao filme “Deu a louca na Branca de
Neve”...........................................................................................
70
10
4.4 Rapunzel..................................................................................... 76
4.4.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 76
4.4.2 Apresentação dos modelos organizadores de
pensamento relativos ao filme “Enrolados”.................................
79
4.5 Shrek........................................................................................... 86
4.5.1 O filme................................................................................ 86
4.5.2 Apresentação dos modelos organizadores de
pensamento relativos aos filmes “Shrek I, II e III”
88
4.6 Considerações sobre a análise dos resultados........................... 94
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................ 107
REFERÊNCIAS ........................................................................................ 112
11
1. APRESENTAÇÃO
É fato que a sociedade contemporânea passou a priorizar os valores
hedonistas1
, principalmente, por influencia da mídia (VALDES, 2009, p. 33) e que os
contos de fadas buscam transmitir valores e ensinamentos éticos e morais (COELHO,
2000, p. 154).
Por outro lado, conforme declara Pierre Lévy (1998, p. 15) “vivemos em uma
civilização da imagem e do audiovisual” e ainda, de acordo com Brito (2011, p. 21) “a
preponderância visual é maciça e determinada pelos meios de comunicação que
utilizam a imagem para comunicar, seduzir, persuadir, distrair, informar e também
manipular”.
As imagens são denominadas de linguagem não-verbal2
e, de acordo com Pais
(2003, p. 1), quando a linguagem verbal se funde com a linguagem não-verbal numa
mesma tecnologia, temos a presença da linguagem sincrética. Pais (2003, p. 12) cita o
cinema, o teatro e a televisão como exemplos marcantes da linguagem sincrética.
Mas, será que o sincretismo das versões fílmicas contemporâneas tanto dos
contos de fadas tradicionais, como dos contos de fadas atuais buscam construir nas
crianças ensinamentos éticos e morais? Ou será que estas versões, por serem
produtos midiáticos, constroem valores hedonistas?
Melo (2010, p. 4) destaca que os contos de fadas contemporâneos, na versão
fílmica, colocam em primeiro plano a animação, o que leva o enredo a tornar-se
secundário, pois, segunda ela, a tela do cinema conquistou rapidamente os jovens pela
entrega da imagem pronta e perfeita, tirando-lhes o trabalho de “imaginar” as cenas.
Segundo esta pesquisadora (2009, p. 4):
[...] a trilha sonora, as cores vibrantes, os efeitos visuais e auditivos, a emoção
concentrada na expectativa de uma sala de cinema e o conforto exercem um
domínio em todos os sentidos do receptor [...] Entretanto, a sedução sensível
do receptor pelo cinema constitui uma arma de manipulação deste suporte, o
que sinaliza para o perigo junto aos jovens dessa visão aparentemente
desvinculada da sociedade e dos valores expostos em um filme.
1
O hedonismo é uma doutrina que considera como bem possível o prazer imediato e individual, sendo
este o princípio e o fim de uma vida moral (VALDES, 2009, p. 35).
2
Para a Lingüística, as imagens são denominadas de linguagem não-verbal.
12
Todas essas informações convergiram para uma grande inquietação, que nos
levou a buscar descobrir como ocorre a representação da moralidade nos contos de
fadas midiáticos voltados para crianças.
Assim, apresentamos a seguir o nosso questionamento principal, as hipóteses,
os objetivos e a justificativa desta pesquisa.
1.1 A pergunta de pesquisa
Os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, proporcionam a
construção psicológica do valor moral generosidade e/ou do valor não-moral egoísmo
em crianças de 10 a 12 anos?
1.2 Hipóteses
Hipótese 1: Os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, influenciam a
construção psicológica do valor moral generosidade e do valor não-moral egoísmo
em crianças de 10 a 12 anos;
Hipótese 2: Os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, não influenciam
a construção psicológica do valor moral generosidade e nem na construção
psicológica do valor não-moral egoísmo em crianças de 10 a 12 anos.
1.3 Objetivo geral
Identificar, por meio de modelos organizadores do pensamento, o
aparecimento ou não do valor moral generosidade e do valor não-moral egoísmo, em
crianças de 10 a 12 anos, a partir de conflitos de natureza moral presentes em cenas
recortadas dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica.
13
1.4 Objetivos específicos
a) Verificar os modelos organizadores do pensamento que as crianças, entre 10 e
12 anos, constroem sobre o valor moral generosidade;
b) Verificar os modelos organizadores do pensamento que as crianças, entre 10 e
12 anos, constroem sobre o seguinte valor não-moral: egoísmo.
1.5 Justificativa
Esta pesquisa justifica-se pelo fato de se fazer necessário analisar a essência
dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, a fim de descobrir se eles
ainda buscam construir valores morais ou se foram “contaminados” pelos valores
hedonistas presentes na sociedade contemporânea.
1.6 Método e metodologia
Será utilizada como método indutivo e a pesquisa bibliográfica. Para análise
dos dados colhidos, utilizaremos o instrumento teórico-metodológico da Teoria dos
Modelos Organizadores do Pensamento.
14
2. QUADRO TEÓRICO
2.1 Sujeito contemporâneo: identidade e valores
A busca pelo prazer imediato e individual numa sociedade que, segundo
Lemos (2004, p. 84), é marcada por um imaginário dionisíaco, a exaltação dos
microdesejos que é produto do desenvolvimento de uma cultura descartável, de uma
ciência e de uma técnica voltadas para o consumo e para o fluxo de uma quantidade
gigantesca de informações fragmentadas e o processo de ideologização que, de certa
forma, cerca a reflexividade crítica a partir da distorção, estereotipação, manipulação e
construção da realidade através da influencia cognitiva da mídia (WOLF, 2008, p. 144)
transformaram o homem contemporâneo num indivíduo esquizofrênico que, segundo
Harvey (2007, p. 49), é aquele que acredita numa realidade forjada. Ou seja, é aquele
que consome, através dos veículos midiáticos, fatias de realidade influenciadas pelo
caráter imediato dos eventos e pelo sensacionalismo do espetáculo que procuram forjar
a consciência dos destinatários.
Como um esquizofrênico, o indivíduo utiliza-se de informações desconectadas,
velozes e isoladas, e que não se articulam em seqüências coerentes. Assim, o sujeito
contemporâneo passa a ser composto por uma colagem esquizofrênica de pequenos
fragmentos que significa uma espécie de desmembramento da realidade única em
infinitas realidades simultâneas (HARVEY, 2007, p. 52).
Edgar Morin (1999, p. 17) comenta que a fragmentação do saber tem como
conseqüência um vazio de subjetividade. Nesse sentido, o desaparecimento da
subjetividade, responsável pela construção de nossa identidade, resulta em
esquizofrenia que seria a ausência de identidade.
Esta esquizofrenia, num sentido não clínico, leva o sujeito contemporâneo, a
substituir a sua subjetividade por presentes desconexos, ou seja, por uma cadeia de
significantes sem significado (HARVEY, 2007, p. 52).
15
Desse modo, a sociedade contemporânea passa a agir a partir da ética da
estética3
, e não a partir de uma moral universalizante. Esta ética da estética vai
impregnar todo o ambiente social e contaminar o político, a comunicação, o consumo,
os negócios, as artes e espetáculos, ou seja, a vida quotidiana no seu conjunto
(LEMOS, 2004, p. 86).
O maior problema que Valdes (2009, p. 33) vê nisso tudo é substituição dos
valores morais pelos valores hedonistas. Dalbosco (2005, p. 165) explica melhor esta
observação de Valdes:
O resultado mais imediato desse processo é a invasão das relações de
dinheiro e poder naquele âmbito responsável pela socialização cultural
espontânea das pessoas, no qual elas formam seu caráter, constroem os seus
valores e, em última instância, atribuem significado à sua existência.
Lombardi e Georgen (2005, p. 6) completam o raciocínio de Dalbosco:
Com o enfraquecimento dos pressupostos da ética do dever e com o aumento
das comodidades favorecidas pelo desenvolvimento da ciência e tecnologia
bem como o destaque dado ao indivíduo, seus interesses e direitos, acentuou-
se o hedonismo como uma das principais tendências da sociedade
contemporânea e um dos critérios da orientação moral dos indivíduos.
Diante dessas reflexões sobre o sujeito contemporâneo esquizofrênico, sem
identidade e constituído por valores hedonistas, torna-se necessário e urgente à
educação em valores, conforme prevêem Lombardi e Georgen (2005, p. 84):
Há uma série de acontecimentos indicativos de que se inicia uma resistência
contra o mercado tentacular e o frenesi consumista, contra o relativismo
axiológico e o individualismo hedonista, contra a violência e a banalização da
vida, contra a atomização social e a despolitização, contra a fabricação de
falsas necessidades e promessas de felicidade pelo consumo.
Esse movimento em prol da criação de valores éticos e morais pode ser
identificado nos artigos 1º e 3º da Constituição Federal do Brasil de 1988:
3
Para Lemos (2004,p. 86) a ética da estética ocorre quando a sociedade elabora um éthos, uma maneira
de ser, um modo de existência onde aquilo que é compartilhado com outros será primordial
16
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
Um amplo discurso sobre a importância e a necessidade de uma inversão de
valores está inserido também na educação, conforme podemos notar nos Parâmetros
Curriculares Nacionais, na apresentação do tema transversal ética (BRASIL, 1997, p.
26):
[...] a reflexão sobre as diversas faces das condutas humanas deve fazer parte
dos objetivos maiores da escola comprometida com a formação para a
cidadania. Partindo dessa perspectiva, o tema Ética traz a proposta de que a
escola realize um trabalho que possibilite o desenvolvimento da autonomia
moral, condição para a reflexão ética. Para isso foram eleitos como eixos do
trabalho quatro blocos de conteúdo: Respeito Mútuo, Justiça, Diálogo e
Solidariedade, valores referenciados no princípio da dignidade do ser humano,
um dos fundamentos da Constituição brasileira.
Conforme já apontamos, a educação em valores passou a ser uma
necessidade devido, principalmente, ao desenvolvimento de valores hedonistas. Desse
modo, podemos dizer que três elementos da sociedade contemporânea se entrelaçam
constantemente quando a temática é valor: mídia, educação e comportamento.
A mídia, considerada um dos aparelhos ideológicos do Estado (ALTHUSSER,
1998) manipula o sujeito. De acordo com Brito (2011, p. 74):
[...] é muito comum à manipulação da significação de uma mensagem, de
modo a alcançar determinados efeitos comunicativos, ou seja, o receptor
passa a acreditar no sentido de alguma coisa, mas a realidade recebe uma
comunicação cuidadosamente elaborada por um emissor.
17
Breton (1999, p. 21) ainda completa, afirmando que:
[...] a manipulação consiste em entrar por efração no espírito de alguém para aí
depor uma opinião ou provocar um comportamento sem que ninguém saiba
que houve efração. Tudo está aí, nesse gesto que se oculta a si mesmo como
manipulatório.
Assim, percebemos que a mídia manipula o sujeito e que, por conta disso,
torna-se necessária à educação em valores para que o comportamento do homem
contemporâneo se transforme de hedonista para ético.
2.1.1 Valores: conceito e processo de internalização
Percebemos que a educação em valores é uma exigência da sociedade atual,
mas o que são valores?
Etimologicamente, o termo valor provém do latim valorem que significa que tem
valor, custo (Bueno, 1967).
Bueno (1967) declara que até o século XVI, a palavra valor era utilizada
apenas para quantificar preços e que somente por volta do século XVII é que a palavra
valor passou a ser empregada para significar também a importância das pessoas.
Thomas Hobbes4
, no Leviatã, explica:
O valor, ou a importância de um homem, tal como de todas as outras coisas, é
o seu preço [...] Portanto, não é absoluto, mas que depende da necessidade e
julgamento de outrem [...] Porque mesmo que um homem (como a maioria faz)
atribua a si mesmo o mais alto valor possível, o seu verdadeiro valor não será
superior ao que for estimado por outros.
Schwartz (2006, p. 56) define valor como:
1) uma crença;
2) que pertence a fins desejáveis ou a formas de comportamento;
3) que transcende as situações específicas;
4
HOBBES, T. (1588-1679) Leviatã,ou matéria, forma e poder de uma república eclesiástica e
civil,organizado por Richard Tuck, tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva,
tradução de Cláudia Berliner, revisão de Eunice Ostrenky, São Paulo,Martins Fontes, 2003, parte I, do
Homem, Capítulo X, Do poder,valor, dignidade, honra e merecimento.
18
4) que guia a seleção ou avaliação de comportamentos, pessoas e
acontecimentos;
5) que se organiza por sua importância relativa a outros valores para formar
um sistema de prioridades de valores.
Cabral e Nick (2007, p. 319) posicionam-se da seguinte maneira quando se
referem ao conceito de valor:
Valor é um conceito abstrato, por vezes meramente implícito que define, em
relação a um individuo ou a uma unidade social, quais são as finalidades
desejáveis, ou os meios aconselháveis e apropriados para atingir essas
finalidades. Esse contexto abstrato de valia não é o resultado de uma
avaliação do próprio individuo, mas o produto social que lhe foi imposto e que
ele só lentamente internaliza isto é, usa e aceita como seu critério pessoal de
valor.
Conforme podemos observar, Cabral e Nick afirmam que os valores são
internalizados lentamente. Aristóteles (1985, p. 40) explica como isso ocorre:
Não é, portanto, nem por natureza nem contrariamente à natureza que as
virtudes se geram em nós; antes devemos dizer que a natureza nos dá a
capacidade de recebê-las, e tal capacidade se aperfeiçoa como hábito.
Sendo a virtude um hábito que se solidifica na ação, os valores devem então
ser constantemente repetidos e exercitados para adquirir a força moral, logo, eles
podem ser construídos.
Araújo (2003, p. 158) declara que a construção de valores ocorre a partir da
“projeção de sentimentos positivos que o sujeito faz sobre objetos, e/ou pessoas, e/ou
relações, e/ou sobre si mesmo”.
Para exemplificar esta teoria, podemos pensar numa pessoa que não aceita
falsidades, de maneira nenhuma, logo, ela tem como valor moral a sinceridade.
Além dos valores, Araújo também destaca que as pessoas também projetam
sentimentos negativos sobre objetos, e/ou pessoas, e/ou relações, e/ou sobre si
mesmas, construindo assim contravalores: “os contravalores referem-se àquilo de que
não gostamos, de que temos raiva, que odiamos, por exemplo” (ARAÚJO, 2003, 158).
19
Para esclarecer melhor esta definição, Araújo (2003, p. 159) faz uma analogia
com a escola:
Se a criança gosta daquele ambiente [...] a instituição escolar pode tornar-se
alvo de projeções afetivas positivas e tornar-se um valor para ela. Caso
contrário [...] é bem provável que esse espaço seja alvo de projeções afetivas
negativas, que não seja valorizado, que não se constitua em um valor para ela,
e sim num contravalor.
Há também os valores não-morais que são construídos quando um sentimento
não ético é alvo de projeções afetivas positivas e passam a ser valorado. Araújo (2003,
p. 159) exemplifica, declarando que “o traficante, a violência e o autoritarismo são
valores para algumas pessoas” e ainda comenta:
Ficava impressionado com cenas apresentadas em telejornais, mostrando
pessoas que haviam cometido chacinas ou eram acusadas de grandes atos de
corrupção e que, ao serem questionadas pelos repórteres sobre suas ações e
seus sentimentos, demonstravam muita frieza e indiferença sobre os fatos.
Como vimos, tanto os valores, morais ou não, como também os contravalores
podem ser construídos e é neste ponto que detemos nossa atenção, pois, de acordo
com os PCNs (Brasil, 2008, p. 33), “a aprendizagem de valores e atitudes é pouco
explorada do ponto de vista pedagógico”, mas, por outro lado, a mídia pode transmitir
valores morais, valores não morais e contravalores o tempo todo e numa linguagem
muito mais atraente que a da escola, conforme declara Araújo (2003, p. 159):
Podemos pensar, por exemplo, no papel da mídia que, empregando
linguagens altamente atrativas e dinâmicas, normalizam a violência quando
elegem como heróis personagens que são assassinos; quando normalizam a
prostituição feminina e o culto a determinados padrões estéticos; quando
apresentam de forma acrítica casos de corrupção.
O autor (2003, p. 159) ainda completa:
Se tais valores são transmitidos em linguagens interessantes, como a da
televisão, da Internet e dos vídeos games [...] podemos pensar que aumentará
20
a probabilidade de que se tornem alvo de suas projeções afetivas positivas e
sejam por eles valoradas.
O problema é que os valores e os contravalores construídos são incorporados
na identidade das pessoas (ARAÚJO, 2003, p. 160). Assim, o que se deve fazer é
analisar criticamente o material veiculado pela mídia, tanto em jornais, revistas, livros,
fotos, propaganda, música, programas de TV, filmes, para trazer à tona suas
mensagens implícitas ou explícitas sobre valores.
Além de analisar criticamente o material que a mídia veicula a fim de verificar
se se constroem valores morais ou não, ou até mesmo contravalores, é necessário que
a educação em valores passe a ser uma realidade para garantir a transformação do
comportamento hedonista.
De acordo com Martins (2009) há quatro maneiras de se ensinar valores:
1.Abordagem pela doutrinação de valores: dá-se através da disciplina, do
bom exemplo, de enfatizar mais as condutas do que os raciocínios, destacando
as virtudes do patriotismo, do trabalho, da honestidade, do altruísmo e da
coragem;
2.Abordagem pela clarificação dos valores: consiste em ajudar, de maneira
não-diretiva e de forma neutra, a clarificar, assumir e por em prática os seus
próprios valores;
3.Abordagem pela opinião ou julgamento dos valores: consiste em
acentuar os componentes cognitivos da moralidade. Esta abordagem propõe
que a educação moral se centre na discussão de dilemas morais sem levar em
conta, no entanto, as diferenças de sexo, raça, de classes sociais e de cultura,
concentrando-se unicamente na atribuição de significados que pessoas dão à
suas experiências ou vivencias morais;
4.Abordagem pela narração: envolve três dimensões da educação em
valores – cognição, emoção e motivação. A abordagem pela narração ou
narrativa reconhece que, na diversidade cultural, é comum a contação de
histórias por parte das pessoas com o objetivo de transmitir valores de
gerações mais velhas para as mais novas. A narrativa desempenha um papel
na vida e na dimensão moral das pessoas.
Vimos, então, que os valores podem ser construídos, tanto pela educação
como pela mídia. Vimos também que a mídia pode também construir valores não
morais/ hedonistas e contravalores. Além disso, observamos que há técnicas de se
21
construir valores, conforme as citadas por Martins (2009), mas, como os valores são
construídos pelo psiquismo humano?
2.1.2 O sujeito psicológico e a construção de valores
Sastre e Moreno (2003, p. 129) afirmam que os diversos cenários da vida
cotidiana, com o entrelaçamento de seus múltiplos e diversos componentes, devem
deixar sua marca na construção do psiquismo humano.
Esses componentes que deixam marcas na construção do psiquismo humano
são explicados por Araújo (2003) em seu modelo de Sujeito Psicológico:
Figura 1: Sujeito Psicológico
Físicas
Interpessoais
Socioculturais
BIOLÓGICA
COGNITIVA
SOCIOCULTURAL
AFETIVA
Inconsciente
Consciência
Universo das
Relações
Fonte: (ARAUJO, 2003, p.156)
22
De acordo com este modelo, o sujeito psicológico é composto por todos esses
sistemas que, em uma interação contínua, relacionam-se com o meio.
Todos eles, segundo o autor (2003, p. 155), estão “inter-relacionados entre si
de maneira sistêmica de tal forma que sua separação só é possível para efeitos de
estudo e para facilitar sua compreensão”.
Em relação a este modelo, Araújo (2003, p. 155) ainda explica que:
a) a visão sistêmica de indissociabilidade entre as diferentes dimensões está
representada por meio de setas bidirecionais que as ligam entre si;
b) a representação de todos os sistemas constituintes é feita por meio de
linhas tracejadas, indicando sua abertura e ausência de fronteiras bem
definidas entre as diferentes dimensões;
c) se a imagem fosse tridimensional, perceber-se-ia que a consciência e o
inconsciente (ou não-consciência) encontram-se em planos distintos, paralelos,
mas ligados entre si, de tal forma que pressupomos um inconsciente cognitivo,
um inconsciente afetivo, um inconsciente biológico e um inconsciente
sociocultural (grifo nosso).
Se o inconsciente, conforme declara Araújo, liga-se a consciência e se o autor
pressupõe que exista um plano inconsciente para as todas as dimensões do sujeito
psicológico, há a necessidade de esclarecermos que, de acordo com Freud, o
inconsciente é uma região da mente humana na qual ficam recalcadas a emoções, os
sentimentos, os desejos e os conflitos do ser humano (NASIO, 1999).
Nasio (1999, p.25-26) explica que o recalcamento é “uma barreira que impede
a passagem dos conteúdos inconscientes para o pré-consciente”. Já Bergeret (2006, p.
85) define o recalcamento como um processo ativo, destinado a conservar fora da
consciência as representações inaceitáveis, ou seja, que representam possíveis
tentações ou castigos de exigências pulsionais censuráveis, quando não meras alusões
a estas. Percebemos, então, que o recalque serve para impedir que os afetos e os
desejos inconscientes passem para a consciência.
Mas, os afetos que trataremos nesta pesquisa estão no plano consciente do
sujeito psicológico. De acordo com Araújo (2003, p. 156), as emoções e os sentimentos
fazem parte da dimensão afetiva e são influenciados pela dimensão biológica e pela
dimensão sociocultural e pode influenciar a dimensão cognitiva:
23
[...] as emoções, pertencentes à dimensão afetiva, são conjuntos complexos de
reações químicas e neurais (dimensão biológica); sua indução recebe forte
influência da cultura, que molda os conteúdos que podem elicitar as emoções
(dimensão sociocultural); e seu aparecimento ou sentimento permeia os
processos cognitivos do pensamento (dimensão cognitiva).
Diante dessas explicações, podemos perceber que a dimensão afetiva
desempenha um papel funcional e organizativo no raciocínio humano, principalmente
no que diz respeito à construção de valores e de identidade.
Minha tese, e de autores como La Taille (1998, 2002) e Damon (1995),é de
que os valores construídos são incorporados na identidade das pessoas.
Quanto maior a carga afetiva vinculada a determinado valor, mais centralmente
ele se “posiciona” na identidade (ARAÚJO, 2003, p. 160).
Conforme já foi aqui discutido, o sujeito contemporâneo é desprovido de
identidade e a educação em valores busca formar esta identidade. Todavia, a dimensão
afetiva é que determinará os valores construídos e a identidade formada já que, a partir
da declaração de Araújo, o valor só será construído e internalizado em sua identidade,
se tocar a sensibilidade do sujeito através da afetividade. Assim, antes de
prosseguirmos, torna-se necessário diferenciar emoção, sentimento e afeto.
Sobre emoção, Mahoney e Almeida (2009, p. 17-18) explicam que:
[...] é a exteriorização da afetividade, é sua expressão corporal, motora. Tem
um poder plástico, expressivo e contagioso; é o recurso de ligação entre o
orgânico e o social: estabelece os primeiros laços com o mundo humano e,
através deste, com o mundo físico e cultural. As emoções compõem sistemas
de atitudes reveladas pelo tônus (nível de tensão muscular). Combinado com
intenções conforme as diferentes situações. Das oscilações viscerais e
musculares se diferenciam as emoções e se estabelecem padrões posturais
para o medo, alegria, raiva, ciúmes, tristeza, etc.
Já, o sentimento corresponde à expressão representacional da afetividade e
não implica reações instantâneas e diretas como na emoção (MAHONEY; ALMEIDA,
2009, p. 21).
24
Saconni (1996, p. 606) define a palavra sentimento como “um estado
psicológico de longa duração”. Rodrigues et al. (1989, p. 15) apontam os sentimentos
como “fenômenos afetivos estáveis que resultam, em regra, da intelectualização das
emoções”.
Damásio (2000, p. 57) também distingue emoção de sentimento: “sentimento
(experiência mental da emoção) e emoção (conjunto de reações orgânicas)”.
Percebemos, a partir destas definições, que a emoção é uma reação corporal
(ativação fisiológica) e o sentimento é quando se atribui um valor aquilo que se sente
(ativação representacional).
Já, o afeto, de acordo com Codo e Gazzotti (1999, p. 48-59), é um conjunto de
fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções e sentimentos,
acompanhados sempre de impressão de dor ou prazer, de satisfação ou insatisfação,
de agrado ou desagrado, de alegria ou de tristeza.
Para Mahoney e Almeida (2009, p. 17), a afetividade “refere-se à capacidade
do ser humano ser afetado pelo mundo externo e interno por meio de sensações
ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis”.
Rodrigues et al. (1989, p. 15) definem a afetividade como o “conjunto de
emoção e sentimentos”. Isso significa dizer que a afetividade engloba tanto uma reação
do corpo (emoção), como também uma experiência subjetiva (sentimento).
Damásio (2000, p. 431) afirma que o “afeto é aquilo que você manifesta
(exprime) ou experimenta (sente) em relação a um objeto ou situação, em qualquer dia
de sua vida”.
Bock et al. (1999, p. 193) enfatizam que:
Os afetos ajudam-nos a avaliar as situações, servem de critérios de valoração
positiva ou negativa para as situações de nossa vida; eles preparam nossas
ações, ou seja, participam ativamente da percepção que temos das situações
vividas e do planejamento de nossas ações ao meio.
Se os afetos (emoções e sentimentos) influenciam a percepção e as ações do
ser humano, eles também regulam suas interações sociais. É como se fosse um círculo:
uma pessoa é afetada pela afetividade (Pinto, 2007, p. 12) e sua reação afeta as
emoções e os sentimentos de outra pessoa, ou seja, um afeto (positivo ou negativo)
25
afeta um ser humano que afetará também a sua interação com o outro, e este outro
será afetado, sucessivamente.
Voltando a discussão da influência das emoções, dos sentimentos e dos afetos
na construção de valores e na formação da identidade do sujeito, Araújo (2003, p. 160)
declara:
No processo de desenvolvimento psicológico, durante nossa vida, nossos
valores se organizam em um sistema em que alguns deles são mais centrais e
outros mais periféricos [...] as emoções e os sentimentos que chamamos
morais, como a vergonha, a culpa e o remorso, aparecem (ou são sentidos)
quando agimos e/ou pensamos contrariando os valores centrais de nossa
identidade. Nesse sentido, atuam regulando nosso funcionamento psíquico.
Assim, os valores pertencentes à dimensão afetiva, que são construídos como
centrais na identidade das pessoas, sendo de natureza moral, atuarão regulando
eticamente seus pensamentos e suas ações. Araújo5
(2007 p. 5-6) explica esta teoria:
Tentando sintetizar essa discussão, entendo que no processo de
desenvolvimento psicológico, durante toda a nossa vida, à medida que nossos
valores vão sendo construídos, eles se organizam em um sistema. Nesse
sistema de valores que cada sujeito constrói (que no fundo constituem a base
das representações de si), alguns deles se "posicionam" de forma mais central
em nossa identidade, e outros, de forma mais periférica. O que determina esse
"posicionamento" é a intensidade da carga afetiva vinculada a determinado
valor (ou contravalor) construído. Assim, nossos valores centrais são aqueles
que, além de terem sido construídos a partir da ação projetiva de sentimentos
positivos, a intensidade desses sentimentos é muito grande. Por outro lado,
construímos alguns valores cuja intensidade dos sentimentos é pequena e, por
isso, se "posicionam" na periferia de nossa identidade.
Vale enfatizar, entretanto, que o posicionamento de valores como centrais ou
periféricos é flexível, logo, um mesmo valor pode ser central ou periférico, dependendo
da situação na qual o sujeito se encontra. Araújo (2003, p. 160) exemplifica esta
declaração:
Exemplificando, existem pessoas que vão à farmácia comprar um remédio que
custa 10 reais e descobrem que só em 9 reais e 80 centavos na carteira. O
5
Fragmento de uma versão simplificada de capítulo publicado no livro “Educação e Valores: pontos e
contrapontos” (Araújo, U.F.; Puig, J. & Arantes, V., Summus Editorial, 2007).
26
balconista lhe entrega o remédio e ele diz que depois paga os 20 centavos
