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MEIO AMBIENTE


                           Visão ampliada
                           A correlação entre ética ambiental, percepção e gestão de riscos
                            Antonio Fernando de Araújo Navarro Pereira e Gilson Brito Alves Lima

                             Riscos são todos os insucessos ocorri-     cionais de gestão de riscos, com base em      bilidade de processos, assim como evo-
                           dos em uma determinada fase ou época e       pesquisa, coleta de dados, análise, percep-   luem as técnicas de avaliação de riscos,
                           não de todo esperados. A partir dessa        ção de sentimentos, medos, informação         com novos softwares e conceitos de per-
                           primeira abordagem, iremos estabelecer       anterior e comprometimento de pessoas         cepção de riscos. As técnicas de geren-
                           uma correlação entre os métodos tradi-       e questões baseadas na ética ambiental.       ciamento trabalham com números, evi-
                                                                                                Pretende-se cor-      dências e prognósticos, ao passo que a
                                                                                                         relacio-     percepção trabalha com o sentimento das
BETO SOARES/ESTÚDIO BOOM




                                                                                                         nar a efi-   pessoas.
                                                                                                        cácia das        As técnicas e conceitos relacionados à
                                                                                                      duas formas     gestão de riscos foram introduzidos com
                                                                                                     de avaliação e   o objetivo de avaliar prematuramente os
                                                                                                  consolidá-las       riscos, por meio da aplicação de concei-
                                                                                                por meio da inter-    tos físico-matemáticos. Com a proximida-
                                                                                             pretação de que não      de dos riscos a áreas povoadas e a intera-
                                                                                          basta somente informar      ção entre populações vizinhas e empreen-
                                                                                       as pessoas sobre os riscos,    dimentos, passou-se a valorizar a percep-
                                                                                   inerentes ao meio e à ativida-     ção de riscos pelas pessoas no entorno do
                                                                                de desenvolvida. Deve-se levar em     empreendimento.
                                                                               consideração também, a sensação           Grandes projetos de Engenharia sem-
                                                                              de segurança ou insegurança e as        pre alteraram fundamentalmente o meio
                                                                              questões ético-ambientais envolvi-      ambiente, como no caso de usinas hidre-
                                                                               das.                                   létricas, portos, túneis, pontes, indústri-
                                                                                    As técnicas de gestão de ris-
                                                                                        cos têm evoluído com a in-    Antonio Fernando de Araújo Navarro Pereira - Engenheiro
                                                                                                                      Civil e de Segurança do Trabalho, especialista em Gestão de
                                                                                           corporação de concei-      Riscos, mestre em Saúde e Meio Ambiente e doutor em
                                                                                                                      Engenharia Civil com ênfase em Gestão de Meio Ambiente.
                                                                                             tos adotados em          navarro@vm.uff.br
                                                                                               programas de qua-      Gilson Brito Alves Lima - Professor da Universidade
                                                                                                                      Federal Fluminense
                                                                                               lidade e em confia-    gbal@gmail.com




                           102 REVISTA PROTEÇÃO                                                                                                                      JUNHO / 2011
MEIO AMBIENTE
as químicas e petroquímicas, minerado-        como não muito distante.                      as frente aos riscos, às vezes não palpá-
ras. Algumas vezes, os empreendimentos          O planejamento e a administração não        veis ou percebíveis somente com técnicas
chegam primeiro e as populações chegam        podem mais suprimir a base ambiental e        de avaliação com estatísticas, confiabili-
depois devido a oferta de empregos e fa-      o modus civilizatório, assim como não po-     dade, análise de situações, pesquisas em
cilidades geradas pelo poder púbico, pela     derão mais prescindir de uma ética de fu-     bancos de dados, com o objetivo de definir
proximidade de rodovias, aeroportos e         turo. Não é mais possível, como enfatizou     medidas preventivas ou mitigadoras. Al-
portos. Em outros casos, os empreendi-        o agrônomo e ecologista brasileiro José       gumas vezes, a falta de percepção é fruto
mentos vêm depois, atrás de facilidades       Lutzenberger, vivermos como se fôssemos       da conivência de uma população à mercê
geradas pelos governos e pela disponibi-      à última geração. As éticas anteriores não    das incertezas da vida ou sem muitas op-
lidade de mão-de-obra. Assim como os          contemplaram a dinâmica de mutação e          ções. Ou seja, as pessoas sabiam que aqui-
grandes empreendimentos, o licencia-          a exclusão inerente à sociedade tecnoin-      lo não era bom para elas mas aceitavam o
mento para a construção de casas em en-       dustrial. Tem seus parâmetros inócuos e,      fato pacificamente. Nesses casos, apre-
costas também podem afetar o meio.            muitas vezes, trazem em seu bojo dispo-       sentar elementos convincentes com base
   Muitos empreendimentos são implan-         sições profundas dos riscos da razão ins-     em formulações matemáticas da conse-
tados sem a devida preocupação com as         trumental e egológica hegemônica. São,        quência de determinado risco representa-
pessoas e o meio ambiente e acabam vi-        por vezes, éticas individualizadas, que não   va a sentença de morte do gestor do risco.
rando notícia em jornais por acidentes        conseguem pensar os sujeitos e os obje-
ambientais ou outros problemas gerados        tos não-humanos, pensar em longo pra-           INTUITO
por sua atividade. Uma indústria de papel     zo, ou ainda pensar a globalização econô-       O objetivo principal foi avaliar, dentro
em Minas Gerais teve rompida uma barrei-      mica como ela se impõe hoje.                  de condições normais, a eficácia de alguns
ra de uma lagoa de rejeitos, causando da-                                                   métodos empregados no processo de ges-
nos ecológicos e comprometendo o abas-           PRESERVAÇÃO
                                                 PRESERV                                    tão de riscos, enfocando meio ambiente e
tecimento de água de cidades, incluindo          O que se observa é que as questões re-     sua degradação. Em muitas circunstânci-
o Rio de Janeiro. O inusitado é que os atu-   lacionadas à preservação do meio ambien-      as, mais vale a segurança sentida pelas
ais donos afirmaram que ao adquirir a in-     te ou à adoção de mecanismos seguros          pessoas frente aos riscos, do que seu con-
dústria, as bacias já existiam, como se não   de prevenção de riscos são ou foram pas-      vencimento por outro caminho que não o
fossem responsáveis por seus passivos         sados para trás, em detrimento da pressa      de sua própria percepção. Muitas vezes,
ambientais.                                   em se iniciar as atividades ou de questões    a segurança sentida não é a segurança
                                              financeiras, principalmente de obtenção       adequada ao momento. Muitos profissio-
   HOLÍSTICA                                  de financiamentos de bancos públicos a        nais que atuam em SST já tiveram a opor-
   No livro “Correntes da Ética Ambien-       juros fortemente subsidiados. Muitos pro-     tunidade de presenciar a permanência de
tal”, Marcelo Luiz Pelizzoli comenta que      blemas causados pelas indústrias foram        profissionais gabaritados em situações ou
“Falar em ambiente é falar em pessoas e       encerrados sem qualquer solução, porque       atos perigosos. Quando questionados so-
suas relações, ou seja, falar em ética, o     era melhor ter como vizinha uma indús-        bre sua própria segurança, os emprega-
que por sua vez não é apenas falar em nor-    tria poluente gerando mão-de-obra para        dos respondiam: “Eu tenho mais de 20 a-
mas morais e comportamentos, mas em           a família toda, do que um ambiente limpo      nos de experiência nessa área” ou então
formas de conhecimento (que são sempre        com pessoas desempregadas, ou tendo           “É só um estantinho e já vai estar tudo
relações), visões de mundo, daí a cosmo-      que se deslocar dezenas de quilômetros        pronto”. A escolha dos riscos aos quais se
logia, a ontologia e a antropologia envol-    por uma oportunidade de emprego. De           deve dar atenção não é simplesmente o
vidas, a saber, visões de sentido do mundo    outra feita, era muito melhor ter um gran-    reflexo de preocupações com a proteção
ou universo, do ser, da essência e do que     de empreendimento próximo à residên-          da saúde, da segurança e do ambiente.
é humano e ético”. O mesmo autor, ao a-       cia, proporcionando mais segurança e in-      Essa escolha reflete também outros as-
bordar as perspectivas gerais da ótica ho-    fraestrutura urbana, do que tê-la por lon-    pectos, como as crenças da sociedade
lística, afirma que o ponto de partida co-    ge. Diz-se na gíria: ruim com ela, pior sem   acerca de valores, instituições sociais, na-
mum é a crítica ao modelo civilizatório que   ela.                                          tureza, justiça e moral, sendo estes
se baseia na noção de progresso material         Por exemplo, em uma obra tradicional       determinantes na superestimação ou
e desenvolvimento econômico nos moldes        de construção de edifícios é nítido que há    subestimação de riscos.
da modernidade científica e industrial,       desperdícios. Esta percepção vem dos ca-        Um ponto que cabe ser destacado é a
que desconsidera as consequências ao ser      minhões que saem das obras carregados         importância que os sujeitos dão aos ris-
humano e à natureza, em termos de dese-       de entulhos (resíduos) e das caçambas es-     cos e seus reflexos quanto às questões
quilíbrio e perda de interligação com as-     tacionadas nas calçadas. Chegou-se a es-      ambientais. Quase sempre as prioridades
pectos fundamentais da vida. Novamen-         timar que os níveis de perdas ultrapassa-     das pessoas não obedecem à mesma cro-
te, entram em choque as ações dos seres       va a 5% do valor do empreendimento. Es-       nologia das prioridades das empresas,
humanos em sua busca incessante pela          se percentual não incluía os custos para a    principalmente se aquelas estiverem di-
modernidade e os gravames abandonados         remediação ambiental, prejudicada pelo        retamente envolvidas com os resultados
nos colos dos indivíduos que co-habitam       lançamento de produtos nocivos ao am-         das implantações dos empreendimen-
os mesmos espaços. Mais uma vez, cabe         biente.                                       tos. Ou seja, se as pessoas percebem que
a reflexão sobre o futuro. Projetos de hoje      A primeira questão que sobressai é a       podem vir a se beneficiar com a implan-
têm que levar em consideração o amanhã,       da importância da percepção das pesso-        tação dos empreendimentos, costumam

