Este documento descreve uma ação de anulação de sentença arbitral. A sentença arbitral foi considerada nula porque o árbitro decidiu sobre questões fora dos limites estabelecidos no compromisso arbitral. Além disso, o árbitro rejeitou em bloco os pedidos da autora sem analisá-los individualmente, como era necessário. O recurso da autora foi provido para anular por completo a sentença arbitral.
Decisão anula sentença arbitral por extrapolar limites do compromisso
1. 3ss TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO
2 6a Câmara
C APELAÇÃO C/ REVISÃO
C/5 No.1220887- 0/6
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Y"^ Comarca de SÃO PAULO 28.V.CÍVEL
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D Processo 134589/06
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APT/APDS PATRIMÔNIO CONSTRUÇÃO E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA
TARRAF CONSTRUTORA LTDA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA
REGISTRADO(A) SOB N°
A C Ó R D Ã O *02177193*
Vistos, relatados e discutidos estes autos,
os desembargadores desta turma julgadora da Seção
de Direito Privado do Tribunal de Justiça, de
conformidade com o relatório e o voto do relator, que
ficam fazendo parte integrante deste julgado, nesta data,
negaram provimento ao recurso da ré e deram provimento
ao apelo do autor, por votação unânime.
Turma Julgadora da 2 6a Câmara
RELATOR DES. CARLOS ALBERTO GARBI
REVISOR DES. NORIVAL OLIVA
3o JUIZ DES. RENATO SARTORELLI
Juiz Presidente DES. RENATO SARTORELLI
Data do julgamento: 04/02/09
DES. CARLOS ALBERTO GARBI
Relator
2. PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
26a CÂMARA DE DIREITO PRIVADO
APELAÇÃO COM REVISÃO N° 1.220.887- 0/6 - VOTO N° 1.524
Comarca: São Paulo (28 a Vara Cível).
Apelante/Apelado: Patrimônio Construção e Empreendimentos
Imobiliários Ltda.
Apelante/Apelado: Tarraf Construtora Ltda.
Arbitragem. Ação de anulação de sentença
arbitrai. A sentença arbitrai foi proferida fora dos
limites da convenção de arbitragem. Sentença
arbitrai nula (art. 32, inc. IV, da Lei n° 9.307/96).
Incumbia ao árbitro convocar as partes para que o
objeto da arbitragem fosse melhor explicitado. Se
uma das partes propõe questão fora dos limites do
compromisso de arbitragem, o árbitro não tem
autoridade para decidi-la e se o faz por
desatenção provocará a nulidadelda sua decisão.
3. PODER JUDICIÁRIO
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O compromisso arbitrai limita a pretensão das
partes. A sentença arbitrai também deixou de
decidir todo o litígio submetido à arbitragem ao
rejeitar, em bloco e sem motivação, a pretensão
da autora formulada discriminadamente. Recurso
da autora provido para anular por inteiro a
sentença arbitrai. Negado provimento ao recurso
da ré.
VOTO N° 1.524
Recorreram as partes da sentença que julgou
parcialmente procedente a ação de anulação de sentença arbitrai.
Sustentou a autora no recurso que o árbitro deixou
de analisar cada um dos itens do pedido inicial. Por esta razão,
pediu a anulação integral da sentença arbitrai e, por conseqüência,
a devolução da matéria para que todas asAquestões sejam
adequadamente decididas. Requereu que o ôn JS ida sucumbencia
seja atribuído exclusivamente à requerida.
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A requerida, por sua vez, sustentou que o contrato de
construção de prédio residencial foi feito pelo regime de
administração, de modo que a autora seria também responsável
pelo acompanhamento da obra, bem como pela apresentação de
estudo hidrologico da área onde seriam edificados os prédios pela
ré. Afirmou que a sentença arbitrai não é extra petita, pois o
compromisso arbitrai previa a abordagem de todas as relações
jurídicas existentes entre as partes. Salientou que o objeto da
arbitragem foi limitado pelo termo de compromisso arbitrai e não
pelo pedido inicial. Por esta razão, a controvérsia dos autos não
estava limitada tão-somente aos valores requeridos pela autora.