restantes. Se a honestidade é um valor central na identidade desse cliente, ele
poderá ir até sua casa pegar as moedas e voltar à farmácia para pagar os 20
centavos. Se não fizer isso, poderá sentir-se mal, incomodado. Por outro lado,
conhecemos pessoas que primam por não pagarem suas dívidas e não se
importam por ficar devendo aos outros. No primeiro caso, a honestidade é um
valor central na identidade da pessoa em questão, o que significa que esse
conteúdo possui uma forte carga afetiva para ele, enquanto que no segundo
caso ela é um valor periférico, localizado na “periferia” de sua identidade, com
pouca carga afetiva vinculada.
O papel exercido nesse sistema, pela intensidade dos sentimentos no
posicionamento dos valores, tem um papel importante na construção de valores e da
identidade.
Diante disso, Araújo (2007 p. 7) conclui:
[...] o valor moral depende de uma certa qualidade nas interações, e não é,
necessariamente, construído pelas pessoas. Vincula-se à projeção afetiva
positiva que o constitui, ligada ou não a conteúdos de natureza moral. Se os
valores construídos como centrais na identidade são de natureza ética,
estamos falando que existe maior probabilidade de que os pensamentos e os
comportamentos dessa pessoa sejam éticos. Pelo contrário, se os valores
construídos como centrais na identidade baseiam-se na violência, na
discriminação, etc, é provável que seus comportamentos e pensamentos não
sejam éticos.
Portanto, as situações que envolvem valores morais e/ou não morais,
contravalores e identidade estão fortemente associadas às emoções positivas e
negativas. Acreditamos que essas experiências emocionais entram em ação quando
estamos considerando uma decisão.
Sobre essas experiências emocionais, Bechara (2003, p. 196) declara que “a
ativação desses estados somáticos oferece sinais automáticos que, de maneira
explícita ou oculta, marcam diversas opções e situações com uma valoração”.
Mas, quais são os valores morais que podem ser construídos como centrais na
identidade do sujeito contemporâneo e que podem atuar em seu funcionamento
psíquico, regulando eticamente seus pensamentos e suas ações?
27
2.1.3 A criança e o processo de internalização dos valores
Segundo Araújo (2003, p. 104), Piaget vincula o desenvolvimento infantil ao
desenvolvimento do juízo moral. Desse modo, Piaget divide a relação das crianças com
as regras em 3 fases: anomia, heteronomia e autonomia.
A anomia é a fase da ausência de regras, por exemplo, um recém-nascido
desconhece a existência das regras sociais. A heteronomia é a fase em que a criança
conhece as regras que são determinadas por outras pessoas e a autonomia é a fase
em que a criança internaliza as regras e se submete conscientemente a elas (PIAGET,
1932).
Assim, podemos compreender que, para Piaget, as crianças menores estão no
estágio de heteronomia, isto é, as regras são impostas pelos adultos e as crianças
maiores passam aos poucos para um estágio de autonomia, em que as regras são
vistas como resultado de uma decisão livre e digna de respeito, aceitas pelo grupo.
Lawrence Kohlberg (1984), ex-aluno de Piaget, insatisfeito com sua obra, ainda
que aceitasse a abordagem cognitivo-evolutiva, dedicou-se a redefinição dos estágios
de desenvolvimento moral estabelecendo seu próprio esquema, criticando aspectos
fundamentais da teoria piagetiana.
Segundo Kohlberg, existem seis estágios em ordem invariável, como os de
Piaget, em que se desenvolve a moralidade. Kohlberg cita os estágios para que o
indivíduo tem que passar para evoluir, porém, para ele, muitos adultos não passam do
3º estágio, onde está presente as expectativas interpessoais mútuas, relacionamentos e
conformidades interpessoais. E através de uma série de estudos e pesquisas, a Teoria
do Desenvolvimento Moral, onde estabelece um esquema de desenvolvimento definido
em três níveis e seis estágios.
1º NIVEL PRÉ-CONVENCIONAL: A moralidade da criança é marcada pelas
conseqüências de seus atos: punição ou recompensa, elogio ou castigo, e
baseia-se no poder físico (de punir ou recompensar) daqueles que estipulam
as normas.
Estágio 1 - O que determina a bondade ou maldade de um ato são
as conseqüências físicas do ato (punição). Respeita-se a ordem apenas por
medo à punição, e não se tem consciência nenhuma do valor e do significado
humano das regras.
28
Estágio 2 - A ação justa é aquela que satisfaz as minhas
necessidades, a que me gera recompensa e prazer, e, ocasionalmente aos
outros. As relações humanas são vistas como trocas comerciais. Mais ou
menos assim "Tu me gratificas e eu te gratifico". A pessoa tenta obter
recompensas pelas suas ações.
2º NÍVEL CONVENCIONAL: Nesse nível a manutenção das expectativas da
família, do grupo, da nação, da sociedade é vista como válida em si mesma e
sem muitos questionamentos ou porquês. É uma atitude de conformidade com
a ordem social, mas também uma atitude de lealdade e amor á família, ao
grupo, ao social.
Estágio 3 - É bom aquele comportamento que agrada aos outros e
por eles é aprovado. De certa forma, é bom o que é socialmente aceito, aquilo
que segue o padrão. O comportamento é muitas vezes julgado com base na
intenção, e a intenção torna-se pela primeira vez importante. É a busca do
desejo de aprovação familiar e social.
Estágio 4 - Há o desenvolvimento da noção de dever, de
comportamento correto, de cumprir a própria obrigação. Há o desejo de manter
a ordem social especificamente pelo desejo de mantê-la, isto é, por que isso é
justo.
3º NÍVEL PÓS-CONVENCIONAL: Há um esforço do indivíduo para definir os
valores morais, para definir conscientemente e livremente o que é certo e o
que é errado, e porquê... Prescinde-se muitas vezes da autoridade dos grupos
e das pessoas que mantém a autoridade sobre os princípios morais.
Estágio 5 - É a tomada da consciência da existência do outro, da
maioria, do bem comum, dos direitos humanos... A ação justa é a ação que
leva em conta os direitos gerais do indivíduo, isto é, o bem comum. Valores
pessoais são claramente considerados relativos, é a lei da maioria e da
utilidade social.
Estágio 6 - O justo e correto é definido pela decisão da consciência
de acordo com os princípios éticos escolhidos e baseados na compreensão
lógica, universalidade, coerência, solidariedade universal. Guia-se por
princípios universais de justiça, de reciprocidade, de igualdade de direitos, de
respeito pela dignidade dos seres humanos, por um profundo altruísmo, pela
fraternidade. Os padrões próprios de justiça têm mais peso do que as regras e
leis existentes na sociedade (RIBEIRO E SILVA. G, 2003, p. 06).
Ribeiro e Silva (2003, p.06) conclui sua pesquisa afirmando que tanto no
modelo de Piaget como no de Kohlberg, a moralidade de um indivíduo depende tanto
de fatores psicológicos e biológicos (quem é a pessoa, quem são seus pais, qual sua
bagagem genética...), como de elementos sociais e culturais (onde nasceu, em que
época, quem são seus vizinhos, amigos, mestres, grau de instrução, condição
financeira...).
29
2.1.4 Valores morais e não-morais
Já vimos que Araújo (2003; 2007) destaca que sentimentos éticos, quando
centrais, vão construir, psicologicamente, valores morais na identidade do sujeito, ao
passo que os sentimentos não éticos vão construir valores não morais ou contravalores.
Martins6
(2009) conceitua dez valores que, segundo ele, se construídos podem
melhorar a vida em sociedade: autonomia, capacidade de convivência, diálogo,
dignidade da pessoa humana, igualdade de direitos, justiça, participação social,
respeito mútuo, generosidade e tolerância.
Dentre os valores citados por Martins, analisaremos, nesta pesquisa o valor
moral generosidade.
Em relação à generosidade, Pinheiro (2009, p. 68) declara que ela “caracteriza-
se por uma virtude por excelência altruísta [...] requer dar algo sem ser pelo
cumprimento do dever”.
Comte-Sponville (2009, p. 105-106) ainda comenta que “A generosidade é o
contrário do egoísmo [...] ser generoso é ser livre de si, de suas pequenas covardias, de
suas pequenas posses, de suas pequenas cóleras, de seus pequenos ciúmes”.
Assim, pretendemos verificar se os contos de fadas contemporâneos, na
versão fílmica, constroem o valor generosidade no público infanto-juvenil porque
acreditamos que se trata de um valor moral extremamente necessário ao homem
contemporâneo que, por viver rodeado por valores hedonistas/não-morais, necessita
construí-lo em sua identidade, como valor central, a fim de combater o predomínio do
egoísmo.
Verificaremos também se ocorre à construção psicológica de valores não-
morais, como o egoísmo. Em relação ao egoísmo, Borriello et al. (2003, p. 349), declara
que este valor indica “amor excessivo a si próprio”.
Esses autores ainda declaram que o egoísmo é uma:
6
MARTINS, V. A prática de valores na escola. Disponível em: http://www.abec.ch/Portugues/subsidios-
educadores/artigos/categorias/artigos-ed
paz/ARTIGO_A_PRATICA_DE_VALORES_NA_ESCOLA%20_Versao25_11_04.pdf. Acesso em 17 Ago
2011.
30
Necessidade desproporcional de conservação e de valorização de si mesmo,
ainda que com prejuízo dos outros, quase que a cristalização do indivíduo na
própria realidade e na própria história; o ponto de referência de tudo é o próprio
eu, como se fosse o centro do universo [...] busca exclusivamente a satisfação
dos próprios interesses pessoais (BORRIELLO et al., 2003, p. 349).
Por ser esse um valor não-moral expresso, geralmente, pela valorização do
sucesso, da beleza, da popularidade, do status social, da fama, do dinheiro, do poder,
entre outros, consideramos importante verificarmos se ele pode ser construído
psicologicamente pelo público infanto-juvenil, através dos contos de fadas
contemporâneos na versão fílmica.
2.2 Os contos de fadas
Há dois tipos de contos muito semelhantes: os contos maravilhosos e os
contos de fadas. De acordo com Todorov (1971, p. 120) “o conto de fadas é uma das
variedades do conto maravilhoso, do qual se distingue por uma certa escritura e não
pelo estatuto do sobrenatural”.
Contudo, há outros teóricos que afirmam que o conto de fadas e os contos
maravilhosos são diferentes, são dois gêneros distintos, ou seja, embora apresentem
estruturas narrativas idênticas, eles são diferentes em relação a sua problemática
central. Enquanto os contos de fadas apresentam uma problemática existencial: a
busca de realização pelo amor, os contos maravilhosos apresentam uma problemática
social: a busca de realização da personagem pela fortuna (COELHO, 2000, p. 109).
Coelho (2000, p. 172-173) declara que há ainda duas diferenças básicas entre
esses gêneros: a origem e o propósito:
A forma do conto maravilhoso tem raízes em narrativas orientais difundidas
pelos árabes [...] O núcleo da aventura é sempre de natureza
material/social/sensorial (a busca de riquezas, a satisfação do corpo; a
conquista do poder, etc) [...] Desse maravilhoso nasceram personagens que
possuem poderes sobrenaturais; deslocam-se; contrariando as leis da
gravidade; sofrem metamorfoses contínuas; defrontam-se com as forças do
Bem e do Mal, personificadas; sofrem profecias que se cumprem; são
beneficiadas com milagres; assistem a fenômenos que desafiam as leis da
lógica, etc. O conto de fadas é de natureza espiritual/ética/existencial.
Originou-se entre os celtas, com heróis e heroínas, cujas aventuras estavam
31
ligadas ao sobrenatural, ao ministério do além-vida e visavam a realização
interior do ser humano. Daí a presença da fada, cujo nome vem do termo
latino”fatum”, que significa destino
Desse modo, podemos perceber então que os contos de fadas apresentam
uma problemática existencial: o herói ou a heroína que precisa vencer obstáculos ou
provas para alcançar sua auto-realização. Geralmente a aventura da busca parte de
uma metamorfose ou de um encantamento.
Já os contos maravilhosos apresentam um herói ou anti-herói que encontrará
sua auto-realização na conquista de bens e de poder material. A aventura de busca,
nesse caso, parte, geralmente, da necessidade de sobrevivência física ou da miséria
dos protagonistas.
Assim, embora narrativas maravilhosas, o conto de fadas e o conto
maravilhoso expressam atitudes bem diferentes diante da vida: no primeiro, ligadas ao
ideal, aos valores eternos, ao espírito; no segundo, ligadas ao sensorial, ao concreto, à
vida prática.
2.2.1 A estrutura das narrativas maravilhosas
Tanto os contos de fadas como os contos maravilhosos fazem parte dos
gêneros narrativos, por isso, é importante compreendermos o conceito de narrativa.
Para Siqueira (1992, p. 14), "[...] quando o fato se desenvolve a partir da
criação de um conflito, temos uma narrativa", ou seja, o fato do leitor reconhecer o
conflito é a principal característica da narrativa.
A narrativa se inicia com um equilíbrio e este é quebrado, seja pela introdução
de um elemento mágico, seja pelo falecimento ou afastamento de algum personagem.
Essa quebra de equilíbrio gera o conflito, e a narrativa desenvolve-se na busca de uma
solução. Uma vez resolvido o conflito, o equilíbrio que se restabelece não é mais o
mesmo, embora possa ser parecido com o inicial (SIQUEIRA, 1992, p. 17).
Segundo Todorov (1970, p. 40), temos:
[...] dois tipos de episódios numa narrativa: os que descrevem um estado de
equilíbrio ou desequilíbrio, e os que descrevem a passagem de um estado a
32
outro. O primeiro tipo será relativamente estático e, pode-se dizer, iterativo: o
mesmo tipo de ações poderia ser repetido indefinidamente. O segundo, em
compensação, será dinâmico e só se produz, em princípio, uma única vez.
Costa (2008, p. 67) explica as principais características do conto:
[...] é breve e curto, com um número reduzido de personagens em cena com
ação concentrada. As personagens geralmente são anônimas e culturalmente
prototípicas (rei, princesa, dragão, padre, moleiro...) Enunciativamente, as
fórmulas introdutórias do tipo “Era uma vez...” de localização temporal
indefinida, acabam dando ao conto um caráter de permanência temporal
(passado e atual), além de colocá-lo no mundo ficcional.
Em relação à estrutura dos gêneros narrativos, Joseph Campbell criou, em
1949, em sua obra “O herói de mil faces”, uma estrutura textual básica que denominou
de Jornada do herói. A partir desta jornada, Campbell divide a aventura do herói em
três fases, que compreendem basicamente a partida, a iniciação e o retorno
(MARTINEZ, 2008, p. 52).
Segundo Mônica Martinez (2008, p. 56-57), a estrutura da Jornada do Herói de
Campbell foi transposta para o cinema por Christipher Vogler nos anos de 1980:
Até então, o analista de roteiros da Companhia Walt Disney preocupava-se em
entender o mecanismo de uma boa história, daquelas que a pessoa tem a
sensação de ter vivido uma experiência completa e significativa [...] Ao se
deparar com o trabalho de Joseph Campbell, Vogler entende que o padrão que
havia instituído estava mapeado no livro Q herói de mil faces, escrito pelo
mitólogo norte-americano. Com o tempo, este conhecimento torna-se a base
do metido empregado pelo especialista para diagnosticar problemas e
prescrever soluções às películas cinematográficas. Em pouco tempo Vogler
traça um memorando de sete páginas que intitula “Guia prático d’O herói de mil
faces”, no qual exemplifica a idéia de Campbell por meio de filmes clássicos e
contemporâneos.
De acordo com Vogler (2006, p. 26) “todas as histórias consistem em alguns
elementos estruturais comuns, encontrados universalmente em mitos, contos de fadas,
sonhos e filmes”.
Christopher Vogler (2006, p. 27) ainda declara:
Ficou logo evidente para mim que a Jornada do Herói era uma tecnologia
narrativa útil e empolgante, que podia ajudar diretores e produtores a eliminar
grande parte dos riscos de tentar adivinhar e dos gastos de desenvolver as
histórias para um filme.
33
Diante disso, o autor passou a utilizar esta técnica em produções
cinematográficas, porém, atualizou-a de acordo com sua necessidade, modificando-a
do original de Campbell. A jornada de Vogler é chamada de ‘Jornada do Escritor’.
Figura 2. Comparação entre a Jornada do Escritor e a Jornada do Herói
Fonte: VOGLER, C. A jornada do escritor: estruturas místicas para escritores. Tradução de Ana Maria
Machado. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 34-35.
Vogler (2006, p. 37-46) explica cada parte da Jornada:
34
1. Mundo Comum: A maioria das histórias desloca o herói para fora de seu
mundo ordinário, cotidiano, e o introduz em um Mundo Especial, novo e
estranho;
2. Chamado à Aventura: Apresenta-se ao herói um problema, um desafio,
uma aventura a empreender;
3. Recusa do Chamado (o Herói Relutante): Agora é a hora do medo. Com
freqüência, o herói hesita logo antes de partir em sua aventura, Recusando o
Chamado, ou exprimindo relutância;
4. Mentor (a Velha ou o Velho Sábio): A função do Mentor é preparar o herói
para enfrentar o desconhecido;
5. Travessia do Primeiro Limiar: Finalmente, o herói se compromete com sua
aventura e entra plenamente no Mundo Especial da história pela primeira vez
— ao efetuar a Travessia do Primeiro Limiar;
6. Testes, Aliados e Inimigos: Uma vez ultrapassado o Primeiro Limiar, o
herói naturalmente encontra novos desafios e Testes, faz Aliados e Inimigos, e
começa a aprender as regras do Mundo Especial;
7. Aproximação da Caverna Oculta: Finalmente, o herói chega à fronteira de
um lugar perigoso, às vezes subterrâneo e profundo, onde está escondido o
objeto de sua busca;
8. A Provação: Aqui se joga a sorte do herói, num confronto direto com seu
maior medo. Ele enfrenta a possibilidade da morte e é levado ao extremo numa
batalha contra uma força hostil;
9. Recompensa (Apanhando a Espada): Após sobreviver à morte, o herói,
então, pode se apossar do tesouro que veio buscar, sua Recompensa;
10. Caminho de Volta: Mas o herói começa a lidar com as conseqüências de
ter-se confrontado com as forças obscuras da Provação;
11. Ressurreição: É uma espécie de exame final do herói, que deve ser posto
à prova, ainda uma vez, para ver se realmente aprendeu as lições da
Provação. O herói se transforma;
12. Retorno com o Elixir: O herói retorna ao Mundo Comum, mas a jornada
não tem sentido se ele não trouxer de volta um Elixir, tesouro ou lição do
Mundo Especial.
Nelly Novaes Coelho também organizou uma estrutura básica para se analisar
os contos de fadas e os contos maravilhosos. Ela extraiu cinco invariantes definidas por
Wladimir Propp que estão sempre presentes nos contos de fadas e nos contos
maravilhosos – aspiração (ou desígnio), viagem, obstáculos (ou desafios), mediação
auxiliar e conquista do objetivo (final feliz) (COELHO, 2000, p. 109 -110):
35
1.Toda efabulação tem, como motivo nuclear, uma aspiração ou um desígnio,
que levam o herói (ou a heroína) à ação;
2.A condição primeira para a realização desse desígnio é sair de casa; o herói
empreende uma viagem ou se desloca para um ambiente estranho, não-
familiar;
3.Há sempre um desafio à realização pretendida, ou surgem obstáculos
aparentemente insuportáveis que se opõem à ação do herói (ou da heroína);
4.Surge sempre um mediador entre o herói (ou a heroína) e o objetivo que está
difícil de ser alcançado; isto é, surge um auxiliar mágico natural ou
sobrenatural, que afasta ou neutraliza os perigos e ajuda o herói a vencer;
5.Finalmente o herói conquista o almejado objetivo.
Portanto, as narrativas – sejam elas maravilhosas ou não, seguem uma
determinada estrutura – tanto para a escrita verbal, como para sua forma mais
contemporânea que é a cinematográfica. Contudo, vale enfatizar que, diferentemente
de qualquer outra forma de literatura, elas são capazes de contribuir diretamente para a
construção da identidade e dos valores éticos e morais.
2.2.2 Os contos de fadas e os valores morais e éticos
Dentre as narrativas maravilhosas, o foco desta pesquisa está nos contos de
fadas e, em relação aos valores morais e éticos, esse gênero apresenta uma certa
“complexidade das forças interiores” (positiva e negativa) sobre a dualidade
maniqueísta que sempre caracterizou o comportamento das personagens tradicionais.
Sobre isso, Coelho (2000, p. 154) declara:
A intenção maior é dotar as personagens de ficção da ambigüidade natural dos
homens e, através dela, revelar as forças polares ou contraditórias, inerentes à
condição humana. Embora em algumas obras a lição de vida desemboque em
horizonte “fechado” e enfatize as forças negativas ou o fracasso do viver, a
grande maioria delas aponta para a esperança, para o entusiasmo e a
importância de se participar dinamicamente da vida.
Assim, podemos perceber que os contos de fadas, além de dar exemplos ou
conselhos, propõem problemas a serem resolvidos, estimulando a capacidade de
36
compreensão dos fenômenos e provocando idéias novas ou uma atitude receptiva em
relação às inovações que a vida cotidiana propõe (ou proporá), além de procurar
capacitar as crianças e jovens a optarem, com inteligência, nos momentos de agir.
Segundo o historiador Darnton (1996, p. 61), as primeiras versões dos contos
de fadas, embora não tivesse a intenção de transmitir valores morais, sugeriam cautela:
Sem fazer pregações nem dar lições de moral, os contos demonstram que o
mundo é duro e perigoso. Embora, na maioria, não fossem endereçados às
crianças, tendem a sugerir cautela. Como se erguessem letreiros de
advertência, por exemplo, em torno à busca de fortuna: "Perigo!"; "Estrada
interrompida; "Vá devagar!"; "Pare!" É verdade que alguns contêm uma
mensagem positiva. Mostram que a generosidade, a honestidade e a coragem
são recompensadas. Mas não inspiram muita confiança na eficácia de se amar
os inimigos e oferecer a outra face. Em vez disso, demonstram que, por mais
louvável quês seja dividir o seu pão com mendigos, não se pode confiar em
todos aqueles que se encontra pelo caminho. Alguns estranhos talvez se
transformem em príncipes e fadas bondosas; mas outros podem ser lobos e
feiticeiras, e não há maneira de distinguir uns dos outros.
Darnton (1996, p. 05) ainda declara que nestas primeiras versões, os
contadores de histórias procuravam retratar um mundo de brutalidade:
As outras histórias da Mamãe Ganso dos camponeses franceses têm as
mesmas características de pesadelo. Numa versão primitiva da "Bela
Adormecida", por exemplo, o Príncipe Encantado, que já é casado, viola a
princesa e ela tem vários filhos com ele, sem acordar. As crianças, finalmente,
quebram o encantamento, mordendo a durante a amamentação, e o conto
então aborda seu segundo tema: as tentativas da sogra do príncipe, uma ogra,
de comer sua prole ilícita. O "Barba Azul" original é a história de uma noiva que
não consegue resistir à tentação de abrir uma porta proibida na casa de seu
marido, um homem estranho, que já teve seis mulheres. Ela entra num quarto
escuro e descobre os cadáveres das esposas anteriores, pendurados na
parede. Horrorizada, deixa a chave proibida cair de sua mão numa poça de
sangue, no chão. Não consegue limpá la; então, Barba Azul descobre sua
desobediência, ao examinar as chaves. Enquanto ele amola sua faca,
preparando se para transformá la na sétima vítima, ela se recolhe em seu
quarto e veste seu traje de casamento. Mas demora a se vestir, o tempo
suficiente para ser salva por seus irmãos, que galopam em seu socorro depois
de receberem um aviso de seu pombo de estimação. Num dos primeiros
contos do ciclo de Cinderela, a heroína torna se empregada doméstica, a fim
de impedir o pai de forçá la a se casar com ele. Em outro, a madrasta ruim
tenta empurrá la para dentro de um fogão, mas incinera, por engano, uma das
mesquinhas irmãs postiças. Em "João e Maria", na versão dos camponeses
franceses, o herói engana um ogre fazendo o cortar as gargantas de seus
próprios filhos. Um marido devora uma sucessão de recém casadas, no leito
conjugal, em "La Belle et le monstre" ("A bela e a fera"), uma das centenas de
contos que jamais chegaram a ser incluídos nas versões publicadas de Mamãe
37
Ganso. Num conto mais desagradável, "Les trois chiens" ("Os três cães"), uma
irmã mata seu irmão escondendo grandes pregos no colchão de seu leito
conjugal. No conto mais maligno de todos, "Ma mère m'a tué, mon père m'a
mangé" ("Minha mãe me matou, meu pai me devorou"), uma mãe faz do filho
picadinho e o cozinha, preparando uma caçarola à lionesa, que sua filha serve
ao pai. E por aí vai, do estupro e da sodomia ao incesto e ao canibalismo.
As versões dos contos de fadas, conhecidas hoje, foram modificadas ao longo
da história para se adequarem ao público infantil. Estas versões passaram a enfatizar
os ensinamentos éticos e morais.
Coelho (2000, p. 179) destaca alguns valores presentes nesse gênero
narrativo:
Predomínio dos valores humanistas; preocupação fundamental com a
sobrevivência ou com as necessidades básicas do indivíduo: fome, sede,
agasalho, descanso, estímulo à caridade, solidariedade, boa vontade,
tolerância... Valorização da palavra dada quem, em hipótese alguma, poderá
ser quebrada;
Oscilação entre uma ética maniqueísta (nítida separação entre o Bem e o
Mal; Certo e Errado) e uma ética relativista (o que parecia mau acaba se
revelando bom; o que parecia errado resulta em algo certo...). Mas quanto às
ações, a regra é: prêmio para o Bem e castigo para o Mal;
A esperteza/astúcia inteligente vencem a prepotência e a força bruta;
inclusive através de atos que julgados rigorosamente são desonestos mas
desculpados pela moral prática (é o caso das artimanhas do Gato de Botas
para tornar o seu pobre amo um nobre senhor);
A ambição desmedida ou a insaciabilidade humana causam desequilíbrios
sem conta;
Há uma ordem natural nos seres e nas coisas que não deve ser contrariada;
São sempre os mais velhos que detêm nas mãos o poder e a autoridade, de
maneira absoluta e inquestionável. Enquanto os mais novos sempre os
predestinados (apesar de no início parecer o contrário...) Os primeiros
representam o passado, a tradição; os últimos, o futuro;
O indivíduo que consegue vencer as provas e passar do nível mais baixo da
sociedade para o mais alto, é sempre alguém com dons excepcionais;
A grande mediadora da possível ascensão do homem na escala social é a
mulher. Casando-se com a “filha do rei” ou do “nobre abastado”,o indivíduo
pobre ou plebeu automaticamente enobrece e se torna poderoso;
As qualidades exigidas á mulher são: beleza, modéstia, pureza, obediência,
recato ... e total submissão ao homem (pai,marido, irmão, etc). É dada muito
maior ênfase às relações entre pai e filha, do que entre esposo e esposa.
38
Muitos e muitos dos núcleos dramáticos dessas histórias expressam
problema entre pai e filha;
É enfatizada a ambigüidade da natureza feminina. Desde as narrativas
primordiais, a mulher pe causa de bem e de mal, tanto pode salvar o homem,
com sua bondade e amor, como pode pô-lo a perder com seus ardis e
traições. Ela tanto pode ser a amada divinizada pela qual o príncipe luta
como pode ser apenas o instrumento da procriação desejada pelo homem.
Nota-se, porém, que a exploração dos aspectos negativos da mulher se dá,
basicamente, nos contos jocosos; isto é, são aspectos realçados com
comicidade: mulheres gulosas, perdulárias, teimosas, mentirosas,
ignorantes, fingidas...
Percebemos, portanto, que a essência dos contos de fadas, nas versões
atuais, está na capacidade que esse tipo de texto tem em abstrair conceitos formadores
de caráter, uma vez que estabelece relação entre “bem e mal”, “certo e errado”.
No decorrer da história, os contos de fadas passaram a abordar, conforme
vimos, questões existenciais e relevantes para a vida do homem. Não são histórias
tenebrosas ou esvaziadas de significação, ao contrário, trazem hoje profundas
reflexões acerca da conduta humana (DONÊNCIO, 2011, p. 90).
E, a criança necessita de idéias sobre como colocar ordem sua “casa interior”.
Ela necessita de uma educação moral que, de modo sutil e só implicitamente, a
conduza às vantagens do comportamento moral, não por meio de conceitos éticos
abstratos, mas daquilo que lhe parece tangivelmente correto e, portanto, significativo.
Para Bettelheim (2007, p. 12) “a criança encontra esse tipo de significado nos
contos de fadas”, já que estas histórias lidam com problemas humanos universais.
As personagens e situações dos contos de fadas também personificam e
ilustram conflitos íntimos, mas sempre sugerem sutilmente como esses
conflitos podem ser solucionados e quais os próximos passos a serem dados
rumo a uma humanidade mais elevada. O conto de fadas é apresentado de um
modo simples, despretensioso; nenhuma solicitação é feita ao ouvinte [...]
Longe de fazer solicitações, os contos de fadas reassegura, dá esperança para
o futuro e oferece a promessa de um final feliz (BETTELHEIM, 2007, p. 37).
Bettelheim (2007, p. 16) esclarece também, com detalhes, como os contos de
fadas contribuem para a educação moral da criança:
39
É característico dos contos de fadas colocar um dilema existencial de maneira
breve e incisiva. Isso permite à criança apreender o problema em sua forma