104 REVISTA PROTEÇÃO                                                                                                           JUNHO / 2011
relegar a um plano inferior suas preocu-       martelo. Isoladamente essa ferramenta         Outro aspecto interessante a ser obser-
pações com outros aspectos que não o de        não apresenta qualquer tipo de risco e        vado é estrutura de família. Um rapaz sol-
sua contratação ou de seus familiares.         nem é motivo de preocupações, como por        teiro que vive sozinho poderá ter uma re-
Assim, não adianta querer envolvê-los em       exemplo, o martelo em uma caixa de fer-       ação frente os riscos bem diferente do que
questões mais técnicas sobre os possíveis      ramentas ou sobre uma bancada de tra-         se fosse casado, e mais diferente ainda se
problemas, já que sua preocupação na-          balho. Todavia, na mão de uma criança         tiver filhos pequenos. O mesmo ocorre
quele momento é apenas a empregabili-          pode vir a representar um risco. Uma mãe,     com famílias com filhos pequenos. A pre-
dade.                                          ao ver seu filho com menos de dois anos       ocupação das mães principalmente, tor-
  O enfoque das técnicas de avaliação          andar pela casa com um martelo na mão         na-se maior quando esses são pequenos.
sempre foi avaliar projetos e processos        tem a reação imediata de tirar o objeto
com vistas à identificação dos riscos, para    do filho por perceber que pode ocorrer           METODOLOGIA
seu posterior tratamento. Recentemente,        algo de ruim. O mesmo pensamento pode            A gestão de riscos (Risk Management)
foi incluída nesse rol de técnicas a avalia-   não ocorrer a um pai, que pode até que-       pode ser entendida como um conjunto de
ção do consumidor quanto a sua percep-         rer entregar um prego para que o filho        técnicas de abordagem, com vistas à aná-
ção de risco. Um aspecto importante é a-       possa pregar sobre uma tábua. Se forem        lise qualitativa e quantitativa dos eventos,
valiar o que pode ocorrer de errado em         tios ou avós, podem até achar graça da        a fim de identificar, avaliar e tratar os ris-
um projeto, sistema ou equipamento, que        criança andando pela casa com martelo,        cos emergenciais ou latentes, capazes de
venha a causar perdas. Outro aspecto é a       em vez de andar com um brinquedo.             provocar perdas financeiras, pessoais, pa-
avaliação sob a ótica dos consumidores ou         A percepção dos riscos pode variar de      trimoniais e de responsabilidades civis. As
dos usuários. Especificamente na avalia-       acordo com momento econômico, nível de        técnicas de gestão de riscos, quando bem
ção de impactos ambientais, espera-se          cultura e de informação, interesses envol-    empregadas, transformam-se em elemen-
que os moradores da circunvizinhança do        vidos, aspectos familiares, entre outros      to de antecipação ou previsão de um cená-
empreendimento também possam opinar            fatores. Se há necessidade de construir       rio de perdas futuras.
sobre as questões que dizem respeito à         um depósito de lixo em determinada lo-           Por meio da gestão de riscos é possível
contaminação ambiental, antes mesmo de         calidade, e se houver tratamento adequa-      estudar procedimentos que promovem a
virem a ser afetados por essa.                 do, esse projeto poderá ser fonte de em-      redução do número de ocorrências ou da
                                               prego para desempregados, ou uma fon-         extensão das perdas, fatores importantís-
   VARIAÇÕES                                   te de riscos para famílias estruturadas fi-   simos para a mensuração das taxas de ris-
   Um exemplo clássico da percepção de         nanceiramente que não dependam da             cos. O processo ou conjunto de tecnolo-
riscos, digamos assim, intuitivo, é o de um    existência desse para sua subsistência.       gias empregadas possibilita o surgimento




JUNHO / 2011                                                                                                          REVISTA PROTEÇÃO 105
MEIO AMBIENTE
                                                                                           é somente aquilo que está para aconte-
                                                                                           cer ou aquilo que se tem receio de que
                                                                                           aconteça em determinado momento. E-
                                                                                           xemplificando:
                                                                                              - Hoje teremos o risco de um temporal,
                                                                                           levem os seus casacos, não cheguem tar-
                                                                                           de da noite;
                                                                                              - Há risco de vocês serem assaltados,
                                                                                           portanto não cheguem tarde, nem andem
                                                                                           por ruas escuras;
                                                                                              - Se vocês não estudarem, correrão o
                                                                                           risco de não tirarem boas notas;
                                                                                              - Não empreste dinheiro para seu ami-
                                                                                           go, porque ele está desempregado e há
                                                                                           risco de você perder o amigo ao cobrá-lo;
                                                                                              - Não tente consertar o chuveiro para
                                                                                           não ter o risco de levar um choque.

                                                                                              Para cada exemplo acima citado, a pa-
                                                                                           lavra “risco” tem significado diferente.
                                                                                           Não chegar junto com o temporal apre-
                                                                                           senta o inconveniente, e não o risco da
                                                                                           pessoa se molhar. No caso do assalto, efe-
                                                                                           tivamente há um risco de perda monetá-
                                                                                           ria ou de danos à vida ou à saúde. Nas
                                                                                           provas, a pessoa pode ser reprovada. O
                                                                                           único risco, que não é aquele objeto da
                                                                                           análise é o da perda financeira de ter que
                                                                                           repetir o ano letivo ou ter o dissabor do
                                                                                           constrangimento pessoal. Finalmente, no
                                                                                           caso do chuveiro, o risco envolve a vida
                                                                                           da própria pessoa. Se essa estiver sobre
                                                                                           um piso molhado poderá sofrer um cho-
                                                                                           que mortal.
                                                                                              A palavra “risco” dá margem a uma sé-
                                                                                           rie de interpretações. Contudo, está sem-
                                                                                           pre associada, em qualquer caso, a um
                                                                                           insucesso, um perigo, uma perda ou um
de meios de atenuação de perdas que a-        bém deve ser ressaltado que o uso de suas    dano. Dentro do enfoque escolhido, de
meaçam o patrimônio da empresa, redu-         técnicas se dá mais na fase do estabeleci-   correlacionar os processos de avaliação
zindo sua severidade ou gravidade. De         mento das premissas básicas de projeto,      metodológica com a avaliação empírica,
certa forma, ao se controlar perdas e, por    do que na implantação. Trata-se de uma       torna-se importante apresentar algumas
conseguinte, reduzir parte dos custos va-     fase com pouca reverberação de opiniões,     considerações sobre o que vem a ser um
riáveis, estar-se-á aumentando o nível de     ou seja, a portas fechadas, quando se ava-   risco, como ele se materializa e como pode
produtividade. Todavia, sob o enfoque do      liam prós e contras.                         ser avaliado, através de processos meto-
consumidor ou da população sob risco, o                                                    dológicos.
conceito está voltado para a sensação de        CONCEITOS                                     Riscos são todos os fatos, situações,
segurança. É importante saber o quão            A gerência de riscos surgiu como téc-      bens ou atividades sujeitas a perdas ou
seguras se encontram a empresa e a popu-      nica em 1963 nos Estados Unidos, com a       danos. Para fins de estudos podem ser
lação. Se a população não se achar segu-      publicação do livro “Risk Management in      classificados em voluntários, acidentais e
ra, o empreendimento deve preocupar-se        the Business Enterprise” de Robert Mehr      aleatórios. Confira o Quadro 1, Classifi-
em empregar técnicas específicas que a        e Bob Hedges. Seguramente, uma das fon-      cação dos riscos.
convençam do contrário.                       tes de consulta dos autores foi um traba-
   Nessa apresentação, vê-se que a utiliza-   lho de Henry Fayol, divulgado na França        SITUAÇÕES
ção das técnicas de gestão de riscos está     em 1916. A origem da gerência de riscos         Para ser capaz de gerar danos, um ris-
mais voltada para a empresa em si e seus      é a mesma da administração de empre-         co materializa-se em função de um infin-
riscos. Quando se volta o foco da atenção     sas, que por sua vez conduziu aos proces-    dável número de situações. No projeto de
para terceiros, vislumbra-se a questão da     sos de qualidade e produtividade.            se lançar uma sonda espacial para fora do
responsabilidade civil daí advinda. Tam-        O conceito de risco é amplo. Risco não     sistema solar a fim de estudar corpos ce-

