O Ministério Público moveu uma ação civil pública contra o Município de Criciúma e uma construtora alegando que o loteamento Girassóis lança esgoto doméstico sem tratamento em um curso d'água. Laudos confirmaram as irregularidades. A juíza concedeu liminar parcial, determinando que o Município faça cessar o lançamento do esgoto no prazo de 120 dias sob pena de multa, e que coloque placa sobre a ação na entrada do loteamento.
1. ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Criciúma
2ª Vara da Fazenda
Endereço: Av. Santos Dumont, S/N, Prédio do Fórum, Milanese - CEP 88.804-500, Criciúma-SC - E-mail: criciuma.fazenda2@tjsc.jus.br
Autos n° 020.13.026182-3
Ação: Ação Civil Pública/Lei Especial
Autor: Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Réu: Município de Criciúma e outro
Vistos, em decisão.
Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por seu
Promotor de Justiça titular da 9ª Promotoria de Justiça desta Comarca, ingressou com a
presente ação civil pública com pedido liminar em face do Município de Criciúma e da
Criciúma Construções Ltda., argumentando, em síntese, que foi instaurado o Inquérito Civil n.
06.2010.00005259-4, com o escopo de compelir os requeridos a cessarem o lançamento do
esgoto sanitário proveniente do Loteamento Girassóis em uma nascente no meio da Mata
Atlântica.
Salientou ter requisitado à Fundação Municipal do Meio
Ambiente – FAMCRI – a realização de vistoria no prefalado loteamento, que resultou no
Parecer Técnico n. 017/2011, onde foi constatado o aterramento de parte de um curso d'água e
que o esgotamento doméstico é lançado na rede de drenagem pluvial. Além disso, ressaltou
que, segundo a fundação municipal, já existiam famílias estabelecidas no loteamento,
despejando seus esgotos de forma irregular.
Acrescentou que a Polícia Militar Ambiental também vistoriou o
empreendimento, oportunidade em que suas conclusões corroboraram as informações
constantes no parecer emitido pela fundação municipal. Afirmou, no mais, que, conforme a
FATMA – Fundação do Meio Ambiente –, o loteamento não possui Licença Ambiental de
Operação, mas tão somente as licenças prévias e de instalação.
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Diante das condutas lesivas ao meio ambiente que teriam sido
praticadas pelo Município de Criciúma e pela Criciúma Construções Ltda., requereu a
concessão de medida liminar para que: a) o Município de Criciúma seja compelido a fazer
cessar o lançamento de efluentes poluidores sem tratamento, oriundos do Loteamento
Girassóis, diretamente em curso d'água, sob pena do pagamento de multa diária de R$
1.000,00 (um mil reais), que deverá ser revertida para o Fundo de Reconstituição dos Bens
Lesados de Santa Catarina; b) os requeridos coloquem placa, com dimensão de 4x2 metros, na
via principal de acesso ao "Loteamento Girassóis", anunciando o ajuizamento e o objeto desta
ação civil pública; c) seja decretada a indisponibilidade de todos os bens móveis e imóveis do
segundo réu, para garantir a obrigação de fazer e a reparação de danos morais.
Notificado, o Município de Criciúma informou que somente
40% de território do município conta com esgotamento coletivo instalado e que ainda
prevalece o esgotamento sanitário individual. Asseverou que onde não há o esgotamento
coletivo, é exigido que o sistema conte com fossa e filtro anaeróbio (fls. 297/301).
Ressaltou que no caso do Loteamento Girassóis, que não é
atendido pelo sistema coletivo, cada residência tem que apresentar esgotamento sanitário
individual, condição para a aprovação dos projetos de construção.
Aduziu que os técnicos municipais da Vigilância Sanitária
constataram o lançamento irregular de resíduos líquidos pelos moradores do loteamento em
questão, motivo pelo qual formalizaram auto de intimação para que a empresa responsável
regularize a situação. Acrescentou, no mais, que as licenças ambientais de instalação e prévia
foram fornecidas pela FATMA, devendo este órgão emitir a licença ambiental de operação
(LAO).
ISSO POSTO.
Antes de mais nada, há que se afirmar a legitimidade do
Ministério Público para a propositura da presente demanda, consabido que uma de suas
funções institucionais é a de promover a ação civil pública, para a proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, exegese do
artigo 129, inciso III da Constituição da República de 1988.
Inegável, pois, a legitimidade do Ministério Público para o
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ajuizamento do feito.
É cediço que para o deferimento de uma medida liminar devem
estar evidenciados os seguintes pressupostos: o fumus boni iuris e o periculum in mora, ou
seja, faz-se mister a presença da plausibilidade do alegado, e do potencial prejuízo à
efetividade da demanda, na hipótese de demora.
A Constituição Federal, nos termos do art. 225, garante a todos o
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, cabendo tanto ao Poder Público, como
à coletividade, o dever de zelar pela sua conservação e preservação, in verbis:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as
presentes e futuras gerações.
Da mesma forma, a Constituição do Estado de Santa Catarina,
em razão do princípio da simetria, reproduz em seu artigo 181 a norma inserta no art. 225, in
verbis:
Art. 181. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
Sobre o tema, a Lei n. 6.766/79, que dispõe sobre o
parcelamento do solo urbano, tem como uma das suas principais finalidades a regulamentação
das atividades de desmembramentos e loteamentos, visando a minimização dos impactos
ambientais e sociais.