mais essencial, enquanto que uma trama mais complexa confundiria as coisas
para ela.O conto de fadas simplifica todas as situações [...] Ao contrário do que
acontece em muitas histórias infantis modernas, nos contos de fadas o mal é
tão onipresente quanto a virtude. Em praticamente todo conto de fadas, o bem
e o mal são corporizados sob a forma de algumas personagens e de suas
ações, uma vez que o bem e o mal são onipresentes na vida e as propensões
para ambos estão presentes em todo homem. É essa dualidade que coloca o
problema moral e requer a luta para resolvê-lo [...] Não é o fato de a virtude
vencer no final que promove a moralidade, mas sim o fato de o herói ser
extremamente atraente para a criança, que se identifica com ele em todas as
suas lutas. Devido a essa identificação, ela imagina que sofre com o herói suas
provas e tribulações, e triunfa com ele quando a virtude sai vitoriosa. A criança
faz tais identificações inteiramente por conta própria, e as lutas interiores e
exteriores do herói lhe imprimem moralidade.
Assim, podemos dizer que os contos de fadas levam a criança a construir sua
identidade e seus valores morais e éticos, além de sugerirem experiências que são
necessárias para desenvolver ainda mais seu caráter.
2.3 O longa-metragem animado
Brito (2011, p. 21) declara que “estamos em um momento da cultura em que as
imagens estão presentes em nosso cotidiano como nunca visto antes”. Lévy (1995, p.
15) também afirma que “vivemos em uma civilização da imagem ou do audiovisual”,
pois a preponderância visual é maciça e determinada pelos meios de comunicação que
utilizam a imagem para comunicar, seduzir, persuadir, destruir, informar e também
manipular.
Como vivenciamos uma forte cultura visual, os longas-metragens animados
têm conquistado um grande público. Mas, o que é animação?
Animação significa dar ânima, dar alma, dar vida. Pode-se dizer que a
animação traz em si a essência do cinema. Manipulando sinteticamente o tempo e o
espaço, a arte de animar expressa a criação de um universo próprio que faz parte do
imaginário de todos que, desde a infância, se encantam com a possibilidade do lúdico.
40
É o terreno do absurdo e da fantasia, no qual a realidade é sempre reinventada e,
muitas vezes, criticada7
.
Existem outras referências para a palavra animação, Vilaça (2006, p. 35) inicia
com a definição:
A palavra ANIMAÇÃO vem do latim Anima e significa Alma ou Sopro Vital.
Animar significa dar vida a objetos inanimados. Em cinema é a arte de dar
vida, de conferir movimentos a objetos inanimados através de recursos
técnicos, onde cada situação é registrada individualmente em material
sensível.
Em 1937, o Walt Disney Studio lança o primeiro longa-metragem animado
baseado em um conto de fadas dos Irmãos Grimm. Branca de Neve e os Sete Anões
que surpreendeu o público. Três anos depois o estúdio lança continuadamente seus
filmes animados que marcaram época, alguns deles são: Pinóquio (1940), Dumbo
(1941), Bambi (1942), Cinderela (1950) e A Bela Adormecida (1959). Em 1991 estréia A
Bela e a Fera, primeiro filme de animação a ser indicado ao Oscar de melhor filme, que
apresentou cenas produzidas com a ajuda de computadores, como a dança de Bela e
Fera no salão de baile. Em 1995, os estúdios Disney, em parceria com a produtora de
animação digital Pixar, apresentam Toy Story, considerado o primeiro longa-metragem
totalmente produzido por computação gráfica. A partir de então, a maioria dos filmes de
animação utiliza as técnicas de três dimensões (VITA, 2009, p. 1-2).
Hoje existem várias técnicas e utilidades para a animação. Podemos dividir
esse gênero em três técnicas principais:
2D ou cell animation ou desenho animado: O que identifica essa técnica é a
utilização de células de papel ou acetato onde são feitos os desenhos. Existem
papéis especiais para animação e pencil test. Alguns animadores utilizam o
papel sulfite 75 gramas, que dá um bom resultado e é mais facilmente
encontrado. Depois da animação pronta, as células são fotografadas ou
digitalizadas com um scanner.
Stop Motion: Não utiliza células de papel como suporte. O animador nessa
técnica trabalha geralmente com objetos inanimados: massa de modelar,
objetos diversos, grãos, recorte de papel e outros. A imagem é captada
utilizando a fotografia quadro a quadro. O pixilation é um stop motion com
7
Definição de animação contida na abertura do site (www.eba.ufmg.br/quadroaquadro), acessado dia
26/06/11 às 14:30h.
41
pessoas; elas têm que ter uma postura inanimada, como um boneco, o
animador orienta as posições que elas têm que ficar para serem fotografadas.
É uma animação com características visuais em três dimensões como um filme
em live action e não pode ser confundida com a técnica 3D, toda criada
virtualmente.
3D e CG (Computação gráfica): É, basicamente, a formação de objetos,
personagens, cenários etc. através de softwares de computador específicos
com ferramentas e efeitos avançados. Já existem sistemas de modelagem,
animação e tratamento de imagens 3D que possibilitam a criação de imagens
hiperealistas, semelhantes aos ambientes naturais. Suas aplicações são
diversas: podem ser desenvolvidas narrativas em animação que explorem os
recursos da técnica; utilizá-la para criar efeitos especiais em filmes em live
action; a tecnologia aplicada à medicina a utiliza para criar ambientes
orgânicos tridimensionais; aplicada na tecnologia espacial, em estratégias de
guerra e outras (VILAÇA, 2006, p. 24-26).
Vilaça (2006, p. 27) ainda afirma que “uma série de animações está sendo
produzida de forma híbrida”, ou seja, desenha-se no papel, digitaliza-se a animação e
finalizam-se os filmes em computação gráfica, ou capturam-se algumas cenas em stop
motion que depois são finalizadas em 3D.
A animação em 3D permite também a estruturação de um público fiel ao
formato, além de contrabalançar a queda nas vendas e a pirataria crescente, já que o
formato é hábil em resgatar o público ao cinema, por oferecer uma experiência
exclusiva.
Sobre o cinema de animação, D’Elia (1996, p. 163) declara:
[...] o cinema de animação integra elementos de todas as outras formas de
expressão. É plástico, musical, narrativo, cinematográfico e coreográfico.
Empresta das outras artes seus códigos e elementos. Mas tem também seu
repertório particular, onde se destacam: o timing; a dinâmica do movimento e o
acting.
O timing se refere ao número de imagens que devem ser fotografadas para
cada segundo de animação. Também é o que determina a velocidade da ação. A
dinâmica do movimento dá-se a partir da qualidade plástica, pois é esta a responsável
pelo ritmo e pela métrica, fazendo com que a imagem possua uma relação direta com a
música. O acting é fazer com que os personagens demonstrem emoções e
personalidade.
De acordo com Brito et al. (2011, p. 18):
42
O cinema, enquanto arte, parte do concreto para o visível, do imediato, do
próximo, pois explora o ver, o ter diante de nós a situações, as pessoas, os
cenários, as cores, as relações espaciais. Os filmes são sensoriais, visuais,
onde a linguagem falada, a musical, a escrita interagem superpostas,
interligadas, somadas. Daí a sua força. Os filmes atingem os seres humanos
por todos os sentidos e de todas as maneiras. Essa combinação de linguagens
que começa no sensorial, passa pelo emocional, pelo intuitivo e atinge o
racional.
Este hibridismo presente na linguagem cinematográfica, seja numa animação
ou não, influencia na cognição das pessoas. Por isso, torna-se necessário analisar e
interpretar as mensagens explícitas e implícitas e a ideologia ali presente.
Setton (2004, p. 143) declara que “tanto a produção quanto a recepção do filme
são envolvidas por interesses ideológicos”. A pesquisadora ainda afirma que:
[...] a ideologia de um filme não assume a forma de declarações ou reflexos
diretos sobre a cultura. Ela se encontra na narrativa e nos discursos usados –
imagens, mitos, convenções e estímulos visuais.
Almeida (2004, p. 23) assegura que “o espectador de cinema passeia ingênuo
e desarmado, buscando seu prazer em meio a um mercado que não é ingênuo, nem
desarmado”, já que a trilha sonora, as cores vibrantes, os efeitos visuais e auditivos e a
emoção concentrada exercem um domínio em todos os sentidos do receptor.
Diferentemente do livro, que exige um receptor ativo, o filme precisa de um
receptor passivo e é isso que se constitui a arma de manipulação deste suporte.
43
3. METODOLOGIA DE PESQUISA
Assim que definimos a problemática da presente investigação que é investigar
se crianças de 11 a 12 anos constroem valor moral, como a generosidade e/ou se
constroem valores não-morais como o egoísmo a partir dos contos de fadas
contemporâneos, na versão fílmica, propusemo-nos a elaborar a metodologia que
desse suporte para encontrarmos respostas às questões levantadas.
Diante disso, verificamos que método de pesquisa mais apropriado para
realizar o estudo proposto é o método indutivo, já que partimos do particular para o
geral.
Além do método indutivo, elegemos também a pesquisa bibliográfica a Teoria
dos Modelos Organizadores do Pensamento.
Tanto o método como a metodologia eleita para analisarmos os resultados
obtidos nesta pesquisa, possibilitar-nos-ão de verificar os modelos elaborados pelos
sujeitos diante de situações de conflito moral presentes nos contos de fadas
contemporâneos na versão fílmica.
3.1 Método
O método indutivo baseia-se na crença de que é possível confirmar um
enunciado (lei) através de um certo número de observações singulares (CHALMERS,
1993, p. 28).
O ponto de partida para a indução não são os princípios, como na dedução,
mas a observação dos fatos e dos fenômenos, da realidade objetiva. Seu ponto de
chegada é o estabelecimento de leis ou regularidades que regem os fatos ou
fenômenos (OLIVEIRA, 2002).
Oliveira (2002, p. 61) ainda completa, dizendo que “na realidade, a indução não
é um raciocínio único: ela compreende um conjunto de procedimentos empíricos, outros
lógicos e outros intuitivos”.
44
A indução ou raciocínio indutivo é, portanto, uma forma de raciocínio em que o
antecedente são dados e fatos particulares e o antecedente, é uma afirmação universal
(SEVERINO, 2002).
Este método de pesquisa deve, contudo, ter uma abordagem qualitativa, já que
esta envolve o uso de dados obtidos em entrevistas, documentos, questionários e
observações dos sujeitos pesquisados para a compreensão e explicação de
fenômenos.
Para Vergara (2010, p. 47):
Uma motivação para se fazer pesquisa qualitativa vem da observação que, se
há uma característica que distingue os seres humanos em relação ao mundo
natural, é a habilidade de falar. Os métodos de pesquisa qualitativa são
projetados para ajudar os pesquisadores a compreender as pessoas e os
contextos sociais e culturais em que elas vivem. O objetivo de compreender
um fenômeno do ponto de vista dos participantes e de seu contexto sócia e
institucional fica prejudicado quando os dados textuais são quatificados.
Seguindo o método de pesquisa indutiva sob uma abordagem qualitativa, é
necessário que façamos uma pesquisa bibliográfica sobre os temas abordados neste
trabalho, pois, este tipo de pesquisa é importante para reunir, revisar e comparar
informações e conhecimentos produzidos em períodos e locais próximos e/ou distantes.
Além disso, a pesquisa bibliográfica possibilita o desenvolvimento de estudos
qualitativos nas áreas de pesquisas das Ciências Humanas, devido ao fato de
permitirem a análise de contextos históricos e socioculturais, proporcionando a
compreensão de valores morais e éticos, que orientam os comportamentos sociais
durante o exercício da cidadania (GOLDENBERG, 1997).
Os objetivos da pesquisa bibliográfica é descrever, explicar e prever a frequência
de ocorrência de um problema a partir de referências teóricas registradas e publicadas
em documentos teóricos (CERVO; BERVIAN, 2003). Como verificaremos se contos de
fadas contemporâneos, na versão fílmica, constroem valores morais e não-morais, a
revisão bibliográfica torna-se de suma importância para que esta pesquisa se
concretize.
45
3.2 A investigação da moralidade a partir dos modelos organizadores do
pensamento
A teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento investiga as
representações mentais dos sujeitos, ou seja, procura entender de que forma o sujeito
incorpora os elementos existentes no mundo em que vive e como elabora a sua própria
compreensão sobre esse mundo.
Arantes (2003, p. 109) destaca que esta teoria:
[...] vem sendo elaborada pelas professoras Montserrat Moreno, Genoveva
Sastre e Aurora Leal, da Universidade de Barcelona (Moreno et al., 1999).
Essa teoria incorpora em seus pressupostos explicativos o papel que os
sentimentos, os desejos, as emoções e as fantasias exercem em nossos juízos
e nossas ações e, por isso, aponta novos caminhos para a compreensão das
relações entre a afetividade e a cognição no funcionamento psíquico do ser
humano.
Para isso, esta teoria parte da idéia de que o sujeito constrói modelos de
realidade que lhes permitem conhecer uma parte do mundo que o cerca e, a partir
disso, estuda a forma como ele os constrói.
De acordo com Sastre e Moreno (2003, p. 119):
O conjunto de representações que o sujeito realiza a partir de uma situação
determinada, constituído pelos dados que abstrai e retém como significativos
entre todos os possíveis, aqueles que imagina ou infere como necessários, os
significados e as implicações que lhes atribui, e as relações que estabelece
entre todos eles. Os modelos organizadores de pensamento constituem aquilo
que é tido por cada sujeito como a realidade, a partir da qual elabora pautas de
conduta, explicações e teorias.
Pinheiro (2009, p. 116-117) explica os três aspectos básicos da construção dos
Modelos Organizadores do Pensamento:
a)abstração e seleção de elementos da situação problemática;
b)atribuição de significados aos elementos considerados relevantes e rechaço
dos elemento considerados irrelevante;
c)estabelecimento de relações e/ou implicações entre os elementos abstratos
e seus significados.
46
Pinheiro (2009, p. 117) ainda enfatiza que “os elementos selecionados passam
a formar uma parte do sistema de representação, os modelos organizadores, que
construímos a partir de uma situação”.
É importante apontar também que é a partir dos Modelos Organizadores e dos
elementos presentes nas situações-problema que pode entender as estratégias
utilizadas pela mente humana, na resolução de conflitos, incluindo os de natureza
moral, já que esses elementos desencadeiam desejos, sentimentos, afetos,
representações sociais e valores (PINHEIRO, 2009, p. 119).
Sobre o processo de abstração de dados Arantes (2003, p. 118) afirma que:
O sujeito psicológico, diante de determinada situação, certamente não retém
todos os dados da realidade. Faz uma seleção: são retidos aqueles dados que,
para ele, são significativos, e rechaçados aqueles que não considera
significativos ou pertinentes. Os dados excluídos não intervêm no juízo
desenvolvido pelo sujeito uma vez que foram por ele desconsiderados.
Portanto, os mesmos dados (não-significativos para o sujeito) não figuram no
seu “modelo organizador”. O raciocínio elaborado pelo sujeito será baseado
somente nos dados significativos (portanto abstraídos e retidos) por ele.
Vasconcelos et al. (2010, p. 211) sintetizam os componentes de um Modelo
Organizador de Pensamento: “(a) são modelos de realidade e (b) são construídos pelo
sujeito no processo de apropriação do conhecimento”.
Estes mesmos pesquisadores (2010, p. 215) elencaram as vantagens dos
Modelos Organizadores de Pensamento:
a) expressa, no estudo do fenômeno psicológico, a organização entre
elementos, significados e suas implicações;
b) possibilita explorar a conjugação entre estrutura e conteúdos, permitindo
assim uma apreensão mais abrangente da complexidade do modo como o
sujeito pensa a realidade, já que apenas os recursos operatórios não são
suficientes para explicar o funcionamento cognitivo – incluem-se nas
operações empregadas valores, sentimentos, princípios e regras envolvidos
nos raciocínios;
c) permite observar a diversidade de modelos de realidade;
d) permite observar as regularidades entre modelos de realidade;
e) não estabelece, numa investigação, a classificação prévia das respostas dos
sujeitos, desse modo, confere uma melhor fidedignidade aos dados
coletados, demonstrando com mais detalhes seu papel no funcionamento
psíquico;
47
f) no campo da psicologia, representa uma alternativa metodológica
significativa na análise de conteúdos;
g) no campo da moralidade avança, notadamente, na análise de situações
envolvendo conflitos.
Para se aplicar os Modelos Organizadores de Pensamento, é necessário seguir
algumas etapas8
:
1. Apresentação de uma situação-problema;
2. Aplicação de um questionário sobre a situação-problema, com base em
três questões eixo:
a) O que você pensaria se estivesse na situação apresentada?
b) O que você sentiria se estivesse na situação apresentada?
c) O que você faria se estivesse na situação apresentada?
3. Identificação dos elementos abstraídos e retidos como significativos;
4. Identificação de todos os significados atribuídos a cada um dos
elementos;
5. Implicações estabelecidas pelos sujeitos;
6. Elaboração dos Modelos Organizadores do Pensamento;
7. Análise quantitativa, em função dos modelos e da variável “estado
emocional”.
Por todos esses pressupostos, vemos na teoria dos Modelos Organizadores do
Pensamento um caminho para se investigar os valores morais e não-morais construídos
psicologicamente, a partir dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica.
3.3 Procedimentos metodológicos
Com o intuito de avaliar as hipóteses sobre a relação entre os contos de fadas
contemporâneos e a construção psicológica de valores morais e não-morais nas
8
Adaptação da obra de Vasconcelos et al. (2010, p. 212-214).
48
crianças de 11 a 12 anos realizamos, primeiramente, um levantamento de algumas
releituras fílmicas de contos de fadas tradicionais do ano 2000 ao ano 2010.
Neste levantamento, encontramos algumas releituras, mas quatro delas nos
chamou a atenção por propiciarem uma versão contemporânea dos contos de fadas
mais lidos, conhecidos e amados pelas crianças: Deu a louca da Chapeuzinho
Vermelho (2005), Deu a louca na Cinderela (2007), Deu a louca na Branca de Neve
(2009),) e Enrolados (2010) que é uma versão do conto de fadas Rapunzel.
Porém, como esta pesquisa tem a intenção de analisar os contos de fadas
contemporâneos, não poderíamos deixar de analisar a versão fílmica do conto de fadas
Shrek, baseado na obra do escritor William Steig (1990), por conta de tornar-se um
filme de grande sucesso entre o público de todas as idades. Para isso, selecionamos
três filmes Shrek (2001), Shrek II (2004) e Shrek III (2007).
Após realizada a seleção dos longas-metragens animados, decidimos recortar
algumas cenas que nos desse suporte para encontramos respostas as questões
levantadas. Assim, os recortes foram realizados em cenas que apresentavam uma
situação-problema de cunho moral, onde se poderia analisar a construção dos valores
morais e não-morais investigados nesta pesquisa.
Assim, recortamos um total de 18 cenas, conforme demonstra a tabela abaixo:
Tabela 1 – Quantidade de recortes por filme
Deu a louca na
Chapeuzinho
Vermelho
Deu a louca
na
Cinderela
Deu a
louca na
Branca
de neve
Enrolados Shrek
I II III
2 recortes 3 recortes 3 recortes 6 recortes 1 recorte 1 recorte 2
recortes
Estes 18 recortes traziam, ao nosso ver, conflitos que, após questões
dilemáticas, levariam os sujeitos a posicionar-se, utilizando conteúdos existentes nos
contextos ali apresentados.
49
Em todos os recortes selecionados para a presente pesquisa, foram realizados
três questionamentos, conforme prevê a Teoria dos Modelos Organizadores de
Pensamento.
As primeiras perguntas tinham como objetivo identificar as representações
estabelecidas pelas crianças a respeito do conflito, ou seja, seria o julgamento das
ações dos sujeitos envolvidos nas cenas recortadas.
As segundas questões tinham por objetivo identificar os sentimentos, emoções
e afetos que a cena provocou e, nas terceiras questões, o objetivo era identificar o que
os sujeitos pesquisados abstraíram como mais significativo naquele contexto.
Em todas estas questões, procuramos organizar, através dos sentimentos
expressos em cada cena, o raciocínio do público-alvo da pesquisa em dois pólos: o de
aceitação e o de negação da atitude.
3.4 Procedimentos para a coleta de informações
Depois de realizarmos um estudo piloto com duas crianças de 10 a 12 anos,
iniciamos a nossa coleta de dados na Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEB)
Padre Eustáquio II que pertence ao município da Estância Hidromineral de Poá, que
fica na região do Alto Tietê.
É válido destacar que tanto a Direção como a Coordenação Pedagógica desta
Unidade Escolar, após explanarmos os objetivos e a justificativa desta pesquisa,
apoiaram-nos por considerarem o tema importante e pertinente.
Por termos conquistado a confiança da equipe gestora, pudemos escolher as
turmas que participaram da amostra: cinco salas de 6º ano do Ensino Fundamental –
ciclo II – do período da manhã, num total de 133 crianças desta escola municipal. A
coleta foi realizada durante uma semana, por conta da quantidade de salas e de alunos
participantes.
Vale destacar que, para cada sala de 6º ano foi sorteado um filme específico:
6º ano A (Deu a louca da Branca de Neve), 6º ano B (Shrek), 6º ano C (Deu a louca na
Chapeuzinho Vermelho), 6º ano D (Enrolados) e 6º ano E (Deu a louca na Cinderela).
50
Primeiramente, explicamos as crianças que se tratava de uma pesquisa
científica e agradecemos a colaboração de todas elas. Em seguida, distribuímos os
questionários que elas deveriam responder após a apresentação dos recortes dos
contos de fadas, na versão fílmica, que selecionamos para análise.
Solicitamos que as crianças respondessem as perguntas da forma mais
completa possível e individualmente.
3.5 Procedimentos para a análise das informações
Após colhermos todos os questionários aplicados, dividimo-los, primeiramente
por filme analisado. Em seguida, analisamos os protocolos de respostas e os dividimos
em dois modelos: modelo 1 (predominância da generosidade) e modelo 2
(predominância do egoísmo).
No decorrer das análises, percebemos que havia protocolos onde a
generosidade surgia como central e o egoísmo como periférico e vice-versa. Por conta
disso, criamos dois sub-modelos para o modelo 1 (sub-modelo 1 generosidade como
valor central e sub-modelo 2 generosidade como valor periférico) e outros dois sub-
modelos para o modelo 2 (sub-modelo 1 egoísmo como valor central e sub-modelo 2
egoísmo como valor periférico).
Além disso, verificamos em cada protocolo os sentimentos que as crianças
abstraíram de cada contexto, classificando-os como sentimentos de negação ou de
afirmação da atitude.
51
4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
4.1 Chapeuzinho Vermelho
4.1.1 Versão tradicional X Versão Contemporânea
A primeira versão francesa em papel do conto de fadas Chapeuzinho Vermelho
data do ano de 1697 (CORSO; CORSO, 2006, p. 51). Nesta narrativa antiga,
Chapeuzinho vai levar, a mando da mãe, pão e leite para sua avó. Enquanto caminhava
alegremente pela floresta, um lobo apareceu e perguntou-lhe onde ia. Ela,
ingenuamente, respondeu que ia à casa da vovó.
O Lobo muito esperto, chegou primeiro a casa, matou-a, colocou seu sangue
numa garrafa, fatiou sua carne num prato, comeu e bebeu satisfatoriamente, guardou
as sobras na despensa, colocou a camisola da vovó e esperou por Chapeuzinho na
cama.
Quando a menina chegou, o lobo ofereceu-lhe carne e vinho. A Menina comeu
o que lhe foi oferecido, e enquanto comia o gato de sua avó a observava aos
murmúrios, dizendo: "Meretriz! Então, comes a carne e bebes o sangue de tua avó com
gosto. Ata teu destino ao dela!".
Em seguida, o lobo pediu que a menina se dispisse e se deitasse com ele na
cama. A menina fez um strip-tease e se deitou ao lado do lobo. Ao sentir o toque do
pêlo roçar em seu corpo, ela disse: “Como a senhora é peluda, vovó” e o lobo
respondeu ”É para te esquentar, minha neta”. E, após o diálogo clássico, ela foi
finalmente devorada.
Décadas depois, Perreault dá um caráter de fábula moral ao conto buscando
ensinar que quem transgride as regras se expõe ao perigo. Em 1857, os irmãos Grimm
escreveram a continuação desta história e lhe deram um caráter de contos de fadas.
[...] após Chapeuzinho ter sido devorada, um lenhador que estava passando
em frente à casa da avó da menina escutou o ronco do lobo que dormia de
barriga cheia. Ele entrou e cortou-lhe a barriga, retirando a avó e a neta vivas
de seu ventre; após, os três preencheram o espaço vazio do estômago do
52
animal com pedras.O lobo acordou com sede e acabou afundando na água
que pretendia beber (CORSO; CORSO, 2006, p. 52).
Apesar das modificações, ao longo dos anos, o diálogo ficou preservado, onde
a vítima ingênua, mas desconfiada, questiona o lobo e é abocanhada por ele. Diante
disso, Diana Lichtenstein Corso e Mário Corso (2006, p. 53) explicam que:
Por mais máscaras que se ponha para suavizar a violência do relato, a menina
será engolida, e a tensão da narrativa provém da percepção das crianças
ouvintes, que antecipam o perigo, ao passo que amenina se deixa enganar.
Bettelheim (2007, p. 239-240) completa:
Chapeuzinho Vermelho é amada universalmente porque, embora virtuosa, é
tentada; e porque sua sorte nos diz que confiar nas boas intenções de todos,
que parece ser tão bom, na realidade nos deixa sujeitos a armadilhas. Se não
houvesse algo em nós que aprecia o grande lobo mau, ele não teria poder
sobre nós. Por conseguinte, é importante entender sua natureza, mas ainda
mais importante é saber o que o torna atraente para nós. Por mais atraente
que seja a ingenuidade, é perigoso permanecer ingênuo a vida toda.
Tanto a versão original, como a de Perreault e dos irmãos Grimm, fica evidente
que o valor moral nesta história é a obediência e a esperteza.
Em 2005 Cory Edwards escreveu, juntamente com Todd Edward e Tony Leech
e dirigiram o filme Hoodwinked (Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho) que foi
produzido pela Europa Corporation.
Nesta versão, Chapeuzinho vendia doces para a vovó na floresta. De repente,
as receitas dos doces começam a ser roubadas por alguém que a polícia não consegue
identificar. A trama se desenvolve nesta busca pelo bandido. Todos são suspeitos, a
história vai acontecendo com o interrogatório de todos que estavam na cena: o lobo, a
vovó, Chapeuzinho e o lenhador.
Alguns personagens novos são apresentados, o sapo detetive, os ursos
policiais e o coelho (figuram inicialmente doce e singela que acaba como o grande vilão
da história).
53
Em se tratando da adaptação do gênero textual ao contexto histórico, essa
história reflete características do contexto contemporâneo, como por exemplo, o uso no
cenário de bares, teleféricos, policiais, aparelhos de escuta, os esportes radicais
praticados pela avó, o celular, dentre outras coisas.
O que se percebe nesta versão contemporânea é a inversão de valores, pois o
lobo não é mais malvado. Ao contrário, é responsável e não aceita coisas erradas.
A avó deixa de ter uma imagem frágil e indefesa, e passa a praticar esportes
radicais. Aliás, nesta nova versão, há uma trama policial, há esportes radicais, há o
desejo de tornar-se ator, há atividades jornalísticas e, tudo isso, para corresponder as
novas necessidade do público, devido as mudanças operadas nos costumes e nos
valores sociais e morais.
4.1.2 Apresentação dos Modelos Organizadores de Pensamento relativos ao filme
“Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho”
Os recortes do filme ‘Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho’ foram
apresentados a 22 alunos do 6º ano C do Ensino Fundamental – ciclo II da EMEB
Padre Eustáquio II. A seguir, apresentamos, no quadro abaixo, a transcrição das cenas
recortadas deste filme, além de outras informações, como ano de produção, diretor,
sinopse, pais de origem e os questionamentos feitos aos alunos.
Quadro 1 – Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho
Ano: 2005 Diretor: Cory Edwards
País de Origem: Estados
Unidos
Sinopse: A tranquilidade da vida na floresta é alterada quando um livro de receitas é roubado. Os
suspeitos do crime são Chapeuzinho Vermelho, o Lobo Mau, o Lenhador e a Vovó, mas cada um
deles conta uma história diferente sobre o ocorrido. Cabe então ao inspetor Nick Pirueta investigar o
caso e descobrir a verdade.
Transcrição dos Recortes
Recorte 1
Sapo: O que esta escondendo, vovó?
Vovó: Minha família se preocupa muito, eu não queria que eles descobrissem.
Sapo: Descobrissem o quê?
Chapeuzinho: É, o quê?
Cegonha: Ai chefe,olha isso aqui.
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema
Valores morais em contos de fadas no cinema