106 REVISTA PROTEÇÃO                                                                                                        JUNHO / 2011
lestes, para que o empreendimento tenha      quências dos eventos.
êxito, deve-se aguardar o alinhamento dos       A função da gestão de riscos é reduzir
planetas, o que só ocorre a intervalos de    perdas e minimizar os seus efeitos. Isso
tempo definidos. Assim, é possível apro-     quer dizer que se assume a existência de
veitar ao máximo as forças de atração dos    perdas em todos os processos industriais,
astros para aumento da velocidade da es-     como um fato perfeitamente natural. En-
paçonave, e mesmo assim, não se tem to-      tretanto, por meio de técnicas como ins-
tal certeza do sucesso da missão. É o que    peções e análises, procura-se evitar que
se chama de imponderável.                    perdas venham a ocorrer com frequência
  A gestão de riscos avalia o imponde-       ou reduzir seus efeitos, limitando-as a va-
rável. Chega-se a determinar, por inter-     lores aceitáveis ou dentro do perfil esti-
médio de técnicas de avaliação de riscos,    pulado pela empresa em seus orçamen-
qual a probabilidade de sucesso e fracas-    tos anuais.
so. Para modelos de análise mais simples,       Não existe um método único de gestão
consegue-se descobrir os prováveis fato-     de riscos ou uma metodologia padrão.
res causadores do insucesso. Assim, ela-     Costuma-se confrontar os procedimentos
boram-se previsões com elevado percen-       em vigor com procedimentos-padrão para
tual de acertos. Algumas técnicas de Estu-   aquele tipo de etapa, analisando as possí-
dos de Confiabilidade de Processos apre-     veis alterações existentes, através de um
sentam resultados bem próximos de 100%       amplo conhecimento das várias etapas da
de acerto.                                   atividade analisada. A gestão de riscos é
  O risco ou evento, contra o qual se está   um processo contínuo de busca de defei-
elaborando um plano de prevenção ou eli-     tos ou quase-defeitos, com vistas à pre-
minação de perdas, deve atender a algu-      venção. Esses defeitos são chamados ris-
mas particularidades para ser enquadra-      cos. Risco é uma chance de perda e prova-
do como tal. Deverá ser futuro, incerto,     velmente, o mais importante degrau no
possível, independente da vontade das        processo de identificação e gerenciamen-
partes, conduzir a perdas mensuráveis.       to das perdas.
Um risco presente não é um risco, e sim         Com as informações obtidas por inter-
um fato consumado. Um risco certo tam-       médio da aplicação das várias técnicas
bém não é um risco, pois já se sabe quan-    adotadas na gestão de riscos e o emprego
do e de que forma irá ocorrer. Um risco      de metodologias específicas pode-se tam-
impossível também não é um risco, já que     bém quantificar riscos. A partir do mo-
não gerará qualquer tipo de perda ou dano.   mento que se qualifica e quantifica um ris-
  Por exemplo, não se pode falar em in-      co tem-se a sua real magnitude ou sua ex-
cêndio em uma caixa d'água, porque sim-      pressão matemática.
plesmente, principalmente quando essa           A qualificação é a identificação do tipo
está cheia de líquido, não apresenta con-    de risco. Trata-se de um risco de incên-
dições para um incêndio. Todavia, pode-      dio, de explosão, de danos elétricos, ou
se falar em um dano elétrico no motor de     de contaminação ambiental, etc. A quanti-
acionamento da bomba que esteja próxi-       ficação é a determinação do valor da per-
ma da caixa d'água. Um risco que depen-      da, expressa em percentual do valor dos
da de um dos sujeitos para ser iniciado      bens ou em valores absolutos ou do tama-
também não é um risco. Lógico que há         nho do prejuízo futuro. O risco, se ocorrer,
exceções, como no caso de uma pessoa         poderá gerar uma perda que irá afetar
sem total domínio das faculdades mentais.    48% do patrimônio da indústria. A perda
Finalmente, um risco que não gere nenhu-     potencial é de cerca de 500 mil reais. No
ma perda e nenhum dano também não            tocante a questões ambientais, há que se
pode ser entendido como risco.               considerar os danos diretos, consequen-
                                             tes e indiretos. Os danos diretos podem
  ETAPAS
  ETAPAPAS                                   ser avaliados com certa precisão, e para
  Procura-se entender como e por que         os demais, é preciso saber as caracterís-
esse risco se manifesta, sua periodicida-    ticas do empreendimento, da região e da
de, frequência e extensão das perdas, para   população atingida.
reduzir a severidade dos prejuízos. Bus-
cam-se ainda meios de reduzir a extensão       TÉCNICAS
das perdas a outros ambientes, locais ou       As técnicas empregadas nos estudos de
equipamentos, com o emprego de meca-         gestão de riscos podem variar de acordo
nismos de proteção, confinando as conse-     com os objetivos inicialmente propostos

JUNHO / 2011                                                                                REVISTA PROTEÇÃO 107
MEIO AMBIENTE
para a análise das situações como:           sinal de pedestres fechado? Se a caldeira    O incidente é importante como dado es-
                                             vier a explodir? Se a pressão da linha de    tatístico porque comprova a existência de
  a) Check list: é um método de caráter      vapor subir muito? Se a informação rece-     falhas operacionais ou de controle, possi-
geral, com abordagens qualitativas, atra-    bida da direção da empresa, para a deso-     bilitando a sua imediata reparação.
vés do diagnóstico de situações de riscos    cupação da área, não for confiável?
a partir de um cenário, com o emprego                                                        d) Análise Preliminar de Riscos: é uma
de perguntas previamente estabelecidas.        c) Técnica de Incidentes Críticos: é uma   técnica de inspeção desenvolvida com o
Seu sucesso depende das análises poste-      técnica operacional qualitativa, que bus-    objetivo de obter a análise superficial dos
riores, bem como dos resultados preten-      ca obter informações relevantes acerca de    possíveis riscos, de suas causas, das con-
didos. Os relatórios, de um modo geral,      incidentes ocorridos durante determina-      sequências advindas com a materialização
contêm um grupo de perguntas básicas,        da fase ou período relatados por testemu-    desses, bem como das medidas correti-
que serão formuladas a operadores de         nhas que os vivenciaram. Os incidentes       vas ou preditivas adotadas. Em resumo, a
equipamentos, supervisores, vizinhos do      são os quase acidentes ou os não gerado-     APR visa à identificação de elementos pe-
empreendimento, terceiros não envolvi-       res de perdas. A metodologia emprega,        rigosos do sistema, das situações de ris-
dos com o empreendimento, as quais per-      principalmente, entrevistas com operado-     co, das falhas potenciais, etc., determinan-
mitirão que sejam traçados perfis aproxi-    res ou mantenedores dos sistemas sujei-      do a gravidade de suas efetivações, nor-
mados do risco.                              tos a estudo. Alternativamente, poderá se    malmente obtidas por meio de simula-
                                             lançar mão de trabalhos de bancos de         ções. Procura enquadrar os riscos segun-
  b) What if: é um método qualitativo, ou    dados, onde todos os acidentes ou inci-      do categorias, definidas de acordo com os
seja, que permite chegar ao tipo e ao ta-    dentes foram relacionados por tipo de        efeitos destrutivos que podem vir a ser
manho de risco, muito importante no em-      ocorrência. Entre as inúmeras formas de      observados, tabelados como a seguir.
prego em discussões de caráter geral acer-   classificação dos incidentes podemos ter
ca de um sistema, e para a abordagem das     o seguinte critério. Na Classe I, estão a-         Desprezível ou Negligenciável
consequências maiores de um acidente.        queles que provocam alterações no pla-       (Classe I): gera efeitos imperceptíveis,
Deve-se sempre separar, na aplicação da      nejamento ou na produção; na Classe II,      não conduzindo a degradações físicas ou
técnica, as causas das consequências. As     os que provocam atrasos no planejamen-       ambientais que não sejam facilmente re-
causas são fatos geradores, e as conse-      to ou na produção; na Classe III, os que     compostas. Normalmente essa categoria
quências, resultados. Existem perguntas      provocam paralisações ou o insucesso do      de riscos é perfeitamente absorvida pela
clássicas que podem ser feitas. Se de re-    planejamento; e na Classe IV, aqueles que    empresa, juntamente com os custos de
pente uma pessoa atravessar a rua com o      afetam a integridade física das pessoas.     manutenção ou revisão;