Os recursos foram respondidos.
É o relatório.
A ré foi contratada pela autora para construção de
prédios residenciais. Foi estabelecido em contrato o custo da obra
em R$ 16.790.000,00. Ao final, caso fosse ultrapassado esse
valor, a diferença seria suportada exclusivamente pela ré.
Afirmou a autora que o referido custo-alvo foi atingido
a
e a ré tentou entregar o empreendimento, o que níão foi aceito em
razão de desconformidades verificadas. Piei equ a autora o
pagamento da quantia de R$ 561.351^35 nte despendido
com a execução dos reparos necessário giu o litígio.
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Em cumprimento à cláusula compromissória prevista
no contrato celebrado, as partes fizeram termo de compromisso
arbitrai pelo qual foi delimitada a controvérsia: "relativa ao
cumprimento ou não das cláusulas contratuais e os valores
reclamados pelo demandante serão decididos pelo Árbitro" (fls.
56).
Percebe-se, diante do compromisso arbitrai, que o
árbitro não poderia ter reconhecido um crédito em favor da ré, pois
somente os valores pleiteados pela autora ("reclamados pelo
demandante" - sic) deveriam ser decididos, conforme constou
expressamente no documento arbitrai.
O compromisso não foi estabelecido de forma ampla
e completa a dar ao árbitro autoridade para decidir qualquer
questão relativa ao cumprimento do contrato. Ao contrário, as
partes levaram à arbitragem questão precedentemente definida e
que dizia respeito à pretensão da autora de receber indenização
da ré pelos serviços que deixaram de ser realizados
adequadamente. Este foi o pedido dirigido ao juízo arbitrai.
É certo que o árbitro, no caso, tinha liberdade para
estabelecer o procedimento: "Tendo início osprocedimentos da
arbitragem, inexistindo acordo entre as partes, p Árbitro decidirá,
definitivamente, sobre o objeto da» controvérsia, a partir das
petições, com as alegações das parles, oitivV das partes, seus
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advogados, testemunhas, alegações finais, por escrito, de acordo
com a orientação e os critérios do Árbitro" (fls. 57).
Sucede que a controvérsia a ser dirimida estava
previamente definida no compromisso arbitrai, de forma que o
árbitro não poderia, a despeito da liberdade de procedimento, ter
apreciado pedidos da ré que não foram incluídos no compromisso.
Ao firmar o compromisso arbitrai as partes, na
verdade, estão limitando as suas pretensões no juízo arbitrai, de
forma que o pedido não poderá ser feito fora do objeto da
controvérsia levada ao árbitro pelo compromisso. A sentença está
limitada ao pedido que, por sua vez, está limitado ao compromisso
arbitrai. O compromisso define a controvérsia a respeito da qual as
partes poderão formular os seus pedidos.
Explica CARLOS ALBERTO CARMONA que a Lei n.
9.307/96 substituiu a expressão "objeto do litígio", que constava no
Código de Processo Civil como requisito do compromisso arbitrai,
por "matéria que será objeto de arbitragem". E recorrendo à
doutrina italiana, cujo respectivo código de processo se refere a
"objeto", lembra CARMONA "que esta determinação (objeto)
consiste, em verdade, apenas na individuaçãodb litígio, ainda que
sumária (ou até mesmo per relacionem, ou sela, com referência a
atos externos ao compromisso), sem necessidade Ide detalhamento
exauriente. O objeto da controvérsia será, portanto, indicado de
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modo genérico, apresentando as partes aos árbitros, quando
instalado o juízo arbitrai, seus pleitos, oportunidade em que melhor
individuarão a demanda..." (op.cit., p. 139).