Weitere ähnliche Inhalte

Was ist angesagt?

Mulheres que mudaram a historia do mundo
Mulheres que mudaram a historia do mundoMulheres que mudaram a historia do mundo
Mulheres que mudaram a historia do mundoLuzia Gabriele
 
4 filosofia contemporanea filosofia
4 filosofia contemporanea   filosofia4 filosofia contemporanea   filosofia
4 filosofia contemporanea filosofiaDaniele Rubim
 
Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"
Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"
Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"Vocação
 
A raposa e as uvas
A raposa e as uvasA raposa e as uvas
A raposa e as uvasRose Tavares
 
Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção
Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção
Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção Prof. Noe Assunção
 
Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)
Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)
Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)Eduarda Bonora Kern
 
do Teocentrismo ao Antropocentrismo
do Teocentrismo ao Antropocentrismodo Teocentrismo ao Antropocentrismo
do Teocentrismo ao AntropocentrismoLarissa Barreis
 
Caça palavras - Dia das mães
Caça palavras -  Dia das mãesCaça palavras -  Dia das mães
Caça palavras - Dia das mãesMary Alvarenga
 
Iniciação científica um salto para a ciência
Iniciação científica um salto para a ciênciaIniciação científica um salto para a ciência
Iniciação científica um salto para a ciênciaNívia Sales
 
Caderno atividades geografia_7_anola
Caderno atividades geografia_7_anolaCaderno atividades geografia_7_anola
Caderno atividades geografia_7_anolaAluisiane Kraisch
 
Valores humanos disciplina
Valores humanos   disciplinaValores humanos   disciplina
Valores humanos disciplinaPAFB
 
HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4
HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4
HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4GernciadeProduodeMat
 

Was ist angesagt? (20)

Mulheres que mudaram a historia do mundo
Mulheres que mudaram a historia do mundoMulheres que mudaram a historia do mundo
Mulheres que mudaram a historia do mundo
 
4 filosofia contemporanea filosofia
4 filosofia contemporanea   filosofia4 filosofia contemporanea   filosofia
4 filosofia contemporanea filosofia
 
o problema do senso comum
o problema do senso comumo problema do senso comum
o problema do senso comum
 
Simulado 02 (ciências 9º ano)
Simulado 02 (ciências 9º ano)Simulado 02 (ciências 9º ano)
Simulado 02 (ciências 9º ano)
 
Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"
Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"
Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"
 
Atividades aquecimento global e efeito estufa
Atividades aquecimento global e efeito estufaAtividades aquecimento global e efeito estufa
Atividades aquecimento global e efeito estufa
 
Aula 04 - Platão e o mundo das idéias
Aula 04 - Platão e o mundo das idéiasAula 04 - Platão e o mundo das idéias
Aula 04 - Platão e o mundo das idéias
 
Filosofia valores
Filosofia   valoresFilosofia   valores
Filosofia valores
 
Historia do dia nacional da consciencia negra
Historia do dia nacional da consciencia negraHistoria do dia nacional da consciencia negra
Historia do dia nacional da consciencia negra
 
A raposa e as uvas
A raposa e as uvasA raposa e as uvas
A raposa e as uvas
 
Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção
Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção
Atividade documentario história das coisas - Prof. noe Assunção
 
Plano proposta ensino religioso
Plano proposta ensino religiosoPlano proposta ensino religioso
Plano proposta ensino religioso
 
Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)
Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)
Propostas de atividade - Inclusão e Sociologia (2)
 
do Teocentrismo ao Antropocentrismo
do Teocentrismo ao Antropocentrismodo Teocentrismo ao Antropocentrismo
do Teocentrismo ao Antropocentrismo
 
Caça palavras - Dia das mães
Caça palavras -  Dia das mãesCaça palavras -  Dia das mães
Caça palavras - Dia das mães
 
Filosofia 8 ano
Filosofia  8 anoFilosofia  8 ano
Filosofia 8 ano
 
Iniciação científica um salto para a ciência
Iniciação científica um salto para a ciênciaIniciação científica um salto para a ciência
Iniciação científica um salto para a ciência
 
Caderno atividades geografia_7_anola
Caderno atividades geografia_7_anolaCaderno atividades geografia_7_anola
Caderno atividades geografia_7_anola
 
Valores humanos disciplina
Valores humanos   disciplinaValores humanos   disciplina
Valores humanos disciplina
 
HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4
HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4
HISTÓRIA | 3ª SÉRIE | HABILIDADE DA BNCC - (EM13CHS603) D1/D4
 

Andere mochten auch

Projeto: Identidade através dos Contos Infantis
Projeto: Identidade através dos Contos Infantis Projeto: Identidade através dos Contos Infantis
Projeto: Identidade através dos Contos Infantis Roberta Silva
 
Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)
Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)
Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)IAB México
 
Energía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, Morelos
Energía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, MorelosEnergía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, Morelos
Energía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, MorelosCICMoficial
 
Campo Electrico: Física C-ESPOL
Campo Electrico: Física C-ESPOLCampo Electrico: Física C-ESPOL
Campo Electrico: Física C-ESPOLESPOL
 
Principales tipos de archivos multimedia
Principales tipos de archivos multimediaPrincipales tipos de archivos multimedia
Principales tipos de archivos multimediaAngela Gómez
 
Teoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandia
Teoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandiaTeoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandia
Teoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandiaRuben Rada Escobar
 
Digital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme Medley
Digital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme MedleyDigital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme Medley
Digital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme Medleyannehelmond
 
18 種台灣超級優秀食物
18 種台灣超級優秀食物18 種台灣超級優秀食物
18 種台灣超級優秀食物Jaing Lai
 
Integración del personal a la empresa
Integración del personal a la empresaIntegración del personal a la empresa
Integración del personal a la empresaCinelandia
 
Matrimonio igualitario (2)
Matrimonio igualitario (2)Matrimonio igualitario (2)
Matrimonio igualitario (2)Gabriela Yánez
 
Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)
Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)
Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)Zacatecas TresPuntoCero
 
11 creatividad empresarial trabajo
11 creatividad empresarial trabajo11 creatividad empresarial trabajo
11 creatividad empresarial trabajojose
 
Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ...
Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ...Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ...
Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ..... ..
 
Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...
Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...
Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...Academia de Ingeniería de México
 
01 marco conceptual y procesos
01 marco conceptual y procesos01 marco conceptual y procesos
01 marco conceptual y procesosRuben Rodriguez
 

Andere mochten auch (20)

Epilepsia e estigma nas artes. uma análise pedagógica
Epilepsia e estigma nas artes. uma análise pedagógicaEpilepsia e estigma nas artes. uma análise pedagógica
Epilepsia e estigma nas artes. uma análise pedagógica
 
Projeto: Identidade através dos Contos Infantis
Projeto: Identidade através dos Contos Infantis Projeto: Identidade através dos Contos Infantis
Projeto: Identidade através dos Contos Infantis
 
Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)
Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)
Estudio de Consumo de Medios Online (Sexta edición)
 
Energía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, Morelos
Energía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, MorelosEnergía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, Morelos
Energía renovables, Cuarta Reunión Regional 2013 Cuernavaca, Morelos
 
Transductores
TransductoresTransductores
Transductores
 
Ikebana (español)
Ikebana (español)Ikebana (español)
Ikebana (español)
 
Campo Electrico: Física C-ESPOL
Campo Electrico: Física C-ESPOLCampo Electrico: Física C-ESPOL
Campo Electrico: Física C-ESPOL
 
Principales tipos de archivos multimedia
Principales tipos de archivos multimediaPrincipales tipos de archivos multimedia
Principales tipos de archivos multimedia
 
Teoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandia
Teoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandiaTeoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandia
Teoria general de la prueba judicial Tomo I - hernando devis echandia
 
Digital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme Medley
Digital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme MedleyDigital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme Medley
Digital Methods Initiative #ENDOFYEARALERT Meme Medley
 
18 種台灣超級優秀食物
18 種台灣超級優秀食物18 種台灣超級優秀食物
18 種台灣超級優秀食物
 
26-02-14 Pobreza Extrema en México y su Evaluación
26-02-14 Pobreza Extrema en México y su Evaluación26-02-14 Pobreza Extrema en México y su Evaluación
26-02-14 Pobreza Extrema en México y su Evaluación
 
Integración del personal a la empresa
Integración del personal a la empresaIntegración del personal a la empresa
Integración del personal a la empresa
 
PEREZ PAIZ, MARTINEZ RUANO
PEREZ PAIZ, MARTINEZ RUANOPEREZ PAIZ, MARTINEZ RUANO
PEREZ PAIZ, MARTINEZ RUANO
 
Matrimonio igualitario (2)
Matrimonio igualitario (2)Matrimonio igualitario (2)
Matrimonio igualitario (2)
 
Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)
Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)
Primer Paquete Económico 2017 Zacatecas (4/9)
 
11 creatividad empresarial trabajo
11 creatividad empresarial trabajo11 creatividad empresarial trabajo
11 creatividad empresarial trabajo
 
Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ...
Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ...Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ...
Normatividad trabajo en alturas resolucion 1409 de 2012 y resolucion 1903 de ...
 
Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...
Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...
Contribución de la planeación al proceso de formación de investigadores en in...
 
01 marco conceptual y procesos
01 marco conceptual y procesos01 marco conceptual y procesos
01 marco conceptual y procesos
 

Ähnlich wie Valores morais em contos de fadas no cinema

Ploner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_ps
Ploner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_psPloner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_ps
Ploner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_psJéssica Petersen
 
Soluções eficazes para ensinar valores e incentivar
Soluções eficazes para ensinar valores e incentivarSoluções eficazes para ensinar valores e incentivar
Soluções eficazes para ensinar valores e incentivarJuan Antonio López Benedí
 
Universidade Salvador Monografia Maryjane Aleluia
Universidade Salvador   Monografia Maryjane AleluiaUniversidade Salvador   Monografia Maryjane Aleluia
Universidade Salvador Monografia Maryjane AleluiaMonografia
 
Universidade Salvador Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...
Universidade Salvador   Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...Universidade Salvador   Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...
Universidade Salvador Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...Monografia
 
Ufcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índice
Ufcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índiceUfcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índice
Ufcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índiceManuais Formação
 
(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...
(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...
(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...VivianaAlves5
 
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...Manuais Formação
 
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...Manuais Formação
 
UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...
UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...
UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...Manuais Formação
 
UFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índice
UFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índiceUFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índice
UFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índiceManuais Formação
 
Tese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_berger
Tese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_bergerTese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_berger
Tese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_bergerpmarisa
 
Apostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhn
Apostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhnApostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhn
Apostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhnMirela Rosa
 
UFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade Cultural
UFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade CulturalUFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade Cultural
UFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade CulturalManuais Formação
 

Ähnlich wie Valores morais em contos de fadas no cinema (14)

Ploner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_ps
Ploner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_psPloner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_ps
Ploner michels schlindwein_guareschi_etica_e_paradigmas_na_ps
 
Soluções eficazes para ensinar valores e incentivar
Soluções eficazes para ensinar valores e incentivarSoluções eficazes para ensinar valores e incentivar
Soluções eficazes para ensinar valores e incentivar
 
Universidade Salvador Monografia Maryjane Aleluia
Universidade Salvador   Monografia Maryjane AleluiaUniversidade Salvador   Monografia Maryjane Aleluia
Universidade Salvador Monografia Maryjane Aleluia
 
Universidade Salvador Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...
Universidade Salvador   Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...Universidade Salvador   Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...
Universidade Salvador Monografia Maryjane Aleluia-O Inconsciente coletivo, ...
 