108 REVISTA PROTEÇÃO                                                                                                         JUNHO / 2011
MEIO AMBIENTE
     Marginal ou Limítrofe (Classe II):        de estudar o comportamento de mísseis         informações que passa a ter. Por isso o
gera ocorrências moderadas, controláveis,      balísticos intercontinentais. Esses mísseis   processo de avaliação é mais demorado e
necessitando, porém, de ações saneado-         representavam um alto custo unitário, de      subjetivo. Quase sempre são empregadas
ras em médio prazo. São riscos que po-         milhões de dólares e um elevado risco po-     entrevistas pessoais e preenchimento de
dem surpreender em termos de perdas.           tencial, não só durante a armazenagem e       formulários específicos. A elaboração des-
Usualmente, as perdas estão associadas         transporte como também no lançamen-           tes formulários deve ser feita de maneira
às consequências dos eventos;                  to. Os graus de acerto tinham de ser da       tal que não conduza o raciocínio das pes-
                                               ordem de 100%. As probabilidades de per-      soas entrevistadas para um determinado
      Crítica (Classe III): afeta substan-     das materiais eram enormes. Assim sen-        viés. O formulário deve ser o mais isento
cialmente o meio ambiente, o patrimônio        do, partindo-se de um raciocínio lógico da    possível.
ou as pessoas, necessitando de ações cor-      ocorrência de um evento indesejável, ou          Pela dificuldade em se obter uma quan-
retivas imediatas. Esse tipo de perda é tra-   evento de topo, desenvolveu-se uma me-        tidade significativa de respostas, que ex-
tado através do repasse do risco a uma         todologia interativa, a fim de descobrir      pressem a opinião da maioria das pesso-
instituição financeira ou seguradora;          quais as falhas que, atuando em conjunto      as envolvidas, costuma-se relegar a impor-
                                               ou isoladamente, poderiam gerar o even-       tância da obtenção das informações dos
      Catastrófica (Classe IV): é normal-      to não desejado.                              envolvidos, priorizando apenas a utiliza-
mente geradora de efeitos irreversíveis,         É importante salientar que um evento,       ção de processos e técnicas como comen-
afetando pessoas, sistemas, patrimônios        quando materializado, nunca traz consi-       tados anteriormente. É mister ressaltar-
ou ambientes. Quase todos os gerentes          go somente um tipo de perda. Associado        se que não se deve prescindir da obten-
de risco recomendam, como técnica de           a essa, poderão existir outras, como per-     ção de informações dos envolvidos, prin-
tratamento de riscos o afastamento, ou         da material ou de insumos para a produ-       cipalmente se estamos tratando da análi-
seja, a empresa deve renunciar a essa ati-     ção, perda de produção, financeira, pes-      se de riscos de empreendimentos que se-
vidade.                                        soal, de imagem, de mercado, assim como       jam potencialmente danosos ao meio am-
                                               responsabilidades civis e danos ambien-       biente.
   e) Análise de Modos de Falha e Efeitos: é   tais.
um método de análise detalhada, que gera                                                       PERCEPÇÃO
resultados qualitativos e quantitativos, ou       MENSURAÇÃO                                   Apesar de podermos conhecer, pelo
seja, identifica o risco ao mesmo tempo           O contraponto da aplicação das técni-      menos em princípio, cada aspecto acerca
em que o mensura. A AMFE permite a             cas, anteriormente informadas, é o da per-    da percepção de riscos, devemos consi-
análise das falhas dos equipamentos, com-      cepção da perda ou do risco. Os indivídu-     derar que esta percepção dependerá das
ponentes e sistemas com estimativas de         os selecionam alguns riscos pela impossi-     informações que as pessoas têm recebi-
frequência de ocorrências (taxa de falhas)     bilidade de estarem conscientes de todos.     do, bem como em que tipos têm escolhi-
e a determinação dos efeitos ou conse-         Entre decidir dentre os milhares que os       do acreditar, dos valores e experiências
quências dessas mesmas falhas. Também          cercam, a opção é a de pensar naqueles        sociais aos quais têm sido expostas e da
conhecida como FMEA (Failure Modes             que deveriam ser relevados e ignorados.       sua visão de mundo. Por sua vez, esses
and Effects Analysis), consiste em estu-       Os indivíduos podem não se preocupar,         fatores dependeriam da dinâmica dos in-
dar o sistema por partes, em conjuntos         em um primeiro momento, com o lança-          teresses dos grupos, da legitimidade das
ou subconjuntos, sob a forma de diagra-        mento de resíduos poluentes em um rio,        instituições, das características do proces-
mas de bloco, analisando não só as ocor-       mas sim na fumaça que sai pela chaminé        so político e do momento histórico que
rências isoladamente como também a in-         da fábrica, porque ainda não estão preo-      vivem.
terpelação existente entre essas e os de-      cupados com a contaminação das águas e          Para Wynne, a tecnologia deveria ser
mais subconjuntos. Dessa análise particu-      porque o rio não passa junto a sua cida-      conceitualizada primariamente como uma
larizada se obtém a revisão dos modos de       de. Quase sempre nos preocupamos com          organização social, e não como uma enti-
falha de cada componente e os efeitos que      aquilo que vemos ou sentimos.                 dade física. Esse conceito esclareceria que
tais falhas terão sobre outros componen-          Para a mensuração dos riscos, pelos        o risco, em si mesmo, pode ser frequen-
tes que, ao falhar gerarão danos a todo o      processos matemáticos, como visto ante-       temente uma categoria de pensamento,
sistema. Como resultado final tem-se o         riormente, basta que conheçamos as me-        inserida artificialmente na mente das pes-
cálculo de probabilidade das falhas do sis-    todologias e tenhamos experiência em          soas, direcionando de algum modo à ques-
tema, gerado a partir das falhas de seus       aplicá-las, empregando para tal conheci-      tão de como deveria ver os sistemas de
componentes. Logicamente, através des-         mento de campo e uso de banco de dados        processos decisórios sobre o desenvolvi-
ses estudos são determinadas as alterna-       confiáveis. Para a obtenção de informa-       mento e controle da tecnologia. Suprimir
tivas de redução da probabilidade de fa-       ções sobre a percepção de riscos não há       a dimensão da experiência social envolvi-
lhas.                                          banco de dados e nem metodologias espe-       da em uma dada tecnologia ou risco seria
                                               cíficas, visto que o sentimento quanto a      encobrir a legitimidade de valores sociais
  f) Análise de Árvore de Falha: é o mais      riscos é individualizado e fruto de um de-    e ansiedades que surgem desta experiên-
conhecido dos métodos de confiabilidade        terminado momento. Assim, uma pessoa          cia. A supressão da experiência social pela
de sistemas. A AAF ou FTA (Failure Tree        pode apresentar um sentimento em um           gestão de riscos ou regulamentação colo-
Analysis) foi desenvolvida nos Estados         momento e outro em momento seguinte.          caria em perigo a própria credibilidade ao
Unidos na década de 60, com o objetivo         Pode também vir a ser influenciada por        dizer para os indivíduos expostos que suas

110 REVISTA PROTEÇÃO                                                                                                            JUNHO / 2011
experiências sociais e busca de significa-   ca, com as avaliações estatísticas, com as    tos ambientais significativos associados
do não contariam.                            verificações de projeto e, com a aplica-      às atividades das unidades operacionais
  A percepção de riscos não deve ser to-     ção de tecnologias que qualifiquem e          considere, quando pertinente, outras
mada como isolada ou dissociada das          quantifiquem os riscos. Sabe-se que mui-      questões locais relativas ao meio ambien-
questões concretas relacionadas às situ-     tos riscos somente são percebidos depois      te e à comunidade. Há outras citações re-
ações e eventos de riscos, já que interage   que se manifestaram. Ou seja, a percep-       lativas à participação da comunidade ex-
com inúmeros aspectos sociais. De modo       ção das pessoas não foi suficiente para       pressando a preocupação dos legislado-
geral, os estudos demonstram que, se que-    afastá-las dos riscos.                        res com o atendimento, também, às ne-
remos estabelecer estratégias de gestão         No subitem 4.3.3 - Objetivos e Metas da    cessidades das comunidades locais. A
de riscos mais eficazes, devemos consi-      NBR ISO 14.001 - Sistemas de gestão am-       norma não faz referências explícitas à per-
derar os aspectos psicológicos, sociais,     biental consta: “Ao estabelecer e revisar     cepção da comunidade frente a riscos,
culturais e os valores morais que confor-    seus objetivos, a organização deve consi-     mas menciona os interesses das comuni-
mam as percepções do público. A racio-       derar os requisitos legais e outros requi-    dades afetadas.
nalidade científica por si não irá substi-   sitos, seus aspectos ambientais significa-
tuir, nem tampouco ser uma resposta fi-      tivos, suas opções tecnológicas, seus re-       PERSPECTIVA
                                                                                             PERSPECTIVA
nal às preocupações do público, de modo      quisitos financeiros, operacionais e co-        Se consideradas as experiências e vi-
que, sozinha, não deverá guiar as políti-    merciais, bem como a visão das partes in-     vências de cada um, especialmente da-
cas públicas e o gerenciamento de tecno-     teressadas”. Dentro desse enfoque, não        queles que serão envolvidos direta ou in-
logias perigosas.                            só os problemas da organização estão em       diretamente pelos projetos, opinião que
                                             cheque, como também a visão das partes        também concordamos, haja vista que,
  ABORDAGENS                                 interessadas. A vizinhança é parte interes-   para se ter sucesso na análise dos resul-
  Há espaço e necessidade para a aplica-     sada. As organizações não governamen-         tados das avaliações técnicas deve-se apli-
ção de abordagens distintas. A empresa       tais também podem ser enquadradas             car também parte do conhecimento ad-
ou o empreendimento não pode só se va-       como partes interessadas, na medida em        quirido pelo avaliador, mesmo que apli-
ler da percepção das pessoas a respeito      que representem legitimamente os inte-        que inúmeras técnicas. Assim, para a opi-
dos riscos que poderá causar. Os organis-    resses das comunidades afetadas.              nião pública envolvida em um projeto am-
mos de licenciamento, principalmente os         No anexo “A” da mesma norma citada         biental valem mais seus conceitos de ris-
ambientais, não podem somente se base-       acima, no que diz respeito a planejamen-      co e sua percepção desses mesmos riscos
ar no que as pessoas dizem ou pensam.        to (subitem A.3) é recomendado que o          do que a leitura de extensos relatórios
Devem se preocupar com a análise técni-      processo para a identificação dos aspec-      tentando lhes provar o contrário. Hoje em




JUNHO / 2011                                                                                                      REVISTA PROTEÇÃO 111
MEIO AMBIENTE
dia, quando se realizam audiências públi-      ção. Sabe-se também que essas tecnolo-         to das pessoas com o empreendimento.
cas para a avaliação de um risco ambien-       gias apuram informações e dados que pre-         A percepção não deve ser algo cuja res-
tal, reuni-se a população local, apresen-      cisam ser interpretados e que essa inter-      ponsabilidade repouse, única e exclusiva-
tam-se os resultados e se discute a ques-      pretação é feita por profissionais com co-     mente, sobre os ombros do trabalhador,
tão.                                           nhecimento específico. Influi bastante, no     mas sim sobre todos os envolvidos. A per-
   Os estudos sobre percepção demons-          resultado dessas análises o conhecimen-        cepção deve fazer parte da elaboração do
tram que as questões relacionadas aos ris-     to específico dos profissionais. Algumas       projeto, da escolha dos materiais, do pla-
cos não podem ser restringidas somente         vezes esse conhecimento não é tão pro-         nejamento das atividades e da execução
aos processos físicos, químicos e biológi-     fundo ou não é profundo o suficiente para      dos serviços.
cos. O mundo em que se situam - seres          avaliar toda a gama de riscos. Nessas cir-       Não se deve deixar de considerar o em-
humanos em suas relações sociais - é           cunstâncias, a percepção do risco é im-        prego das técnicas de gestão de riscos,
constituído por outros aspectos, como os       portante e deve ser relevante na avalia-       assim como não se deve deixar de ouvir a
estilos de vida e as relações interpessoais,   ção final da análise. Também se deve re-       opinião dos sujeitos que irão ser prejudi-
as interações simbólicas e os movimen-         forçar a tese de que os laços de afetividade   cados com um acidente ambiental que en-
tos sociais, as questões de poder e de dis-    entre a comunidade vizinha e o empreen-        volva o empreendimento, como também
tribuição de riscos, controle social e ins-    dimento devem ser sempre fortes. Para          deixar de levar em consideração os aspec-
tituições sociais. Estes aspectos confor-      reforçá-los é importante ouvir a opinião       tos éticos de todo o processo. Todos os
matarão não somente o modo como os in-         de seus representantes.                        processos encontram-se interrelaciona-
divíduos e especialistas percebem os ris-        Finalmente, conclui-se que a percepção       dos. A sociedade como um todo não pode
cos, mas também o próprio modo como            de riscos deve ser uma ferramenta a mais,      deixar de lado a premissa básica de que a
este risco ocorre.                             além das técnicas, utilizadas na avaliação     semente de hoje será a arvore de amanhã.
   Os riscos existem dentro de toda ativi-     dos riscos, em programas de Gestão de          O empreendimento de hoje poderá ser o
dade humana. Uns ocorrem no início das         Riscos, face à sua importância dentro de       algoz da população amanhã. Deve-se ter
atividades, outros ao longo dessa. Há a-       um contexto social. Também se conclui          o máximo cuidado nas avaliações técni-
queles que têm um tempo de recorrência         que a percepção não deve ser um elemen-        cas bem como no respeito à opinião das
muito longo, ou alongado com a adoção          to único ou isolado na avaliação dos ris-      pessoas envolvidas.
de medidas preventivas. Contudo, exis-         cos, porque há possibilidade de não ser
tem. Considera-se também que as tecno-         completamente verdadeira, face ao fato
logias empregadas para a detecção des-         de que contribui para o seu insucesso a
ses está em contínuo processo de evolu-        falta de informação ou o comprometimen-