A informalidade que se preconiza para o juízo
arbitrai não pode contrariar os preceitos fundamentais do processo
e surpreender a parte com a condenação decorrente de pedido não
admitido. Tem aplicação no juízo arbitrai o princípio da demanda,
definido no art. 128, do Código de Processo Civil. Por isso, de
acordo com a doutrina de JOEL DIAS FIGUEIRA JÚNIOR, "o
árbitro decidirá o conflito nos limites em que foi proposto, ou seja,
conhecerá estritamente a parte do conflito sociológico
transformado em lide jurídica conforme descrita no compromisso
arbitrai (art. 10, III), sendo-lhe defeso conhecer de questões não
suscitadas, a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte ..."
(Manual de Arbitragem, ed. RT, p. 177).
Vale notar que, ao contrário do que sustentou a ré,
não há pedido contraposto na defesa apresentada (fls. 67/84). A ré
não pediu a condenação da autora. É certo que alegou a existência
de crédito contra a autora, mas o fez, na verdade, para efeito de
compensação, como se vê, sem dificuldade, dos termos da defesa.
Portanto, deve ser reconhecida nulidade da
sentença arbitrai, com fundamento no IV, da Lei n°
9.307/96, exatamente como determinou a recorrida.
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Sobre essa nulidade esclarece CARLOS ALBERTO
CARMONA: "A nulidade da sentença extra petita e a nulidade da
parte ultra petita do laudo estão calcadas no fato de que, se uma
das partes propõe questão que fuja dos limites da convenção de
arbitragem, não faz nascer, com tal demanda, o poder-dever do
árbitro de julgar, e se o árbitro, por desatenção ou desídia,
examina e decide a questão, provocará a nulidade (de todo o laudo
ou de parte dele...)" (Arbitragem e Processo um comentário à Lei
9.307/96, 1998, p. 267).
Não se pode olvidar que o árbitro poderia convocar
as partes para um adendo ao compromisso arbitrai, caso fosse
necessário explicitar a questão controvertida. Esta providência é
facultada pelo parágrafo único, do art. 19, da Lei 9.307/96.
Contudo, não foi o que ocorreu.
A respeito escreveu CARLOS ALBERTO CARMONA:
"Depois de instituída a arbitragem pode o árbitro sentir a
necessidade de esclarecer alguns pontos dúbios da convenção de
arbitragem: pode ocorrer que o pacto arbitrai não seja
suficientemente explícito acerca da extensão dos poderes
conferidos ao árbitro (...). A prudência recomenda que o árbitro
desde logo procure consenso das partes para completar
disposição da convenção de arbitragem, (pvitandq fjutura alegação
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de nulidade" (Arbitragem e Processo um comentário à Lei
9.307/96, 1998, p. 195).
Outro motivo se acrescenta para a anulação da
sentença arbitrai. É que a autora formulou o pedido
discriminadamente, indicando o valor de cada ponto da sua
pretensão. No entanto, o árbitro não examinou por inteiro a sua
pretensão, decidindo em bloco pela rejeição de todas as verbas
pleiteadas sem estabelecer relação de causalidade entre elas e a
responsabilidade da autora que apontou na sua decisão. Há verbas
que, tudo indica, não estão relacionadas à falta da autora que o
árbitro reconheceu na sua decisão. De qualquer modo, cumpria à
decisão arbitrai examinar por inteiro a pretensão deduzida pela
autora (art. 32, V).
A sentença recorrida anulou apenas a parte da
decisão arbitrai que condenava a autora ao pagamento de R$
425.048,41. Entretanto, a anulação deve ser determinada por
inteiro, pois o árbitro não decidiu completamente o litígio, deixando
de motivar a rejeição de todos os itens do pedido.
Assim, o recurso da autora merece [provimento a fim
de anular por inteiro a sentença arbitrai paral que outra seja
proferida (art. 33, § 2 o , inc II, da Lei n° 9tv307/96). /
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Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO ao rejz% so da ré
e DOU PROVIMENTO ao apelo da autora para anular /bor| inteiro a
sentença arbitrai, para que outra seja proferida, e conjben/o a ré ao
pagamento das custas processuais e dos ocatícios
de 10% sobre o valor da causa [corrigido.
CARLOS ALBERTO GARBI
Relator
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