Grupo 5
Grupo 5Grupo 5
Grupo 5
 
Ufcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índice
Ufcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índiceUfcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índice
Ufcd 6733 processo de socialização e identidade cultural_índice
 
(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...
(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...
(CARTAXO) Cora e pé em aprendendendo o modelo cognitivo com psicoeducação ilu...
 
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
 
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
UFCD_6687_Dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização e contexto...
 
UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...
UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...
UFCD_6687 UFCD_6687 dinâmica de grupos, relações interpessoais, socialização ...
 
UFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índice
UFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índiceUFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índice
UFCD_6733_Processo de socialização e identidade cultural_índice
 
Tese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_berger
Tese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_bergerTese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_berger
Tese doutorado corpo e identidade_feminina-mirela_berger
 
Apostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhn
Apostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhnApostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhn
Apostila cef etica_e_legislacao_especifica_pedro_kuhn
 
UFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade Cultural
UFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade CulturalUFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade Cultural
UFCD_6733 Processo de Socialização e Identidade Cultural
 

Mehr von Audrey Danielle Beserra de Brito (14)

Inclusão de alunos com nee emsalas regulares. estudo dos sentimentos e emoçõe...
Inclusão de alunos com nee emsalas regulares. estudo dos sentimentos e emoçõe...Inclusão de alunos com nee emsalas regulares. estudo dos sentimentos e emoçõe...
Inclusão de alunos com nee emsalas regulares. estudo dos sentimentos e emoçõe...
 
Os efeitos da mídia jornalistica digital na construção da imagem do professor
Os efeitos da mídia jornalistica digital na construção da imagem do professorOs efeitos da mídia jornalistica digital na construção da imagem do professor
Os efeitos da mídia jornalistica digital na construção da imagem do professor
 
Como o professor de escola pública lida com o tema das doenças neurológicas
Como o professor de escola pública lida com o tema das doenças neurológicasComo o professor de escola pública lida com o tema das doenças neurológicas
Como o professor de escola pública lida com o tema das doenças neurológicas
 
Sacristã e Gomez aula 9
Sacristã e Gomez aula 9Sacristã e Gomez aula 9
Sacristã e Gomez aula 9
 
Rios aula 8
Rios aula 8Rios aula 8
Rios aula 8
 
Morin aula 7
Morin aula 7Morin aula 7
Morin aula 7
 
La taylle, dantas e oliveira aula 6
La taylle, dantas e oliveira aula 6La taylle, dantas e oliveira aula 6
La taylle, dantas e oliveira aula 6
 
Gatti, barreto e andré aula 5
Gatti, barreto e andré aula 5Gatti, barreto e andré aula 5
Gatti, barreto e andré aula 5
 
Freitas aula 4
Freitas aula 4Freitas aula 4
Freitas aula 4
 
Freire aula 3
Freire aula 3Freire aula 3
Freire aula 3
 
Cortella aula 2
Cortella aula 2Cortella aula 2
Cortella aula 2
 
Cortella aula 2
Cortella aula 2Cortella aula 2
Cortella aula 2
 
Carvalho aula 1
Carvalho aula 1Carvalho aula 1
Carvalho aula 1
 
Carvalho
CarvalhoCarvalho
Carvalho
 

Kürzlich hochgeladen

ATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos Descritores
ATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos DescritoresATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos Descritores
ATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos DescritoresAnaCarinaKucharski1
 
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...licinioBorges
 
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdfHistoria da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdfEmanuel Pio
 
Slides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptx
Slides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptxSlides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptx
Slides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptxLuizHenriquedeAlmeid6
 
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesRevolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesFabianeMartins35
 
Música Meu Abrigo - Texto e atividade
Música   Meu   Abrigo  -   Texto e atividadeMúsica   Meu   Abrigo  -   Texto e atividade
Música Meu Abrigo - Texto e atividadeMary Alvarenga
 
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!Ilda Bicacro
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...azulassessoria9
 
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãConstrução (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãIlda Bicacro
 
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfProjeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfHELENO FAVACHO
 
ATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇ
ATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇ
ATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇJaineCarolaineLima
 
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdfLeloIurk1
 
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptxDiscurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptxferreirapriscilla84
 
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdfA QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdfAna Lemos
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéisines09cachapa
 
JOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptx
JOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptxJOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptx
JOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptxTainTorres4
 
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcanteCOMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcanteVanessaCavalcante37
 
Reta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdf
Reta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdfReta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdf
Reta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdfWagnerCamposCEA
 

Kürzlich hochgeladen (20)

ATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos Descritores
ATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos DescritoresATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos Descritores
ATIVIDADE PARA ENTENDER -Pizzaria dos Descritores
 
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
11oC_-_Mural_de_Portugues_4m35.pptxTrabalho do Ensino Profissional turma do 1...
 
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdfHistoria da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
 
Slides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptx
Slides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptxSlides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptx
Slides Lição 04, Central Gospel, O Tribunal De Cristo, 1Tr24.pptx
 
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesRevolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
 
Música Meu Abrigo - Texto e atividade
Música   Meu   Abrigo  -   Texto e atividadeMúsica   Meu   Abrigo  -   Texto e atividade
Música Meu Abrigo - Texto e atividade
 
Bullying, sai pra lá
Bullying,  sai pra láBullying,  sai pra lá
Bullying, sai pra lá
 
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
 
CINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULA
CINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULACINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULA
CINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULA
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
 
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãConstrução (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
 
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfProjeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
 
ATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇ
ATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇ
ATIVIDADE - CHARGE.pptxDFGHJKLÇ~ÇLJHUFTDRSEDFGJHKLÇ
 
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
 
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptxDiscurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
 
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdfA QUATRO MÃOS  -  MARILDA CASTANHA . pdf
A QUATRO MÃOS - MARILDA CASTANHA . pdf
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
 
JOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptx
JOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptxJOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptx
JOGO FATO OU FAKE - ATIVIDADE LUDICA(1).pptx
 
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcanteCOMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
 
Reta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdf
Reta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdfReta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdf
Reta Final - CNU - Gestão Governamental - Prof. Stefan Fantini.pdf
 