112 REVISTA PROTEÇÃO                                                                                                           JUNHO / 2011

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Avaliando a percepção de riscos ambientais e a ética na gestão de riscos

  • 1. MEIO AMBIENTE Visão ampliada A correlação entre ética ambiental, percepção e gestão de riscos Antonio Fernando de Araújo Navarro Pereira e Gilson Brito Alves Lima Riscos são todos os insucessos ocorri- cionais de gestão de riscos, com base em bilidade de processos, assim como evo- dos em uma determinada fase ou época e pesquisa, coleta de dados, análise, percep- luem as técnicas de avaliação de riscos, não de todo esperados. A partir dessa ção de sentimentos, medos, informação com novos softwares e conceitos de per- primeira abordagem, iremos estabelecer anterior e comprometimento de pessoas cepção de riscos. As técnicas de geren- uma correlação entre os métodos tradi- e questões baseadas na ética ambiental. ciamento trabalham com números, evi- Pretende-se cor- dências e prognósticos, ao passo que a relacio- percepção trabalha com o sentimento das BETO SOARES/ESTÚDIO BOOM nar a efi- pessoas. cácia das As técnicas e conceitos relacionados à duas formas gestão de riscos foram introduzidos com de avaliação e o objetivo de avaliar prematuramente os consolidá-las riscos, por meio da aplicação de concei- por meio da inter- tos físico-matemáticos. Com a proximida- pretação de que não de dos riscos a áreas povoadas e a intera- basta somente informar ção entre populações vizinhas e empreen- as pessoas sobre os riscos, dimentos, passou-se a valorizar a percep- inerentes ao meio e à ativida- ção de riscos pelas pessoas no entorno do de desenvolvida. Deve-se levar em empreendimento. consideração também, a sensação Grandes projetos de Engenharia sem- de segurança ou insegurança e as pre alteraram fundamentalmente o meio questões ético-ambientais envolvi- ambiente, como no caso de usinas hidre- das. létricas, portos, túneis, pontes, indústri- As técnicas de gestão de ris- cos têm evoluído com a in- Antonio Fernando de Araújo Navarro Pereira - Engenheiro Civil e de Segurança do Trabalho, especialista em Gestão de corporação de concei- Riscos, mestre em Saúde e Meio Ambiente e doutor em Engenharia Civil com ênfase em Gestão de Meio Ambiente. tos adotados em navarro@vm.uff.br programas de qua- Gilson Brito Alves Lima - Professor da Universidade Federal Fluminense lidade e em confia- gbal@gmail.com 102 REVISTA PROTEÇÃO JUNHO / 2011
  • 2. MEIO AMBIENTE as químicas e petroquímicas, minerado- como não muito distante. as frente aos riscos, às vezes não palpá- ras. Algumas vezes, os empreendimentos O planejamento e a administração não veis ou percebíveis somente com técnicas chegam primeiro e as populações chegam podem mais suprimir a base ambiental e de avaliação com estatísticas, confiabili- depois devido a oferta de empregos e fa- o modus civilizatório, assim como não po- dade, análise de situações, pesquisas em cilidades geradas pelo poder púbico, pela derão mais prescindir de uma ética de fu- bancos de dados, com o objetivo de definir proximidade de rodovias, aeroportos e turo. Não é mais possível, como enfatizou medidas preventivas ou mitigadoras. Al- portos. Em outros casos, os empreendi- o agrônomo e ecologista brasileiro José gumas vezes, a falta de percepção é fruto mentos vêm depois, atrás de facilidades Lutzenberger, vivermos como se fôssemos da conivência de uma população à mercê geradas pelos governos e pela disponibi- à última geração. As éticas anteriores não das incertezas da vida ou sem muitas op- lidade de mão-de-obra. Assim como os contemplaram a dinâmica de mutação e ções. Ou seja, as pessoas sabiam que aqui- grandes empreendimentos, o licencia- a exclusão inerente à sociedade tecnoin- lo não era bom para elas mas aceitavam o mento para a construção de casas em en- dustrial. Tem seus parâmetros inócuos e, fato pacificamente. Nesses casos, apre- costas também podem afetar o meio. muitas vezes, trazem em seu bojo dispo- sentar elementos convincentes com base Muitos empreendimentos são implan- sições profundas dos riscos da razão ins- em formulações matemáticas da conse- tados sem a devida preocupação com as trumental e egológica hegemônica. São, quência de determinado risco representa- pessoas e o meio ambiente e acabam vi- por vezes, éticas individualizadas, que não va a sentença de morte do gestor do risco. rando notícia em jornais por acidentes conseguem pensar os sujeitos e os obje- ambientais ou outros problemas gerados tos não-humanos, pensar em longo pra- INTUITO por sua atividade. Uma indústria de papel zo, ou ainda pensar a globalização econô- O objetivo principal foi avaliar, dentro em Minas Gerais teve rompida uma barrei- mica como ela se impõe hoje. de condições normais, a eficácia de alguns ra de uma lagoa de rejeitos, causando da- métodos empregados no processo de ges- nos ecológicos e comprometendo o abas- PRESERVAÇÃO PRESERV tão de riscos, enfocando meio ambiente e tecimento de água de cidades, incluindo O que se observa é que as questões re- sua degradação. Em muitas circunstânci- o Rio de Janeiro. O inusitado é que os atu- lacionadas à preservação do meio ambien- as, mais vale a segurança sentida pelas ais donos afirmaram que ao adquirir a in- te ou à adoção de mecanismos seguros pessoas frente aos riscos, do que seu con- dústria, as bacias já existiam, como se não de prevenção de riscos são ou foram pas- vencimento por outro caminho que não o fossem responsáveis por seus passivos sados para trás, em detrimento da pressa de sua própria percepção. Muitas vezes, ambientais. em se iniciar as atividades ou de questões a segurança sentida não é a segurança financeiras, principalmente de obtenção adequada ao momento. Muitos profissio- HOLÍSTICA de financiamentos de bancos públicos a nais que atuam em SST já tiveram a opor- No livro “Correntes da Ética Ambien- juros fortemente subsidiados. Muitos pro- tunidade de presenciar a permanência de tal”, Marcelo Luiz Pelizzoli comenta que blemas causados pelas indústrias foram profissionais gabaritados em situações ou “Falar em ambiente é falar em pessoas e encerrados sem qualquer solução, porque atos perigosos. Quando questionados so- suas relações, ou seja, falar em ética, o era melhor ter como vizinha uma indús- bre sua própria segurança, os emprega- que por sua vez não é apenas falar em nor- tria poluente gerando mão-de-obra para dos respondiam: “Eu tenho mais de 20 a- mas morais e comportamentos, mas em a família toda, do que um ambiente limpo nos de experiência nessa área” ou então formas de conhecimento (que são sempre com pessoas desempregadas, ou tendo “É só um estantinho e já vai estar tudo relações), visões de mundo, daí a cosmo- que se deslocar dezenas de quilômetros pronto”. A escolha dos riscos aos quais se logia, a ontologia e a antropologia envol- por uma oportunidade de emprego. De deve dar atenção não é simplesmente o vidas, a saber, visões de sentido do mundo outra feita, era muito melhor ter um gran- reflexo de preocupações com a proteção ou universo, do ser, da essência e do que de empreendimento próximo à residên- da saúde, da segurança e do ambiente. é humano e ético”. O mesmo autor, ao a- cia, proporcionando mais segurança e in- Essa escolha reflete também outros as- bordar as perspectivas gerais da ótica ho- fraestrutura urbana, do que tê-la por lon- pectos, como as crenças da sociedade lística, afirma que o ponto de partida co- ge. Diz-se na gíria: ruim com ela, pior sem acerca de valores, instituições sociais, na- mum é a crítica ao modelo civilizatório que ela. tureza, justiça e moral, sendo estes se baseia na noção de progresso material Por exemplo, em uma obra tradicional determinantes na superestimação ou e desenvolvimento econômico nos moldes de construção de edifícios é nítido que há subestimação de riscos. da modernidade científica e industrial, desperdícios. Esta percepção vem dos ca- Um ponto que cabe ser destacado é a que desconsidera as consequências ao ser minhões que saem das obras carregados importância que os sujeitos dão aos ris- humano e à natureza, em termos de dese- de entulhos (resíduos) e das caçambas es- cos e seus reflexos quanto às questões quilíbrio e perda de interligação com as- tacionadas nas calçadas. Chegou-se a es- ambientais. Quase sempre as prioridades pectos fundamentais da vida. Novamen- timar que os níveis de perdas ultrapassa- das pessoas não obedecem à mesma cro- te, entram em choque as ações dos seres va a 5% do valor do empreendimento. Es- nologia das prioridades das empresas, humanos em sua busca incessante pela se percentual não incluía os custos para a principalmente se aquelas estiverem di- modernidade e os gravames abandonados remediação ambiental, prejudicada pelo retamente envolvidas com os resultados nos colos dos indivíduos que co-habitam lançamento de produtos nocivos ao am- das implantações dos empreendimen- os mesmos espaços. Mais uma vez, cabe biente. tos. Ou seja, se as pessoas percebem que a reflexão sobre o futuro. Projetos de hoje A primeira questão que sobressai é a podem vir a se beneficiar com a implan- têm que levar em consideração o amanhã, da importância da percepção das pesso- tação dos empreendimentos, costumam 104 REVISTA PROTEÇÃO JUNHO / 2011