De uma análise dos documentos que instruem a presente ação
civil pública, depreende-se que o Ministério Público, em 4-11-2010, após uma denúncia
anônima, instaurou o Inquérito Civil n. 06.2010.00005259-4, objetivando apurar
irregularidades no destino dado ao esgoto sanitário proveniente do Loteamento Girassóis de
propriedade do segundo requerido.
A fim de instruir o referido inquérito civil, o Ministério Público,
solicitou vistoria à FAMCRI, informações à Vigilância Sanitária e diligências à Polícia
Ambiental.
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O Parecer Técnico 017/2011, da FAMCRI, noticiou o
aterramento de parte de um curso d'água e que o esgoto doméstico, oriundo das residências,
era lançado na rede de drenagem pluvial (fl.41/44).
Do mesmo modo, no Auto de Constatação 078/2011,
confeccionado pela Polícia Ambiental Militar, restou consignado que em vistoria no
Loteamento Girassóis foi "observado a existência de curso d'água, que aparenta ser natural;
que houve aterro parcial deste curso d'água, nas margens de uma rua que passa pelo
loteamento" (fls. 80/82).
No ano de 2012, sobreveio novo parecer elaborado pela
FAMCRI, o qual informa que no loteamento existem aproximadamente 50 residências, que
não expediu Licença Ambiental para Operação – LAO –, que na área verde foi constatada a
presença de lixo e que a Área de Utilidade Pública está cercada (fls. 245/247). Corroborando
as informações, o parecer da Vigilância Sanitária Municipal afirmou que "o sistema de
drenagem aprovado pela Prefeitura Municipal de Criciúma foi implantado pela empresa
proprietária do loteamento, no entanto constatou-se vazamento de efluentes domésticos e
águas pluviais na Área de Utilidade Pública, provavelmente em decorrência de tubulação
danificada", e que inexiste tubulação que possibilite a drenagem e o destino final dos resíduos
(fls. 255/256).
Mais recentemente, em nova vistoria, a FAMCRI noticiou que o
loteamento não possui sistema de tratamento de esgoto adequado e que os resíduos estão
sendo lançados na rede de drenagem das águas pluviais, que por sua vez está ligada
diretamente a um curso d'água que deságua em um reservatório natural (261/266).
Em dado cenário, entendo presente o fumus boni iuris, pois, ao
menos num exame perfunctório, vislumbra-se a emissão de esgoto doméstico no meio
ambiente.
Já o periculum in mora decorre do prejuízo causado ao meio
ambiente, que se agrava dia após dia com o esgoto que é despejado no curso d'água. Desta
forma, a fim de proteger o interesse coletivo e de resguardar o meio ambiente, a adoção de
medidas pelo poder público é imprescindível.
Desse modo, "em tema de meio ambiente, a cautela deve pender
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a favor dos interesses da sociedade que estão em discussão. Demonstrado o perigo de dano, a
medida que se impõe é o imediato afastamento da causa que está gerando o risco, ou seja, in
casu, a paralisação de toda e qualquer atividade potencialmente lesiva [...] (Agravo de
Instrumento n. 2008.033525-1, de Santo Amaro da Imperatriz, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros,
Terceira Câmara de Direito Público, j. 9-2-2009)"
No entanto, não se desconhece que a rede de esgoto coletivo,
implantada pela CASAN, não alcança todos os bairros do município, sendo que nestas
hipóteses, como bem lembrou o representante do Ministério Público à fl. 15, a Lei da Política
Nacional de Saneamento admite a possibilidade de sistemas individuais de tratamento de
esgoto (fossas sépticas), de responsabilidade do próprio morador (art. 45, §1°, Lei n.
11.445/2007).
Sendo assim, cabe ao proprietário da residência implantar,
individualmente, o tratamento de seus efluentes e ao Município de Criciúma a fiscalização do
destino do esgoto sanitário, a fim de evitar o seu descarte no meio ambiente.
Em suma, em uma análise precária da matéria, pairam dúvidas
quanto à responsabilidade da Criciúma Construções quanto à destinação do esgotamento
sanitário.
Como corolário, ficam prejudicados os pedidos formulados em
liminar contra a Criciúma Construções – nada impedindo este juízo de reconsiderar a decisão
posteriormente.
Destarte, presentes os pressupostos legais, o deferimento parcial
do pedido liminar é medida que se impõe.
Diante do exposto, DEFIRO EM PARTE o pedido de liminar
para determinar ao Município de Criciúma que adote providências no sentido de fazer cessar o
lançamento de efluentes sem tratamento diretamente no curso d'água, originados no
Loteamento Girassóis, bairro Vida Nova, neste município, dentro do prazo de 120 (cento e
vinte) dias, sob pena de multa diária de R$1.000,00 (mil reais) a ser revertida para o fundo de
que trata o artigo 13 da Lei n. 7.347/85, bem como que coloque placa em frente ao
"Loteamento Girassóis" (metragem 4x2 metros), anunciando o ajuizamento desta ação civil
pública, bem como o seu objeto.
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Expeça-se mandado para cumprimento da liminar.
Citem-se com as advertências legais.
Intime-se.
Cumpra-se com urgência.
Criciúma (SC), 10 de março de 2014.
Fernanda Pereira Nunes
Juíza Substituta