Valores morais em contos de fadas no cinema

  • 1. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ARTES, CIÊNCIAS E HUMANIDADES AUDREY DANIELLE BESERRA DE BRITO Os contos de fadas contemporâneos na versão fílmica e a construção psicológica de valores : um estudo exploratório na perspectiva dos Modelos Organizadores do Pensamento São Paulo 2011
  • 2. 2 AUDREY DANIELLE BESERRA DE BRITO Os contos de fadas contemporâneos na versão fílmica e a construção psicológica de valores : um estudo exploratório na perspectiva dos Modelos Organizadores do Pensamento Trabalho de Conclusão de Curso apresentado a Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de especialista em Ética, Valores e Saúde na Escola. Área de Concentração: Educação e Construção de Valores Orientador(a): Profª Ângela Esteves Modesto São Paulo 2011
  • 3. 3 RESUMO BRITO, A. D. B. et al (Ed). Os contos de fadas contemporâneos na versão fílmica e a construção psicológica de valores : um estudo exploratório na perspectiva dos Modelos Organizadores do Pensamento. 2011. 116 f. TCC - Escola de Artes, Ciências e Humanidades, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. A sociedade contemporânea passou a priorizar os valores hedonistas, principalmente, por influencia da mídia. Além disso, é fato que os meios de comunicação passaram a utilizar-se da linguagem sincrética para comunicar, seduzir, persuadir, distrair, informar e também para manipular. Mas, será que o sincretismo das versões fílmicas contemporâneas tanto dos contos de fadas tradicionais, como dos contos de fadas atuais, buscam construir nas crianças ensinamentos éticos e morais? Ou será que estas versões, por serem produtos midiáticos, constroem valores hedonistas? Estes questionamentos convergiram em uma grande inquietação, que nos levou a buscar descobrir como ocorre a representação da moralidade nos contos de fadas midiáticos voltados para crianças. Assim, o objetivo desta pesquisa foi investigar, por meio de modelos organizadores do pensamento, o aparecimento ou não dos valores morais generosidade e compaixão e do valor não-moral egoísmo, em crianças de 10 a 12 anos, a partir de conflitos de natureza moral presentes em cenas recortadas dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica. Esta pesquisa justifica-se pelo fato de se fazer necessário analisar a essência dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, a fim de descobrir se eles ainda buscam construir valores morais ou se foram “contaminados” pelos valores hedonistas presentes na sociedade contemporânea. Palavras-chave: Valores morais e não-morais. Generosidade. Compaixão. Egoísmo. Modelos Organizadores do Pensamento.
  • 4. 4 Ao propor que se leve em conta a generosidade, para compreender a moralidade, estaremos concebendo o ser humano como um ‘saco de virtudes’? De modo algum. Uma teoria do ‘saco de virtudes’ pressupões justaposição entre diversas virtudes. Quanto a nós, propomos uma integração entre elas” Yves de La Taille (2004)
  • 5. 5 LISTA DE QUADROS Quadro 1 Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho 53 Quadro 2 Deu a louca na Cinderela 62 Quadro 3 Deu a louca na Branca de Neve 71 Quadro 4 Enrolados 79 Quadro 5 Shrek I 88 Quadro 6 Shrek II 89 Quadro 7 Shrek III 90
  • 6. 6 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Quantidade de recortes por filme 48 Tabela 2 Configuração dos Modelos Organizadores de Pensamento e sub-modelos referente ao filme “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho” 55 Tabela 3 Disposição afetiva em relação aos valores expressos no filme “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho” 58 Tabela 4 Configuração dos Modelos Organizadores de Pensamento e sub-modelos referente ao filme “Deu a louca na Cinderela” 63 Tabela 5 Disposição afetiva em relação aos valores expressos no filme “Deu a louca na Cinderela” 66 Tabela 6 Configuração dos modelos organizadores de pensamento e sub-modelos referente ao filme “Deu a louca na Branca de Neve” 72 Tabela 7 Disposição afetiva em relação aos valores expressos no filme “Deu a louca na Branca de Neve” 75 Tabela 8 Configuração dos modelos organizadores de pensamento e sub-modelos referente ao filme “Enrolados” 83 Tabela 9 Disposição afetiva em relação aos valores expressos no filme “Enrolados” 85 Tabela 10 Configuração dos modelos organizadores de pensamento e sub-modelos referente ao filme “Shrek I, II e III” 91 Tabela 11 Disposição afetiva em relação aos valores expressos no filme “Shrek I, II e III” 94 Tabela 12 Exemplos de respostas que ilustram o modelo 2 97 Tabela 13 Exemplos de respostas que ilustram o modelo 1 101 Tabela 14 Sentimentos morais e não-morais expressos a partir da análise dos recortes dos contos de fadas na versão fílmica 105
  • 7. 7 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 Construção de valores, em porcentagem, a partir do filme “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho” 57 Gráfico 2 Posição dos valores no filme “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho” 57 Gráfico 3 Presença dos valores nos protocolos de respostas do filme “Deu a louca na Cinderela” 64 Gráfico 4 Posição dos valores no filme “Deu a louca na Cinderela” 66 Gráfico 5 Presença dos valores nos protocolos de respostas do filme “Deu a louca na Branca de Neve” 74 Gráfico 6 Posição dos valores no filme “Deu a louca na Branca de Neve” 75 Gráfico 7 Presença dos valores nos protocolos de respostas do filme “Enrolados” 83 Gráfico 8 Posição dos valores no filme “Enrolados” 84 Gráfico 9 Presença dos valores nos protocolos de respostas do filme “Shrek” 92 Gráfico 10 Posição dos valores no filme “Shrek” 93 Gráfico 11 Agrupamento de sujeitos pelos valores construídos ou não construídos 96 Gráfico 12 Presença do Egoísmo em cada Filme 99 Gráfico 13 Egoísmo como valor central e periférico 100 Gráfico 14 Valor moral e valor não-moral como valor central e periférico. 101 Gráfico 15 Presença da Generosidade em cada Filme 104 Gráfico 16 Generosidade como valor central e periférico 105
  • 8. 8 LISTA DE FIGURAS Figura 1 Sujeito Psicológico 21 Figura 2 Comparação entre a Jornada do Escritor e a Jornada do Herói 33
  • 9. 9 SUMÁRIO 1 APRESENTAÇÃO ................................................................................ 11 1.1 A pergunta de pesquisa .......................................................... 12 1.2 Hipóteses................................................................................. 12 1.3 Objetivo geral.......................................................................... 12 1.4 Objetivos específicos............................................................... 13 1.5 Justificativa.............................................................................. 13 1.6 Método e metodologia............................................................. 13 2 QUADRO TEÓRICO ............................................................................ 14 2.1 O sujeito contemporâneo: identidade e valores.......................... 14 2.1.1 Valores: conceito e processo de internalização................ 17 2.1.2 O sujeito psicológico e a construção de valores................ 21 2.1.3 A criança e o processo de internalização dos valores....... 27 2.1.4 Valores morais e não-morais............................................. 29 2.2 Os contos de fadas...................................................................... 30 2.2.1 A estrutura das narrativas maravilhosas........................... 31 2.2.2 Os contos e fadas e os valores morais e éticos................ 35 2.2.3 O longa-metragem animado.............................................. 39 3 METODOLOGIA DE PESQUISA......................................................... 43 3.1 Método......................................................................................... 43 3.2 A investigação da moralidade a partir dos modelos organizadores do pensamento.................................................... 45 3.3 Procedimentos metodológicos.................................................... 47 3.4 Procedimentos para a coleta de informações............................. 49 3.5 Procedimentos para a análise das informações.......................... 50 4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS ........................ 51 4.1 Chapeuzinho Vermelho 51 4.1.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 51 4.1.2 Apresentação dos modelos organizadores de pensamento relativos ao filme “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho” 53 4.2 Cinderela 59 4.2.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 59 4.2.2 Apresentação dos modelos organizadores de pensamento relativos ao filme “Deu a louca na Cinderela”......... 62 4.3 Branca de Neve........................................................................... 68 4.3.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 68 4.3.2 Apresentação dos modelos organizadores de pensamento relativos ao filme “Deu a louca na Branca de Neve”........................................................................................... 70
  • 10. 10 4.4 Rapunzel..................................................................................... 76 4.4.1 Versão tradicional X versão contemporânea..................... 76 4.4.2 Apresentação dos modelos organizadores de pensamento relativos ao filme “Enrolados”................................. 79 4.5 Shrek........................................................................................... 86 4.5.1 O filme................................................................................ 86 4.5.2 Apresentação dos modelos organizadores de pensamento relativos aos filmes “Shrek I, II e III” 88 4.6 Considerações sobre a análise dos resultados........................... 94 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................ 107 REFERÊNCIAS ........................................................................................ 112
  • 11. 11 1. APRESENTAÇÃO É fato que a sociedade contemporânea passou a priorizar os valores hedonistas1 , principalmente, por influencia da mídia (VALDES, 2009, p. 33) e que os contos de fadas buscam transmitir valores e ensinamentos éticos e morais (COELHO, 2000, p. 154). Por outro lado, conforme declara Pierre Lévy (1998, p. 15) “vivemos em uma civilização da imagem e do audiovisual” e ainda, de acordo com Brito (2011, p. 21) “a preponderância visual é maciça e determinada pelos meios de comunicação que utilizam a imagem para comunicar, seduzir, persuadir, distrair, informar e também manipular”. As imagens são denominadas de linguagem não-verbal2 e, de acordo com Pais (2003, p. 1), quando a linguagem verbal se funde com a linguagem não-verbal numa mesma tecnologia, temos a presença da linguagem sincrética. Pais (2003, p. 12) cita o cinema, o teatro e a televisão como exemplos marcantes da linguagem sincrética. Mas, será que o sincretismo das versões fílmicas contemporâneas tanto dos contos de fadas tradicionais, como dos contos de fadas atuais buscam construir nas crianças ensinamentos éticos e morais? Ou será que estas versões, por serem produtos midiáticos, constroem valores hedonistas? Melo (2010, p. 4) destaca que os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, colocam em primeiro plano a animação, o que leva o enredo a tornar-se secundário, pois, segunda ela, a tela do cinema conquistou rapidamente os jovens pela entrega da imagem pronta e perfeita, tirando-lhes o trabalho de “imaginar” as cenas. Segundo esta pesquisadora (2009, p. 4): [...] a trilha sonora, as cores vibrantes, os efeitos visuais e auditivos, a emoção concentrada na expectativa de uma sala de cinema e o conforto exercem um domínio em todos os sentidos do receptor [...] Entretanto, a sedução sensível do receptor pelo cinema constitui uma arma de manipulação deste suporte, o que sinaliza para o perigo junto aos jovens dessa visão aparentemente desvinculada da sociedade e dos valores expostos em um filme. 1 O hedonismo é uma doutrina que considera como bem possível o prazer imediato e individual, sendo este o princípio e o fim de uma vida moral (VALDES, 2009, p. 35). 2 Para a Lingüística, as imagens são denominadas de linguagem não-verbal.
  • 12. 12 Todas essas informações convergiram para uma grande inquietação, que nos levou a buscar descobrir como ocorre a representação da moralidade nos contos de fadas midiáticos voltados para crianças. Assim, apresentamos a seguir o nosso questionamento principal, as hipóteses, os objetivos e a justificativa desta pesquisa. 1.1 A pergunta de pesquisa Os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, proporcionam a construção psicológica do valor moral generosidade e/ou do valor não-moral egoísmo em crianças de 10 a 12 anos? 1.2 Hipóteses Hipótese 1: Os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, influenciam a construção psicológica do valor moral generosidade e do valor não-moral egoísmo em crianças de 10 a 12 anos; Hipótese 2: Os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, não influenciam a construção psicológica do valor moral generosidade e nem na construção psicológica do valor não-moral egoísmo em crianças de 10 a 12 anos. 1.3 Objetivo geral Identificar, por meio de modelos organizadores do pensamento, o aparecimento ou não do valor moral generosidade e do valor não-moral egoísmo, em crianças de 10 a 12 anos, a partir de conflitos de natureza moral presentes em cenas recortadas dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica.
  • 13. 13 1.4 Objetivos específicos a) Verificar os modelos organizadores do pensamento que as crianças, entre 10 e 12 anos, constroem sobre o valor moral generosidade; b) Verificar os modelos organizadores do pensamento que as crianças, entre 10 e 12 anos, constroem sobre o seguinte valor não-moral: egoísmo. 1.5 Justificativa Esta pesquisa justifica-se pelo fato de se fazer necessário analisar a essência dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, a fim de descobrir se eles ainda buscam construir valores morais ou se foram “contaminados” pelos valores hedonistas presentes na sociedade contemporânea. 1.6 Método e metodologia Será utilizada como método indutivo e a pesquisa bibliográfica. Para análise dos dados colhidos, utilizaremos o instrumento teórico-metodológico da Teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento.
  • 14. 14 2. QUADRO TEÓRICO 2.1 Sujeito contemporâneo: identidade e valores A busca pelo prazer imediato e individual numa sociedade que, segundo Lemos (2004, p. 84), é marcada por um imaginário dionisíaco, a exaltação dos microdesejos que é produto do desenvolvimento de uma cultura descartável, de uma ciência e de uma técnica voltadas para o consumo e para o fluxo de uma quantidade gigantesca de informações fragmentadas e o processo de ideologização que, de certa forma, cerca a reflexividade crítica a partir da distorção, estereotipação, manipulação e construção da realidade através da influencia cognitiva da mídia (WOLF, 2008, p. 144) transformaram o homem contemporâneo num indivíduo esquizofrênico que, segundo Harvey (2007, p. 49), é aquele que acredita numa realidade forjada. Ou seja, é aquele que consome, através dos veículos midiáticos, fatias de realidade influenciadas pelo caráter imediato dos eventos e pelo sensacionalismo do espetáculo que procuram forjar a consciência dos destinatários. Como um esquizofrênico, o indivíduo utiliza-se de informações desconectadas, velozes e isoladas, e que não se articulam em seqüências coerentes. Assim, o sujeito contemporâneo passa a ser composto por uma colagem esquizofrênica de pequenos fragmentos que significa uma espécie de desmembramento da realidade única em infinitas realidades simultâneas (HARVEY, 2007, p. 52). Edgar Morin (1999, p. 17) comenta que a fragmentação do saber tem como conseqüência um vazio de subjetividade. Nesse sentido, o desaparecimento da subjetividade, responsável pela construção de nossa identidade, resulta em esquizofrenia que seria a ausência de identidade. Esta esquizofrenia, num sentido não clínico, leva o sujeito contemporâneo, a substituir a sua subjetividade por presentes desconexos, ou seja, por uma cadeia de significantes sem significado (HARVEY, 2007, p. 52).
  • 15. 15 Desse modo, a sociedade contemporânea passa a agir a partir da ética da estética3 , e não a partir de uma moral universalizante. Esta ética da estética vai impregnar todo o ambiente social e contaminar o político, a comunicação, o consumo, os negócios, as artes e espetáculos, ou seja, a vida quotidiana no seu conjunto (LEMOS, 2004, p. 86). O maior problema que Valdes (2009, p. 33) vê nisso tudo é substituição dos valores morais pelos valores hedonistas. Dalbosco (2005, p. 165) explica melhor esta observação de Valdes: O resultado mais imediato desse processo é a invasão das relações de dinheiro e poder naquele âmbito responsável pela socialização cultural espontânea das pessoas, no qual elas formam seu caráter, constroem os seus valores e, em última instância, atribuem significado à sua existência. Lombardi e Georgen (2005, p. 6) completam o raciocínio de Dalbosco: Com o enfraquecimento dos pressupostos da ética do dever e com o aumento das comodidades favorecidas pelo desenvolvimento da ciência e tecnologia bem como o destaque dado ao indivíduo, seus interesses e direitos, acentuou- se o hedonismo como uma das principais tendências da sociedade contemporânea e um dos critérios da orientação moral dos indivíduos. Diante dessas reflexões sobre o sujeito contemporâneo esquizofrênico, sem identidade e constituído por valores hedonistas, torna-se necessário e urgente à educação em valores, conforme prevêem Lombardi e Georgen (2005, p. 84): Há uma série de acontecimentos indicativos de que se inicia uma resistência contra o mercado tentacular e o frenesi consumista, contra o relativismo axiológico e o individualismo hedonista, contra a violência e a banalização da vida, contra a atomização social e a despolitização, contra a fabricação de falsas necessidades e promessas de felicidade pelo consumo. Esse movimento em prol da criação de valores éticos e morais pode ser identificado nos artigos 1º e 3º da Constituição Federal do Brasil de 1988: 3 Para Lemos (2004,p. 86) a ética da estética ocorre quando a sociedade elabora um éthos, uma maneira de ser, um modo de existência onde aquilo que é compartilhado com outros será primordial
  • 16. 16 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; Um amplo discurso sobre a importância e a necessidade de uma inversão de valores está inserido também na educação, conforme podemos notar nos Parâmetros Curriculares Nacionais, na apresentação do tema transversal ética (BRASIL, 1997, p. 26): [...] a reflexão sobre as diversas faces das condutas humanas deve fazer parte dos objetivos maiores da escola comprometida com a formação para a cidadania. Partindo dessa perspectiva, o tema Ética traz a proposta de que a escola realize um trabalho que possibilite o desenvolvimento da autonomia moral, condição para a reflexão ética. Para isso foram eleitos como eixos do trabalho quatro blocos de conteúdo: Respeito Mútuo, Justiça, Diálogo e Solidariedade, valores referenciados no princípio da dignidade do ser humano, um dos fundamentos da Constituição brasileira. Conforme já apontamos, a educação em valores passou a ser uma necessidade devido, principalmente, ao desenvolvimento de valores hedonistas. Desse modo, podemos dizer que três elementos da sociedade contemporânea se entrelaçam constantemente quando a temática é valor: mídia, educação e comportamento. A mídia, considerada um dos aparelhos ideológicos do Estado (ALTHUSSER, 1998) manipula o sujeito. De acordo com Brito (2011, p. 74): [...] é muito comum à manipulação da significação de uma mensagem, de modo a alcançar determinados efeitos comunicativos, ou seja, o receptor passa a acreditar no sentido de alguma coisa, mas a realidade recebe uma comunicação cuidadosamente elaborada por um emissor.
  • 17. 17 Breton (1999, p. 21) ainda completa, afirmando que: [...] a manipulação consiste em entrar por efração no espírito de alguém para aí depor uma opinião ou provocar um comportamento sem que ninguém saiba que houve efração. Tudo está aí, nesse gesto que se oculta a si mesmo como manipulatório. Assim, percebemos que a mídia manipula o sujeito e que, por conta disso, torna-se necessária à educação em valores para que o comportamento do homem contemporâneo se transforme de hedonista para ético. 2.1.1 Valores: conceito e processo de internalização Percebemos que a educação em valores é uma exigência da sociedade atual, mas o que são valores? Etimologicamente, o termo valor provém do latim valorem que significa que tem valor, custo (Bueno, 1967). Bueno (1967) declara que até o século XVI, a palavra valor era utilizada apenas para quantificar preços e que somente por volta do século XVII é que a palavra valor passou a ser empregada para significar também a importância das pessoas. Thomas Hobbes4 , no Leviatã, explica: O valor, ou a importância de um homem, tal como de todas as outras coisas, é o seu preço [...] Portanto, não é absoluto, mas que depende da necessidade e julgamento de outrem [...] Porque mesmo que um homem (como a maioria faz) atribua a si mesmo o mais alto valor possível, o seu verdadeiro valor não será superior ao que for estimado por outros. Schwartz (2006, p. 56) define valor como: 1) uma crença; 2) que pertence a fins desejáveis ou a formas de comportamento; 3) que transcende as situações específicas; 4 HOBBES, T. (1588-1679) Leviatã,ou matéria, forma e poder de uma república eclesiástica e civil,organizado por Richard Tuck, tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva, tradução de Cláudia Berliner, revisão de Eunice Ostrenky, São Paulo,Martins Fontes, 2003, parte I, do Homem, Capítulo X, Do poder,valor, dignidade, honra e merecimento.
  • 18. 18 4) que guia a seleção ou avaliação de comportamentos, pessoas e acontecimentos; 5) que se organiza por sua importância relativa a outros valores para formar um sistema de prioridades de valores. Cabral e Nick (2007, p. 319) posicionam-se da seguinte maneira quando se referem ao conceito de valor: Valor é um conceito abstrato, por vezes meramente implícito que define, em relação a um individuo ou a uma unidade social, quais são as finalidades desejáveis, ou os meios aconselháveis e apropriados para atingir essas finalidades. Esse contexto abstrato de valia não é o resultado de uma avaliação do próprio individuo, mas o produto social que lhe foi imposto e que ele só lentamente internaliza isto é, usa e aceita como seu critério pessoal de valor. Conforme podemos observar, Cabral e Nick afirmam que os valores são internalizados lentamente. Aristóteles (1985, p. 40) explica como isso ocorre: Não é, portanto, nem por natureza nem contrariamente à natureza que as virtudes se geram em nós; antes devemos dizer que a natureza nos dá a capacidade de recebê-las, e tal capacidade se aperfeiçoa como hábito. Sendo a virtude um hábito que se solidifica na ação, os valores devem então ser constantemente repetidos e exercitados para adquirir a força moral, logo, eles podem ser construídos. Araújo (2003, p. 158) declara que a construção de valores ocorre a partir da “projeção de sentimentos positivos que o sujeito faz sobre objetos, e/ou pessoas, e/ou relações, e/ou sobre si mesmo”. Para exemplificar esta teoria, podemos pensar numa pessoa que não aceita falsidades, de maneira nenhuma, logo, ela tem como valor moral a sinceridade. Além dos valores, Araújo também destaca que as pessoas também projetam sentimentos negativos sobre objetos, e/ou pessoas, e/ou relações, e/ou sobre si mesmas, construindo assim contravalores: “os contravalores referem-se àquilo de que não gostamos, de que temos raiva, que odiamos, por exemplo” (ARAÚJO, 2003, 158).
  • 19. 19 Para esclarecer melhor esta definição, Araújo (2003, p. 159) faz uma analogia com a escola: Se a criança gosta daquele ambiente [...] a instituição escolar pode tornar-se alvo de projeções afetivas positivas e tornar-se um valor para ela. Caso contrário [...] é bem provável que esse espaço seja alvo de projeções afetivas negativas, que não seja valorizado, que não se constitua em um valor para ela, e sim num contravalor. Há também os valores não-morais que são construídos quando um sentimento não ético é alvo de projeções afetivas positivas e passam a ser valorado. Araújo (2003, p. 159) exemplifica, declarando que “o traficante, a violência e o autoritarismo são valores para algumas pessoas” e ainda comenta: Ficava impressionado com cenas apresentadas em telejornais, mostrando pessoas que haviam cometido chacinas ou eram acusadas de grandes atos de corrupção e que, ao serem questionadas pelos repórteres sobre suas ações e seus sentimentos, demonstravam muita frieza e indiferença sobre os fatos. Como vimos, tanto os valores, morais ou não, como também os contravalores podem ser construídos e é neste ponto que detemos nossa atenção, pois, de acordo com os PCNs (Brasil, 2008, p. 33), “a aprendizagem de valores e atitudes é pouco explorada do ponto de vista pedagógico”, mas, por outro lado, a mídia pode transmitir valores morais, valores não morais e contravalores o tempo todo e numa linguagem muito mais atraente que a da escola, conforme declara Araújo (2003, p. 159): Podemos pensar, por exemplo, no papel da mídia que, empregando linguagens altamente atrativas e dinâmicas, normalizam a violência quando elegem como heróis personagens que são assassinos; quando normalizam a prostituição feminina e o culto a determinados padrões estéticos; quando apresentam de forma acrítica casos de corrupção. O autor (2003, p. 159) ainda completa: Se tais valores são transmitidos em linguagens interessantes, como a da televisão, da Internet e dos vídeos games [...] podemos pensar que aumentará
  • 20. 20 a probabilidade de que se tornem alvo de suas projeções afetivas positivas e sejam por eles valoradas. O problema é que os valores e os contravalores construídos são incorporados na identidade das pessoas (ARAÚJO, 2003, p. 160). Assim, o que se deve fazer é analisar criticamente o material veiculado pela mídia, tanto em jornais, revistas, livros, fotos, propaganda, música, programas de TV, filmes, para trazer à tona suas mensagens implícitas ou explícitas sobre valores. Além de analisar criticamente o material que a mídia veicula a fim de verificar se se constroem valores morais ou não, ou até mesmo contravalores, é necessário que a educação em valores passe a ser uma realidade para garantir a transformação do comportamento hedonista. De acordo com Martins (2009) há quatro maneiras de se ensinar valores: 1.Abordagem pela doutrinação de valores: dá-se através da disciplina, do bom exemplo, de enfatizar mais as condutas do que os raciocínios, destacando as virtudes do patriotismo, do trabalho, da honestidade, do altruísmo e da coragem; 2.Abordagem pela clarificação dos valores: consiste em ajudar, de maneira não-diretiva e de forma neutra, a clarificar, assumir e por em prática os seus próprios valores; 3.Abordagem pela opinião ou julgamento dos valores: consiste em acentuar os componentes cognitivos da moralidade. Esta abordagem propõe que a educação moral se centre na discussão de dilemas morais sem levar em conta, no entanto, as diferenças de sexo, raça, de classes sociais e de cultura, concentrando-se unicamente na atribuição de significados que pessoas dão à suas experiências ou vivencias morais; 4.Abordagem pela narração: envolve três dimensões da educação em valores – cognição, emoção e motivação. A abordagem pela narração ou narrativa reconhece que, na diversidade cultural, é comum a contação de histórias por parte das pessoas com o objetivo de transmitir valores de gerações mais velhas para as mais novas. A narrativa desempenha um papel na vida e na dimensão moral das pessoas. Vimos, então, que os valores podem ser construídos, tanto pela educação como pela mídia. Vimos também que a mídia pode também construir valores não morais/ hedonistas e contravalores. Além disso, observamos que há técnicas de se
  • 21. 21 construir valores, conforme as citadas por Martins (2009), mas, como os valores são construídos pelo psiquismo humano? 2.1.2 O sujeito psicológico e a construção de valores Sastre e Moreno (2003, p. 129) afirmam que os diversos cenários da vida cotidiana, com o entrelaçamento de seus múltiplos e diversos componentes, devem deixar sua marca na construção do psiquismo humano. Esses componentes que deixam marcas na construção do psiquismo humano são explicados por Araújo (2003) em seu modelo de Sujeito Psicológico: Figura 1: Sujeito Psicológico Físicas Interpessoais Socioculturais BIOLÓGICA COGNITIVA SOCIOCULTURAL AFETIVA Inconsciente Consciência Universo das Relações Fonte: (ARAUJO, 2003, p.156)
  • 22. 22 De acordo com este modelo, o sujeito psicológico é composto por todos esses sistemas que, em uma interação contínua, relacionam-se com o meio. Todos eles, segundo o autor (2003, p. 155), estão “inter-relacionados entre si de maneira sistêmica de tal forma que sua separação só é possível para efeitos de estudo e para facilitar sua compreensão”. Em relação a este modelo, Araújo (2003, p. 155) ainda explica que: a) a visão sistêmica de indissociabilidade entre as diferentes dimensões está representada por meio de setas bidirecionais que as ligam entre si; b) a representação de todos os sistemas constituintes é feita por meio de linhas tracejadas, indicando sua abertura e ausência de fronteiras bem definidas entre as diferentes dimensões; c) se a imagem fosse tridimensional, perceber-se-ia que a consciência e o inconsciente (ou não-consciência) encontram-se em planos distintos, paralelos, mas ligados entre si, de tal forma que pressupomos um inconsciente cognitivo, um inconsciente afetivo, um inconsciente biológico e um inconsciente sociocultural (grifo nosso). Se o inconsciente, conforme declara Araújo, liga-se a consciência e se o autor pressupõe que exista um plano inconsciente para as todas as dimensões do sujeito psicológico, há a necessidade de esclarecermos que, de acordo com Freud, o inconsciente é uma região da mente humana na qual ficam recalcadas a emoções, os sentimentos, os desejos e os conflitos do ser humano (NASIO, 1999). Nasio (1999, p.25-26) explica que o recalcamento é “uma barreira que impede a passagem dos conteúdos inconscientes para o pré-consciente”. Já Bergeret (2006, p. 85) define o recalcamento como um processo ativo, destinado a conservar fora da consciência as representações inaceitáveis, ou seja, que representam possíveis tentações ou castigos de exigências pulsionais censuráveis, quando não meras alusões a estas. Percebemos, então, que o recalque serve para impedir que os afetos e os desejos inconscientes passem para a consciência. Mas, os afetos que trataremos nesta pesquisa estão no plano consciente do sujeito psicológico. De acordo com Araújo (2003, p. 156), as emoções e os sentimentos fazem parte da dimensão afetiva e são influenciados pela dimensão biológica e pela dimensão sociocultural e pode influenciar a dimensão cognitiva:
  • 23. 23 [...] as emoções, pertencentes à dimensão afetiva, são conjuntos complexos de reações químicas e neurais (dimensão biológica); sua indução recebe forte influência da cultura, que molda os conteúdos que podem elicitar as emoções (dimensão sociocultural); e seu aparecimento ou sentimento permeia os processos cognitivos do pensamento (dimensão cognitiva). Diante dessas explicações, podemos perceber que a dimensão afetiva desempenha um papel funcional e organizativo no raciocínio humano, principalmente no que diz respeito à construção de valores e de identidade. Minha tese, e de autores como La Taille (1998, 2002) e Damon (1995),é de que os valores construídos são incorporados na identidade das pessoas. Quanto maior a carga afetiva vinculada a determinado valor, mais centralmente ele se “posiciona” na identidade (ARAÚJO, 2003, p. 160). Conforme já foi aqui discutido, o sujeito contemporâneo é desprovido de identidade e a educação em valores busca formar esta identidade. Todavia, a dimensão afetiva é que determinará os valores construídos e a identidade formada já que, a partir da declaração de Araújo, o valor só será construído e internalizado em sua identidade, se tocar a sensibilidade do sujeito através da afetividade. Assim, antes de prosseguirmos, torna-se necessário diferenciar emoção, sentimento e afeto. Sobre emoção, Mahoney e Almeida (2009, p. 17-18) explicam que: [...] é a exteriorização da afetividade, é sua expressão corporal, motora. Tem um poder plástico, expressivo e contagioso; é o recurso de ligação entre o orgânico e o social: estabelece os primeiros laços com o mundo humano e, através deste, com o mundo físico e cultural. As emoções compõem sistemas de atitudes reveladas pelo tônus (nível de tensão muscular). Combinado com intenções conforme as diferentes situações. Das oscilações viscerais e musculares se diferenciam as emoções e se estabelecem padrões posturais para o medo, alegria, raiva, ciúmes, tristeza, etc. Já, o sentimento corresponde à expressão representacional da afetividade e não implica reações instantâneas e diretas como na emoção (MAHONEY; ALMEIDA, 2009, p. 21).
  • 24. 24 Saconni (1996, p. 606) define a palavra sentimento como “um estado psicológico de longa duração”. Rodrigues et al. (1989, p. 15) apontam os sentimentos como “fenômenos afetivos estáveis que resultam, em regra, da intelectualização das emoções”. Damásio (2000, p. 57) também distingue emoção de sentimento: “sentimento (experiência mental da emoção) e emoção (conjunto de reações orgânicas)”. Percebemos, a partir destas definições, que a emoção é uma reação corporal (ativação fisiológica) e o sentimento é quando se atribui um valor aquilo que se sente (ativação representacional). Já, o afeto, de acordo com Codo e Gazzotti (1999, p. 48-59), é um conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções e sentimentos, acompanhados sempre de impressão de dor ou prazer, de satisfação ou insatisfação, de agrado ou desagrado, de alegria ou de tristeza. Para Mahoney e Almeida (2009, p. 17), a afetividade “refere-se à capacidade do ser humano ser afetado pelo mundo externo e interno por meio de sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis”. Rodrigues et al. (1989, p. 15) definem a afetividade como o “conjunto de emoção e sentimentos”. Isso significa dizer que a afetividade engloba tanto uma reação do corpo (emoção), como também uma experiência subjetiva (sentimento). Damásio (2000, p. 431) afirma que o “afeto é aquilo que você manifesta (exprime) ou experimenta (sente) em relação a um objeto ou situação, em qualquer dia de sua vida”. Bock et al. (1999, p. 193) enfatizam que: Os afetos ajudam-nos a avaliar as situações, servem de critérios de valoração positiva ou negativa para as situações de nossa vida; eles preparam nossas ações, ou seja, participam ativamente da percepção que temos das situações vividas e do planejamento de nossas ações ao meio. Se os afetos (emoções e sentimentos) influenciam a percepção e as ações do ser humano, eles também regulam suas interações sociais. É como se fosse um círculo: uma pessoa é afetada pela afetividade (Pinto, 2007, p. 12) e sua reação afeta as emoções e os sentimentos de outra pessoa, ou seja, um afeto (positivo ou negativo)
  • 25. 25 afeta um ser humano que afetará também a sua interação com o outro, e este outro será afetado, sucessivamente. Voltando a discussão da influência das emoções, dos sentimentos e dos afetos na construção de valores e na formação da identidade do sujeito, Araújo (2003, p. 160) declara: No processo de desenvolvimento psicológico, durante nossa vida, nossos valores se organizam em um sistema em que alguns deles são mais centrais e outros mais periféricos [...] as emoções e os sentimentos que chamamos morais, como a vergonha, a culpa e o remorso, aparecem (ou são sentidos) quando agimos e/ou pensamos contrariando os valores centrais de nossa identidade. Nesse sentido, atuam regulando nosso funcionamento psíquico. Assim, os valores pertencentes à dimensão afetiva, que são construídos como centrais na identidade das pessoas, sendo de natureza moral, atuarão regulando eticamente seus pensamentos e suas ações. Araújo5 (2007 p. 5-6) explica esta teoria: Tentando sintetizar essa discussão, entendo que no processo de desenvolvimento psicológico, durante toda a nossa vida, à medida que nossos valores vão sendo construídos, eles se organizam em um sistema. Nesse sistema de valores que cada sujeito constrói (que no fundo constituem a base das representações de si), alguns deles se "posicionam" de forma mais central em nossa identidade, e outros, de forma mais periférica. O que determina esse "posicionamento" é a intensidade da carga afetiva vinculada a determinado valor (ou contravalor) construído. Assim, nossos valores centrais são aqueles que, além de terem sido construídos a partir da ação projetiva de sentimentos positivos, a intensidade desses sentimentos é muito grande. Por outro lado, construímos alguns valores cuja intensidade dos sentimentos é pequena e, por isso, se "posicionam" na periferia de nossa identidade. Vale enfatizar, entretanto, que o posicionamento de valores como centrais ou periféricos é flexível, logo, um mesmo valor pode ser central ou periférico, dependendo da situação na qual o sujeito se encontra. Araújo (2003, p. 160) exemplifica esta declaração: Exemplificando, existem pessoas que vão à farmácia comprar um remédio que custa 10 reais e descobrem que só em 9 reais e 80 centavos na carteira. O 5 Fragmento de uma versão simplificada de capítulo publicado no livro “Educação e Valores: pontos e contrapontos” (Araújo, U.F.; Puig, J. & Arantes, V., Summus Editorial, 2007).
  • 26. 26 balconista lhe entrega o remédio e ele diz que depois paga os 20 centavos restantes. Se a honestidade é um valor central na identidade desse cliente, ele poderá ir até sua casa pegar as moedas e voltar à farmácia para pagar os 20 centavos. Se não fizer isso, poderá sentir-se mal, incomodado. Por outro lado, conhecemos pessoas que primam por não pagarem suas dívidas e não se importam por ficar devendo aos outros. No primeiro caso, a honestidade é um valor central na identidade da pessoa em questão, o que significa que esse conteúdo possui uma forte carga afetiva para ele, enquanto que no segundo caso ela é um valor periférico, localizado na “periferia” de sua identidade, com pouca carga afetiva vinculada. O papel exercido nesse sistema, pela intensidade dos sentimentos no posicionamento dos valores, tem um papel importante na construção de valores e da identidade. Diante disso, Araújo (2007 p. 7) conclui: [...] o valor moral depende de uma certa qualidade nas interações, e não é, necessariamente, construído pelas pessoas. Vincula-se à projeção afetiva positiva que o constitui, ligada ou não a conteúdos de natureza moral. Se os valores construídos como centrais na identidade são de natureza ética, estamos falando que existe maior probabilidade de que os pensamentos e os comportamentos dessa pessoa sejam éticos. Pelo contrário, se os valores construídos como centrais na identidade baseiam-se na violência, na discriminação, etc, é provável que seus comportamentos e pensamentos não sejam éticos. Portanto, as situações que envolvem valores morais e/ou não morais, contravalores e identidade estão fortemente associadas às emoções positivas e negativas. Acreditamos que essas experiências emocionais entram em ação quando estamos considerando uma decisão. Sobre essas experiências emocionais, Bechara (2003, p. 196) declara que “a ativação desses estados somáticos oferece sinais automáticos que, de maneira explícita ou oculta, marcam diversas opções e situações com uma valoração”. Mas, quais são os valores morais que podem ser construídos como centrais na identidade do sujeito contemporâneo e que podem atuar em seu funcionamento psíquico, regulando eticamente seus pensamentos e suas ações?
  • 27. 27 2.1.3 A criança e o processo de internalização dos valores Segundo Araújo (2003, p. 104), Piaget vincula o desenvolvimento infantil ao desenvolvimento do juízo moral. Desse modo, Piaget divide a relação das crianças com as regras em 3 fases: anomia, heteronomia e autonomia. A anomia é a fase da ausência de regras, por exemplo, um recém-nascido desconhece a existência das regras sociais. A heteronomia é a fase em que a criança conhece as regras que são determinadas por outras pessoas e a autonomia é a fase em que a criança internaliza as regras e se submete conscientemente a elas (PIAGET, 1932). Assim, podemos compreender que, para Piaget, as crianças menores estão no estágio de heteronomia, isto é, as regras são impostas pelos adultos e as crianças maiores passam aos poucos para um estágio de autonomia, em que as regras são vistas como resultado de uma decisão livre e digna de respeito, aceitas pelo grupo. Lawrence Kohlberg (1984), ex-aluno de Piaget, insatisfeito com sua obra, ainda que aceitasse a abordagem cognitivo-evolutiva, dedicou-se a redefinição dos estágios de desenvolvimento moral estabelecendo seu próprio esquema, criticando aspectos fundamentais da teoria piagetiana. Segundo Kohlberg, existem seis estágios em ordem invariável, como os de Piaget, em que se desenvolve a moralidade. Kohlberg cita os estágios para que o indivíduo tem que passar para evoluir, porém, para ele, muitos adultos não passam do 3º estágio, onde está presente as expectativas interpessoais mútuas, relacionamentos e conformidades interpessoais. E através de uma série de estudos e pesquisas, a Teoria do Desenvolvimento Moral, onde estabelece um esquema de desenvolvimento definido em três níveis e seis estágios. 1º NIVEL PRÉ-CONVENCIONAL: A moralidade da criança é marcada pelas conseqüências de seus atos: punição ou recompensa, elogio ou castigo, e baseia-se no poder físico (de punir ou recompensar) daqueles que estipulam as normas. Estágio 1 - O que determina a bondade ou maldade de um ato são as conseqüências físicas do ato (punição). Respeita-se a ordem apenas por medo à punição, e não se tem consciência nenhuma do valor e do significado humano das regras.
  • 28. 28 Estágio 2 - A ação justa é aquela que satisfaz as minhas necessidades, a que me gera recompensa e prazer, e, ocasionalmente aos outros. As relações humanas são vistas como trocas comerciais. Mais ou menos assim "Tu me gratificas e eu te gratifico". A pessoa tenta obter recompensas pelas suas ações. 2º NÍVEL CONVENCIONAL: Nesse nível a manutenção das expectativas da família, do grupo, da nação, da sociedade é vista como válida em si mesma e sem muitos questionamentos ou porquês. É uma atitude de conformidade com a ordem social, mas também uma atitude de lealdade e amor á família, ao grupo, ao social. Estágio 3 - É bom aquele comportamento que agrada aos outros e por eles é aprovado. De certa forma, é bom o que é socialmente aceito, aquilo que segue o padrão. O comportamento é muitas vezes julgado com base na intenção, e a intenção torna-se pela primeira vez importante. É a busca do desejo de aprovação familiar e social. Estágio 4 - Há o desenvolvimento da noção de dever, de comportamento correto, de cumprir a própria obrigação. Há o desejo de manter a ordem social especificamente pelo desejo de mantê-la, isto é, por que isso é justo. 3º NÍVEL PÓS-CONVENCIONAL: Há um esforço do indivíduo para definir os valores morais, para definir conscientemente e livremente o que é certo e o que é errado, e porquê... Prescinde-se muitas vezes da autoridade dos grupos e das pessoas que mantém a autoridade sobre os princípios morais. Estágio 5 - É a tomada da consciência da existência do outro, da maioria, do bem comum, dos direitos humanos... A ação justa é a ação que leva em conta os direitos gerais do indivíduo, isto é, o bem comum. Valores pessoais são claramente considerados relativos, é a lei da maioria e da utilidade social. Estágio 6 - O justo e correto é definido pela decisão da consciência de acordo com os princípios éticos escolhidos e baseados na compreensão lógica, universalidade, coerência, solidariedade universal. Guia-se por princípios universais de justiça, de reciprocidade, de igualdade de direitos, de respeito pela dignidade dos seres humanos, por um profundo altruísmo, pela fraternidade. Os padrões próprios de justiça têm mais peso do que as regras e leis existentes na sociedade (RIBEIRO E SILVA. G, 2003, p. 06). Ribeiro e Silva (2003, p.06) conclui sua pesquisa afirmando que tanto no modelo de Piaget como no de Kohlberg, a moralidade de um indivíduo depende tanto de fatores psicológicos e biológicos (quem é a pessoa, quem são seus pais, qual sua bagagem genética...), como de elementos sociais e culturais (onde nasceu, em que época, quem são seus vizinhos, amigos, mestres, grau de instrução, condição financeira...).
  • 29. 29 2.1.4 Valores morais e não-morais Já vimos que Araújo (2003; 2007) destaca que sentimentos éticos, quando centrais, vão construir, psicologicamente, valores morais na identidade do sujeito, ao passo que os sentimentos não éticos vão construir valores não morais ou contravalores. Martins6 (2009) conceitua dez valores que, segundo ele, se construídos podem melhorar a vida em sociedade: autonomia, capacidade de convivência, diálogo, dignidade da pessoa humana, igualdade de direitos, justiça, participação social, respeito mútuo, generosidade e tolerância. Dentre os valores citados por Martins, analisaremos, nesta pesquisa o valor moral generosidade. Em relação à generosidade, Pinheiro (2009, p. 68) declara que ela “caracteriza- se por uma virtude por excelência altruísta [...] requer dar algo sem ser pelo cumprimento do dever”. Comte-Sponville (2009, p. 105-106) ainda comenta que “A generosidade é o contrário do egoísmo [...] ser generoso é ser livre de si, de suas pequenas covardias, de suas pequenas posses, de suas pequenas cóleras, de seus pequenos ciúmes”. Assim, pretendemos verificar se os contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, constroem o valor generosidade no público infanto-juvenil porque acreditamos que se trata de um valor moral extremamente necessário ao homem contemporâneo que, por viver rodeado por valores hedonistas/não-morais, necessita construí-lo em sua identidade, como valor central, a fim de combater o predomínio do egoísmo. Verificaremos também se ocorre à construção psicológica de valores não- morais, como o egoísmo. Em relação ao egoísmo, Borriello et al. (2003, p. 349), declara que este valor indica “amor excessivo a si próprio”. Esses autores ainda declaram que o egoísmo é uma: 6 MARTINS, V. A prática de valores na escola. Disponível em: http://www.abec.ch/Portugues/subsidios- educadores/artigos/categorias/artigos-ed paz/ARTIGO_A_PRATICA_DE_VALORES_NA_ESCOLA%20_Versao25_11_04.pdf. Acesso em 17 Ago 2011.
  • 30. 30 Necessidade desproporcional de conservação e de valorização de si mesmo, ainda que com prejuízo dos outros, quase que a cristalização do indivíduo na própria realidade e na própria história; o ponto de referência de tudo é o próprio eu, como se fosse o centro do universo [...] busca exclusivamente a satisfação dos próprios interesses pessoais (BORRIELLO et al., 2003, p. 349). Por ser esse um valor não-moral expresso, geralmente, pela valorização do sucesso, da beleza, da popularidade, do status social, da fama, do dinheiro, do poder, entre outros, consideramos importante verificarmos se ele pode ser construído psicologicamente pelo público infanto-juvenil, através dos contos de fadas contemporâneos na versão fílmica. 2.2 Os contos de fadas Há dois tipos de contos muito semelhantes: os contos maravilhosos e os contos de fadas. De acordo com Todorov (1971, p. 120) “o conto de fadas é uma das variedades do conto maravilhoso, do qual se distingue por uma certa escritura e não pelo estatuto do sobrenatural”. Contudo, há outros teóricos que afirmam que o conto de fadas e os contos maravilhosos são diferentes, são dois gêneros distintos, ou seja, embora apresentem estruturas narrativas idênticas, eles são diferentes em relação a sua problemática central. Enquanto os contos de fadas apresentam uma problemática existencial: a busca de realização pelo amor, os contos maravilhosos apresentam uma problemática social: a busca de realização da personagem pela fortuna (COELHO, 2000, p. 109). Coelho (2000, p. 172-173) declara que há ainda duas diferenças básicas entre esses gêneros: a origem e o propósito: A forma do conto maravilhoso tem raízes em narrativas orientais difundidas pelos árabes [...] O núcleo da aventura é sempre de natureza material/social/sensorial (a busca de riquezas, a satisfação do corpo; a conquista do poder, etc) [...] Desse maravilhoso nasceram personagens que possuem poderes sobrenaturais; deslocam-se; contrariando as leis da gravidade; sofrem metamorfoses contínuas; defrontam-se com as forças do Bem e do Mal, personificadas; sofrem profecias que se cumprem; são beneficiadas com milagres; assistem a fenômenos que desafiam as leis da lógica, etc. O conto de fadas é de natureza espiritual/ética/existencial. Originou-se entre os celtas, com heróis e heroínas, cujas aventuras estavam
  • 31. 31 ligadas ao sobrenatural, ao ministério do além-vida e visavam a realização interior do ser humano. Daí a presença da fada, cujo nome vem do termo latino”fatum”, que significa destino Desse modo, podemos perceber então que os contos de fadas apresentam uma problemática existencial: o herói ou a heroína que precisa vencer obstáculos ou provas para alcançar sua auto-realização. Geralmente a aventura da busca parte de uma metamorfose ou de um encantamento. Já os contos maravilhosos apresentam um herói ou anti-herói que encontrará sua auto-realização na conquista de bens e de poder material. A aventura de busca, nesse caso, parte, geralmente, da necessidade de sobrevivência física ou da miséria dos protagonistas. Assim, embora narrativas maravilhosas, o conto de fadas e o conto maravilhoso expressam atitudes bem diferentes diante da vida: no primeiro, ligadas ao ideal, aos valores eternos, ao espírito; no segundo, ligadas ao sensorial, ao concreto, à vida prática. 2.2.1 A estrutura das narrativas maravilhosas Tanto os contos de fadas como os contos maravilhosos fazem parte dos gêneros narrativos, por isso, é importante compreendermos o conceito de narrativa. Para Siqueira (1992, p. 14), "[...] quando o fato se desenvolve a partir da criação de um conflito, temos uma narrativa", ou seja, o fato do leitor reconhecer o conflito é a principal característica da narrativa. A narrativa se inicia com um equilíbrio e este é quebrado, seja pela introdução de um elemento mágico, seja pelo falecimento ou afastamento de algum personagem. Essa quebra de equilíbrio gera o conflito, e a narrativa desenvolve-se na busca de uma solução. Uma vez resolvido o conflito, o equilíbrio que se restabelece não é mais o mesmo, embora possa ser parecido com o inicial (SIQUEIRA, 1992, p. 17). Segundo Todorov (1970, p. 40), temos: [...] dois tipos de episódios numa narrativa: os que descrevem um estado de equilíbrio ou desequilíbrio, e os que descrevem a passagem de um estado a
  • 32. 32 outro. O primeiro tipo será relativamente estático e, pode-se dizer, iterativo: o mesmo tipo de ações poderia ser repetido indefinidamente. O segundo, em compensação, será dinâmico e só se produz, em princípio, uma única vez. Costa (2008, p. 67) explica as principais características do conto: [...] é breve e curto, com um número reduzido de personagens em cena com ação concentrada. As personagens geralmente são anônimas e culturalmente prototípicas (rei, princesa, dragão, padre, moleiro...) Enunciativamente, as fórmulas introdutórias do tipo “Era uma vez...” de localização temporal indefinida, acabam dando ao conto um caráter de permanência temporal (passado e atual), além de colocá-lo no mundo ficcional. Em relação à estrutura dos gêneros narrativos, Joseph Campbell criou, em 1949, em sua obra “O herói de mil faces”, uma estrutura textual básica que denominou de Jornada do herói. A partir desta jornada, Campbell divide a aventura do herói em três fases, que compreendem basicamente a partida, a iniciação e o retorno (MARTINEZ, 2008, p. 52). Segundo Mônica Martinez (2008, p. 56-57), a estrutura da Jornada do Herói de Campbell foi transposta para o cinema por Christipher Vogler nos anos de 1980: Até então, o analista de roteiros da Companhia Walt Disney preocupava-se em entender o mecanismo de uma boa história, daquelas que a pessoa tem a sensação de ter vivido uma experiência completa e significativa [...] Ao se deparar com o trabalho de Joseph Campbell, Vogler entende que o padrão que havia instituído estava mapeado no livro Q herói de mil faces, escrito pelo mitólogo norte-americano. Com o tempo, este conhecimento torna-se a base do metido empregado pelo especialista para diagnosticar problemas e prescrever soluções às películas cinematográficas. Em pouco tempo Vogler traça um memorando de sete páginas que intitula “Guia prático d’O herói de mil faces”, no qual exemplifica a idéia de Campbell por meio de filmes clássicos e contemporâneos. De acordo com Vogler (2006, p. 26) “todas as histórias consistem em alguns elementos estruturais comuns, encontrados universalmente em mitos, contos de fadas, sonhos e filmes”. Christopher Vogler (2006, p. 27) ainda declara: Ficou logo evidente para mim que a Jornada do Herói era uma tecnologia narrativa útil e empolgante, que podia ajudar diretores e produtores a eliminar grande parte dos riscos de tentar adivinhar e dos gastos de desenvolver as histórias para um filme.
  • 33. 33 Diante disso, o autor passou a utilizar esta técnica em produções cinematográficas, porém, atualizou-a de acordo com sua necessidade, modificando-a do original de Campbell. A jornada de Vogler é chamada de ‘Jornada do Escritor’. Figura 2. Comparação entre a Jornada do Escritor e a Jornada do Herói Fonte: VOGLER, C. A jornada do escritor: estruturas místicas para escritores. Tradução de Ana Maria Machado. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 34-35. Vogler (2006, p. 37-46) explica cada parte da Jornada:
  • 34. 34 1. Mundo Comum: A maioria das histórias desloca o herói para fora de seu mundo ordinário, cotidiano, e o introduz em um Mundo Especial, novo e estranho; 2. Chamado à Aventura: Apresenta-se ao herói um problema, um desafio, uma aventura a empreender; 3. Recusa do Chamado (o Herói Relutante): Agora é a hora do medo. Com freqüência, o herói hesita logo antes de partir em sua aventura, Recusando o Chamado, ou exprimindo relutância; 4. Mentor (a Velha ou o Velho Sábio): A função do Mentor é preparar o herói para enfrentar o desconhecido; 5. Travessia do Primeiro Limiar: Finalmente, o herói se compromete com sua aventura e entra plenamente no Mundo Especial da história pela primeira vez — ao efetuar a Travessia do Primeiro Limiar; 6. Testes, Aliados e Inimigos: Uma vez ultrapassado o Primeiro Limiar, o herói naturalmente encontra novos desafios e Testes, faz Aliados e Inimigos, e começa a aprender as regras do Mundo Especial; 7. Aproximação da Caverna Oculta: Finalmente, o herói chega à fronteira de um lugar perigoso, às vezes subterrâneo e profundo, onde está escondido o objeto de sua busca; 8. A Provação: Aqui se joga a sorte do herói, num confronto direto com seu maior medo. Ele enfrenta a possibilidade da morte e é levado ao extremo numa batalha contra uma força hostil; 9. Recompensa (Apanhando a Espada): Após sobreviver à morte, o herói, então, pode se apossar do tesouro que veio buscar, sua Recompensa; 10. Caminho de Volta: Mas o herói começa a lidar com as conseqüências de ter-se confrontado com as forças obscuras da Provação; 11. Ressurreição: É uma espécie de exame final do herói, que deve ser posto à prova, ainda uma vez, para ver se realmente aprendeu as lições da Provação. O herói se transforma; 12. Retorno com o Elixir: O herói retorna ao Mundo Comum, mas a jornada não tem sentido se ele não trouxer de volta um Elixir, tesouro ou lição do Mundo Especial. Nelly Novaes Coelho também organizou uma estrutura básica para se analisar os contos de fadas e os contos maravilhosos. Ela extraiu cinco invariantes definidas por Wladimir Propp que estão sempre presentes nos contos de fadas e nos contos maravilhosos – aspiração (ou desígnio), viagem, obstáculos (ou desafios), mediação auxiliar e conquista do objetivo (final feliz) (COELHO, 2000, p. 109 -110):
  • 35. 35 1.Toda efabulação tem, como motivo nuclear, uma aspiração ou um desígnio, que levam o herói (ou a heroína) à ação; 2.A condição primeira para a realização desse desígnio é sair de casa; o herói empreende uma viagem ou se desloca para um ambiente estranho, não- familiar; 3.Há sempre um desafio à realização pretendida, ou surgem obstáculos aparentemente insuportáveis que se opõem à ação do herói (ou da heroína); 4.Surge sempre um mediador entre o herói (ou a heroína) e o objetivo que está difícil de ser alcançado; isto é, surge um auxiliar mágico natural ou sobrenatural, que afasta ou neutraliza os perigos e ajuda o herói a vencer; 5.Finalmente o herói conquista o almejado objetivo. Portanto, as narrativas – sejam elas maravilhosas ou não, seguem uma determinada estrutura – tanto para a escrita verbal, como para sua forma mais contemporânea que é a cinematográfica. Contudo, vale enfatizar que, diferentemente de qualquer outra forma de literatura, elas são capazes de contribuir diretamente para a construção da identidade e dos valores éticos e morais. 2.2.2 Os contos de fadas e os valores morais e éticos Dentre as narrativas maravilhosas, o foco desta pesquisa está nos contos de fadas e, em relação aos valores morais e éticos, esse gênero apresenta uma certa “complexidade das forças interiores” (positiva e negativa) sobre a dualidade maniqueísta que sempre caracterizou o comportamento das personagens tradicionais. Sobre isso, Coelho (2000, p. 154) declara: A intenção maior é dotar as personagens de ficção da ambigüidade natural dos homens e, através dela, revelar as forças polares ou contraditórias, inerentes à condição humana. Embora em algumas obras a lição de vida desemboque em horizonte “fechado” e enfatize as forças negativas ou o fracasso do viver, a grande maioria delas aponta para a esperança, para o entusiasmo e a importância de se participar dinamicamente da vida. Assim, podemos perceber que os contos de fadas, além de dar exemplos ou conselhos, propõem problemas a serem resolvidos, estimulando a capacidade de
  • 36. 36 compreensão dos fenômenos e provocando idéias novas ou uma atitude receptiva em relação às inovações que a vida cotidiana propõe (ou proporá), além de procurar capacitar as crianças e jovens a optarem, com inteligência, nos momentos de agir. Segundo o historiador Darnton (1996, p. 61), as primeiras versões dos contos de fadas, embora não tivesse a intenção de transmitir valores morais, sugeriam cautela: Sem fazer pregações nem dar lições de moral, os contos demonstram que o mundo é duro e perigoso. Embora, na maioria, não fossem endereçados às crianças, tendem a sugerir cautela. Como se erguessem letreiros de advertência, por exemplo, em torno à busca de fortuna: "Perigo!"; "Estrada interrompida; "Vá devagar!"; "Pare!" É verdade que alguns contêm uma mensagem positiva. Mostram que a generosidade, a honestidade e a coragem são recompensadas. Mas não inspiram muita confiança na eficácia de se amar os inimigos e oferecer a outra face. Em vez disso, demonstram que, por mais louvável quês seja dividir o seu pão com mendigos, não se pode confiar em todos aqueles que se encontra pelo caminho. Alguns estranhos talvez se transformem em príncipes e fadas bondosas; mas outros podem ser lobos e feiticeiras, e não há maneira de distinguir uns dos outros. Darnton (1996, p. 05) ainda declara que nestas primeiras versões, os contadores de histórias procuravam retratar um mundo de brutalidade: As outras histórias da Mamãe Ganso dos camponeses franceses têm as mesmas características de pesadelo. Numa versão primitiva da "Bela Adormecida", por exemplo, o Príncipe Encantado, que já é casado, viola a princesa e ela tem vários filhos com ele, sem acordar. As crianças, finalmente, quebram o encantamento, mordendo a durante a amamentação, e o conto então aborda seu segundo tema: as tentativas da sogra do príncipe, uma ogra, de comer sua prole ilícita. O "Barba Azul" original é a história de uma noiva que não consegue resistir à tentação de abrir uma porta proibida na casa de seu marido, um homem estranho, que já teve seis mulheres. Ela entra num quarto escuro e descobre os cadáveres das esposas anteriores, pendurados na parede. Horrorizada, deixa a chave proibida cair de sua mão numa poça de sangue, no chão. Não consegue limpá la; então, Barba Azul descobre sua desobediência, ao examinar as chaves. Enquanto ele amola sua faca, preparando se para transformá la na sétima vítima, ela se recolhe em seu quarto e veste seu traje de casamento. Mas demora a se vestir, o tempo suficiente para ser salva por seus irmãos, que galopam em seu socorro depois de receberem um aviso de seu pombo de estimação. Num dos primeiros contos do ciclo de Cinderela, a heroína torna se empregada doméstica, a fim de impedir o pai de forçá la a se casar com ele. Em outro, a madrasta ruim tenta empurrá la para dentro de um fogão, mas incinera, por engano, uma das mesquinhas irmãs postiças. Em "João e Maria", na versão dos camponeses franceses, o herói engana um ogre fazendo o cortar as gargantas de seus próprios filhos. Um marido devora uma sucessão de recém casadas, no leito conjugal, em "La Belle et le monstre" ("A bela e a fera"), uma das centenas de contos que jamais chegaram a ser incluídos nas versões publicadas de Mamãe
  • 37. 37 Ganso. Num conto mais desagradável, "Les trois chiens" ("Os três cães"), uma irmã mata seu irmão escondendo grandes pregos no colchão de seu leito conjugal. No conto mais maligno de todos, "Ma mère m'a tué, mon père m'a mangé" ("Minha mãe me matou, meu pai me devorou"), uma mãe faz do filho picadinho e o cozinha, preparando uma caçarola à lionesa, que sua filha serve ao pai. E por aí vai, do estupro e da sodomia ao incesto e ao canibalismo. As versões dos contos de fadas, conhecidas hoje, foram modificadas ao longo da história para se adequarem ao público infantil. Estas versões passaram a enfatizar os ensinamentos éticos e morais. Coelho (2000, p. 179) destaca alguns valores presentes nesse gênero narrativo: Predomínio dos valores humanistas; preocupação fundamental com a sobrevivência ou com as necessidades básicas do indivíduo: fome, sede, agasalho, descanso, estímulo à caridade, solidariedade, boa vontade, tolerância... Valorização da palavra dada quem, em hipótese alguma, poderá ser quebrada; Oscilação entre uma ética maniqueísta (nítida separação entre o Bem e o Mal; Certo e Errado) e uma ética relativista (o que parecia mau acaba se revelando bom; o que parecia errado resulta em algo certo...). Mas quanto às ações, a regra é: prêmio para o Bem e castigo para o Mal; A esperteza/astúcia inteligente vencem a prepotência e a força bruta; inclusive através de atos que julgados rigorosamente são desonestos mas desculpados pela moral prática (é o caso das artimanhas do Gato de Botas para tornar o seu pobre amo um nobre senhor); A ambição desmedida ou a insaciabilidade humana causam desequilíbrios sem conta; Há uma ordem natural nos seres e nas coisas que não deve ser contrariada; São sempre os mais velhos que detêm nas mãos o poder e a autoridade, de maneira absoluta e inquestionável. Enquanto os mais novos sempre os predestinados (apesar de no início parecer o contrário...) Os primeiros representam o passado, a tradição; os últimos, o futuro; O indivíduo que consegue vencer as provas e passar do nível mais baixo da sociedade para o mais alto, é sempre alguém com dons excepcionais; A grande mediadora da possível ascensão do homem na escala social é a mulher. Casando-se com a “filha do rei” ou do “nobre abastado”,o indivíduo pobre ou plebeu automaticamente enobrece e se torna poderoso; As qualidades exigidas á mulher são: beleza, modéstia, pureza, obediência, recato ... e total submissão ao homem (pai,marido, irmão, etc). É dada muito maior ênfase às relações entre pai e filha, do que entre esposo e esposa.