  • 3. relegar a um plano inferior suas preocu- martelo. Isoladamente essa ferramenta Outro aspecto interessante a ser obser- pações com outros aspectos que não o de não apresenta qualquer tipo de risco e vado é estrutura de família. Um rapaz sol- sua contratação ou de seus familiares. nem é motivo de preocupações, como por teiro que vive sozinho poderá ter uma re- Assim, não adianta querer envolvê-los em exemplo, o martelo em uma caixa de fer- ação frente os riscos bem diferente do que questões mais técnicas sobre os possíveis ramentas ou sobre uma bancada de tra- se fosse casado, e mais diferente ainda se problemas, já que sua preocupação na- balho. Todavia, na mão de uma criança tiver filhos pequenos. O mesmo ocorre quele momento é apenas a empregabili- pode vir a representar um risco. Uma mãe, com famílias com filhos pequenos. A pre- dade. ao ver seu filho com menos de dois anos ocupação das mães principalmente, tor- O enfoque das técnicas de avaliação andar pela casa com um martelo na mão na-se maior quando esses são pequenos. sempre foi avaliar projetos e processos tem a reação imediata de tirar o objeto com vistas à identificação dos riscos, para do filho por perceber que pode ocorrer METODOLOGIA seu posterior tratamento. Recentemente, algo de ruim. O mesmo pensamento pode A gestão de riscos (Risk Management) foi incluída nesse rol de técnicas a avalia- não ocorrer a um pai, que pode até que- pode ser entendida como um conjunto de ção do consumidor quanto a sua percep- rer entregar um prego para que o filho técnicas de abordagem, com vistas à aná- ção de risco. Um aspecto importante é a- possa pregar sobre uma tábua. Se forem lise qualitativa e quantitativa dos eventos, valiar o que pode ocorrer de errado em tios ou avós, podem até achar graça da a fim de identificar, avaliar e tratar os ris- um projeto, sistema ou equipamento, que criança andando pela casa com martelo, cos emergenciais ou latentes, capazes de venha a causar perdas. Outro aspecto é a em vez de andar com um brinquedo. provocar perdas financeiras, pessoais, pa- avaliação sob a ótica dos consumidores ou A percepção dos riscos pode variar de trimoniais e de responsabilidades civis. As dos usuários. Especificamente na avalia- acordo com momento econômico, nível de técnicas de gestão de riscos, quando bem ção de impactos ambientais, espera-se cultura e de informação, interesses envol- empregadas, transformam-se em elemen- que os moradores da circunvizinhança do vidos, aspectos familiares, entre outros to de antecipação ou previsão de um cená- empreendimento também possam opinar fatores. Se há necessidade de construir rio de perdas futuras. sobre as questões que dizem respeito à um depósito de lixo em determinada lo- Por meio da gestão de riscos é possível contaminação ambiental, antes mesmo de calidade, e se houver tratamento adequa- estudar procedimentos que promovem a virem a ser afetados por essa. do, esse projeto poderá ser fonte de em- redução do número de ocorrências ou da prego para desempregados, ou uma fon- extensão das perdas, fatores importantís- VARIAÇÕES te de riscos para famílias estruturadas fi- simos para a mensuração das taxas de ris- Um exemplo clássico da percepção de nanceiramente que não dependam da cos. O processo ou conjunto de tecnolo- riscos, digamos assim, intuitivo, é o de um existência desse para sua subsistência. gias empregadas possibilita o surgimento JUNHO / 2011 REVISTA PROTEÇÃO 105
  • 4. MEIO AMBIENTE é somente aquilo que está para aconte- cer ou aquilo que se tem receio de que aconteça em determinado momento. E- xemplificando: - Hoje teremos o risco de um temporal, levem os seus casacos, não cheguem tar- de da noite; - Há risco de vocês serem assaltados, portanto não cheguem tarde, nem andem por ruas escuras; - Se vocês não estudarem, correrão o risco de não tirarem boas notas; - Não empreste dinheiro para seu ami- go, porque ele está desempregado e há risco de você perder o amigo ao cobrá-lo; - Não tente consertar o chuveiro para não ter o risco de levar um choque. Para cada exemplo acima citado, a pa- lavra “risco” tem significado diferente. Não chegar junto com o temporal apre- senta o inconveniente, e não o risco da pessoa se molhar. No caso do assalto, efe- tivamente há um risco de perda monetá- ria ou de danos à vida ou à saúde. Nas provas, a pessoa pode ser reprovada. O único risco, que não é aquele objeto da análise é o da perda financeira de ter que repetir o ano letivo ou ter o dissabor do constrangimento pessoal. Finalmente, no caso do chuveiro, o risco envolve a vida da própria pessoa. Se essa estiver sobre um piso molhado poderá sofrer um cho- que mortal. A palavra “risco” dá margem a uma sé- rie de interpretações. Contudo, está sem- pre associada, em qualquer caso, a um insucesso, um perigo, uma perda ou um de meios de atenuação de perdas que a- bém deve ser ressaltado que o uso de suas dano. Dentro do enfoque escolhido, de meaçam o patrimônio da empresa, redu- técnicas se dá mais na fase do estabeleci- correlacionar os processos de avaliação zindo sua severidade ou gravidade. De mento das premissas básicas de projeto, metodológica com a avaliação empírica, certa forma, ao se controlar perdas e, por do que na implantação. Trata-se de uma torna-se importante apresentar algumas conseguinte, reduzir parte dos custos va- fase com pouca reverberação de opiniões, considerações sobre o que vem a ser um riáveis, estar-se-á aumentando o nível de ou seja, a portas fechadas, quando se ava- risco, como ele se materializa e como pode produtividade. Todavia, sob o enfoque do liam prós e contras. ser avaliado, através de processos meto- consumidor ou da população sob risco, o dológicos. conceito está voltado para a sensação de CONCEITOS Riscos são todos os fatos, situações, segurança. É importante saber o quão A gerência de riscos surgiu como téc- bens ou atividades sujeitas a perdas ou seguras se encontram a empresa e a popu- nica em 1963 nos Estados Unidos, com a danos. Para fins de estudos podem ser lação. Se a população não se achar segu- publicação do livro “Risk Management in classificados em voluntários, acidentais e ra, o empreendimento deve preocupar-se the Business Enterprise” de Robert Mehr aleatórios. Confira o Quadro 1, Classifi- em empregar técnicas específicas que a e Bob Hedges. Seguramente, uma das fon- cação dos riscos. convençam do contrário. tes de consulta dos autores foi um traba- Nessa apresentação, vê-se que a utiliza- lho de Henry Fayol, divulgado na França SITUAÇÕES ção das técnicas de gestão de riscos está em 1916. A origem da gerência de riscos Para ser capaz de gerar danos, um ris- mais voltada para a empresa em si e seus é a mesma da administração de empre- co materializa-se em função de um infin- riscos. Quando se volta o foco da atenção sas, que por sua vez conduziu aos proces- dável número de situações. No projeto de para terceiros, vislumbra-se a questão da sos de qualidade e produtividade. se lançar uma sonda espacial para fora do responsabilidade civil daí advinda. Tam- O conceito de risco é amplo. Risco não sistema solar a fim de estudar corpos ce- 106 REVISTA PROTEÇÃO JUNHO / 2011
  • 5. lestes, para que o empreendimento tenha quências dos eventos. êxito, deve-se aguardar o alinhamento dos A função da gestão de riscos é reduzir planetas, o que só ocorre a intervalos de perdas e minimizar os seus efeitos. Isso tempo definidos. Assim, é possível apro- quer dizer que se assume a existência de veitar ao máximo as forças de atração dos perdas em todos os processos industriais, astros para aumento da velocidade da es- como um fato perfeitamente natural. En- paçonave, e mesmo assim, não se tem to- tretanto, por meio de técnicas como ins- tal certeza do sucesso da missão. É o que peções e análises, procura-se evitar que se chama de imponderável. perdas venham a ocorrer com frequência A gestão de riscos avalia o imponde- ou reduzir seus efeitos, limitando-as a va- rável. Chega-se a determinar, por inter- lores aceitáveis ou dentro do perfil esti- médio de técnicas de avaliação de riscos, pulado pela empresa em seus orçamen- qual a probabilidade de sucesso e fracas- tos anuais. so. Para modelos de análise mais simples, Não existe um método único de gestão consegue-se descobrir os prováveis fato- de riscos ou uma metodologia padrão. res causadores do insucesso. Assim, ela- Costuma-se confrontar os procedimentos boram-se previsões com elevado percen- em vigor com procedimentos-padrão para tual de acertos. Algumas técnicas de Estu- aquele tipo de etapa, analisando as possí- dos de Confiabilidade de Processos apre- veis alterações existentes, através de um sentam resultados bem próximos de 100% amplo conhecimento das várias etapas da de acerto. atividade analisada. A gestão de riscos é O risco ou evento, contra o qual se está um processo contínuo de busca de defei- elaborando um plano de prevenção ou eli- tos ou quase-defeitos, com vistas à pre- minação de perdas, deve atender a algu- venção. Esses defeitos são chamados ris- mas particularidades para ser enquadra- cos. Risco é uma chance de perda e prova- do como tal. Deverá ser futuro, incerto, velmente, o mais importante degrau no possível, independente da vontade das processo de identificação e gerenciamen- partes, conduzir a perdas mensuráveis. to das perdas. Um risco presente não é um risco, e sim Com as informações obtidas por inter- um fato consumado. Um risco certo tam- médio da aplicação das várias técnicas bém não é um risco, pois já se sabe quan- adotadas na gestão de riscos e o emprego do e de que forma irá ocorrer. Um risco de metodologias específicas pode-se tam- impossível também não é um risco, já que bém quantificar riscos. A partir do mo- não gerará qualquer tipo de perda ou dano. mento que se qualifica e quantifica um ris- Por exemplo, não se pode falar em in- co tem-se a sua real magnitude ou sua ex- cêndio em uma caixa d'água, porque sim- pressão matemática. plesmente, principalmente quando essa A qualificação é a identificação do tipo está cheia de líquido, não apresenta con- de risco. Trata-se de um risco de incên- dições para um incêndio. Todavia, pode- dio, de explosão, de danos elétricos, ou se falar em um dano elétrico no motor de de contaminação ambiental, etc. A quanti- acionamento da bomba que esteja próxi- ficação é a determinação do valor da per- ma da caixa d'água. Um risco que depen- da, expressa em percentual do valor dos da de um dos sujeitos para ser iniciado bens ou em valores absolutos ou do tama- também não é um risco. Lógico que há nho do prejuízo futuro. O risco, se ocorrer, exceções, como no caso de uma pessoa poderá gerar uma perda que irá afetar sem total domínio das faculdades mentais. 48% do patrimônio da indústria. A perda Finalmente, um risco que não gere nenhu- potencial é de cerca de 500 mil reais. No ma perda e nenhum dano também não tocante a questões ambientais, há que se pode ser entendido como risco. considerar os danos diretos, consequen- tes e indiretos. Os danos diretos podem ETAPAS ETAPAPAS ser avaliados com certa precisão, e para Procura-se entender como e por que os demais, é preciso saber as caracterís- esse risco se manifesta, sua periodicida- ticas do empreendimento, da região e da de, frequência e extensão das perdas, para população atingida. reduzir a severidade dos prejuízos. Bus- cam-se ainda meios de reduzir a extensão TÉCNICAS das perdas a outros ambientes, locais ou As técnicas empregadas nos estudos de equipamentos, com o emprego de meca- gestão de riscos podem variar de acordo nismos de proteção, confinando as conse- com os objetivos inicialmente propostos JUNHO / 2011 REVISTA PROTEÇÃO 107
  • 6. MEIO AMBIENTE para a análise das situações como: sinal de pedestres fechado? Se a caldeira O incidente é importante como dado es- vier a explodir? Se a pressão da linha de tatístico porque comprova a existência de a) Check list: é um método de caráter vapor subir muito? Se a informação rece- falhas operacionais ou de controle, possi- geral, com abordagens qualitativas, atra- bida da direção da empresa, para a deso- bilitando a sua imediata reparação. vés do diagnóstico de situações de riscos cupação da área, não for confiável? a partir de um cenário, com o emprego d) Análise Preliminar de Riscos: é uma de perguntas previamente estabelecidas. c) Técnica de Incidentes Críticos: é uma técnica de inspeção desenvolvida com o Seu sucesso depende das análises poste- técnica operacional qualitativa, que bus- objetivo de obter a análise superficial dos riores, bem como dos resultados preten- ca obter informações relevantes acerca de possíveis riscos, de suas causas, das con- didos. Os relatórios, de um modo geral, incidentes ocorridos durante determina- sequências advindas com a materialização contêm um grupo de perguntas básicas, da fase ou período relatados por testemu- desses, bem como das medidas correti- que serão formuladas a operadores de nhas que os vivenciaram. Os incidentes vas ou preditivas adotadas. Em resumo, a equipamentos, supervisores, vizinhos do são os quase acidentes ou os não gerado- APR visa à identificação de elementos pe- empreendimento, terceiros não envolvi- res de perdas. A metodologia emprega, rigosos do sistema, das situações de ris- dos com o empreendimento, as quais per- principalmente, entrevistas com operado- co, das falhas potenciais, etc., determinan- mitirão que sejam traçados perfis aproxi- res ou mantenedores dos sistemas sujei- do a gravidade de suas efetivações, nor- mados do risco. tos a estudo. Alternativamente, poderá se malmente obtidas por meio de simula- lançar mão de trabalhos de bancos de ções. Procura enquadrar os riscos segun- b) What if: é um método qualitativo, ou dados, onde todos os acidentes ou inci- do categorias, definidas de acordo com os seja, que permite chegar ao tipo e ao ta- dentes foram relacionados por tipo de efeitos destrutivos que podem vir a ser manho de risco, muito importante no em- ocorrência. Entre as inúmeras formas de observados, tabelados como a seguir. prego em discussões de caráter geral acer- classificação dos incidentes podemos ter ca de um sistema, e para a abordagem das o seguinte critério. Na Classe I, estão a- Desprezível ou Negligenciável consequências maiores de um acidente. queles que provocam alterações no pla- (Classe I): gera efeitos imperceptíveis, Deve-se sempre separar, na aplicação da nejamento ou na produção; na Classe II, não conduzindo a degradações físicas ou técnica, as causas das consequências. As os que provocam atrasos no planejamen- ambientais que não sejam facilmente re- causas são fatos geradores, e as conse- to ou na produção; na Classe III, os que compostas. Normalmente essa categoria quências, resultados. Existem perguntas provocam paralisações ou o insucesso do de riscos é perfeitamente absorvida pela clássicas que podem ser feitas. Se de re- planejamento; e na Classe IV, aqueles que empresa, juntamente com os custos de pente uma pessoa atravessar a rua com o afetam a integridade física das pessoas. manutenção ou revisão; 108 REVISTA PROTEÇÃO JUNHO / 2011
  • 7. MEIO AMBIENTE Marginal ou Limítrofe (Classe II): de estudar o comportamento de mísseis informações que passa a ter. Por isso o gera ocorrências moderadas, controláveis, balísticos intercontinentais. Esses mísseis processo de avaliação é mais demorado e necessitando, porém, de ações saneado- representavam um alto custo unitário, de subjetivo. Quase sempre são empregadas ras em médio prazo. São riscos que po- milhões de dólares e um elevado risco po- entrevistas pessoais e preenchimento de dem surpreender em termos de perdas. tencial, não só durante a armazenagem e formulários específicos. A elaboração des- Usualmente, as perdas estão associadas transporte como também no lançamen- tes formulários deve ser feita de maneira às consequências dos eventos; to. Os graus de acerto tinham de ser da tal que não conduza o raciocínio das pes- ordem de 100%. As probabilidades de per- soas entrevistadas para um determinado Crítica (Classe III): afeta substan- das materiais eram enormes. Assim sen- viés. O formulário deve ser o mais isento cialmente o meio ambiente, o patrimônio do, partindo-se de um raciocínio lógico da possível. ou as pessoas, necessitando de ações cor- ocorrência de um evento indesejável, ou Pela dificuldade em se obter uma quan- retivas imediatas. Esse tipo de perda é tra- evento de topo, desenvolveu-se uma me- tidade significativa de respostas, que ex- tado através do repasse do risco a uma todologia interativa, a fim de descobrir pressem a opinião da maioria das pesso- instituição financeira ou seguradora; quais as falhas que, atuando em conjunto as envolvidas, costuma-se relegar a impor- ou isoladamente, poderiam gerar o even- tância da obtenção das informações dos Catastrófica (Classe IV): é normal- to não desejado. envolvidos, priorizando apenas a utiliza- mente geradora de efeitos irreversíveis, É importante salientar que um evento, ção de processos e técnicas como comen- afetando pessoas, sistemas, patrimônios quando materializado, nunca traz consi- tados anteriormente. É mister ressaltar- ou ambientes. Quase todos os gerentes go somente um tipo de perda. Associado se que não se deve prescindir da obten- de risco recomendam, como técnica de a essa, poderão existir outras, como per- ção de informações dos envolvidos, prin- tratamento de riscos o afastamento, ou da material ou de insumos para a produ- cipalmente se estamos tratando da análi- seja, a empresa deve renunciar a essa ati- ção, perda de produção, financeira, pes- se de riscos de empreendimentos que se- vidade. soal, de imagem, de mercado, assim como jam potencialmente danosos ao meio am- responsabilidades civis e danos ambien- biente. e) Análise de Modos de Falha e Efeitos: é tais. um método de análise detalhada, que gera PERCEPÇÃO resultados qualitativos e quantitativos, ou MENSURAÇÃO Apesar de podermos conhecer, pelo seja, identifica o risco ao mesmo tempo O contraponto da aplicação das técni- menos em princípio, cada aspecto acerca em que o mensura. A AMFE permite a cas, anteriormente informadas, é o da per- da percepção de riscos, devemos consi- análise das falhas dos equipamentos, com- cepção da perda ou do risco. Os indivídu- derar que esta percepção dependerá das ponentes e sistemas com estimativas de os selecionam alguns riscos pela impossi- informações que as pessoas têm recebi- frequência de ocorrências (taxa de falhas) bilidade de estarem conscientes de todos. do, bem como em que tipos têm escolhi- e a determinação dos efeitos ou conse- Entre decidir dentre os milhares que os do acreditar, dos valores e experiências quências dessas mesmas falhas. Também cercam, a opção é a de pensar naqueles sociais aos quais têm sido expostas e da conhecida como FMEA (Failure Modes que deveriam ser relevados e ignorados. sua visão de mundo. Por sua vez, esses and Effects Analysis), consiste em estu- Os indivíduos podem não se preocupar, fatores dependeriam da dinâmica dos in- dar o sistema por partes, em conjuntos em um primeiro momento, com