  • 38. 38 Muitos e muitos dos núcleos dramáticos dessas histórias expressam problema entre pai e filha; É enfatizada a ambigüidade da natureza feminina. Desde as narrativas primordiais, a mulher pe causa de bem e de mal, tanto pode salvar o homem, com sua bondade e amor, como pode pô-lo a perder com seus ardis e traições. Ela tanto pode ser a amada divinizada pela qual o príncipe luta como pode ser apenas o instrumento da procriação desejada pelo homem. Nota-se, porém, que a exploração dos aspectos negativos da mulher se dá, basicamente, nos contos jocosos; isto é, são aspectos realçados com comicidade: mulheres gulosas, perdulárias, teimosas, mentirosas, ignorantes, fingidas... Percebemos, portanto, que a essência dos contos de fadas, nas versões atuais, está na capacidade que esse tipo de texto tem em abstrair conceitos formadores de caráter, uma vez que estabelece relação entre “bem e mal”, “certo e errado”. No decorrer da história, os contos de fadas passaram a abordar, conforme vimos, questões existenciais e relevantes para a vida do homem. Não são histórias tenebrosas ou esvaziadas de significação, ao contrário, trazem hoje profundas reflexões acerca da conduta humana (DONÊNCIO, 2011, p. 90). E, a criança necessita de idéias sobre como colocar ordem sua “casa interior”. Ela necessita de uma educação moral que, de modo sutil e só implicitamente, a conduza às vantagens do comportamento moral, não por meio de conceitos éticos abstratos, mas daquilo que lhe parece tangivelmente correto e, portanto, significativo. Para Bettelheim (2007, p. 12) “a criança encontra esse tipo de significado nos contos de fadas”, já que estas histórias lidam com problemas humanos universais. As personagens e situações dos contos de fadas também personificam e ilustram conflitos íntimos, mas sempre sugerem sutilmente como esses conflitos podem ser solucionados e quais os próximos passos a serem dados rumo a uma humanidade mais elevada. O conto de fadas é apresentado de um modo simples, despretensioso; nenhuma solicitação é feita ao ouvinte [...] Longe de fazer solicitações, os contos de fadas reassegura, dá esperança para o futuro e oferece a promessa de um final feliz (BETTELHEIM, 2007, p. 37). Bettelheim (2007, p. 16) esclarece também, com detalhes, como os contos de fadas contribuem para a educação moral da criança:
  • 39. 39 É característico dos contos de fadas colocar um dilema existencial de maneira breve e incisiva. Isso permite à criança apreender o problema em sua forma mais essencial, enquanto que uma trama mais complexa confundiria as coisas para ela.O conto de fadas simplifica todas as situações [...] Ao contrário do que acontece em muitas histórias infantis modernas, nos contos de fadas o mal é tão onipresente quanto a virtude. Em praticamente todo conto de fadas, o bem e o mal são corporizados sob a forma de algumas personagens e de suas ações, uma vez que o bem e o mal são onipresentes na vida e as propensões para ambos estão presentes em todo homem. É essa dualidade que coloca o problema moral e requer a luta para resolvê-lo [...] Não é o fato de a virtude vencer no final que promove a moralidade, mas sim o fato de o herói ser extremamente atraente para a criança, que se identifica com ele em todas as suas lutas. Devido a essa identificação, ela imagina que sofre com o herói suas provas e tribulações, e triunfa com ele quando a virtude sai vitoriosa. A criança faz tais identificações inteiramente por conta própria, e as lutas interiores e exteriores do herói lhe imprimem moralidade. Assim, podemos dizer que os contos de fadas levam a criança a construir sua identidade e seus valores morais e éticos, além de sugerirem experiências que são necessárias para desenvolver ainda mais seu caráter. 2.3 O longa-metragem animado Brito (2011, p. 21) declara que “estamos em um momento da cultura em que as imagens estão presentes em nosso cotidiano como nunca visto antes”. Lévy (1995, p. 15) também afirma que “vivemos em uma civilização da imagem ou do audiovisual”, pois a preponderância visual é maciça e determinada pelos meios de comunicação que utilizam a imagem para comunicar, seduzir, persuadir, destruir, informar e também manipular. Como vivenciamos uma forte cultura visual, os longas-metragens animados têm conquistado um grande público. Mas, o que é animação? Animação significa dar ânima, dar alma, dar vida. Pode-se dizer que a animação traz em si a essência do cinema. Manipulando sinteticamente o tempo e o espaço, a arte de animar expressa a criação de um universo próprio que faz parte do imaginário de todos que, desde a infância, se encantam com a possibilidade do lúdico.
  • 40. 40 É o terreno do absurdo e da fantasia, no qual a realidade é sempre reinventada e, muitas vezes, criticada7 . Existem outras referências para a palavra animação, Vilaça (2006, p. 35) inicia com a definição: A palavra ANIMAÇÃO vem do latim Anima e significa Alma ou Sopro Vital. Animar significa dar vida a objetos inanimados. Em cinema é a arte de dar vida, de conferir movimentos a objetos inanimados através de recursos técnicos, onde cada situação é registrada individualmente em material sensível. Em 1937, o Walt Disney Studio lança o primeiro longa-metragem animado baseado em um conto de fadas dos Irmãos Grimm. Branca de Neve e os Sete Anões que surpreendeu o público. Três anos depois o estúdio lança continuadamente seus filmes animados que marcaram época, alguns deles são: Pinóquio (1940), Dumbo (1941), Bambi (1942), Cinderela (1950) e A Bela Adormecida (1959). Em 1991 estréia A Bela e a Fera, primeiro filme de animação a ser indicado ao Oscar de melhor filme, que apresentou cenas produzidas com a ajuda de computadores, como a dança de Bela e Fera no salão de baile. Em 1995, os estúdios Disney, em parceria com a produtora de animação digital Pixar, apresentam Toy Story, considerado o primeiro longa-metragem totalmente produzido por computação gráfica. A partir de então, a maioria dos filmes de animação utiliza as técnicas de três dimensões (VITA, 2009, p. 1-2). Hoje existem várias técnicas e utilidades para a animação. Podemos dividir esse gênero em três técnicas principais: 2D ou cell animation ou desenho animado: O que identifica essa técnica é a utilização de células de papel ou acetato onde são feitos os desenhos. Existem papéis especiais para animação e pencil test. Alguns animadores utilizam o papel sulfite 75 gramas, que dá um bom resultado e é mais facilmente encontrado. Depois da animação pronta, as células são fotografadas ou digitalizadas com um scanner. Stop Motion: Não utiliza células de papel como suporte. O animador nessa técnica trabalha geralmente com objetos inanimados: massa de modelar, objetos diversos, grãos, recorte de papel e outros. A imagem é captada utilizando a fotografia quadro a quadro. O pixilation é um stop motion com 7 Definição de animação contida na abertura do site (www.eba.ufmg.br/quadroaquadro), acessado dia 26/06/11 às 14:30h.
  • 41. 41 pessoas; elas têm que ter uma postura inanimada, como um boneco, o animador orienta as posições que elas têm que ficar para serem fotografadas. É uma animação com características visuais em três dimensões como um filme em live action e não pode ser confundida com a técnica 3D, toda criada virtualmente. 3D e CG (Computação gráfica): É, basicamente, a formação de objetos, personagens, cenários etc. através de softwares de computador específicos com ferramentas e efeitos avançados. Já existem sistemas de modelagem, animação e tratamento de imagens 3D que possibilitam a criação de imagens hiperealistas, semelhantes aos ambientes naturais. Suas aplicações são diversas: podem ser desenvolvidas narrativas em animação que explorem os recursos da técnica; utilizá-la para criar efeitos especiais em filmes em live action; a tecnologia aplicada à medicina a utiliza para criar ambientes orgânicos tridimensionais; aplicada na tecnologia espacial, em estratégias de guerra e outras (VILAÇA, 2006, p. 24-26). Vilaça (2006, p. 27) ainda afirma que “uma série de animações está sendo produzida de forma híbrida”, ou seja, desenha-se no papel, digitaliza-se a animação e finalizam-se os filmes em computação gráfica, ou capturam-se algumas cenas em stop motion que depois são finalizadas em 3D. A animação em 3D permite também a estruturação de um público fiel ao formato, além de contrabalançar a queda nas vendas e a pirataria crescente, já que o formato é hábil em resgatar o público ao cinema, por oferecer uma experiência exclusiva. Sobre o cinema de animação, D’Elia (1996, p. 163) declara: [...] o cinema de animação integra elementos de todas as outras formas de expressão. É plástico, musical, narrativo, cinematográfico e coreográfico. Empresta das outras artes seus códigos e elementos. Mas tem também seu repertório particular, onde se destacam: o timing; a dinâmica do movimento e o acting. O timing se refere ao número de imagens que devem ser fotografadas para cada segundo de animação. Também é o que determina a velocidade da ação. A dinâmica do movimento dá-se a partir da qualidade plástica, pois é esta a responsável pelo ritmo e pela métrica, fazendo com que a imagem possua uma relação direta com a música. O acting é fazer com que os personagens demonstrem emoções e personalidade. De acordo com Brito et al. (2011, p. 18):
  • 42. 42 O cinema, enquanto arte, parte do concreto para o visível, do imediato, do próximo, pois explora o ver, o ter diante de nós a situações, as pessoas, os cenários, as cores, as relações espaciais. Os filmes são sensoriais, visuais, onde a linguagem falada, a musical, a escrita interagem superpostas, interligadas, somadas. Daí a sua força. Os filmes atingem os seres humanos por todos os sentidos e de todas as maneiras. Essa combinação de linguagens que começa no sensorial, passa pelo emocional, pelo intuitivo e atinge o racional. Este hibridismo presente na linguagem cinematográfica, seja numa animação ou não, influencia na cognição das pessoas. Por isso, torna-se necessário analisar e interpretar as mensagens explícitas e implícitas e a ideologia ali presente. Setton (2004, p. 143) declara que “tanto a produção quanto a recepção do filme são envolvidas por interesses ideológicos”. A pesquisadora ainda afirma que: [...] a ideologia de um filme não assume a forma de declarações ou reflexos diretos sobre a cultura. Ela se encontra na narrativa e nos discursos usados – imagens, mitos, convenções e estímulos visuais. Almeida (2004, p. 23) assegura que “o espectador de cinema passeia ingênuo e desarmado, buscando seu prazer em meio a um mercado que não é ingênuo, nem desarmado”, já que a trilha sonora, as cores vibrantes, os efeitos visuais e auditivos e a emoção concentrada exercem um domínio em todos os sentidos do receptor. Diferentemente do livro, que exige um receptor ativo, o filme precisa de um receptor passivo e é isso que se constitui a arma de manipulação deste suporte.
  • 43. 43 3. METODOLOGIA DE PESQUISA Assim que definimos a problemática da presente investigação que é investigar se crianças de 11 a 12 anos constroem valor moral, como a generosidade e/ou se constroem valores não-morais como o egoísmo a partir dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, propusemo-nos a elaborar a metodologia que desse suporte para encontrarmos respostas às questões levantadas. Diante disso, verificamos que método de pesquisa mais apropriado para realizar o estudo proposto é o método indutivo, já que partimos do particular para o geral. Além do método indutivo, elegemos também a pesquisa bibliográfica a Teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento. Tanto o método como a metodologia eleita para analisarmos os resultados obtidos nesta pesquisa, possibilitar-nos-ão de verificar os modelos elaborados pelos sujeitos diante de situações de conflito moral presentes nos contos de fadas contemporâneos na versão fílmica. 3.1 Método O método indutivo baseia-se na crença de que é possível confirmar um enunciado (lei) através de um certo número de observações singulares (CHALMERS, 1993, p. 28). O ponto de partida para a indução não são os princípios, como na dedução, mas a observação dos fatos e dos fenômenos, da realidade objetiva. Seu ponto de chegada é o estabelecimento de leis ou regularidades que regem os fatos ou fenômenos (OLIVEIRA, 2002). Oliveira (2002, p. 61) ainda completa, dizendo que “na realidade, a indução não é um raciocínio único: ela compreende um conjunto de procedimentos empíricos, outros lógicos e outros intuitivos”.
  • 44. 44 A indução ou raciocínio indutivo é, portanto, uma forma de raciocínio em que o antecedente são dados e fatos particulares e o antecedente, é uma afirmação universal (SEVERINO, 2002). Este método de pesquisa deve, contudo, ter uma abordagem qualitativa, já que esta envolve o uso de dados obtidos em entrevistas, documentos, questionários e observações dos sujeitos pesquisados para a compreensão e explicação de fenômenos. Para Vergara (2010, p. 47): Uma motivação para se fazer pesquisa qualitativa vem da observação que, se há uma característica que distingue os seres humanos em relação ao mundo natural, é a habilidade de falar. Os métodos de pesquisa qualitativa são projetados para ajudar os pesquisadores a compreender as pessoas e os contextos sociais e culturais em que elas vivem. O objetivo de compreender um fenômeno do ponto de vista dos participantes e de seu contexto sócia e institucional fica prejudicado quando os dados textuais são quatificados. Seguindo o método de pesquisa indutiva sob uma abordagem qualitativa, é necessário que façamos uma pesquisa bibliográfica sobre os temas abordados neste trabalho, pois, este tipo de pesquisa é importante para reunir, revisar e comparar informações e conhecimentos produzidos em períodos e locais próximos e/ou distantes. Além disso, a pesquisa bibliográfica possibilita o desenvolvimento de estudos qualitativos nas áreas de pesquisas das Ciências Humanas, devido ao fato de permitirem a análise de contextos históricos e socioculturais, proporcionando a compreensão de valores morais e éticos, que orientam os comportamentos sociais durante o exercício da cidadania (GOLDENBERG, 1997). Os objetivos da pesquisa bibliográfica é descrever, explicar e prever a frequência de ocorrência de um problema a partir de referências teóricas registradas e publicadas em documentos teóricos (CERVO; BERVIAN, 2003). Como verificaremos se contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica, constroem valores morais e não-morais, a revisão bibliográfica torna-se de suma importância para que esta pesquisa se concretize.
  • 45. 45 3.2 A investigação da moralidade a partir dos modelos organizadores do pensamento A teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento investiga as representações mentais dos sujeitos, ou seja, procura entender de que forma o sujeito incorpora os elementos existentes no mundo em que vive e como elabora a sua própria compreensão sobre esse mundo. Arantes (2003, p. 109) destaca que esta teoria: [...] vem sendo elaborada pelas professoras Montserrat Moreno, Genoveva Sastre e Aurora Leal, da Universidade de Barcelona (Moreno et al., 1999). Essa teoria incorpora em seus pressupostos explicativos o papel que os sentimentos, os desejos, as emoções e as fantasias exercem em nossos juízos e nossas ações e, por isso, aponta novos caminhos para a compreensão das relações entre a afetividade e a cognição no funcionamento psíquico do ser humano. Para isso, esta teoria parte da idéia de que o sujeito constrói modelos de realidade que lhes permitem conhecer uma parte do mundo que o cerca e, a partir disso, estuda a forma como ele os constrói. De acordo com Sastre e Moreno (2003, p. 119): O conjunto de representações que o sujeito realiza a partir de uma situação determinada, constituído pelos dados que abstrai e retém como significativos entre todos os possíveis, aqueles que imagina ou infere como necessários, os significados e as implicações que lhes atribui, e as relações que estabelece entre todos eles. Os modelos organizadores de pensamento constituem aquilo que é tido por cada sujeito como a realidade, a partir da qual elabora pautas de conduta, explicações e teorias. Pinheiro (2009, p. 116-117) explica os três aspectos básicos da construção dos Modelos Organizadores do Pensamento: a)abstração e seleção de elementos da situação problemática; b)atribuição de significados aos elementos considerados relevantes e rechaço dos elemento considerados irrelevante; c)estabelecimento de relações e/ou implicações entre os elementos abstratos e seus significados.
  • 46. 46 Pinheiro (2009, p. 117) ainda enfatiza que “os elementos selecionados passam a formar uma parte do sistema de representação, os modelos organizadores, que construímos a partir de uma situação”. É importante apontar também que é a partir dos Modelos Organizadores e dos elementos presentes nas situações-problema que pode entender as estratégias utilizadas pela mente humana, na resolução de conflitos, incluindo os de natureza moral, já que esses elementos desencadeiam desejos, sentimentos, afetos, representações sociais e valores (PINHEIRO, 2009, p. 119). Sobre o processo de abstração de dados Arantes (2003, p. 118) afirma que: O sujeito psicológico, diante de determinada situação, certamente não retém todos os dados da realidade. Faz uma seleção: são retidos aqueles dados que, para ele, são significativos, e rechaçados aqueles que não considera significativos ou pertinentes. Os dados excluídos não intervêm no juízo desenvolvido pelo sujeito uma vez que foram por ele desconsiderados. Portanto, os mesmos dados (não-significativos para o sujeito) não figuram no seu “modelo organizador”. O raciocínio elaborado pelo sujeito será baseado somente nos dados significativos (portanto abstraídos e retidos) por ele. Vasconcelos et al. (2010, p. 211) sintetizam os componentes de um Modelo Organizador de Pensamento: “(a) são modelos de realidade e (b) são construídos pelo sujeito no processo de apropriação do conhecimento”. Estes mesmos pesquisadores (2010, p. 215) elencaram as vantagens dos Modelos Organizadores de Pensamento: a) expressa, no estudo do fenômeno psicológico, a organização entre elementos, significados e suas implicações; b) possibilita explorar a conjugação entre estrutura e conteúdos, permitindo assim uma apreensão mais abrangente da complexidade do modo como o sujeito pensa a realidade, já que apenas os recursos operatórios não são suficientes para explicar o funcionamento cognitivo – incluem-se nas operações empregadas valores, sentimentos, princípios e regras envolvidos nos raciocínios; c) permite observar a diversidade de modelos de realidade; d) permite observar as regularidades entre modelos de realidade; e) não estabelece, numa investigação, a classificação prévia das respostas dos sujeitos, desse modo, confere uma melhor fidedignidade aos dados coletados, demonstrando com mais detalhes seu papel no funcionamento psíquico;
  • 47. 47 f) no campo da psicologia, representa uma alternativa metodológica significativa na análise de conteúdos; g) no campo da moralidade avança, notadamente, na análise de situações envolvendo conflitos. Para se aplicar os Modelos Organizadores de Pensamento, é necessário seguir algumas etapas8 : 1. Apresentação de uma situação-problema; 2. Aplicação de um questionário sobre a situação-problema, com base em três questões eixo: a) O que você pensaria se estivesse na situação apresentada? b) O que você sentiria se estivesse na situação apresentada? c) O que você faria se estivesse na situação apresentada? 3. Identificação dos elementos abstraídos e retidos como significativos; 4. Identificação de todos os significados atribuídos a cada um dos elementos; 5. Implicações estabelecidas pelos sujeitos; 6. Elaboração dos Modelos Organizadores do Pensamento; 7. Análise quantitativa, em função dos modelos e da variável “estado emocional”. Por todos esses pressupostos, vemos na teoria dos Modelos Organizadores do Pensamento um caminho para se investigar os valores morais e não-morais construídos psicologicamente, a partir dos contos de fadas contemporâneos, na versão fílmica. 3.3 Procedimentos metodológicos Com o intuito de avaliar as hipóteses sobre a relação entre os contos de fadas contemporâneos e a construção psicológica de valores morais e não-morais nas 8 Adaptação da obra de Vasconcelos et al. (2010, p. 212-214).
  • 48. 48 crianças de 11 a 12 anos realizamos, primeiramente, um levantamento de algumas releituras fílmicas de contos de fadas tradicionais do ano 2000 ao ano 2010. Neste levantamento, encontramos algumas releituras, mas quatro delas nos chamou a atenção por propiciarem uma versão contemporânea dos contos de fadas mais lidos, conhecidos e amados pelas crianças: Deu a louca da Chapeuzinho Vermelho (2005), Deu a louca na Cinderela (2007), Deu a louca na Branca de Neve (2009),) e Enrolados (2010) que é uma versão do conto de fadas Rapunzel. Porém, como esta pesquisa tem a intenção de analisar os contos de fadas contemporâneos, não poderíamos deixar de analisar a versão fílmica do conto de fadas Shrek, baseado na obra do escritor William Steig (1990), por conta de tornar-se um filme de grande sucesso entre o público de todas as idades. Para isso, selecionamos três filmes Shrek (2001), Shrek II (2004) e Shrek III (2007). Após realizada a seleção dos longas-metragens animados, decidimos recortar algumas cenas que nos desse suporte para encontramos respostas as questões levantadas. Assim, os recortes foram realizados em cenas que apresentavam uma situação-problema de cunho moral, onde se poderia analisar a construção dos valores morais e não-morais investigados nesta pesquisa. Assim, recortamos um total de 18 cenas, conforme demonstra a tabela abaixo: Tabela 1 – Quantidade de recortes por filme Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho Deu a louca na Cinderela Deu a louca na Branca de neve Enrolados Shrek I II III 2 recortes 3 recortes 3 recortes 6 recortes 1 recorte 1 recorte 2 recortes Estes 18 recortes traziam, ao nosso ver, conflitos que, após questões dilemáticas, levariam os sujeitos a posicionar-se, utilizando conteúdos existentes nos contextos ali apresentados.
  • 49. 49 Em todos os recortes selecionados para a presente pesquisa, foram realizados três questionamentos, conforme prevê a Teoria dos Modelos Organizadores de Pensamento. As primeiras perguntas tinham como objetivo identificar as representações estabelecidas pelas crianças a respeito do conflito, ou seja, seria o julgamento das ações dos sujeitos envolvidos nas cenas recortadas. As segundas questões tinham por objetivo identificar os sentimentos, emoções e afetos que a cena provocou e, nas terceiras questões, o objetivo era identificar o que os sujeitos pesquisados abstraíram como mais significativo naquele contexto. Em todas estas questões, procuramos organizar, através dos sentimentos expressos em cada cena, o raciocínio do público-alvo da pesquisa em dois pólos: o de aceitação e o de negação da atitude. 3.4 Procedimentos para a coleta de informações Depois de realizarmos um estudo piloto com duas crianças de 10 a 12 anos, iniciamos a nossa coleta de dados na Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEB) Padre Eustáquio II que pertence ao município da Estância Hidromineral de Poá, que fica na região do Alto Tietê. É válido destacar que tanto a Direção como a Coordenação Pedagógica desta Unidade Escolar, após explanarmos os objetivos e a justificativa desta pesquisa, apoiaram-nos por considerarem o tema importante e pertinente. Por termos conquistado a confiança da equipe gestora, pudemos escolher as turmas que participaram da amostra: cinco salas de 6º ano do Ensino Fundamental – ciclo II – do período da manhã, num total de 133 crianças desta escola municipal. A coleta foi realizada durante uma semana, por conta da quantidade de salas e de alunos participantes. Vale destacar que, para cada sala de 6º ano foi sorteado um filme específico: 6º ano A (Deu a louca da Branca de Neve), 6º ano B (Shrek), 6º ano C (Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho), 6º ano D (Enrolados) e 6º ano E (Deu a louca na Cinderela).
  • 50. 50 Primeiramente, explicamos as crianças que se tratava de uma pesquisa científica e agradecemos a colaboração de todas elas. Em seguida, distribuímos os questionários que elas deveriam responder após a apresentação dos recortes dos contos de fadas, na versão fílmica, que selecionamos para análise. Solicitamos que as crianças respondessem as perguntas da forma mais completa possível e individualmente. 3.5 Procedimentos para a análise das informações Após colhermos todos os questionários aplicados, dividimo-los, primeiramente por filme analisado. Em seguida, analisamos os protocolos de respostas e os dividimos em dois modelos: modelo 1 (predominância da generosidade) e modelo 2 (predominância do egoísmo). No decorrer das análises, percebemos que havia protocolos onde a generosidade surgia como central e o egoísmo como periférico e vice-versa. Por conta disso, criamos dois sub-modelos para o modelo 1 (sub-modelo 1 generosidade como valor central e sub-modelo 2 generosidade como valor periférico) e outros dois sub- modelos para o modelo 2 (sub-modelo 1 egoísmo como valor central e sub-modelo 2 egoísmo como valor periférico). Além disso, verificamos em cada protocolo os sentimentos que as crianças abstraíram de cada contexto, classificando-os como sentimentos de negação ou de afirmação da atitude.
  • 51. 51 4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS 4.1 Chapeuzinho Vermelho 4.1.1 Versão tradicional X Versão Contemporânea A primeira versão francesa em papel do conto de fadas Chapeuzinho Vermelho data do ano de 1697 (CORSO; CORSO, 2006, p. 51). Nesta narrativa antiga, Chapeuzinho vai levar, a mando da mãe, pão e leite para sua avó. Enquanto caminhava alegremente pela floresta, um lobo apareceu e perguntou-lhe onde ia. Ela, ingenuamente, respondeu que ia à casa da vovó. O Lobo muito esperto, chegou primeiro a casa, matou-a, colocou seu sangue numa garrafa, fatiou sua carne num prato, comeu e bebeu satisfatoriamente, guardou as sobras na despensa, colocou a camisola da vovó e esperou por Chapeuzinho na cama. Quando a menina chegou, o lobo ofereceu-lhe carne e vinho. A Menina comeu o que lhe foi oferecido, e enquanto comia o gato de sua avó a observava aos murmúrios, dizendo: "Meretriz! Então, comes a carne e bebes o sangue de tua avó com gosto. Ata teu destino ao dela!". Em seguida, o lobo pediu que a menina se dispisse e se deitasse com ele na cama. A menina fez um strip-tease e se deitou ao lado do lobo. Ao sentir o toque do pêlo roçar em seu corpo, ela disse: “Como a senhora é peluda, vovó” e o lobo respondeu ”É para te esquentar, minha neta”. E, após o diálogo clássico, ela foi finalmente devorada. Décadas depois, Perreault dá um caráter de fábula moral ao conto buscando ensinar que quem transgride as regras se expõe ao perigo. Em 1857, os irmãos Grimm escreveram a continuação desta história e lhe deram um caráter de contos de fadas. [...] após Chapeuzinho ter sido devorada, um lenhador que estava passando em frente à casa da avó da menina escutou o ronco do lobo que dormia de barriga cheia. Ele entrou e cortou-lhe a barriga, retirando a avó e a neta vivas de seu ventre; após, os três preencheram o espaço vazio do estômago do
  • 52. 52 animal com pedras.O lobo acordou com sede e acabou afundando na água que pretendia beber (CORSO; CORSO, 2006, p. 52). Apesar das modificações, ao longo dos anos, o diálogo ficou preservado, onde a vítima ingênua, mas desconfiada, questiona o lobo e é abocanhada por ele. Diante disso, Diana Lichtenstein Corso e Mário Corso (2006, p. 53) explicam que: Por mais máscaras que se ponha para suavizar a violência do relato, a menina será engolida, e a tensão da narrativa provém da percepção das crianças ouvintes, que antecipam o perigo, ao passo que amenina se deixa enganar. Bettelheim (2007, p. 239-240) completa: Chapeuzinho Vermelho é amada universalmente porque, embora virtuosa, é tentada; e porque sua sorte nos diz que confiar nas boas intenções de todos, que parece ser tão bom, na realidade nos deixa sujeitos a armadilhas. Se não houvesse algo em nós que aprecia o grande lobo mau, ele não teria poder sobre nós. Por conseguinte, é importante entender sua natureza, mas ainda mais importante é saber o que o torna atraente para nós. Por mais atraente que seja a ingenuidade, é perigoso permanecer ingênuo a vida toda. Tanto a versão original, como a de Perreault e dos irmãos Grimm, fica evidente que o valor moral nesta história é a obediência e a esperteza. Em 2005 Cory Edwards escreveu, juntamente com Todd Edward e Tony Leech e dirigiram o filme Hoodwinked (Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho) que foi produzido pela Europa Corporation. Nesta versão, Chapeuzinho vendia doces para a vovó na floresta. De repente, as receitas dos doces começam a ser roubadas por alguém que a polícia não consegue identificar. A trama se desenvolve nesta busca pelo bandido. Todos são suspeitos, a história vai acontecendo com o interrogatório de todos que estavam na cena: o lobo, a vovó, Chapeuzinho e o lenhador. Alguns personagens novos são apresentados, o sapo detetive, os ursos policiais e o coelho (figuram inicialmente doce e singela que acaba como o grande vilão da história).
  • 53. 53 Em se tratando da adaptação do gênero textual ao contexto histórico, essa história reflete características do contexto contemporâneo, como por exemplo, o uso no cenário de bares, teleféricos, policiais, aparelhos de escuta, os esportes radicais praticados pela avó, o celular, dentre outras coisas. O que se percebe nesta versão contemporânea é a inversão de valores, pois o lobo não é mais malvado. Ao contrário, é responsável e não aceita coisas erradas. A avó deixa de ter uma imagem frágil e indefesa, e passa a praticar esportes radicais. Aliás, nesta nova versão, há uma trama policial, há esportes radicais, há o desejo de tornar-se ator, há atividades jornalísticas e, tudo isso, para corresponder as novas necessidade do público, devido as mudanças operadas nos costumes e nos valores sociais e morais. 4.1.2 Apresentação dos Modelos Organizadores de Pensamento relativos ao filme “Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho” Os recortes do filme ‘Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho’ foram apresentados a 22 alunos do 6º ano C do Ensino Fundamental – ciclo II da EMEB Padre Eustáquio II. A seguir, apresentamos, no quadro abaixo, a transcrição das cenas recortadas deste filme, além de outras informações, como ano de produção, diretor, sinopse, pais de origem e os questionamentos feitos aos alunos. Quadro 1 – Deu a louca na Chapeuzinho Vermelho Ano: 2005 Diretor: Cory Edwards País de Origem: Estados Unidos Sinopse: A tranquilidade da vida na floresta é alterada quando um livro de receitas é roubado. Os suspeitos do crime são Chapeuzinho Vermelho, o Lobo Mau, o Lenhador e a Vovó, mas cada um deles conta uma história diferente sobre o ocorrido. Cabe então ao inspetor Nick Pirueta investigar o caso e descobrir a verdade. Transcrição dos Recortes Recorte 1 Sapo: O que esta escondendo, vovó? Vovó: Minha família se preocupa muito, eu não queria que eles descobrissem. Sapo: Descobrissem o quê? Chapeuzinho: É, o quê? Cegonha: Ai chefe,olha isso aqui.