o lança- teresses dos grupos, da legitimidade das ou subconjuntos, sob a forma de diagra- mento de resíduos poluentes em um rio, instituições, das características do proces- mas de bloco, analisando não só as ocor- mas sim na fumaça que sai pela chaminé so político e do momento histórico que rências isoladamente como também a in- da fábrica, porque ainda não estão preo- vivem. terpelação existente entre essas e os de- cupados com a contaminação das águas e Para Wynne, a tecnologia deveria ser mais subconjuntos. Dessa análise particu- porque o rio não passa junto a sua cida- conceitualizada primariamente como uma larizada se obtém a revisão dos modos de de. Quase sempre nos preocupamos com organização social, e não como uma enti- falha de cada componente e os efeitos que aquilo que vemos ou sentimos. dade física. Esse conceito esclareceria que tais falhas terão sobre outros componen- Para a mensuração dos riscos, pelos o risco, em si mesmo, pode ser frequen- tes que, ao falhar gerarão danos a todo o processos matemáticos, como visto ante- temente uma categoria de pensamento, sistema. Como resultado final tem-se o riormente, basta que conheçamos as me- inserida artificialmente na mente das pes- cálculo de probabilidade das falhas do sis- todologias e tenhamos experiência em soas, direcionando de algum modo à ques- tema, gerado a partir das falhas de seus aplicá-las, empregando para tal conheci- tão de como deveria ver os sistemas de componentes. Logicamente, através des- mento de campo e uso de banco de dados processos decisórios sobre o desenvolvi- ses estudos são determinadas as alterna- confiáveis. Para a obtenção de informa- mento e controle da tecnologia. Suprimir tivas de redução da probabilidade de fa- ções sobre a percepção de riscos não há a dimensão da experiência social envolvi- lhas. banco de dados e nem metodologias espe- da em uma dada tecnologia ou risco seria cíficas, visto que o sentimento quanto a encobrir a legitimidade de valores sociais f) Análise de Árvore de Falha: é o mais riscos é individualizado e fruto de um de- e ansiedades que surgem desta experiên- conhecido dos métodos de confiabilidade terminado momento. Assim, uma pessoa cia. A supressão da experiência social pela de sistemas. A AAF ou FTA (Failure Tree pode apresentar um sentimento em um gestão de riscos ou regulamentação colo- Analysis) foi desenvolvida nos Estados momento e outro em momento seguinte. caria em perigo a própria credibilidade ao Unidos na década de 60, com o objetivo Pode também vir a ser influenciada por dizer para os indivíduos expostos que suas 110 REVISTA PROTEÇÃO JUNHO / 2011
  • 8. experiências sociais e busca de significa- ca, com as avaliações estatísticas, com as tos ambientais significativos associados do não contariam. verificações de projeto e, com a aplica- às atividades das unidades operacionais A percepção de riscos não deve ser to- ção de tecnologias que qualifiquem e considere, quando pertinente, outras mada como isolada ou dissociada das quantifiquem os riscos. Sabe-se que mui- questões locais relativas ao meio ambien- questões concretas relacionadas às situ- tos riscos somente são percebidos depois te e à comunidade. Há outras citações re- ações e eventos de riscos, já que interage que se manifestaram. Ou seja, a percep- lativas à participação da comunidade ex- com inúmeros aspectos sociais. De modo ção das pessoas não foi suficiente para pressando a preocupação dos legislado- geral, os estudos demonstram que, se que- afastá-las dos riscos. res com o atendimento, também, às ne- remos estabelecer estratégias de gestão No subitem 4.3.3 - Objetivos e Metas da cessidades das comunidades locais. A de riscos mais eficazes, devemos consi- NBR ISO 14.001 - Sistemas de gestão am- norma não faz referências explícitas à per- derar os aspectos psicológicos, sociais, biental consta: “Ao estabelecer e revisar cepção da comunidade frente a riscos, culturais e os valores morais que confor- seus objetivos, a organização deve consi- mas menciona os interesses das comuni- mam as percepções do público. A racio- derar os requisitos legais e outros requi- dades afetadas. nalidade científica por si não irá substi- sitos, seus aspectos ambientais significa- tuir, nem tampouco ser uma resposta fi- tivos, suas opções tecnológicas, seus re- PERSPECTIVA PERSPECTIVA nal às preocupações do público, de modo quisitos financeiros, operacionais e co- Se consideradas as experiências e vi- que, sozinha, não deverá guiar as políti- merciais, bem como a visão das partes in- vências de cada um, especialmente da- cas públicas e o gerenciamento de tecno- teressadas”. Dentro desse enfoque, não queles que serão envolvidos direta ou in- logias perigosas. só os problemas da organização estão em diretamente pelos projetos, opinião que cheque, como também a visão das partes também concordamos, haja vista que, ABORDAGENS interessadas. A vizinhança é parte interes- para se ter sucesso na análise dos resul- Há espaço e necessidade para a aplica- sada. As organizações não governamen- tados das avaliações técnicas deve-se apli- ção de abordagens distintas. A empresa tais também podem ser enquadradas car também parte do conhecimento ad- ou o empreendimento não pode só se va- como partes interessadas, na medida em quirido pelo avaliador, mesmo que apli- ler da percepção das pessoas a respeito que representem legitimamente os inte- que inúmeras técnicas. Assim, para a opi- dos riscos que poderá causar. Os organis- resses das comunidades afetadas. nião pública envolvida em um projeto am- mos de licenciamento, principalmente os No anexo “A” da mesma norma citada biental valem mais seus conceitos de ris- ambientais, não podem somente se base- acima, no que diz respeito a planejamen- co e sua percepção desses mesmos riscos ar no que as pessoas dizem ou pensam. to (subitem A.3) é recomendado que o do que a leitura de extensos relatórios Devem se preocupar com a análise técni- processo para a identificação dos aspec- tentando lhes provar o contrário. Hoje em JUNHO / 2011 REVISTA PROTEÇÃO 111
  • 9. MEIO AMBIENTE dia, quando se realizam audiências públi- ção. Sabe-se também que essas tecnolo- to das pessoas com o empreendimento. cas para a avaliação de um risco ambien- gias apuram informações e dados que pre- A percepção não deve ser algo cuja res- tal, reuni-se a população local, apresen- cisam ser interpretados e que essa inter- ponsabilidade repouse, única e exclusiva- tam-se os resultados e se discute a ques- pretação é feita por profissionais com co- mente, sobre os ombros do trabalhador, tão. nhecimento específico. Influi bastante, no mas sim sobre todos os envolvidos. A per- Os estudos sobre percepção demons- resultado dessas análises o conhecimen- cepção deve fazer parte da elaboração do tram que as questões relacionadas aos ris- to específico dos profissionais. Algumas projeto, da escolha dos materiais, do pla- cos não podem ser restringidas somente vezes esse conhecimento não é tão pro- nejamento das atividades e da execução aos processos físicos, químicos e biológi- fundo ou não é profundo o suficiente para dos serviços. cos. O mundo em que se situam - seres avaliar toda a gama de riscos. Nessas cir- Não se deve deixar de considerar o em- humanos em suas relações sociais - é cunstâncias, a percepção do risco é im- prego das técnicas de gestão de riscos, constituído por outros aspectos, como os portante e deve ser relevante na avalia- assim como não se deve deixar de ouvir a estilos de vida e as relações interpessoais, ção final da análise. Também se deve re- opinião dos sujeitos que irão ser prejudi- as interações simbólicas e os movimen- forçar a tese de que os laços de afetividade cados com um acidente ambiental que en- tos sociais, as questões de poder e de dis- entre a comunidade vizinha e o empreen- volva o empreendimento, como também tribuição de riscos, controle social e ins- dimento devem ser sempre fortes. Para deixar de levar em consideração os aspec- tituições sociais. Estes aspectos confor- reforçá-los é importante ouvir a opinião tos éticos de todo o processo. Todos os matarão não somente o modo como os in- de seus representantes. processos encontram-se interrelaciona- divíduos e especialistas percebem os ris- Finalmente, conclui-se que a percepção dos. A sociedade como um todo não pode cos, mas também o próprio modo como de riscos deve ser uma ferramenta a mais, deixar de lado a premissa básica de que a este risco ocorre. além das técnicas, utilizadas na avaliação semente de hoje será a arvore de amanhã. Os riscos existem dentro de toda ativi- dos riscos, em programas de Gestão de O empreendimento de hoje poderá ser o dade humana. Uns ocorrem no início das Riscos, face à sua importância dentro de algoz da população amanhã. Deve-se ter atividades, outros ao longo dessa. Há a- um contexto social. Também se conclui o máximo cuidado nas avaliações técni- queles que têm um tempo de recorrência que a percepção não deve ser um elemen- cas bem como no respeito à opinião das muito longo, ou alongado com a adoção to único ou isolado na avaliação dos ris- pessoas envolvidas. de medidas preventivas. Contudo, exis- cos, porque há possibilidade de não ser tem. Considera-se também que as tecno- completamente verdadeira, face ao fato logias empregadas para a detecção des- de que contribui para o seu insucesso a ses está em contínuo processo de evolu- falta de informação ou o comprometimen- 112 REVISTA PROTEÇÃO JUNHO / 2011